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MAGINAÇÃ
daNa CASA
Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola
I O
32
MAGINAÇÃ
daNa CASA
Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola
I O
FIG. 01
54
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Trabalho de conclusão de curso por
Na cASA da Imaginação
Thalessa Maia Germanovix
Orientadora
Vanessa Goulart Dorneles
Florianópolis
2016
“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desapren-
dam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob con-
trole. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pás-
saros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros.
Porque a essência dos pássaros é o vôo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas
amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros cor-
agem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque
o vôo já nasce dentro dos pássaros.
O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.”
RUBEM ALVES
Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola
76
screver os agradecimentos deste trabalho, é ter a oportunidade de perceber como estou cercada de pessoas es-
pecias, as quais foram fundamentais para que eu chegasse até aqui, me perdoem se as palavras não significarem
tanto, pois como disse Manoel de Barros “Onde estou as palavras não me acham”.
Quero agradecer em primeiro lugar a Deus, o maior arquiteto que eu poderia ter como inspiração!
Ao meu amado André, que esteve ao meu lado durante esse período, você é o engenheiro/bombeiro mais arquiteto
que eu conheço! Te amo!
Aos meus pais, Josiane e Carlos, agradeço muito por acreditarem em mim e por me apoiarem ao longo deste tempo de
graduação, sei o quanto vocês oraram e torceram por mim! Mãe, você não faz ideia de quanto os seus abraços signifi-
caram ao longo da faculdade, muito obrigada por cuidar de mim! Amo vocês!
Thaíssa, muito obrigada por me lembrar como é ser criança e alegrar alguns dos meus dias mais difíceis, nunca vou
esquecer quando um dia te perguntei como seria a escola mais legal do mundo e você me disse que nela teriam baldes
para carregar os brinquedos, cavernas e princesas! Você é demais, maninha!
Agradeço também ao meu avô Ivo (in memorian) o primeiro “arquiteto da família”, você me inspirou a arquitetar. Sei
que terias orgulho de mim!
Quero agradecer também a minha orientadora Vanessa, obrigada por todos os vôos os quais você me encorajou a
voar, e por sonhar este projeto comigo! Obrigada mesmo! Você foi uma daquelas pessoas que entram sem querer na
nossa vida e fazem toda a diferença!
Agradeço ainda as pessoas queridas do NEI Otília, a Fabrícia, a Fernanda e a Janaina, que me deram o prazer de vi-
venciar a realidade por dentro dos muros do Otília e me fizeram ver o grande carinho que tem por esse lugar! Obrigada,
sem vocês não teria sido possível!
Agradeço ainda as grandes amigas que fiz ao longo da graduação, Dani, Maitê e Amanda! Sem dúvidas aprendemos
muitas juntas e sou muito feliz em saber que essa amizade continuará para além da faculdade!
Agradeço a minha grande amiga Jéssica Melo, que me acompanhou na exploração fotográ-
fica pelo bairro me emprestando sua tão preciosa câmera e sua sensibilidade de fotógrafa!
E quero agradecer ainda as amigas que mesmo durante minha ausência não mediram esforços para me deixar pala-
vras de incentivo e carinho, obrigada Ruth, Alê, Manu, Carol, Maynã e Lauren!
Família e amigos, muito obrigada por todo apoio, carinho, incentivo e paciência, meu coração transborda de
GRATIDÃO!
OBRIGADA,
E
98
Objetivo...........................................
Metodologia...................................
ERA UMA VEZ...............................
PEDAGOGIA E ARQUITETURA...
Desenvolvimento infantil..............
Correntes pedagógicas..................
Educação infantil e o Brasil...........
A criança, o lugar e o brincar........
O pássaro..........................................
ESPAÇOS EDUCATIVOS...............
A escola e a comunidade...............
O pátio, espaço integrador............
Os heróis...........................................
O LUGAR...........................................
Da minha janela...............................
Um lugar chamado Otília Cruz.....
Entre muros e marcas...................
Os vilões..........................................
AFETIVIDADE POR DETRÁS
DOS MUROS.................................
Afetividade, o conceito................
Afetividade, a prática...................
	 Walkthrough......................
	 Mapas afetivos..................
	 Mapas visuais....................
	 Poema dos desejos...........
A chave.............................................
DIRETRIZES PROJETUAIS..........
CPD..................................................
INTERVENÇÕES.
ARQUITETÔNICAS......................
Muros...............................................
Espaços edificados........................
Espaço não-edificados.................
VOARAM FELIZES PARA
SEMPRE..........................................
Bibliografia......................................
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214
220
224
UMÁRIOS
1110
específico
geral
espertar novas ambiências a partir da afetividade dos usuários (crianças e a comunidade)
para com o lugar, estimulando o imaginário infantil e a apropriação da comunidade por
meio de intervenções arquitetônicas lúdicas que integrem o ambiente escolar ao bairro.
romovervitalidade, permeabilidade e integração no espaço escolar Otília Cruz tendo como
base os afetos, desejos e inquietações compartilhados pelos usuários e comunidade além
de minha própria vivência enquanto vizinha do lugar, por meio de:
Reformas, as quais não modifiquem a espacialidade formal já conhecida pela comunidade por 50
anos, mas que permitam um uso mais livre, lúdico, comunitário e integrador.
Revitalizações de espaços sem uso, a partir de projeto paisagistico e arquitetônico que dialogue
com a linguagem do bairro, promovendo a apropriação comunitária, tornando as atividades do
terreno um conjunto.
Intervenções lúdicas que promovam a brincadeira, o desenvolvimento infantil, o imaginário, a
integração social, o espaço enquanto lugar convidativo, cativante, dinâmico.
D
P
BJETIVOO
1312
ETODOLOGIAM
1514
Era uma vez...
1716
ar asa a imaginação é a inspiração para a alçar vôo rumo a um olhar
afetivo para com a criança, a comunidade, os muros e a escola, fa-
zendo nascer a Casa da imaginação, um lugar que é em parte real, e
em parte uma história.
Os personagens não são aqueles que você vê comumente nos livros, estes são
alegorias que tornam a história um lugar, e o lugar uma história.
A crianças, são as protagonistas, são elas que voam mais alto, sendo que seu
vôo depende de quão grande o céu lhes parece.
A comunidade, personagem muito importante, tem papel fundamental na bus-
ca por céus maiores, onde se possa voar livremente e sem medo.
Os muros, limitam os céus, enquanto contam a mentira de que foram feitos
para a segurança das crianças e da comunidade. A rua carece de olhos, logo, os
muros precisam ser quebrados.
A afetividade, é o que torna o lugar a história, é o que dá cor ao comum.
A escola é quem encoraja os pássaros e todos aqueles que possuem asas a
voar mais alto. Afinal como disse Rubem Alves, “Ensinar o vôo, isso elas [as
escolas] não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros.”
Este lugar-história cresceu dentro de mim, pois vivi junto das crianças, da co-
munidade, dos muros e da escola. Não conto sobre o que ouvi, conto sobre
o que vi com meus próprios olhos e imaginei ao voar com as asas da minha
imaginação e do meu coração.
Essa é definitivamente uma história que vale a pena ser contada!
D
1918
CRIANÇA,
o pássaro
FIG. 02
2120
PEDAGOGI
QUITETUR
a
AR
&
pedagogia enquanto ensino e a
arquitetura enquanto lugar pro-
movem discursos, transmitem
mensagens. Não existe pedagogia sem
ideologia e não existe arquitetura que
não reflita o tempo e o espaço em que
se insere.
E é nas escolas que estes dois discursos
se encontram, mas não podem coexistir,
já que ou o discurso pedagógico sub-
metirá a arquitetura a sua ideologia, ou
a arquitetura influenciará a pedagogia
com sua linguagem. Portanto, é de ex-
trema importância compreender como a
pedagogia e a arquitetura podem se ali-
nhar para criar uma escola que trasmite a
mensagem correta influenciando a crian-
ça durante seu desenvolvimento.
Para Anita Olds (1979, p. 137) “na crian-
ça a motivação para interagir com o am-
biente existe como propriedade intrínse-
ca à vida. Mas a qualidade das interações
depende do engajamento que o ambien-
te permitir. E o espaço é o currículo e o
parâmetro físico da escola, e pode ser
manipulado pelos professores como um
aspecto essencial do processo educati-
vo”.
Talvez a melhor forma de aliar pedago-
gia e arquitetura seja compreendendo
A
“Acredito que as escolas
começam quando os alunos
não sabem que são alunos,
os professores não sabem
que são professores e es-
tão todos debaixo de uma
árvore.”
LOUIS KAHN
os espaços escolares como lugares (TUAN,
2013, p. 14), os quais estabelecem um vín-
culo entre a pessoa e o ambiente, dotando
-o de valor. Portanto não basta enxergar a
pedagogia e a arquitetura como discursos
isolados, ou até mesmo como meros dis-
cursos, mas como possibilidades que aco-
lhem e promovem as sensações, o desen-
volvimento e as experiências (LIMA, 1989,
p.13)
É por isso que na afirmação de Kahn está
implícito que antes de ser aluno ou pro-
fessor, o ser humano é um ser sociável e
influenciável pela ambiência dos lugares,
fatores que facilitam o discurso, o aprendi-
zado e o desenvolvimento.
2322
Há duas abordagens comumente difundidas
no meio psico-pedagógico, as quais estudam
o desenvolvimento infantil e que são de inter-
esse para este trabalho, as quais são:
A abordagem cognitivista a qual tem como
principal expoente Jean Piaget e a abordagem
histórico-cultural com Vygotsky.
	 As duas abordagens dedicam-se a com-
preender o desenvolvimento da criança du-
rante seus primeiros anos de vida. Alguns es-
tudiosos consideram-as contraditórias, pois há
divergência entre os próprios autores sobre
alguns pontos, porém, podem ser considera-
das complementares se analisadas do ponto
de vista de que focalizam tipos de desenvolvi-
mento distintos e portanto podem coexistir, já
que Piaget atribui maior ênfase ao desenvolvi-
mento físico e cognitivo enquanto Vygotsky
aborda o desenvolvimento psicossocial como
maior fator no desenvolvimento infantil.
ABORDAGEM COGNITIVISTA
A abordagem cognitivista de Piaget, influenci-
da por sua formação biológica, entende o de-
senvolvimento da criança como que de dentro
para fora, no sentido de que os impulsos in-
ternos que ao longo do desenvolvimento são
Desenvolvimento Infantil
O
mento infantil compõem um vasto campo de
estudo, por onde permeiam diversas teorias e
linhas de pensamento. A análise portanto, será
sucinta e direcionada ao projeto de arquitetu-
ra.
Há basicamente 3 tipos de desenvolvimento
sobre os quais os cientistas concordam:
Desenvolvimento físico: relacionado ao ama-
durecimento do corpo e do cérebro, permitin-
amadurecidos permitem ao indivíduo atuar no
mundo exterior. (HENRIQUES, 1993; PRADO
2015; REGO 1995).
	 Piaget desenvolve então os quatro es-
tágios de desenvolvimento:
Sensório motor (do nascimento aos 2 anos):
Este estágio corresponde ao início da vida
do bebê, neste momento se estabelece uma
relação com o meio externo por meio das sen-
sações e movimentos, os quais não são vol-
untários, mas ações reflexas.
	 Este estágio é divido em 6 subfases, as
quais interessam ao arquiteto, visto que po-
dem auxiliar nas ambiências e experiências que
propostas.
Segundo TEODORO (2013, p. 27) são estas as
subfases:
Reflexo (0 ao 1° mês)
-A criança e o meio são percebidos por ela
como um só.
-Não há controle motor. Braços e pernas são
desconhecidos.
-Os reflexos são acionados quando algo entra
no campo perceptivo da criança.
Reações Circulares Primárias (1° ao 4° mês)
-Início das imitações
-Tendência a repetir experiências agradáveis
-A criança não conserva o objeto que sai do seu
campo visual
-Exploração do próprio corpo
Reações Circulares Secundárias (4° ao 8° mês)
-A criança começa a perceber o mundo como
-separado dela.
-Início da conservação de objetos desapareci-
dos pela continuação da ação.
-Início da exploração do meio.
Reações Circulares Coordenadas (8° ao 12°
mês):
-A criança já consegue achar objetos que saíram
do seu campo de visão.
-Aperfeiçoamento da capacidade de assimi-
lação.
-Movimentos intencionais.
Reações Circulares Terciárias (12° ao 18° mês):
-A criança é capaz de procurar objetos desapa-
recidos;
-Comportamentos exploratórios ou de experi-
mentação.
Início do Simbolismo (18° ao 24° mês):
-A criança já consegue pensar sobre um fato
sem ser preciso vê-lo na prática;
do as habilidade motoras e sensoriais.
Desenvolvimento cognitivo: o qual diz respei-
to a inteligência e a lógica, relativos portanto a
aprendizagem, a memória, ao pensamento e a
criatividade.
Desenvolvimento psicossocial: relativo aos
relacionamentos sociais e a personalidade.
desenvolvimento pode ser entendido
como o conjunto de transformações
os quais os indivíduos vivenciam ao
longo de suas vidas. (ELALI, 2002).
É porém, nos primeiros anos de vida que a pes-
soa sofre o maior número de transformações
em um curto espaço de tempo, sendo essas
mudanças de extrema importância para seu
amadurecimento e crescimento enquanto ser
humano.
Tuan afirma que “a criança é o pai do homem, já
que as categorias perceptivas do adulto, são de
vez em quando impregnadas de emoções que pro-
cedem da primeiras experiências”(2013, p.32)
	 As primeiras semanas de vida movimen-
tos são limitados mas com o passar do tempo
se vêem evoluções no movimento. A criança,
antes um bebê, adquire a capacidade de exe-
cutar com cada vez mais precisão os movimen-
tos permitindo-se ao longo do tempo explorar
o espaço ao seu redor.
	 Os estudos relacionado ao desenvolvi-
2524
to, ou seja para ele o processo de desenvolvi-
mento das funções psicológicas superiores não
é inata ao homem, ela depende da relação da
criança com sua cultura. (REGO, 1995).
	 Rego (1995) comenta que Vygotsky
chamava atenção para o termo “jardim de in-
fância” que indicava a concepção botânica que
havia quanto ao desennvolvimento infantil, en-
quanto algo botânico, algo que já está instrín-
seco ao homem.
	 A abordagem histórico-cultural de Vy-
gotsky está alicerçada em alguns princípios
básicos dentre os quais para fins deste tra-
balho destaca-se em REGO (1995, p. 41 -43):
Interação sócio-cultural
Para Vygotsky as características típicas do
homem, ou seja, o que o difere enquanto ser
racional, não estão presentes desde o nasci-
mento do indivíduo e não existem dentre dele
como que esperando para aflorar, para ele, o
desenvolvimento humano é proveniente da in-
teração entre o homem e seu meio sócio cultur-
al. É portanto a partir dessa interação em que
o homem modifica seu meio, que seu desen-
volvimento vai acontecendo, ou seja segundo
ele as funções psicológicas humanas surgem
da interação das características biológicas com
a cultura em que está inserido.
Origem cultural das funções psíquicas
A interação sócio-cultural traz consigo a ideia
de que a origem da cultura, portanto é baseada
nas funções psíquicas do homem, já que ao in-
teragir com a cultura que o homem a transfor-
ma e transforma a si mesmo. Logo, a cultura
constitui a natureza humana e o indivíduo pos-
sui seu desenvolvimento a partir da internal-
ização dela.
Cérebro
Vygotsky não nega a importância das funções
biológicas, pelo contrário, são elas a base do
funcionamento psíquico o qual ocorre por
meio do cérebro. É portanto, a partir da ativ-
idade cerebral que o indíviduo interage com a
seu meio exterior, reagindo a ele. Para Vygot-
sky o cérebro é um órgão que mesmo sendo
a base do funcionamento psicológico, não é
imutável e fixo, é moldado ao longo da vida.
Mediação
A mediação para Vygotsky representa os in-
strumentos técnicos e os sistemas de signos,
que foram construídos historicamente na cul-
tura humana e permitem a interação do homem
com os demais indivíduos e do homem com
seu meio exterior. A linguagem por exemplo, é
um signo que permite que o homem se comu-
nique e interaja com os demais de sua cultura
ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL
A abordagem histórico-cultural proposta por
Lev Vygotsky tem como objetivo entender
o comportamento humano baseado nos as-
pectos típicos, permitindo conhecer as carac-
terísticas que levam o ser humano a ser desen-
volver (REGO, 1995).
	 Vygotsky diferentemente de Piaget,
entendia que o desenvolvimento infantil es-
pecialmente no que diz respeito as funções
psicológicas superiores, tais como a memória,
o pensamento, a atenção voluntária, se dava
de fora para dentro, ou seja o mundo exteri-
or, as relações sociais e na “internalização de
formas culturais” (REGO, 1995, p.39) são as re-
sponsáveis por gerar os impulsos internos.
	 Basicamente, Piaget detalha as etapas
do processo de desenvolvimento cognitivo,
enquanto Vygotsky aborda o que desencadeia
esse desenvolvimento que para ele é a relação
sócio-interativa. Portanto, ambas as aborda-
gens podem ser entendidas como complemen-
tares quando sob a ótica de que uma focaliza
o “o que”, e a outra o “como” permitindo um
estudo mais completo do desenvolvimento
humano, haja vista sua complexidade, que não
pode ser explicada apenas levando-se em con-
ta o desenvolvimento físico ou apenas o de-
senvolvimento piscossocial.
	 Porém, paraVygotskya relação sócio-in-
terativa é determinante para o desenvolvimen-
-Noção do próprio corpo a partir do corpo do
outro.
Pré-operacional (dos 2 anos aos 7 anos):
Neste período a criança se comunica por meio
da linguagem, e a presença do simbolismo tor-
na-se bem presente , sendo que ela reconhece
os símbolos e os utiliza para a representação.
	 A presença da função simbólica é algo
muito importante neste estágio, visto que
pode ser estimulada por meio do lúdico e do
faz-de-conta. (PRADO, 2015). Porém, como se
trata da fase pré-operacional a criança ainda
não se utiliza do pensamento lógico, logo, tem
dificuldade em compreender o conceito de ir-
reversibilidade e conservação de massa. (TEO-
DORO, 2013).
	 Essa fase é marcada também pelo ego-
centrismo, ou seja a criança não consegue
perceber o mundo ao seu redor a partir do
ponto de vista de outra pessoa. Tudo está rela-
cionado com seu mundo e com seus sentimen-
tos. (TEODORO, 2013).
Operacional concreto (dos 7 anos aos 11 anos):
Neste estágio a criança já consegue solucion-
ar operações, como soma, subtração, divisão e
multiplicação, consegue também entender os
conceitos de irreversibilidade e conservação de massa, além de solucionar questões envolvendo
situações, porém ainda não é capaz de pensar de forma abstrata, seu pensamento flui de forma
concreta, ou seja seu raciocínio baseia-se em acontecimentos verídicos. (PRADO, 2015; TEO-
DORO, 2013).
Operacional formal (dos 11 anos em diante):
Este é o período marcado pelo pensamento abstrato, a criança agora é capaz de pensar além do
concreto. É neste momento que conceitos subjetivos podem ser compreendidos. Neste estágio
o indivíduo consegue solucionar situações hipotéticas e lidar com situações abstratas. (PRADO,
2015; TEODORO, 2013).
	 Para Elali (2002) cada um dos estágios depende da etapa anterior para que o indivíduo
evolua para a fase seguinte, porém entende-se que as características individuais são responsáveis
pela velocidade de transição entre os estágios. Portanto o conhecimento não pode ser ensinado,
apenas estimulado por meio de experiências, as quais por meio do erro e acerto direcionam o
indivíduo a adquirir novas habilidades.
2726
Portanto, considerando-se tanto a abordagem cognitivista como a abordagem histórico cultural
é possível, segundo Prado (2015) compreender e se utilizar de mecanismos que podem ser fer-
ramentas educacionais as quais podem qualificar o desenvolvimento infantil.
	 Sendo elas, o encorajamento à exploração, a comemoração das novas conquistas, o incen-
tivo ao uso da linguagem e símbolos, direcionamento para a realização de novas tarefas e desen-
volvimento de novas habilidades, e a ausência de correção durante o processo de exploração. 	
	 Logo, considerando-se tanto a abordagem cognitivista como a abordagem histórico cul-
tural é possível, segundo Prado (2015) compreender e se utilizar de mecanismos que podem ser
ferramentas educacionais as quais podem qualificar o desenvolvimento infantil.
Sendo elas, o encorajamento à exploração, a comemoração das novas conquistas, o incentivo
ao uso da linguagem e símbolos, direcionamento para a realização de novas tarefas e desen-
volvimento de novas habilidades, e a ausência de correção durante o processo de exploração.
ao mesmo tempo que o auxilia no processo do
pensamento (compreensão do mundo exte-
rior). Logo, a interação com o meio socio-cul-
tural por parte do homem não é uma relação
direta, mas realizada por meio de ferramentas
auxiliares.
	 A importância atribuída por Vygotsky
“a interação sócio-cultural é de extrema im-
portância para sua teoria, haja vista, que para
ele a estrutura fisiológica humana não é sufi-
ciente para produzir o indivíduo humano na
ausência do ambiente social” REGO (1995, p.
57-58). Sua teoria é embasada ainda no caso
verídico das chamadas “meninas-lobas” en-
contradas na Índia, vivendo entre lobos, elas
não apresentavam praticamente nenhuma
característica humana, não ficavam de pé, não
falavam, não pensavam logicamente e se ali-
mentavam dos alimentos dos lobos, este acon-
tecimento reforça para Vygotsky a ideia de que
quando fora do meio sócio-cultural o homem é
insuficiente para desenvolver-se enquanto ser
humano. (REGO, 1995).
	 Na cultura na qual o indivíduo estiver
inserido cabe ao adulto transmitir aos bebês os
costumes, os instrumentos e o signos de sua
cultura. Portanto, as conquistas individuais re-
sultam de um processo compartilhado.
	 Ainda em Vygotsky encontra-se um
conceito muito interessante relacionado a in-
teração entre o aprendizado e o desenvolvi-
mento, que é a zona de desenvolvimento
proximal. Vygotsky identifica dois níveis de de-
senvolvimento, os quais são o desenvolvimen-
to efetivo e o potencial. O primeiro se refere as
conquistas já consolidadas na criança, as quais
são as capacidades as quais por meio de sua
relação com os outros humanos e com sua cul-
tura, ela já aprendeu e pode realizar de forma
independente. Já o desenvolvimento poten-
cial, se refere ao que a criança é capaz de faz-
er, porém somente mediante a ajuda de outra
pessoa (seja ela uma criança mais velha ou um
adulto).
	 A distância entre o que ela faz de for-
ma autônoma e o que ela realiza com o auxílio
de outros é o chamado desenvolvimento prox-
imal, ou seja as funções ainda não amadure-
ceram na criança, mas se estimuladas podem
se tornar parte de seu desenvolvimento efeti-
vo. Portanto, desafiar a criança e estimular seu
pensamento é uma forma de qualificar seu de-
senvolvimento.
	 Logo, o ato de brincar, em especial a
brincadeira de faz-de-conta é “uma impor-
tante fonte de promoção do desenvolvimento”
REGO (1995, p. 80) já que por meio dela se in-
troduzem novos conceitos, os quais alargarão
seu desenvolvimento proximal, e logo farão
parte de seu denvolvimento efetivo. A brinca-
deira permite representar o simbólico, permite
imaginar. O brincar estimula o pensamento
que antes era determinado pelos objetos reais
a ser regido pela imaginação.
	 Portanto, é por meio de Vygotsky que
é possível compreender a necessidade da in-
teração do indivíduo com os outros e com seu
meio e ainda a necessidade de estimular a cri-
ança para que seu desenvolvimento seja rico
em experiências.
O ato de brincar, em
especial a brincadei-
ra de faz-de-conta é
“uma importante fon-
te de promoção do de-
senvolvimento” já que
por meio dela se intro-
duzem novos concei-
tos, os quais alargarão
seu desenvolvimento
proximal, e logo farão
parte de seu denvolvi-
mento efetivo. A brin-
cadeira permite re-
presentar o simbólico,
permite imaginar.
2928
Portanto em resposta a escola tradicional
surgiram alguns outros métodos pedagógi-
cos, os quais são fruto dos estudos sobre o
desenvolvimento infantil, logo nomes como
Emília Ferreiro (Construtivismo), Maria Mon-
tessori, Rudolf Steiner (Método Waldorf), Loris
Malaguzzi (Reggio Emillia) e outros abriram as
portas para uma nova forma de abordar o ensi-
no e a aprendizagem.
O fator principal que torna estes métodos,
tão distintos do método tradicional é devido
a forma como vêem a criança, como ser único
e capaz de por meio da curiosidade, explorar,
questionar e aprender. Tornando-se um indívid-
uo completo, não apenas cognitivamente, mas
emocional e socialmente. Já que como dizia
Rubem Alves “O ato de aprender acontece em
resposta a um desejo” (2010, p. 11).
Corrrentes Pedagógicas
educação escolar enquanto método
pedagógico, encontra várias aborda-
gens, as quais procedem de diferentes
compreensões de quem é a criança e
de sua relação com o mundo.
	 Sabe-se que foi a partir da Revolução
Industrial que as escolas enquanto instituições
ganharam força já que viu-se a necessidade de
se gerar pessoas capacitadas para o trabalho,
logo não havia preocupação com a criança ou
seu desenvolvimento, mas sim com o ensino
massificado e formail, ignorando-se a unici-
dade do indíviduo.
	 As escola tradicionais permearam muito
séculos e ainda são encontradas enquanto es-
trutura rígida, as quais podem ser comparadas
a fábricas com suas linhas de montagem, visto
que trabalham com a fragmentação do ensino,
aplicam teste de qualidade, usam uniformes,
possuem apitos.:
As linhas de montagem denominadas escolas se organizam
segundo coordenadas espaciais e temporais. As coordena-
das espaciais se denominam “salas de aula”. As coordenadas
temporais se denominam “anos” ou “séries”. Dentro dessas
unidades espaço-tempo os professores realizam o processo
técnico-científico de acrescentar sobre os alunos os saberes
-habilidades que, juntos, irão compor o objeto final. Depois de
passar por esse processo de acréscimos sucessivos - à seme-
lhança do que acontece com os “objetos originais” na linha de
montagem da fábrica- o objeto original que entrou na linha de
montagem chamada escola ( naquele momento ele chamava
“criança”) perdeu totalmente a visibilidade e se revela, então,
como um simples suporte para os saberes habilidades que a
ele foram acrescentados durante o processo. A criança está,
finalmente formada, isso é, transformada num produto igual
a milhares de outros.
(ALVES, 2010, p. 2-3)
A arquitetura das escolas tradicionais apre-
senta a mesma rigidez presente no sistema ed-
ucativo, a formalidade torna o espaço escolar
uma instituição, logo enquanto instituição não
dialoga com a cidade, é superior a ela, rejeita o
entorno e não se abre para o mundo exterior,
o que pode-se perceber nos muros altos. (FER-
REIRA, 2011).
A
FIG. 03
3130
FIG. 3A
FIG. 3B
3332
FIG. 3C FIG. 3D
3534
http://media.oregonlive.com/portland_impact/
photo/opaljpg-83cb8d1cfe031b29.jpg
FIG. 3E FIG. 3F
3736
"Se um médico do Século XX entrar numa sala de cirurgia do Século XXI,
ele consegue operar? Não. Ele não consegue operar. Ele mal consegue en-
tender o que é que tem ali. Onde é que está o paciente? Agora, se um pro-
fessor do Século XIX entrar na sala de aula do Século XXI, ele vai achar
muito diferente? Não vai. Ele vai ver ali a lousa, o giz, as carteiras enfileira-
das, a lista de chamadas, tudo conforme era no Século XIX. A única coisa
que ele não contava era com a cabeça dos alunos do Século XXI. É aí que
está o conflito, pois a sala de aula do Século XXI não é mais aquele quadra-
do, é praticamente um planeta, porque, com as novas tecnologias, o planeta
é o espaço de aprendizado das pessoas agora".
SIMONE ANDRÉ
3938
Educação infantil e o Brasil
A
educação infantil, está para além da
instituição, ela remete à criança, ser
humano cheio de vida. (DIDONET,
2001). Logo, limitar a educação infan-
til aos aprendizados escolares, é restringi-la.
Pode-se considerar que a educação infantil
envolve todos os aprendizados dos primeiros
anos de vida da criança, os quais ela obtém por
meio da relação e interação com seus seme-
lhantes, antes mesmo de ir a escola. (DI LELLO,
2012)
	 A educação infantil no mundo, enquan-
to instituição, teve seu início na Europa no sé-
culo XVIII, devido a transição do sistema feu-
dal para o capitalismo, onde de um modo de
produção doméstico há a passagem pra um
modo de produção em fábricas. Logo, com a
Revolução Industrial e a entrada da mulher no
mercado de trabalho, a forma de organização
familiar adquiriu um novo rumo. (DI LELLO,
2012)
	 Apesar dos impulsos direcionados para
a assistência de crianças durante este período,
foi somente após a Segunda Guerra que houve
a preocupação com as necessidades emocio-
nais da criança, com estudos sobre o desenvol-
vimento infantil e a compreensão da importân-
cia dos primeiros anos de vida para a criança.
	 No Brasil, foi apenas a partir dos anos
80 que conquistas históricas legais relativas à
criança e sua educação foram conquistadas,
com a Constituição Federal em 1988 e com Es-
tatuto da Criança e do adolescente em 1990.
	 Mais recentemente o governo tem se
preocupado em traçar diretrizes nacionais re-
ferentes a construção de espaços de educação
infantil, assim como diretrizes curriculares as
quais norteam as propostas pedagógicas e es-
tão baseadas nos princípios:
Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solida-
riedade e do respeito ao bem comum, ao meio am-
biente e às diferentes culturas, identidades e singu-
laridades.
Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da
criticidade e do respeito à ordem democrática.
Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludici-
dade e da liberdade de expressão nas diferentes ma-
nifestações artísticas e culturais.
(BRASIL, 2010, p. 16)
A partir deste ano (2016), a lei Lei nº 12.796,
de 4 de abril de 2013, determina a obrigato-
riedade escolar a partir dos 4 anos, além de
estabelecer que:
“A educação infantil, primeira etapa da educação bá-
sica, tem como finalidade o desenvolvimento integral
da criança de até 5 anos, em seus aspectos físico, psi-
cológico, intelectual e social, complementando a ação
da família e da comunidade”.
(DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 2013, p.1)
É interessante perceber que este trecho desta-
ca o papel da educação infantil enquanto ins-
tituição como algo complementar à educação
familiar e da vida em comunidade, demons-
trando que o educar vai além do ensino formal
abrange também os conhecimentos empíricos
e afetivos recebidos pela criança ao longo dos
primeiros anos.
As diretrizes curriculares nacionais dispõe
ainda que as práticas pedagógicas devem
ter a interação e a brincadeira como norte-
adores, garantindo portanto experiências
sensoriais, expressivas, corporais, assim
como imersão quanto a diferentes lingua-
gens, onde esteja presente a expressão:
gestual, verbal, plástica, dramática ,musi-
cal; promovam a autonomia, a coletivida-
de, a curiosidade, o encantamento, conhe-
cimento cultural.
(BRASIL, 2010, p. 24-26)
O brincar é direito assegurado a criança, in-
felizmente este belo discurso nem sempre
condiz com a realidade dos espaços escola-
res destinados a infância, especialmente nas
instituições públicas os quais tendem a fal-
ta de manutenção, a espaços ausentes de
significado e humanização, os quais não
atraem a criança a exploração e ao conví-
vio.
FIG. 04
4140
A despeito do descaso público, para com
as instituições de ensino, é muito interes-
sante perceber o esforço dos profissinais
docentes para com uma melhor humani-
zação dos espaços, mesmo sem haver ver-
bas para reformas.
Como é perceptível no NEI Otília Cruz, lu-
gar onde se desenrola este trabalho e que
será discutido detalhadamente nos capí-
tulos posteriores.
Na primeira foto a direita, tem-se a sala
simbólica, inseria num espaço residual do
complexo e que busca permitir com que a
criança possa representar e imaginar.
Na segunda foto a direita, tem-se a biblio-
teca criada pelos próprios profissionais
como forma de estimular as crianças a lei-
tura e ao mundo da imaginação.
É sem dúvidas, uma atitude muito váli-
da, apesar de ficar claro que não apenas
a biblioteca e a sala simbólica poderiam
ser espaços lúdicos, mas todo o complexo
infantil, de forma a agregar ainda mais ex-
periências e tornando a brincadeira uma
rotina.
FIG. 05 FIG. 06
4342
A criança, o lugar e o brincar
AAtravés da brincadeira que a criança
é capaz de assimilar o mundo ao seu
redor (PIAGET,1971), já que na brinca-
deira a questão espacial é fundamental pois é o
que determina o movimento que a brincadeira
exige (LIMA, 1995, p.187). Logo, o espaço não
é neutro, ele influencia e interage o comporta-
mento infantil.
Dessa forma, os espaços infantis devem ser
sensíveis a forma como a criança enxerga o es-
paço.
“O espaço isolado só existe na cabeça do
adultopara medi-lo, para vendê-lo, para
guardá-lo. Para a criança existe o espaço
-alegria, o espaço-medo, o espaço proteção,
o espaço-mistério, o espaço descoberta, en-
fim, os espaços da liberdade ou da opres-
são.” (LIMA, 1989, p. 30)
	 Portanto como forma de auxiliar a brin-
cadeira, os espaços precisam possuir ambiên-
cias que incentivem a experimentação, a curi-
osidade, e a afetividade (a qual será abordada
num capítulo posterior) possibilitando que a
aprendizagem seja lúdica e autônoma.
	 Rubem Alves (2010, p. 14) ao dizer “Ah,
uma vez cometido o erro arquitetônico o es-
piríto da escola já está determinado” estava se
referindo a importância dos “espaços-lugares”
(TUAN, 2012) das ambiências e de uma ar-
quitetura que converge com os princípios
pedagógicos para promover o aprendizado, a
corrente pedagógica Reggio Emilia considera
arquitetura escolar o “terceiro-educador” ou
seja além dos professores e da família e comu-
nidade o ambiente também ensina. (SANTOS,
2014)
FIG. 07
FIG. 08
4544
o brincar surge o conceito do “lúdico” que Di Lello (2011, p. 49)
descreve como “atividade criadora que está aquém da seriedade
e além da brincadeira” por se tratar não apenas do divertimento,
mas que está relacionada com processo de ensino-aprendizado, já que
permite a exploração, a curiosidade, estimula o interesse.
	 Se considerarmos o lúdico como uma brincadeira instigante e ca-
tivante, poderemos encontrar o lúdico de várias formas, as quais vão
além do tradicional parque infantil, mas que ao se tornar o conceito e a
linguagem tornam o lugar completo e muito mais rico em experiências
que conformam um novo significado ao ambiente escolar.
	 A palavra “lúdico” vem do latim “ludus” que significa “jogo”, logo
confere a brincadeira algo além do brincar por brincar, mas traz a co-
notação de brincadeira com propósito, onde a crinça ou até mesmo o
adulto pois como diz Marrach (1998) o lúdico não é apenas brincadeira
de criança, pois o adulto também brinca sem saber que o está fazendo,
cita ainda como exemplo a invenção da linguagem que pode ter sido
originada com um jogo, uma brincadeira com propósito.
	 O lúdico estimula a socialização e o crescimento mútuo, já que
num jogo, sempre se é melhor jogar com alguém, logo esta troca de ex-
periências promove interação e aprendizado.
BONS EXEMPLOS
Praça infantil por Márcio Kogan
“Uma praça lúdica para ser explorada livremente” é assim que o arquiteto
Márcio Kogan define a praça que seu escritório projetou.
	 Toda a praça gira em torno do de uma cerca de madeira a qual
define a organização da praça. A cerca é como um portal que convida a
criança a explorar os “novos mundos” ao atravessá-lo, onde se revelam
D
http://studiomk27.com.br/p/praca-infantil/
FIG. 09
4746
jardins, labirintos.
	 Os brinquedos não buscam impor uma forma de utilização, pelo
contrário estimulam a exploração e o uso.
	 A praça é “um lugar vivo repleto de livres descobertas” as quais
representam experiências singulares para as crianças.
	 A praça ao oferecem diversas ambiências, desperta a curiosida-
de. Por estar ao ar livre permite o contato direto com a natureza de
forma quase “primitiva”, como descreve Kogan, já que a grande cerca
simboliza um encontro ao redor do fogo. Sendo que a brincadeira de
esconde-esconde vira de repente um pega pega que adentra o portal e
se achega a um gramado verde.
	 Esta praça tem o jogo, a brincadeira com propósito, que traduz
a criança que aprender ao ar livre e no meio de diferentes ambiências e
texturas é algo singular.
	
FIG. 10
FIG. 11
4948
Playground Infinito por Marco Brajovic
O projeto busca permitir à criança o uso inusitado e livre de sua for-
ma. Inspirados nos parques topográficos, o playground infinito, infinitos
usos, que acontecem em um relevo criado para estimular a brincadeira.
	 Este conceito traz liberdade à criança e estimula sua criatividade
e imaginação. Segundo Brajovic “Como criar uma arquitetura dos rela-
cionamentos? Como criar uma arquitetura que ajuda a definir o que é
privado, o que é público, o que é comunitário – o que é meu, o que é
teu, o que é nosso? Cada um encontra nesta paisagem as próprias ca-
deiras, as próprias gangorras. Aqui, são as crianças mesmas, que criam
as próprias histórias e criam os próprios relacionamento. Eu acho que
isso é um playground do século 21.”
	 A imagem abaixo ilustra alguns possíveis usos do playground.
FIG. 12
FIG. 13
5150
Taka Tuka Land por Susanne Hofmann
Este foi um projeto de intervenção temporária em um jardim de infância
em Berlim. O projeto tinha como proposta criar um espaço segundo a
imaginação das crianças, trazendo novas ambiências ao inserir micro-ar-
quiteturas lúdicas que incentivassem o uso espotâneo e livre dos pe-
quenos.
	 Segundo Susanne “a realidade convive junto com a fantasia”, a
intervenção é portanto baseada em uma história infantil a qual trouxe o
conceito de que a escola era uma ávore de limão e portanto cada parte
de sua arquitetura representava uma parte da árvore, logo as interven-
ções compuseram um percurso muito interessante na arquitetura exis-
tente, estimulando a imaginação infantil, a interação com os colegas e a
brincadeira com propósito.
A imagem a abaixo mostra a inserção das intervenções ao longo do es-
paço infantil.
	
http://www.archdaily.com/519/taka-tu-
ka-land-baupiloten
FIG. 14 FIG. 15 FIG. 16
5352
CRIANÇA,
O PÁSSARO...
Já que não é um adulto em minia-
tura, mas um ser humano único,
completo e ao mesmo tempo que
está crescendo e desenvolvendo-
se. É completo devido a sua es-
trutura física já formada e por
ser capaz de pensar e sentir,
mas é ao mesmo tempo um ser
que está desenvolvimento visto
que tem tudo em transformação.
Embora necessite de um adulto,
é capaz de interagir com o meio
natural, social e cultural desde
muito pequena, portanto quanto
maior sua interação com o meio,
maior serão seus vôos, ou seja
seu universo pessoal será amplia-
do. (BRASIL, 2006).
Pássaros não podem viver em
gaiolas, logo os espaços infantis
devem favorecer seu desenvolvi-
mento de forma livre por meio
da exploração, da curiosidade e
do lúdico para que assim possam
voar nas “asas da imaginação”.
A
FIG. 17
5554
os heróisCOMUNIDADE,
FIG. 18
5756
Ativos
“Os pátios escolares e os espaços
livres tem algo em comum, só de pro-
nunciá-los já nos fazem bem: reme-
tem-nos a ideia de liberdade. É como
se estivessem livres dos males que
assolam nossas escolas e nossas ci-
dades: livres do controle, do individual-
ismo [...]. Nos remetem a ideia de pul-
mão, é por onde a cidade e a escola
respiram. Livres!
spaços
EDUC ANA BEATRIZ G. FARIA
5958
desenvolvimento de valores sociais e contri-
buindo para a solidariedade e a cidadania.
	 Espaços livres nos trazem a mente o
encontro, a coletividade (AZEVEDO, 2011) o
comunitário, ensinando a criança e o adulto
princípios de igualdade.
Segundo Elali (2002) “para crianças de todas as
idades” (do bebê ao adulto) é fundamental re-
alizar atividades ao ar livre, como simplesmen-
te o brincar. Logo, que melhor lugar que a escola
para acontecer este encontro?
A Escola e a Comunidade
A
ços que utilizam.
	 Jacobs (2011) reforça a importância de
espaços vivos para que haja segurança, já que
a vitalidade dos lugares em diferentes horários,
gera movimento. Ela destaca ainda a importân-
cia de diferentes usos em um bairro para a pro-
moção de espaços vivos.
	 As escolas enquanto equipamento cul-
tural ou como espaço público requerem como
diz Mayumi (1989) “o rompimento da escola/
prisão/fortaleza e sua transformação na esco-
la/praça/parque [...] para que haja apropriação
dinâmica”, sendo que reforça ainda a ideia de
que o espaço escolar é um material pedagógico
e lúdico que interage com a população os pro-
fessores e as crianças.
	 As escolas enquanto espaços ativos,
não podem estar confinadas em muros altos
ignorando o mundo exterior, pois ao integrar
a comunidade em seu espaço tem grande po-
tencial educativo e cooperativo, auxiliando no
A escola enquanto espaço físico, não
é um lugar fechado em si mesmo, está
inserida em um contexto social, cultu-
ral e urbano. A escola é parte da cida-
de, e uma parte muito importante, se conside-
rar que ela tem papel vital no desenvolvimento
dos cidadãos, logo, a cidade é em parte um re-
flexo de suas escolas.
Como disse Paulo Freire “Educar não pode estar
desconectado do contexto que se encontra” logo
os espaços escolares necessitam dialogar com a ci-
dade, tornando-se como diz Ribeiro (2015, p. 11)
“um novo e potente equipamento cultural” já que
“se a escola é a reprodução da cidade, ao transfor-
mar a escola podemos transformar também a ci-
dade” (RIBEIRO, 2015, p. 43)
	 A escola enquanto equipamento cultu-
ral, torna-se um espaço público, que propor-
ciona o encontro e a diversidade trazendo a
apropriação, conceito muito importante que
define a relação da comunidade com os espa-
FIG. 20
FIG. 19
6160
O Pátio, espaço integrador
sociais, elemento fundamental da escola que po-
tencializa o processo educativo” (AZEVEDO, 2011,
p.15-16)
Os pátios escolares enquanto espaços públi-
cos permitem que o cidadão se transforme em
aluno e o aluno retome seu papel de cidadão
(GOULART DE FARIA, 2011) . Pois é através
da socialização e do espaço democrático que
o indíviduo tem a possibilidade de exercer sua
cidadania.
	 Logo, a educação é entendida como um
compromisso integral que vai muito além dos
ensinos formais, abrange especialmente a vida
cotidiana da criança em comunidade, já que
o desenvolvimento integral só pode ser con-
cretizado a partir do momento que a criança
compreende seu papel enquanto participante
do conhecimento e não apenas receptora do
mesmo, pois assim pode ter papel ativo no seu
aprendizado baseado na experimentação e na
socialização.
	 Há 4 premissas básicas que devem
definir um espaço infantil, o espaço enquanto
“ambiente pedagógico, sócio-cultural, inclusi-
vo e ecológico” (AZEVEDO, 2011, p. 59), estes
fatores determinam a relação escola-cidade e
contribuem para uma espaço que promove o
desenvolvimento infantil e a cidadania, a qual
passa pelo pátio.
A
O espaço escolar pode ser
um ambiente múltiplo onde a
formalidade dá lado aos es-
paços hipnotizantes, os es-
paços que cativam, instigam
e ensinam, “as crianças de
todas as idades” sejam elas
pequenas ou adultas.
O pátio tem esse potencial
de ditar o espírito da esco-
la, ele tem a capacidade de
convidar e fazer-se sentir
bem-vindo. O pátio é a ponte
entre a escola e a cidade.
É nele que o aprendizado se
fortalece e é nele que a ci-
dadania é enriquecida.
escola enquanto parte da cidade, ou
seja, como lugar permeável e extra-
muros, pode dialogar com seu entorno
por meio de seus espaços livres, que ao pro-
mover o aprendizado, o lazer e a socialização
se tornam espaços públicos.
	 Dentre os espaços livres das escolas,
destaca-se o pátio, local de recreação e ativi-
dades esportivas, que marca a vida de escolar
de muitas crianças e jovens e que raramente
é pensado como espaço de desenvolvimento
(AZEVEDO, 2011), é considerado apenas local
de pausa entre as atividades formais. Porém,
o pátio tem muito potencial enquanto promo-
tor de integração, descoberta, exploração, e
aprendizado.
“A palavra pátio provém do latim “pateo” que sig-
nifica estar aberto, ou exposto; estender-se; abrir-
se; estar descoberto, sugerindo a possibilidade
de relacionar-se. Logo o pátio pode ser entendido
como lugar de manifestações, palco de relações
FIG. 21
6362
?
Há alguns anos o MEC juntamente com a Unes-
co desenvolveram um projeto que se intitulou
“Escola Aberta”. O qual previa a abertura das
escolas públicas durante os finais de semana,
com o objetivo de ampliar as relações entre a
comunidade e o espaço escolar, a escola por-
tanto seria o palco para oficinas e lazer. (MEC,
2010).
	 Esta iniciativa é interessante e benéfica
para o espaço escolar, porém não é uma atitu-
de suficiente, é necessário mais para que um
espaço seja realmente aberto.
	 A escola enquanto espaço aberto e so-
cializador não é um espaço irresponsável, um
espaço que ignora as inseguranças, mas é um
lugar que cativa e torna a comunidade partici-
pante de forma a fazê-la enxergar os benefí-
cios de ser parte da escola.
	 Faz-se necessário portanto, que o espa-
ço escolar além de abrir-se para a comunida-
de, dialogue com ela, trazendo as ambiências
conhecidas do bairro para este espaço. Este
conceito encontrado em Ramos (2015) basea-
da no programa de ambiência de experiências
de Hélio Oiticica o qual reinterpretava as am-
biências das comunidades para despertar nelas
uma experiência sensorial, permitindo criar-se
ambientes reconhecíveis e a apropriação co-
munitária, será desenvolvido posteriormente
no projeto.
FIG. 22
6564
BONS EXEMPLOS
Complexo educacional por CEBRA
Este complexo educacional cujo projeto será executado na Rússia após
um concurso que tinha como objetivo o projeto de uma escola inteli-
gente, a qual deveria buscar por uma tipologia que combinasse pais-
agismo, arquitetura em um ambiente de aprendizado que pudesse ser
utlizado como centro comunitário. (ARCHDAILY, 2015).
	 Logo, o projeto se organiza enquanto vários blocos dispostos
num círculo e cobertos por uma unica cobertura, o centro é marcado
por um imenso pátio verde que congrega criança e adultos, é possível
perceber ainda a presença de hortas e espaços esportivos que também
encontram-se permeáveis a todos.
	
FIG. 23
FIG. 24
6766
Escola Antônio Derka em Medellín
Esta escola foi executada em Medellín, em uma das “zonas periféricas
mais deprimidas e violentas da cidade, devido à falta de investimento
social”(ARCHDAILY, 2008) após sua proposta de reestruturação urbana.
	 Os arquitetos do escritório Obranegra Architectos tinham a in-
tenção de criar um projeto amável e familiar para a comunidade, logo,
fizeram uma releitura de alguns elementos da comunidade para a ar-
quitetura, como os terraços, as varandas, as ruas escalonadas entre out-
ros, os quais segundo eles deram sentido ao projeto.
	 A intenção era propor uma “escola aberta que consistia em dis-
sipar os limites físicos e mentais do colégio mediante uma intervenção
urbana e arquitetônica aberta, que buscava convertê-los em centros de
atividade cultural, recreativa, educativa e em referencial urbano que
promovessem a integração de toda a comunidade.” (ARCHDAILY,2008).
FIG. 25
FIG. 26
6968
Escola primária e centro familiar por CEBRA
	 Esta escola inserida na Noruega, em um bairro residencial tem a
inteção de dialogar com o entorno se desenvencilhando de seus muros e
tornando o acesso principal aberto a comunidade, assim como a criação
de um parque verde inserido em frente ao edifício.
A escola é descrita como uma ambiente que cumpre variadas funções:
“uma arena de aprendizagem e ensino, um local de trabalho e um ponto
de encontro social.”
	 Segundo os arquitetos “o parque da escola já se tornou uma
importante área de recolhimento para o bairro fora do horário escolar
também. A combinação destas três funções criou um complexo cheio de
atividade de manhã à noite, sete dias por semana.” (ARCHDAILY, 2014)
	 Logo é possível perceber a vitalidade alcançada por ser uma es-
cola que convida a cidade.
FIG. 27
FIG. 28
7170
Escola Ny Krohnborg por Arkitektgruppen CUBUS
Este projeto realizado na Noruega, o qual é uma revitalização de um
escola antiga quen encontrava-se abandonada e gerava inseguranças
ao bairro.
	 O projeto portanto, buscava dialogar e revitalizar também o bair-
ro, portanto se abriu permitindo um grande pátio o qual é público e
também possui quadras esportivas.
	 Por ser uma escola que também conta com crianças pequenas,
definiu-se também um outro pátio privado na parte posterior da edifi-
cação.
É interessante perceber essa relação, pois demonstra que um edifício
aberto não é um edifício irresponsável quanto a segurança das crianças
as quais utilizam esse espaço, portanto dialoga de forma consciente
com o entorno e ao mesmo tempo possui espaços mais privativos.
FIG. 29
FIG. 30
7372
Jardim de infância Montessori Fuji por Tezuka Architects
Este projeto realizado em Tokyo trata-se de um jardim de infância sem
muros, o qual configura-se em torno de um grande pátio, sendo que sua
cobertura compõe ainda um terraço onde pode-se circular e contem-
plar.
	 As atividades mais formais ocorrem na parte construída, abaixo
do terraço, onde estão dispostos os mobiliários de maneira bem livre
permitindo total contato com o pátio.
	 Os arquitetos descrevem que “As conveniências modernas pri-
varam as crianças das sensações. Aqui pretende-se ensinar através do
edifício o sentido de comunidade . Estes são valores da sociedade hu-
mana que não mudam, mesmo através das eras.”
	 Portanto, é interessante como a forma do edifício pode confor-
mar o espaço público e o privado e como os dois podem conviver.
http://chuknum.com/wp-content/up-
loads/2011/08/1.jpg
FIG. 31
FIG. 32
7574
COMUNIDADE,
OS HERÓIS...
Não há dúvidas que a comu-
nidade enquanto possibilitado-
ra de novas relações e de
interação com o mundo in-
fantil tem muito a agregar
ao trazer a “cidade” para es-
cola, no sentido da cidadania,
da cooperatividade.
Logo, a comunidade repre-
senta os heróis que fazem
a ponte entre a cidade e a
escola, podendo tornar o es-
paço escolar um lugar com
vitalidade, um lugar onde
acontece a democracia e a
solidariedade.
A
FIG. 33
7776
os vilões
MUROS,
FIG. 34
7978
FIG. 35
Esta foto é da parte de trás do Otília Cruz, nela pode-se perceber o comprimento do muro e a relação com a escola e com a rua. Para torná-lo menos impessoal a escola incentiva a apropriação por grafiteiros como forma de
utilizar o muro enquanto painel. No ano passado foi realizado um final de semana de pinturas onde a comunidade se reuniu para prestigiar os novos grafites do muro, os quais são agora do tema ‘Star Wars’.
8180
ugL ARo
“A ideia essencial é
tornar os ambientes
de aprendizados um
verdadeiro lar.”
DORIS KOWALTOWSKI
8382
	 into que não fui eu quem escolheu este lugar, foi ele quem me
escolheu. Morei exatamente na frente da – na época – Escola
Professora Otília Cruz, e sinto que aos poucos o lugar me cativou.
	 A escola estava fechada havia alguns anos e me intrigava com
seus muros altos e ao mesmo tempo me atraía com suas árvores cheias
de vida que como que num anseio de viver se so-
brepunham aos muros e criavam uma ambiência
tão atraente, especialmente nos dias de primavera
onde as flores roxas afloravam e deixavam o quin-
tal de casa com cheiro de natureza, ou ainda nos
fins de tarde quando emolduravam um belo pôr-do
sol que como numa pintura absorvia meus olhares.
	 Passado o pôr-do-sol nascia um grande
breu, que amedrontador, permeava aquele lugar,
tornando aqueles muros antes instigantes agora
ameaçadores na noite escura, trazendo aos vizinhos, a insegurança.
	 Mas não eram apenas os muros e as árvores que chamavam minha
atenção era também como aquele lugar era como um coração para aquela
comunidade, pois mesmo aparentemente abandonado, podía-se ouvir de
dentro dos muros aos finais de semana, vozes cantando, passos de dança,
reuniões do bairro, ou ainda festas e almoços da comunidade. Pude sen-
Da minha janela
S
tir que havia algo ali, além de uma arquitetura dos anos 50 cercada por
muros altos,
havia um elo entre o espiríto daquele lugar e as pessoas que viviam ali.
	 Um raio de esperança me tocou um dia pela amanhã, quando ao
abrir minha janela vi que a escola, iria ser reformada e se tornaria uma
creche, mas não durou muito ao ver que apenas
de um verde sem vida os muros foram cobertos
de alaranjado, as velhas salas de aula foram de-
senferrujadas e os telhados consertados. Como
que numa grande ironia, tudo voltou a funcionar,
e de repente crianças de 0 a 5 anos começaram a
diariamente ser engolidas pelos muros, que reve-
lam que há infância graças as vozes, os choros e as
cores que surgem do seu interior.
Foi neste misto de sentimentos que não tive dúvi-
da, esse lugar precisava de um olhar diferente, não apenas um olhar quan-
titativo, mas um olhar afetivo, um olhar de alguém que foi vizinha destes
muros. Sim! Este lugar me escolheu. E ele me escolheu como que dizendo,
que ser arquiteto é ser capaz de ver pessoas, por de trás de muros”.
“Não fui eu
quem escolheu
este lugar, foi
ele quem me
escolheu”
FIG. 36
8584
Otília Cruz está localizada na par-
te Continental do município de
Florianópolis, no bairro Jardim
Atlântico, bem próximo ao bairro Colon-
inha, podendo ser considerada parte da
“Grande Coloninha” como se referem os
moradores da região.
	 Essa identificação com o bairro
próximo, acontece devido as mesmas car-
acterísticas topográficas, de urbanização
e de vizinhança que circundam a área
onde está a Creche (Jardim Atlântico) do
bairro Coloninha, já que segundo Lynch
(1999, p. 50; 78-80) “o conceito de bairro
pode ser compreendido como regiões que
possuem algo em comum e são passíveis
de reconhecimento interior e exterior e
as características que determinam bairros
são continuidades temáticas, que podem
consistir em variantes como: textura, es-
paço, forma, detalhe, topografia [...] Con-
Um lugar chamado Otília Cruz
O
tudo, as conotações sociais são bastantes
significantes, quando se trata de delimitar
regiões”
	 Tanto o terreno em estudo se en-
contra no alto do morro (aproximada-
mente cerca de 40 metros acima do nível
do mar), quanto a malha urbana é semel-
hante e há ainda a Escola de Samba Un-
idos da Coloninha próximo a Creche, a
qual gera senso de vizinhança e identi-
dade como de um único bairro, independ-
entemente da divisão municipal. Pode-se
afirmar então, que este lugar possui uma
identidade única que o conforma parte do
bairro Coloninha. Visto que o conceito de
‘identidade de lugar’ pode ser entendido
como o espírito do lugar, onde as raízes
e o sentimento de familiaridade depen-
dem tanto das qualidades físicas como
das mudanças humanas atribuidas a esse
lugar (HOLZER, 1997). FIG. 37 FIG. 38
8786
O mapa ao lado ilustra os bairros definidos
pela legislação municipal em (A) temos o bairro
Jardim Atlântico, em (B) o bairro Balneário, em
(C) está o Canto, em (D) está a Coloninha, e em
(E) encontra-se o bairro Estreito.
	 Logo, como descrito anteriormente o
terreno encontra-se no bairro Jardim Atlântico,
porém pode considerar-se a Grande Coloni-
nha.
	 Neste recorte há alguns equipamentos
urbanos que podem ser considerados pontos
referenciais. São eles, além da Escola de Sam-
ba, a Escola de Aprendizes de Marinheiros e o
Estádio Orlando Scarpelli.
A
B
E
D
C
FIG. 39 FIG. 40
FIG. 41
FIG. 42
FIG. 43
8988
USO DO SOLO
A análise do entorno permite compreender a
relação entre o uso do solo, o porte das edifi-
cações e o sistema viário, permitindo entender
como o lugar se encontra localizado na cidade
e quais as interferências que recebe de seu en-
torno.
O recorte realizado para a análise dos mapas, foi
realizado considerando o bairro não pela divisão
municipal, mas sim pela linguagem morfológica,
topográfica e e humana que se entende como
que conformando um conjunto no que, como já
foi referenciado, se considera a “Grande Coloni-
nha”.
Logo, é a partir da análise dos mapas que é
possível compreender o caráter do lugar.
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Sem uso
Uso institucional religioso
Uso institucional escolar
Uso residencial
Uso comercial
Uso misto
Área verde
O Mapa de uso do solo permite perceber a forte presença do uso
residencial, com pequenos comércios e serviços próximos a via Max
Schramm, além da presença de comércios vicinais nas partes mais
internas do recorte.
	 É interessante notar a presença de diversas áreas verdes,
como pequenas praças, as quais são pouco utilizadas, e ainda a forte
presença de escolas e creches, devido a grande demanda desta re-
gião.
	 É possível perceber também que as quadras a direita do Otília
Cruz, são bem longas, o que dificulta a relação de vizinhança, en-
quanto a esquerda do terreno percebe-se a presença de quadras me-
nores o que se constata na melhor relação entre os vizinhos.
	 Na parte mais ao centro do recorte é visível a presença de
várias áreas vazias e em crescimento com diversos prédios de alto
padrão que estão sendo construídos.
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FIG. 44 FIG. 45
9190
1 pavimento
2 pavimentos
3 pavimentos
4 pavimentos
5 pavimentos
ou mais
SISTEMA VIÁRIOGABARITOS
O Mapa de sistema viário permite compreender a relação entre a hie-
rarquia das vias. Percebe-se que a Via Max Schramm, a qual conecta
Florianópolis a São José, Biguaçu e demais cidades possui fluxo in-
tenso, o qual é recebido pelas vias coletoras, as quais possuem maior
fluxo por conectarem-se as áreas residencias do bairro. Já as vias lo-
cais, possuem fluxos bem menos intenso já que recebem o fluxo das
vias coletoras e o distribui.
	 Há 3 linhas de ônibus que abastecem esse bairro, as quais são:
Bairro de Fátima o qual possui horários a cada 30 minutos, Coloninha
com apenas 10 horários ao longo do dia e o Corredor Continente que
tem horário a cada 10 minutos.
	 A linha Coloninha foi criada devido a um pedido da comunida-
de, já que o bairro possui um relevo acentuado e também possibilita
a parada em frente a Otília Cruz, por isso possui intervalos relaciona-
dos ao horários de aula e trabalho da comunidade.
O Mapa de gabaritos permite compreender a relação volumétrica e
as possíveis ambiências projetadas sobre os usuários deste lugar.
	 É um bairro com predominância de edificações de 1 e 2 pavi-
mentos ao longo das quadras. Porém, nos últimos 5 anos os espaços
vazios do bairro, que possuem relevo acidentado, tem dado lugar a
edifícios de alto padrão os quais consistem em edifícios de 5 pavi-
mentos ou mais.
	 É importante perceber que a predominância de edificações de
alto padrão consiste em condomínios fechados os quais comportam
de 2 a 3 blocos de apartamentos, o que é preocupante para a segu-
rança do bairro, já que se fecham em seus muros ignorando a rua.
	 O Otília Cruz possui uma edificação horizontal de apenas um
pavimento, porém devido ao relevo irregular possui um subsolo.
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Via arterial
Vias coletoras
Vias locais
Transporte público
Linhas Bairro de Fátima
Linha Coloninha
Linha Corredor Continente
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A
A
B
B
C
C
FIG. 46 FIG. 47
9392
Subida íngrime, desafiadora, mas no topo as árvores
do terreno da creche que como que num convite se
debruçam sobre a rua.
FIG. 48
FIG. 49
9594
tualmente o “Otília” como é chamado carinhosamente pelos
moradores do bairro, é um NEI (Núcleo Educacional infantil)
que atende 235 crianças entre 0-5 anos, as quais provêm de
diversos bairros do Continente, além é claro de atender a co-
munidade local, dentre esse número, 195 crianças estão na faixa de
0-3 anos.
	 Chama atenção a grande quantidade de equipamentos esco-
lares tão próximos, em especial duas outras Creches públicas locali-
zadas próximas ao NEI. Essa questão foi esclarecida pela diretora do
NEI Otília, Fabrícia Souza, que afirmou que demanda para educação
infantil é muito alta na parte Continental de Florianópolis, o que não
acontece com tanta intensidade no ensino fundamental e médio, pe-
ríodo onde há maior evasão escolar. A diretora, afirmou ainda que o
espaço Otília Cruz, veio atender esta demanda e que agora sobram
vagas.
	 O espaço do Otília Cruz já foi utilizado atendendo programas
diferentes. Fundando em 1958, como E.E.B. Otília Cruz funcionou
até 2008, quando por motivos que serão abordados posteriormente,
foi fechado e durante este tempo funcionou com o projeto criado
pela própria comunidade local, intitulado “Amor Coloninha” o qual
oferecia aulas de dança, canto, futebol, entre outros, para crianças da
comunidade da Coloninha, funcionando em parceria com a Escola de
Samba Unidos da Coloninha. Posteriormente em 2014, o terreno foi
doado do Estado para o município reabrindo como NEI.
A
FIG. 50
FIG. 51 FIG. 51
FIG. 52 FIG. 53
9796
TOPOGRAFIA LEGISLAÇÃO
A Creche localiza-se no final da Rua Professora Otília Cruz, ocupando
um terreno de esquina que possui 6400m².
	 O terreno encontra-se no topo do morro, sendo sua cota mais
acentuada, a cota 42 m. Sendo que o terreno possui uma topografia
irregular entre as cotas 38 e 42, sendo que a parte edificada se estabe-
lece principalmente entre as cotas 40 e 42 m.
	 Devido a grande variação do terreno há várias escadas e ram-
pas, as quais foram inseridas após a reforma e que de certa forma re-
stringem a livre exploração das crianças pelo lugar, haja vista que há
vários portões para a segurança das crianças frente a topografia acen-
tuada.
	
O plano diretorde Florianópolis de 2012, juntamente com o zoneamento
urbano classificam essa área como uma ZMR - 3, ou seja Zona Mista
residencial com uso predominante residencial com média complexidade.
	 O plano diretor determinar que para a ZMR -3 a Taxa de
Ocupação, em 50%, o Índice de aproveitamento máximo como 1,5, a
altura máxima da fachada de 12 a 15 m, podendo construir-se até 4
pavimentos. A relação entre a testada/comprimento do lote é de 1/3 e
quanto aos afastamentos, consta como de 4 metros para as frentes, e 3
metros os laterais.
	 Esta área é também considerada uma ACI, Aréa Comunitária
Institucional, logo seu uso remete a espaços que sirvam a comunidade.
9998
12h12h
10h 10h
15h 15h
E
S
T
U
D
O
S
O
L
A
R
VERÃO INVERNO
101100
PRIMAVERA OUTONO
12h12h
10h 10h
15h 15h
103102
Antes...
Escola Otília Cruz, foi fundada em 22 de Abril de 1958, levando
o nome da Professora Otília Cruz, a qual dá nome também a rua
no qual está inserida.
Otília Cruz moradora da Coloninha lecionou para crianças de
1913 até 1947, em algumas escolas da Grande Florianópolis:
“Na escola José Boiteux na qual lecionou até 1941, foi professora de francês e de
piano. O envolvimento dela com o estabelecimento e com a música foi tão grande
que Otília Cruz doou o piano, de sua propriedade, para a escola. Ela não queria que
as aulas fossem interrompidas após a sua saída.”
(SME Florianópolis, 2014)
Ao conversar com Tânia Ramos, membro da Velha Guarda da Escola de
samba Unidos da Coloninha e líder comunitária da Coloninha, ela con-
tou que o terreno da escola era da família de Otília, o qual foi concedido
ao Estado para que a escola funcionasse. Não há relatos se Otília che-
gou a lecionar na Escola doada pela sua família, visto que se aposentou
em 1947 e a fundação da Escola se deu em 1958, apenas. Porém seu
carinho para com a educação fica evidente na sua trajetória, portanto o
lugar leva seu nome.
“Inicialmente a escola funcionou atendendo classes multisseriadas de 1ª a 4ª séries
e foi a partir de 1958, que foi reconhecida como grupo escolar, matriculando então
os alunos em classes separadas. Em 1973, o governo estadual elevou o estabeleci-
mento à condição de escola básica, quando passou a absorver estudantes de 5ª à
8ª séries. Foi em 1990 que passou a atender também crianças em idade de pré-es-
cola e então em 2000, foi denominada Escola de Educação Básica Professora Otília
Cruz, adaptando-se às normas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996).”
(SME Florianópolis, 2014)
Porém em 2010, com a falta de manutenção da escola (sucateamento e
total descaso) e portanto a frequente migração dos estudantes para out-
ras regiões, a Escola foi fechada alegando-se a falta de alunos, porém o
governo tinha uma nova proposta para esse lugar, transformá-lo em um
presídio feminino, o que culminou em revolta por parte da comunidade.
A
FIG. 54
FIG. 55
105104
C
om o fechamento da escola em 2010, a comunidade local se le-
vantou frente a esta decisão do Estado de torná-la um presídio.
O Otília havia sido por 50 anos parte da história deste bairro,
várias gerações haviam se formado ali e nele aconteciam tam-
bém as festas comunitárias e reuniões do bairro.
Com certeza há muitos motivos para lutar por esse lugar, afinal ele é o
coração da Coloninha.
	 Após dezenas de audiências infrutíferas, a comunidade decidiu
agir, instalaram-se na Escola, porque esse lugar lhes pertencia: perten-
ceu a comunidade antes de pertencer ao Estado. Não deixariam nin-
guém tomar o que era seu.
	 Tânia Ramos, conta que a comunidade passou a utilizar o lugar
como espaço comunitário, ali aconteceram aulas abertas a comunidade,
canto, dança, futebol e até mesmo uma horta cultivada pela comunida-
de., nascia ali o projeto “Amor Coloninha”.
	 O lugar inspirava subvesividade mas ao mesmo tempo, inspirava
ARTE, inspirava vida. Havia vida por detrás dos muros.
	 Segundo Tânia foram 3 anos difíceis, em que muitas ameaças fo-
ram feitas, mas que mesmo assim a comunidade persistiu, pediam que
o lugar fosse doado ao município e que parte do terreno fosse doado a
comunidade.
	 Então em 2014 o pedido da comunidade foi atendido, o espaço
foi cedido pelo Estado para o município, que por meio do projeto de
“municipalização” adotou a Escola tranformando-a em um NEI.
Parte do terreno foi doado para a comunidade para que pudessem cons-
truir um espaço comunitário e para que atividades do projeto “Amor Co-
loninha” pudessem continuar.
	 O Otília agora é um NEI e o centro comunitário ainda não saiu do
papel por falta de verbas. Mas uma vitória já pode ser comemorada. O
Otília reabriu suas portas (Seus muros ainda não).
FIG. 56
107106
o dia da reabertura do Otília, estavam lá as primeiras pro-
fessoras, sorriam ao ver o lugar vivo e cheio de crianças
novamente. (Foto a esquerda)
Para a reabertura, a antiga E.E.B. Otília Cruz foi reformada, com o
objetivo de adaptar o edifício aos pequenos novos usuários.
	 Hoje é composta por 4 blocos, sendo o primeiro e menor, a
parte da secretaria e sala de professores, o segundo bloco a parte
de salas de aula dos bebês de 0-3 anos, o terceiro bloco, separado
por um dos pátios composto também por salas de aulas para cri-
anças de 3-6 anos, e o último bloco, próximo ao pátio coberto é
onde se encontra a cozinha, o refeitório e as salas multi-usos.
	 A creche conta ainda com duas salas num nível inferior, que
pode ser acessado por uma rampa, de um lado a sala simbólica e
do outro a biblioteca, já descritos na página 40 e 41 deste materi-
al, como espaços que a despeito da qualidade das obras públicas,
são esforços dos profissionais para trazer o imaginário e a brinca-
deira.
	 Há ainda uma área sem uso e o espaço da quadra de
basquete, área a qual foi doada pelo município para a comunidade
para a construção de espaço comunitário.
	 É importante ressaltar que a reforma fez adaptações, e não
alterações nas ambiências da antiga escola. A reforma não trouxe
o lúdico ou os espaços da brincadeira como as crianças pedem, ela
não pensou em se abrir para comunidade através de seus pátios,
ela apenas se adequou a exigências mínimas da legislação.
	 O objetivo deste trabalho não é fazer uma crítica a reforma
realizada, mas sim analisar a qualidade do espaço atual buscando
melhorá-lo, nem que de forma apenas projetual e utópica, para
uma comunidade que tem tanto carinho por esse lugar.
N
FIG. 59
FIG. 57
FIG. 58
109108
A reportagem ao lado foi emitida no site
da Prefeitura no período que antecedeu
a reabertura do Otília.
A foto do lado direito foi feita após a
reabertura e já com o espaço em fun-
cionamento, demonstrando que a refor-
ma não alterou as ambiências do lugar,
apenas permitiu que o lugar se tornasse
funcional.
O pátio enquanto espaço rico, lúdico,
integrador e comunitário necessita ob-
viamente ser um espaço rico em insti-
gar. Instigar a curiosidade, a exploração,
a convivência e a aprendizagem.
E para tanto, necessita ser um lugar,
um lugar daqueles que a gente guarda
na memória e quando pensa neles não
lembra de um muro azul ao fundo, mas
lembra das árvores, dos pássaros, dos
brinquedos.
Talvez seja isso que os governantes não
entendam e por isso se contentem com
espaços, ao invés de lugares, com caixas
de areia sem cor, e com o tamanho das
coisas ao invés do valor afetivo delas,
porque afinal a criança não se importa
em medir, ela se importa com o viven-
ciar, com o brincar e com o imaginar.
foto/divulgação: Aline Rebequi/SMC
Obras devem estar prontas até o fim deste mês
12/08/2014 - Educação
NEI Otília Cruz será a maior da cidade em área construída
A Prefeitura de Florianópolis deve
entregar ao Continente ainda este mês,
a maior creche em área construída da
cidade. O Núcleo de Educação Infantil
(NEI) Professora Otília Cruz, na
Coloninha, terá capacidade para cerca
de 200 crianças de seis meses a 6 anos
de idade.
A reforma e ampliação do local, que
funcionou por muitos anos como escola,
iniciou no ano passado e está prevista
para ser entregue no fim deste mês.
Com um investimento de R$ 1,4 milhão, a creche terá 15 salas, anfiteatro, lavanderia,
bercário, sala de convivência, áreas de lazer e parquinhos para os pequenos.
De acordo com o secretário de Educação, Rodolfo Pinto da Luz, esta será maior creche de
Florianópolis em termos de área construída, com 1.371 metros quadrados.
 
"É uma unidade modelo, com equipamentos de ponta. Estamos muito satisfeitos com o
andamento dos trabalhos", disse o secretário, durante vistoria à obra. O prefeito em
exercício, Cesar Faria, e o secretário do Continente, Dejair de Oliveira Junior, participaram
da visita.
"Estou impressionado com a qualidade da reforma, tudo muito caprichado em todos os
detalhes. Tenho certeza de que ela estará no mesmo nível, ou até superior, de creches
particulares", elogiou Cesar Faria.
Atendimento integral
A Otília Cruz irá funcionar em período integral, das 7h30 às 18h30, e irá atender cerca de
FIG. 60
FIG. 61
111110
E
MUROS
MARCAS& ste capítulo, compõe uma série de fotografias realizadas num ensaio de
reconhecimento do lugar, todas as fotos são de minha autoria.
O ensaio fotográfico se intitula “Entre muros & marcas” devido a forte
presença dos muros no entorno e também de “marcas” as quais são considera-
das os traços que caracterizam essa comunidade.
	 A ideia de fotografar o entorno, surgiu da necessidade de conhecer o
bairro para além da rua que morei, a qual está em frente ao Otília Cruz.
	 As fotografias buscam detalhes que para um trauseunte despercebido
não chamariam a atenção, porém elas revelam a profundidade da dureza de
alguns lugares, da beleza de outros, e da aparente neutralidade de alguns.
	 Para acompanhar as fotografias, estão inseridas pequenos trechos da
sensação que me representaram ao serem fotografadas revelando a intimidade
que tenho com o lugar.
	 Para uma melhor apreciação do ensaio fotográfico, sugiro ouvir a trilha
sonora do “O Pequeno Príncipe” em especial a música “Somewhere only we
know” de Lily Allen.
Boa apreciação!
113112
Muro onde estão os
anseios e angústias
expressos por quem
vive o lugar e é este
o mesmo que sepa-
ra duas realidades,
como numa compo-
sição figura-fundo,
destaca-se a grande
ironia:
a desigualdade.
	
O muro alaranjado é a sina do Otília Cruz, cada
camada uma finalidade, a primeira regulari-
za, a segunda impede as crianças de saírem, a
terceira as faz desaparecer. Lá fora caminha
uma garota entre muros, ela apressa o pas-
so enquanto escuta choros de bebês invísiveis.
115114
É quase no final da Rua Otília Cruz que de dentro
dos muros da creche, a árvore frondosa ilumina o
lugar, e é debaixo dos galhos sem folhas da árvo-
re que despontam timidamente as cores, que fazem
lembram que por de trás dos muros existem crian-
ças brincando.
117116
Há aqui uma forte
separação entre a
infância e o mundo
externo presente no
misto de cores vi-
brantes e as grades
e o muro, como que
aprisionando a
felicidade.
Muro onde estão os
anseios e angústias
expressos por quem
vive o lugar e é este
o mesmo que sepa-
ra duas realidades,
como numa compo-
sição figura-fundo,
destaca-se a grande
ironia:
a desigualdade.
119118
O urso aproveita o sol
para se secar, enquanto
nos conta que aqui mora a
infância.
121120
Abro os olhos, vejo
elementos aleató-
rios. Fecho e abro no-
vamente na esperan-
ça que ao acordar o
esqueleto vertical
e os muros da esco-
la não estejam mais
aqui, só haja infância
livre, árvores com
cavalos e um belo
sofá pra sentar na
sombra.
Da terra vermelha, da grama baixa, surgem as ár-
vores viçosas, uma aduba o monstro de concreto a
outra faz sombra ao cavalo e o sofá.
123122
Dentro dos muros se escondem o crianças,
não vendo que lá fora o cavalo está solto e
se abriga na sombra fresca, aguardando com-
panhia para sentar-se no sofá.
A menina assiste
arregalada o que
acontece fora dos
muros, um espaço
inusitado, tem ca-
valo, tem sofá, tem
sombra sobre a gra-
ma verde.
125124
A reforma veio e
trouxe a reabertura
oficial do espaço da
comunidade. Renasce
a creche, os muros
agora são alaran-
jados, fantasmas
coloridos. Será que
esse lugar está do
jeito que a comunida-
de queria? Será?
127126
viva o senso de
vizinhança!
Vivam os olhos da rua!
O grafite no muro
da creche como que
num desabafo reve-
la o tormento que
é ficar calado e
ao apropriar-se do
muro consegue ex-
pressar que calar-
se não é manter as
ideias escondidas,
é expressá-las em
arte! Arte no morro,
que de tão íngrime,
faz o mar parecer
em pé.
Lá na varanda, as roupas
coloridas dão um toque de ale-
gria para a
rotina da dona de casa e a gran-
de árvore faz sombra na roupa.
129128
Bebê a tiracolo, a
mãe caminha apres-
sada, olha para o
chão para não tro-
peçar, a calçada
não é nem de perto
um lugar seguro.
Os muros clamam, que venham em primeiro lugar a paz, e depois a justiça e então a liberdade! Que esse
pedido aqueça esse muro frio e a caminhada nessa calçada estreita.
131130
A árvore é parte
do quintal das suas
casas e é por isso
que transformam o
chão batido em pra-
ça. Essa praça é a
marca da apropria-
ção do lugar pela
comunidade.
133132
Há vestígios de cor-
reria e brincadeira,
mas tudo o que res-
tou ficou pendurado
como denunciando a
felicidade nos esque-
letos das pipas.
A surpresa não é encontrar o
conjunto habitacional em área
tão isolada, mas sim o tanque
no meio da pastagem.
135134
Nasce outro condomínio, logo nasce
outra empena cega. Cega, mas verde.
Em frente a
praça e par-
que infantil
que o condo-
mínio de alto
padrão fez
para a comu-
nidade, há tra-
ços de desejos
de arranjar
marido, num
fundo onde
há apenas um
render sem
calungas.
Divididos pelo mesmo muro, o da direita tem seu
terreno, e o outro está neste terreiro desde 1977.
137136
Ponto de onibus o
espaço público do
encontro e desen-
contro, das meias
palavras, do “será
que vai chover”? O
lugar onde os ros-
tos sem expressão
trocam resmungos
inconformados com
a demora do ônibus.
Quase que imperceptível está o
pedido como que camuflado por
trás dos muros, Queremos mais,
MAIS ARTE, por favor!
139138
Um montoado de lixo, serviço bagunçado,
gente carente, e um pedido conveniente:
Só por Deus!
É sexta a tarde e
a vegetação ca-
mufla os olheiros,
que transformam
a rótula da avenida
em espaço público,
onde sofás velhos
e cadeiras se tor-
nam o ponto dos vi-
gia. Vigiam o que?
Que esse frete leve
para longe todo o
desgosto e que as
árvores predomi-
nem e tornem esse
lugar restaurador.
141140
Háinfâncianomeio
do barraco em
plena sexta-feira
a tarde, infância
inocente, infância
com brinquedo in-
fame, mas que seja
infância e que en-
contre a sorte de
viver para sempre
como criança.
143142
A fortaleza por detrás dos muros abriga nin-
guém, os muros abrigam a fé, e os dois desabri-
gam quem passa.
Na rua do samba pre-
dominam os muros
baixos, o senso de vi-
zinhança o ritmo e a
harmonia.
145144
Na casa do samba não
tem preto nem bran-
co, só tem poesia.
Na parede branca por detrás
das árvores, repousa a mulata
faceira, ela é linda, é cor, é iden-
tidade.
Ser criança é não ver a pre-
cariedade, é se aventurar nos
perigos da tábua solta, da
mesa bamba, do varal torto,
é pular por entre os tijolos
aparentes e quando ao cres-
cer se lembrar que o nome
disso é infância.
147146
O vento balança a bandeira do
time, que quase escondida por
entre a vegetação identifica
o lugar. Estamos perto do Fi-
gueirense.
O cenário pito-
resco assiste o
homem enlou-
quecido que joga
o objeto no chão
repetidas vezes
para que de den-
tro saia o cobre.
Os muros frios, o
encobrem e per-
mitem que possa
manter sua lou-
cura por mais um
tempo.
Em terras de futebol, só tem gente no domingo, e
entre muros e arquibancadas, reina a inseguran-
ça dos dias da semana.
149148
Vestígios de infância nesse
lugar esquecido.
O urso sorri, foi visto por
alguém!
151150
A estrada terminou então
sente-se e descanse nessa
paisagem inóspita, pois se
não há sáida ao menos há
um sofá.
153152
Ao fundo uma escola que mais se parece com um presídio, em suas pare-
des os anseios de pessoas que não encontram seus caminhos e logo na
frente outra grande ironia: O “progresso” trazendo consigo o lazer, a
exclusividade e a confiança, (pra quem puder pagar).
155154
na rua do lazer da
exclusividade e da
confiança moram os
buracos, circulados
pelo cidadão de bem.
As paredes revelam o angústia de um “pro-
gresso” que chegou. E o chão revela que a
“desordem” virou colchão.
157156
O caminho é estreito, mas o muro verde alegra o caminho.
A rua é feita de es-
cadas, pra subir tem
que ter disposição,
carrega a bicicleta
de um lado e do ou-
tro segura o corri-
mão.
159158
Pulsante está
a árvore, quan-
do olham pra ela
cada um vê o que
tem no seu próprio
coração. Aqui des-
te canto ela en-
canta.
Na casa murada, o cadeado. Na árvore livre um coração arromabdo
161160
163162
OS MUROS,
OS VILÕES
Há um ditado popular que
diz:
“Quer fazer amigos? Então
não construa muros, cons-
trua pontes.”
É hora de quebrar os muros
e construir pontes.Pontes
entre a criança e a comuni-
dade, pontes entre a escola
e a cidade, assim talvez tere-
mos lugares amigáveis.
Esta fotografia, tirada há pouco tempo e posterior ao ensaio fotográfico, mostra a pre-
sença dos novos grafites, e a relação dos muros com a escala humana.
FIG. 62
165164
a chaveAFETO
167166
MANOEL DE BARROS
IDADE
por detrás dos
MUROS
FETIV
A
“Acho que o quintal onde a gente brincou é
maior do que a cidade. A gente só desco-
bre isso depois de grande.
A gente descobre que o tamanho das coi-
sas há que ser medido pelo encantamento
que as coisas produzem em nós.”
ste capítulo é baseado na pesquisa de campo realizada por mim
na disciplina de Psicologia Ambiental no Departamento de Psi-
cologia da UFSC intitulada de “Afetividade por detrás dos mu-
ros”.
A pesquisa foi realizada com o objetivo de investigar a afetividade a
partir das influências dos aspectos físicos sobre os usuários do NEI Pro-
fessora Otília Cruz buscando por meio do viés da afetividade, entender
o aspecto emocional que a arquitetura possibilita, proporcionando re-
flexões que possam auxiliar em propostas de intervenções arquitetô-
nicas no espaço da Creche, pois será a partir do entendimento sobre o
que a Creche significa para os seus usuários, enquanto sentimentos e
desejos, que será possível ver pessoas reais por detrás de um muro tão
impessoal.
	 Para adentrar o espiríto desta pesquisa é preciso compreender
o que disse Yi Fu Tuan:
“Espaço é mais abstrato que lugar. O que começa como espaço indife-
renciado transforma-se em lugar a medida que o conhecemos melhor e o
dotamos de valor”.
(TUAN, 2013, p. 14)
	 Logo, explorar a afetividade na arquitetura, é estudar os lugares.
Lugares representam algo, tem valor. Este lugar, o Otília transmite sig-
nificado e sentimentos, as pessoas se identificam com ele, e tem afeto
por ele.
	 A luta comunitária reforça a ideia de que há algo na arquitetura
que vai além do construído, há memórias, histórias, vivências que con-
tagiam as pessoas a ponto de elas não mais olharem para um espaço e
o verem de forma indiferente, mas a ponto de olharem e se verem nele.
	 Acredito que lugares são o que fazem da arquitetura algo tão
incrível, algo que dá essência a nossas vidas. E é por isso que esse tra-
balho busca esse olhar afetivo, um olhar que vê lugares e com isso vê
as pessoas. Logo, o afeto é a chave.
E
169168
Psicologia Ambiental, vertente interdisciplinar da Psicologia
estuda a relação entre o ambiente e o usuário, que é quem vi-
vencia este lugar. Alguns conceitos permeiam a Psicologia Am-
biental como apropriação, identidade social, territorialidade,
pertencimento e afetividade (BOMFIM, 2010).
	 Este trabalho trata especialmente sobre a ‘Afetividade’, já que
busca a compreensão das influências da arquitetura escolar sobre as
pessoas (crianças e adultos) visto que o espaço físico traduz identidades
e sentimentos, como descreve Sawaia:
A cidade, a rua, o prédio, a porta representam modelos de subjetividade enquando porta-
dores de história, desejos, carência e conflitos. Cada cidade, bairro, rua, até mesmo cada
casa tem um clima que não advém, exclusivamente, do planejamento urbano e da geografia,
mas do encontro de identidades em processos – identidades de homens e de espaços. Este
clima perpassa diferentes entidades: eu, corpo, espaço doméstico, etnia, arquitetura. Dessa
forma, os espaços construídos formam discursos e manipulam impulsos cognitivos e afetos
próprios.
(SAWAIA, 1995, P.21)
Como descrito anteriormente há algo nos espaços que os tornam luga-
res, há dimensões subjetivas que trazem o “clima” como diz Sawaia, e
para entender essa relação do homem com os lugares, faz-se necessário
investigar a afetividade.
Afetividade, o conceito
A
Afetividade é tonalidade, cor emocional que impregna a
existência do ser humano e é vivda como sentimento, os reações moderadas de prazer e
desprazer que não se referem a objetos específicos e emoção: fenômeno afetivo intenso,
breve e centrado em objeto que interrompe o fluxo normal da conduta.
(SAWAIA, 1999, p.98)
	 A afetividade enquanto sentimento e emoção, os quais com-
põem a existência do ser humano (SAWAIA, 1999, p.98), podem auxiliar
na investigação da relação entre o espaço construído e os seus usuários,
podendo refletir na relação ambiental entre pessoas e a edificação.
	 A afetividade aplicada ao estudos relacionados ao lugar foram
desenvolvidas pela pesquisadora Zulmira Bomfim, baseando-se na teo-
ria de Vygotsky (BOMFIM, 2010, p. 56), o qual entendia que não há
cisão entre a razão e a emoção, e portanto propõe que se trabalhe a
linguagem emocional e o pensamento a partir dos desejos. Pois segun-
do ele, não há pensamento sem sentimento e vice-versa. (VYGOTSKY,
1991, p.64).
	 Segundo a abordagem histórico-cultural, que tem Vygotsky como
expoente, é a partir da mediação, que o homem compreende o mundo,
por meio dos signos, os quais carregam os conceitos generalizados pela
cultura humana. (REGO, 1995, p. 41-43). Portanto, pode-se compreen-
der a afetividade como uma forma de mediação entre o mundo e o ho-
Mas afinal, o que é afetividade?
mem, por meio do pensamento e da emoção, os quais o orientam e o
permitem entender o que acontece ao seu redor.
	 Dessa forma, é evidente que investigar a afetividade é como
traçar um retrato da visão de mundo de cada indivíduo a partir de
seus pensamentos e emoções através das afecções do corpo, as quais
segundo ESPINOSA (apud BOMFIM, 2010, p. 63) “permitem a com-
posição dos indivíduos com outros” por meio dos bons encontros. Ou
seja, investigar a afetividade é entender o lugar que cada um carrega
dentro de si a partir do que compreende sobre o espaço por inter-
médio de seus sentimentos e relacionamentos. Pois segundo TUAN
(2012, p.19) a visão de mundo de um indivíduo representa as suas
experiências tanto pessoais como sociais.
	 Relembrando como bem disse Rubem Alves (2000, p. 14) “Ah!
Uma vez cometido o erro arquitetônico, o espírito da escola já está de-
terminado!” visto que o lugar pode trazer tanto a topofilia, que carac-
teriza-se como elo afetivo positivo com o lugar que gera sentimentos
de pertencimento e identificação, ou pode ocorrer a topofobia, onde o
indivíduo desenvolve afetos de inquietações e medo quanto aquele lu-
gar (TUAN, 2012), os quais ditarão seu comportamento, seus relaciona-
mentos, seu trabalho e no caso das crianças seu desenvolvimento tanto
cognitivo, social e como afetivo.
	 A afetividade só pode ser investigada quando o olhar encontra-
se sobre as pessoas, pois é delas que provém os sentimentos, emoções,
anseios e pensamentos.
	 Por essa razão este trabalho é dedicado a aplicação no Otília
Cruz, o qual tem como protagonistas as crianças e a comunidade da
grande Coloninha. Haja vista, que é por causa destes atores que hoje
encontra-se reaberto este lugar, espaço com valor (TUAN, 2013).
FIG 63
Esta fotografia tirada no NEI, é de uma miniatura de
árvore, lembra muito o a árvore grande do parque.
171170
Esta distinção remete à questão figura-fundo isto é: ao esclarecimento do foco de um de-
terminado estudo, em termos do tipo de relação tratada: (a) quais as características do
ambiente em função das pessoas - centrado no ambiente, (b) quais os atributos das pessoas
em função do ambiente - centrado nas pessoas.
(GÜNTHER; ELALI; PINHEIRO, 2008, p. 378)
	 Dentre os métodos utilizados, estão o Walkthrough (Centrado
no ambiente), o Mapa Afetivo (Centrado na pessoa), o Mapa visual (Cen-
trado no ambiente) e o Poema dos desejos (Centrado na pessoa).
	 Estes 4 métodos foram utilizados, de forma a se complementa-
rem, o Walkthrough permite um primeiro contato com o espaço físico
por meio dos olhos de um usuário do espaço, o Mapa Afetivo aborda a
relação sentimental e emocional entre os usuários e o espaço, o Mapa
Visual (realizado após o Mapa afetivo) permite ao partipante sintetizar
espacialmente seus sentimentos expressos anteriormente. E o Poema
dos desejos permite uma interlocução com crianças para uma com-
preensão de seus afetos em relação a Creche.
	 A abordagem multimétodos fez-se necessária também, dada a
diferença entre os participantes (adultos e crianças).
Visto que além da diferença cognitiva, ambos percebem o espaço de
formas diferentes:
Afetividade, a prática
ompreender os afetos das pessoas em relação ao lugar onde es-
tão envolvidas não é uma tarefa simples, pois:
Investigar sentimentos e emoções do habitante na cidade é um processo difícil de ser
operacionalizado, porque emoções e sentimentos não são, normalmente, identificados e
nomeados com facilidade. Poderíamos dizer que as sensações, emoções e sentimentos,
como parte de uma linguagem interior, podem ser, muitas vezes, intangíveis como expres-
são exterior.
(BOMFIM, 2008, p. 255)
	 Portanto, para dialogar de forma adequada com os participantes
e compreender os afetos que tanto os adultos como as crianças pos-
suem com o lugar, fez necessária a utilização de métodos que permitis-
sem uma interlocução com os grupos de maneira eficaz.
	 Os pesquisadores Elali, Günther e Pinheiro (2008, p. 381) rein-
teram a importância da abordagem multimétodos no estudo Pessoa
-Ambiente, para evitar-se lacunas e vieses metodólogicos, desde que
considerado o fenômeno a ser estudado e a complementariedade entre
os métodos para que a análise possa ser coerente e sintetizada.
	 Dessa forma, considerando o fenômeno em estudo a ‘Afetivida-
de’ foram utilizados 4 métodos para a pesquisa, dentre eles dois estão
centrados no ambiente e dois são centrados na pessoa:
“O espaço físico isolado do ambiente só existe na cabeça dos adultos para medi-lo, para
vendê-lo, para guardá-lo. Para a criança existe o espaço-alegria, o espaço-medo, o espaço
-proteção, o espaço-mistério, o espaço-descoberta, enfim, os espaços da liberdade ou da
opressão.” (LIMA, 1989, p. 30)
	
Para Mayumi (1989, p. 13-14) o espaço palpável, físico, é como um pano
de fundo, onde as sensações se revelam e deixam marcas, as quais per-
manecem mesmo após a infância. Segunda ela, essas sensações qualifi-
cam o espaço de forma a torná-lo um “ambiente” (Para Tuan um lugar).
Dessa maneira, para a criança não existe dissociação entre o espaço físi-
co e o ambiente (espaço qualificado) pois o espaço para a criança repre-
senta sensações, as quais ela experimenta sem compreender de forma
cognitiva completa o espaço físico, capacidade que o adulto apresenta,
o qual traz a ele maior impessoalidade e a capacidade de perceber o
espaço sem necessariamento tê-lo como lugar.
	 Não há como negar que os aspectos ambientais exercem impor-
tante papel sobre o adulto e sobre a criança, ambos percebem o espaço,
e ambos são influenciados por ele, porém o que é importante ressaltar
é que a percepção de ambos é diferente, visto que o adulto devido ao
seu desenvolvimento tanto cognitivo quanto social já foi muito mais in-
fluencido pela cultura (REGO,1995, p. 41-43) na qual está inserido e sua
forma de compreender o mundo é muito mais mediada pelos aspectos
lógicos e intelectuais. Enquanto a criança, possui seu desenvolvimento
cognitivo em desenvolvimento e portanto o que lhe apreende a atenção
são os signos que lhe são traduzidos como sensações e sentimentos,
antes mesmo de saberem o seu significado cultural.
	 Para o adulto é muito mais difícil abstrair o mundo cognitivo do
que para a criança. Portanto, para investigar a afetividade é necessário
que os métodos utilizados dialoguem com o participante, seja ele, adul-
to ou criança de forma a conseguir traduzir e exteriorizar a afetividade.
	 É importante ressaltar que antes de ir à campo, a estruturação
dos métodos contou com variadas leituras que percorreram especial-
mente BOMFIM (2013) e RHEINGANTZ et al. (2007;2009), devido a
relação com o estudo da afetividade e a abordagem multimétodos em
Avalição Pós-Ocupação, tratados respectivamente.
	 Portanto, após a leitura destes materiais somado a todo o re-
ferencial teórico lido ao longo do semestre tanto na Disciplina de Psi-
cologia Ambiental com a Profª Ariane Kuhnen, como na Disciplina de
TCC I com a Profªa Vanessa Dorneles, foi possível adaptar os métodos
pesquisados para o contexto do Otília Cruz.
	 Em dois dos métodos mencionados, o Mapa Afetivo e o Poema
dos desejos, foi realizado um teste piloto, com duas moradoras do en-
torno próximo da Creche (minha mãe e minha irmã de 3 anos), para de-
tectar possíveis inconclusões e perceber falhas que pudessem ser corri-
gidas antes da aplicação real, visto que era uma adaptação do método. 	
O que demonstrou ser bem importante, pois algumas perguntas feitas
tanto a adulta quanto a criança, puderam ser aprimoradas, para que me-
lhores resultados fossem obtidos. Assim foi possível reformular alguns
itens da pesquisa e estabelecer uma duração média de 15 minutos para
cada participante.
C
173172
WALKTHROUGH
O Walkthrough, ou caminhada pelo
local, é um método de análise espa-
cial que combina a observação com a
entrevista. Tem como objetivo esta-
belecer um contato inicial com o local,
onde o pesquisador é acompanhado de
uma pessoa-chave. (ELALI et al., 2008;
RHEINGANTZ et al., 2009). Essa cami-
nhada pode ser complementada por fo-
tografia ou croquis... Que permitam ao
pesquisador um primeiro contato com
as ambiências espaciais, percebendo o
conjunto espacial com suas positivida-
des e carências.
	 O primeiro Walkthrough foi reali-
zada pelo Arquiteto Kevin Lynch quan-
do levou um grupo de participantes
voluntários para uma caminhada-en-
trevista por Boston para compreender
qual a imagem que tinha da área cen-
tral da cidade. O método foi reconheci-
do cientificamente pelos anos 60 e 70
com o advento da Psicologia Ambiental
(RHEINGANTZ et al., 2009, p. 24)
	 Este método precede os estudos
mais aprofundados, onde é possível ter
a “primeira impressão” sobre o lugar e
permite auxiliar a pessoa-chave a arti-
cular suas sensações em relação ao edi-
fício. (RHEINGANTZ et al., 2009, p. 29).
ste método foi aplicado na primeira visita
intramuros, que fiz ao NEI Otília Cruz. Fui
recebida pela diretora Fabrícia Luiz de Sou-
za, sendo que primeiramente tivemos uma
conversa em sua sala onde ela me contou um pou-
co da história do lugar e durante a nossa conversa
perguntei a ela, o que ela mais gostava no quesito
espacial da creche e o que ela menos gostava. Ela
então me convidou a conhecer a Creche com ela.
	 Começamos a caminhada, e com a autori-
zação dela fui fotogrando os ambientes que mais
atraiam minha atenção –
Ver próxima página (a úni-
ca restrição era não foto-
grafar as crianças).
Ela me levou então ao local
que mais lhe agradava, ao
pátio central (Fig. 3A) que
para ela possuía uma clari-
dade muito agradável e era
um lugar amplo, onde as crianças podem praticar
diversas atividades, utilizando também as caixas de
areia.
	 E logo ao lado se encontrava o que ela me-
nos gostava espacialmente (Fig. 3B), o pátio é con-
formado por dois blocos, sendo que o bloco a es-
querda possui suas portas se abrindo para o pátio e
o bloco a direita possui suas portas abrindo para os
fundos da Creche, consistindo em erro de projeto
(o bloco deveria ter sido espelhado), portanto isso
aumentava as distâncias percorridas e diminuía a
interação entre as crianças por entre o pátio.
	 Visitamos ainda as salas de aula dos dois
blocos, e os espaços que se encontram em um nível
inferior e que são acessados por uma rampa, onde
estão a sala simbólica (Fig. 06) e a biblioteca (Fig.
07), dois espaços muito tranquilos e humanizados
pelos próprios professores, próximos a árvores e
do gramado, onde podem se ouvir passarinhos no
meio da tarde.
	 Visitamos também o pátio coberto, onde
fica o refeitório, e seguimos até a área externa e
cercada da Creche onde existe uma área aberta as
vezes utilizada para educação física e também há o
acesso até a quadra que devido a fortes chuvas ha-
via desmoronado e não foi
possível visitar. Esta área
está abandonada, pois a
comunidade não consegue
recursos governamentais
para a construção do cen-
tro social.
O Walkthrough foi mui-
to importante para um
primeira impressão sobre a realidade por de-
trás dos muros, pois mesmo tendo morado
durante 4 anos em frente a Creche conhecia
apenas a realidade extramuros, a qual é muito
diferente das ambiências vivenciadas lá fora.
Lá dentro o muro não é ameaçador, é quase
um aliado, o espaço opressor de quem vê lá
de fora, lá dentro é quase como um refúgio,
onde cantam até passarinhos. As percepções
as quais experienciei, puderam dar sentido a
continuidade deste trabalho.
(As fotografias são acervo pessoal)
E
“Próximo as árvores e
o gramado, podem se
ouvir
passarinhos cantando
no meio da tarde.”
175174
08
01 02A 03A02B 03B 04 05
07A
07B0809A09B09C09D
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Thalessa TCC - Na casa da imaginação

  • 1. 1 MAGINAÇÃ daNa CASA Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola I O
  • 2. 32 MAGINAÇÃ daNa CASA Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola I O FIG. 01
  • 3. 54 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Trabalho de conclusão de curso por Na cASA da Imaginação Thalessa Maia Germanovix Orientadora Vanessa Goulart Dorneles Florianópolis 2016 “Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desapren- dam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob con- trole. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pás- saros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros cor- agem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.” RUBEM ALVES Um olhar afetivo sobre a criança, a comunidade, os muros e a escola
  • 4. 76 screver os agradecimentos deste trabalho, é ter a oportunidade de perceber como estou cercada de pessoas es- pecias, as quais foram fundamentais para que eu chegasse até aqui, me perdoem se as palavras não significarem tanto, pois como disse Manoel de Barros “Onde estou as palavras não me acham”. Quero agradecer em primeiro lugar a Deus, o maior arquiteto que eu poderia ter como inspiração! Ao meu amado André, que esteve ao meu lado durante esse período, você é o engenheiro/bombeiro mais arquiteto que eu conheço! Te amo! Aos meus pais, Josiane e Carlos, agradeço muito por acreditarem em mim e por me apoiarem ao longo deste tempo de graduação, sei o quanto vocês oraram e torceram por mim! Mãe, você não faz ideia de quanto os seus abraços signifi- caram ao longo da faculdade, muito obrigada por cuidar de mim! Amo vocês! Thaíssa, muito obrigada por me lembrar como é ser criança e alegrar alguns dos meus dias mais difíceis, nunca vou esquecer quando um dia te perguntei como seria a escola mais legal do mundo e você me disse que nela teriam baldes para carregar os brinquedos, cavernas e princesas! Você é demais, maninha! Agradeço também ao meu avô Ivo (in memorian) o primeiro “arquiteto da família”, você me inspirou a arquitetar. Sei que terias orgulho de mim! Quero agradecer também a minha orientadora Vanessa, obrigada por todos os vôos os quais você me encorajou a voar, e por sonhar este projeto comigo! Obrigada mesmo! Você foi uma daquelas pessoas que entram sem querer na nossa vida e fazem toda a diferença! Agradeço ainda as pessoas queridas do NEI Otília, a Fabrícia, a Fernanda e a Janaina, que me deram o prazer de vi- venciar a realidade por dentro dos muros do Otília e me fizeram ver o grande carinho que tem por esse lugar! Obrigada, sem vocês não teria sido possível! Agradeço ainda as grandes amigas que fiz ao longo da graduação, Dani, Maitê e Amanda! Sem dúvidas aprendemos muitas juntas e sou muito feliz em saber que essa amizade continuará para além da faculdade! Agradeço a minha grande amiga Jéssica Melo, que me acompanhou na exploração fotográ- fica pelo bairro me emprestando sua tão preciosa câmera e sua sensibilidade de fotógrafa! E quero agradecer ainda as amigas que mesmo durante minha ausência não mediram esforços para me deixar pala- vras de incentivo e carinho, obrigada Ruth, Alê, Manu, Carol, Maynã e Lauren! Família e amigos, muito obrigada por todo apoio, carinho, incentivo e paciência, meu coração transborda de GRATIDÃO! OBRIGADA, E
  • 5. 98 Objetivo........................................... Metodologia................................... ERA UMA VEZ............................... PEDAGOGIA E ARQUITETURA... Desenvolvimento infantil.............. Correntes pedagógicas.................. Educação infantil e o Brasil........... A criança, o lugar e o brincar........ O pássaro.......................................... ESPAÇOS EDUCATIVOS............... A escola e a comunidade............... O pátio, espaço integrador............ Os heróis........................................... O LUGAR........................................... Da minha janela............................... Um lugar chamado Otília Cruz..... Entre muros e marcas................... Os vilões.......................................... AFETIVIDADE POR DETRÁS DOS MUROS................................. Afetividade, o conceito................ Afetividade, a prática................... Walkthrough...................... Mapas afetivos.................. Mapas visuais.................... Poema dos desejos........... A chave............................................. DIRETRIZES PROJETUAIS.......... CPD.................................................. INTERVENÇÕES. ARQUITETÔNICAS...................... Muros............................................... Espaços edificados........................ Espaço não-edificados................. VOARAM FELIZES PARA SEMPRE.......................................... Bibliografia...................................... 10 12 14 20 22 28 38 42 58 56 58 60 73 80 82 84 110 160 164 166 168 170 176 182 188 182 196 198 204 206 210 214 220 224 UMÁRIOS
  • 6. 1110 específico geral espertar novas ambiências a partir da afetividade dos usuários (crianças e a comunidade) para com o lugar, estimulando o imaginário infantil e a apropriação da comunidade por meio de intervenções arquitetônicas lúdicas que integrem o ambiente escolar ao bairro. romovervitalidade, permeabilidade e integração no espaço escolar Otília Cruz tendo como base os afetos, desejos e inquietações compartilhados pelos usuários e comunidade além de minha própria vivência enquanto vizinha do lugar, por meio de: Reformas, as quais não modifiquem a espacialidade formal já conhecida pela comunidade por 50 anos, mas que permitam um uso mais livre, lúdico, comunitário e integrador. Revitalizações de espaços sem uso, a partir de projeto paisagistico e arquitetônico que dialogue com a linguagem do bairro, promovendo a apropriação comunitária, tornando as atividades do terreno um conjunto. Intervenções lúdicas que promovam a brincadeira, o desenvolvimento infantil, o imaginário, a integração social, o espaço enquanto lugar convidativo, cativante, dinâmico. D P BJETIVOO
  • 9. 1716 ar asa a imaginação é a inspiração para a alçar vôo rumo a um olhar afetivo para com a criança, a comunidade, os muros e a escola, fa- zendo nascer a Casa da imaginação, um lugar que é em parte real, e em parte uma história. Os personagens não são aqueles que você vê comumente nos livros, estes são alegorias que tornam a história um lugar, e o lugar uma história. A crianças, são as protagonistas, são elas que voam mais alto, sendo que seu vôo depende de quão grande o céu lhes parece. A comunidade, personagem muito importante, tem papel fundamental na bus- ca por céus maiores, onde se possa voar livremente e sem medo. Os muros, limitam os céus, enquanto contam a mentira de que foram feitos para a segurança das crianças e da comunidade. A rua carece de olhos, logo, os muros precisam ser quebrados. A afetividade, é o que torna o lugar a história, é o que dá cor ao comum. A escola é quem encoraja os pássaros e todos aqueles que possuem asas a voar mais alto. Afinal como disse Rubem Alves, “Ensinar o vôo, isso elas [as escolas] não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros.” Este lugar-história cresceu dentro de mim, pois vivi junto das crianças, da co- munidade, dos muros e da escola. Não conto sobre o que ouvi, conto sobre o que vi com meus próprios olhos e imaginei ao voar com as asas da minha imaginação e do meu coração. Essa é definitivamente uma história que vale a pena ser contada! D
  • 11. 2120 PEDAGOGI QUITETUR a AR & pedagogia enquanto ensino e a arquitetura enquanto lugar pro- movem discursos, transmitem mensagens. Não existe pedagogia sem ideologia e não existe arquitetura que não reflita o tempo e o espaço em que se insere. E é nas escolas que estes dois discursos se encontram, mas não podem coexistir, já que ou o discurso pedagógico sub- metirá a arquitetura a sua ideologia, ou a arquitetura influenciará a pedagogia com sua linguagem. Portanto, é de ex- trema importância compreender como a pedagogia e a arquitetura podem se ali- nhar para criar uma escola que trasmite a mensagem correta influenciando a crian- ça durante seu desenvolvimento. Para Anita Olds (1979, p. 137) “na crian- ça a motivação para interagir com o am- biente existe como propriedade intrínse- ca à vida. Mas a qualidade das interações depende do engajamento que o ambien- te permitir. E o espaço é o currículo e o parâmetro físico da escola, e pode ser manipulado pelos professores como um aspecto essencial do processo educati- vo”. Talvez a melhor forma de aliar pedago- gia e arquitetura seja compreendendo A “Acredito que as escolas começam quando os alunos não sabem que são alunos, os professores não sabem que são professores e es- tão todos debaixo de uma árvore.” LOUIS KAHN os espaços escolares como lugares (TUAN, 2013, p. 14), os quais estabelecem um vín- culo entre a pessoa e o ambiente, dotando -o de valor. Portanto não basta enxergar a pedagogia e a arquitetura como discursos isolados, ou até mesmo como meros dis- cursos, mas como possibilidades que aco- lhem e promovem as sensações, o desen- volvimento e as experiências (LIMA, 1989, p.13) É por isso que na afirmação de Kahn está implícito que antes de ser aluno ou pro- fessor, o ser humano é um ser sociável e influenciável pela ambiência dos lugares, fatores que facilitam o discurso, o aprendi- zado e o desenvolvimento.
  • 12. 2322 Há duas abordagens comumente difundidas no meio psico-pedagógico, as quais estudam o desenvolvimento infantil e que são de inter- esse para este trabalho, as quais são: A abordagem cognitivista a qual tem como principal expoente Jean Piaget e a abordagem histórico-cultural com Vygotsky. As duas abordagens dedicam-se a com- preender o desenvolvimento da criança du- rante seus primeiros anos de vida. Alguns es- tudiosos consideram-as contraditórias, pois há divergência entre os próprios autores sobre alguns pontos, porém, podem ser considera- das complementares se analisadas do ponto de vista de que focalizam tipos de desenvolvi- mento distintos e portanto podem coexistir, já que Piaget atribui maior ênfase ao desenvolvi- mento físico e cognitivo enquanto Vygotsky aborda o desenvolvimento psicossocial como maior fator no desenvolvimento infantil. ABORDAGEM COGNITIVISTA A abordagem cognitivista de Piaget, influenci- da por sua formação biológica, entende o de- senvolvimento da criança como que de dentro para fora, no sentido de que os impulsos in- ternos que ao longo do desenvolvimento são Desenvolvimento Infantil O mento infantil compõem um vasto campo de estudo, por onde permeiam diversas teorias e linhas de pensamento. A análise portanto, será sucinta e direcionada ao projeto de arquitetu- ra. Há basicamente 3 tipos de desenvolvimento sobre os quais os cientistas concordam: Desenvolvimento físico: relacionado ao ama- durecimento do corpo e do cérebro, permitin- amadurecidos permitem ao indivíduo atuar no mundo exterior. (HENRIQUES, 1993; PRADO 2015; REGO 1995). Piaget desenvolve então os quatro es- tágios de desenvolvimento: Sensório motor (do nascimento aos 2 anos): Este estágio corresponde ao início da vida do bebê, neste momento se estabelece uma relação com o meio externo por meio das sen- sações e movimentos, os quais não são vol- untários, mas ações reflexas. Este estágio é divido em 6 subfases, as quais interessam ao arquiteto, visto que po- dem auxiliar nas ambiências e experiências que propostas. Segundo TEODORO (2013, p. 27) são estas as subfases: Reflexo (0 ao 1° mês) -A criança e o meio são percebidos por ela como um só. -Não há controle motor. Braços e pernas são desconhecidos. -Os reflexos são acionados quando algo entra no campo perceptivo da criança. Reações Circulares Primárias (1° ao 4° mês) -Início das imitações -Tendência a repetir experiências agradáveis -A criança não conserva o objeto que sai do seu campo visual -Exploração do próprio corpo Reações Circulares Secundárias (4° ao 8° mês) -A criança começa a perceber o mundo como -separado dela. -Início da conservação de objetos desapareci- dos pela continuação da ação. -Início da exploração do meio. Reações Circulares Coordenadas (8° ao 12° mês): -A criança já consegue achar objetos que saíram do seu campo de visão. -Aperfeiçoamento da capacidade de assimi- lação. -Movimentos intencionais. Reações Circulares Terciárias (12° ao 18° mês): -A criança é capaz de procurar objetos desapa- recidos; -Comportamentos exploratórios ou de experi- mentação. Início do Simbolismo (18° ao 24° mês): -A criança já consegue pensar sobre um fato sem ser preciso vê-lo na prática; do as habilidade motoras e sensoriais. Desenvolvimento cognitivo: o qual diz respei- to a inteligência e a lógica, relativos portanto a aprendizagem, a memória, ao pensamento e a criatividade. Desenvolvimento psicossocial: relativo aos relacionamentos sociais e a personalidade. desenvolvimento pode ser entendido como o conjunto de transformações os quais os indivíduos vivenciam ao longo de suas vidas. (ELALI, 2002). É porém, nos primeiros anos de vida que a pes- soa sofre o maior número de transformações em um curto espaço de tempo, sendo essas mudanças de extrema importância para seu amadurecimento e crescimento enquanto ser humano. Tuan afirma que “a criança é o pai do homem, já que as categorias perceptivas do adulto, são de vez em quando impregnadas de emoções que pro- cedem da primeiras experiências”(2013, p.32) As primeiras semanas de vida movimen- tos são limitados mas com o passar do tempo se vêem evoluções no movimento. A criança, antes um bebê, adquire a capacidade de exe- cutar com cada vez mais precisão os movimen- tos permitindo-se ao longo do tempo explorar o espaço ao seu redor. Os estudos relacionado ao desenvolvi-
  • 13. 2524 to, ou seja para ele o processo de desenvolvi- mento das funções psicológicas superiores não é inata ao homem, ela depende da relação da criança com sua cultura. (REGO, 1995). Rego (1995) comenta que Vygotsky chamava atenção para o termo “jardim de in- fância” que indicava a concepção botânica que havia quanto ao desennvolvimento infantil, en- quanto algo botânico, algo que já está instrín- seco ao homem. A abordagem histórico-cultural de Vy- gotsky está alicerçada em alguns princípios básicos dentre os quais para fins deste tra- balho destaca-se em REGO (1995, p. 41 -43): Interação sócio-cultural Para Vygotsky as características típicas do homem, ou seja, o que o difere enquanto ser racional, não estão presentes desde o nasci- mento do indivíduo e não existem dentre dele como que esperando para aflorar, para ele, o desenvolvimento humano é proveniente da in- teração entre o homem e seu meio sócio cultur- al. É portanto a partir dessa interação em que o homem modifica seu meio, que seu desen- volvimento vai acontecendo, ou seja segundo ele as funções psicológicas humanas surgem da interação das características biológicas com a cultura em que está inserido. Origem cultural das funções psíquicas A interação sócio-cultural traz consigo a ideia de que a origem da cultura, portanto é baseada nas funções psíquicas do homem, já que ao in- teragir com a cultura que o homem a transfor- ma e transforma a si mesmo. Logo, a cultura constitui a natureza humana e o indivíduo pos- sui seu desenvolvimento a partir da internal- ização dela. Cérebro Vygotsky não nega a importância das funções biológicas, pelo contrário, são elas a base do funcionamento psíquico o qual ocorre por meio do cérebro. É portanto, a partir da ativ- idade cerebral que o indíviduo interage com a seu meio exterior, reagindo a ele. Para Vygot- sky o cérebro é um órgão que mesmo sendo a base do funcionamento psicológico, não é imutável e fixo, é moldado ao longo da vida. Mediação A mediação para Vygotsky representa os in- strumentos técnicos e os sistemas de signos, que foram construídos historicamente na cul- tura humana e permitem a interação do homem com os demais indivíduos e do homem com seu meio exterior. A linguagem por exemplo, é um signo que permite que o homem se comu- nique e interaja com os demais de sua cultura ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL A abordagem histórico-cultural proposta por Lev Vygotsky tem como objetivo entender o comportamento humano baseado nos as- pectos típicos, permitindo conhecer as carac- terísticas que levam o ser humano a ser desen- volver (REGO, 1995). Vygotsky diferentemente de Piaget, entendia que o desenvolvimento infantil es- pecialmente no que diz respeito as funções psicológicas superiores, tais como a memória, o pensamento, a atenção voluntária, se dava de fora para dentro, ou seja o mundo exteri- or, as relações sociais e na “internalização de formas culturais” (REGO, 1995, p.39) são as re- sponsáveis por gerar os impulsos internos. Basicamente, Piaget detalha as etapas do processo de desenvolvimento cognitivo, enquanto Vygotsky aborda o que desencadeia esse desenvolvimento que para ele é a relação sócio-interativa. Portanto, ambas as aborda- gens podem ser entendidas como complemen- tares quando sob a ótica de que uma focaliza o “o que”, e a outra o “como” permitindo um estudo mais completo do desenvolvimento humano, haja vista sua complexidade, que não pode ser explicada apenas levando-se em con- ta o desenvolvimento físico ou apenas o de- senvolvimento piscossocial. Porém, paraVygotskya relação sócio-in- terativa é determinante para o desenvolvimen- -Noção do próprio corpo a partir do corpo do outro. Pré-operacional (dos 2 anos aos 7 anos): Neste período a criança se comunica por meio da linguagem, e a presença do simbolismo tor- na-se bem presente , sendo que ela reconhece os símbolos e os utiliza para a representação. A presença da função simbólica é algo muito importante neste estágio, visto que pode ser estimulada por meio do lúdico e do faz-de-conta. (PRADO, 2015). Porém, como se trata da fase pré-operacional a criança ainda não se utiliza do pensamento lógico, logo, tem dificuldade em compreender o conceito de ir- reversibilidade e conservação de massa. (TEO- DORO, 2013). Essa fase é marcada também pelo ego- centrismo, ou seja a criança não consegue perceber o mundo ao seu redor a partir do ponto de vista de outra pessoa. Tudo está rela- cionado com seu mundo e com seus sentimen- tos. (TEODORO, 2013). Operacional concreto (dos 7 anos aos 11 anos): Neste estágio a criança já consegue solucion- ar operações, como soma, subtração, divisão e multiplicação, consegue também entender os conceitos de irreversibilidade e conservação de massa, além de solucionar questões envolvendo situações, porém ainda não é capaz de pensar de forma abstrata, seu pensamento flui de forma concreta, ou seja seu raciocínio baseia-se em acontecimentos verídicos. (PRADO, 2015; TEO- DORO, 2013). Operacional formal (dos 11 anos em diante): Este é o período marcado pelo pensamento abstrato, a criança agora é capaz de pensar além do concreto. É neste momento que conceitos subjetivos podem ser compreendidos. Neste estágio o indivíduo consegue solucionar situações hipotéticas e lidar com situações abstratas. (PRADO, 2015; TEODORO, 2013). Para Elali (2002) cada um dos estágios depende da etapa anterior para que o indivíduo evolua para a fase seguinte, porém entende-se que as características individuais são responsáveis pela velocidade de transição entre os estágios. Portanto o conhecimento não pode ser ensinado, apenas estimulado por meio de experiências, as quais por meio do erro e acerto direcionam o indivíduo a adquirir novas habilidades.
  • 14. 2726 Portanto, considerando-se tanto a abordagem cognitivista como a abordagem histórico cultural é possível, segundo Prado (2015) compreender e se utilizar de mecanismos que podem ser fer- ramentas educacionais as quais podem qualificar o desenvolvimento infantil. Sendo elas, o encorajamento à exploração, a comemoração das novas conquistas, o incen- tivo ao uso da linguagem e símbolos, direcionamento para a realização de novas tarefas e desen- volvimento de novas habilidades, e a ausência de correção durante o processo de exploração. Logo, considerando-se tanto a abordagem cognitivista como a abordagem histórico cul- tural é possível, segundo Prado (2015) compreender e se utilizar de mecanismos que podem ser ferramentas educacionais as quais podem qualificar o desenvolvimento infantil. Sendo elas, o encorajamento à exploração, a comemoração das novas conquistas, o incentivo ao uso da linguagem e símbolos, direcionamento para a realização de novas tarefas e desen- volvimento de novas habilidades, e a ausência de correção durante o processo de exploração. ao mesmo tempo que o auxilia no processo do pensamento (compreensão do mundo exte- rior). Logo, a interação com o meio socio-cul- tural por parte do homem não é uma relação direta, mas realizada por meio de ferramentas auxiliares. A importância atribuída por Vygotsky “a interação sócio-cultural é de extrema im- portância para sua teoria, haja vista, que para ele a estrutura fisiológica humana não é sufi- ciente para produzir o indivíduo humano na ausência do ambiente social” REGO (1995, p. 57-58). Sua teoria é embasada ainda no caso verídico das chamadas “meninas-lobas” en- contradas na Índia, vivendo entre lobos, elas não apresentavam praticamente nenhuma característica humana, não ficavam de pé, não falavam, não pensavam logicamente e se ali- mentavam dos alimentos dos lobos, este acon- tecimento reforça para Vygotsky a ideia de que quando fora do meio sócio-cultural o homem é insuficiente para desenvolver-se enquanto ser humano. (REGO, 1995). Na cultura na qual o indivíduo estiver inserido cabe ao adulto transmitir aos bebês os costumes, os instrumentos e o signos de sua cultura. Portanto, as conquistas individuais re- sultam de um processo compartilhado. Ainda em Vygotsky encontra-se um conceito muito interessante relacionado a in- teração entre o aprendizado e o desenvolvi- mento, que é a zona de desenvolvimento proximal. Vygotsky identifica dois níveis de de- senvolvimento, os quais são o desenvolvimen- to efetivo e o potencial. O primeiro se refere as conquistas já consolidadas na criança, as quais são as capacidades as quais por meio de sua relação com os outros humanos e com sua cul- tura, ela já aprendeu e pode realizar de forma independente. Já o desenvolvimento poten- cial, se refere ao que a criança é capaz de faz- er, porém somente mediante a ajuda de outra pessoa (seja ela uma criança mais velha ou um adulto). A distância entre o que ela faz de for- ma autônoma e o que ela realiza com o auxílio de outros é o chamado desenvolvimento prox- imal, ou seja as funções ainda não amadure- ceram na criança, mas se estimuladas podem se tornar parte de seu desenvolvimento efeti- vo. Portanto, desafiar a criança e estimular seu pensamento é uma forma de qualificar seu de- senvolvimento. Logo, o ato de brincar, em especial a brincadeira de faz-de-conta é “uma impor- tante fonte de promoção do desenvolvimento” REGO (1995, p. 80) já que por meio dela se in- troduzem novos conceitos, os quais alargarão seu desenvolvimento proximal, e logo farão parte de seu denvolvimento efetivo. A brinca- deira permite representar o simbólico, permite imaginar. O brincar estimula o pensamento que antes era determinado pelos objetos reais a ser regido pela imaginação. Portanto, é por meio de Vygotsky que é possível compreender a necessidade da in- teração do indivíduo com os outros e com seu meio e ainda a necessidade de estimular a cri- ança para que seu desenvolvimento seja rico em experiências. O ato de brincar, em especial a brincadei- ra de faz-de-conta é “uma importante fon- te de promoção do de- senvolvimento” já que por meio dela se intro- duzem novos concei- tos, os quais alargarão seu desenvolvimento proximal, e logo farão parte de seu denvolvi- mento efetivo. A brin- cadeira permite re- presentar o simbólico, permite imaginar.
  • 15. 2928 Portanto em resposta a escola tradicional surgiram alguns outros métodos pedagógi- cos, os quais são fruto dos estudos sobre o desenvolvimento infantil, logo nomes como Emília Ferreiro (Construtivismo), Maria Mon- tessori, Rudolf Steiner (Método Waldorf), Loris Malaguzzi (Reggio Emillia) e outros abriram as portas para uma nova forma de abordar o ensi- no e a aprendizagem. O fator principal que torna estes métodos, tão distintos do método tradicional é devido a forma como vêem a criança, como ser único e capaz de por meio da curiosidade, explorar, questionar e aprender. Tornando-se um indívid- uo completo, não apenas cognitivamente, mas emocional e socialmente. Já que como dizia Rubem Alves “O ato de aprender acontece em resposta a um desejo” (2010, p. 11). Corrrentes Pedagógicas educação escolar enquanto método pedagógico, encontra várias aborda- gens, as quais procedem de diferentes compreensões de quem é a criança e de sua relação com o mundo. Sabe-se que foi a partir da Revolução Industrial que as escolas enquanto instituições ganharam força já que viu-se a necessidade de se gerar pessoas capacitadas para o trabalho, logo não havia preocupação com a criança ou seu desenvolvimento, mas sim com o ensino massificado e formail, ignorando-se a unici- dade do indíviduo. As escola tradicionais permearam muito séculos e ainda são encontradas enquanto es- trutura rígida, as quais podem ser comparadas a fábricas com suas linhas de montagem, visto que trabalham com a fragmentação do ensino, aplicam teste de qualidade, usam uniformes, possuem apitos.: As linhas de montagem denominadas escolas se organizam segundo coordenadas espaciais e temporais. As coordena- das espaciais se denominam “salas de aula”. As coordenadas temporais se denominam “anos” ou “séries”. Dentro dessas unidades espaço-tempo os professores realizam o processo técnico-científico de acrescentar sobre os alunos os saberes -habilidades que, juntos, irão compor o objeto final. Depois de passar por esse processo de acréscimos sucessivos - à seme- lhança do que acontece com os “objetos originais” na linha de montagem da fábrica- o objeto original que entrou na linha de montagem chamada escola ( naquele momento ele chamava “criança”) perdeu totalmente a visibilidade e se revela, então, como um simples suporte para os saberes habilidades que a ele foram acrescentados durante o processo. A criança está, finalmente formada, isso é, transformada num produto igual a milhares de outros. (ALVES, 2010, p. 2-3) A arquitetura das escolas tradicionais apre- senta a mesma rigidez presente no sistema ed- ucativo, a formalidade torna o espaço escolar uma instituição, logo enquanto instituição não dialoga com a cidade, é superior a ela, rejeita o entorno e não se abre para o mundo exterior, o que pode-se perceber nos muros altos. (FER- REIRA, 2011). A FIG. 03
  • 19. 3736 "Se um médico do Século XX entrar numa sala de cirurgia do Século XXI, ele consegue operar? Não. Ele não consegue operar. Ele mal consegue en- tender o que é que tem ali. Onde é que está o paciente? Agora, se um pro- fessor do Século XIX entrar na sala de aula do Século XXI, ele vai achar muito diferente? Não vai. Ele vai ver ali a lousa, o giz, as carteiras enfileira- das, a lista de chamadas, tudo conforme era no Século XIX. A única coisa que ele não contava era com a cabeça dos alunos do Século XXI. É aí que está o conflito, pois a sala de aula do Século XXI não é mais aquele quadra- do, é praticamente um planeta, porque, com as novas tecnologias, o planeta é o espaço de aprendizado das pessoas agora". SIMONE ANDRÉ
  • 20. 3938 Educação infantil e o Brasil A educação infantil, está para além da instituição, ela remete à criança, ser humano cheio de vida. (DIDONET, 2001). Logo, limitar a educação infan- til aos aprendizados escolares, é restringi-la. Pode-se considerar que a educação infantil envolve todos os aprendizados dos primeiros anos de vida da criança, os quais ela obtém por meio da relação e interação com seus seme- lhantes, antes mesmo de ir a escola. (DI LELLO, 2012) A educação infantil no mundo, enquan- to instituição, teve seu início na Europa no sé- culo XVIII, devido a transição do sistema feu- dal para o capitalismo, onde de um modo de produção doméstico há a passagem pra um modo de produção em fábricas. Logo, com a Revolução Industrial e a entrada da mulher no mercado de trabalho, a forma de organização familiar adquiriu um novo rumo. (DI LELLO, 2012) Apesar dos impulsos direcionados para a assistência de crianças durante este período, foi somente após a Segunda Guerra que houve a preocupação com as necessidades emocio- nais da criança, com estudos sobre o desenvol- vimento infantil e a compreensão da importân- cia dos primeiros anos de vida para a criança. No Brasil, foi apenas a partir dos anos 80 que conquistas históricas legais relativas à criança e sua educação foram conquistadas, com a Constituição Federal em 1988 e com Es- tatuto da Criança e do adolescente em 1990. Mais recentemente o governo tem se preocupado em traçar diretrizes nacionais re- ferentes a construção de espaços de educação infantil, assim como diretrizes curriculares as quais norteam as propostas pedagógicas e es- tão baseadas nos princípios: Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solida- riedade e do respeito ao bem comum, ao meio am- biente e às diferentes culturas, identidades e singu- laridades. Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática. Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludici- dade e da liberdade de expressão nas diferentes ma- nifestações artísticas e culturais. (BRASIL, 2010, p. 16) A partir deste ano (2016), a lei Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, determina a obrigato- riedade escolar a partir dos 4 anos, além de estabelecer que: “A educação infantil, primeira etapa da educação bá- sica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 anos, em seus aspectos físico, psi- cológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”. (DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, 2013, p.1) É interessante perceber que este trecho desta- ca o papel da educação infantil enquanto ins- tituição como algo complementar à educação familiar e da vida em comunidade, demons- trando que o educar vai além do ensino formal abrange também os conhecimentos empíricos e afetivos recebidos pela criança ao longo dos primeiros anos. As diretrizes curriculares nacionais dispõe ainda que as práticas pedagógicas devem ter a interação e a brincadeira como norte- adores, garantindo portanto experiências sensoriais, expressivas, corporais, assim como imersão quanto a diferentes lingua- gens, onde esteja presente a expressão: gestual, verbal, plástica, dramática ,musi- cal; promovam a autonomia, a coletivida- de, a curiosidade, o encantamento, conhe- cimento cultural. (BRASIL, 2010, p. 24-26) O brincar é direito assegurado a criança, in- felizmente este belo discurso nem sempre condiz com a realidade dos espaços escola- res destinados a infância, especialmente nas instituições públicas os quais tendem a fal- ta de manutenção, a espaços ausentes de significado e humanização, os quais não atraem a criança a exploração e ao conví- vio. FIG. 04
  • 21. 4140 A despeito do descaso público, para com as instituições de ensino, é muito interes- sante perceber o esforço dos profissinais docentes para com uma melhor humani- zação dos espaços, mesmo sem haver ver- bas para reformas. Como é perceptível no NEI Otília Cruz, lu- gar onde se desenrola este trabalho e que será discutido detalhadamente nos capí- tulos posteriores. Na primeira foto a direita, tem-se a sala simbólica, inseria num espaço residual do complexo e que busca permitir com que a criança possa representar e imaginar. Na segunda foto a direita, tem-se a biblio- teca criada pelos próprios profissionais como forma de estimular as crianças a lei- tura e ao mundo da imaginação. É sem dúvidas, uma atitude muito váli- da, apesar de ficar claro que não apenas a biblioteca e a sala simbólica poderiam ser espaços lúdicos, mas todo o complexo infantil, de forma a agregar ainda mais ex- periências e tornando a brincadeira uma rotina. FIG. 05 FIG. 06
  • 22. 4342 A criança, o lugar e o brincar AAtravés da brincadeira que a criança é capaz de assimilar o mundo ao seu redor (PIAGET,1971), já que na brinca- deira a questão espacial é fundamental pois é o que determina o movimento que a brincadeira exige (LIMA, 1995, p.187). Logo, o espaço não é neutro, ele influencia e interage o comporta- mento infantil. Dessa forma, os espaços infantis devem ser sensíveis a forma como a criança enxerga o es- paço. “O espaço isolado só existe na cabeça do adultopara medi-lo, para vendê-lo, para guardá-lo. Para a criança existe o espaço -alegria, o espaço-medo, o espaço proteção, o espaço-mistério, o espaço descoberta, en- fim, os espaços da liberdade ou da opres- são.” (LIMA, 1989, p. 30) Portanto como forma de auxiliar a brin- cadeira, os espaços precisam possuir ambiên- cias que incentivem a experimentação, a curi- osidade, e a afetividade (a qual será abordada num capítulo posterior) possibilitando que a aprendizagem seja lúdica e autônoma. Rubem Alves (2010, p. 14) ao dizer “Ah, uma vez cometido o erro arquitetônico o es- piríto da escola já está determinado” estava se referindo a importância dos “espaços-lugares” (TUAN, 2012) das ambiências e de uma ar- quitetura que converge com os princípios pedagógicos para promover o aprendizado, a corrente pedagógica Reggio Emilia considera arquitetura escolar o “terceiro-educador” ou seja além dos professores e da família e comu- nidade o ambiente também ensina. (SANTOS, 2014) FIG. 07 FIG. 08
  • 23. 4544 o brincar surge o conceito do “lúdico” que Di Lello (2011, p. 49) descreve como “atividade criadora que está aquém da seriedade e além da brincadeira” por se tratar não apenas do divertimento, mas que está relacionada com processo de ensino-aprendizado, já que permite a exploração, a curiosidade, estimula o interesse. Se considerarmos o lúdico como uma brincadeira instigante e ca- tivante, poderemos encontrar o lúdico de várias formas, as quais vão além do tradicional parque infantil, mas que ao se tornar o conceito e a linguagem tornam o lugar completo e muito mais rico em experiências que conformam um novo significado ao ambiente escolar. A palavra “lúdico” vem do latim “ludus” que significa “jogo”, logo confere a brincadeira algo além do brincar por brincar, mas traz a co- notação de brincadeira com propósito, onde a crinça ou até mesmo o adulto pois como diz Marrach (1998) o lúdico não é apenas brincadeira de criança, pois o adulto também brinca sem saber que o está fazendo, cita ainda como exemplo a invenção da linguagem que pode ter sido originada com um jogo, uma brincadeira com propósito. O lúdico estimula a socialização e o crescimento mútuo, já que num jogo, sempre se é melhor jogar com alguém, logo esta troca de ex- periências promove interação e aprendizado. BONS EXEMPLOS Praça infantil por Márcio Kogan “Uma praça lúdica para ser explorada livremente” é assim que o arquiteto Márcio Kogan define a praça que seu escritório projetou. Toda a praça gira em torno do de uma cerca de madeira a qual define a organização da praça. A cerca é como um portal que convida a criança a explorar os “novos mundos” ao atravessá-lo, onde se revelam D http://studiomk27.com.br/p/praca-infantil/ FIG. 09
  • 24. 4746 jardins, labirintos. Os brinquedos não buscam impor uma forma de utilização, pelo contrário estimulam a exploração e o uso. A praça é “um lugar vivo repleto de livres descobertas” as quais representam experiências singulares para as crianças. A praça ao oferecem diversas ambiências, desperta a curiosida- de. Por estar ao ar livre permite o contato direto com a natureza de forma quase “primitiva”, como descreve Kogan, já que a grande cerca simboliza um encontro ao redor do fogo. Sendo que a brincadeira de esconde-esconde vira de repente um pega pega que adentra o portal e se achega a um gramado verde. Esta praça tem o jogo, a brincadeira com propósito, que traduz a criança que aprender ao ar livre e no meio de diferentes ambiências e texturas é algo singular. FIG. 10 FIG. 11
  • 25. 4948 Playground Infinito por Marco Brajovic O projeto busca permitir à criança o uso inusitado e livre de sua for- ma. Inspirados nos parques topográficos, o playground infinito, infinitos usos, que acontecem em um relevo criado para estimular a brincadeira. Este conceito traz liberdade à criança e estimula sua criatividade e imaginação. Segundo Brajovic “Como criar uma arquitetura dos rela- cionamentos? Como criar uma arquitetura que ajuda a definir o que é privado, o que é público, o que é comunitário – o que é meu, o que é teu, o que é nosso? Cada um encontra nesta paisagem as próprias ca- deiras, as próprias gangorras. Aqui, são as crianças mesmas, que criam as próprias histórias e criam os próprios relacionamento. Eu acho que isso é um playground do século 21.” A imagem abaixo ilustra alguns possíveis usos do playground. FIG. 12 FIG. 13
  • 26. 5150 Taka Tuka Land por Susanne Hofmann Este foi um projeto de intervenção temporária em um jardim de infância em Berlim. O projeto tinha como proposta criar um espaço segundo a imaginação das crianças, trazendo novas ambiências ao inserir micro-ar- quiteturas lúdicas que incentivassem o uso espotâneo e livre dos pe- quenos. Segundo Susanne “a realidade convive junto com a fantasia”, a intervenção é portanto baseada em uma história infantil a qual trouxe o conceito de que a escola era uma ávore de limão e portanto cada parte de sua arquitetura representava uma parte da árvore, logo as interven- ções compuseram um percurso muito interessante na arquitetura exis- tente, estimulando a imaginação infantil, a interação com os colegas e a brincadeira com propósito. A imagem a abaixo mostra a inserção das intervenções ao longo do es- paço infantil. http://www.archdaily.com/519/taka-tu- ka-land-baupiloten FIG. 14 FIG. 15 FIG. 16
  • 27. 5352 CRIANÇA, O PÁSSARO... Já que não é um adulto em minia- tura, mas um ser humano único, completo e ao mesmo tempo que está crescendo e desenvolvendo- se. É completo devido a sua es- trutura física já formada e por ser capaz de pensar e sentir, mas é ao mesmo tempo um ser que está desenvolvimento visto que tem tudo em transformação. Embora necessite de um adulto, é capaz de interagir com o meio natural, social e cultural desde muito pequena, portanto quanto maior sua interação com o meio, maior serão seus vôos, ou seja seu universo pessoal será amplia- do. (BRASIL, 2006). Pássaros não podem viver em gaiolas, logo os espaços infantis devem favorecer seu desenvolvi- mento de forma livre por meio da exploração, da curiosidade e do lúdico para que assim possam voar nas “asas da imaginação”. A FIG. 17
  • 29. 5756 Ativos “Os pátios escolares e os espaços livres tem algo em comum, só de pro- nunciá-los já nos fazem bem: reme- tem-nos a ideia de liberdade. É como se estivessem livres dos males que assolam nossas escolas e nossas ci- dades: livres do controle, do individual- ismo [...]. Nos remetem a ideia de pul- mão, é por onde a cidade e a escola respiram. Livres! spaços EDUC ANA BEATRIZ G. FARIA
  • 30. 5958 desenvolvimento de valores sociais e contri- buindo para a solidariedade e a cidadania. Espaços livres nos trazem a mente o encontro, a coletividade (AZEVEDO, 2011) o comunitário, ensinando a criança e o adulto princípios de igualdade. Segundo Elali (2002) “para crianças de todas as idades” (do bebê ao adulto) é fundamental re- alizar atividades ao ar livre, como simplesmen- te o brincar. Logo, que melhor lugar que a escola para acontecer este encontro? A Escola e a Comunidade A ços que utilizam. Jacobs (2011) reforça a importância de espaços vivos para que haja segurança, já que a vitalidade dos lugares em diferentes horários, gera movimento. Ela destaca ainda a importân- cia de diferentes usos em um bairro para a pro- moção de espaços vivos. As escolas enquanto equipamento cul- tural ou como espaço público requerem como diz Mayumi (1989) “o rompimento da escola/ prisão/fortaleza e sua transformação na esco- la/praça/parque [...] para que haja apropriação dinâmica”, sendo que reforça ainda a ideia de que o espaço escolar é um material pedagógico e lúdico que interage com a população os pro- fessores e as crianças. As escolas enquanto espaços ativos, não podem estar confinadas em muros altos ignorando o mundo exterior, pois ao integrar a comunidade em seu espaço tem grande po- tencial educativo e cooperativo, auxiliando no A escola enquanto espaço físico, não é um lugar fechado em si mesmo, está inserida em um contexto social, cultu- ral e urbano. A escola é parte da cida- de, e uma parte muito importante, se conside- rar que ela tem papel vital no desenvolvimento dos cidadãos, logo, a cidade é em parte um re- flexo de suas escolas. Como disse Paulo Freire “Educar não pode estar desconectado do contexto que se encontra” logo os espaços escolares necessitam dialogar com a ci- dade, tornando-se como diz Ribeiro (2015, p. 11) “um novo e potente equipamento cultural” já que “se a escola é a reprodução da cidade, ao transfor- mar a escola podemos transformar também a ci- dade” (RIBEIRO, 2015, p. 43) A escola enquanto equipamento cultu- ral, torna-se um espaço público, que propor- ciona o encontro e a diversidade trazendo a apropriação, conceito muito importante que define a relação da comunidade com os espa- FIG. 20 FIG. 19
  • 31. 6160 O Pátio, espaço integrador sociais, elemento fundamental da escola que po- tencializa o processo educativo” (AZEVEDO, 2011, p.15-16) Os pátios escolares enquanto espaços públi- cos permitem que o cidadão se transforme em aluno e o aluno retome seu papel de cidadão (GOULART DE FARIA, 2011) . Pois é através da socialização e do espaço democrático que o indíviduo tem a possibilidade de exercer sua cidadania. Logo, a educação é entendida como um compromisso integral que vai muito além dos ensinos formais, abrange especialmente a vida cotidiana da criança em comunidade, já que o desenvolvimento integral só pode ser con- cretizado a partir do momento que a criança compreende seu papel enquanto participante do conhecimento e não apenas receptora do mesmo, pois assim pode ter papel ativo no seu aprendizado baseado na experimentação e na socialização. Há 4 premissas básicas que devem definir um espaço infantil, o espaço enquanto “ambiente pedagógico, sócio-cultural, inclusi- vo e ecológico” (AZEVEDO, 2011, p. 59), estes fatores determinam a relação escola-cidade e contribuem para uma espaço que promove o desenvolvimento infantil e a cidadania, a qual passa pelo pátio. A O espaço escolar pode ser um ambiente múltiplo onde a formalidade dá lado aos es- paços hipnotizantes, os es- paços que cativam, instigam e ensinam, “as crianças de todas as idades” sejam elas pequenas ou adultas. O pátio tem esse potencial de ditar o espírito da esco- la, ele tem a capacidade de convidar e fazer-se sentir bem-vindo. O pátio é a ponte entre a escola e a cidade. É nele que o aprendizado se fortalece e é nele que a ci- dadania é enriquecida. escola enquanto parte da cidade, ou seja, como lugar permeável e extra- muros, pode dialogar com seu entorno por meio de seus espaços livres, que ao pro- mover o aprendizado, o lazer e a socialização se tornam espaços públicos. Dentre os espaços livres das escolas, destaca-se o pátio, local de recreação e ativi- dades esportivas, que marca a vida de escolar de muitas crianças e jovens e que raramente é pensado como espaço de desenvolvimento (AZEVEDO, 2011), é considerado apenas local de pausa entre as atividades formais. Porém, o pátio tem muito potencial enquanto promo- tor de integração, descoberta, exploração, e aprendizado. “A palavra pátio provém do latim “pateo” que sig- nifica estar aberto, ou exposto; estender-se; abrir- se; estar descoberto, sugerindo a possibilidade de relacionar-se. Logo o pátio pode ser entendido como lugar de manifestações, palco de relações FIG. 21
  • 32. 6362 ? Há alguns anos o MEC juntamente com a Unes- co desenvolveram um projeto que se intitulou “Escola Aberta”. O qual previa a abertura das escolas públicas durante os finais de semana, com o objetivo de ampliar as relações entre a comunidade e o espaço escolar, a escola por- tanto seria o palco para oficinas e lazer. (MEC, 2010). Esta iniciativa é interessante e benéfica para o espaço escolar, porém não é uma atitu- de suficiente, é necessário mais para que um espaço seja realmente aberto. A escola enquanto espaço aberto e so- cializador não é um espaço irresponsável, um espaço que ignora as inseguranças, mas é um lugar que cativa e torna a comunidade partici- pante de forma a fazê-la enxergar os benefí- cios de ser parte da escola. Faz-se necessário portanto, que o espa- ço escolar além de abrir-se para a comunida- de, dialogue com ela, trazendo as ambiências conhecidas do bairro para este espaço. Este conceito encontrado em Ramos (2015) basea- da no programa de ambiência de experiências de Hélio Oiticica o qual reinterpretava as am- biências das comunidades para despertar nelas uma experiência sensorial, permitindo criar-se ambientes reconhecíveis e a apropriação co- munitária, será desenvolvido posteriormente no projeto. FIG. 22
  • 33. 6564 BONS EXEMPLOS Complexo educacional por CEBRA Este complexo educacional cujo projeto será executado na Rússia após um concurso que tinha como objetivo o projeto de uma escola inteli- gente, a qual deveria buscar por uma tipologia que combinasse pais- agismo, arquitetura em um ambiente de aprendizado que pudesse ser utlizado como centro comunitário. (ARCHDAILY, 2015). Logo, o projeto se organiza enquanto vários blocos dispostos num círculo e cobertos por uma unica cobertura, o centro é marcado por um imenso pátio verde que congrega criança e adultos, é possível perceber ainda a presença de hortas e espaços esportivos que também encontram-se permeáveis a todos. FIG. 23 FIG. 24
  • 34. 6766 Escola Antônio Derka em Medellín Esta escola foi executada em Medellín, em uma das “zonas periféricas mais deprimidas e violentas da cidade, devido à falta de investimento social”(ARCHDAILY, 2008) após sua proposta de reestruturação urbana. Os arquitetos do escritório Obranegra Architectos tinham a in- tenção de criar um projeto amável e familiar para a comunidade, logo, fizeram uma releitura de alguns elementos da comunidade para a ar- quitetura, como os terraços, as varandas, as ruas escalonadas entre out- ros, os quais segundo eles deram sentido ao projeto. A intenção era propor uma “escola aberta que consistia em dis- sipar os limites físicos e mentais do colégio mediante uma intervenção urbana e arquitetônica aberta, que buscava convertê-los em centros de atividade cultural, recreativa, educativa e em referencial urbano que promovessem a integração de toda a comunidade.” (ARCHDAILY,2008). FIG. 25 FIG. 26
  • 35. 6968 Escola primária e centro familiar por CEBRA Esta escola inserida na Noruega, em um bairro residencial tem a inteção de dialogar com o entorno se desenvencilhando de seus muros e tornando o acesso principal aberto a comunidade, assim como a criação de um parque verde inserido em frente ao edifício. A escola é descrita como uma ambiente que cumpre variadas funções: “uma arena de aprendizagem e ensino, um local de trabalho e um ponto de encontro social.” Segundo os arquitetos “o parque da escola já se tornou uma importante área de recolhimento para o bairro fora do horário escolar também. A combinação destas três funções criou um complexo cheio de atividade de manhã à noite, sete dias por semana.” (ARCHDAILY, 2014) Logo é possível perceber a vitalidade alcançada por ser uma es- cola que convida a cidade. FIG. 27 FIG. 28
  • 36. 7170 Escola Ny Krohnborg por Arkitektgruppen CUBUS Este projeto realizado na Noruega, o qual é uma revitalização de um escola antiga quen encontrava-se abandonada e gerava inseguranças ao bairro. O projeto portanto, buscava dialogar e revitalizar também o bair- ro, portanto se abriu permitindo um grande pátio o qual é público e também possui quadras esportivas. Por ser uma escola que também conta com crianças pequenas, definiu-se também um outro pátio privado na parte posterior da edifi- cação. É interessante perceber essa relação, pois demonstra que um edifício aberto não é um edifício irresponsável quanto a segurança das crianças as quais utilizam esse espaço, portanto dialoga de forma consciente com o entorno e ao mesmo tempo possui espaços mais privativos. FIG. 29 FIG. 30
  • 37. 7372 Jardim de infância Montessori Fuji por Tezuka Architects Este projeto realizado em Tokyo trata-se de um jardim de infância sem muros, o qual configura-se em torno de um grande pátio, sendo que sua cobertura compõe ainda um terraço onde pode-se circular e contem- plar. As atividades mais formais ocorrem na parte construída, abaixo do terraço, onde estão dispostos os mobiliários de maneira bem livre permitindo total contato com o pátio. Os arquitetos descrevem que “As conveniências modernas pri- varam as crianças das sensações. Aqui pretende-se ensinar através do edifício o sentido de comunidade . Estes são valores da sociedade hu- mana que não mudam, mesmo através das eras.” Portanto, é interessante como a forma do edifício pode confor- mar o espaço público e o privado e como os dois podem conviver. http://chuknum.com/wp-content/up- loads/2011/08/1.jpg FIG. 31 FIG. 32
  • 38. 7574 COMUNIDADE, OS HERÓIS... Não há dúvidas que a comu- nidade enquanto possibilitado- ra de novas relações e de interação com o mundo in- fantil tem muito a agregar ao trazer a “cidade” para es- cola, no sentido da cidadania, da cooperatividade. Logo, a comunidade repre- senta os heróis que fazem a ponte entre a cidade e a escola, podendo tornar o es- paço escolar um lugar com vitalidade, um lugar onde acontece a democracia e a solidariedade. A FIG. 33
  • 40. 7978 FIG. 35 Esta foto é da parte de trás do Otília Cruz, nela pode-se perceber o comprimento do muro e a relação com a escola e com a rua. Para torná-lo menos impessoal a escola incentiva a apropriação por grafiteiros como forma de utilizar o muro enquanto painel. No ano passado foi realizado um final de semana de pinturas onde a comunidade se reuniu para prestigiar os novos grafites do muro, os quais são agora do tema ‘Star Wars’.
  • 41. 8180 ugL ARo “A ideia essencial é tornar os ambientes de aprendizados um verdadeiro lar.” DORIS KOWALTOWSKI
  • 42. 8382 into que não fui eu quem escolheu este lugar, foi ele quem me escolheu. Morei exatamente na frente da – na época – Escola Professora Otília Cruz, e sinto que aos poucos o lugar me cativou. A escola estava fechada havia alguns anos e me intrigava com seus muros altos e ao mesmo tempo me atraía com suas árvores cheias de vida que como que num anseio de viver se so- brepunham aos muros e criavam uma ambiência tão atraente, especialmente nos dias de primavera onde as flores roxas afloravam e deixavam o quin- tal de casa com cheiro de natureza, ou ainda nos fins de tarde quando emolduravam um belo pôr-do sol que como numa pintura absorvia meus olhares. Passado o pôr-do-sol nascia um grande breu, que amedrontador, permeava aquele lugar, tornando aqueles muros antes instigantes agora ameaçadores na noite escura, trazendo aos vizinhos, a insegurança. Mas não eram apenas os muros e as árvores que chamavam minha atenção era também como aquele lugar era como um coração para aquela comunidade, pois mesmo aparentemente abandonado, podía-se ouvir de dentro dos muros aos finais de semana, vozes cantando, passos de dança, reuniões do bairro, ou ainda festas e almoços da comunidade. Pude sen- Da minha janela S tir que havia algo ali, além de uma arquitetura dos anos 50 cercada por muros altos, havia um elo entre o espiríto daquele lugar e as pessoas que viviam ali. Um raio de esperança me tocou um dia pela amanhã, quando ao abrir minha janela vi que a escola, iria ser reformada e se tornaria uma creche, mas não durou muito ao ver que apenas de um verde sem vida os muros foram cobertos de alaranjado, as velhas salas de aula foram de- senferrujadas e os telhados consertados. Como que numa grande ironia, tudo voltou a funcionar, e de repente crianças de 0 a 5 anos começaram a diariamente ser engolidas pelos muros, que reve- lam que há infância graças as vozes, os choros e as cores que surgem do seu interior. Foi neste misto de sentimentos que não tive dúvi- da, esse lugar precisava de um olhar diferente, não apenas um olhar quan- titativo, mas um olhar afetivo, um olhar de alguém que foi vizinha destes muros. Sim! Este lugar me escolheu. E ele me escolheu como que dizendo, que ser arquiteto é ser capaz de ver pessoas, por de trás de muros”. “Não fui eu quem escolheu este lugar, foi ele quem me escolheu” FIG. 36
  • 43. 8584 Otília Cruz está localizada na par- te Continental do município de Florianópolis, no bairro Jardim Atlântico, bem próximo ao bairro Colon- inha, podendo ser considerada parte da “Grande Coloninha” como se referem os moradores da região. Essa identificação com o bairro próximo, acontece devido as mesmas car- acterísticas topográficas, de urbanização e de vizinhança que circundam a área onde está a Creche (Jardim Atlântico) do bairro Coloninha, já que segundo Lynch (1999, p. 50; 78-80) “o conceito de bairro pode ser compreendido como regiões que possuem algo em comum e são passíveis de reconhecimento interior e exterior e as características que determinam bairros são continuidades temáticas, que podem consistir em variantes como: textura, es- paço, forma, detalhe, topografia [...] Con- Um lugar chamado Otília Cruz O tudo, as conotações sociais são bastantes significantes, quando se trata de delimitar regiões” Tanto o terreno em estudo se en- contra no alto do morro (aproximada- mente cerca de 40 metros acima do nível do mar), quanto a malha urbana é semel- hante e há ainda a Escola de Samba Un- idos da Coloninha próximo a Creche, a qual gera senso de vizinhança e identi- dade como de um único bairro, independ- entemente da divisão municipal. Pode-se afirmar então, que este lugar possui uma identidade única que o conforma parte do bairro Coloninha. Visto que o conceito de ‘identidade de lugar’ pode ser entendido como o espírito do lugar, onde as raízes e o sentimento de familiaridade depen- dem tanto das qualidades físicas como das mudanças humanas atribuidas a esse lugar (HOLZER, 1997). FIG. 37 FIG. 38
  • 44. 8786 O mapa ao lado ilustra os bairros definidos pela legislação municipal em (A) temos o bairro Jardim Atlântico, em (B) o bairro Balneário, em (C) está o Canto, em (D) está a Coloninha, e em (E) encontra-se o bairro Estreito. Logo, como descrito anteriormente o terreno encontra-se no bairro Jardim Atlântico, porém pode considerar-se a Grande Coloni- nha. Neste recorte há alguns equipamentos urbanos que podem ser considerados pontos referenciais. São eles, além da Escola de Sam- ba, a Escola de Aprendizes de Marinheiros e o Estádio Orlando Scarpelli. A B E D C FIG. 39 FIG. 40 FIG. 41 FIG. 42 FIG. 43
  • 45. 8988 USO DO SOLO A análise do entorno permite compreender a relação entre o uso do solo, o porte das edifi- cações e o sistema viário, permitindo entender como o lugar se encontra localizado na cidade e quais as interferências que recebe de seu en- torno. O recorte realizado para a análise dos mapas, foi realizado considerando o bairro não pela divisão municipal, mas sim pela linguagem morfológica, topográfica e e humana que se entende como que conformando um conjunto no que, como já foi referenciado, se considera a “Grande Coloni- nha”. Logo, é a partir da análise dos mapas que é possível compreender o caráter do lugar. PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT Sem uso Uso institucional religioso Uso institucional escolar Uso residencial Uso comercial Uso misto Área verde O Mapa de uso do solo permite perceber a forte presença do uso residencial, com pequenos comércios e serviços próximos a via Max Schramm, além da presença de comércios vicinais nas partes mais internas do recorte. É interessante notar a presença de diversas áreas verdes, como pequenas praças, as quais são pouco utilizadas, e ainda a forte presença de escolas e creches, devido a grande demanda desta re- gião. É possível perceber também que as quadras a direita do Otília Cruz, são bem longas, o que dificulta a relação de vizinhança, en- quanto a esquerda do terreno percebe-se a presença de quadras me- nores o que se constata na melhor relação entre os vizinhos. Na parte mais ao centro do recorte é visível a presença de várias áreas vazias e em crescimento com diversos prédios de alto padrão que estão sendo construídos. PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT FIG. 44 FIG. 45
  • 46. 9190 1 pavimento 2 pavimentos 3 pavimentos 4 pavimentos 5 pavimentos ou mais SISTEMA VIÁRIOGABARITOS O Mapa de sistema viário permite compreender a relação entre a hie- rarquia das vias. Percebe-se que a Via Max Schramm, a qual conecta Florianópolis a São José, Biguaçu e demais cidades possui fluxo in- tenso, o qual é recebido pelas vias coletoras, as quais possuem maior fluxo por conectarem-se as áreas residencias do bairro. Já as vias lo- cais, possuem fluxos bem menos intenso já que recebem o fluxo das vias coletoras e o distribui. Há 3 linhas de ônibus que abastecem esse bairro, as quais são: Bairro de Fátima o qual possui horários a cada 30 minutos, Coloninha com apenas 10 horários ao longo do dia e o Corredor Continente que tem horário a cada 10 minutos. A linha Coloninha foi criada devido a um pedido da comunida- de, já que o bairro possui um relevo acentuado e também possibilita a parada em frente a Otília Cruz, por isso possui intervalos relaciona- dos ao horários de aula e trabalho da comunidade. O Mapa de gabaritos permite compreender a relação volumétrica e as possíveis ambiências projetadas sobre os usuários deste lugar. É um bairro com predominância de edificações de 1 e 2 pavi- mentos ao longo das quadras. Porém, nos últimos 5 anos os espaços vazios do bairro, que possuem relevo acidentado, tem dado lugar a edifícios de alto padrão os quais consistem em edifícios de 5 pavi- mentos ou mais. É importante perceber que a predominância de edificações de alto padrão consiste em condomínios fechados os quais comportam de 2 a 3 blocos de apartamentos, o que é preocupante para a segu- rança do bairro, já que se fecham em seus muros ignorando a rua. O Otília Cruz possui uma edificação horizontal de apenas um pavimento, porém devido ao relevo irregular possui um subsolo. PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT Via arterial Vias coletoras Vias locais Transporte público Linhas Bairro de Fátima Linha Coloninha Linha Corredor Continente PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCEDBYANAUTODESKEDUCATIONALPRODUCT PRODUCED BY AN AUTODESK EDUCATIONAL PRODUCT A A B B C C FIG. 46 FIG. 47
  • 47. 9392 Subida íngrime, desafiadora, mas no topo as árvores do terreno da creche que como que num convite se debruçam sobre a rua. FIG. 48 FIG. 49
  • 48. 9594 tualmente o “Otília” como é chamado carinhosamente pelos moradores do bairro, é um NEI (Núcleo Educacional infantil) que atende 235 crianças entre 0-5 anos, as quais provêm de diversos bairros do Continente, além é claro de atender a co- munidade local, dentre esse número, 195 crianças estão na faixa de 0-3 anos. Chama atenção a grande quantidade de equipamentos esco- lares tão próximos, em especial duas outras Creches públicas locali- zadas próximas ao NEI. Essa questão foi esclarecida pela diretora do NEI Otília, Fabrícia Souza, que afirmou que demanda para educação infantil é muito alta na parte Continental de Florianópolis, o que não acontece com tanta intensidade no ensino fundamental e médio, pe- ríodo onde há maior evasão escolar. A diretora, afirmou ainda que o espaço Otília Cruz, veio atender esta demanda e que agora sobram vagas. O espaço do Otília Cruz já foi utilizado atendendo programas diferentes. Fundando em 1958, como E.E.B. Otília Cruz funcionou até 2008, quando por motivos que serão abordados posteriormente, foi fechado e durante este tempo funcionou com o projeto criado pela própria comunidade local, intitulado “Amor Coloninha” o qual oferecia aulas de dança, canto, futebol, entre outros, para crianças da comunidade da Coloninha, funcionando em parceria com a Escola de Samba Unidos da Coloninha. Posteriormente em 2014, o terreno foi doado do Estado para o município reabrindo como NEI. A FIG. 50 FIG. 51 FIG. 51 FIG. 52 FIG. 53
  • 49. 9796 TOPOGRAFIA LEGISLAÇÃO A Creche localiza-se no final da Rua Professora Otília Cruz, ocupando um terreno de esquina que possui 6400m². O terreno encontra-se no topo do morro, sendo sua cota mais acentuada, a cota 42 m. Sendo que o terreno possui uma topografia irregular entre as cotas 38 e 42, sendo que a parte edificada se estabe- lece principalmente entre as cotas 40 e 42 m. Devido a grande variação do terreno há várias escadas e ram- pas, as quais foram inseridas após a reforma e que de certa forma re- stringem a livre exploração das crianças pelo lugar, haja vista que há vários portões para a segurança das crianças frente a topografia acen- tuada. O plano diretorde Florianópolis de 2012, juntamente com o zoneamento urbano classificam essa área como uma ZMR - 3, ou seja Zona Mista residencial com uso predominante residencial com média complexidade. O plano diretor determinar que para a ZMR -3 a Taxa de Ocupação, em 50%, o Índice de aproveitamento máximo como 1,5, a altura máxima da fachada de 12 a 15 m, podendo construir-se até 4 pavimentos. A relação entre a testada/comprimento do lote é de 1/3 e quanto aos afastamentos, consta como de 4 metros para as frentes, e 3 metros os laterais. Esta área é também considerada uma ACI, Aréa Comunitária Institucional, logo seu uso remete a espaços que sirvam a comunidade.
  • 52. 103102 Antes... Escola Otília Cruz, foi fundada em 22 de Abril de 1958, levando o nome da Professora Otília Cruz, a qual dá nome também a rua no qual está inserida. Otília Cruz moradora da Coloninha lecionou para crianças de 1913 até 1947, em algumas escolas da Grande Florianópolis: “Na escola José Boiteux na qual lecionou até 1941, foi professora de francês e de piano. O envolvimento dela com o estabelecimento e com a música foi tão grande que Otília Cruz doou o piano, de sua propriedade, para a escola. Ela não queria que as aulas fossem interrompidas após a sua saída.” (SME Florianópolis, 2014) Ao conversar com Tânia Ramos, membro da Velha Guarda da Escola de samba Unidos da Coloninha e líder comunitária da Coloninha, ela con- tou que o terreno da escola era da família de Otília, o qual foi concedido ao Estado para que a escola funcionasse. Não há relatos se Otília che- gou a lecionar na Escola doada pela sua família, visto que se aposentou em 1947 e a fundação da Escola se deu em 1958, apenas. Porém seu carinho para com a educação fica evidente na sua trajetória, portanto o lugar leva seu nome. “Inicialmente a escola funcionou atendendo classes multisseriadas de 1ª a 4ª séries e foi a partir de 1958, que foi reconhecida como grupo escolar, matriculando então os alunos em classes separadas. Em 1973, o governo estadual elevou o estabeleci- mento à condição de escola básica, quando passou a absorver estudantes de 5ª à 8ª séries. Foi em 1990 que passou a atender também crianças em idade de pré-es- cola e então em 2000, foi denominada Escola de Educação Básica Professora Otília Cruz, adaptando-se às normas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996).” (SME Florianópolis, 2014) Porém em 2010, com a falta de manutenção da escola (sucateamento e total descaso) e portanto a frequente migração dos estudantes para out- ras regiões, a Escola foi fechada alegando-se a falta de alunos, porém o governo tinha uma nova proposta para esse lugar, transformá-lo em um presídio feminino, o que culminou em revolta por parte da comunidade. A FIG. 54 FIG. 55
  • 53. 105104 C om o fechamento da escola em 2010, a comunidade local se le- vantou frente a esta decisão do Estado de torná-la um presídio. O Otília havia sido por 50 anos parte da história deste bairro, várias gerações haviam se formado ali e nele aconteciam tam- bém as festas comunitárias e reuniões do bairro. Com certeza há muitos motivos para lutar por esse lugar, afinal ele é o coração da Coloninha. Após dezenas de audiências infrutíferas, a comunidade decidiu agir, instalaram-se na Escola, porque esse lugar lhes pertencia: perten- ceu a comunidade antes de pertencer ao Estado. Não deixariam nin- guém tomar o que era seu. Tânia Ramos, conta que a comunidade passou a utilizar o lugar como espaço comunitário, ali aconteceram aulas abertas a comunidade, canto, dança, futebol e até mesmo uma horta cultivada pela comunida- de., nascia ali o projeto “Amor Coloninha”. O lugar inspirava subvesividade mas ao mesmo tempo, inspirava ARTE, inspirava vida. Havia vida por detrás dos muros. Segundo Tânia foram 3 anos difíceis, em que muitas ameaças fo- ram feitas, mas que mesmo assim a comunidade persistiu, pediam que o lugar fosse doado ao município e que parte do terreno fosse doado a comunidade. Então em 2014 o pedido da comunidade foi atendido, o espaço foi cedido pelo Estado para o município, que por meio do projeto de “municipalização” adotou a Escola tranformando-a em um NEI. Parte do terreno foi doado para a comunidade para que pudessem cons- truir um espaço comunitário e para que atividades do projeto “Amor Co- loninha” pudessem continuar. O Otília agora é um NEI e o centro comunitário ainda não saiu do papel por falta de verbas. Mas uma vitória já pode ser comemorada. O Otília reabriu suas portas (Seus muros ainda não). FIG. 56
  • 54. 107106 o dia da reabertura do Otília, estavam lá as primeiras pro- fessoras, sorriam ao ver o lugar vivo e cheio de crianças novamente. (Foto a esquerda) Para a reabertura, a antiga E.E.B. Otília Cruz foi reformada, com o objetivo de adaptar o edifício aos pequenos novos usuários. Hoje é composta por 4 blocos, sendo o primeiro e menor, a parte da secretaria e sala de professores, o segundo bloco a parte de salas de aula dos bebês de 0-3 anos, o terceiro bloco, separado por um dos pátios composto também por salas de aulas para cri- anças de 3-6 anos, e o último bloco, próximo ao pátio coberto é onde se encontra a cozinha, o refeitório e as salas multi-usos. A creche conta ainda com duas salas num nível inferior, que pode ser acessado por uma rampa, de um lado a sala simbólica e do outro a biblioteca, já descritos na página 40 e 41 deste materi- al, como espaços que a despeito da qualidade das obras públicas, são esforços dos profissionais para trazer o imaginário e a brinca- deira. Há ainda uma área sem uso e o espaço da quadra de basquete, área a qual foi doada pelo município para a comunidade para a construção de espaço comunitário. É importante ressaltar que a reforma fez adaptações, e não alterações nas ambiências da antiga escola. A reforma não trouxe o lúdico ou os espaços da brincadeira como as crianças pedem, ela não pensou em se abrir para comunidade através de seus pátios, ela apenas se adequou a exigências mínimas da legislação. O objetivo deste trabalho não é fazer uma crítica a reforma realizada, mas sim analisar a qualidade do espaço atual buscando melhorá-lo, nem que de forma apenas projetual e utópica, para uma comunidade que tem tanto carinho por esse lugar. N FIG. 59 FIG. 57 FIG. 58
  • 55. 109108 A reportagem ao lado foi emitida no site da Prefeitura no período que antecedeu a reabertura do Otília. A foto do lado direito foi feita após a reabertura e já com o espaço em fun- cionamento, demonstrando que a refor- ma não alterou as ambiências do lugar, apenas permitiu que o lugar se tornasse funcional. O pátio enquanto espaço rico, lúdico, integrador e comunitário necessita ob- viamente ser um espaço rico em insti- gar. Instigar a curiosidade, a exploração, a convivência e a aprendizagem. E para tanto, necessita ser um lugar, um lugar daqueles que a gente guarda na memória e quando pensa neles não lembra de um muro azul ao fundo, mas lembra das árvores, dos pássaros, dos brinquedos. Talvez seja isso que os governantes não entendam e por isso se contentem com espaços, ao invés de lugares, com caixas de areia sem cor, e com o tamanho das coisas ao invés do valor afetivo delas, porque afinal a criança não se importa em medir, ela se importa com o viven- ciar, com o brincar e com o imaginar. foto/divulgação: Aline Rebequi/SMC Obras devem estar prontas até o fim deste mês 12/08/2014 - Educação NEI Otília Cruz será a maior da cidade em área construída A Prefeitura de Florianópolis deve entregar ao Continente ainda este mês, a maior creche em área construída da cidade. O Núcleo de Educação Infantil (NEI) Professora Otília Cruz, na Coloninha, terá capacidade para cerca de 200 crianças de seis meses a 6 anos de idade. A reforma e ampliação do local, que funcionou por muitos anos como escola, iniciou no ano passado e está prevista para ser entregue no fim deste mês. Com um investimento de R$ 1,4 milhão, a creche terá 15 salas, anfiteatro, lavanderia, bercário, sala de convivência, áreas de lazer e parquinhos para os pequenos. De acordo com o secretário de Educação, Rodolfo Pinto da Luz, esta será maior creche de Florianópolis em termos de área construída, com 1.371 metros quadrados.   "É uma unidade modelo, com equipamentos de ponta. Estamos muito satisfeitos com o andamento dos trabalhos", disse o secretário, durante vistoria à obra. O prefeito em exercício, Cesar Faria, e o secretário do Continente, Dejair de Oliveira Junior, participaram da visita. "Estou impressionado com a qualidade da reforma, tudo muito caprichado em todos os detalhes. Tenho certeza de que ela estará no mesmo nível, ou até superior, de creches particulares", elogiou Cesar Faria. Atendimento integral A Otília Cruz irá funcionar em período integral, das 7h30 às 18h30, e irá atender cerca de FIG. 60 FIG. 61
  • 56. 111110 E MUROS MARCAS& ste capítulo, compõe uma série de fotografias realizadas num ensaio de reconhecimento do lugar, todas as fotos são de minha autoria. O ensaio fotográfico se intitula “Entre muros & marcas” devido a forte presença dos muros no entorno e também de “marcas” as quais são considera- das os traços que caracterizam essa comunidade. A ideia de fotografar o entorno, surgiu da necessidade de conhecer o bairro para além da rua que morei, a qual está em frente ao Otília Cruz. As fotografias buscam detalhes que para um trauseunte despercebido não chamariam a atenção, porém elas revelam a profundidade da dureza de alguns lugares, da beleza de outros, e da aparente neutralidade de alguns. Para acompanhar as fotografias, estão inseridas pequenos trechos da sensação que me representaram ao serem fotografadas revelando a intimidade que tenho com o lugar. Para uma melhor apreciação do ensaio fotográfico, sugiro ouvir a trilha sonora do “O Pequeno Príncipe” em especial a música “Somewhere only we know” de Lily Allen. Boa apreciação!
  • 57. 113112 Muro onde estão os anseios e angústias expressos por quem vive o lugar e é este o mesmo que sepa- ra duas realidades, como numa compo- sição figura-fundo, destaca-se a grande ironia: a desigualdade. O muro alaranjado é a sina do Otília Cruz, cada camada uma finalidade, a primeira regulari- za, a segunda impede as crianças de saírem, a terceira as faz desaparecer. Lá fora caminha uma garota entre muros, ela apressa o pas- so enquanto escuta choros de bebês invísiveis.
  • 58. 115114 É quase no final da Rua Otília Cruz que de dentro dos muros da creche, a árvore frondosa ilumina o lugar, e é debaixo dos galhos sem folhas da árvo- re que despontam timidamente as cores, que fazem lembram que por de trás dos muros existem crian- ças brincando.
  • 59. 117116 Há aqui uma forte separação entre a infância e o mundo externo presente no misto de cores vi- brantes e as grades e o muro, como que aprisionando a felicidade. Muro onde estão os anseios e angústias expressos por quem vive o lugar e é este o mesmo que sepa- ra duas realidades, como numa compo- sição figura-fundo, destaca-se a grande ironia: a desigualdade.
  • 60. 119118 O urso aproveita o sol para se secar, enquanto nos conta que aqui mora a infância.
  • 61. 121120 Abro os olhos, vejo elementos aleató- rios. Fecho e abro no- vamente na esperan- ça que ao acordar o esqueleto vertical e os muros da esco- la não estejam mais aqui, só haja infância livre, árvores com cavalos e um belo sofá pra sentar na sombra. Da terra vermelha, da grama baixa, surgem as ár- vores viçosas, uma aduba o monstro de concreto a outra faz sombra ao cavalo e o sofá.
  • 62. 123122 Dentro dos muros se escondem o crianças, não vendo que lá fora o cavalo está solto e se abriga na sombra fresca, aguardando com- panhia para sentar-se no sofá. A menina assiste arregalada o que acontece fora dos muros, um espaço inusitado, tem ca- valo, tem sofá, tem sombra sobre a gra- ma verde.
  • 63. 125124 A reforma veio e trouxe a reabertura oficial do espaço da comunidade. Renasce a creche, os muros agora são alaran- jados, fantasmas coloridos. Será que esse lugar está do jeito que a comunida- de queria? Será?
  • 64. 127126 viva o senso de vizinhança! Vivam os olhos da rua! O grafite no muro da creche como que num desabafo reve- la o tormento que é ficar calado e ao apropriar-se do muro consegue ex- pressar que calar- se não é manter as ideias escondidas, é expressá-las em arte! Arte no morro, que de tão íngrime, faz o mar parecer em pé. Lá na varanda, as roupas coloridas dão um toque de ale- gria para a rotina da dona de casa e a gran- de árvore faz sombra na roupa.
  • 65. 129128 Bebê a tiracolo, a mãe caminha apres- sada, olha para o chão para não tro- peçar, a calçada não é nem de perto um lugar seguro. Os muros clamam, que venham em primeiro lugar a paz, e depois a justiça e então a liberdade! Que esse pedido aqueça esse muro frio e a caminhada nessa calçada estreita.
  • 66. 131130 A árvore é parte do quintal das suas casas e é por isso que transformam o chão batido em pra- ça. Essa praça é a marca da apropria- ção do lugar pela comunidade.
  • 67. 133132 Há vestígios de cor- reria e brincadeira, mas tudo o que res- tou ficou pendurado como denunciando a felicidade nos esque- letos das pipas. A surpresa não é encontrar o conjunto habitacional em área tão isolada, mas sim o tanque no meio da pastagem.
  • 68. 135134 Nasce outro condomínio, logo nasce outra empena cega. Cega, mas verde. Em frente a praça e par- que infantil que o condo- mínio de alto padrão fez para a comu- nidade, há tra- ços de desejos de arranjar marido, num fundo onde há apenas um render sem calungas. Divididos pelo mesmo muro, o da direita tem seu terreno, e o outro está neste terreiro desde 1977.
  • 69. 137136 Ponto de onibus o espaço público do encontro e desen- contro, das meias palavras, do “será que vai chover”? O lugar onde os ros- tos sem expressão trocam resmungos inconformados com a demora do ônibus. Quase que imperceptível está o pedido como que camuflado por trás dos muros, Queremos mais, MAIS ARTE, por favor!
  • 70. 139138 Um montoado de lixo, serviço bagunçado, gente carente, e um pedido conveniente: Só por Deus! É sexta a tarde e a vegetação ca- mufla os olheiros, que transformam a rótula da avenida em espaço público, onde sofás velhos e cadeiras se tor- nam o ponto dos vi- gia. Vigiam o que? Que esse frete leve para longe todo o desgosto e que as árvores predomi- nem e tornem esse lugar restaurador.
  • 71. 141140 Háinfâncianomeio do barraco em plena sexta-feira a tarde, infância inocente, infância com brinquedo in- fame, mas que seja infância e que en- contre a sorte de viver para sempre como criança.
  • 72. 143142 A fortaleza por detrás dos muros abriga nin- guém, os muros abrigam a fé, e os dois desabri- gam quem passa. Na rua do samba pre- dominam os muros baixos, o senso de vi- zinhança o ritmo e a harmonia.
  • 73. 145144 Na casa do samba não tem preto nem bran- co, só tem poesia. Na parede branca por detrás das árvores, repousa a mulata faceira, ela é linda, é cor, é iden- tidade. Ser criança é não ver a pre- cariedade, é se aventurar nos perigos da tábua solta, da mesa bamba, do varal torto, é pular por entre os tijolos aparentes e quando ao cres- cer se lembrar que o nome disso é infância.
  • 74. 147146 O vento balança a bandeira do time, que quase escondida por entre a vegetação identifica o lugar. Estamos perto do Fi- gueirense. O cenário pito- resco assiste o homem enlou- quecido que joga o objeto no chão repetidas vezes para que de den- tro saia o cobre. Os muros frios, o encobrem e per- mitem que possa manter sua lou- cura por mais um tempo. Em terras de futebol, só tem gente no domingo, e entre muros e arquibancadas, reina a inseguran- ça dos dias da semana.
  • 75. 149148 Vestígios de infância nesse lugar esquecido. O urso sorri, foi visto por alguém!
  • 76. 151150 A estrada terminou então sente-se e descanse nessa paisagem inóspita, pois se não há sáida ao menos há um sofá.
  • 77. 153152 Ao fundo uma escola que mais se parece com um presídio, em suas pare- des os anseios de pessoas que não encontram seus caminhos e logo na frente outra grande ironia: O “progresso” trazendo consigo o lazer, a exclusividade e a confiança, (pra quem puder pagar).
  • 78. 155154 na rua do lazer da exclusividade e da confiança moram os buracos, circulados pelo cidadão de bem. As paredes revelam o angústia de um “pro- gresso” que chegou. E o chão revela que a “desordem” virou colchão.
  • 79. 157156 O caminho é estreito, mas o muro verde alegra o caminho. A rua é feita de es- cadas, pra subir tem que ter disposição, carrega a bicicleta de um lado e do ou- tro segura o corri- mão.
  • 80. 159158 Pulsante está a árvore, quan- do olham pra ela cada um vê o que tem no seu próprio coração. Aqui des- te canto ela en- canta. Na casa murada, o cadeado. Na árvore livre um coração arromabdo
  • 82. 163162 OS MUROS, OS VILÕES Há um ditado popular que diz: “Quer fazer amigos? Então não construa muros, cons- trua pontes.” É hora de quebrar os muros e construir pontes.Pontes entre a criança e a comuni- dade, pontes entre a escola e a cidade, assim talvez tere- mos lugares amigáveis. Esta fotografia, tirada há pouco tempo e posterior ao ensaio fotográfico, mostra a pre- sença dos novos grafites, e a relação dos muros com a escala humana. FIG. 62
  • 84. 167166 MANOEL DE BARROS IDADE por detrás dos MUROS FETIV A “Acho que o quintal onde a gente brincou é maior do que a cidade. A gente só desco- bre isso depois de grande. A gente descobre que o tamanho das coi- sas há que ser medido pelo encantamento que as coisas produzem em nós.” ste capítulo é baseado na pesquisa de campo realizada por mim na disciplina de Psicologia Ambiental no Departamento de Psi- cologia da UFSC intitulada de “Afetividade por detrás dos mu- ros”. A pesquisa foi realizada com o objetivo de investigar a afetividade a partir das influências dos aspectos físicos sobre os usuários do NEI Pro- fessora Otília Cruz buscando por meio do viés da afetividade, entender o aspecto emocional que a arquitetura possibilita, proporcionando re- flexões que possam auxiliar em propostas de intervenções arquitetô- nicas no espaço da Creche, pois será a partir do entendimento sobre o que a Creche significa para os seus usuários, enquanto sentimentos e desejos, que será possível ver pessoas reais por detrás de um muro tão impessoal. Para adentrar o espiríto desta pesquisa é preciso compreender o que disse Yi Fu Tuan: “Espaço é mais abstrato que lugar. O que começa como espaço indife- renciado transforma-se em lugar a medida que o conhecemos melhor e o dotamos de valor”. (TUAN, 2013, p. 14) Logo, explorar a afetividade na arquitetura, é estudar os lugares. Lugares representam algo, tem valor. Este lugar, o Otília transmite sig- nificado e sentimentos, as pessoas se identificam com ele, e tem afeto por ele. A luta comunitária reforça a ideia de que há algo na arquitetura que vai além do construído, há memórias, histórias, vivências que con- tagiam as pessoas a ponto de elas não mais olharem para um espaço e o verem de forma indiferente, mas a ponto de olharem e se verem nele. Acredito que lugares são o que fazem da arquitetura algo tão incrível, algo que dá essência a nossas vidas. E é por isso que esse tra- balho busca esse olhar afetivo, um olhar que vê lugares e com isso vê as pessoas. Logo, o afeto é a chave. E
  • 85. 169168 Psicologia Ambiental, vertente interdisciplinar da Psicologia estuda a relação entre o ambiente e o usuário, que é quem vi- vencia este lugar. Alguns conceitos permeiam a Psicologia Am- biental como apropriação, identidade social, territorialidade, pertencimento e afetividade (BOMFIM, 2010). Este trabalho trata especialmente sobre a ‘Afetividade’, já que busca a compreensão das influências da arquitetura escolar sobre as pessoas (crianças e adultos) visto que o espaço físico traduz identidades e sentimentos, como descreve Sawaia: A cidade, a rua, o prédio, a porta representam modelos de subjetividade enquando porta- dores de história, desejos, carência e conflitos. Cada cidade, bairro, rua, até mesmo cada casa tem um clima que não advém, exclusivamente, do planejamento urbano e da geografia, mas do encontro de identidades em processos – identidades de homens e de espaços. Este clima perpassa diferentes entidades: eu, corpo, espaço doméstico, etnia, arquitetura. Dessa forma, os espaços construídos formam discursos e manipulam impulsos cognitivos e afetos próprios. (SAWAIA, 1995, P.21) Como descrito anteriormente há algo nos espaços que os tornam luga- res, há dimensões subjetivas que trazem o “clima” como diz Sawaia, e para entender essa relação do homem com os lugares, faz-se necessário investigar a afetividade. Afetividade, o conceito A Afetividade é tonalidade, cor emocional que impregna a existência do ser humano e é vivda como sentimento, os reações moderadas de prazer e desprazer que não se referem a objetos específicos e emoção: fenômeno afetivo intenso, breve e centrado em objeto que interrompe o fluxo normal da conduta. (SAWAIA, 1999, p.98) A afetividade enquanto sentimento e emoção, os quais com- põem a existência do ser humano (SAWAIA, 1999, p.98), podem auxiliar na investigação da relação entre o espaço construído e os seus usuários, podendo refletir na relação ambiental entre pessoas e a edificação. A afetividade aplicada ao estudos relacionados ao lugar foram desenvolvidas pela pesquisadora Zulmira Bomfim, baseando-se na teo- ria de Vygotsky (BOMFIM, 2010, p. 56), o qual entendia que não há cisão entre a razão e a emoção, e portanto propõe que se trabalhe a linguagem emocional e o pensamento a partir dos desejos. Pois segun- do ele, não há pensamento sem sentimento e vice-versa. (VYGOTSKY, 1991, p.64). Segundo a abordagem histórico-cultural, que tem Vygotsky como expoente, é a partir da mediação, que o homem compreende o mundo, por meio dos signos, os quais carregam os conceitos generalizados pela cultura humana. (REGO, 1995, p. 41-43). Portanto, pode-se compreen- der a afetividade como uma forma de mediação entre o mundo e o ho- Mas afinal, o que é afetividade? mem, por meio do pensamento e da emoção, os quais o orientam e o permitem entender o que acontece ao seu redor. Dessa forma, é evidente que investigar a afetividade é como traçar um retrato da visão de mundo de cada indivíduo a partir de seus pensamentos e emoções através das afecções do corpo, as quais segundo ESPINOSA (apud BOMFIM, 2010, p. 63) “permitem a com- posição dos indivíduos com outros” por meio dos bons encontros. Ou seja, investigar a afetividade é entender o lugar que cada um carrega dentro de si a partir do que compreende sobre o espaço por inter- médio de seus sentimentos e relacionamentos. Pois segundo TUAN (2012, p.19) a visão de mundo de um indivíduo representa as suas experiências tanto pessoais como sociais. Relembrando como bem disse Rubem Alves (2000, p. 14) “Ah! Uma vez cometido o erro arquitetônico, o espírito da escola já está de- terminado!” visto que o lugar pode trazer tanto a topofilia, que carac- teriza-se como elo afetivo positivo com o lugar que gera sentimentos de pertencimento e identificação, ou pode ocorrer a topofobia, onde o indivíduo desenvolve afetos de inquietações e medo quanto aquele lu- gar (TUAN, 2012), os quais ditarão seu comportamento, seus relaciona- mentos, seu trabalho e no caso das crianças seu desenvolvimento tanto cognitivo, social e como afetivo. A afetividade só pode ser investigada quando o olhar encontra- se sobre as pessoas, pois é delas que provém os sentimentos, emoções, anseios e pensamentos. Por essa razão este trabalho é dedicado a aplicação no Otília Cruz, o qual tem como protagonistas as crianças e a comunidade da grande Coloninha. Haja vista, que é por causa destes atores que hoje encontra-se reaberto este lugar, espaço com valor (TUAN, 2013). FIG 63 Esta fotografia tirada no NEI, é de uma miniatura de árvore, lembra muito o a árvore grande do parque.
  • 86. 171170 Esta distinção remete à questão figura-fundo isto é: ao esclarecimento do foco de um de- terminado estudo, em termos do tipo de relação tratada: (a) quais as características do ambiente em função das pessoas - centrado no ambiente, (b) quais os atributos das pessoas em função do ambiente - centrado nas pessoas. (GÜNTHER; ELALI; PINHEIRO, 2008, p. 378) Dentre os métodos utilizados, estão o Walkthrough (Centrado no ambiente), o Mapa Afetivo (Centrado na pessoa), o Mapa visual (Cen- trado no ambiente) e o Poema dos desejos (Centrado na pessoa). Estes 4 métodos foram utilizados, de forma a se complementa- rem, o Walkthrough permite um primeiro contato com o espaço físico por meio dos olhos de um usuário do espaço, o Mapa Afetivo aborda a relação sentimental e emocional entre os usuários e o espaço, o Mapa Visual (realizado após o Mapa afetivo) permite ao partipante sintetizar espacialmente seus sentimentos expressos anteriormente. E o Poema dos desejos permite uma interlocução com crianças para uma com- preensão de seus afetos em relação a Creche. A abordagem multimétodos fez-se necessária também, dada a diferença entre os participantes (adultos e crianças). Visto que além da diferença cognitiva, ambos percebem o espaço de formas diferentes: Afetividade, a prática ompreender os afetos das pessoas em relação ao lugar onde es- tão envolvidas não é uma tarefa simples, pois: Investigar sentimentos e emoções do habitante na cidade é um processo difícil de ser operacionalizado, porque emoções e sentimentos não são, normalmente, identificados e nomeados com facilidade. Poderíamos dizer que as sensações, emoções e sentimentos, como parte de uma linguagem interior, podem ser, muitas vezes, intangíveis como expres- são exterior. (BOMFIM, 2008, p. 255) Portanto, para dialogar de forma adequada com os participantes e compreender os afetos que tanto os adultos como as crianças pos- suem com o lugar, fez necessária a utilização de métodos que permitis- sem uma interlocução com os grupos de maneira eficaz. Os pesquisadores Elali, Günther e Pinheiro (2008, p. 381) rein- teram a importância da abordagem multimétodos no estudo Pessoa -Ambiente, para evitar-se lacunas e vieses metodólogicos, desde que considerado o fenômeno a ser estudado e a complementariedade entre os métodos para que a análise possa ser coerente e sintetizada. Dessa forma, considerando o fenômeno em estudo a ‘Afetivida- de’ foram utilizados 4 métodos para a pesquisa, dentre eles dois estão centrados no ambiente e dois são centrados na pessoa: “O espaço físico isolado do ambiente só existe na cabeça dos adultos para medi-lo, para vendê-lo, para guardá-lo. Para a criança existe o espaço-alegria, o espaço-medo, o espaço -proteção, o espaço-mistério, o espaço-descoberta, enfim, os espaços da liberdade ou da opressão.” (LIMA, 1989, p. 30) Para Mayumi (1989, p. 13-14) o espaço palpável, físico, é como um pano de fundo, onde as sensações se revelam e deixam marcas, as quais per- manecem mesmo após a infância. Segunda ela, essas sensações qualifi- cam o espaço de forma a torná-lo um “ambiente” (Para Tuan um lugar). Dessa maneira, para a criança não existe dissociação entre o espaço físi- co e o ambiente (espaço qualificado) pois o espaço para a criança repre- senta sensações, as quais ela experimenta sem compreender de forma cognitiva completa o espaço físico, capacidade que o adulto apresenta, o qual traz a ele maior impessoalidade e a capacidade de perceber o espaço sem necessariamento tê-lo como lugar. Não há como negar que os aspectos ambientais exercem impor- tante papel sobre o adulto e sobre a criança, ambos percebem o espaço, e ambos são influenciados por ele, porém o que é importante ressaltar é que a percepção de ambos é diferente, visto que o adulto devido ao seu desenvolvimento tanto cognitivo quanto social já foi muito mais in- fluencido pela cultura (REGO,1995, p. 41-43) na qual está inserido e sua forma de compreender o mundo é muito mais mediada pelos aspectos lógicos e intelectuais. Enquanto a criança, possui seu desenvolvimento cognitivo em desenvolvimento e portanto o que lhe apreende a atenção são os signos que lhe são traduzidos como sensações e sentimentos, antes mesmo de saberem o seu significado cultural. Para o adulto é muito mais difícil abstrair o mundo cognitivo do que para a criança. Portanto, para investigar a afetividade é necessário que os métodos utilizados dialoguem com o participante, seja ele, adul- to ou criança de forma a conseguir traduzir e exteriorizar a afetividade. É importante ressaltar que antes de ir à campo, a estruturação dos métodos contou com variadas leituras que percorreram especial- mente BOMFIM (2013) e RHEINGANTZ et al. (2007;2009), devido a relação com o estudo da afetividade e a abordagem multimétodos em Avalição Pós-Ocupação, tratados respectivamente. Portanto, após a leitura destes materiais somado a todo o re- ferencial teórico lido ao longo do semestre tanto na Disciplina de Psi- cologia Ambiental com a Profª Ariane Kuhnen, como na Disciplina de TCC I com a Profªa Vanessa Dorneles, foi possível adaptar os métodos pesquisados para o contexto do Otília Cruz. Em dois dos métodos mencionados, o Mapa Afetivo e o Poema dos desejos, foi realizado um teste piloto, com duas moradoras do en- torno próximo da Creche (minha mãe e minha irmã de 3 anos), para de- tectar possíveis inconclusões e perceber falhas que pudessem ser corri- gidas antes da aplicação real, visto que era uma adaptação do método. O que demonstrou ser bem importante, pois algumas perguntas feitas tanto a adulta quanto a criança, puderam ser aprimoradas, para que me- lhores resultados fossem obtidos. Assim foi possível reformular alguns itens da pesquisa e estabelecer uma duração média de 15 minutos para cada participante. C
  • 87. 173172 WALKTHROUGH O Walkthrough, ou caminhada pelo local, é um método de análise espa- cial que combina a observação com a entrevista. Tem como objetivo esta- belecer um contato inicial com o local, onde o pesquisador é acompanhado de uma pessoa-chave. (ELALI et al., 2008; RHEINGANTZ et al., 2009). Essa cami- nhada pode ser complementada por fo- tografia ou croquis... Que permitam ao pesquisador um primeiro contato com as ambiências espaciais, percebendo o conjunto espacial com suas positivida- des e carências. O primeiro Walkthrough foi reali- zada pelo Arquiteto Kevin Lynch quan- do levou um grupo de participantes voluntários para uma caminhada-en- trevista por Boston para compreender qual a imagem que tinha da área cen- tral da cidade. O método foi reconheci- do cientificamente pelos anos 60 e 70 com o advento da Psicologia Ambiental (RHEINGANTZ et al., 2009, p. 24) Este método precede os estudos mais aprofundados, onde é possível ter a “primeira impressão” sobre o lugar e permite auxiliar a pessoa-chave a arti- cular suas sensações em relação ao edi- fício. (RHEINGANTZ et al., 2009, p. 29). ste método foi aplicado na primeira visita intramuros, que fiz ao NEI Otília Cruz. Fui recebida pela diretora Fabrícia Luiz de Sou- za, sendo que primeiramente tivemos uma conversa em sua sala onde ela me contou um pou- co da história do lugar e durante a nossa conversa perguntei a ela, o que ela mais gostava no quesito espacial da creche e o que ela menos gostava. Ela então me convidou a conhecer a Creche com ela. Começamos a caminhada, e com a autori- zação dela fui fotogrando os ambientes que mais atraiam minha atenção – Ver próxima página (a úni- ca restrição era não foto- grafar as crianças). Ela me levou então ao local que mais lhe agradava, ao pátio central (Fig. 3A) que para ela possuía uma clari- dade muito agradável e era um lugar amplo, onde as crianças podem praticar diversas atividades, utilizando também as caixas de areia. E logo ao lado se encontrava o que ela me- nos gostava espacialmente (Fig. 3B), o pátio é con- formado por dois blocos, sendo que o bloco a es- querda possui suas portas se abrindo para o pátio e o bloco a direita possui suas portas abrindo para os fundos da Creche, consistindo em erro de projeto (o bloco deveria ter sido espelhado), portanto isso aumentava as distâncias percorridas e diminuía a interação entre as crianças por entre o pátio. Visitamos ainda as salas de aula dos dois blocos, e os espaços que se encontram em um nível inferior e que são acessados por uma rampa, onde estão a sala simbólica (Fig. 06) e a biblioteca (Fig. 07), dois espaços muito tranquilos e humanizados pelos próprios professores, próximos a árvores e do gramado, onde podem se ouvir passarinhos no meio da tarde. Visitamos também o pátio coberto, onde fica o refeitório, e seguimos até a área externa e cercada da Creche onde existe uma área aberta as vezes utilizada para educação física e também há o acesso até a quadra que devido a fortes chuvas ha- via desmoronado e não foi possível visitar. Esta área está abandonada, pois a comunidade não consegue recursos governamentais para a construção do cen- tro social. O Walkthrough foi mui- to importante para um primeira impressão sobre a realidade por de- trás dos muros, pois mesmo tendo morado durante 4 anos em frente a Creche conhecia apenas a realidade extramuros, a qual é muito diferente das ambiências vivenciadas lá fora. Lá dentro o muro não é ameaçador, é quase um aliado, o espaço opressor de quem vê lá de fora, lá dentro é quase como um refúgio, onde cantam até passarinhos. As percepções as quais experienciei, puderam dar sentido a continuidade deste trabalho. (As fotografias são acervo pessoal) E “Próximo as árvores e o gramado, podem se ouvir passarinhos cantando no meio da tarde.”
  • 88. 175174 08 01 02A 03A02B 03B 04 05 07A 07B0809A09B09C09D 10 12 11 06A 06C 06B 01 02 03 05 0406 07 11 12 09 10