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MONTAIGNE: SÍMBOLO E REFERENCIAL EDUCATIVO PARA
                                       UMA GERAÇÃO NOVA
                                                                                 Augusto Rodrigues de Sousa1




RESUMO: O avanço das tecnologias digitais trouxe consigo o advento de uma nova geração,
a dos que já nasceram na era da internet, nativos digitais, e não conheceram o mundo antes
das primeiras mídias pessoais. A presença de elementos tecnológicos condiciona os
comportamentos que ajudam a definir a Geração Z, letra que faz referência ao verbo “zapear”,
isto é, circular entre as diversas opções de mídia disponíveis. Tudo ao mesmo tempo! Novos
comportamentos e novas maneiras de se relacionar com o mundo desafiam os educadores a
descobrir também novas maneiras de formar os indivíduos. Neste artigo, Montaigne é visto
como o precursor dos comportamentos da Geração Z e filósofo que apresenta válidas
reflexões para o processo educativo da mesma.


PALAVRAS-CHAVES: Geração Z. Montaigne. Educação


ABSTRACT: The advance of digital technology has brought the advent of a new generation,
those who were born in the era of internet, digital natives, and did not know the world before
the first personal media. The presence of technological conditions the behaviors that help
define the Generation Z, the letter that refers to the verb "zapping", that is move between the
various media options available. All at once! New behaviors and new ways to relate to the
world challenge educators to also discover new ways to form individuals. This article presents
Montaigne as the forerunner of the behaviors of Generation Z and philosopher who has valid
thoughts to the educational process of the same.
KEYWORDS: Z Generation. Montaigne. Education


1. INTRODUÇÃO

         Desde a Revolução Francesa, define-se sociologicamente os indivíduos a partir de um
grupo social denominado “geração”, termo abrangente que envolve não apenas a idade dos
indivíduos, mas também todo o contexto social, político, econômico, cultural e, mais
recentemente, tecnológico, a que estão envolvidos:


1
          Acadêmico do 3° período do curso de Licenciatura em Filosofia na Faculdade Salesiana Dom Bosco, Manaus- AM.
É Salesiano de Dom Bosco, congregação religiosa que trabalha de maneira especial com a juventude, a comunicação social,
a animação vocacional e o serviço missionário. Email: augustosdb@gmail.com
“Foi só no início do século XX que as gerações viraram objeto de
                             estudo acadêmico. O primeiro a tentar formular uma ciência das
                             gerações foi o sociólogo alemão Karl Manhein (1893-1947)- a
                             expressão, colada à sua acepção atual, tinha nascido no período da
                             Revolução Francesa. Em uma série de estudos publicados nos anos 20
                             e 30, Manhein defendeu a idéia de que os eventos marcantes de um
                             determinado período têm o mesmo poder de moldar a consciência de
                             um individuo quanto a sua cultura ou classe social. Nos anos 90, o
                             tema se polarizou depois de um estudo seminal dos historiadores Neil
                             Howe e William Struss sobre as diferenças de comportamento das
                             gerações no trabalho e no consumo” (CARELLI, 2012, p.104)

         Este conceito permaneceu escondido sob grossas camadas de poeira acadêmica por
muito tempo, até que foi resgatado pela sociologia e pelas novas “ciências”, como a
publicidade, que precisava traçar um perfil dos novos consumidores do mercado pseudo-
reestruturador do pós-guerra. Eles perceberam que durante e nos primeiros anos após a
Segunda Guerra Mundial, o mundo recebeu mais que a explosão de uma bomba atômica:
recebeu uma enorme e contagiante explosão juvenil.

         Decepcionados com o caos gerado pelo mundo adulto e racionalizado (fruto da
Modernidade), os Baby Boomers, os jovens dos anos pós-guerra, “saíram por aí” proclamando
um tempo de paz, liberdade, amor livre e rompimento dos padrões até então apregoados. Seus
filhos formam a Geração X, ou Geração Coca-Cola, nascidos a partir de meados dos anos 60,
não conheceram o mundo destruído pela guerra, mas continuaram a luta por grandes ideais.
Marca desta geração é também o nascimento da internet, inventada por Tim Berners Lee, e
também o aparecimento dos primeiros gadgets2. A Geração Y (dos nascidos nos anos 80 e
início dos anos 90), também chamada de Globals ou Milleniuns, recebeu das gerações
precedentes um mundo mais estável e acompanhou o desenvolvimento e emancipação da
internet e dos gadgets. A infância passou a ser mais valorizada neste período e o mundo
começou a ganhar mais confiança e estabilidade. Por fim, vimos surgir, junto com as grandes
descobertas da tecnologia e a possibilidade de um novo mundo (o digital), a Geração Z.


2
 Gadget é uma gíria tecnológica que se refere a um equipamento que tem um propósito e uma função específica, prática e
útil no cotidiano. São comumente chamados de gadgets dispositivos eletrônicos portáteis como celulares,
smartphones, tocadores mp3, entre outros. Na Internet ou mesmo dentro de algum sistema computacional chama-se de
gadget pequenos softwaresr agregados a um ambiente maior.
Nascida a partir de meados dos anos 903, esta geração não conheceu o mundo antes do avanço
da tecnologia, por isso gira (zapeia) com facilidade entre as mais diversas mídias digitais. As
pessoas da Geração Z possuem muitas características similares às gerações anteriores, chega-
se a dizer, que se parecem mais com a Geração Y que os próprios jovens da Geração Y. Seu
comportamento também é moldado pela tecnologia: acostumados à velocidade e
constantemente bombardeados por informações, naturalmente curiosos e ansiosos, possuem
um alto poder de compra e gosto exacerbado pelas novidades, eles são os nativos digitais. O
surgimento desta última geração é talvez a mais desafiadora para os educadores, pertencentes
às gerações precedentes.

         Cinco séculos antes de todo este processo histórico, o filósofo, comerciante e político,
Michel de Montaigne vivia um processo semelhante de descobertas de um “novo mundo” e de
revoluções intensas na ordem estabelecida, por isso também ele apresentava uma série de
características comportamentais similares ao comportamento da Geração Z atual, entre eles o
gosto pela informação, o pensamento multifocal, a vivência de uma liberdade profunda no
agir e no escrever, o caráter cosmopolita, o falar de si mesmo e a experiência da solidão. Por
isso nos aventuramos a oferecer este filósofo como parente distante, precursor remoto, destes
novos indivíduos, que a partir destes anos começam a conquistar o mundo com sua entrada no
mercado de trabalho.4 Em alguns de seus Ensaios, Montaigne, ao tratar da “Educação dos
crianças” ou do “Afeto aos filhos” apresenta indicativos pontuais e válidos ainda hoje para os
educadores que atualmente compõem o corpo discente de nossas escolas.

         Com a pesquisa e análise do fenômeno comportamental da Geração Z, vistos à luz do
Ensaio “Da educação das crianças”, esperamos oferecer uma reflexão agradável (o que
combina muito bem com Montaigne) da filosofia ao processo de educação, ensino e
aprendizagem desta nova geração.

         Prefiro apresentar um retrato da Geração Z antes de apresentarmos o autor trabalhado.
Tive que sacrificar um pouco da metodologia para uma melhor compreensão didática desta
apresentação. Montaigne, o filósofo sem método, nos permite isso!




3
  A discussão geracional envolve seriamente a questão do “inicio” ou “nascimento” das gerações apresentadas. Alguns
pesquisadores situam a Geração Y até o ano 2000, e, por conseguinte, a Geração Z a partir de 2001, de modo especial
seguindo o lifestyle americano, completamente modificado a partir do atentado de 11 de setembro. Preferi seguir os dados
da empresa Box1824, que situa a Geração Z a partir de meados dos anos 90.

4
 De fato, se a Geração X corresponde aos nascidos nos meados dos anos 90, a partir do ano de 2012 eles começam a se
aventurar no nosso mercado de trabalho, trazendo para o campo profissional todas as exigências de seu perfil geracional.
Após apresentar a o perfil e a figura de Montaigne, relacionamos as possíveis
contribuições que ele pode oferecer para o processo educativo das novas gerações.

2. “NOSSO JOVEM TEM MAIS PRESSA” 5: O PERFIL DA GERAÇÃO Z6

         Determinar características de qualquer grupo social é uma tarefa muito complexa, pois
carrega o risco de generalizações, que são generalizadamente traiçoeiras. “Por diversas vezes
encontramos estudiosos totalmente contrários a este tipo de classificações, para seres
humanos complexos e naturalmente contraditórios” (CARELLI, 2008, p.104).

         Concordo com os pesquisadores do Dossiê Universo Jovem da MTV, que declaram:

                             “Enquadrar toda uma geração dentro de um mesmo rótulo é válido,
                             mas é mais adequado para estudos de grupos homogêneos em termos
                             de renda, escolaridade e poder de consumo. E esse não é o caso no
                             Brasil, que, mesmo com o crescimento econômico, ainda tem
                             diferenças sociais importantes.” (MTV Brasil, 2010)

         Soma-se a isso o fato de que, possivelmente, indivíduos nascidos dentro do período
histórico marcado por uma geração, pertençam a outro grupo geracional, ou mesmo possuam
comportamentos de outro grupo. Ainda assim, apresento aqui algumas características gerais
da chamada Geração Z, relacionando-as com elementos presentes no texto de Montaigne.

         No ensaio “Da educação das crianças”, Montaigne, enquanto apresenta os indicativos
para uma educação frutuosa, deixa entrever uma série de comportamentos pessoais e das
gerações mais jovens de seu período histórico. A partir destes indícios, podemos apresentar as
características relevantes da Geração Z, comparando-as também com o ensaio mencionado.

         Iniciemos com a citação já apresentada como título deste capítulo. Se na época de
Montaigne, há quinhentos anos, se podia dizer que os jovens tinham mais pressa, o que se
poderá dizer dos jovens de nosso contexto atual? Como já foi dito, nascidos da era da internet,
estes jovens determinam suas vidas e seu comportamento pela rapidez e fluidez de um
software. “Os jovens são imediatistas, hedonistas, sem percepção do tempo. Eles não
conseguem esperar. Demorou, já era.” (MTV Brasil, 2010)



5
 Sempre que tratarmos de uma citação direta a Montaigne, nos referimos à Obra “Ensaios”, da coleção “Os Pensadores”,
1972. Nesta citação cf. Montaigne, 1972, p. 87.
6
  Muitos dos elementos apresentados aqui sobre a Geração Z encontram embasamento nas obras de Zygmund Bauman, de
forma especial o texto Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. E no Dossiê Universo Jovem 5: Screem
Generation, produzido pela MTV Brasil no ano de 2010.
A grande quantidade de informações disponíveis torna-os culturalmente curiosos e
seletivos, ao mesmo tempo em que gera uma das maiores ondas de ansiedade crônica já
relatadas na história. Desde a Geração Y, a imagem é mais significativa do que a palavra
escrita, por isso é fator determinante nos gostos e no aprendizado.

           Constantemente conectados, os jovens cumprem a profecia de McLuhan, fazendo dos
gadgets extensões do próprio corpo (MCLUHAN, 2011. p.17), e a partir deles os jovens
podem viver o sonho de uma verdadeira “pantopia”, ou seja, estar em todos os lugares ao
mesmo tempo.

            Fáceis para iniciar relacionamentos, correm sério risco de cair na superficialidade e na
frustração de relações pessoais que seguem o ritmo das relações virtuais, rápidas e
descartáveis. Percebe-se um aumento no índice de stress nestas crianças e adolescentes e que
a maioria de seus problemas pessoais gira em torno principalmente de sua reputação nas redes
sociais.

            Os adolescentes da Geração Z têm forte dificuldade no relacionamento interpessoal e
na comunicação verbal, percebida principalmente por pesquisas que demonstram que, de dez
jovens entrevistados, dez apresentam a experiência da solidão (SAVAL, 2009, p. 279). Ainda
assim é uma geração que produz conteúdos, e não recebe apenas dos meios de comunicação
formais. Ao mapear os conteúdos produzidos por esta geração, observamos que comunicam
especialmente sobre si mesmos através dos blogs e redes sociais (no Twitter7, a maioria dos
tweet's trata exclusivamente da própria vida, dos afazeres e os gostos pessoais). Percebe-se
nisso uma forte necessidade de ser visto, em um tempo em que ser “curtido” no Facebook8 e
visto por milhares de pessoas no Youtube9, é muito fácil e confere status. Esta fluidez das
informações e relacionamentos levaram os estudiosos a classificar está geração: zapping.

           Ainda que se perceba uma profunda e perigosa superficialidade, a Geração Z dá
grande valor à honestidade: informações e relacionamentos enganosos não são válidos. Esta é
uma geração que dá grande valor à honestidade/sinceridade, à relações éticas seja entre as
pessoas como no ambiente empresarial. Competência é outro elemento chave em um mundo
disperso pelo excesso de informações, não se percebe nesta geração um retorno ao ideal


7
 Twitter: rede social e servidor para microblogging que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de
outros contatos (em textos de até 140 caracteres, conhecidos como “tweets”). (Glossário Dossiê Jovem. MTV, 2010)
8
Facebook: rede social que reúne pessoas a seus amigos. (Idem, 2010)
9
    YouTube: Site que permite que seus usuários carreguem e compartilhem vídeos em formato digital. (Idem, 2010)
filosófico antigo do homem filósofo, cientista, artista, matemático, mesmo que esta geração
esteja bombardeada por todos estes conteúdos, a norma agora é a especialização e a
competência em uma área específica do conhecimento.

        Traço característico de todas as gerações nascidas após a guerra é a percepção de que a
vida deve ser vívida intensamente, e que para isso é preciso dar um sentido a própria vida.
Esta percepção pode ser percebida em diversas áreas do conhecimento pós-guerra, tanto no
Existencialismo de Sartre, que afirma que “a vida não tem nenhum sentido a não o sentido
que nós damos a ela”, seja na psicologia de Victor Frankl, que com sua logoterapia defende
que a frustração nasce de uma vida que não possui um projeto. Viver intensamente, ter
experiências profundas passou a ser o anseio das novas gerações desde que a guerra minou o
otimismo do mundo diante da vida e da racionalidade, agora não existem mais receitas
prontas. Um termômetro curioso é que boa parte dos perfis no facebook dos jovens que
pesquisei apresentavam títulos para seus álbuns como “a gente leva da vida a vida que a gente
leva”, um sinal de que as novas gerações pretendem mesmo construir e “curtir” a própria vida.

2.1      “CENTENAS DE ESTUDANTES CONTRAEM DOENÇAS VENÉREAS
ANTES DE CHEGAREM A APRENDER O QUE ARISTÓTELES DIZ DA
TEMPERANÇA” 10: ÀS VOLTAS COM A SEXUALIDADE

        Percebemos no título desta sessão alguns traços de exagero, próprios da maneira
coloquial com que Montaigne escreve seus ensaios. Mas, desta forma, ele nos apresenta pistas
relevantes para entender a vivência afetiva dos jovens de seu tempo.

        A partir das conquistas das outras gerações e do fenômeno da velocidade relacional já
relatado, percebe-se também na Geração Z um forte apelo afetivo-sexual, próprio de sua idade
(a adolescência) e dos estímulos com que as fontes de informação bombardeiam em seus
cérebros em formação. Cada vez mais, as imagens presentes nos vídeos e propagandas
carregam evidentes apelos sexuais. Segundo dados da UNESCO (2004), no Brasil, as
atividades de iniciação sexual começam entre os 10 e 15 anos de idade, compreendendo um
período que envolve desde as idealizações até as iniciações de fato. Percebe-se ainda, como
marca de toda a cultura juvenil atual um acentuado culto ao corpo, manifestado seja como
ditadura da beleza, promotor de alienação, seja como busca por uma vida saudável, já
presente em outras gerações, e estudado como fruto perene do estilo de vida pós-moderno. É
uma geração mais integrada afetivamente, mas, ainda assim, muito propensa a quadros

10
 Montaigne, 1972, p.87.
depressivos. Marca emblemática dos últimos tempos é o “ficar”, elemento fortemente
hedonista, que varia de um beijo mais acalorado durante uma “balada”, ao ato sexual em si,
ou mesmo um “namoro” de curta duração, como um mês, ou alguns dias. A única coisa que se
pode afirmar do “ficar” é o fato de ser um relacionamento rápido, e que, segundo os próprios
adolescentes, não envolve sentimentos profundos, mas apenas desejo, ou atração física
momentânea.

            Elemento positivo do processo afetivo é a dimensão da amizade. Ao mesmo tempo
delineiam-se novas formas de associacionismo na busca virtual de pares, um processo que
surgiu com os primários “grupos de clientes” dos antigos e-mails, passando pelas
comunidades do Orkut, até evoluir para as fanpages da “onda do momento, o Facebook”, e à
interatividade seletiva da Web 3.011. “Os amigos são formadores de opinião muito relevantes
(se não forem os mais relevantes).” (MTV, 2010)

            Ainda que tenham grandes dificuldades no relacionamento interpessoal, as crianças,
adolescentes e jovens da Geração Z emocionam-se facilmente, choram com facilidade
(algumas vezes beiram a histeria), ligam-se facilmente com pessoas de gostos similares, mas
ao mesmo tempo desligam-se delas por qualquer motivo.

            Último elemento que pretendo destacar nesta dimensão é a relação com a autoridade.
Esta nova geração sente muitas dificuldades com as instituições formais de autoridade. Ao
mesmo tempo, há uma natural necessidade de “‟ídolos testemunhas”, pessoas que sirvam
como referenciais, modelos para a vida futura. Dentre estas pessoas destacam-se as que de
alguma forma lutam pela paz, pela preservação ambiental ou que apresentem uma forte
experiência de superação pessoal. Experiência, por sinal, é a palavra de ordem desta geração,
que não se prende tanto a teorias ou conceitos, mas prontamente deixa de lado seus fones de
ouvido, celulares, iphones e demais gadgets, por uma boa história de vida ou por uma forte
experiência pessoal.

2.2         “ESTE MUNDO TÃO GRANDE (...) QUERO QUE SEJA ESTE O LIVRO DE
NOSSO ALUNO”12. COSMOPOLITAS E GREGÁRIOS.




11
  Web 3.0 é um mais conceito do campo da informática. Na verdade muitos estudiosos não acreditam que a internet tenha
realmente chegado a esta versão (uma espécie de evolução). Característica fundamental do Web 3.0 é a seleção
automática que próprios softwares fazem dos gostos e preferências do usuário.
12
     Montaigne, 1972, p.84.
Montaigne era um homem naturalmente dado ao conhecimento de outras culturas e
acreditava que este era um elemento determinante para uma boa educação das crianças e
adolescentes.

            Vivendo imersa na era da globalização, com a velocidade dos contatos com pessoas do
mundo inteiro, a Geração Z parece mesmo não conhecer fronteiras, claro que isto, mais
virtualmente que fisicamente. As modas e estilos rapidamente ganham o mundo. As músicas,
ritmos, artistas, unem jovens do mundo inteiro, ao mesmo tempo em que esses gostos
demarcam uma identidade grupal que delimita novas fronteiras, não mais as nacionais,
determinadas pelo Estado, mas pelos gostos pessoais e pelo acesso ou não às fontes de
informação.

            Desligados das estruturas institucionais de política e religião, percebe-se nesta geração
a revisão de antigos valores, entre eles a busca pelo Sagrado na vida e por causas globais,
difundidas pelas mídias, como causas ambientais, a luta pela justiça e paz e a
Responsabilidade Social. Segundo a pesquisa “O Sonho Brasileiro”, organizada pela
organização Box1824 (2012), os jovens de hoje, assim como os das gerações anteriores
continuam se preocupando com grandes causas e assuntos globais, mas os modelos de luta e
resistência de ontem não são mais válidos para a estrutura comportamental atual. Hoje não se
exige mais que a individualidade seja sublimada num sacrifício pela coletividade, mas a partir
da exposição das individualidades (pensemos novamente nas redes sociais) os indivíduos se
conectam em busca de causas em comum. O jovem é visto como jovem-ponte, catalisador de
iniciativas e gerador de micro-revoluções. Passeatas e luta com a polícia são elementos que
não surtem mais efeito diante das novas gerações, eles acreditam que as grandes mudanças
(macro-revolução) começam por pequenas e pontuais ações, marcadas, é claro pela fluidez de
sua geração. Segundo a mesma pesquisa, 8% dos jovens brasileiros realizam serviços diversos
pela promoção humana, luta pela justiça e paz e pelo meio ambiente, pode parecer pouco, mas
representa um número de 2 milhões de brasileiros empenhados em micro-revoluções.

            Existem ainda outras características relevantes da Geração Z, mas acredito que as que
apresentamos sejam suficientes para a análise que pretendemos fazer.

3. “SOU EU MESMO A MATÉRIA DESTE LIVRO”13 E “ DE BOM GRADO TENHO
IMITADO A MANEIRA EXCÊNTRICA DE SE TRAJAREM OS JOVENS DE
HOJE”14: ASPECTOS DA VIDA E OBRA DE MICHEL DE MONTAIGNE

13
     Montaigne, 1972, p.11.
Nos Ensaios, Montaigne dedica-se a apresentar suas reflexões e opiniões (não
apresenta certezas, por isso muitas vezes é interpretado como cético) acerca dos mais diversos
temas de seu contexto histórico, social e político. Mas, acima de tudo, fala a partir de sua
própria experiência e fala principalmente de si mesmo. De fato chega a declarar que nenhum
conhecimento é mais útil que o conhecimento de si mesmo e que em cada pessoa pode-se
entrever o universo inteiro. Para Montaigne, como para Sócrates, para se alcançar o
conhecimento pleno, o primeiro passo é conhecer a si mesmo.

            Podemos perceber nas características pessoais de Montaigne muitas aproximações
com o perfil da Geração Z15 e por isso, seus indicativos educativos me parecem válidos na
construção formativa de nossos novos indivíduos, já que ele mesmo pode ser considerado
uma antecipação de cinco séculos do modelo de vida desta geração.

            A primeira destas características está no fato de que, tanto Montaigne, quanto a
Geração Z, nasceram em contextos históricos marcados por descobertas que geraram uma
verdadeira revolução (novidade) dos modos de pensar e agir da sociedade como um todo. A
descoberta do “novo mundo” no século XVI foi revivida e atualizada com a descoberta de um
“mundo digital”, dois elementos que formaram as bases para uma nova relação do homem
com um mundo, uma nova geração.

            Assim como Montaigne, os nativos digitais são os primeiros comentadores de si
mesmos. Hoje, possivelmente “Os Ensaios” seriam publicados em uma página pessoal em um
blog ou facebook, bem como as citações célebres que Montaigne mandou entalhar nos
umbrais de seu castelo e enxertou em seus Ensaios, hoje figurariam os tweet’s de um
webstar.16 De fato, é possível perceber forte semelhança no estilo de comunicação de
Montaigne e webstars influentes nas mídias juvenis atuais, entre os quais destaco o paulista
PC Siqueira, que em seus vídeos fala a partir de suas próprias experiências e convicções de
assuntos que vão, do mais novo game do mercado, até temas pautados em política, ética e
filosofia.17

            Filho legítimo do século XVI (1533-1592), Montaigne acompanhou como bom
observador os grandes eventos históricos que marcam o nascimento da modernidade: as


14
     Idem, p.91
15
     Estas semelhanças serão apresentadas em itálico
16
     Webstar é uma personalidade da mídia digital. Vlogueiros (vídeo) e blogueiros (textos e imagens) entram neste aspecto.
17
 Para ter contato com os vídeos de PC Siqueira seu canal no youtube pode ser acessado pelo link:
www.youtube.com/maspoxavida
guerras religiosas no início do cisma protestante, a descoberta do novo mundo, que desafia os
homens a descobrir também novas maneiras de pensar o mundo e o próprio ser humano. Filho
de burgueses enobrecidos, desde cedo foi educado dentro dos padrões da cultura clássica e
leitor ardoroso da filosofia antiga.

       André Gide selecionou elementos presentes em vários ensaios que nos dão uma boa
amostra das características físicas e de personalidade de nosso autor:

                         “De estatura um pouco pequena, tem o rosto cheio sem ser gordo. Usa
                         a barba toda, segundo a moda da época, mas não muito longa. Todos
                         os sentidos são nele „inteiros‟, quase perfeitos. Embora tenha abusado,
                         licenciosamente, de uma saúde robusta, esta se mantém garbosa,
                         apenas de leve alterada pela pedra aos 47 anos. Seu andar é firme;
                         seus gestos arrebatados; sua voz alta e sonora. Fala de bom grado,
                         sempre com veemência, agitando-se muito. Come de tudo e com tal
                         voracidade que lhe ocorre de morder os dedos, pois nessa época ainda
                         não se usavam garfos. Monta a cavalo seguidamente e mesmo na
                         velhice, as mais longas cavalgadas não o fatigam. Dormir, diz-nos,
                         ocupa grande parte de sua vida. (GIDE, 1985)

       Esta descrição não é muito diferente do que se possa dizer de um adolescente de
nossos dias: comer de tudo e com rapidez (a era da velocidade), cuidado com a saúde, o falar
sem medo de expor as próprias convicções, e curiosamente, até mesmo o fato de que dormir
ocupa boa parte de suas vidas.

       Moderado por natureza e esforço, perseguiu sempre a virtude aristotélica, buscando
em tudo o saudável meio termo, seja na política, na vivência religiosa como nas convicções
pessoais. Declaradamente católico, parece nunca ter se prendido à instituição eclesial, ao
mesmo tempo em que nunca procurou contrariá-la.

       Desejoso de conhecer o mundo, seus ensaios apresentam um homem aberto às culturas
e costumes diversos. Percebe-se nele um forte traço cosmopolita.

       Sua vida solitária foi marcada pela presença de uma amizade profunda com Étienne
de La Boétie e Marie de Gournay, a quem chama de “filha por afinidade”. Competente que
era na administração no comércio, travou também muitas relações com pessoas da alta
sociedade francesa e européia de seu tempo. Após a morte de seu amigo Étienne, dito por ele
como “o maior homem do século”, Montaigne entra no seu “retiro”, mas sua solidão é
rodeada pela presença das citações de “homens modelo”, sábios e inspiradores, através de
suas citações gravadas nos umbrais e no teto de seu castelo. Este retiro é também o tempo de
uma solidão criativa, pois, tal como um adolescente com seu blog, foi no silêncio de seu
quarto que Montaigne escreveu os três volumes de seus Ensaios.

            Percebe-se certas dificuldades no relacionamento com a esposa e frieza ao tratar da
morte de suas cinco primeiras filhas. Um elemento que em nada se parece com as gerações
atuais em Montaigne, é a maneira como fala das mulheres (fruto de sua época, claro), quase
sempre de maneira pouco elogiosa. Mesmo com estes aspectos, podemos entrever uma
propensão muito forte à solidariedade: “Dedico-me de bom grado aos pequenos” (Livro III,
cap.13).

            Outro aspecto relevante da obra dos Ensaios é a grande insistência no “Bem Morrer”.
Nossa sociedade pós-moderna talvez não se identifique tanto com este elemento que em
Montaigne é tão importante. De fato, nos dias de hoje, ou se foge deste tema, ou tratamos a
morte com tanta frieza quanto Montaigne diante da morte de suas cinco filhas, mas pensar na
própria morte não é prioridade para nossa sociedade, muito menos para a Geração Z. Percebe-
se ainda, que Montaigne possuía e transmitia em seus ensaios um grande gosto pela vida, que
deve ser vivida intensamente, mais uma similaridade notória.

            Os Ensaios, por fim, são um exercício contínuo da razão e neles podemos perceber,
através das inúmeras correções e acréscimos, a progressão do pensamento de um homem todo
entregue à arte de refletir, enfim, à filosofia em sua faceta mais imaculada.

            Para uma geração carente de fortes experiências, com forte desejo de se comunicar,
produzir conteúdo, apresentar convicções e necessitada de pessoas que lhe sirvam como
modelo prático; acredito que Montaigne é uma das pessoas mais indicadas para ser
apresentada aos adolescentes e seus educadores, como companheiro na viagem do processo
formativo integral dos indivíduos.

4. “EIS AS MINHAS LIÇÕES”18: ELEMENTOS PEDAGÓGICOS PRESENTES NOS
ENSAIOS

            Trataremos, por fim, dos elementos pedagógicos presentes em Montaigne e que são
válidos para o repensamento do processo educativo das novas gerações.




18
     Montaigne, 1972, p.89.
Defini que, com sua vida pessoal e sua estrutura filosófica (o método de não ter um
método), Montaigne se aproxima bastante do modelo de vida e pensamento das pessoas da
Geração Z, por isso pode ser apresentado como produtor válido de conceitos educativos que
atinjam as expectativas profundas seja dos alunos Z como de seus educadores.

       O ensaio que melhor apresenta as convicções pedagógicas de Montaigne é o “Da
educação das crianças”, deste ensaio retiraremos, como já fizemos anteriormente, os
elementos mais relevantes para a educação da Geração Z:

       - para jovens naturalmente curiosos, imersos em um mundo bombardeado por
informações, Montaigne oferece em primeiro lugar a importância de uma guia estável. O
papel do professor hoje é mais importante do que em todos os tempos (mesmos que certos
modelos educativos modernos difundam o contrário). Em um tempo que sofre uma verdadeira
crise de referenciais, a Geração Z, anseia por pessoas-modelo que lhes ofereçam respostas
concretas para os desafios de sua existência;

       - para jovens ansiosos por pessoas que os ajudem a desenvolver valores minados pelo
imediatismo e o niilismo, Montaigne nos diz que este guia, “deve ter a cabeça mais bem
formada do que bem cheia, e ainda que se exigissem as duas coisas, tivesse melhores
costumes que ciência” (p.81);

       - para jovens integrados e conscientes de suas convicções, Montaigne oferece uma
proposta de educação integral do ser humano, “para se enriquecer e adornar por dentro, para
um rapaz que desejaríamos mais honesto que sábio” (p.81). Montaigne, há cinco séculos, já
estava consciente de que “não é uma alma somente que se educa, nem um corpo, é um
homem. Cabe não separar as duas parcelas do todo” (p.88). Por isso, o educador deve
conduzir os jovens tantos nos conhecimentos intelectuais quanto nas artes marciais, no
esporte e no trabalho;

       - para jovens imersos em uma cultura de massa, que mina as identidades pessoais
construindo cidadãos-rótulo, cidadãos-consumidores, oferece uma proposta de educação
personalizada e adequada aos níveis de aprendizagem do indivíduo. Demonstrando que as
crianças dificilmente conseguiriam aproveitar-se proveitosamente do ensino, se os professores
“encarregados de instruir espíritos naturalmente diferentes uns dos outros pela inteligência e
pelo temperamento, a todos ministram igual lição e disciplina” (p.81);

       - para jovens desacreditados das instituições formais e burocráticas, oferece a
possibilidade de construir juntos o caminho de ensino-aprendizagem, insistindo no diálogo e
na livre expressão das idéias. “Tudo se submeterá ao exame da criança e nada se lhe enfiará
na cabeça por simples autoridade e crédito” (p.81);

       - para jovens desejosos de viver as próprias experiências, mais uma vez oferece o
educador como guia verdadeiro pedagogo, que acompanha, mas não tolhe o educando de
construir seu próprio conhecimento do mundo. Professores de seu tempo e dos nossos:

                        “Não cessam de nos gritar aos ouvidos, como que por meio de um
                        funil, o que nos querem ensinar, e o nosso trabalho consiste em
                        repetir. Gostaria que ele corrigisse esse erro, e desde logo, segundo a
                        inteligência da criança, começar a indicar-lhe o caminho, fazendo-lhe
                        provar as coisas, e as escolher e discernir por si próprios, indicando-
                        lhe por vezes o caminho certo ou lho permitindo de escolher”
                        (MONTAIGNE, 1972, p. 81)

       Ainda para atender a esta necessidade de experiências concretas e profundas,
Montaigne oferece a justa medida entre teoria e prática, reforçando que “uma ciência
puramente livresca é inútil” e torna a criança “servil e tímida” (p.82). Insiste ainda que “o
mundo é o livro de onde as crianças irão aprender”, considerando que “para exercitar nossa
inteligência tudo que se oferece aos olhos serve de livro: a malícia de uma pajem, a estupidez
de um criado, uma conversa à mesa” (p.82), raciocínio que séculos depois Paulo Freire vem
reforçar com a idéia de que a leitura do mundo precede a leitura da escrita (cf. FREIRE,
Paulo. 1989. p. 09);

       - para jovens comunicadores e que sabem produzir os próprios conteúdos oferece a
participação coletiva na produção do saber: “Não quero que fale (o professor) sozinho e sim
que deixe também o discípulo falar por seu turno” (p.81) E mais ainda, “(...) os elementos
tirados de outrem devem fazer-lhe obra própria, isto é, para forjar sua inteligência” (p.82);

       - para jovens desejosos de um agir ético consistente, pautado pela responsabilidade
social e o cuidado do meio-ambiente, Montaigne insiste que a educação deve passar pela
vivência real e concreta dos “bons costumes” por parte dos professores: “criando no discípulo
um amor pela virtude”; formando um cidadão que “serve ao seu príncipe com lealdade (...)
mas prendendo-se a ele apenas pelo dever cívico” (p.83); incutindo normas sérias de boa
conduta e boa educação, trabalhando inclusive o aspecto comum aos adolescentes de todas as
épocas de achar-se “o dono do mundo”; “cuidando para corrigir-se a si próprio que aos
outros”; fazendo que o aprendizado ético seja mais importante que a simples ciência
informativa, “para que se lembre menos o lugar em que morreu Marcelo e mais o fato de que
este morreu por descumprir seu dever!” (p.84). Ainda neste ponto insiste que não deve haver
nenhum tipo de castigo, mas sim que se ensine “a acostumar o aluno a tudo, ao calor e o frio,
à fome e a qualquer incomodo” (p.88); por fim, Montaigne pretende que a conduta do
educando “se acomode aos usos e costumes e que possa fazer todas as coisas, mas só goste de
fazer as boas”, salientando desta maneira o caráter da escolha livre e decidida que o jovem
deve fazer pelo bem;

       - para jovens que dão grande valor à honestidade, convida aos educadores que os
ensinem “sobretudo a ceder e sustar a discussão ante a verdade, surja ela dos argumentos do
adversário ou da própria reflexão (...) Ensinar-lhe-ão a compreender que confessar o erro em
seu raciocínio, inda que ninguém o perceba, é prova de discernimento e sinceridade,
qualidades principais a que se deve aspirar” (p.83);

       - para jovens cosmopolitas, oferece a importância do contato com outras culturas e
outras línguas, formando assim um indivíduo maleável às mais diversas intempéries da vida, e
compreensivo com a realidade de outras pessoas. Esta talvez seja a melhor resposta diante dos
atuais fenômenos de preconceito e violência escolar diante do diferente;

       - para jovens de uma geração em que a imagem vale mais que as palavras: oferece
uma metáfora plástica, mas que expressa mimeticamente como na instituição escolar deve-se
oferecer essencialmente o amor pela sabedoria. Montaigne declara que, “é preferível pintar,
nas paredes, belos florais e motivos da natureza” (p.88), para incutir nos estudantes a beleza
da descoberta do que já está diante de nossos olhos no mundo;

       - para os jovens “que hoje tem mais pressa”, oferece um modelo de aprendizagem que
comece desde os primeiros anos de vida e siga até aos 16 anos, quando todos os
conhecimentos adquiridos poderão ser postos em prática. De fato, muitos países fazem com
que o Ensino Médio seja um período de exercício prático, nas mais diversas áreas do
conhecimento escolhidas pelo próprio aluno. Os resultados apresentam-se bem mais efetivos
que o do sistema tradicional de ensino;

       - para jovens reflexivos e críticos, com acesso direto a fontes sérias de informação e
cada vez mais tornando-se produtores-difusores do próprio conhecimento, Montaigne oferece
o indicativo e o exemplo pessoal de que antes de qualquer outra coisa deve-se aprender a
pensar filosoficamente, visto que a filosofia abre as portas para o mundo de conhecimentos
que o ser humano pode se aventurar. O Brasil nos últimos anos vem se avançando neste
aspecto em passos lentos, mas decididos. A leitura, principalmente dos clássicos, contribui
para que o jovem crie as próprias convicções, profundas e éticas, e estas convicções sejam
refletidas na prática cotidiana;

         - por fim, para jovens que amam a vida e têm profundo desejo de viver intensamente,
Montaigne demonstra que nossas inclinações humanas nos fazem pender justamente para este
fim, mas que a educação deve ajudar o jovem a “usar bem destes dons (a vida, a beleza, a
glória, a saúde), sabendo-os utilizar com moderação e perdê-los sem fraquejar, se for preciso”
(p.86)

         O único aspecto que a mentalidade educacional moderna se afasta do pensamento de
Montaigne se refere a ideal do filósofo de que um ensino de qualidade, de preparação total
para a vida, deva ser ministrado longe da assistência dos pais. Hoje, bem mais que no século
XVI, percebe-se a necessidade cada vez maior de uma integração positiva entre a família e a
educação escolar. Aliás, podemos afirmar ainda, que as próprias estruturas de educação
institucional devem favorecer a preservação da família, tão ameaçada nos tempos atuais,
como base de educação e humanização primeira da pessoa. (CHÁVEZ, 2006. p. 6)

         Existem outros aspectos também relevantes no modo como Montaigne entende a
educação, mas acredito que seja de melhor proveito ficar apenas com alguns pontos
fundamentais que possibilitem não só o conhecimento destes indicativos, mas a realização dos
mesmos. Tanto no agir educativo dos educadores quanto na praticidade da vida dos jovens.
Quanto à execução destes preceitos deixemos que Montaigne fale por si mesmo: “Eis minhas
lições, aproveita-as melhor quem as pratica do que quem as sabe (...) o jovem as traduzirá em
ações, e as aplicará aos atos da vida” (p.89).

         CONSIDERAÇÕES

         As novas gerações estão ansiosas por pessoas-modelo capazes de saciar sua enorme
sede de vida e de experiências profundas. Muitas vezes os educadores não sabem o que fazer
para sair de um modelo pedagógico conteudista para um modelo de formação integral dos
jovens dispersos e “cheios de si”, a que Montaigne em seu ensaio chama “donos do mundo”.
Seus ouvidos acostumados aos fones, conectados aos mp3 players e nos Ipods, não
conseguem ouvir teorias desligadas da vida, quando podem ouvir o maior hit das últimas
horas. Montaigne, por viver aspectos tão semelhantes no contexto histórico e nas
características de personalidade, é alguém indicado para ajudar a responder aos desafios
educativos destes jovens que “hoje tem mais pressa.”
A interatividade e a rapidez da internet realmente formatam de modo novo a vida e os
comportamentos das crianças e adolescentes de nossos dias. Por isso, é válido classificá-los
didaticamente em grupo social à parte, denominado Geração Z. Mas, vale reforçar o cuidado
com o exagero de alguns sociólogos, que a cada lançamento da Apple pretendem definir uma
nova geração. As características das gerações anteriores são mantidas (como podemos
perceber com as gerações Y e Z), mas são acrescentados cada vez mais elementos
tecnológicos ao arcabouço geracional, enfim, percebe-se mais uma evolução tecnológica que
uma verdadeira progressão geracional, as gerações, ao menos neste contexto histórico, tendo
como a mais recente a Geração Z, continuam as mesmas, o que mudam são apenas os
gadgets.

       Talvez os indicativos de Montaigne tenham mais eficácia hoje do que quando ele
escreveu-o à senhora Diana de Folx, Condessa de Gurson, há cinco séculos. E se os grandes
estudiosos de Filosofia algumas vezes excluíram Montaigne da categoria de filósofo, talvez
seu lugar seja mesmo junto a nós, nos bancos de nossas escolas, brincando no pátio, deitado
nas camas de nossos jovens, com fones nos ouvidos e sonhos na cabeça, escrevendo e falando
de si mesmo nas redes sociais e no youtube, sentado junto às cátedras dos educadores do
futuro, descortinando o mundo, desvendando soluções práticas para problemas práticos. Sua
vivacidade, espontaneidade e alegria de viver fazem que não fique ofendido com lugar tão
pequeno quanto este, mas, com certeza aceita de bom grado “a árdua tarefa de colocar-se no
nível das crianças” (p.81).
REFERÊNCIAS


ABRAVONAY, Miriam; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete. Juventudes e
sexualidade. Brasília: UNESCO Brasil, 2004.


BAKEWEEL, Sarah. Como viver: uma vida com Montaigne. Objetiva: São Paulo, 2011.


BAUMAN, Zygmund: Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Zahar: São
Paulo, 2005


______. O mal-estar na pós-modernidade. Zahar: São Paulo, 2005.


Box 1814. Projeto sonho Brasileiro. pdf. Suporte para Adobe Reader. São Paulo, 2012.
Disponível em http://pesquisa.osonhobrasileiro.com.br/indexn.php, acessado dia 11 de Junho
de 2012, 19h15min.


CARELLI, Gabriela. A Geração coisa nenhuma. In.: Veja, São Paulo, Edição 2267, n° 18,
p.104-109. Maio de 2012.


CARR, Nicholas . A Geração Superficial: o que a Internet está fazendo com os nossos
cérebros. Agir: São Paulo, 2011.


CHÁVEZ, Pascual. Estréia 2006: Dar especial atenção à família, berço da vida e do amor e
lugar primeiro de humanização. São Paulo: Editora Salesiana, 2006.


FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler: em três artigos que se completam. 23ª ed.
São Paulo: Cortez, 1989.


GIDE, André. Montaigne. In.: O Pensamento vivo de Montaigne. Livraria Martins Editora:
São Paulo, 1967. Biblioteca do Pensamento Vivo.


MACLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação com extensões do homem. Tradução
Décio Pignatari. Editora Cultrix: São Paulo, 2011.
MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. Tradução de Sérgio Milliet. Nova Cultura: São Paulo,
1972. Os Pensadores


______. The Essays. Translated by Charles Cotton. Chicago, 1984. Encyclopeaedia
Britannica Inc., vol.25


MTV Brasil. Dossiê Universo Jovem 5: Screem Generation. Abril Radiodifusão S.A: São
Paulo, 2010


SARTRE, Jean-Paul, O Existencialismo é um humanismo.in. Os Pensadores, Tradução de
Vergilio Ferreira. São Paulo: Editora Abril, 1975. p. 7-38.


SAVAL, Malina. A Vida Secreta dos Garotos: por dentro do mundo emocional dos
jovens. Prumo: São Paulo, 2009.


http://dicionario.babylon.com, acessado no dia 23 de abril de 2012, às 11h20min.


www.youtube.com/maspoxavida, acessado no dia 09 de Junho de 2012, às 16h30min.

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Montaigne símbolo e referencial para uma geração nova

  • 1. MONTAIGNE: SÍMBOLO E REFERENCIAL EDUCATIVO PARA UMA GERAÇÃO NOVA Augusto Rodrigues de Sousa1 RESUMO: O avanço das tecnologias digitais trouxe consigo o advento de uma nova geração, a dos que já nasceram na era da internet, nativos digitais, e não conheceram o mundo antes das primeiras mídias pessoais. A presença de elementos tecnológicos condiciona os comportamentos que ajudam a definir a Geração Z, letra que faz referência ao verbo “zapear”, isto é, circular entre as diversas opções de mídia disponíveis. Tudo ao mesmo tempo! Novos comportamentos e novas maneiras de se relacionar com o mundo desafiam os educadores a descobrir também novas maneiras de formar os indivíduos. Neste artigo, Montaigne é visto como o precursor dos comportamentos da Geração Z e filósofo que apresenta válidas reflexões para o processo educativo da mesma. PALAVRAS-CHAVES: Geração Z. Montaigne. Educação ABSTRACT: The advance of digital technology has brought the advent of a new generation, those who were born in the era of internet, digital natives, and did not know the world before the first personal media. The presence of technological conditions the behaviors that help define the Generation Z, the letter that refers to the verb "zapping", that is move between the various media options available. All at once! New behaviors and new ways to relate to the world challenge educators to also discover new ways to form individuals. This article presents Montaigne as the forerunner of the behaviors of Generation Z and philosopher who has valid thoughts to the educational process of the same. KEYWORDS: Z Generation. Montaigne. Education 1. INTRODUÇÃO Desde a Revolução Francesa, define-se sociologicamente os indivíduos a partir de um grupo social denominado “geração”, termo abrangente que envolve não apenas a idade dos indivíduos, mas também todo o contexto social, político, econômico, cultural e, mais recentemente, tecnológico, a que estão envolvidos: 1 Acadêmico do 3° período do curso de Licenciatura em Filosofia na Faculdade Salesiana Dom Bosco, Manaus- AM. É Salesiano de Dom Bosco, congregação religiosa que trabalha de maneira especial com a juventude, a comunicação social, a animação vocacional e o serviço missionário. Email: augustosdb@gmail.com
  • 2. “Foi só no início do século XX que as gerações viraram objeto de estudo acadêmico. O primeiro a tentar formular uma ciência das gerações foi o sociólogo alemão Karl Manhein (1893-1947)- a expressão, colada à sua acepção atual, tinha nascido no período da Revolução Francesa. Em uma série de estudos publicados nos anos 20 e 30, Manhein defendeu a idéia de que os eventos marcantes de um determinado período têm o mesmo poder de moldar a consciência de um individuo quanto a sua cultura ou classe social. Nos anos 90, o tema se polarizou depois de um estudo seminal dos historiadores Neil Howe e William Struss sobre as diferenças de comportamento das gerações no trabalho e no consumo” (CARELLI, 2012, p.104) Este conceito permaneceu escondido sob grossas camadas de poeira acadêmica por muito tempo, até que foi resgatado pela sociologia e pelas novas “ciências”, como a publicidade, que precisava traçar um perfil dos novos consumidores do mercado pseudo- reestruturador do pós-guerra. Eles perceberam que durante e nos primeiros anos após a Segunda Guerra Mundial, o mundo recebeu mais que a explosão de uma bomba atômica: recebeu uma enorme e contagiante explosão juvenil. Decepcionados com o caos gerado pelo mundo adulto e racionalizado (fruto da Modernidade), os Baby Boomers, os jovens dos anos pós-guerra, “saíram por aí” proclamando um tempo de paz, liberdade, amor livre e rompimento dos padrões até então apregoados. Seus filhos formam a Geração X, ou Geração Coca-Cola, nascidos a partir de meados dos anos 60, não conheceram o mundo destruído pela guerra, mas continuaram a luta por grandes ideais. Marca desta geração é também o nascimento da internet, inventada por Tim Berners Lee, e também o aparecimento dos primeiros gadgets2. A Geração Y (dos nascidos nos anos 80 e início dos anos 90), também chamada de Globals ou Milleniuns, recebeu das gerações precedentes um mundo mais estável e acompanhou o desenvolvimento e emancipação da internet e dos gadgets. A infância passou a ser mais valorizada neste período e o mundo começou a ganhar mais confiança e estabilidade. Por fim, vimos surgir, junto com as grandes descobertas da tecnologia e a possibilidade de um novo mundo (o digital), a Geração Z. 2 Gadget é uma gíria tecnológica que se refere a um equipamento que tem um propósito e uma função específica, prática e útil no cotidiano. São comumente chamados de gadgets dispositivos eletrônicos portáteis como celulares, smartphones, tocadores mp3, entre outros. Na Internet ou mesmo dentro de algum sistema computacional chama-se de gadget pequenos softwaresr agregados a um ambiente maior.
  • 3. Nascida a partir de meados dos anos 903, esta geração não conheceu o mundo antes do avanço da tecnologia, por isso gira (zapeia) com facilidade entre as mais diversas mídias digitais. As pessoas da Geração Z possuem muitas características similares às gerações anteriores, chega- se a dizer, que se parecem mais com a Geração Y que os próprios jovens da Geração Y. Seu comportamento também é moldado pela tecnologia: acostumados à velocidade e constantemente bombardeados por informações, naturalmente curiosos e ansiosos, possuem um alto poder de compra e gosto exacerbado pelas novidades, eles são os nativos digitais. O surgimento desta última geração é talvez a mais desafiadora para os educadores, pertencentes às gerações precedentes. Cinco séculos antes de todo este processo histórico, o filósofo, comerciante e político, Michel de Montaigne vivia um processo semelhante de descobertas de um “novo mundo” e de revoluções intensas na ordem estabelecida, por isso também ele apresentava uma série de características comportamentais similares ao comportamento da Geração Z atual, entre eles o gosto pela informação, o pensamento multifocal, a vivência de uma liberdade profunda no agir e no escrever, o caráter cosmopolita, o falar de si mesmo e a experiência da solidão. Por isso nos aventuramos a oferecer este filósofo como parente distante, precursor remoto, destes novos indivíduos, que a partir destes anos começam a conquistar o mundo com sua entrada no mercado de trabalho.4 Em alguns de seus Ensaios, Montaigne, ao tratar da “Educação dos crianças” ou do “Afeto aos filhos” apresenta indicativos pontuais e válidos ainda hoje para os educadores que atualmente compõem o corpo discente de nossas escolas. Com a pesquisa e análise do fenômeno comportamental da Geração Z, vistos à luz do Ensaio “Da educação das crianças”, esperamos oferecer uma reflexão agradável (o que combina muito bem com Montaigne) da filosofia ao processo de educação, ensino e aprendizagem desta nova geração. Prefiro apresentar um retrato da Geração Z antes de apresentarmos o autor trabalhado. Tive que sacrificar um pouco da metodologia para uma melhor compreensão didática desta apresentação. Montaigne, o filósofo sem método, nos permite isso! 3 A discussão geracional envolve seriamente a questão do “inicio” ou “nascimento” das gerações apresentadas. Alguns pesquisadores situam a Geração Y até o ano 2000, e, por conseguinte, a Geração Z a partir de 2001, de modo especial seguindo o lifestyle americano, completamente modificado a partir do atentado de 11 de setembro. Preferi seguir os dados da empresa Box1824, que situa a Geração Z a partir de meados dos anos 90. 4 De fato, se a Geração X corresponde aos nascidos nos meados dos anos 90, a partir do ano de 2012 eles começam a se aventurar no nosso mercado de trabalho, trazendo para o campo profissional todas as exigências de seu perfil geracional.
  • 4. Após apresentar a o perfil e a figura de Montaigne, relacionamos as possíveis contribuições que ele pode oferecer para o processo educativo das novas gerações. 2. “NOSSO JOVEM TEM MAIS PRESSA” 5: O PERFIL DA GERAÇÃO Z6 Determinar características de qualquer grupo social é uma tarefa muito complexa, pois carrega o risco de generalizações, que são generalizadamente traiçoeiras. “Por diversas vezes encontramos estudiosos totalmente contrários a este tipo de classificações, para seres humanos complexos e naturalmente contraditórios” (CARELLI, 2008, p.104). Concordo com os pesquisadores do Dossiê Universo Jovem da MTV, que declaram: “Enquadrar toda uma geração dentro de um mesmo rótulo é válido, mas é mais adequado para estudos de grupos homogêneos em termos de renda, escolaridade e poder de consumo. E esse não é o caso no Brasil, que, mesmo com o crescimento econômico, ainda tem diferenças sociais importantes.” (MTV Brasil, 2010) Soma-se a isso o fato de que, possivelmente, indivíduos nascidos dentro do período histórico marcado por uma geração, pertençam a outro grupo geracional, ou mesmo possuam comportamentos de outro grupo. Ainda assim, apresento aqui algumas características gerais da chamada Geração Z, relacionando-as com elementos presentes no texto de Montaigne. No ensaio “Da educação das crianças”, Montaigne, enquanto apresenta os indicativos para uma educação frutuosa, deixa entrever uma série de comportamentos pessoais e das gerações mais jovens de seu período histórico. A partir destes indícios, podemos apresentar as características relevantes da Geração Z, comparando-as também com o ensaio mencionado. Iniciemos com a citação já apresentada como título deste capítulo. Se na época de Montaigne, há quinhentos anos, se podia dizer que os jovens tinham mais pressa, o que se poderá dizer dos jovens de nosso contexto atual? Como já foi dito, nascidos da era da internet, estes jovens determinam suas vidas e seu comportamento pela rapidez e fluidez de um software. “Os jovens são imediatistas, hedonistas, sem percepção do tempo. Eles não conseguem esperar. Demorou, já era.” (MTV Brasil, 2010) 5 Sempre que tratarmos de uma citação direta a Montaigne, nos referimos à Obra “Ensaios”, da coleção “Os Pensadores”, 1972. Nesta citação cf. Montaigne, 1972, p. 87. 6 Muitos dos elementos apresentados aqui sobre a Geração Z encontram embasamento nas obras de Zygmund Bauman, de forma especial o texto Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. E no Dossiê Universo Jovem 5: Screem Generation, produzido pela MTV Brasil no ano de 2010.
  • 5. A grande quantidade de informações disponíveis torna-os culturalmente curiosos e seletivos, ao mesmo tempo em que gera uma das maiores ondas de ansiedade crônica já relatadas na história. Desde a Geração Y, a imagem é mais significativa do que a palavra escrita, por isso é fator determinante nos gostos e no aprendizado. Constantemente conectados, os jovens cumprem a profecia de McLuhan, fazendo dos gadgets extensões do próprio corpo (MCLUHAN, 2011. p.17), e a partir deles os jovens podem viver o sonho de uma verdadeira “pantopia”, ou seja, estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Fáceis para iniciar relacionamentos, correm sério risco de cair na superficialidade e na frustração de relações pessoais que seguem o ritmo das relações virtuais, rápidas e descartáveis. Percebe-se um aumento no índice de stress nestas crianças e adolescentes e que a maioria de seus problemas pessoais gira em torno principalmente de sua reputação nas redes sociais. Os adolescentes da Geração Z têm forte dificuldade no relacionamento interpessoal e na comunicação verbal, percebida principalmente por pesquisas que demonstram que, de dez jovens entrevistados, dez apresentam a experiência da solidão (SAVAL, 2009, p. 279). Ainda assim é uma geração que produz conteúdos, e não recebe apenas dos meios de comunicação formais. Ao mapear os conteúdos produzidos por esta geração, observamos que comunicam especialmente sobre si mesmos através dos blogs e redes sociais (no Twitter7, a maioria dos tweet's trata exclusivamente da própria vida, dos afazeres e os gostos pessoais). Percebe-se nisso uma forte necessidade de ser visto, em um tempo em que ser “curtido” no Facebook8 e visto por milhares de pessoas no Youtube9, é muito fácil e confere status. Esta fluidez das informações e relacionamentos levaram os estudiosos a classificar está geração: zapping. Ainda que se perceba uma profunda e perigosa superficialidade, a Geração Z dá grande valor à honestidade: informações e relacionamentos enganosos não são válidos. Esta é uma geração que dá grande valor à honestidade/sinceridade, à relações éticas seja entre as pessoas como no ambiente empresarial. Competência é outro elemento chave em um mundo disperso pelo excesso de informações, não se percebe nesta geração um retorno ao ideal 7 Twitter: rede social e servidor para microblogging que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos (em textos de até 140 caracteres, conhecidos como “tweets”). (Glossário Dossiê Jovem. MTV, 2010) 8 Facebook: rede social que reúne pessoas a seus amigos. (Idem, 2010) 9 YouTube: Site que permite que seus usuários carreguem e compartilhem vídeos em formato digital. (Idem, 2010)
  • 6. filosófico antigo do homem filósofo, cientista, artista, matemático, mesmo que esta geração esteja bombardeada por todos estes conteúdos, a norma agora é a especialização e a competência em uma área específica do conhecimento. Traço característico de todas as gerações nascidas após a guerra é a percepção de que a vida deve ser vívida intensamente, e que para isso é preciso dar um sentido a própria vida. Esta percepção pode ser percebida em diversas áreas do conhecimento pós-guerra, tanto no Existencialismo de Sartre, que afirma que “a vida não tem nenhum sentido a não o sentido que nós damos a ela”, seja na psicologia de Victor Frankl, que com sua logoterapia defende que a frustração nasce de uma vida que não possui um projeto. Viver intensamente, ter experiências profundas passou a ser o anseio das novas gerações desde que a guerra minou o otimismo do mundo diante da vida e da racionalidade, agora não existem mais receitas prontas. Um termômetro curioso é que boa parte dos perfis no facebook dos jovens que pesquisei apresentavam títulos para seus álbuns como “a gente leva da vida a vida que a gente leva”, um sinal de que as novas gerações pretendem mesmo construir e “curtir” a própria vida. 2.1 “CENTENAS DE ESTUDANTES CONTRAEM DOENÇAS VENÉREAS ANTES DE CHEGAREM A APRENDER O QUE ARISTÓTELES DIZ DA TEMPERANÇA” 10: ÀS VOLTAS COM A SEXUALIDADE Percebemos no título desta sessão alguns traços de exagero, próprios da maneira coloquial com que Montaigne escreve seus ensaios. Mas, desta forma, ele nos apresenta pistas relevantes para entender a vivência afetiva dos jovens de seu tempo. A partir das conquistas das outras gerações e do fenômeno da velocidade relacional já relatado, percebe-se também na Geração Z um forte apelo afetivo-sexual, próprio de sua idade (a adolescência) e dos estímulos com que as fontes de informação bombardeiam em seus cérebros em formação. Cada vez mais, as imagens presentes nos vídeos e propagandas carregam evidentes apelos sexuais. Segundo dados da UNESCO (2004), no Brasil, as atividades de iniciação sexual começam entre os 10 e 15 anos de idade, compreendendo um período que envolve desde as idealizações até as iniciações de fato. Percebe-se ainda, como marca de toda a cultura juvenil atual um acentuado culto ao corpo, manifestado seja como ditadura da beleza, promotor de alienação, seja como busca por uma vida saudável, já presente em outras gerações, e estudado como fruto perene do estilo de vida pós-moderno. É uma geração mais integrada afetivamente, mas, ainda assim, muito propensa a quadros 10 Montaigne, 1972, p.87.
  • 7. depressivos. Marca emblemática dos últimos tempos é o “ficar”, elemento fortemente hedonista, que varia de um beijo mais acalorado durante uma “balada”, ao ato sexual em si, ou mesmo um “namoro” de curta duração, como um mês, ou alguns dias. A única coisa que se pode afirmar do “ficar” é o fato de ser um relacionamento rápido, e que, segundo os próprios adolescentes, não envolve sentimentos profundos, mas apenas desejo, ou atração física momentânea. Elemento positivo do processo afetivo é a dimensão da amizade. Ao mesmo tempo delineiam-se novas formas de associacionismo na busca virtual de pares, um processo que surgiu com os primários “grupos de clientes” dos antigos e-mails, passando pelas comunidades do Orkut, até evoluir para as fanpages da “onda do momento, o Facebook”, e à interatividade seletiva da Web 3.011. “Os amigos são formadores de opinião muito relevantes (se não forem os mais relevantes).” (MTV, 2010) Ainda que tenham grandes dificuldades no relacionamento interpessoal, as crianças, adolescentes e jovens da Geração Z emocionam-se facilmente, choram com facilidade (algumas vezes beiram a histeria), ligam-se facilmente com pessoas de gostos similares, mas ao mesmo tempo desligam-se delas por qualquer motivo. Último elemento que pretendo destacar nesta dimensão é a relação com a autoridade. Esta nova geração sente muitas dificuldades com as instituições formais de autoridade. Ao mesmo tempo, há uma natural necessidade de “‟ídolos testemunhas”, pessoas que sirvam como referenciais, modelos para a vida futura. Dentre estas pessoas destacam-se as que de alguma forma lutam pela paz, pela preservação ambiental ou que apresentem uma forte experiência de superação pessoal. Experiência, por sinal, é a palavra de ordem desta geração, que não se prende tanto a teorias ou conceitos, mas prontamente deixa de lado seus fones de ouvido, celulares, iphones e demais gadgets, por uma boa história de vida ou por uma forte experiência pessoal. 2.2 “ESTE MUNDO TÃO GRANDE (...) QUERO QUE SEJA ESTE O LIVRO DE NOSSO ALUNO”12. COSMOPOLITAS E GREGÁRIOS. 11 Web 3.0 é um mais conceito do campo da informática. Na verdade muitos estudiosos não acreditam que a internet tenha realmente chegado a esta versão (uma espécie de evolução). Característica fundamental do Web 3.0 é a seleção automática que próprios softwares fazem dos gostos e preferências do usuário. 12 Montaigne, 1972, p.84.
  • 8. Montaigne era um homem naturalmente dado ao conhecimento de outras culturas e acreditava que este era um elemento determinante para uma boa educação das crianças e adolescentes. Vivendo imersa na era da globalização, com a velocidade dos contatos com pessoas do mundo inteiro, a Geração Z parece mesmo não conhecer fronteiras, claro que isto, mais virtualmente que fisicamente. As modas e estilos rapidamente ganham o mundo. As músicas, ritmos, artistas, unem jovens do mundo inteiro, ao mesmo tempo em que esses gostos demarcam uma identidade grupal que delimita novas fronteiras, não mais as nacionais, determinadas pelo Estado, mas pelos gostos pessoais e pelo acesso ou não às fontes de informação. Desligados das estruturas institucionais de política e religião, percebe-se nesta geração a revisão de antigos valores, entre eles a busca pelo Sagrado na vida e por causas globais, difundidas pelas mídias, como causas ambientais, a luta pela justiça e paz e a Responsabilidade Social. Segundo a pesquisa “O Sonho Brasileiro”, organizada pela organização Box1824 (2012), os jovens de hoje, assim como os das gerações anteriores continuam se preocupando com grandes causas e assuntos globais, mas os modelos de luta e resistência de ontem não são mais válidos para a estrutura comportamental atual. Hoje não se exige mais que a individualidade seja sublimada num sacrifício pela coletividade, mas a partir da exposição das individualidades (pensemos novamente nas redes sociais) os indivíduos se conectam em busca de causas em comum. O jovem é visto como jovem-ponte, catalisador de iniciativas e gerador de micro-revoluções. Passeatas e luta com a polícia são elementos que não surtem mais efeito diante das novas gerações, eles acreditam que as grandes mudanças (macro-revolução) começam por pequenas e pontuais ações, marcadas, é claro pela fluidez de sua geração. Segundo a mesma pesquisa, 8% dos jovens brasileiros realizam serviços diversos pela promoção humana, luta pela justiça e paz e pelo meio ambiente, pode parecer pouco, mas representa um número de 2 milhões de brasileiros empenhados em micro-revoluções. Existem ainda outras características relevantes da Geração Z, mas acredito que as que apresentamos sejam suficientes para a análise que pretendemos fazer. 3. “SOU EU MESMO A MATÉRIA DESTE LIVRO”13 E “ DE BOM GRADO TENHO IMITADO A MANEIRA EXCÊNTRICA DE SE TRAJAREM OS JOVENS DE HOJE”14: ASPECTOS DA VIDA E OBRA DE MICHEL DE MONTAIGNE 13 Montaigne, 1972, p.11.
  • 9. Nos Ensaios, Montaigne dedica-se a apresentar suas reflexões e opiniões (não apresenta certezas, por isso muitas vezes é interpretado como cético) acerca dos mais diversos temas de seu contexto histórico, social e político. Mas, acima de tudo, fala a partir de sua própria experiência e fala principalmente de si mesmo. De fato chega a declarar que nenhum conhecimento é mais útil que o conhecimento de si mesmo e que em cada pessoa pode-se entrever o universo inteiro. Para Montaigne, como para Sócrates, para se alcançar o conhecimento pleno, o primeiro passo é conhecer a si mesmo. Podemos perceber nas características pessoais de Montaigne muitas aproximações com o perfil da Geração Z15 e por isso, seus indicativos educativos me parecem válidos na construção formativa de nossos novos indivíduos, já que ele mesmo pode ser considerado uma antecipação de cinco séculos do modelo de vida desta geração. A primeira destas características está no fato de que, tanto Montaigne, quanto a Geração Z, nasceram em contextos históricos marcados por descobertas que geraram uma verdadeira revolução (novidade) dos modos de pensar e agir da sociedade como um todo. A descoberta do “novo mundo” no século XVI foi revivida e atualizada com a descoberta de um “mundo digital”, dois elementos que formaram as bases para uma nova relação do homem com um mundo, uma nova geração. Assim como Montaigne, os nativos digitais são os primeiros comentadores de si mesmos. Hoje, possivelmente “Os Ensaios” seriam publicados em uma página pessoal em um blog ou facebook, bem como as citações célebres que Montaigne mandou entalhar nos umbrais de seu castelo e enxertou em seus Ensaios, hoje figurariam os tweet’s de um webstar.16 De fato, é possível perceber forte semelhança no estilo de comunicação de Montaigne e webstars influentes nas mídias juvenis atuais, entre os quais destaco o paulista PC Siqueira, que em seus vídeos fala a partir de suas próprias experiências e convicções de assuntos que vão, do mais novo game do mercado, até temas pautados em política, ética e filosofia.17 Filho legítimo do século XVI (1533-1592), Montaigne acompanhou como bom observador os grandes eventos históricos que marcam o nascimento da modernidade: as 14 Idem, p.91 15 Estas semelhanças serão apresentadas em itálico 16 Webstar é uma personalidade da mídia digital. Vlogueiros (vídeo) e blogueiros (textos e imagens) entram neste aspecto. 17 Para ter contato com os vídeos de PC Siqueira seu canal no youtube pode ser acessado pelo link: www.youtube.com/maspoxavida
  • 10. guerras religiosas no início do cisma protestante, a descoberta do novo mundo, que desafia os homens a descobrir também novas maneiras de pensar o mundo e o próprio ser humano. Filho de burgueses enobrecidos, desde cedo foi educado dentro dos padrões da cultura clássica e leitor ardoroso da filosofia antiga. André Gide selecionou elementos presentes em vários ensaios que nos dão uma boa amostra das características físicas e de personalidade de nosso autor: “De estatura um pouco pequena, tem o rosto cheio sem ser gordo. Usa a barba toda, segundo a moda da época, mas não muito longa. Todos os sentidos são nele „inteiros‟, quase perfeitos. Embora tenha abusado, licenciosamente, de uma saúde robusta, esta se mantém garbosa, apenas de leve alterada pela pedra aos 47 anos. Seu andar é firme; seus gestos arrebatados; sua voz alta e sonora. Fala de bom grado, sempre com veemência, agitando-se muito. Come de tudo e com tal voracidade que lhe ocorre de morder os dedos, pois nessa época ainda não se usavam garfos. Monta a cavalo seguidamente e mesmo na velhice, as mais longas cavalgadas não o fatigam. Dormir, diz-nos, ocupa grande parte de sua vida. (GIDE, 1985) Esta descrição não é muito diferente do que se possa dizer de um adolescente de nossos dias: comer de tudo e com rapidez (a era da velocidade), cuidado com a saúde, o falar sem medo de expor as próprias convicções, e curiosamente, até mesmo o fato de que dormir ocupa boa parte de suas vidas. Moderado por natureza e esforço, perseguiu sempre a virtude aristotélica, buscando em tudo o saudável meio termo, seja na política, na vivência religiosa como nas convicções pessoais. Declaradamente católico, parece nunca ter se prendido à instituição eclesial, ao mesmo tempo em que nunca procurou contrariá-la. Desejoso de conhecer o mundo, seus ensaios apresentam um homem aberto às culturas e costumes diversos. Percebe-se nele um forte traço cosmopolita. Sua vida solitária foi marcada pela presença de uma amizade profunda com Étienne de La Boétie e Marie de Gournay, a quem chama de “filha por afinidade”. Competente que era na administração no comércio, travou também muitas relações com pessoas da alta sociedade francesa e européia de seu tempo. Após a morte de seu amigo Étienne, dito por ele como “o maior homem do século”, Montaigne entra no seu “retiro”, mas sua solidão é
  • 11. rodeada pela presença das citações de “homens modelo”, sábios e inspiradores, através de suas citações gravadas nos umbrais e no teto de seu castelo. Este retiro é também o tempo de uma solidão criativa, pois, tal como um adolescente com seu blog, foi no silêncio de seu quarto que Montaigne escreveu os três volumes de seus Ensaios. Percebe-se certas dificuldades no relacionamento com a esposa e frieza ao tratar da morte de suas cinco primeiras filhas. Um elemento que em nada se parece com as gerações atuais em Montaigne, é a maneira como fala das mulheres (fruto de sua época, claro), quase sempre de maneira pouco elogiosa. Mesmo com estes aspectos, podemos entrever uma propensão muito forte à solidariedade: “Dedico-me de bom grado aos pequenos” (Livro III, cap.13). Outro aspecto relevante da obra dos Ensaios é a grande insistência no “Bem Morrer”. Nossa sociedade pós-moderna talvez não se identifique tanto com este elemento que em Montaigne é tão importante. De fato, nos dias de hoje, ou se foge deste tema, ou tratamos a morte com tanta frieza quanto Montaigne diante da morte de suas cinco filhas, mas pensar na própria morte não é prioridade para nossa sociedade, muito menos para a Geração Z. Percebe- se ainda, que Montaigne possuía e transmitia em seus ensaios um grande gosto pela vida, que deve ser vivida intensamente, mais uma similaridade notória. Os Ensaios, por fim, são um exercício contínuo da razão e neles podemos perceber, através das inúmeras correções e acréscimos, a progressão do pensamento de um homem todo entregue à arte de refletir, enfim, à filosofia em sua faceta mais imaculada. Para uma geração carente de fortes experiências, com forte desejo de se comunicar, produzir conteúdo, apresentar convicções e necessitada de pessoas que lhe sirvam como modelo prático; acredito que Montaigne é uma das pessoas mais indicadas para ser apresentada aos adolescentes e seus educadores, como companheiro na viagem do processo formativo integral dos indivíduos. 4. “EIS AS MINHAS LIÇÕES”18: ELEMENTOS PEDAGÓGICOS PRESENTES NOS ENSAIOS Trataremos, por fim, dos elementos pedagógicos presentes em Montaigne e que são válidos para o repensamento do processo educativo das novas gerações. 18 Montaigne, 1972, p.89.
  • 12. Defini que, com sua vida pessoal e sua estrutura filosófica (o método de não ter um método), Montaigne se aproxima bastante do modelo de vida e pensamento das pessoas da Geração Z, por isso pode ser apresentado como produtor válido de conceitos educativos que atinjam as expectativas profundas seja dos alunos Z como de seus educadores. O ensaio que melhor apresenta as convicções pedagógicas de Montaigne é o “Da educação das crianças”, deste ensaio retiraremos, como já fizemos anteriormente, os elementos mais relevantes para a educação da Geração Z: - para jovens naturalmente curiosos, imersos em um mundo bombardeado por informações, Montaigne oferece em primeiro lugar a importância de uma guia estável. O papel do professor hoje é mais importante do que em todos os tempos (mesmos que certos modelos educativos modernos difundam o contrário). Em um tempo que sofre uma verdadeira crise de referenciais, a Geração Z, anseia por pessoas-modelo que lhes ofereçam respostas concretas para os desafios de sua existência; - para jovens ansiosos por pessoas que os ajudem a desenvolver valores minados pelo imediatismo e o niilismo, Montaigne nos diz que este guia, “deve ter a cabeça mais bem formada do que bem cheia, e ainda que se exigissem as duas coisas, tivesse melhores costumes que ciência” (p.81); - para jovens integrados e conscientes de suas convicções, Montaigne oferece uma proposta de educação integral do ser humano, “para se enriquecer e adornar por dentro, para um rapaz que desejaríamos mais honesto que sábio” (p.81). Montaigne, há cinco séculos, já estava consciente de que “não é uma alma somente que se educa, nem um corpo, é um homem. Cabe não separar as duas parcelas do todo” (p.88). Por isso, o educador deve conduzir os jovens tantos nos conhecimentos intelectuais quanto nas artes marciais, no esporte e no trabalho; - para jovens imersos em uma cultura de massa, que mina as identidades pessoais construindo cidadãos-rótulo, cidadãos-consumidores, oferece uma proposta de educação personalizada e adequada aos níveis de aprendizagem do indivíduo. Demonstrando que as crianças dificilmente conseguiriam aproveitar-se proveitosamente do ensino, se os professores “encarregados de instruir espíritos naturalmente diferentes uns dos outros pela inteligência e pelo temperamento, a todos ministram igual lição e disciplina” (p.81); - para jovens desacreditados das instituições formais e burocráticas, oferece a possibilidade de construir juntos o caminho de ensino-aprendizagem, insistindo no diálogo e
  • 13. na livre expressão das idéias. “Tudo se submeterá ao exame da criança e nada se lhe enfiará na cabeça por simples autoridade e crédito” (p.81); - para jovens desejosos de viver as próprias experiências, mais uma vez oferece o educador como guia verdadeiro pedagogo, que acompanha, mas não tolhe o educando de construir seu próprio conhecimento do mundo. Professores de seu tempo e dos nossos: “Não cessam de nos gritar aos ouvidos, como que por meio de um funil, o que nos querem ensinar, e o nosso trabalho consiste em repetir. Gostaria que ele corrigisse esse erro, e desde logo, segundo a inteligência da criança, começar a indicar-lhe o caminho, fazendo-lhe provar as coisas, e as escolher e discernir por si próprios, indicando- lhe por vezes o caminho certo ou lho permitindo de escolher” (MONTAIGNE, 1972, p. 81) Ainda para atender a esta necessidade de experiências concretas e profundas, Montaigne oferece a justa medida entre teoria e prática, reforçando que “uma ciência puramente livresca é inútil” e torna a criança “servil e tímida” (p.82). Insiste ainda que “o mundo é o livro de onde as crianças irão aprender”, considerando que “para exercitar nossa inteligência tudo que se oferece aos olhos serve de livro: a malícia de uma pajem, a estupidez de um criado, uma conversa à mesa” (p.82), raciocínio que séculos depois Paulo Freire vem reforçar com a idéia de que a leitura do mundo precede a leitura da escrita (cf. FREIRE, Paulo. 1989. p. 09); - para jovens comunicadores e que sabem produzir os próprios conteúdos oferece a participação coletiva na produção do saber: “Não quero que fale (o professor) sozinho e sim que deixe também o discípulo falar por seu turno” (p.81) E mais ainda, “(...) os elementos tirados de outrem devem fazer-lhe obra própria, isto é, para forjar sua inteligência” (p.82); - para jovens desejosos de um agir ético consistente, pautado pela responsabilidade social e o cuidado do meio-ambiente, Montaigne insiste que a educação deve passar pela vivência real e concreta dos “bons costumes” por parte dos professores: “criando no discípulo um amor pela virtude”; formando um cidadão que “serve ao seu príncipe com lealdade (...) mas prendendo-se a ele apenas pelo dever cívico” (p.83); incutindo normas sérias de boa conduta e boa educação, trabalhando inclusive o aspecto comum aos adolescentes de todas as épocas de achar-se “o dono do mundo”; “cuidando para corrigir-se a si próprio que aos outros”; fazendo que o aprendizado ético seja mais importante que a simples ciência
  • 14. informativa, “para que se lembre menos o lugar em que morreu Marcelo e mais o fato de que este morreu por descumprir seu dever!” (p.84). Ainda neste ponto insiste que não deve haver nenhum tipo de castigo, mas sim que se ensine “a acostumar o aluno a tudo, ao calor e o frio, à fome e a qualquer incomodo” (p.88); por fim, Montaigne pretende que a conduta do educando “se acomode aos usos e costumes e que possa fazer todas as coisas, mas só goste de fazer as boas”, salientando desta maneira o caráter da escolha livre e decidida que o jovem deve fazer pelo bem; - para jovens que dão grande valor à honestidade, convida aos educadores que os ensinem “sobretudo a ceder e sustar a discussão ante a verdade, surja ela dos argumentos do adversário ou da própria reflexão (...) Ensinar-lhe-ão a compreender que confessar o erro em seu raciocínio, inda que ninguém o perceba, é prova de discernimento e sinceridade, qualidades principais a que se deve aspirar” (p.83); - para jovens cosmopolitas, oferece a importância do contato com outras culturas e outras línguas, formando assim um indivíduo maleável às mais diversas intempéries da vida, e compreensivo com a realidade de outras pessoas. Esta talvez seja a melhor resposta diante dos atuais fenômenos de preconceito e violência escolar diante do diferente; - para jovens de uma geração em que a imagem vale mais que as palavras: oferece uma metáfora plástica, mas que expressa mimeticamente como na instituição escolar deve-se oferecer essencialmente o amor pela sabedoria. Montaigne declara que, “é preferível pintar, nas paredes, belos florais e motivos da natureza” (p.88), para incutir nos estudantes a beleza da descoberta do que já está diante de nossos olhos no mundo; - para os jovens “que hoje tem mais pressa”, oferece um modelo de aprendizagem que comece desde os primeiros anos de vida e siga até aos 16 anos, quando todos os conhecimentos adquiridos poderão ser postos em prática. De fato, muitos países fazem com que o Ensino Médio seja um período de exercício prático, nas mais diversas áreas do conhecimento escolhidas pelo próprio aluno. Os resultados apresentam-se bem mais efetivos que o do sistema tradicional de ensino; - para jovens reflexivos e críticos, com acesso direto a fontes sérias de informação e cada vez mais tornando-se produtores-difusores do próprio conhecimento, Montaigne oferece o indicativo e o exemplo pessoal de que antes de qualquer outra coisa deve-se aprender a pensar filosoficamente, visto que a filosofia abre as portas para o mundo de conhecimentos que o ser humano pode se aventurar. O Brasil nos últimos anos vem se avançando neste
  • 15. aspecto em passos lentos, mas decididos. A leitura, principalmente dos clássicos, contribui para que o jovem crie as próprias convicções, profundas e éticas, e estas convicções sejam refletidas na prática cotidiana; - por fim, para jovens que amam a vida e têm profundo desejo de viver intensamente, Montaigne demonstra que nossas inclinações humanas nos fazem pender justamente para este fim, mas que a educação deve ajudar o jovem a “usar bem destes dons (a vida, a beleza, a glória, a saúde), sabendo-os utilizar com moderação e perdê-los sem fraquejar, se for preciso” (p.86) O único aspecto que a mentalidade educacional moderna se afasta do pensamento de Montaigne se refere a ideal do filósofo de que um ensino de qualidade, de preparação total para a vida, deva ser ministrado longe da assistência dos pais. Hoje, bem mais que no século XVI, percebe-se a necessidade cada vez maior de uma integração positiva entre a família e a educação escolar. Aliás, podemos afirmar ainda, que as próprias estruturas de educação institucional devem favorecer a preservação da família, tão ameaçada nos tempos atuais, como base de educação e humanização primeira da pessoa. (CHÁVEZ, 2006. p. 6) Existem outros aspectos também relevantes no modo como Montaigne entende a educação, mas acredito que seja de melhor proveito ficar apenas com alguns pontos fundamentais que possibilitem não só o conhecimento destes indicativos, mas a realização dos mesmos. Tanto no agir educativo dos educadores quanto na praticidade da vida dos jovens. Quanto à execução destes preceitos deixemos que Montaigne fale por si mesmo: “Eis minhas lições, aproveita-as melhor quem as pratica do que quem as sabe (...) o jovem as traduzirá em ações, e as aplicará aos atos da vida” (p.89). CONSIDERAÇÕES As novas gerações estão ansiosas por pessoas-modelo capazes de saciar sua enorme sede de vida e de experiências profundas. Muitas vezes os educadores não sabem o que fazer para sair de um modelo pedagógico conteudista para um modelo de formação integral dos jovens dispersos e “cheios de si”, a que Montaigne em seu ensaio chama “donos do mundo”. Seus ouvidos acostumados aos fones, conectados aos mp3 players e nos Ipods, não conseguem ouvir teorias desligadas da vida, quando podem ouvir o maior hit das últimas horas. Montaigne, por viver aspectos tão semelhantes no contexto histórico e nas características de personalidade, é alguém indicado para ajudar a responder aos desafios educativos destes jovens que “hoje tem mais pressa.”
  • 16. A interatividade e a rapidez da internet realmente formatam de modo novo a vida e os comportamentos das crianças e adolescentes de nossos dias. Por isso, é válido classificá-los didaticamente em grupo social à parte, denominado Geração Z. Mas, vale reforçar o cuidado com o exagero de alguns sociólogos, que a cada lançamento da Apple pretendem definir uma nova geração. As características das gerações anteriores são mantidas (como podemos perceber com as gerações Y e Z), mas são acrescentados cada vez mais elementos tecnológicos ao arcabouço geracional, enfim, percebe-se mais uma evolução tecnológica que uma verdadeira progressão geracional, as gerações, ao menos neste contexto histórico, tendo como a mais recente a Geração Z, continuam as mesmas, o que mudam são apenas os gadgets. Talvez os indicativos de Montaigne tenham mais eficácia hoje do que quando ele escreveu-o à senhora Diana de Folx, Condessa de Gurson, há cinco séculos. E se os grandes estudiosos de Filosofia algumas vezes excluíram Montaigne da categoria de filósofo, talvez seu lugar seja mesmo junto a nós, nos bancos de nossas escolas, brincando no pátio, deitado nas camas de nossos jovens, com fones nos ouvidos e sonhos na cabeça, escrevendo e falando de si mesmo nas redes sociais e no youtube, sentado junto às cátedras dos educadores do futuro, descortinando o mundo, desvendando soluções práticas para problemas práticos. Sua vivacidade, espontaneidade e alegria de viver fazem que não fique ofendido com lugar tão pequeno quanto este, mas, com certeza aceita de bom grado “a árdua tarefa de colocar-se no nível das crianças” (p.81).
  • 17. REFERÊNCIAS ABRAVONAY, Miriam; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete. Juventudes e sexualidade. Brasília: UNESCO Brasil, 2004. BAKEWEEL, Sarah. Como viver: uma vida com Montaigne. Objetiva: São Paulo, 2011. BAUMAN, Zygmund: Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Zahar: São Paulo, 2005 ______. O mal-estar na pós-modernidade. Zahar: São Paulo, 2005. Box 1814. Projeto sonho Brasileiro. pdf. Suporte para Adobe Reader. São Paulo, 2012. Disponível em http://pesquisa.osonhobrasileiro.com.br/indexn.php, acessado dia 11 de Junho de 2012, 19h15min. CARELLI, Gabriela. A Geração coisa nenhuma. In.: Veja, São Paulo, Edição 2267, n° 18, p.104-109. Maio de 2012. CARR, Nicholas . A Geração Superficial: o que a Internet está fazendo com os nossos cérebros. Agir: São Paulo, 2011. CHÁVEZ, Pascual. Estréia 2006: Dar especial atenção à família, berço da vida e do amor e lugar primeiro de humanização. São Paulo: Editora Salesiana, 2006. FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler: em três artigos que se completam. 23ª ed. São Paulo: Cortez, 1989. GIDE, André. Montaigne. In.: O Pensamento vivo de Montaigne. Livraria Martins Editora: São Paulo, 1967. Biblioteca do Pensamento Vivo. MACLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação com extensões do homem. Tradução Décio Pignatari. Editora Cultrix: São Paulo, 2011.
  • 18. MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. Tradução de Sérgio Milliet. Nova Cultura: São Paulo, 1972. Os Pensadores ______. The Essays. Translated by Charles Cotton. Chicago, 1984. Encyclopeaedia Britannica Inc., vol.25 MTV Brasil. Dossiê Universo Jovem 5: Screem Generation. Abril Radiodifusão S.A: São Paulo, 2010 SARTRE, Jean-Paul, O Existencialismo é um humanismo.in. Os Pensadores, Tradução de Vergilio Ferreira. São Paulo: Editora Abril, 1975. p. 7-38. SAVAL, Malina. A Vida Secreta dos Garotos: por dentro do mundo emocional dos jovens. Prumo: São Paulo, 2009. http://dicionario.babylon.com, acessado no dia 23 de abril de 2012, às 11h20min. www.youtube.com/maspoxavida, acessado no dia 09 de Junho de 2012, às 16h30min.