PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
Homens, ideias e imortalidade
1. Homens, ideais e imortalidade
“Si insistes en saber lo que es saudade, Tendrás que antes de todo conocer,
Sentir lo que es querer, lo que es ternura,
Tener por bien un puro amor, vivir! (Guarânia de Mário Palmério).
Fui convidado para ocupar a cadeira de Mário Palmério na Academia Uberlandense de Letras e, mesmo me
achando pequeno ante tão grande desafio, aceitei a empreitada e tomo posse dia 3 de dezembro próximo, às
21h, na loja maçônica Liberdade e Justiça – rua estrada dos fazendeiros, em Uberlândia. Agradeço aos meus
leitores porque foram eles que me fizeram atender a este chamado, para viver e colaborar na construção e
preservação de catedrais e santuários, a trilhar ideais que não morrerão, como os sonhos jamais o fizeram.
Estarei assim sobre os ombros de um gigante, que viveu além do seu tempo: poeta, escritor professor e
político. Autor dos clássicos “Vila dos Confins” e “Chapadão do Bugre”, que na visão de André Fonseca
constituiu-se como mito ao manipular os símbolos mais preciosos da sociedade no interior de Minas Gerais.
Ambicioso, conquistou mentes e corações de seus conterrâneos e do país, enquanto sua sensibilidade sobre as
dimensões intangíveis de seu papel social fê-lo um fenômeno teatral para as massas, que o elegeram deputado
federal.
Mário Palmério foi embaixador brasileiro em Assunção e, como poeta, tentou explicar o que é saudade aos
paraguaios, que elegeram esta sua guarânia como a música mais popular de todos os tempos após o hino
nacional. Parece que ele conseguiu. Sucedeu a Guimarães Rosa na Academia Brasileira de Letras, num
momento de efervescência das letras e artes: construção de Brasília, o surgimento da bossa-nova, de Tom
Jobim, e dos versos de Carlos Drummond de Andrade, entre outros marcos da nossa cultura e arte, que tão
caros nos são hoje.
Propugno por uma academia que leve essas luzes à periferia da cidade. Minha posse em uma loja maçônica
que funciona em um centro comunitário (Alfa e Ômega) é um sinal e testemunho de fé neste país, que só tem
uma solução para a violência que nos amedronta e nos tira o bem mais precioso, que é a vida: integrar à
sociedade os jovens negros e afrodescendentes de Zumbi, hoje cooptados pelas drogas e pelo tráfico. E o
único caminho é a educação, que traz de imediato consigo as letras e a arte, vindo depois a saú de e a
autossegurança.
A crise na segurança pública aqui, em São Paulo e no Brasil tem vitimado milhares de jovens negros e
afrodescendentes em sua maioria- alguns deles devedores à justiça, porém a cor da pele tem significado para
muitos, “apenas” simples trabalhadores, uma verdadeira sentença de morte, sumária, o que é inaceitável. Sim,
estamos em guerra e há um genocídio em marcha. Nesta semana da consciência negra, reitero que o patrono
desta cadeira na academia uberlandense foi o rei da alteridade, não só ao louvar todas diferenças, como a
conviver com elas seja no ideal de seus versos seja na prática ao se relacionar com uma índia durante oito
anos em um barco no rio Amazonas (Mário Prata).
Sigo a Deus, que me guia e por ora me despeço com os versos de Chico Buarque que podem retratar a
situação da negritude hoje: “Olha a veia que salta/Olha a gota que falta/Pro desfecho da festa/Por favor/Deixa
em paz meu coração/Que ele é um pote/até aqui de mágoa/E qualquer desatenção/Faça não/Pode ser a gota
d’água”.
José Carlos Nunes Barreto