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Jornal Laboratório do Curso de Comunicação Social - Jornalismo - 6o
Semestre/2002 Edição nº 24 - 15 de Outubro de 2002
Trabalho informal:
opção ou alternativa
A tarefa de descascar e limpar peixes e camarões se
tornou fonte de renda para mulheres de Barra do Sul.
Leia a matéria nas. Páginas 8 e 9
Geral
Não ter horário de
trabalho e nem pa-
trão. Este é o sonho
de muitas pessoas.
Profissionais avali-
am as vantagens
de estar no merca-
do informal e tra-
balhar por conta
própria. Página 10
Os guardadores
de carro, ou sim-
plesmente flane-
linhas, oferecem
segurança nos
estacionamentos
centrais.
Contracapa.
Cotidiano
Sacoleiros viajam semanal-
mente e driblam a fiscaliza-
ção para garantir sustento.
Página 13
Burocracia atrapalha pequenas empresas
familiares. Página 5
Saiba o que o legislativo municipal tem fei-
to (ou não) pelo trabalho informal. Página 6
Políticas Públicas
KennedyNunes
Gabriela Nicllau
KennedyNunes
KeltrynWendland
KennedyNunes
Primeira Pauta
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
2
Opinião
Um quadro cada vez mais
comum no Brasil e em outros
países é a grande quantidade de
trabalhadores na chamada eco-
nomia informal. Este setor já é
responsável por mais de 40% do
PIB brasileiro, aproximadamen-
te R$ 400 milhões do total de
R$ 1,08 bilhão gerados em 2001.
Nas grandes e pequenas ci-
dades, lá estão eles: o camelô, o
flanelinha, o vendedor ambulan-
te. Mas o que estes trabalhado-
res têm em comum? Nosso de-
safio foi retratar a realidade de
trabalhadores que desenvolvem
possibilidades singulares para a
situação do desemprego. A ven-
da de produtos cosméticos para
colaborar na renda mensal –
uma forma parcial de
informalidade; trabalhos tempo-
rários – conhecidos como “bi-
cos” – enquanto aguardam a
recolocação no mercado formal
ou através da coleta de materiais
recicláveis – que para muitos se
constitui a única fonte de renda.
Ou ainda, a dura realidade das
descascadeiras de camarão de
Barra do Sul. As mãos sujas e
machucadas pela tarefa diária de
descascar, limpar peixes e cama-
rões. É o caso de mulheres
como dona Maria Aparecida,
que divide seu tempo entre os
serviços domésticos, a banca de
peixes e, às vezes, o trabalho de
diarista.
Conheça alternativas como o
Programa Integrar, projeto que
investe na capacitação profissio-
nal e o Sine (Sistema Nacional
de Empregos), órgão que
intermedia mão-de-obra e tam-
bém oferece cursos para o tra-
balhador. E saiba a opinião de psi-
cólogos sobre as vantagens e des-
vantagens do trabalho informal.
Garantir a própria sobrevi-
vência guardando carros é a ta-
refa de muitos “flanelinhas” no
centro da cidade. Eles atuam nas
ruas de maior movimentação ou
perto de casas noturnas e
shoppings. Histórias como a de
Cláudio Felipe, o Cacá, de 18
anos, parecem indicar uma reali-
dade sem volta: “É o único jeito
de ganhar alguma coisa”.
Pequenas empresas e profis-
sionais autônomos, que fabricam
ou comercializam produtos
como churros ou cachorro-
quente, estão sujeitos a licença e
legalização de órgãos como a
Vigilância Sanitária, Corpo de
Bombeiros, Fatma ou Ibama.
Contudo, a realidade joinvilense
revela que ainda há muito por
fazer.
Enquanto dados apontam
que, no Brasil, cerca de 7 milhões
de crianças executam atividades
de trabalho em idade precoce,
em Joinville, 445 crianças cadas-
tradas no Peti - programa cria-
do pelo Governo Federal - mu-
daram sua rotina e tem seu aces-
so e a permanência garantidos na
escola.
Nas eleições deste ano, não
muito diferente das anteriores, a
principal bandeira levantada é a
“geração de empregos”. Contu-
do, o que o legislativo e o poder
público municipal em Joinville,
tem feito neste sentido? Como é
tratado esse setor responsável
por mais de 60% da geração de
empregos em todo o Brasil? Na
Câmara de Vereadores, são dis-
cutidas a regulamentação e rein-
tegração do trabalhador ao mer-
cado formal. No entanto, ainda
nenhum projeto saiu do papel.
“Não há ajuda pública da Pre-
feitura ou de outro órgão, não
há investimento algum na situa-
ção dos trabalhadores informais,
pois a questão não gera votos”,
avalia um ex-vereador e atual
candidato.
O trabalho informal surge
num contexto marcado pela fal-
ta de políticas públicas de desen-
volvimento e criação de empre-
gos, custos elevados de encargos
trabalhistas, perda de direitos, e,
por outro lado, o processo de
automação tecnológica e a
terceirização. A grande questão
permanece: é possível ou neces-
sário reverter o quadro da
informalidade no Brasil?
Keltryn Wendland, editora
O trabalhador que perdeu
seu emprego formal encontra no
mercado informal uma solução
para sobreviver. De um lado os
trabalhadores autônomos e, tam-
bém, os empregadores e empre-
gados de pequenas firmas. De
outro, temos os trabalhadores
que exercem o trabalho sem car-
teira assinada.
Uma questão de sobrevivên-
cia devido à perda de emprego
formal ou a uma opção de vida
de alguns trabalhadores que pre-
ferem desenvolver seu “próprio
negócio”. Há muita força de tra-
balho informal no Brasil, de cada
dez brasileiros, seis estão no mer-
cado informal.
Em Joinville, as filas nas uni-
dades do Sistema Nacional de
Emprego (Sine) não param de
crescer. De outro lado, as agên-
cias de emprego encontram di-
ficuldades para preencher as va-
gas disponíveis. A falta de mão
de obra qualificada: tanto em-
pregadores quanto agenciadores
são unânimes em apontar a fal-
ta de escolaridade como o prin-
cipal motivo. O que traz um au-
mento no trabalho informal.
No Brasil, o capitalismo tem
sido marcado por um grande de-
senvolvimento produtivo e
tecnológico. Este desenvolvi-
mento ocorre rapidamente, o
que nem sempre é positivo para
o empregado, trazendo um au-
mento de desemprego e dificul-
dades para empresários se man-
terem no mercado formal.
A empresa, devido ao eleva-
do custo de ter um funcionário
registrado, não disponibiliza va-
gas para futuros empregados.
Desta forma, a solução para o
desemprego acaba sendo o tra-
balho informal.
Nas atividades informais, os
que estão desempregados espe-
ram obter melhores condições de
trabalho e de vida. Não somen-
te isso, mas a realização profis-
sional, o que envolve diversos
fatores como felicidade, criati-
vidade, relações pessoais e liber-
dade.
Apesar de manter o trabalha-
dor afastado dos benefícios da
legislação trabalhista, o trabalho
informal nem sempre permite
uma melhoria nas condições de
trabalho e no padrão de vida.
Mesmo assim, esse trabalho de
meninos de rua, catadores de
lixo, vendedores ambulantes e
outros é uma realidade numéri-
ca significativa na sociedade atu-
al.
Essas atividades fora do tra-
balho tradicional são o resulta-
do da alternativa mais imediata,
criada pelos próprios trabalha-
dores. Quem sabe um dia vamos
poder superar os problemas do
mundo, trazendo para economia
informal mais dignidade.
Economia informal A busca por trabalho
Por Suzana Ferreira
Jornal Laboratório do
Curso de Comunicação
Social –Jornalismo – do
Instituto Superior Luterano
de Santa Catarina – Ielusc
www.ielusc.br
Diretor Geral:
Tito L. Lermen
Diretor do Curso:
Edelberto Behs
Professor responsável:
Juciano de S. Lacerda
DRT-PB 1.177
Editora:
Keltryn Wendland
Secretária:
Suzana Ferreira
EDITORIAS
Políticas Públicas
Shirlei Paterno
Ana Paula Bueno
Sérgio Leal Nunes
Juliana Bertolini
Cotidiano
Igor R. W. Schulenburg
Alessandra Kupas
Marino Braga Jr.
Aline Anacleto
Manoela de Borba
Francisco Carlos Farias
Sara Fernanda Coelho
Geral
Giovana H. Pereira
Juliana Kock
Gabriela Nicolau
Samara A. Zucchetti
Economia
Peterson Izidoro
Diagramação:
Adilson Luiz Girardi
Escreva para nós: Cur-
so de Comunicação Soci-
al- Jornalismo. Rua Alexan-
dre Dohler, 56, centro
89201-260, Joinville
Tel: (47) 4330155
E-mail:
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EXPEDIENTE
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e
l
a
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.
br
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
3
Economia
O avanço do trabalho infor-
mal em Joinville está atingindo
em cheio a arrecadação de tri-
butos municipais. A constatação
é do chefe da Divisão de Tribu-
tação da Secretaria da Fazenda
de Joinville, Luiz Henrique Lima,
que avaliou os resultados da pes-
quisa elaborada pela Fundação
Municipal Albano Schmidt
(Fundamas), com dados de
2001. O levantamento ouviu cer-
ca de 25 mil famílias, quase um
terço da população joinvilense.
Os números apontam que 13%
dos entrevistados vivem do em-
prego informal, ou seja, sem car-
teira de trabalho assinada.
De acordo com Lima, ao
driblar os concorrentes formais,
se livrando de impostos e dos
altos preços cobrados nos alu-
guéis dos pontos comerciais, os
empreendedores informais tor-
naram-se um dos principais cau-
sadores da queda de arrecada-
ção da Prefeitura de Joinville.
Com a economia clandestina,
podem vender produtos mais
baratos ou cobrar menos por
serviços oferecidos. “Aboca-
nham a maior fatia do mercado
dos formais”, constatou o chefe
da divisão.
A Fundamas aponta que a
maioria dos prestadores de ser-
viços sem regularização incluídos
na pesquisa, perto de 45%, está
na construção civil, do pintor ao
auxiliar de pedreiro. O levanta-
mento também revela que 14%
dos entrevistados são motoris-
tas e outros 10% atuam em ven-
das, sem a abertura obrigatória
de empresa, conforme exige a
legislação brasileira. A pesquisa
foi feita com alunos das escolas
municipais, que levaram um re-
latório para ser respondido pe-
los pais.
A informalidade pode pro-
vocar demissões no comércio e
na indústria, segundo o presiden-
te da Associação de Joinville e
Região da Micro, Pequena e
Média Empresa (Ajorpeme),
Volnei Francisco Batista. A con-
corrência desleal, com a redução
dos preços adotados pelos infor-
mais, afeta a venda do comércio
e a produção industrial, ocasio-
nando demissões. “É um risco
iminente”, afirma o empresário.
A prefeitura tenta reverter o
problema e pretende tornar mais
efetiva a fiscalização até o final
deste ano. O número de fiscais
em Joinville deve crescer de oito
para 30 ainda neste semestre,
garantiu o secretário municipal da
Fazenda, Roberto Busch. Ainda
é pouco. Pelos cálculos de Luiz
Henrique Lima, da Divisão de
Tributação da Secretaria da Fa-
zenda. Três microindústrias já
operam na informalidade em
Joinville. Boa parte dos informais
são ex-funcionários da indústria
que foram demitidos. “Preferem
montar o próprio negócio, mes-
mo que seja informal, a recorrer
a empregos no comércio”, com-
pleta. A alta tributação é uma das
causas de o pequeno empreen-
dedor optar pela não regulamen-
tação de sua empresa.
Uma das alternativas da
Ajorpeme para combater a
informalidade na microempresa
é a adesão da Prefeitura ao Sim-
ples, o imposto com tarifa única
para os pequenos empreende-
dores. Na análise do presidente
da entidade, haveria diminuição
dos encargos e incentivaria os
informais a regulamentarem o
negócio. O reflexo seria o au-
mento da base da arrecadação
municipal. O projeto tramita na
Câmara de Vereadores.
Informalidade reduz arrecadação
Pesquisa da Fundamas revela que
milhares de joinvilenses vivem do
emprego informal
Peterson Izidoro
Profissão ambulante: novos postos são inferiores ao crescimento da população ativa
Foto:KennedyNunes
O emprego sem carteira as-
sinada funcionou como amorte-
cedor para suprir, nos doze me-
ses encerrados em abril, a neces-
sidade de trabalho de pelo me-
nos 20 mil catarinenses que en-
traram no mercado e não tive-
ram suporte na economia tradi-
cional, conforme dados do Ca-
dastro Geral de Emprego e De-
semprego (Caged), do Ministé-
rio do Trabalho. Um cenário oti-
mista para 2002 garante a aber-
tura de 30 mil novos postos de
trabalho no Estado, o mesmo
número dos últimos dois anos.
O problema é que o cresci-
mento da população economi-
camente ativa em Santa Catarina
é de 2% ao ano (contra 1,6% de
toda a população). Isso represen-
ta a entrada de 50 mil pessoas
ao ano no mercado de trabalho,
mas como o setor formal da
economia só emprega mais 30
mil, os outros 20 mil são obri-
gados a optar pela informalidade
Trabalho informal amortece a ausência
de novas vagas na economia tradicional
para sobreviver. O comércio,
responsável por 9,9% dos traba-
lhadores com carteira assinada
(equivalente a 259.388 trabalha-
dores), é um dos setores que não
espera crescimento significativo
do volume de empregos for-
mais neste semestre.
Os números do Departa-
mento Intersindical de Estatísti-
ca e Estudos Sócio-Econômicos
(Dieese), referentes aos primei-
ros cinco meses do ano, indicam
que o emprego com carteira as-
sinada continuou aumentando
nas regiões industriais do estado
- Joinville e Blumenau - com
6,74% e 5,83% de elevação, res-
pectivamente.
Em Florianópolis, onde pre-
domina o setor terciário, o cres-
cimento foi bem menor: 2,63%.
A indústria da transformação no
Estado, por exemplo, criou cin-
co mil empregos, sendo que 2,4
mil, quase a metade, em apenas
dois segmentos: alimentação e
têxtil. [PI]
Crescimento da população
economicamente
ativa em 2002 (média de 2% ao ano)
Abertura de novos postos
de trabalho no Estado
Número de novos
trabalhadores sem
emprego
50 mil
trabalhadores
30 mil
vagas
20 mil
desempregados
Saldo negativo
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
4
Políticas públicas
Dos trabalhadores informais
encontrados nas ruas de Joinville
vendendoalimentos,apenas30são
cadastradosjuntoàVigilânciaSani-
tária e cumprem com a legislação
fiscal, trabalhista e previdenciária.
Nemosconsumidoresandamaten-
tos ao alvará de regulamentação.
Eles afirmam não observar esta
questão, mas consideram a higiene
dolocalimportante.
Márcia Santana de Paula faz
parte do grupo de trabalhadores
informais. Ela trabalha há vários
anos na rua. Começou como
guardadora de veículos, agora ven-
de churros em frente ao shopping
e está regulamentada. Trabalha de
segunda à sexta das 10h30 às 20h.
Quandochovemuitonãocostuma
ir, pois o abrigo do carrinho é pe-
InformalidadenãoéfiscalizadaemJoinville
Falta de fiscalização faz com que a irregularidade aumente e que número de ambulantes cresça
Ana Paula Bueno quenoeomovimentoémenor. Os
churros custam um real e as ven-
das costumam ser de mais de trinta
churros ao dia.
Valmor Manoel Valentina tam-
bém é trabalhador informal. Ao
contrário de Márcia ele não tem
alvarásanitárioedelocalização.Seu
ramo é a venda de cachorro-quen-
te em um estacionamento de uma
ótica, no centro. Valmor paga ape-
nas o que consome de luz no local.
Paraequilibraroorçamento,suaes-
posa faz marmitas durante o almo-
ço e ele sai para entregá-las. Nas
noites de sábado a quinta-feira, tra-
balha com a venda de cachorro-
quente. Só não comparece se tiver
algum evento em Araquari, local
que reside. O ambulante vende em
médiacinqüentacachorros-quentes
por noite e seu lucro é de 43 a 45%
do valor do alimento, que varia de
R$ 1,50 a R$ 2,30. A venda de churros complementa a renda na família Santana de Paula
Vendedores zelam pela higiene
GiseleCristiane Moser nuncapa-
rou para observar a questão do alvará
sanitário em nenhum dos lugares em
quejácomeu,porémobservaahigiene
do local. Tanto Márcia, que vende
churros, quanto Valmor que vende ca-
chorro-quente,garantemcuidardoma-
nuseiodosalimentos.Usamsemprelu-
vas,chapéus,jaleco,alémdeestaremsem-
prelimpandoocarrinho.
O argumento dos ambulantes não
convence muito Paulo Roberto
Halssemann:“Nãogostodecomernarua,
jácomi,masprefirocomeremcasa”.Paulo
se contradiz ao lembrar que não resiste à
maçã-do-amor,alimentomuitoencontra-
donomercadoinformaleaocomentarque
oatodecomernaruaécultural:“Aspessoas
interagemumascomasoutras”.
Quanto ao alvará de licença, Paulo
também nunca observou, mas já tinha
uma opinião formada sobre o assunto:
“Não é justo uns pagarem impostos e
outrosnão,masémelhorquefiquetudo
desregulamentado do que gente por aí
desempregada ou roubando”.
CarlosEduardoBiervendiasorve-
tenarua. Hoje, alémdesorvete,vende
cachorro-quenteecaldo-de-cana.Com
algumas economias, ele conseguiu alu-
garumterreno,construiuumacozinha
ecolocoumesasecadeirasparamelhor
servir seus clientes. Trabalhando neste
localháseismeses,Carlosjáganhapara
pagar as contas, que somam mil e tre-
zentos reais por mês. Tem um funcio-
nário e trabalha das 17h30 às 23h, de
segunda a segunda.
A Vigilância já esteve no local, e
Carlosprecisoufazeralgunsreparospara
continuartrabalhando.Omicro-empre-
sário terá algumas taxas fixas a serem
pagas mensalmente além do imposto
de3%dovalordecadaalimento. Mes-
mo tendo seu negócio regulamentado,
suaopiniãonãomudouemrelaçãoaos
trabalhadoresinformais:“Asdificulda-
des para aqueles que trabalham na rua
sãograndes,euseicomoé,nãoconde-
no quem não paga impostos”.
Vigilância Sanitária
Em Joinville não existe um órgão
que fiscalize o trabalho informal. Se o
vendedordecachorro-quentenãotem
alvarásanitário, aresponsabilidadenão
é só dele. Segundo o fiscal sanitarista,
LucianoJosédeFariasJunior,essade-
veriaseraobrigaçãodaCompanhiade
Desenvolvimento e Urbanização
(Conurb) que concede o alvará de lo-
calizaçãoaostrabalhadores.
LucianodizqueopapeldaVigilân-
cianestaquestãodainformalidadeévis-
toriarosambulantesqueestãocadastra-
dos junto à prefeitura e a Conurb. Na
cidade há 30 ambulantes regulamenta-
dos e todos trabalham no centro.
Ostrabalhadoresmuitasvezesnão
procuramalegalizaçãoporacharqueseu
trabalhovaiserinterrompidoouqueas
taxas são altas demais para o seu rendi-
mento.Outrofatorcontribuinteparaa
nãoregulamentaçãoéabaixaescolarida-
de: muitos têm medo de serem logra-
dos ou não entenderem o processo.
Luciano explica que a regulamentação
nãoétãocomplicada.Oprimeiropasso
éprocuraraConurb,comosdocumen-
tos básicos: identidade, CPF, compro-
vantederesidênciaepagarumataxade
0,2 UPMs que custa próximo de R$
19,00. Depois o trabalhador será enca-
minhadoparaprefeituraeparaavigilân-
cia,quefarãoadevidainspeção.
Oalvaráconcedeaoinformalodi-
reito de trabalhar de modo legal como
prevêalei,alémdeoferecerconfiançapara
o consumidor.
Gisele Cristiane Moser trabalha no
centro de Joinville. Próximo ao seu
local de trabalho tem um carrinho
de lanche. “Quando a fome bate,
comer na rua é muito bom”, diz.
Regulamentação
da atividade
trouxe
benefícios
para os
negócios de
Carlos
FotosKennedyNunes
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
5
Shirlei Paterno
Políticas públicas
Pequenos negócios ajudam renda familiar
As pessoas procuram alternativas para ficar mais tempo em casa e obter ganho extra
Ter um negócio próprio em
casa, aumentar a renda familiar e
ainda educar os filhos vêm se
tornando comum a cada dia.
Empresas familiares como
telemensagens, docerias entre
outros, ocupam cada vez mais o
ramo de industrias informais.
Alguns desses estabelecimentos
não são legalizados por opção.
Os proprietários asseguram que
os lucros não seriam suficientes
para pagar os impostos.
Para que se possa fabricar e
comercializar produtos é pre-
ciso legalizar o pequeno negó-
cio e obter licença de alguns ór-
gãos como Vigilância Sanitária,
Corpo de Bombeiros, Fatma
ou Ibama. Caso a legalização
não ocorra, a empresa é consi-
derada informal. A legislação
considera informal “a pessoa
que exerce alguma atividade
produtiva não registrada nos
órgãos competentes e que não
cumpre a legislação fiscal, tra-
balhista e previdenciária”.
Além de pequenas empre-
sas informais, o que se pode
observar são os profissionais
autônomos, especialmente, os
de profissões não regulamen-
tadas, ou seja, doceiras, vende-
dores de cachorro-quente, am-
bulantes. Essas pessoas não pre-
cisam trabalhar informalmen-
te, pois para que sejam regula-
rizadas, elas precisam do cadas-
tro como profissional autônomo.
A burocracia e o custo le-
varam Mauro Roberto
Segundo o site especializado
www.geranegocio.com.br, criado para
orientar quem deseja abrir uma
pequena empresa, para que
Mauro possa legalizar a pequena
empresa, há algumas etapas prin-
cipais que deveria cumprir. De-
pois de esclarecido o fato de não
se tratar de um profissional au-
tônomo e sim de um pequeno
negócio, é preciso definir de que
natureza é a empresa. Ela pode
ser: de sociedade anônima, de
sociedade por quota de respon-
sabilidade limitada, individual ou
de sociedade civil.
No caso de Mauro, a empre-
sa seria de sociedade individual,
ou seja, ela é individual porque
existe apenas um dono. Nesse
caso, o proprietário é responsá-
vel por todos os atos e compro-
missos praticados na empresa.
Para esse tipo de empresa é pre-
ciso procurar a Junta Comercial
Kricheldorf, 48 anos, a não re-
gulamentar seu negócio. Apo-
sentado como mecânico há
cerca de 10 anos, Mauro ven-
de leite. Todo o processo é in-
dustrial, o leite é retirado atra-
vés de ordenha mecânica, pas-
teurizado e empacotado. O leite
chega aos seus mais de oitenta
clientes como se tivesse saído
de uma grande empresa, com
uma diferença, a pequena em-
presa é informal e o pacote do
leite não exibe nenhuma mar-
ca. Mauro afirma que decidiu
trabalhar por conta própria
para aumentar a renda famili-
ar. Ele não fez a legalização e
justifica: “Se o negócio for le-
galizado, a lei toma conta e o
proprietário não ganha nem
pra pagar os impostos”.
e verificar se não há nenhuma
empresa com o mesmo nome.
Feita a verificação, entra-se
com o pedido de liberação e
aprovação do local do funcio-
namento da empresa, na Prefei-
tura. A resposta leva de dois a
três dias. Depois de aprovado o
local, deve-se dar entrada no
Alvará de funcionamento, que
depende da licença de vários
outro órgãos. (Veja endereços no
quadro ao lado)
Com a aprovação do local, a
empresa deve ter registrada a fir-
ma na Junta Comercial. Para isso,
é preciso além de diversos do-
cumentos pessoais, declarações
como o DARF e o DNCR, que
são adquiridos em qualquer pa-
pelaria e pagas em qualquer agên-
cia bancária. A seguir registra-se
a empresa na Receita Federal e
INSS. Além de precisar de licen-
ça, que pode ser ambiental, sani-
tária ou do Corpo de Bombei-
ros.
Depois de obter a licença e o
Alvará de localização é necessá-
rio se inscrever na Secretaria da
Fazenda Estadual, para que se
faça a contribuição do ICMS. Fei-
to isso, a empresa pode dar en-
trada ao processo de emissão de
nota fiscal da Fazenda Estadual
e na Inscrição Municipal, que
dará direito a emissão de nota
fiscal Municipal (ISS).
Legalizado tudo, obrigatori-
amente, a empresa precisa ser
inscrita no sindicato patronal da
categoria. Dependendo do pro-
duto que será fabricado é preci-
so o certificado do Inmetro, além
do registro de marca no Institu-
to Nacional de Propriedade In-
dustrial (INPI). Vale salientar que
essas são apenas as principais eta-
pas de todo processo, entre cada
etapa dessa existem outras. [SP]
Rachel Phais, 42 anos, é
um exemplo de profissional
autônoma.Balconista hásete
anos resolveu trabalhar por
conta própria. Ela faz e ven-
de salgadinhos, bolos e do-
ces para padarias. Rachel de-
cidiu trabalhar de forma au-
tônoma para poder cuidar
dos filhos, educar e dar mais
atenção às crianças. Ela está
regulamentada como profis-
sional autônoma, mas traba-
lhoudemaneirainformaldu-
rante dois anos e meio. A re-
gularização ocorreu porque,
segundoRachel,existe“mui-
to dedo duro”. E acrescenta:
“Não achei a regularização
burocrática, mas para o ‘bol-
so’ o processo não vale a
pena”. O profissional autô-
nomo precisa todo ano efe-
tuar o pagamento do Impos-
to Sobre Serviços de Qual-
quer Natureza (ISSQN) e a
Taxa de Licença para Locali-
zação e Permanência (TLL).
INSS - Instituto de Seguridade Social
Rua: 9 de março 241 – Centro
Fone: (47) 433-1912 / 451-1500
Delegacia Receita Federal Joinville
Rua: Mário Lobo 180 – Centro
Fone: (47) 431-6300
Inmetro – Instituto Nacional de Metrologia
Normalização e Qualidade
Rua: Abdon Batista 189 – Centro
Fone: (47) 422-6269
Junta Comercial – Jucesc
Rua do Príncipe 330, sala 103 – centro
Fone: (47) 433-5599
Sociedade Corpo de Bombeiros
Rua: Jaguaruna 13 – Centro
Fone: (47) 431-1112
Secretaria Fazenda
Rua: Dona Francisca 364 – Centro
Fone: 433-4200
Vigilância Sanitária
Rua: Itajaí 50 – Centro
Fone: 431-4551
Profissional autônomo
prioriza educação dos filhos
Dicas para criar ou regularizar empresa Onde encontrar:
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
6
Políticas públicas
A situação dos trabalha-
dores informais em Joinvi-
lle é debatida mais uma vez
em época de eleições. Se-
gundo discussões na Câma-
ra de Vereadores da cida-
de, as possibilidades seriam
as de regulamentar a profis-
são do trabalhador informal
ou reintegrá-lo ao mercado
formal. Nenhum dos pro-
jetos saiu do papel ainda no
legislativo municipal.
Trabalho informal demanda atenção política
Vereadores de Joinville e trabalhadores informais aguardam iniciativa do Legislativo federal
Juliana Bertolini
Dentinho critica os ór-
gãos responsáveis pela fis-
calização do trabalho in-
formal na cidade. “Seus
fiscais são autoritários e
anti-sociais”, comenta. O
ex-vereador Getúlio
Ferreira considera que o
objetivo desses órgãos é
acabar com o trabalho in-
formal em Joinville.
A fiscalização do traba-
lho informal é feita pela
Conurb (Companhia de
Desenvolvimento e Urba-
nização de Joinville). Se-
gundo o fiscal Rogério
Crespim, o comércio am-
bulante não é licenciado
atualmente. “O Estado
concedeu essa licença aos
ambulantes por dois anos,
mas hoje já venceu”, expli-
ca. O fiscal diz que quan-
do o trabalhador informal
é flagrado pela fiscalização,
ele é notificado para dei-
xar o local em 24 horas. Se
após o prazo de um dia o
ambulante continuar no
local, terá, então, sua mer-
cadoria apreendida pelos
fiscais da Conurb. A mer-
cadoria é mantida no pró-
prio órgão público. O tra-
balhador pode reaver seus
produtos através do paga-
mento de uma multa. “Às
vezes a multa é maior que
o valor dos artigos e o am-
bulante prefere abandoná-
los”, explica. Se a merca-
doria é perecível e não é
recuperada dentro de 48
horas, será doada.
Rogério Crespim lem-
bra que não há projetos po-
líticos na área do mercado
informal no momento, mas
enfatiza que se a situação
do trabalhador informal de
Joinville for legalizada de
alguma forma, a Conurb
certamente respeitará a lei.
A Conurb fiscaliza todos os
tipos de comércio ambu-
lante na cidade. A fiscaliza-
ção pode ser feita pela
Seinfra (Secretaria de
Infraestrutura), mas atual-
mente sua divisão de fisca-
lização verifica somente se
os estabelecimentos possu-
em alvará. [JB]
Getúlio Ferreira atribui a
competência sobre o tema aos
deputados federais. Ele diz não
haver um projeto de lei federal
em relação ao trabalhador in-
formal atualmente. Ferreira de-
fende a regulamentação do tra-
balho informal como uma pro-
fissão. “É necessário regula-
mentar a profissão do traba-
lhador informal com urgência
e, para isso, é preciso buscar
parcerias com deputados fede-
rais com idéias semelhantes”,
conclui. Wilson Vieira, vereador
do PT, também diz que os ve-
readores não podem fazer
muito pelo trabalho informal.
Segundo o vereador Mar-
cos Aurélio Fernandes, do
PartidodosTrabalhadores (PT),
no momento não há ne-
nhum projeto ou mobiliza-
ção no legislativo em relação
aos trabalhadores informais
da cidade. “Isto é devido à
legislação, que depende mais
do âmbito federal do que
municipal”, completa
Marquinhos, como é conhe-
cido popularmente.
Getúlio Ferreira, ex-vere-
ador do Partido da Frente Li-
beral (PFL), enfatiza que sim-
plesmente não há interesse
da maioria dos vereadores
pelo assunto. “Não há ajuda
pública da Prefeitura ou de
outro órgão, não há investi-
mento algum na situação dos
trabalhadores informais,
pois a questão não gera vo-
tos”, diz ele. Falta uma po-
lítica pública para lidar com
a situação, o que, segundo
Ferreira, seria fundamental
para regularizar quem está na
informalidade. Enquanto não
surgem propostas efetivas, o nú-
mero de informais aumenta.
Ele considera que a iniciativa
teria de partir do poder exe-
cutivo. O vereador conta que
já houve mobilização de alguns
vereadores sobre a questão,
mas os projetos surgidos não
foram aprovados pela Câma-
ra dos Vereadores ou foram
vetados pela prefeitura. De
acordo com Vieira, eleito depu-
tado estadual no último dia 3, o
PT tem projetos para o traba-
lhador informal, mas encontra
dificuldades para colocá-los
em prática. “O objetivo do
partido é tirar o trabalhador
das ruas e ajudá-lo a conseguir
um emprego formal, reinte-
grando-o ao mercado”, diz o
vereador, também conhecido
como Dentinho. Para ele, o
principal obstáculo seria con-
seguir apoio da Prefeitura. Se-
gundo o vereador, o PT tenta
colocar em prática o projeto
“Simples Municipal” com o
objetivo de extinguir o traba-
lho informal, garantindo um
emprego no setor formal para
todas as pessoas. ParaDentinho,
seria possível parcelar as dívi-
das e multas dos trabalhadores
informais e regularizar sua si-
tuação. A bancada do PT dis-
cute o projeto comcontabilistas
ecomerciantesdeJoinville.[JB]
Ex-vereador defende busca de parcerias
federais para efetivar regulamentação
Fiscalização é criticada
por setores do Legislativo
Dia 18 de outubro
14 às 22 horas
Bom Jesus/Ielusc
PARTICIPE!
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
7
Políticas públicas
Organizar a informalidade,
apesar da aparente contradição,
é possível. Em Joinville três
exemplos provam isto: a Asso-
ciação dos Camelôs de Joinville,
a Associação dos Artesãos de
Joinville e a Recicla Cooperativa
de Reciclagem, formada pelos
catadores de papelão e papel. A
Associação dos Camelôs de
Joinville foi criada em 1983, de-
pois que a prefeitura fez o atual
terminal de ônibus. No local, os
camelôs se concentravam ante-
riormente. Como a fiscalização
da prefeitura passou a dificultar
a atuação nas calçadas, 58 came-
lôs associaram-se e, com o apoio
de um advogado, conseguiram
regulamentar a atividade no cen-
tro da cidade.
Os pontos permitidos na pra-
ça foram sorteados, ainda com
o tradicional esquema das
barraquinhas. Posteriormente a
prefeitura fez um local especifi-
co: o camelódromo. Antes o es-
paço era localizado no inicio da
rua XV de novembro, hoje está
na praça Castelo Branco. Os 33
boxes do local tornaram-se pro-
priedade familiar, a documen-
Organizar a informalidade é possível
Associações de trabalhadores informais em Joinville dão maior segurança aos participantes
Sergio Leal Nunes tação passa de pai para filho.
O presidente da Associação
dos Camelôs de Joinville, Rui
Santos, afirma que trabalhar nas
ruas seria melhor para as vendas,
mas considera que o local tem
suas vantagens como a relativa
segurança e o abrigo das varia-
ções climáticas. O conforto tem
seu preço. No Camelódromo,
cada associado paga um alvará
de licença para a prefeitura e faz
uma contribuição mensal para a
associação. Todas as despesas de
manutenção das instalações são
bancadas pelos camelôs e o que
sobra das contribuições fica no
caixa da associação que funcio-
na em uma sala no local.
Garantia de loja
Na organização dos camelôs
há uma aproximação com a
maneira de agir dos comercian-
tes formais.“O camelô quer se
aperfeiçoar mais”, comenta Rui
Santos. No camelódromo já
existem boxes que adotam pro-
cedimentos comuns às lojas
como garantia dos produtos,
vendas parceladas e consultas de
cheques. “Os camelôs até aceita-
riam pagar impostos como um
lojista normal em troca de me-
lhores condições de trabalho e
de um espaço mais estruturado,
o atual sequer tem uma porta”,
desabafa o presidente da associ-
ação.
A Recicla Cooperativa de
Reciclagem foi fundada pelo seu
atual presidente, Marcos
Demarchi, há cerca de dois anos.
Cristiane, sua esposa e também
cooperada, lembra que Marcos
diariamente levava os filhos para
a escola e notou que no trajeto,
durante vários dias, uma garrafa
ficou jogada no chão sem que
ninguém a recolhesse. “Marcos
sentiu a necessidade de fazer algo
para resolver o problema, fun-
dou uma cooperativa”, conta
Cristiane, que também ajuda na
administração.
Os vinte cooperados iniciais
passaram a trabalhar juntos na
coleta de papel, isopor, plásticos
e, agora, até pneus. Os
“carrinheiros” - catadores asso-
ciados - entregam o que coletam
para a cooperativa que negocia
diretamente com as empresas
recicladoras, aumentando assim
a renda dos cooperados. A mai-
or parte dos cooperados são
desempregados.“Antigos coope-
rados hoje voltaram a trabalhar
formalmente, mas ainda conti-
nuam contribuindo com a
Recicla de alguma maneira”, afir-
ma Cristiane. A prefeitura ajuda
a cooperativa cedendo gratuita-
mente o local que serve de de-
pósito para o material coletado,
mas todas as despesas de manu-
tenção do depósito são de res-
ponsabilidade da Recicla. O
galpão está localizado na rua
Aubé,850, onde funcionava uma
antiga fabrica de motores marí-
timos. O local poderia até servir
de abrigo para os catadores que
moram na rua.“Devido ao risco
de incêndio ser muito grande,
em razão dos materiais guarda-
dos, foi feito um acordo entre
os cooperados em que não é
permitido passar a noite na
Recicla”, justifica Cristiane.
Caminho sem volta
A economia informal - que
gera renda mas não paga impos-
tos nem seguridade social - não
é irrisória em suas estatísticas e
quem nela ingressa nem sempre
faz o caminho de volta. Recente
levantamento feito pelo IBGE
(Fundação Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística) mostra
muitos brasileiros satisfeitos em
trabalhar sem patrão e sem car-
teira assinada. Já são 38,6% dos
trabalhadores. Entre os
pesquisados, 85% dos que dei-
xaram o trabalho assalariado e
passaram a ter seu próprio ne-
gócio informal não querem mu-
dar de ramo ou buscar o
reemprego no mercado formal.
São as pessoas que foram de-
mitidas das indústrias por serem
trabalhadores menos qualifica-
dos. Ao ingressarem na econo-
mia informal de serviços ou
produtos, constatam que sua
renda aumenta em relação à si-
tuação anterior. Em Joinville,
segundo a coordenadora do
projeto Integrar, Viviane
Schumacher Bail, desenvolvido
pela CUT (Central Única dos
Trabalhadores), 30% da popu-
lação está na informalidade ou
desempregado.
Os carrinheiros conseguem vender o material coletado por melhores preços na Recicla
Catadores entregam o que coletam para a cooperativa
Fotos:KennedyNunes
8 Primeira
Geral
A pesca considerada amadora
no Balneário Barra do Sul, a 40
km de Joinville, é o principal
motivador do trabalho informal
local. Por não existir legalmente
registro profissional e demais di-
reitos para os pescadores do mu-
nicípio, a tarefa de descascar e lim-
par peixes e camarões se tornou
fonte de renda para as mulheres.
Diariamente elas estão nas bancas
de pesca.
Maria Aparecida Cândido Sil-
va, de 37 anos, é um exemplo da
luta pelo sustento da família. Casa-
da com o pescador José Silva, de
40 anos, e mãe de cinco filhos, ela
assume as responsabilidades da
casa no período em que o marido
está no mar.
Filha de pescadores, Maria
Aparecida divide seu tempo com
serviços de sua casa, a banca de
peixes e, às vezes, o trabalho de
diarista. Ela gosta do trabalho, mas
reclama das condições em que o
executa, e sente que não tem pers-
pectiva de melhorar sua vida. “Já
estou velha para conseguir um tra-
balho melhor, eu não sei fazer ou-
tra coisa”, ressalta.
No mesmo caminho de Maria
está a filha Fabiana Silva, de 20
anos, que trabalha nas bancas des-
de criança. Casada desde os 15
anos e mãe do garoto Lucas
Almeida, de 3 anos, ela também é
responsável pelas despesas da casa
no período em que o marido sai
com o barco. Na última viagem a
trabalho, ele permaneceu por 45
dias no litoral paulista.
Com as mãos manchadas e
machucadas pelo serviço diário,
Fabiana sente por não ter dado
continuidadeaosestudos.“Eusem-
pre pensei que não precisava estu-
dar, que trabalharia como minha
mãe, mas hoje eu sei como estava
errada”, desabafa.
O trabalho nas bancas não é
Pesca é fonte de renda para mulheres de ba
Falta de regulamentação é um dos motivos para a procura do trabalho informal em Barra do Sul, n
Gabriela Nicolau nada fácil. Assim que os primeiros
barcos chegam com o camarão e
o peixe, tudo é dividido entre as
mulheres para começarem a lim-
peza. Após o dia de trabalho, elas
recebem R$ 0,80 por quilo de ca-
marão limpo e R$ 2,50 para cada
caixa com 20 kg de peixe limpo.
Porém, no momento de rece-
ber pelo serviço, elas enfrentam
um grave problema. Se trabalham
para donos de barcos o pagamen-
to é imediato. Se o trabalho for
para peixarias, principalmente as de
Joinville, elas recebem pouco, com
atraso e lhes são oferecidas cestas
básicas como forma de pagamen-
to.
Em relação à regulamentação
o presidente da Colônia de Pesca
Z-3, Esmael Cabral, de 45 anos,
explica que apenas treze das mu-
lheres possuem carteira de pesca-
dor. A maior dificuldade é durante
o período de “defeso” do cama-
rão, quando é proibida a pesca.
Anualmente, entre os dias 25 de
fevereiro a 28 de junho, nenhum
pescador deve montar redes ou sair
para o mar. Neste período, as mu-
lheres trabalham como diaristas,
roçam quintais, entre outras ativi-
dades.
Salário defeso
Cabral explica que, nesta épo-
ca, o associado da colônia recebe a
quantia de R$ 200,00, e se o pes-
cador tiver filhos com menos de 5
anos de idade, ele recebe R$ 15,00
por mês. Para ter direito ao “salá-
rio defeso”, Cabral ressalta que o
pescador deve estar com a anuida-
de de R$ 45,00 pagos à colônia em
dia, deve possuir carteira de pes-
cador há pelo menos três anos e
mais dois anos como agricultor.
O presidente da Colônia de
Pesca Z-3 afirma que as mulheres
que trabalham para seus maridos
não são contratadas por peixarias.
Fato negado por Cecília Rocha, de
32 anos, que trabalha para uma das
peixarias existentes no município.
Cecília tem três filhos, e seu mari-
do, o pescador Carlos Rocha, de
39 anos, trabalha para um dono
de barco.
Com a ajuda de seu filho Eduar-
do Rocha, de 18 anos, ele fica em
média vinte a trinta dias longe de
casa e, quando retorna, tudo que
pescou é vendido. Uma parte da
venda vai para o dono do barco e,
a outra, para os pescadores dividi-
rem entre eles. No caso de Rocha,
a divisão é entre ele e o filho.
Apesar do trabalho não propor-
cionar conforto para a família,
Cecília prefere trabalhar nas ban-
cas a ser diarista. Para ela, um dia
de trabalho pode lhe render até R$
30,00, mesmo no inverno. “Se eu
estivesse trabalhando como empre-
gada doméstica não ganharia mais
que R$ 15,00, e ainda correria o
risco de não receber”, justifica.
Cecília está cadastrada na co-
lônia, juntamente com seu marido
e filho. Quanto aos estudos, ela la-
menta não ter concluído o primei-
ro grau. O mesmo acontece com
seu filho Eduardo, que interrom-
peu os estudos ainda na 5ª série,
para trabalhar na pesca. “Meus
outros filhos mais novos estão es-
tudando, mas o Duda não quer. Ele
diz que não precisa. Eu temo por
seu futuro,que passe necessidades”.
As mãos sujas e marcadas pelo
trabalho diário são resultado da
prática e rapidez com que são des-
cascados até 20 kg de camarão em
apenas meio dia de trabalho. Fato
comprovado por Joana Lima Cas-
tro, de 57 anos, e viúva há oito.Ela
reclama do que recebe por seu tra-
balho. Após limpar doze caixas de
peixe com 20 kg cada, em oito de
horas de trabalho, recebeu R$
17,50. “É muito pouco, mas não
posso parar de trabalhar, não sou
aposentada. Eu morreria de fome”.
Além do trabalho nas bancas,
existe uma outra opção para com-
pletar o orçamento familiar. Du-
rante a noite, algumas mulheres
com a ajuda dos filhos, e até mes-
mo do marido, colocam o “puçar”,
uma armadilha para pegar siri e
retiram pela manhã. O siri é cozi-
do, sua casquinha é retirada e ven-
dida a R$ 1,00 a dúzia. A carne,
apreciada por donos de restauran-
tes da região, custa em média R$
8,00 a R$ 10,00 o quilo.
Seopescadorpossuirbarco,além
do peixe vendido para as peixarias,
sua esposa vende as sobras nas ban-
cas ou até mesmo em casa. O mes-
mo acontece com o camarão. “Des-
taformanãoprecisodividircomou-
tros pescadores e consigo ter lucro.
Se eu vendo o quilo do camarão sujo
por R$ 4,50, limpo ele irá custar R$
8,00”, destaca o pescador Marcos
Souza, de 31 anos.
Marcos trabalhou vários anos
comoempregado,econseguiucom-
prar um pequeno barco há quase
três anos. Sua esposa Carmem Sou-
za, de 28 anos, afirma que somente
com a compra do barco eles passa-
ram a ter melhores condições finan-
ceiras. “Antes éramos explorados,
tudo que meu marido pescava era
dividido,nãodavaparapagarasdes-
pesas”, comenta.
Ao final de cada dia de trabalho as mulheres recebem R$ 2,50 por 20Kg de peixe limpo
Gabriela Nicolau
Joinville/SC, 15 de
9ra Pauta
Geral
alneário
no norte do Estado
Para divulgar a qualida-
de dos pescados no muni-
cípio, assim como intensi-
ficar o fluxo de turistas
durante o inverno, a Colô-
nia de Pesca Z-3 com o
patrocínio do comércio lo-
cal criou, em 1998, a
FESCAM, a Festa do Ca-
marão. A festa está em sua
quinta edição e será reali-
zada no salão da Igreja
Nossa Senhora dos
Navegantes, ao contrário
dos anos anteriores em que
ocorria no Ginásio de Es-
porte, na Boca da Barra.
A 5° FESCAM acontece
no mês de setembro, com
quatro dias de duração,
onde o morador e o turis-
ta do balneário podem par-
ticipar de shows musicais,
bailes e ter acesso à pra-
ça de alimentação. Tam-
bém há parque de diver-
sões, pratos típicos e, no
domingo de encerramento,
tem o concurso “A melhor
descascadeira de cama-
rão”.
Durante a festa do ca-
marão, ocorre a feira de ar-
tesanatos feitos pelas mu-
lheres dos pescadores. O
visitante encontra na fes-
ta peças decorativas cons-
truídas com conchas, es-
trelas do mar, siris, cama-
rões, entre outros.
Festa do Camarão
atrai turistas na
baixa temporada
Juntas, mãe, filha e neta
trabalham para ajudar no
orçamento familiar. Elza
Severino Lopes, 44 anos,
desde os 15 confecciona em-
balagens para presentes e chi-
nelos de crochês. A filha
Fabiana, 22 anos, usa a
criatividade para riscar mol-
des para bordado. Ponto a
ponto, os desenhos vão to-
mando formas e cores que
encantam o comprador.
Beatriz, a netinha de apenas
3 anos e meio, percebe cada
movimento e tenta repeti-los
com toda ingenuidade de
uma criança.
A família que mora na rua
Afonso Moreira, no Conjun-
to Habitacional Ademar
Garcia, em Joinville, passa
por dificuldades financeiras,
mas acredita que, além de
ajudar no orçamento famili-
ar, o trabalho que as mulhe-
res realizam em casa faz par-
te de uma cultura artística
passada de geração para ge-
ração. “São quatro gerações
apaixonadas por trabalhos
artesanais. Minha mãe ainda
está viva e continua confec-
cionando produtos para
vender e ajudar a família”,
comenta Elza. Apesar dos
discursos freqüentes de que
a mulher está conquistando
espaço no mercado formal
de trabalho, muitas mulheres
como dona Elza, ainda fa-
zem parte da fatia feminina
mal-remunerada e de pouca
ascensão social na economia.
O Relatório do Desenvolvi-
mento Humano das Nações
Unidas, divulgado esse ano,
confirma a degradação da
situação das mulheres em ní-
vel mundial. Elas represen-
tam 70% do total do que vi-
vem em situação de miséria
absoluta.
Para Elza, que garante
um rendimento em torno de
R$ 250,00 por mês com a
venda de seus produtos, além
de ser um trabalho informal
e uma forma de ajudar no
orçamento, é também uma
diversão e um meio de es-
quecer as dificuldades do
dia-a-dia. Assim como ela,
centenas de outras mulheres
que acumulam as funções de
mãe, esposa e dona de casa
conseguem fazer parte de
um mercado de trabalho
que se constrói às margens
da formalidade. Há poucas
quadras da casa de Elza, é
possível encontrar uma gran-
de quantidade de produtos
feitos com qualidade,
criatividade, bom gosto e
com um preço acessível.
Fabiana é a única, entre os
três filhos, que tem um con-
tato permanente com os
pais. Ela e o marido atual-
mente estão desempregados
e conseguem manter os gas-
tos com a pequena Beatriz e
a manutenção da casa,
construída nos fundos do
terreno de dona Elza, ape-
nas com a venda de artesa-
nato. O marido de Elza tra-
balha com uma máquina de
descascar camarão. Juntando
o ganho no fim do mês,
Elza e seu marido, pagam as
contas de água, luz, IPTU e
alimentação. “Em datas es-
peciais, como Dia das Mães,
as vendas aumentam. Um
chinelo custa R$ 5,00 e en-
tre as embalagens a maior
custa R$ 1,20 e a menor
R$1,00”, comenta.
Elza enfatiza a importân-
cia do trabalho na vida de
uma mulher. “A gente se sen-
te valorizada”. Apesar de
todas as dificuldades finan-
ceiras, há vários anos a Fa-
mília Lopes demonstra so-
lidariedade em datas festi-
vas como a Páscoa, por
exemplo. Este ano eles se-
pararam R$ 100,00 do or-
çamento familiar para mon-
tar cestas que foram distri-
A força feminina no mercado informal
Elas acumulam a função de mãe, dona-de-casa, sustentam o lar e ajudam outras pessoas
buídas para crianças no
Morro do Amaral, umas das
comunidades mais carentes
de Joinville. “Não gostamos
de fazer propaganda disso.
A gente confecciona os pro-
dutos com muito amor, e é
preciso compartilhar este
sentimento. Quando não
podemos vender, doamos”,
salienta.
KeltrynWendland
Além do emprego formal, mulheres acumulam tarefas do lar
Sara Fernanda Coelho
e Outubro de 2002
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
10
Geral
Condições de trabalho às
vezes precárias, insegurança de
um emprego sem carteira assi-
nada ou sem seguro saúde são
preocupações dos que estão no
mercado de trabalho informal.
Mas é possível permanecer nes-
se segmento e tirar o melhor
proveito dessa escolha? Traba-
lhar informalmente pode ter al-
gumas vantagens. É preciso va-
lorizar essa escolha, planejar a
vida a partir desta nova opção.
Carlos Roberto Muller, de
47 anos, faz oito viagens por
dia, na sua bicicleta, do Jardim
Paraíso ao Bom Retiro e cen-
tro da cidade. Ele é um dos
muitos catadores de papel de
Joinville. O peso que ele carre-
ga varia de 35 até 80 quilos, de
cada vez. E o rendimento va-
ria de R$ 50,00 a R$ 60,00 re-
ais por semana.
Na informalidade traba-
lha-se muitas horas. Carlos co-
Informalidade pede criatividade
Estar no mercado
informal requer um
replanejamento
do cotidiano
Giovana H. Pereira
meça seu dia às 6h30 e só ter-
mina às 20h30, dependendo
das condições climáticas.
“Quando chove complica
tudo. Não dá para sair. O pa-
pelão molha, fica pesado na
bicicleta. E não tenho lugar para
esperar ele secar”, explica.
A alternativa que o catador
A bicicleta facilita a rotina de Carlos na coleta de papelão
KennedyNunes
É possível ter vantagens no
trabalho informal. “Pode-se ter
autonomia para escolher o que
se vai fazer e como e quando
trabalhar” observa a psicólo-
ga Daisy Gassenferth. A esco-
lha do local e da atividade per-
mitem conciliar outros com-
promissos e responsabilidades.
O ganho financeiro, às vezes,
também compensa. “Sempre
valorize sua escolha, seja o lo-
cal de trabalho ou a ativida-
de”, orienta a psicóloga a
Trabalho informal oferece vantagens
Autonomia para escolher o que se vai fazer, como
e quando trabalhar são vantagens da formalidade
quem trabalha informalmente.
Mas nem sempre a opção
pelo trabalho informal é espon-
tânea, às vezes acontece por ne-
cessidade de sobrevivência. “In-
dependentemente das causas que
levem alguém a trabalhar na
informalidade, esta pessoa deve-
rá estar atenta para pontuar seus
aspectos positivos”, ressalta
Daisy.
No vínculo empregatício há
benefícios que os informais ge-
ralmente não têm. Para se
conviver sem estes benefícios
é preciso aprender a lidar e a
resgatar estas ausências. A psi-
cóloga sugere ao indivíduo
planejar e administrar seu ne-
gócio, qualquer que seja.
“Deve-se ficar atento
para respeitar o limite de tem-
po de trabalho e preservar o
descanso. O desgaste pode le-
var ao estresse e a situações
negativas, tanto físicas como
emocionais”, completa a psi-
cóloga. (GHP]
de papel encontrou para não
voltar do centro à sua casa com
quilos e quilos de papelão é
deixá-los na casa dos sogros,
no bairro Bom Retiro. É lá tam-
bém que ele almoça algumas
vezes.
Carlos fala sobre as dificul-
dades em trafegar com a bici-
cleta carregada de papelão no
meio do trânsito. “Arriscar a
vida no meio dos carros todos
os dias é um desafio. Os ôni-
bus buzinam, passam raspan-
do. Ninguém te respeita, nin-
guém tem paciência”, desaba-
fa o catador.
O sonho de Carlos é traba-
lhar numa empresa e não pre-
cisar mais correr risco na rua,
ter a garantia de um salário fixo
e demais benefícios que sua fa-
mília poderia usufruir, como
seguro-saúde. Sobre isso, ele
comenta: “Nem eu nem minha
família temos qualquer garan-
tia em caso de doença. Depen-
demos do SUS e usamos o
posto de saúde do bairro”.
Restrições
O último emprego de
Carlos com carteira assinada foi
na Embraco, onde trabalhou
como operador de retífica.
Sobre trabalhar no mercado
formal de novo, ele comenta:
“Está cada vez pior. Quando
vou às agências de emprego, já
de cara me informam que, pela
idade, é difícil conseguir traba-
lho”. Ele não vê uma solução
a curto prazo para o seu caso.
Carlos estudou até a sétima sé-
rie do ensino fundamental.
“Para continuar os estudos é
preciso ter pique. E após um
dia inteiro a pedalar e carregar
peso, de onde tirar forças?”,
questiona.
A família de Carlos é com-
posta de mulher e quatro filhos,
com idade entre 12 e 22 anos.
A filha mais velha, de 22 anos,
está desempregada e ajuda a
mãe nos afazeres domésticos.
A segunda filha de Carlos, de
18 anos, tem necessidades es-
peciais. Sua mulher não pode
trabalhar, dedica-se à garota e
a casa. Os dois filhos menores,
de quinze e doze anos, estu-
dam. A esperança do catador é
dar condições para que seus fi-
lhos tenham melhores chances.
Marilete de Oliveira
Fernandes tem 33 anos e tra-
balha como mensalista de se-
gunda à sexta-feira. E, aos
sábados, como diarista em
outra casa.
Ela já trabalhou com car-
teira assinada em uma ma-
lharia, onde atuava como
revisora e também no setor
de embalagem. Seu último
emprego foi recente e ficou
nele por três meses. Marilete
trabalhava em uma empresa
de limpeza que presta servi-
ços a terceiros. Foi dispensa-
da por medidas econômicas.
Atualmente a vida de
Marilete se divide entre o seu
trabalho e aos três filhos. Eles
vivem do salário dela e da
pensão alimentícia que rece-
be do ex-marido. “Meu fi-
lho mais velho, o Maurício,
está trabalhando numa grá-
fica e será registrado quan-
do fizer 16 anos, em outu-
bro. Ele trabalha durante o
dia e estuda à noite”, conta.
Já o filho do meio,
Fernando, de 13 anos, é alu-
no do Balé Bolshoi, em Jo-
inville. Deixou a capoeira e
se apaixonou pelo balé. Fez
o teste, passou e sua rotina
mudou completamente.
“Ele estuda no período da
manhã e, à tarde, vai ao
Bolshoi, onde está no segun-
do ano. Ele adora! A televi-
são entrevistou-o este ano,
no Festival de Dança”, orgu-
lha-se ela.
Marilete estudou até a oi-
tava série do ensino funda-
mental. “Eu estudei à noite,
fiz o curso para adultos. Te-
nho consciência de que, para
mudar minha vida e é o que
espero, preciso voltar aos es-
tudos”. Ela ainda não sabe
quando, e justifica: “O
Juliano, de dois anos, ainda é
muito pequeno, não tenho
com quem deixá-lo. [GHP]
Trabalhar
para uma
vida melhor
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
11
Geral
O Programa Integrar é uma
alternativa para o trabalhador ou
desempregado voltar ao mercado
de trabalho. Implantado no muni-
cípio em julho de 1998, o projeto
investe na capacitação profissio-
nal de pessoas com mais de 25
anos, desempregadas ou
ameaçadas de perder o emprego
por não possuírem o 1o
grau com-
pleto. “O programa é desenvolvi-
do pela Confederação Nacional
dos Metalúrgicos, filiada à CUT,
e visa a formação educacional
para o trabalho e a busca pela ci-
dadania”, declara a coordenadora
técnica do projeto em Joinville,
Viviane Bail Schumacher.
Viviane apresenta dados for-
necidos pelo Integrar, que apon-
tam que 30% dos trabalhadores
Projetocapacita pessoas paraomercado
SamaraA.Zucchetti
Cursos gratuitos são alternativa conseguir novo emprego
na cidade estão desempregados ou
na informalidade. “O desempre-
go não é um problema particular
do cidadão e sim do sistema polí-
tico vigente”, desabafa.
A falta de perspectiva e a von-
tade de arrumar outro emprego
encaminharam Marina Borgmann
da Rosa, 30 anos, até o progra-
ma. Ela trabalhava como domés-
tica e agora com os estudos em
andamento pretende melhorar a
renda familiar. “Estou com meu
curso em andamento, mas ainda
desempregada. Mesmo assim,
acredito que sem as aulas do In-
tegrar seria pior. Mais do que fa-
zer contas, eu aprendo a praticar
a minha cidadania”, diz Marina.
As dificuldades para se man-
ter no mercado de trabalho leva-
ram a repositora de estoques,
Ivanilde Alves de Mello, 38 anos,
a procurar o projeto. “Ouvi falar
do curso do Integrar na associa-
ção de moradores do meu bairro.
Me interessei, pois não conseguia
acompanhar as aulas dadas no
supletivo”, comenta. Ela está no
módulo do Ensino Fundamental.
Com a ajuda do curso, Ivanilde
pretende terminar o 2o
grau e es-
tudar enfermagem. “Os professo-
res do Integrar dão um grande
incentivo, me sinto renovada des-
de que comecei a fazer parte des-
te programa”, diz.
Hoje o programa está com as
aulas interrompidas devido a de-
mora do repasse das verbas. “A
verba é distribuída pela Secretá-
ria de Estado do Desenvolvimen-
to Social e da Família, portanto
essa distribuição não é tão imedi-
ata, essa é a causa da interrupção
das aulas. Devemos voltar aos tra-
balhos agora no segundo semes-
tre”, explica Viviane.
TodososdiasIdalinaGomesPi-
res, 11 anos, acordava cedo para tra-
balhar com a mãe, Sarita Marcondes
Gomes, 41 anos. Às sete horas já es-
tavanasruasdeJoinville,catandopa-
pelãoelatinhasdealumínio,antesque
ocaminhãodelixopassasseelevasse
tudo. Háumanoemeio, Idalinaestá
noProgramadeErradicaçãodoTra-
balho Infantil (Peti).
O programa foi criado pelo Go-
vernoFederalparapossibilitaroaces-
so,apermanênciaeobomdesempe-
nhodecriançaseadolescentesnaes-
cola. O objetivo é eliminar todas as
formasdemão-de-obraprecoce,con-
formeacoordenadoradoprojetoem
Joinville,Tereza Soares.
ParaaeducadoraElizangelaValério,
este projeto é uma iniciativa positiva,
porém ainda não previne o trabalho
infantil. “O número de crianças no
programaéinsatisfatório,selevarem
consideração que Joinville é a maior
cidadedoestado,comcercadequinhen-
tos mil habitantes”, afirma.
OPetitem445criançasinscritas,
com idade de 7 a 15 anos. Tiago
Brisdo, 9 anos, morador do bairro
Jardim Paraíso, também é uma des-
tascrianças.Hojeeleparticipadeou-
tra jornada dupla. De dia vai para a
escola, Maria Berezoski, no Jardim
Paraíso, e, à tarde, para o programa,
noCentroEducacionalDomBosco.
Há um ano e meio, Tiago trabalhava
nas ruas com seu irmão vendendo
picolé. Segundo ele, era para ajudar
seuspaisenãoficarsozinhoemcasa.
SuafamíliatrabalhanolixãodeJoin-
ville,catandopapelãoparapoderso-
breviver. Tiago falou que sua maior
alegria é poder estar no programa,
porqueagoraelepodeestudarecon-
tinuar ajudando sua família com os
R$40,00mensaisquerecebe.
Conforme a educadora
Elizangela,Tiagoéumasdascrianças
que mudaram muito depois da en-
trada no programa. De uma criança
agressiva e solitária, para um garoto
educadoeamigávelcomtodos.Seus
PETI: uma saída para o
trabalho infantil
paissentemamesmareaçãoemcasa.
Segundo sua mãe, Maria Elizete
Brisdo, 41 anos, seu comportamen-
to mudou bastante. “Ele está mais
calmoeagorapodefreqüentaraesco-
laquetantodesejava”,asseguraela.
Nemtodasascriançastêmames-
ma chance que Tiago e Idalina tive-
ram.Aexploraçãodotrabalhoparece
uma realidade distante no mercado
joinvilense, onde a indústria exige
mão-de-obraqualificada.Mas,indu-
zidospelapobreza,desigualdadeeex-
clusão social existente em Joinville e
em todo o país, muitas crianças tro-
cam o banco das escolas pelo traba-
lhonasruas.Embuscadealgunstro-
cados para ajudar na renda familiar,
ignoramatividadesperigosas,quere-
presentamsériosriscosparasuasaú-
de e seu desenvolvimento.
O trabalho infantil é uma dura
realidade não apenas no Brasil. Esti-
ma-se hoje que haja 180 milhões de
criançassubmetidasaameaçasfísicas
epsicológicas.Ouseja,umaemcada
oitocriançaséforçadaarealizartarefas
diáriasemáreasnãorecomendáveis.
No tráfico de drogas e na prostitui-
ção,aUnicef,órgãodasNaçõesUni-
das,estimaquehojeestejamenvolvi-
dascercade8milhõesdecrianças.
SegundopadreFelício,daParóquia
Bom Jesus, no Aventureiro, não há
dúvida de que o problema decorra de
causaseconômicasesociais,ondeade-
sigualdade social vem sendo cada vez
maisampliadasendoprecisoestabele-
cerdiretrizeseobjetivoscapazesdere-
duzirapéssimadistribuiçãodariqueza.
NoBrasil,quase7milhõesdecri-
anças executam atividades em idade
precoce.SegundooRelatóriodaOr-
ganizaçãoInternacionaldoTrabalho
(OIT), órgão das Nações Unidas, o
trabalho infantil no Brasil teve uma
redução de 23% entre 1992 e 1999.
Nostrêsanosseguintes,emrazãode
campanhas nacionais desenvolvidas
pelaIgrejaCatólicaepelogovernofe-
deral,aquedadotrabalhoinfantilche-
gou a 13,6%. Mas voltou a baixar
consideravelmente daí para frente,
hoje mantendo um índice médio de
2,4%entreosanosde1998e1999.
O Sistema Nacional de Em-
prego (Sine/SC), além de
intermediar mão-de-obra, ofere-
ce cursos para a qualificação e
requalificação do trabalhador. O
sistema funciona através de um
cadastramento do desemprega-
do. Neste cadastro, ele inclui o
último emprego e a área que pre-
tende trabalhar. Os cursos acon-
tecem de acordo com as neces-
sidades do cadastrado, visando
a recolocação do desempregado
no mercado. O número de pes-
soas que conseguem um empre-
go após um curso é variável. E
o registro deste número não é
possível de ser contabilizado pelo
sistema.
O Sine é um órgão que rece-
be recursos do Fundo de Am-
paro ao Trabalhador (FAT) do
Governo Federal. Os cursos es-
tão paralisados porque as verbas
ainda não foram distribuídas,
mesmo assim a procura é inten-
sa. Odenir da Silveira, 28 anos,
fez cadastro há mais de um ano,
já passou por três empregos tem-
porários. Ele já trabalhou como
garçom, chapeiro e recepcionis-
ta. Apesar de não conseguir um
emprego fixo, ele quer fazer um
curso através do Sine para ob-
ter um emprego imediatamente.
“Pretendo fazer um curso de vi-
gilante, pois está área vem cres-
cendo em Joinville”, comenta.
Os cursos mais procurados são
os relativos ao comércio e pres-
tação de serviços. “O número de
pessoas que procuram o setor de
serviços é grande. Se o desem-
pregado faz um curso de quali-
ficação, o Sine tem condições de
intermediar e recolocá-lo no mer-
cado de trabalho”, revela a co-
ordenadora regional do Sine em
Joinville, Isabel Cristina Almeida
do Amaral.
O número de pessoas que
têm cursos técnicos e acabam
migrando para outras áreas é um
fato freqüente apontado pelo
Sine. “O curso técnico exige uma
maior especialização de conhe-
cimentos, por isso poucas pes-
soas podem preencher vagas
neste departamento. Já o setor
de serviços sempre está em ex-
No Brasil, quase 7 milhões de crianças trabalham
nas ruas. Em Joinville, o Peti tirou das ruas 445
Juliana Kock
Sine orienta e cadastra desempregados
Cadastro
Instituto Integrar de Santa
Catarina
Rua do Príncipe, n° 838 - 1°
Andar - Fundos - Centro
Telefones: (47) 433- 5826 /
433- 6258
Sine/SC
Rua: Mário Lobo, n° 214 –
Centro
Telefone: (47) 422- 4255
pansão. Além disso, os cursos
deste campo são mais rápidos e
tem maior demanda do merca-
do”, garante Isabel.
A coordenadora afirma, en-
tretanto, que um curso não é ga-
rantia de emprego imediato. “O
mercado quer um profissional
qualificado e atualizado, os cur-
sos oferecidos são gratuitos basta
a pessoa se empenhar e batalhar
por um objetivo”, avalia. [SAZ]
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
12
Os carrinhos de cachorro-
quente têm se tornado bastante
populares. Espalhados em inú-
meros cantos da cidade, nor-
malmente no período que vai
da noite até a madrugada, os
“dogueiros”, preparam cada
lanche com todo o requinte e
criatividade, almejando con-
quistar ao máximo os seus fre-
gueses.
Pedro Steffens, 47 anos, na-
tural da cidade de Ituporanga,
SC, desde 1999 comercializa
cachorro-quente num dos pon-
tos estratégicos da avenida
Jerônimo Coelho. Casado, pai
de dois filhos, Pedro veio para
Joinville em 1974 como ope-
rário de indústria Após passar
por várias empresas de gran-
de porte, como Cia. Hansen,
Comfloresta e Embraco, sem
possibilidade alguma de sobre-
viver da aposentadoria do
INSS, ele começou no ramo
de “dogueiro”como empre-
gado. Logo em seguida, seu
patrão, que decidiu ir embora
para Santos, vendeu-lhe o
equipamento. Pedro, dali por
diante, estabeleceu-se por con-
ta própria.
Trabalho sem rotina
Indagado sobre o dia-a-dia
de um vendedor de cachorro-
quente, respondeu que a pro-
fissão não chega a ser uma ro-
tina, uma vez que há sempre
uma cara nova, um freguês di-
ferente. “Tem dias que eu te-
nho que suportar certos incon-
Criatividade para atrair clientes
Concorrência faz “dogueiros”
se espalharem pela cidade
e incrementarem seus lanches
Marino Braga Jr.
Dificuldade: informais querem legalizar barraquinhas para manter qualidade
venientes e atender gente
alcoolizada, pessoas que se al-
teram e chegam a provocar
brigas no local”, salienta.
Os sanduíches são prepara-
dos ao ar livre. Para priorizar
a higiene e evitar problemas de
contaminação, tanto o carrinho
como o equipamento são dia-
riamente lavados com água e
detergente, enxugados até se-
car por completo e, por fim,
esterilizados com álcool. Com
relação aos alimentos, no final
de cada expediente os únicos
que são reaproveitados para o
dia seguinte são a farofa, a ba-
tata palha e a salsicha crua. Os
demais complementos: milho,
ervilha, molho, verduras, legu-
mes, que sobram, são imedia-
tamente jogados fora.
O “dogueiro” não tem no-
ção de quantas unidades saem
por noite, tudo varia de acor-
do com o movimento. Os dias
de maior venda ocorrem nos
finais de semanas.
Concorrência
Antigamente, os cachor-
ros-quentes eram compostos
apenas de pão, molho, maio-
nese, cat chup e mostarda.
Hoje, a lei da concorrência
impôs novos aprimoramen-
tos, e os lanches se tornaram
mais incrementados, com mi-
lho, ervilha, tomate, alface,
batata palha, farofa e até purê
de batata. Outros, mais refor-
çados ainda, são acrescidos
com calabresa, bacon ou pe-
quenos pedaços de frango.
Pedro Steffens há tempos
vem tentando de todas as ma-
neiras providenciar a sua do-
cumentação, pois depende do
negócio para o sustento da
família. Sua aposentadoria é
pouco mais de um salário mí-
nimo.
Luiz Antônio de Oliveira,
22 anos, que mantém um car-
rinho de cachorro-quente nas
proximidades da danceteria
Metrô, no bairro Itaum, subúr-
bio da cidade, está no mesmo
impasse do Pedro. Buscando
fazer de seu carrinho uma lan-
chonete com ponto fixo, o
vendedor vem tentando obter
a legalização, mas tem dificul-
dade de realizar os procedi-
mentos legais junto à Prefei-
tura e Vigilância Sanitária. “A
perspectiva de lucro com este
negócio é suficiente para ga-
rantir a sobrevivência”, com-
pletou Luiz Antônio, que não
dispõe de mais nenhum recur-
so financeiro para formalizar o
empreendimento.
KennedyNunes
Cotidiano
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
13
Cotidiano
Sacoleiros, muambeiros e até
contrabandistas. Assim são cha-
madas as pessoas que viajam ao
Paraguai para comprar e reven-
der mercadorias. Cerca de 40 mil
pessoas atravessam diariamente a
Ponte da Amizade, ligação entre a
cidade brasileira de Foz do Iguaçu
e a paraguaia Ciudad del Este, sem
nenhum tipo de controle. Foz do
Iguaçu é considerada o segundo
pólo turístico e terceiro parque ho-
teleiro do Brasil. A cidade fica a
poucos quilômetros das fronteiras
do Paraguai e Argentina.
A sacoleira A. D. A, 51 anos,
há dez anos sobrevive das viagens
que faz ao Paraguai. Ela descreve
as dificuldades enfrentadas: “Às
vezes temos que desviar o cami-
nho da volta, dormir em postos,
se esconder dentro do mato para
não perder nossas mercadorias. É
muitohumilhanteecansativo”.Ela
ainda afirma já ter sido tratada
como ladra e criminosa. “Só
estamos trabalhando para sobre-
viver, fico revoltada porque já
perdi mercadoria para a receita e
vi policiais colocando minhas mer-
cadorias dentro de carros particu-
lares. Os melhores produtos fi-
cam para eles”, afirma A.D.A.
São 750 quilômetros de
Joinville até o Paraguai, cerca de
12 horas de viagem. Em média,
120 pessoas viajam semanalmen-
te a Ciudad del Este, para com-
prar bebidas, perfumes, cigarros
e produtos eletrônicos, trazidos
em grande quantidade. Quem
comprar acima da cota, de
U$150,00, deve ir à aduana do
país e declarar a mercadoria para
pagar o imposto. Assim não cor-
rerá riscos de perder o produto,
pois as mercadorias apreendidas
não podem ser recuperadas.
S.R.C, 38 anos, há dois anos
trabalha com mercadorias trazidas
do Paraguai. Por falta de opção,
escolheu essa área como meio de
sobrevivência. “Sou hipertenso, e
Sacoleiros garantem sobrevivência
Compra e venda de produtos é a forma de trabalho dos viajantes que vão ao Paraguai
não posso trabalhar de emprega-
do. É muito difícil, mas não é jus-
to os policiais tirarem da gente e
ficarem com as mercadorias para
eles”, declara o sacoleiro.
A vigilância das fronteiras, a
fiscalização de entrada e saída de
pessoas no país e o controle dos
meios de transportes que fazem
o tráfego internacional são de res-
ponsabilidade da Polícia Federal.
Cabe ainda a investigação e o
combate de crimes nacionais ou
transnacionais como o tráfico de
drogas, armas, mulheres e crian-
ças, furtos e roubos de veículos,
contra a fauna e a flora, como a
exploração ilegal de madeira e a
pirataria.
A Receita Federal é o órgão
encarregado a destinação das mer-
cadorias apreendidas. Segundo o
delegado Paulo Correia Yung,
muitas pessoas já se tornaram
empresários do contrabando.
“Tem gente que compra ônibus e
coloca pessoas para viajar e com-
prar as mercadorias”, comenta.
O ônibus quando apreendido
passa por uma vistoria. Os passa-
geiros com bagagem acima da cota
tem toda a mercadoria apreendi-
da. Elas ficam guardadas no de-
pósito da Receita Federal durante
a tramitação do processo fiscal.
Conforme o delegado Yung, a
Receita dá uma destinação para
cada produto. Os cigarros são in-
cinerados, mercadorias falsifica-
das - como cd’s e relógios - são
destruídas. Veículos são leiloados.
Bens eletrônicos e equipamentos
de informática são doados para
órgãospúblicos.Brinquedoserou-
pas são destinados à prefeitura
que, por sua vez, faz o repasse
para instituições beneficentes.
“Não existe um esquema espe-
cialnasestradas,nemdiasfixospara
fazer as operações. Caso contrário,
ficariamuitofácilparaossacoleiros.
Geralmente, a polícia faz cerco na
madrugada de quinta-feira, quan-
do os sacoleiros retornam da via-
gem”,explicaodelegado.
Prejudicados pela alta do dólar, sacoleiros reclamam da atual situação financeira do País
“Às vezes temos que desviar o caminho da volta,
dormir em postos, se esconder dentro do mato,
tudo para não perder nossas mercadorias.
É muito humilhante e cansativo”
Aline Anacleto
KeltrynWendland
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
14
Cotidiano
O número de mulheres traba-
lhando no ramo da revenda de
cosméticos aumenta a cada ano.
É uma fonte de renda para quem
não pode ficar muito tempo fora
de casa, para quem tem crianças
pequenas ou para quem está de-
sempregado e precisa se susten-
tar.
Ivanir Pinheiro, 29 anos, re-
vende os produtos da Avon há um
ano. Ela garante que é um exce-
lente negócio, principalmente para
mulheres que tem o serviço do-
méstico para fazer e cuidar da
família. “Se ausentar de casa, na
maioria das vezes, é uma tarefa
difícil para as donas de casa”,
completa Ivanir.
Outro ponto positivo é a con-
tribuição na renda familiar. A
revendedora afirma que se não
fosse esse dinheiro, certamente
passaria por dificuldades. Acácio
Ramos, 38 anos, marido de Ivanir,
trabalha como taxista autônomo.
Quando a situação aperta, ela
pode ajudá-lo nas despesas com
as revendas que faz. “Graças a
esse dinheiro, eu consegui pagar
as dívidas desse mês. A venda de
cosméticos é importante para o
sustento da minha família”, justi-
fica.
Não é um emprego com car-
teira assinada, férias e décimo ter-
ceiro, mas pode servir como com-
plemento e até mesmo como úni-
ca fonte de renda para pessoas
que não conseguem arrumar em-
prego. Alini Senábio, 25 anos, está
desempregada há três meses e
consegue juntar dinheiro com as
revendas de cosméticos, para aju-
dar seu marido a terminar a cons-
trução de sua casa. “Ela está de-
sempregada no momento e, com
as revendas, pode me ajudar nas
contas, para que a gente possa
comprar nossos móveis, comer e
pagar água, luz e gás”, diz
Vanderlei Senábio, 21 anos,
torneiro mecânico.
Revenda de cosméticos atrai mulheres
À procura de uma fonte de renda, público feminino investe em produtos de beleza
A revenda de cosméticos
normalmente é feita de porta
em porta. E não são todos que
gostam dessa abordagem.
Ivanir Pinheiro disse que às
vezes é bem recebida, mas em
outras leva um “não”, sem
poder explicar o motivo da
visita.
Taisa Juglair, 21 anos, pro-
fessora de inglês, diz que quan-
do escuta a campainha e vê que
são vendedoras já pensa em
uma desculpa. “Normalmente
Para a vendedora de cosméticos Ivanir Pinheiro, ter um escritório em casa é fundamental para o sucesso do negócio
A síndrome da abordagem direta, de porta em porta
elas chegam em uma hora
indesejada. Não as trato mal,
mas peço que vão embora logo,
pois estou muito ocupada. Se
a vendedora for inconvenien-
te, não faço questão de ser
muito educada”, continua.
Já Francisca Ramos, 77
anos, aposentada, diz que gos-
ta quando recebe visita das
revendedoras: “Elas sabem
conversar e convencer os cli-
entes. Têm lábia”.
Ivanir Pinheiro sempre está
com os catálogos em baixo do
braço. “Nos finais de semana
sempre consigo vender alguma
coisa para os parentes e ami-
gos. Qualquer oportunidade é
importante para nós
revendedoras, que ganhamos a
vida com esse trabalho”.
Sustento básico
Hoje Ivanir consegue suprir
suas necessidades básicas. E
sempre que alguém reclama de
dificuldades, dá a dica: “Nós
não ficamos ricas, mas pode-
mos pelo menos colocar comi-
da na mesa, e até pagar o estu-
do de nossos filhos”.
Quem está fora do merca-
do formal e deseja trabalhar
com revenda de cosméticos,
pode entrar em contato com
as marcas desses produtos pe-
los sites. Outra possibilidade é
contatar as revendedoras, fazer
um cadastro e pagar uma taxa
de matrícula. [AK]
Alessandra Kupas
Alessandra Kupas
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de outubro de 2002
15
Cotidiano
Um salário de dois mil reais
por quatro horas de trabalho por
dia pode parecer um sonho para
uma família de classe média, mas
é a realidade de muitas garotas de
programa de Joinville, que vivem
da prostituição. O resultado é a
exclusão familiar e social.
Carla, 34 anos, é uma destas
prostitutas que buscam a qualquer
preço um reinserção na socieda-
de, por meio de emprego, mas até
agora não conseguiu. “Quando a
gente está na rua, ninguém olha, a
não ser para fazer sexo”, diz ela,
ressaltando que deixou o filho
com a mãe, em Londrina, e veio
para Joinville em busca de uma
vida melhor. Com ensino funda-
mental incompleto, sem dinheiro
e profissão indefinida, acabou na
Rua do Príncipe, vendendo o pró-
prio corpo para viver. Mora em
um quarto de pensão alugado
com mais quatrogarotas. “Não ligo
para minha mãe, porque tenho
vergonha do que faço, mas sem-
pre deposito dinheiro para meu
filho”, justifica Carla, afirmando
que não tem contato com a famí-
lia há mais de três anos.
Outra garota de programa que
perdeu vínculo familiar é
Bernadete, 42 anos, que mora no
quarto com Carla. “Quando mi-
nha mãe morreu, meu pai arru-
mou outra esposa e eu fugi de
casa”, conta a prostituta, acrescen-
tando que já consumiu e
comercializou drogas, mas que
agora só vende o corpo. Com 1,50
metro, setenta quilos, uma mini-
saia e, na boca, batom de 1,99,
Bernadete reclama que o merca-
do está fraco. “Quando tinha
meus dezoito anos, ganhava bem,
mas hoje apenas alguns trocados”,
compara. Para ludibriar a concor-
rência, a prostituta inovou e ago-
ra aceita até pagamento pré-data-
do e ticket-refeição. “Até agora
ninguém sustou o cheque”, co-
menta Bernadete, ressaltando que
O outro lado da prostituição
A maioria das garotas de programa ganha bem, mas querem largar a prostituição
não teve espírito empreendedor.
“ O que ganhei, gastei”, lastima.
Ganhar muito, mas não des-
frutar é o que acontece diariamen-
te com as garotas que trabalham
nas boates fazendo strip-tease em
Joinville. Silvia, 27 anos, foi uma
das que ganhou, mas não levou o
dinheiro. “Cobravam por progra-
ma R$ 100, 00, fora à bebida, que
o cliente consumia”, diz, contrari-
ada, porque oitenta por cento fi-
cava com o dono do estabeleci-
mento. Silvia trabalhou numa bo-
ate as margens da BR 101 e hoje
faz ponto na Rua Abdon Batista.
Com um corpo bem definido, diz
que faz mais de sete programas
por dia e seu faturamento supera
a casa dos três mil reais. “Procuro
guardar um pouco, mas nem sem-
pre dá”, lastima. Além de traba-
lhar na rua, Silvia também atende
a domicílio. “Coloquei um anún-
cio no jornal e eles ligam para meu
celular”, diz. Questionada se quer
mudar de vida, disse que um dia
irá largar a prostituição, mas ago-
ra não. “Preciso de mais dinheiro,
quero montar meu próprio negó-
cio”, argumenta, ressaltando que
um dia terá um restaurante.
O sonho de ter uma vida me-
lhor, ainda persiste na cabeça das
garotas de programa joinvilenses,
principalmente para uma pré-ado-
lescente que não conheceu as bo-
necas e já faz sexo como uma
mulher. Roberta, 14 anos, deixou
o convívio familiar com nove anos.
Seus pais foram mortos por trafi-
cantes em Curitiba. Não gosta de
comentar sobre o passado, apenas
sobre o futuro. “Acredito que um
príncipe irá me tirar desta vida”,
sonha. Roberta não tem traços de
uma prostituta e, sim, de uma cri-
ança abandonada. Com 1,50 de
altura, cabelos cacheados e emba-
raçados, chinelos de dedo, cami-
seta, bermuda e boné, ela freqüen-
ta a Rua do Príncipe. “Fico sem-
pre andando, pois não posso parar
num local, porque tem alguém que
denuncia”, explica Roberta, com
medo da polícia, que pouco pode
fazer para coibir, pois o código
penal brasileiro oferece dúbia ex-
plicação (veja box ao lado).
Além de conviver com a rejei-
ção da sociedade, comercializar o
próprio corpo, as garotas progra-
ma joinvilenses sobrevivem num
mundo de incertezas, que na bus-
ca de agradar o cliente, deixam
seus desejos de lado. Entre os
principais riscos está o tráfico de
drogas, que encontra na prostitu-
ta seu ponto de distribuição, a
agressão por parte do cliente in-
satisfeito e o próprio risco de con-
tágio com um doença sexualmen-
te transmissível.
Os artigos 227 e 230,
do Código Penal, caracte-
rizam a prostituição como
crime quando uma pessoa
convence, induz ou atrai
alguém a praticar o ato se-
xual. Já no artigo 228, ela
só será encarada como
crime quando alguém usa
da prostituição ou obte-
nha lucro com ela, ou seja,
sustentado com a prosti-
tuição de outra pessoa. O
que os artigos concordam
é que a pena prevista é de
reclusão de um a dez
anos, mais multa que é
estipulada pela Justiça.
O que diz a lei
As esquinas das principais ruas do centro da cidade são os locais preferidos
Francisco Carlos Farias
e Manoela de Borba
KennedyNunes
Primeira Pauta
Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002
16
Cotidiano
O preço varia de R$ 3,00 à
R$ 5,00. O benefício é a segu-
rança do carro no horário das
compras, do trabalho ou do
lazer. As conseqüências podem
ser desagradáveis. Os guardado-
res de carros, ou simplesmente
“flanelinhas”, são presença cons-
tante nas ruas de maior movi-
mento em Joinville. O freqüen-
tador paga pela vaga ao estaci-
onar, o que “garante” a segu-
rança do carro. Os flanelinhas
escolhem a dedo os locais. Eles
podem surgir de forma indivi-
dual ou em grupo, dependen-
do do local escolhido pelo mo-
torista.
Visando uma maior seguran-
ça e a garantia da rotatividade do
espaço de estacionamento nas
ruas da cidade, surgiu a chama-
da Zona Azul, sob responsabili-
dade da Conurb (Companhia de
Desenvolvimento e Urbaniza-
ção). Antes da implantação do
serviço, os veículos ocupavam
vagas nas ruas mais movimenta-
das durante o dia inteiro. Segun-
do o presidente da Câmara dos
Dirigentes Lojistas (CDL) de
Joinville, Gilson Bohn,azonaazul
conta mais com 1,5 mil vagas.
Os preços variam de acordo
com a localização. Nas ruas cen-
trais da cidade o custo é de R$
1,50, sendo que o número de va-
gas comporta aproximadamente
300 veículos. Mesmo com a im-
plantação e o pleno funcionamen-
to, a Zona Azul não absorveu os
“informais”. Nos arredores de
um grande Shopping, no centro,
a situação é flagrante. O
freqüentador é abordado logo ao
estacionar. O flanelinha Cláudio
Felipe, o Cacá, de 18 anos atua
há 2 anos em Joinville. “É o úni-
co jeito de ganhar alguma coisa”,
Boa vaga tem preço
Trânsito de Joinville é marcado pela informalidade. Flanelinhas atuam principalmente à noite
diz. Ele afirma não gostar de fi-
car pedindo dinheiro pelo ser-
viço, e garante: “Quem deixa
alguma coisa é sempre bem re-
cebido”. Ao ser questionado
sobre o freqüentador que não
paga, Cacá desconversa: “A
gente tenta tratar sempre igual,
não tem outro jeito. Sempre
tem um troquinho pra dar”.
Maior organização
No período noturno, a pre-
sença de guardadores de carros
também é constante. Dificilmen-
te um freqüentador irá a qual-
quer casa noturna ou clube da ci-
dade sem encontrar os informais.
Os principais pontos são as
Avenidas Getúlio Vargas e João
Colin, além da Rua Visconde de
Taunay, que apresentam movi-
mento semanal constante em três
das principais casas noturnas da
cidade. José Ignácio, de 54 anos
é um dos informais no setor que
trabalham na noite. Para ele, a
falta de oportunidade foi o prin-
cipal motivo para dar início a
esse tipo de serviço. “Tenho 54
anos e já trabalhei com várias
coisas. Fazia pequenos arranjos
de palha pra vender, mas ficou
muito complicado”, explica.
Ignácio trabalha há cinco
anos como guardador de car-
ros no centro de Joinville e tem
clientes assíduos. “Uso esse ter-
reno faz tempo, e ele fica lotado
todo sábado. Muita gente que
vem aqui sabe que o trabalho é
sério”, garante. Ele exalta ain-
da a organização dos guarda-
dores de carros que trabalham
na noite e não aceita ser cha-
mado de flanelinha. “Com 54
anos? Eu trabalho sério!
Flanelinhas são as crianças na
rua que não tem outra opção”,
conclui.
Histórias como a de José
Ignácio não são as predomi-
nantes entre os informais que
trabalham na área. A maior
parte dos flanelinhas entrevis-
tados durante a reportagem
atua durante o dia e tem ida-
des entre 15 e 22 anos. Mui-
tos deles vieram do Paraná
em busca de oportunidade
aqui e não foram absorvidos
pelo mercado formal.
Um dos casos é o de J.S., de
17 anos. A família continua mo-
rando em Curitiba. Ele veio
para Joinville acompanhado de
dois amigos que também são
flanelinhas e se alternam nas re-
giões centrais e do Centreventos
Cau Hansen, quando há algum
evento. “Juntamos dinheiro em
Curitiba. Deu pra comprar uma
passagem só”, diz ele, que ape-
sar das dificuldades não pensa
em voltar. Quando pergun-
tado sobre o local onde pas-
sa a noite, tenta mudar de
assunto e se mostra disper-
so: “Dou um jeito”. J.S., as-
sim como tantos outros
flanelinhas que atuam na ci-
dade, tenta sobreviver na
informalidade e não perde
a esperança: “Não quero fi-
car aqui pra sempre. Quero
voltar pra escola”. [IRWS]
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  • 1. Jornal Laboratório do Curso de Comunicação Social - Jornalismo - 6o Semestre/2002 Edição nº 24 - 15 de Outubro de 2002 Trabalho informal: opção ou alternativa A tarefa de descascar e limpar peixes e camarões se tornou fonte de renda para mulheres de Barra do Sul. Leia a matéria nas. Páginas 8 e 9 Geral Não ter horário de trabalho e nem pa- trão. Este é o sonho de muitas pessoas. Profissionais avali- am as vantagens de estar no merca- do informal e tra- balhar por conta própria. Página 10 Os guardadores de carro, ou sim- plesmente flane- linhas, oferecem segurança nos estacionamentos centrais. Contracapa. Cotidiano Sacoleiros viajam semanal- mente e driblam a fiscaliza- ção para garantir sustento. Página 13 Burocracia atrapalha pequenas empresas familiares. Página 5 Saiba o que o legislativo municipal tem fei- to (ou não) pelo trabalho informal. Página 6 Políticas Públicas KennedyNunes Gabriela Nicllau KennedyNunes KeltrynWendland KennedyNunes Primeira Pauta
  • 2. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 2 Opinião Um quadro cada vez mais comum no Brasil e em outros países é a grande quantidade de trabalhadores na chamada eco- nomia informal. Este setor já é responsável por mais de 40% do PIB brasileiro, aproximadamen- te R$ 400 milhões do total de R$ 1,08 bilhão gerados em 2001. Nas grandes e pequenas ci- dades, lá estão eles: o camelô, o flanelinha, o vendedor ambulan- te. Mas o que estes trabalhado- res têm em comum? Nosso de- safio foi retratar a realidade de trabalhadores que desenvolvem possibilidades singulares para a situação do desemprego. A ven- da de produtos cosméticos para colaborar na renda mensal – uma forma parcial de informalidade; trabalhos tempo- rários – conhecidos como “bi- cos” – enquanto aguardam a recolocação no mercado formal ou através da coleta de materiais recicláveis – que para muitos se constitui a única fonte de renda. Ou ainda, a dura realidade das descascadeiras de camarão de Barra do Sul. As mãos sujas e machucadas pela tarefa diária de descascar, limpar peixes e cama- rões. É o caso de mulheres como dona Maria Aparecida, que divide seu tempo entre os serviços domésticos, a banca de peixes e, às vezes, o trabalho de diarista. Conheça alternativas como o Programa Integrar, projeto que investe na capacitação profissio- nal e o Sine (Sistema Nacional de Empregos), órgão que intermedia mão-de-obra e tam- bém oferece cursos para o tra- balhador. E saiba a opinião de psi- cólogos sobre as vantagens e des- vantagens do trabalho informal. Garantir a própria sobrevi- vência guardando carros é a ta- refa de muitos “flanelinhas” no centro da cidade. Eles atuam nas ruas de maior movimentação ou perto de casas noturnas e shoppings. Histórias como a de Cláudio Felipe, o Cacá, de 18 anos, parecem indicar uma reali- dade sem volta: “É o único jeito de ganhar alguma coisa”. Pequenas empresas e profis- sionais autônomos, que fabricam ou comercializam produtos como churros ou cachorro- quente, estão sujeitos a licença e legalização de órgãos como a Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, Fatma ou Ibama. Contudo, a realidade joinvilense revela que ainda há muito por fazer. Enquanto dados apontam que, no Brasil, cerca de 7 milhões de crianças executam atividades de trabalho em idade precoce, em Joinville, 445 crianças cadas- tradas no Peti - programa cria- do pelo Governo Federal - mu- daram sua rotina e tem seu aces- so e a permanência garantidos na escola. Nas eleições deste ano, não muito diferente das anteriores, a principal bandeira levantada é a “geração de empregos”. Contu- do, o que o legislativo e o poder público municipal em Joinville, tem feito neste sentido? Como é tratado esse setor responsável por mais de 60% da geração de empregos em todo o Brasil? Na Câmara de Vereadores, são dis- cutidas a regulamentação e rein- tegração do trabalhador ao mer- cado formal. No entanto, ainda nenhum projeto saiu do papel. “Não há ajuda pública da Pre- feitura ou de outro órgão, não há investimento algum na situa- ção dos trabalhadores informais, pois a questão não gera votos”, avalia um ex-vereador e atual candidato. O trabalho informal surge num contexto marcado pela fal- ta de políticas públicas de desen- volvimento e criação de empre- gos, custos elevados de encargos trabalhistas, perda de direitos, e, por outro lado, o processo de automação tecnológica e a terceirização. A grande questão permanece: é possível ou neces- sário reverter o quadro da informalidade no Brasil? Keltryn Wendland, editora O trabalhador que perdeu seu emprego formal encontra no mercado informal uma solução para sobreviver. De um lado os trabalhadores autônomos e, tam- bém, os empregadores e empre- gados de pequenas firmas. De outro, temos os trabalhadores que exercem o trabalho sem car- teira assinada. Uma questão de sobrevivên- cia devido à perda de emprego formal ou a uma opção de vida de alguns trabalhadores que pre- ferem desenvolver seu “próprio negócio”. Há muita força de tra- balho informal no Brasil, de cada dez brasileiros, seis estão no mer- cado informal. Em Joinville, as filas nas uni- dades do Sistema Nacional de Emprego (Sine) não param de crescer. De outro lado, as agên- cias de emprego encontram di- ficuldades para preencher as va- gas disponíveis. A falta de mão de obra qualificada: tanto em- pregadores quanto agenciadores são unânimes em apontar a fal- ta de escolaridade como o prin- cipal motivo. O que traz um au- mento no trabalho informal. No Brasil, o capitalismo tem sido marcado por um grande de- senvolvimento produtivo e tecnológico. Este desenvolvi- mento ocorre rapidamente, o que nem sempre é positivo para o empregado, trazendo um au- mento de desemprego e dificul- dades para empresários se man- terem no mercado formal. A empresa, devido ao eleva- do custo de ter um funcionário registrado, não disponibiliza va- gas para futuros empregados. Desta forma, a solução para o desemprego acaba sendo o tra- balho informal. Nas atividades informais, os que estão desempregados espe- ram obter melhores condições de trabalho e de vida. Não somen- te isso, mas a realização profis- sional, o que envolve diversos fatores como felicidade, criati- vidade, relações pessoais e liber- dade. Apesar de manter o trabalha- dor afastado dos benefícios da legislação trabalhista, o trabalho informal nem sempre permite uma melhoria nas condições de trabalho e no padrão de vida. Mesmo assim, esse trabalho de meninos de rua, catadores de lixo, vendedores ambulantes e outros é uma realidade numéri- ca significativa na sociedade atu- al. Essas atividades fora do tra- balho tradicional são o resulta- do da alternativa mais imediata, criada pelos próprios trabalha- dores. Quem sabe um dia vamos poder superar os problemas do mundo, trazendo para economia informal mais dignidade. Economia informal A busca por trabalho Por Suzana Ferreira Jornal Laboratório do Curso de Comunicação Social –Jornalismo – do Instituto Superior Luterano de Santa Catarina – Ielusc www.ielusc.br Diretor Geral: Tito L. Lermen Diretor do Curso: Edelberto Behs Professor responsável: Juciano de S. Lacerda DRT-PB 1.177 Editora: Keltryn Wendland Secretária: Suzana Ferreira EDITORIAS Políticas Públicas Shirlei Paterno Ana Paula Bueno Sérgio Leal Nunes Juliana Bertolini Cotidiano Igor R. W. Schulenburg Alessandra Kupas Marino Braga Jr. Aline Anacleto Manoela de Borba Francisco Carlos Farias Sara Fernanda Coelho Geral Giovana H. Pereira Juliana Kock Gabriela Nicolau Samara A. Zucchetti Economia Peterson Izidoro Diagramação: Adilson Luiz Girardi Escreva para nós: Cur- so de Comunicação Soci- al- Jornalismo. Rua Alexan- dre Dohler, 56, centro 89201-260, Joinville Tel: (47) 4330155 E-mail: redacao.pp@ieusc.br EXPEDIENTE www . h u m o r t a d e l a . com . br
  • 3. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 3 Economia O avanço do trabalho infor- mal em Joinville está atingindo em cheio a arrecadação de tri- butos municipais. A constatação é do chefe da Divisão de Tribu- tação da Secretaria da Fazenda de Joinville, Luiz Henrique Lima, que avaliou os resultados da pes- quisa elaborada pela Fundação Municipal Albano Schmidt (Fundamas), com dados de 2001. O levantamento ouviu cer- ca de 25 mil famílias, quase um terço da população joinvilense. Os números apontam que 13% dos entrevistados vivem do em- prego informal, ou seja, sem car- teira de trabalho assinada. De acordo com Lima, ao driblar os concorrentes formais, se livrando de impostos e dos altos preços cobrados nos alu- guéis dos pontos comerciais, os empreendedores informais tor- naram-se um dos principais cau- sadores da queda de arrecada- ção da Prefeitura de Joinville. Com a economia clandestina, podem vender produtos mais baratos ou cobrar menos por serviços oferecidos. “Aboca- nham a maior fatia do mercado dos formais”, constatou o chefe da divisão. A Fundamas aponta que a maioria dos prestadores de ser- viços sem regularização incluídos na pesquisa, perto de 45%, está na construção civil, do pintor ao auxiliar de pedreiro. O levanta- mento também revela que 14% dos entrevistados são motoris- tas e outros 10% atuam em ven- das, sem a abertura obrigatória de empresa, conforme exige a legislação brasileira. A pesquisa foi feita com alunos das escolas municipais, que levaram um re- latório para ser respondido pe- los pais. A informalidade pode pro- vocar demissões no comércio e na indústria, segundo o presiden- te da Associação de Joinville e Região da Micro, Pequena e Média Empresa (Ajorpeme), Volnei Francisco Batista. A con- corrência desleal, com a redução dos preços adotados pelos infor- mais, afeta a venda do comércio e a produção industrial, ocasio- nando demissões. “É um risco iminente”, afirma o empresário. A prefeitura tenta reverter o problema e pretende tornar mais efetiva a fiscalização até o final deste ano. O número de fiscais em Joinville deve crescer de oito para 30 ainda neste semestre, garantiu o secretário municipal da Fazenda, Roberto Busch. Ainda é pouco. Pelos cálculos de Luiz Henrique Lima, da Divisão de Tributação da Secretaria da Fa- zenda. Três microindústrias já operam na informalidade em Joinville. Boa parte dos informais são ex-funcionários da indústria que foram demitidos. “Preferem montar o próprio negócio, mes- mo que seja informal, a recorrer a empregos no comércio”, com- pleta. A alta tributação é uma das causas de o pequeno empreen- dedor optar pela não regulamen- tação de sua empresa. Uma das alternativas da Ajorpeme para combater a informalidade na microempresa é a adesão da Prefeitura ao Sim- ples, o imposto com tarifa única para os pequenos empreende- dores. Na análise do presidente da entidade, haveria diminuição dos encargos e incentivaria os informais a regulamentarem o negócio. O reflexo seria o au- mento da base da arrecadação municipal. O projeto tramita na Câmara de Vereadores. Informalidade reduz arrecadação Pesquisa da Fundamas revela que milhares de joinvilenses vivem do emprego informal Peterson Izidoro Profissão ambulante: novos postos são inferiores ao crescimento da população ativa Foto:KennedyNunes O emprego sem carteira as- sinada funcionou como amorte- cedor para suprir, nos doze me- ses encerrados em abril, a neces- sidade de trabalho de pelo me- nos 20 mil catarinenses que en- traram no mercado e não tive- ram suporte na economia tradi- cional, conforme dados do Ca- dastro Geral de Emprego e De- semprego (Caged), do Ministé- rio do Trabalho. Um cenário oti- mista para 2002 garante a aber- tura de 30 mil novos postos de trabalho no Estado, o mesmo número dos últimos dois anos. O problema é que o cresci- mento da população economi- camente ativa em Santa Catarina é de 2% ao ano (contra 1,6% de toda a população). Isso represen- ta a entrada de 50 mil pessoas ao ano no mercado de trabalho, mas como o setor formal da economia só emprega mais 30 mil, os outros 20 mil são obri- gados a optar pela informalidade Trabalho informal amortece a ausência de novas vagas na economia tradicional para sobreviver. O comércio, responsável por 9,9% dos traba- lhadores com carteira assinada (equivalente a 259.388 trabalha- dores), é um dos setores que não espera crescimento significativo do volume de empregos for- mais neste semestre. Os números do Departa- mento Intersindical de Estatísti- ca e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), referentes aos primei- ros cinco meses do ano, indicam que o emprego com carteira as- sinada continuou aumentando nas regiões industriais do estado - Joinville e Blumenau - com 6,74% e 5,83% de elevação, res- pectivamente. Em Florianópolis, onde pre- domina o setor terciário, o cres- cimento foi bem menor: 2,63%. A indústria da transformação no Estado, por exemplo, criou cin- co mil empregos, sendo que 2,4 mil, quase a metade, em apenas dois segmentos: alimentação e têxtil. [PI] Crescimento da população economicamente ativa em 2002 (média de 2% ao ano) Abertura de novos postos de trabalho no Estado Número de novos trabalhadores sem emprego 50 mil trabalhadores 30 mil vagas 20 mil desempregados Saldo negativo
  • 4. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 4 Políticas públicas Dos trabalhadores informais encontrados nas ruas de Joinville vendendoalimentos,apenas30são cadastradosjuntoàVigilânciaSani- tária e cumprem com a legislação fiscal, trabalhista e previdenciária. Nemosconsumidoresandamaten- tos ao alvará de regulamentação. Eles afirmam não observar esta questão, mas consideram a higiene dolocalimportante. Márcia Santana de Paula faz parte do grupo de trabalhadores informais. Ela trabalha há vários anos na rua. Começou como guardadora de veículos, agora ven- de churros em frente ao shopping e está regulamentada. Trabalha de segunda à sexta das 10h30 às 20h. Quandochovemuitonãocostuma ir, pois o abrigo do carrinho é pe- InformalidadenãoéfiscalizadaemJoinville Falta de fiscalização faz com que a irregularidade aumente e que número de ambulantes cresça Ana Paula Bueno quenoeomovimentoémenor. Os churros custam um real e as ven- das costumam ser de mais de trinta churros ao dia. Valmor Manoel Valentina tam- bém é trabalhador informal. Ao contrário de Márcia ele não tem alvarásanitárioedelocalização.Seu ramo é a venda de cachorro-quen- te em um estacionamento de uma ótica, no centro. Valmor paga ape- nas o que consome de luz no local. Paraequilibraroorçamento,suaes- posa faz marmitas durante o almo- ço e ele sai para entregá-las. Nas noites de sábado a quinta-feira, tra- balha com a venda de cachorro- quente. Só não comparece se tiver algum evento em Araquari, local que reside. O ambulante vende em médiacinqüentacachorros-quentes por noite e seu lucro é de 43 a 45% do valor do alimento, que varia de R$ 1,50 a R$ 2,30. A venda de churros complementa a renda na família Santana de Paula Vendedores zelam pela higiene GiseleCristiane Moser nuncapa- rou para observar a questão do alvará sanitário em nenhum dos lugares em quejácomeu,porémobservaahigiene do local. Tanto Márcia, que vende churros, quanto Valmor que vende ca- chorro-quente,garantemcuidardoma- nuseiodosalimentos.Usamsemprelu- vas,chapéus,jaleco,alémdeestaremsem- prelimpandoocarrinho. O argumento dos ambulantes não convence muito Paulo Roberto Halssemann:“Nãogostodecomernarua, jácomi,masprefirocomeremcasa”.Paulo se contradiz ao lembrar que não resiste à maçã-do-amor,alimentomuitoencontra- donomercadoinformaleaocomentarque oatodecomernaruaécultural:“Aspessoas interagemumascomasoutras”. Quanto ao alvará de licença, Paulo também nunca observou, mas já tinha uma opinião formada sobre o assunto: “Não é justo uns pagarem impostos e outrosnão,masémelhorquefiquetudo desregulamentado do que gente por aí desempregada ou roubando”. CarlosEduardoBiervendiasorve- tenarua. Hoje, alémdesorvete,vende cachorro-quenteecaldo-de-cana.Com algumas economias, ele conseguiu alu- garumterreno,construiuumacozinha ecolocoumesasecadeirasparamelhor servir seus clientes. Trabalhando neste localháseismeses,Carlosjáganhapara pagar as contas, que somam mil e tre- zentos reais por mês. Tem um funcio- nário e trabalha das 17h30 às 23h, de segunda a segunda. A Vigilância já esteve no local, e Carlosprecisoufazeralgunsreparospara continuartrabalhando.Omicro-empre- sário terá algumas taxas fixas a serem pagas mensalmente além do imposto de3%dovalordecadaalimento. Mes- mo tendo seu negócio regulamentado, suaopiniãonãomudouemrelaçãoaos trabalhadoresinformais:“Asdificulda- des para aqueles que trabalham na rua sãograndes,euseicomoé,nãoconde- no quem não paga impostos”. Vigilância Sanitária Em Joinville não existe um órgão que fiscalize o trabalho informal. Se o vendedordecachorro-quentenãotem alvarásanitário, aresponsabilidadenão é só dele. Segundo o fiscal sanitarista, LucianoJosédeFariasJunior,essade- veriaseraobrigaçãodaCompanhiade Desenvolvimento e Urbanização (Conurb) que concede o alvará de lo- calizaçãoaostrabalhadores. LucianodizqueopapeldaVigilân- cianestaquestãodainformalidadeévis- toriarosambulantesqueestãocadastra- dos junto à prefeitura e a Conurb. Na cidade há 30 ambulantes regulamenta- dos e todos trabalham no centro. Ostrabalhadoresmuitasvezesnão procuramalegalizaçãoporacharqueseu trabalhovaiserinterrompidoouqueas taxas são altas demais para o seu rendi- mento.Outrofatorcontribuinteparaa nãoregulamentaçãoéabaixaescolarida- de: muitos têm medo de serem logra- dos ou não entenderem o processo. Luciano explica que a regulamentação nãoétãocomplicada.Oprimeiropasso éprocuraraConurb,comosdocumen- tos básicos: identidade, CPF, compro- vantederesidênciaepagarumataxade 0,2 UPMs que custa próximo de R$ 19,00. Depois o trabalhador será enca- minhadoparaprefeituraeparaavigilân- cia,quefarãoadevidainspeção. Oalvaráconcedeaoinformalodi- reito de trabalhar de modo legal como prevêalei,alémdeoferecerconfiançapara o consumidor. Gisele Cristiane Moser trabalha no centro de Joinville. Próximo ao seu local de trabalho tem um carrinho de lanche. “Quando a fome bate, comer na rua é muito bom”, diz. Regulamentação da atividade trouxe benefícios para os negócios de Carlos FotosKennedyNunes
  • 5. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 5 Shirlei Paterno Políticas públicas Pequenos negócios ajudam renda familiar As pessoas procuram alternativas para ficar mais tempo em casa e obter ganho extra Ter um negócio próprio em casa, aumentar a renda familiar e ainda educar os filhos vêm se tornando comum a cada dia. Empresas familiares como telemensagens, docerias entre outros, ocupam cada vez mais o ramo de industrias informais. Alguns desses estabelecimentos não são legalizados por opção. Os proprietários asseguram que os lucros não seriam suficientes para pagar os impostos. Para que se possa fabricar e comercializar produtos é pre- ciso legalizar o pequeno negó- cio e obter licença de alguns ór- gãos como Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, Fatma ou Ibama. Caso a legalização não ocorra, a empresa é consi- derada informal. A legislação considera informal “a pessoa que exerce alguma atividade produtiva não registrada nos órgãos competentes e que não cumpre a legislação fiscal, tra- balhista e previdenciária”. Além de pequenas empre- sas informais, o que se pode observar são os profissionais autônomos, especialmente, os de profissões não regulamen- tadas, ou seja, doceiras, vende- dores de cachorro-quente, am- bulantes. Essas pessoas não pre- cisam trabalhar informalmen- te, pois para que sejam regula- rizadas, elas precisam do cadas- tro como profissional autônomo. A burocracia e o custo le- varam Mauro Roberto Segundo o site especializado www.geranegocio.com.br, criado para orientar quem deseja abrir uma pequena empresa, para que Mauro possa legalizar a pequena empresa, há algumas etapas prin- cipais que deveria cumprir. De- pois de esclarecido o fato de não se tratar de um profissional au- tônomo e sim de um pequeno negócio, é preciso definir de que natureza é a empresa. Ela pode ser: de sociedade anônima, de sociedade por quota de respon- sabilidade limitada, individual ou de sociedade civil. No caso de Mauro, a empre- sa seria de sociedade individual, ou seja, ela é individual porque existe apenas um dono. Nesse caso, o proprietário é responsá- vel por todos os atos e compro- missos praticados na empresa. Para esse tipo de empresa é pre- ciso procurar a Junta Comercial Kricheldorf, 48 anos, a não re- gulamentar seu negócio. Apo- sentado como mecânico há cerca de 10 anos, Mauro ven- de leite. Todo o processo é in- dustrial, o leite é retirado atra- vés de ordenha mecânica, pas- teurizado e empacotado. O leite chega aos seus mais de oitenta clientes como se tivesse saído de uma grande empresa, com uma diferença, a pequena em- presa é informal e o pacote do leite não exibe nenhuma mar- ca. Mauro afirma que decidiu trabalhar por conta própria para aumentar a renda famili- ar. Ele não fez a legalização e justifica: “Se o negócio for le- galizado, a lei toma conta e o proprietário não ganha nem pra pagar os impostos”. e verificar se não há nenhuma empresa com o mesmo nome. Feita a verificação, entra-se com o pedido de liberação e aprovação do local do funcio- namento da empresa, na Prefei- tura. A resposta leva de dois a três dias. Depois de aprovado o local, deve-se dar entrada no Alvará de funcionamento, que depende da licença de vários outro órgãos. (Veja endereços no quadro ao lado) Com a aprovação do local, a empresa deve ter registrada a fir- ma na Junta Comercial. Para isso, é preciso além de diversos do- cumentos pessoais, declarações como o DARF e o DNCR, que são adquiridos em qualquer pa- pelaria e pagas em qualquer agên- cia bancária. A seguir registra-se a empresa na Receita Federal e INSS. Além de precisar de licen- ça, que pode ser ambiental, sani- tária ou do Corpo de Bombei- ros. Depois de obter a licença e o Alvará de localização é necessá- rio se inscrever na Secretaria da Fazenda Estadual, para que se faça a contribuição do ICMS. Fei- to isso, a empresa pode dar en- trada ao processo de emissão de nota fiscal da Fazenda Estadual e na Inscrição Municipal, que dará direito a emissão de nota fiscal Municipal (ISS). Legalizado tudo, obrigatori- amente, a empresa precisa ser inscrita no sindicato patronal da categoria. Dependendo do pro- duto que será fabricado é preci- so o certificado do Inmetro, além do registro de marca no Institu- to Nacional de Propriedade In- dustrial (INPI). Vale salientar que essas são apenas as principais eta- pas de todo processo, entre cada etapa dessa existem outras. [SP] Rachel Phais, 42 anos, é um exemplo de profissional autônoma.Balconista hásete anos resolveu trabalhar por conta própria. Ela faz e ven- de salgadinhos, bolos e do- ces para padarias. Rachel de- cidiu trabalhar de forma au- tônoma para poder cuidar dos filhos, educar e dar mais atenção às crianças. Ela está regulamentada como profis- sional autônoma, mas traba- lhoudemaneirainformaldu- rante dois anos e meio. A re- gularização ocorreu porque, segundoRachel,existe“mui- to dedo duro”. E acrescenta: “Não achei a regularização burocrática, mas para o ‘bol- so’ o processo não vale a pena”. O profissional autô- nomo precisa todo ano efe- tuar o pagamento do Impos- to Sobre Serviços de Qual- quer Natureza (ISSQN) e a Taxa de Licença para Locali- zação e Permanência (TLL). INSS - Instituto de Seguridade Social Rua: 9 de março 241 – Centro Fone: (47) 433-1912 / 451-1500 Delegacia Receita Federal Joinville Rua: Mário Lobo 180 – Centro Fone: (47) 431-6300 Inmetro – Instituto Nacional de Metrologia Normalização e Qualidade Rua: Abdon Batista 189 – Centro Fone: (47) 422-6269 Junta Comercial – Jucesc Rua do Príncipe 330, sala 103 – centro Fone: (47) 433-5599 Sociedade Corpo de Bombeiros Rua: Jaguaruna 13 – Centro Fone: (47) 431-1112 Secretaria Fazenda Rua: Dona Francisca 364 – Centro Fone: 433-4200 Vigilância Sanitária Rua: Itajaí 50 – Centro Fone: 431-4551 Profissional autônomo prioriza educação dos filhos Dicas para criar ou regularizar empresa Onde encontrar:
  • 6. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 6 Políticas públicas A situação dos trabalha- dores informais em Joinvi- lle é debatida mais uma vez em época de eleições. Se- gundo discussões na Câma- ra de Vereadores da cida- de, as possibilidades seriam as de regulamentar a profis- são do trabalhador informal ou reintegrá-lo ao mercado formal. Nenhum dos pro- jetos saiu do papel ainda no legislativo municipal. Trabalho informal demanda atenção política Vereadores de Joinville e trabalhadores informais aguardam iniciativa do Legislativo federal Juliana Bertolini Dentinho critica os ór- gãos responsáveis pela fis- calização do trabalho in- formal na cidade. “Seus fiscais são autoritários e anti-sociais”, comenta. O ex-vereador Getúlio Ferreira considera que o objetivo desses órgãos é acabar com o trabalho in- formal em Joinville. A fiscalização do traba- lho informal é feita pela Conurb (Companhia de Desenvolvimento e Urba- nização de Joinville). Se- gundo o fiscal Rogério Crespim, o comércio am- bulante não é licenciado atualmente. “O Estado concedeu essa licença aos ambulantes por dois anos, mas hoje já venceu”, expli- ca. O fiscal diz que quan- do o trabalhador informal é flagrado pela fiscalização, ele é notificado para dei- xar o local em 24 horas. Se após o prazo de um dia o ambulante continuar no local, terá, então, sua mer- cadoria apreendida pelos fiscais da Conurb. A mer- cadoria é mantida no pró- prio órgão público. O tra- balhador pode reaver seus produtos através do paga- mento de uma multa. “Às vezes a multa é maior que o valor dos artigos e o am- bulante prefere abandoná- los”, explica. Se a merca- doria é perecível e não é recuperada dentro de 48 horas, será doada. Rogério Crespim lem- bra que não há projetos po- líticos na área do mercado informal no momento, mas enfatiza que se a situação do trabalhador informal de Joinville for legalizada de alguma forma, a Conurb certamente respeitará a lei. A Conurb fiscaliza todos os tipos de comércio ambu- lante na cidade. A fiscaliza- ção pode ser feita pela Seinfra (Secretaria de Infraestrutura), mas atual- mente sua divisão de fisca- lização verifica somente se os estabelecimentos possu- em alvará. [JB] Getúlio Ferreira atribui a competência sobre o tema aos deputados federais. Ele diz não haver um projeto de lei federal em relação ao trabalhador in- formal atualmente. Ferreira de- fende a regulamentação do tra- balho informal como uma pro- fissão. “É necessário regula- mentar a profissão do traba- lhador informal com urgência e, para isso, é preciso buscar parcerias com deputados fede- rais com idéias semelhantes”, conclui. Wilson Vieira, vereador do PT, também diz que os ve- readores não podem fazer muito pelo trabalho informal. Segundo o vereador Mar- cos Aurélio Fernandes, do PartidodosTrabalhadores (PT), no momento não há ne- nhum projeto ou mobiliza- ção no legislativo em relação aos trabalhadores informais da cidade. “Isto é devido à legislação, que depende mais do âmbito federal do que municipal”, completa Marquinhos, como é conhe- cido popularmente. Getúlio Ferreira, ex-vere- ador do Partido da Frente Li- beral (PFL), enfatiza que sim- plesmente não há interesse da maioria dos vereadores pelo assunto. “Não há ajuda pública da Prefeitura ou de outro órgão, não há investi- mento algum na situação dos trabalhadores informais, pois a questão não gera vo- tos”, diz ele. Falta uma po- lítica pública para lidar com a situação, o que, segundo Ferreira, seria fundamental para regularizar quem está na informalidade. Enquanto não surgem propostas efetivas, o nú- mero de informais aumenta. Ele considera que a iniciativa teria de partir do poder exe- cutivo. O vereador conta que já houve mobilização de alguns vereadores sobre a questão, mas os projetos surgidos não foram aprovados pela Câma- ra dos Vereadores ou foram vetados pela prefeitura. De acordo com Vieira, eleito depu- tado estadual no último dia 3, o PT tem projetos para o traba- lhador informal, mas encontra dificuldades para colocá-los em prática. “O objetivo do partido é tirar o trabalhador das ruas e ajudá-lo a conseguir um emprego formal, reinte- grando-o ao mercado”, diz o vereador, também conhecido como Dentinho. Para ele, o principal obstáculo seria con- seguir apoio da Prefeitura. Se- gundo o vereador, o PT tenta colocar em prática o projeto “Simples Municipal” com o objetivo de extinguir o traba- lho informal, garantindo um emprego no setor formal para todas as pessoas. ParaDentinho, seria possível parcelar as dívi- das e multas dos trabalhadores informais e regularizar sua si- tuação. A bancada do PT dis- cute o projeto comcontabilistas ecomerciantesdeJoinville.[JB] Ex-vereador defende busca de parcerias federais para efetivar regulamentação Fiscalização é criticada por setores do Legislativo Dia 18 de outubro 14 às 22 horas Bom Jesus/Ielusc PARTICIPE!
  • 7. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 7 Políticas públicas Organizar a informalidade, apesar da aparente contradição, é possível. Em Joinville três exemplos provam isto: a Asso- ciação dos Camelôs de Joinville, a Associação dos Artesãos de Joinville e a Recicla Cooperativa de Reciclagem, formada pelos catadores de papelão e papel. A Associação dos Camelôs de Joinville foi criada em 1983, de- pois que a prefeitura fez o atual terminal de ônibus. No local, os camelôs se concentravam ante- riormente. Como a fiscalização da prefeitura passou a dificultar a atuação nas calçadas, 58 came- lôs associaram-se e, com o apoio de um advogado, conseguiram regulamentar a atividade no cen- tro da cidade. Os pontos permitidos na pra- ça foram sorteados, ainda com o tradicional esquema das barraquinhas. Posteriormente a prefeitura fez um local especifi- co: o camelódromo. Antes o es- paço era localizado no inicio da rua XV de novembro, hoje está na praça Castelo Branco. Os 33 boxes do local tornaram-se pro- priedade familiar, a documen- Organizar a informalidade é possível Associações de trabalhadores informais em Joinville dão maior segurança aos participantes Sergio Leal Nunes tação passa de pai para filho. O presidente da Associação dos Camelôs de Joinville, Rui Santos, afirma que trabalhar nas ruas seria melhor para as vendas, mas considera que o local tem suas vantagens como a relativa segurança e o abrigo das varia- ções climáticas. O conforto tem seu preço. No Camelódromo, cada associado paga um alvará de licença para a prefeitura e faz uma contribuição mensal para a associação. Todas as despesas de manutenção das instalações são bancadas pelos camelôs e o que sobra das contribuições fica no caixa da associação que funcio- na em uma sala no local. Garantia de loja Na organização dos camelôs há uma aproximação com a maneira de agir dos comercian- tes formais.“O camelô quer se aperfeiçoar mais”, comenta Rui Santos. No camelódromo já existem boxes que adotam pro- cedimentos comuns às lojas como garantia dos produtos, vendas parceladas e consultas de cheques. “Os camelôs até aceita- riam pagar impostos como um lojista normal em troca de me- lhores condições de trabalho e de um espaço mais estruturado, o atual sequer tem uma porta”, desabafa o presidente da associ- ação. A Recicla Cooperativa de Reciclagem foi fundada pelo seu atual presidente, Marcos Demarchi, há cerca de dois anos. Cristiane, sua esposa e também cooperada, lembra que Marcos diariamente levava os filhos para a escola e notou que no trajeto, durante vários dias, uma garrafa ficou jogada no chão sem que ninguém a recolhesse. “Marcos sentiu a necessidade de fazer algo para resolver o problema, fun- dou uma cooperativa”, conta Cristiane, que também ajuda na administração. Os vinte cooperados iniciais passaram a trabalhar juntos na coleta de papel, isopor, plásticos e, agora, até pneus. Os “carrinheiros” - catadores asso- ciados - entregam o que coletam para a cooperativa que negocia diretamente com as empresas recicladoras, aumentando assim a renda dos cooperados. A mai- or parte dos cooperados são desempregados.“Antigos coope- rados hoje voltaram a trabalhar formalmente, mas ainda conti- nuam contribuindo com a Recicla de alguma maneira”, afir- ma Cristiane. A prefeitura ajuda a cooperativa cedendo gratuita- mente o local que serve de de- pósito para o material coletado, mas todas as despesas de manu- tenção do depósito são de res- ponsabilidade da Recicla. O galpão está localizado na rua Aubé,850, onde funcionava uma antiga fabrica de motores marí- timos. O local poderia até servir de abrigo para os catadores que moram na rua.“Devido ao risco de incêndio ser muito grande, em razão dos materiais guarda- dos, foi feito um acordo entre os cooperados em que não é permitido passar a noite na Recicla”, justifica Cristiane. Caminho sem volta A economia informal - que gera renda mas não paga impos- tos nem seguridade social - não é irrisória em suas estatísticas e quem nela ingressa nem sempre faz o caminho de volta. Recente levantamento feito pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra muitos brasileiros satisfeitos em trabalhar sem patrão e sem car- teira assinada. Já são 38,6% dos trabalhadores. Entre os pesquisados, 85% dos que dei- xaram o trabalho assalariado e passaram a ter seu próprio ne- gócio informal não querem mu- dar de ramo ou buscar o reemprego no mercado formal. São as pessoas que foram de- mitidas das indústrias por serem trabalhadores menos qualifica- dos. Ao ingressarem na econo- mia informal de serviços ou produtos, constatam que sua renda aumenta em relação à si- tuação anterior. Em Joinville, segundo a coordenadora do projeto Integrar, Viviane Schumacher Bail, desenvolvido pela CUT (Central Única dos Trabalhadores), 30% da popu- lação está na informalidade ou desempregado. Os carrinheiros conseguem vender o material coletado por melhores preços na Recicla Catadores entregam o que coletam para a cooperativa Fotos:KennedyNunes
  • 8. 8 Primeira Geral A pesca considerada amadora no Balneário Barra do Sul, a 40 km de Joinville, é o principal motivador do trabalho informal local. Por não existir legalmente registro profissional e demais di- reitos para os pescadores do mu- nicípio, a tarefa de descascar e lim- par peixes e camarões se tornou fonte de renda para as mulheres. Diariamente elas estão nas bancas de pesca. Maria Aparecida Cândido Sil- va, de 37 anos, é um exemplo da luta pelo sustento da família. Casa- da com o pescador José Silva, de 40 anos, e mãe de cinco filhos, ela assume as responsabilidades da casa no período em que o marido está no mar. Filha de pescadores, Maria Aparecida divide seu tempo com serviços de sua casa, a banca de peixes e, às vezes, o trabalho de diarista. Ela gosta do trabalho, mas reclama das condições em que o executa, e sente que não tem pers- pectiva de melhorar sua vida. “Já estou velha para conseguir um tra- balho melhor, eu não sei fazer ou- tra coisa”, ressalta. No mesmo caminho de Maria está a filha Fabiana Silva, de 20 anos, que trabalha nas bancas des- de criança. Casada desde os 15 anos e mãe do garoto Lucas Almeida, de 3 anos, ela também é responsável pelas despesas da casa no período em que o marido sai com o barco. Na última viagem a trabalho, ele permaneceu por 45 dias no litoral paulista. Com as mãos manchadas e machucadas pelo serviço diário, Fabiana sente por não ter dado continuidadeaosestudos.“Eusem- pre pensei que não precisava estu- dar, que trabalharia como minha mãe, mas hoje eu sei como estava errada”, desabafa. O trabalho nas bancas não é Pesca é fonte de renda para mulheres de ba Falta de regulamentação é um dos motivos para a procura do trabalho informal em Barra do Sul, n Gabriela Nicolau nada fácil. Assim que os primeiros barcos chegam com o camarão e o peixe, tudo é dividido entre as mulheres para começarem a lim- peza. Após o dia de trabalho, elas recebem R$ 0,80 por quilo de ca- marão limpo e R$ 2,50 para cada caixa com 20 kg de peixe limpo. Porém, no momento de rece- ber pelo serviço, elas enfrentam um grave problema. Se trabalham para donos de barcos o pagamen- to é imediato. Se o trabalho for para peixarias, principalmente as de Joinville, elas recebem pouco, com atraso e lhes são oferecidas cestas básicas como forma de pagamen- to. Em relação à regulamentação o presidente da Colônia de Pesca Z-3, Esmael Cabral, de 45 anos, explica que apenas treze das mu- lheres possuem carteira de pesca- dor. A maior dificuldade é durante o período de “defeso” do cama- rão, quando é proibida a pesca. Anualmente, entre os dias 25 de fevereiro a 28 de junho, nenhum pescador deve montar redes ou sair para o mar. Neste período, as mu- lheres trabalham como diaristas, roçam quintais, entre outras ativi- dades. Salário defeso Cabral explica que, nesta épo- ca, o associado da colônia recebe a quantia de R$ 200,00, e se o pes- cador tiver filhos com menos de 5 anos de idade, ele recebe R$ 15,00 por mês. Para ter direito ao “salá- rio defeso”, Cabral ressalta que o pescador deve estar com a anuida- de de R$ 45,00 pagos à colônia em dia, deve possuir carteira de pes- cador há pelo menos três anos e mais dois anos como agricultor. O presidente da Colônia de Pesca Z-3 afirma que as mulheres que trabalham para seus maridos não são contratadas por peixarias. Fato negado por Cecília Rocha, de 32 anos, que trabalha para uma das peixarias existentes no município. Cecília tem três filhos, e seu mari- do, o pescador Carlos Rocha, de 39 anos, trabalha para um dono de barco. Com a ajuda de seu filho Eduar- do Rocha, de 18 anos, ele fica em média vinte a trinta dias longe de casa e, quando retorna, tudo que pescou é vendido. Uma parte da venda vai para o dono do barco e, a outra, para os pescadores dividi- rem entre eles. No caso de Rocha, a divisão é entre ele e o filho. Apesar do trabalho não propor- cionar conforto para a família, Cecília prefere trabalhar nas ban- cas a ser diarista. Para ela, um dia de trabalho pode lhe render até R$ 30,00, mesmo no inverno. “Se eu estivesse trabalhando como empre- gada doméstica não ganharia mais que R$ 15,00, e ainda correria o risco de não receber”, justifica. Cecília está cadastrada na co- lônia, juntamente com seu marido e filho. Quanto aos estudos, ela la- menta não ter concluído o primei- ro grau. O mesmo acontece com seu filho Eduardo, que interrom- peu os estudos ainda na 5ª série, para trabalhar na pesca. “Meus outros filhos mais novos estão es- tudando, mas o Duda não quer. Ele diz que não precisa. Eu temo por seu futuro,que passe necessidades”. As mãos sujas e marcadas pelo trabalho diário são resultado da prática e rapidez com que são des- cascados até 20 kg de camarão em apenas meio dia de trabalho. Fato comprovado por Joana Lima Cas- tro, de 57 anos, e viúva há oito.Ela reclama do que recebe por seu tra- balho. Após limpar doze caixas de peixe com 20 kg cada, em oito de horas de trabalho, recebeu R$ 17,50. “É muito pouco, mas não posso parar de trabalhar, não sou aposentada. Eu morreria de fome”. Além do trabalho nas bancas, existe uma outra opção para com- pletar o orçamento familiar. Du- rante a noite, algumas mulheres com a ajuda dos filhos, e até mes- mo do marido, colocam o “puçar”, uma armadilha para pegar siri e retiram pela manhã. O siri é cozi- do, sua casquinha é retirada e ven- dida a R$ 1,00 a dúzia. A carne, apreciada por donos de restauran- tes da região, custa em média R$ 8,00 a R$ 10,00 o quilo. Seopescadorpossuirbarco,além do peixe vendido para as peixarias, sua esposa vende as sobras nas ban- cas ou até mesmo em casa. O mes- mo acontece com o camarão. “Des- taformanãoprecisodividircomou- tros pescadores e consigo ter lucro. Se eu vendo o quilo do camarão sujo por R$ 4,50, limpo ele irá custar R$ 8,00”, destaca o pescador Marcos Souza, de 31 anos. Marcos trabalhou vários anos comoempregado,econseguiucom- prar um pequeno barco há quase três anos. Sua esposa Carmem Sou- za, de 28 anos, afirma que somente com a compra do barco eles passa- ram a ter melhores condições finan- ceiras. “Antes éramos explorados, tudo que meu marido pescava era dividido,nãodavaparapagarasdes- pesas”, comenta. Ao final de cada dia de trabalho as mulheres recebem R$ 2,50 por 20Kg de peixe limpo Gabriela Nicolau Joinville/SC, 15 de
  • 9. 9ra Pauta Geral alneário no norte do Estado Para divulgar a qualida- de dos pescados no muni- cípio, assim como intensi- ficar o fluxo de turistas durante o inverno, a Colô- nia de Pesca Z-3 com o patrocínio do comércio lo- cal criou, em 1998, a FESCAM, a Festa do Ca- marão. A festa está em sua quinta edição e será reali- zada no salão da Igreja Nossa Senhora dos Navegantes, ao contrário dos anos anteriores em que ocorria no Ginásio de Es- porte, na Boca da Barra. A 5° FESCAM acontece no mês de setembro, com quatro dias de duração, onde o morador e o turis- ta do balneário podem par- ticipar de shows musicais, bailes e ter acesso à pra- ça de alimentação. Tam- bém há parque de diver- sões, pratos típicos e, no domingo de encerramento, tem o concurso “A melhor descascadeira de cama- rão”. Durante a festa do ca- marão, ocorre a feira de ar- tesanatos feitos pelas mu- lheres dos pescadores. O visitante encontra na fes- ta peças decorativas cons- truídas com conchas, es- trelas do mar, siris, cama- rões, entre outros. Festa do Camarão atrai turistas na baixa temporada Juntas, mãe, filha e neta trabalham para ajudar no orçamento familiar. Elza Severino Lopes, 44 anos, desde os 15 confecciona em- balagens para presentes e chi- nelos de crochês. A filha Fabiana, 22 anos, usa a criatividade para riscar mol- des para bordado. Ponto a ponto, os desenhos vão to- mando formas e cores que encantam o comprador. Beatriz, a netinha de apenas 3 anos e meio, percebe cada movimento e tenta repeti-los com toda ingenuidade de uma criança. A família que mora na rua Afonso Moreira, no Conjun- to Habitacional Ademar Garcia, em Joinville, passa por dificuldades financeiras, mas acredita que, além de ajudar no orçamento famili- ar, o trabalho que as mulhe- res realizam em casa faz par- te de uma cultura artística passada de geração para ge- ração. “São quatro gerações apaixonadas por trabalhos artesanais. Minha mãe ainda está viva e continua confec- cionando produtos para vender e ajudar a família”, comenta Elza. Apesar dos discursos freqüentes de que a mulher está conquistando espaço no mercado formal de trabalho, muitas mulheres como dona Elza, ainda fa- zem parte da fatia feminina mal-remunerada e de pouca ascensão social na economia. O Relatório do Desenvolvi- mento Humano das Nações Unidas, divulgado esse ano, confirma a degradação da situação das mulheres em ní- vel mundial. Elas represen- tam 70% do total do que vi- vem em situação de miséria absoluta. Para Elza, que garante um rendimento em torno de R$ 250,00 por mês com a venda de seus produtos, além de ser um trabalho informal e uma forma de ajudar no orçamento, é também uma diversão e um meio de es- quecer as dificuldades do dia-a-dia. Assim como ela, centenas de outras mulheres que acumulam as funções de mãe, esposa e dona de casa conseguem fazer parte de um mercado de trabalho que se constrói às margens da formalidade. Há poucas quadras da casa de Elza, é possível encontrar uma gran- de quantidade de produtos feitos com qualidade, criatividade, bom gosto e com um preço acessível. Fabiana é a única, entre os três filhos, que tem um con- tato permanente com os pais. Ela e o marido atual- mente estão desempregados e conseguem manter os gas- tos com a pequena Beatriz e a manutenção da casa, construída nos fundos do terreno de dona Elza, ape- nas com a venda de artesa- nato. O marido de Elza tra- balha com uma máquina de descascar camarão. Juntando o ganho no fim do mês, Elza e seu marido, pagam as contas de água, luz, IPTU e alimentação. “Em datas es- peciais, como Dia das Mães, as vendas aumentam. Um chinelo custa R$ 5,00 e en- tre as embalagens a maior custa R$ 1,20 e a menor R$1,00”, comenta. Elza enfatiza a importân- cia do trabalho na vida de uma mulher. “A gente se sen- te valorizada”. Apesar de todas as dificuldades finan- ceiras, há vários anos a Fa- mília Lopes demonstra so- lidariedade em datas festi- vas como a Páscoa, por exemplo. Este ano eles se- pararam R$ 100,00 do or- çamento familiar para mon- tar cestas que foram distri- A força feminina no mercado informal Elas acumulam a função de mãe, dona-de-casa, sustentam o lar e ajudam outras pessoas buídas para crianças no Morro do Amaral, umas das comunidades mais carentes de Joinville. “Não gostamos de fazer propaganda disso. A gente confecciona os pro- dutos com muito amor, e é preciso compartilhar este sentimento. Quando não podemos vender, doamos”, salienta. KeltrynWendland Além do emprego formal, mulheres acumulam tarefas do lar Sara Fernanda Coelho e Outubro de 2002
  • 10. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 10 Geral Condições de trabalho às vezes precárias, insegurança de um emprego sem carteira assi- nada ou sem seguro saúde são preocupações dos que estão no mercado de trabalho informal. Mas é possível permanecer nes- se segmento e tirar o melhor proveito dessa escolha? Traba- lhar informalmente pode ter al- gumas vantagens. É preciso va- lorizar essa escolha, planejar a vida a partir desta nova opção. Carlos Roberto Muller, de 47 anos, faz oito viagens por dia, na sua bicicleta, do Jardim Paraíso ao Bom Retiro e cen- tro da cidade. Ele é um dos muitos catadores de papel de Joinville. O peso que ele carre- ga varia de 35 até 80 quilos, de cada vez. E o rendimento va- ria de R$ 50,00 a R$ 60,00 re- ais por semana. Na informalidade traba- lha-se muitas horas. Carlos co- Informalidade pede criatividade Estar no mercado informal requer um replanejamento do cotidiano Giovana H. Pereira meça seu dia às 6h30 e só ter- mina às 20h30, dependendo das condições climáticas. “Quando chove complica tudo. Não dá para sair. O pa- pelão molha, fica pesado na bicicleta. E não tenho lugar para esperar ele secar”, explica. A alternativa que o catador A bicicleta facilita a rotina de Carlos na coleta de papelão KennedyNunes É possível ter vantagens no trabalho informal. “Pode-se ter autonomia para escolher o que se vai fazer e como e quando trabalhar” observa a psicólo- ga Daisy Gassenferth. A esco- lha do local e da atividade per- mitem conciliar outros com- promissos e responsabilidades. O ganho financeiro, às vezes, também compensa. “Sempre valorize sua escolha, seja o lo- cal de trabalho ou a ativida- de”, orienta a psicóloga a Trabalho informal oferece vantagens Autonomia para escolher o que se vai fazer, como e quando trabalhar são vantagens da formalidade quem trabalha informalmente. Mas nem sempre a opção pelo trabalho informal é espon- tânea, às vezes acontece por ne- cessidade de sobrevivência. “In- dependentemente das causas que levem alguém a trabalhar na informalidade, esta pessoa deve- rá estar atenta para pontuar seus aspectos positivos”, ressalta Daisy. No vínculo empregatício há benefícios que os informais ge- ralmente não têm. Para se conviver sem estes benefícios é preciso aprender a lidar e a resgatar estas ausências. A psi- cóloga sugere ao indivíduo planejar e administrar seu ne- gócio, qualquer que seja. “Deve-se ficar atento para respeitar o limite de tem- po de trabalho e preservar o descanso. O desgaste pode le- var ao estresse e a situações negativas, tanto físicas como emocionais”, completa a psi- cóloga. (GHP] de papel encontrou para não voltar do centro à sua casa com quilos e quilos de papelão é deixá-los na casa dos sogros, no bairro Bom Retiro. É lá tam- bém que ele almoça algumas vezes. Carlos fala sobre as dificul- dades em trafegar com a bici- cleta carregada de papelão no meio do trânsito. “Arriscar a vida no meio dos carros todos os dias é um desafio. Os ôni- bus buzinam, passam raspan- do. Ninguém te respeita, nin- guém tem paciência”, desaba- fa o catador. O sonho de Carlos é traba- lhar numa empresa e não pre- cisar mais correr risco na rua, ter a garantia de um salário fixo e demais benefícios que sua fa- mília poderia usufruir, como seguro-saúde. Sobre isso, ele comenta: “Nem eu nem minha família temos qualquer garan- tia em caso de doença. Depen- demos do SUS e usamos o posto de saúde do bairro”. Restrições O último emprego de Carlos com carteira assinada foi na Embraco, onde trabalhou como operador de retífica. Sobre trabalhar no mercado formal de novo, ele comenta: “Está cada vez pior. Quando vou às agências de emprego, já de cara me informam que, pela idade, é difícil conseguir traba- lho”. Ele não vê uma solução a curto prazo para o seu caso. Carlos estudou até a sétima sé- rie do ensino fundamental. “Para continuar os estudos é preciso ter pique. E após um dia inteiro a pedalar e carregar peso, de onde tirar forças?”, questiona. A família de Carlos é com- posta de mulher e quatro filhos, com idade entre 12 e 22 anos. A filha mais velha, de 22 anos, está desempregada e ajuda a mãe nos afazeres domésticos. A segunda filha de Carlos, de 18 anos, tem necessidades es- peciais. Sua mulher não pode trabalhar, dedica-se à garota e a casa. Os dois filhos menores, de quinze e doze anos, estu- dam. A esperança do catador é dar condições para que seus fi- lhos tenham melhores chances. Marilete de Oliveira Fernandes tem 33 anos e tra- balha como mensalista de se- gunda à sexta-feira. E, aos sábados, como diarista em outra casa. Ela já trabalhou com car- teira assinada em uma ma- lharia, onde atuava como revisora e também no setor de embalagem. Seu último emprego foi recente e ficou nele por três meses. Marilete trabalhava em uma empresa de limpeza que presta servi- ços a terceiros. Foi dispensa- da por medidas econômicas. Atualmente a vida de Marilete se divide entre o seu trabalho e aos três filhos. Eles vivem do salário dela e da pensão alimentícia que rece- be do ex-marido. “Meu fi- lho mais velho, o Maurício, está trabalhando numa grá- fica e será registrado quan- do fizer 16 anos, em outu- bro. Ele trabalha durante o dia e estuda à noite”, conta. Já o filho do meio, Fernando, de 13 anos, é alu- no do Balé Bolshoi, em Jo- inville. Deixou a capoeira e se apaixonou pelo balé. Fez o teste, passou e sua rotina mudou completamente. “Ele estuda no período da manhã e, à tarde, vai ao Bolshoi, onde está no segun- do ano. Ele adora! A televi- são entrevistou-o este ano, no Festival de Dança”, orgu- lha-se ela. Marilete estudou até a oi- tava série do ensino funda- mental. “Eu estudei à noite, fiz o curso para adultos. Te- nho consciência de que, para mudar minha vida e é o que espero, preciso voltar aos es- tudos”. Ela ainda não sabe quando, e justifica: “O Juliano, de dois anos, ainda é muito pequeno, não tenho com quem deixá-lo. [GHP] Trabalhar para uma vida melhor
  • 11. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 11 Geral O Programa Integrar é uma alternativa para o trabalhador ou desempregado voltar ao mercado de trabalho. Implantado no muni- cípio em julho de 1998, o projeto investe na capacitação profissio- nal de pessoas com mais de 25 anos, desempregadas ou ameaçadas de perder o emprego por não possuírem o 1o grau com- pleto. “O programa é desenvolvi- do pela Confederação Nacional dos Metalúrgicos, filiada à CUT, e visa a formação educacional para o trabalho e a busca pela ci- dadania”, declara a coordenadora técnica do projeto em Joinville, Viviane Bail Schumacher. Viviane apresenta dados for- necidos pelo Integrar, que apon- tam que 30% dos trabalhadores Projetocapacita pessoas paraomercado SamaraA.Zucchetti Cursos gratuitos são alternativa conseguir novo emprego na cidade estão desempregados ou na informalidade. “O desempre- go não é um problema particular do cidadão e sim do sistema polí- tico vigente”, desabafa. A falta de perspectiva e a von- tade de arrumar outro emprego encaminharam Marina Borgmann da Rosa, 30 anos, até o progra- ma. Ela trabalhava como domés- tica e agora com os estudos em andamento pretende melhorar a renda familiar. “Estou com meu curso em andamento, mas ainda desempregada. Mesmo assim, acredito que sem as aulas do In- tegrar seria pior. Mais do que fa- zer contas, eu aprendo a praticar a minha cidadania”, diz Marina. As dificuldades para se man- ter no mercado de trabalho leva- ram a repositora de estoques, Ivanilde Alves de Mello, 38 anos, a procurar o projeto. “Ouvi falar do curso do Integrar na associa- ção de moradores do meu bairro. Me interessei, pois não conseguia acompanhar as aulas dadas no supletivo”, comenta. Ela está no módulo do Ensino Fundamental. Com a ajuda do curso, Ivanilde pretende terminar o 2o grau e es- tudar enfermagem. “Os professo- res do Integrar dão um grande incentivo, me sinto renovada des- de que comecei a fazer parte des- te programa”, diz. Hoje o programa está com as aulas interrompidas devido a de- mora do repasse das verbas. “A verba é distribuída pela Secretá- ria de Estado do Desenvolvimen- to Social e da Família, portanto essa distribuição não é tão imedi- ata, essa é a causa da interrupção das aulas. Devemos voltar aos tra- balhos agora no segundo semes- tre”, explica Viviane. TodososdiasIdalinaGomesPi- res, 11 anos, acordava cedo para tra- balhar com a mãe, Sarita Marcondes Gomes, 41 anos. Às sete horas já es- tavanasruasdeJoinville,catandopa- pelãoelatinhasdealumínio,antesque ocaminhãodelixopassasseelevasse tudo. Háumanoemeio, Idalinaestá noProgramadeErradicaçãodoTra- balho Infantil (Peti). O programa foi criado pelo Go- vernoFederalparapossibilitaroaces- so,apermanênciaeobomdesempe- nhodecriançaseadolescentesnaes- cola. O objetivo é eliminar todas as formasdemão-de-obraprecoce,con- formeacoordenadoradoprojetoem Joinville,Tereza Soares. ParaaeducadoraElizangelaValério, este projeto é uma iniciativa positiva, porém ainda não previne o trabalho infantil. “O número de crianças no programaéinsatisfatório,selevarem consideração que Joinville é a maior cidadedoestado,comcercadequinhen- tos mil habitantes”, afirma. OPetitem445criançasinscritas, com idade de 7 a 15 anos. Tiago Brisdo, 9 anos, morador do bairro Jardim Paraíso, também é uma des- tascrianças.Hojeeleparticipadeou- tra jornada dupla. De dia vai para a escola, Maria Berezoski, no Jardim Paraíso, e, à tarde, para o programa, noCentroEducacionalDomBosco. Há um ano e meio, Tiago trabalhava nas ruas com seu irmão vendendo picolé. Segundo ele, era para ajudar seuspaisenãoficarsozinhoemcasa. SuafamíliatrabalhanolixãodeJoin- ville,catandopapelãoparapoderso- breviver. Tiago falou que sua maior alegria é poder estar no programa, porqueagoraelepodeestudarecon- tinuar ajudando sua família com os R$40,00mensaisquerecebe. Conforme a educadora Elizangela,Tiagoéumasdascrianças que mudaram muito depois da en- trada no programa. De uma criança agressiva e solitária, para um garoto educadoeamigávelcomtodos.Seus PETI: uma saída para o trabalho infantil paissentemamesmareaçãoemcasa. Segundo sua mãe, Maria Elizete Brisdo, 41 anos, seu comportamen- to mudou bastante. “Ele está mais calmoeagorapodefreqüentaraesco- laquetantodesejava”,asseguraela. Nemtodasascriançastêmames- ma chance que Tiago e Idalina tive- ram.Aexploraçãodotrabalhoparece uma realidade distante no mercado joinvilense, onde a indústria exige mão-de-obraqualificada.Mas,indu- zidospelapobreza,desigualdadeeex- clusão social existente em Joinville e em todo o país, muitas crianças tro- cam o banco das escolas pelo traba- lhonasruas.Embuscadealgunstro- cados para ajudar na renda familiar, ignoramatividadesperigosas,quere- presentamsériosriscosparasuasaú- de e seu desenvolvimento. O trabalho infantil é uma dura realidade não apenas no Brasil. Esti- ma-se hoje que haja 180 milhões de criançassubmetidasaameaçasfísicas epsicológicas.Ouseja,umaemcada oitocriançaséforçadaarealizartarefas diáriasemáreasnãorecomendáveis. No tráfico de drogas e na prostitui- ção,aUnicef,órgãodasNaçõesUni- das,estimaquehojeestejamenvolvi- dascercade8milhõesdecrianças. SegundopadreFelício,daParóquia Bom Jesus, no Aventureiro, não há dúvida de que o problema decorra de causaseconômicasesociais,ondeade- sigualdade social vem sendo cada vez maisampliadasendoprecisoestabele- cerdiretrizeseobjetivoscapazesdere- duzirapéssimadistribuiçãodariqueza. NoBrasil,quase7milhõesdecri- anças executam atividades em idade precoce.SegundooRelatóriodaOr- ganizaçãoInternacionaldoTrabalho (OIT), órgão das Nações Unidas, o trabalho infantil no Brasil teve uma redução de 23% entre 1992 e 1999. Nostrêsanosseguintes,emrazãode campanhas nacionais desenvolvidas pelaIgrejaCatólicaepelogovernofe- deral,aquedadotrabalhoinfantilche- gou a 13,6%. Mas voltou a baixar consideravelmente daí para frente, hoje mantendo um índice médio de 2,4%entreosanosde1998e1999. O Sistema Nacional de Em- prego (Sine/SC), além de intermediar mão-de-obra, ofere- ce cursos para a qualificação e requalificação do trabalhador. O sistema funciona através de um cadastramento do desemprega- do. Neste cadastro, ele inclui o último emprego e a área que pre- tende trabalhar. Os cursos acon- tecem de acordo com as neces- sidades do cadastrado, visando a recolocação do desempregado no mercado. O número de pes- soas que conseguem um empre- go após um curso é variável. E o registro deste número não é possível de ser contabilizado pelo sistema. O Sine é um órgão que rece- be recursos do Fundo de Am- paro ao Trabalhador (FAT) do Governo Federal. Os cursos es- tão paralisados porque as verbas ainda não foram distribuídas, mesmo assim a procura é inten- sa. Odenir da Silveira, 28 anos, fez cadastro há mais de um ano, já passou por três empregos tem- porários. Ele já trabalhou como garçom, chapeiro e recepcionis- ta. Apesar de não conseguir um emprego fixo, ele quer fazer um curso através do Sine para ob- ter um emprego imediatamente. “Pretendo fazer um curso de vi- gilante, pois está área vem cres- cendo em Joinville”, comenta. Os cursos mais procurados são os relativos ao comércio e pres- tação de serviços. “O número de pessoas que procuram o setor de serviços é grande. Se o desem- pregado faz um curso de quali- ficação, o Sine tem condições de intermediar e recolocá-lo no mer- cado de trabalho”, revela a co- ordenadora regional do Sine em Joinville, Isabel Cristina Almeida do Amaral. O número de pessoas que têm cursos técnicos e acabam migrando para outras áreas é um fato freqüente apontado pelo Sine. “O curso técnico exige uma maior especialização de conhe- cimentos, por isso poucas pes- soas podem preencher vagas neste departamento. Já o setor de serviços sempre está em ex- No Brasil, quase 7 milhões de crianças trabalham nas ruas. Em Joinville, o Peti tirou das ruas 445 Juliana Kock Sine orienta e cadastra desempregados Cadastro Instituto Integrar de Santa Catarina Rua do Príncipe, n° 838 - 1° Andar - Fundos - Centro Telefones: (47) 433- 5826 / 433- 6258 Sine/SC Rua: Mário Lobo, n° 214 – Centro Telefone: (47) 422- 4255 pansão. Além disso, os cursos deste campo são mais rápidos e tem maior demanda do merca- do”, garante Isabel. A coordenadora afirma, en- tretanto, que um curso não é ga- rantia de emprego imediato. “O mercado quer um profissional qualificado e atualizado, os cur- sos oferecidos são gratuitos basta a pessoa se empenhar e batalhar por um objetivo”, avalia. [SAZ]
  • 12. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 12 Os carrinhos de cachorro- quente têm se tornado bastante populares. Espalhados em inú- meros cantos da cidade, nor- malmente no período que vai da noite até a madrugada, os “dogueiros”, preparam cada lanche com todo o requinte e criatividade, almejando con- quistar ao máximo os seus fre- gueses. Pedro Steffens, 47 anos, na- tural da cidade de Ituporanga, SC, desde 1999 comercializa cachorro-quente num dos pon- tos estratégicos da avenida Jerônimo Coelho. Casado, pai de dois filhos, Pedro veio para Joinville em 1974 como ope- rário de indústria Após passar por várias empresas de gran- de porte, como Cia. Hansen, Comfloresta e Embraco, sem possibilidade alguma de sobre- viver da aposentadoria do INSS, ele começou no ramo de “dogueiro”como empre- gado. Logo em seguida, seu patrão, que decidiu ir embora para Santos, vendeu-lhe o equipamento. Pedro, dali por diante, estabeleceu-se por con- ta própria. Trabalho sem rotina Indagado sobre o dia-a-dia de um vendedor de cachorro- quente, respondeu que a pro- fissão não chega a ser uma ro- tina, uma vez que há sempre uma cara nova, um freguês di- ferente. “Tem dias que eu te- nho que suportar certos incon- Criatividade para atrair clientes Concorrência faz “dogueiros” se espalharem pela cidade e incrementarem seus lanches Marino Braga Jr. Dificuldade: informais querem legalizar barraquinhas para manter qualidade venientes e atender gente alcoolizada, pessoas que se al- teram e chegam a provocar brigas no local”, salienta. Os sanduíches são prepara- dos ao ar livre. Para priorizar a higiene e evitar problemas de contaminação, tanto o carrinho como o equipamento são dia- riamente lavados com água e detergente, enxugados até se- car por completo e, por fim, esterilizados com álcool. Com relação aos alimentos, no final de cada expediente os únicos que são reaproveitados para o dia seguinte são a farofa, a ba- tata palha e a salsicha crua. Os demais complementos: milho, ervilha, molho, verduras, legu- mes, que sobram, são imedia- tamente jogados fora. O “dogueiro” não tem no- ção de quantas unidades saem por noite, tudo varia de acor- do com o movimento. Os dias de maior venda ocorrem nos finais de semanas. Concorrência Antigamente, os cachor- ros-quentes eram compostos apenas de pão, molho, maio- nese, cat chup e mostarda. Hoje, a lei da concorrência impôs novos aprimoramen- tos, e os lanches se tornaram mais incrementados, com mi- lho, ervilha, tomate, alface, batata palha, farofa e até purê de batata. Outros, mais refor- çados ainda, são acrescidos com calabresa, bacon ou pe- quenos pedaços de frango. Pedro Steffens há tempos vem tentando de todas as ma- neiras providenciar a sua do- cumentação, pois depende do negócio para o sustento da família. Sua aposentadoria é pouco mais de um salário mí- nimo. Luiz Antônio de Oliveira, 22 anos, que mantém um car- rinho de cachorro-quente nas proximidades da danceteria Metrô, no bairro Itaum, subúr- bio da cidade, está no mesmo impasse do Pedro. Buscando fazer de seu carrinho uma lan- chonete com ponto fixo, o vendedor vem tentando obter a legalização, mas tem dificul- dade de realizar os procedi- mentos legais junto à Prefei- tura e Vigilância Sanitária. “A perspectiva de lucro com este negócio é suficiente para ga- rantir a sobrevivência”, com- pletou Luiz Antônio, que não dispõe de mais nenhum recur- so financeiro para formalizar o empreendimento. KennedyNunes Cotidiano
  • 13. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 13 Cotidiano Sacoleiros, muambeiros e até contrabandistas. Assim são cha- madas as pessoas que viajam ao Paraguai para comprar e reven- der mercadorias. Cerca de 40 mil pessoas atravessam diariamente a Ponte da Amizade, ligação entre a cidade brasileira de Foz do Iguaçu e a paraguaia Ciudad del Este, sem nenhum tipo de controle. Foz do Iguaçu é considerada o segundo pólo turístico e terceiro parque ho- teleiro do Brasil. A cidade fica a poucos quilômetros das fronteiras do Paraguai e Argentina. A sacoleira A. D. A, 51 anos, há dez anos sobrevive das viagens que faz ao Paraguai. Ela descreve as dificuldades enfrentadas: “Às vezes temos que desviar o cami- nho da volta, dormir em postos, se esconder dentro do mato para não perder nossas mercadorias. É muitohumilhanteecansativo”.Ela ainda afirma já ter sido tratada como ladra e criminosa. “Só estamos trabalhando para sobre- viver, fico revoltada porque já perdi mercadoria para a receita e vi policiais colocando minhas mer- cadorias dentro de carros particu- lares. Os melhores produtos fi- cam para eles”, afirma A.D.A. São 750 quilômetros de Joinville até o Paraguai, cerca de 12 horas de viagem. Em média, 120 pessoas viajam semanalmen- te a Ciudad del Este, para com- prar bebidas, perfumes, cigarros e produtos eletrônicos, trazidos em grande quantidade. Quem comprar acima da cota, de U$150,00, deve ir à aduana do país e declarar a mercadoria para pagar o imposto. Assim não cor- rerá riscos de perder o produto, pois as mercadorias apreendidas não podem ser recuperadas. S.R.C, 38 anos, há dois anos trabalha com mercadorias trazidas do Paraguai. Por falta de opção, escolheu essa área como meio de sobrevivência. “Sou hipertenso, e Sacoleiros garantem sobrevivência Compra e venda de produtos é a forma de trabalho dos viajantes que vão ao Paraguai não posso trabalhar de emprega- do. É muito difícil, mas não é jus- to os policiais tirarem da gente e ficarem com as mercadorias para eles”, declara o sacoleiro. A vigilância das fronteiras, a fiscalização de entrada e saída de pessoas no país e o controle dos meios de transportes que fazem o tráfego internacional são de res- ponsabilidade da Polícia Federal. Cabe ainda a investigação e o combate de crimes nacionais ou transnacionais como o tráfico de drogas, armas, mulheres e crian- ças, furtos e roubos de veículos, contra a fauna e a flora, como a exploração ilegal de madeira e a pirataria. A Receita Federal é o órgão encarregado a destinação das mer- cadorias apreendidas. Segundo o delegado Paulo Correia Yung, muitas pessoas já se tornaram empresários do contrabando. “Tem gente que compra ônibus e coloca pessoas para viajar e com- prar as mercadorias”, comenta. O ônibus quando apreendido passa por uma vistoria. Os passa- geiros com bagagem acima da cota tem toda a mercadoria apreendi- da. Elas ficam guardadas no de- pósito da Receita Federal durante a tramitação do processo fiscal. Conforme o delegado Yung, a Receita dá uma destinação para cada produto. Os cigarros são in- cinerados, mercadorias falsifica- das - como cd’s e relógios - são destruídas. Veículos são leiloados. Bens eletrônicos e equipamentos de informática são doados para órgãospúblicos.Brinquedoserou- pas são destinados à prefeitura que, por sua vez, faz o repasse para instituições beneficentes. “Não existe um esquema espe- cialnasestradas,nemdiasfixospara fazer as operações. Caso contrário, ficariamuitofácilparaossacoleiros. Geralmente, a polícia faz cerco na madrugada de quinta-feira, quan- do os sacoleiros retornam da via- gem”,explicaodelegado. Prejudicados pela alta do dólar, sacoleiros reclamam da atual situação financeira do País “Às vezes temos que desviar o caminho da volta, dormir em postos, se esconder dentro do mato, tudo para não perder nossas mercadorias. É muito humilhante e cansativo” Aline Anacleto KeltrynWendland
  • 14. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 14 Cotidiano O número de mulheres traba- lhando no ramo da revenda de cosméticos aumenta a cada ano. É uma fonte de renda para quem não pode ficar muito tempo fora de casa, para quem tem crianças pequenas ou para quem está de- sempregado e precisa se susten- tar. Ivanir Pinheiro, 29 anos, re- vende os produtos da Avon há um ano. Ela garante que é um exce- lente negócio, principalmente para mulheres que tem o serviço do- méstico para fazer e cuidar da família. “Se ausentar de casa, na maioria das vezes, é uma tarefa difícil para as donas de casa”, completa Ivanir. Outro ponto positivo é a con- tribuição na renda familiar. A revendedora afirma que se não fosse esse dinheiro, certamente passaria por dificuldades. Acácio Ramos, 38 anos, marido de Ivanir, trabalha como taxista autônomo. Quando a situação aperta, ela pode ajudá-lo nas despesas com as revendas que faz. “Graças a esse dinheiro, eu consegui pagar as dívidas desse mês. A venda de cosméticos é importante para o sustento da minha família”, justi- fica. Não é um emprego com car- teira assinada, férias e décimo ter- ceiro, mas pode servir como com- plemento e até mesmo como úni- ca fonte de renda para pessoas que não conseguem arrumar em- prego. Alini Senábio, 25 anos, está desempregada há três meses e consegue juntar dinheiro com as revendas de cosméticos, para aju- dar seu marido a terminar a cons- trução de sua casa. “Ela está de- sempregada no momento e, com as revendas, pode me ajudar nas contas, para que a gente possa comprar nossos móveis, comer e pagar água, luz e gás”, diz Vanderlei Senábio, 21 anos, torneiro mecânico. Revenda de cosméticos atrai mulheres À procura de uma fonte de renda, público feminino investe em produtos de beleza A revenda de cosméticos normalmente é feita de porta em porta. E não são todos que gostam dessa abordagem. Ivanir Pinheiro disse que às vezes é bem recebida, mas em outras leva um “não”, sem poder explicar o motivo da visita. Taisa Juglair, 21 anos, pro- fessora de inglês, diz que quan- do escuta a campainha e vê que são vendedoras já pensa em uma desculpa. “Normalmente Para a vendedora de cosméticos Ivanir Pinheiro, ter um escritório em casa é fundamental para o sucesso do negócio A síndrome da abordagem direta, de porta em porta elas chegam em uma hora indesejada. Não as trato mal, mas peço que vão embora logo, pois estou muito ocupada. Se a vendedora for inconvenien- te, não faço questão de ser muito educada”, continua. Já Francisca Ramos, 77 anos, aposentada, diz que gos- ta quando recebe visita das revendedoras: “Elas sabem conversar e convencer os cli- entes. Têm lábia”. Ivanir Pinheiro sempre está com os catálogos em baixo do braço. “Nos finais de semana sempre consigo vender alguma coisa para os parentes e ami- gos. Qualquer oportunidade é importante para nós revendedoras, que ganhamos a vida com esse trabalho”. Sustento básico Hoje Ivanir consegue suprir suas necessidades básicas. E sempre que alguém reclama de dificuldades, dá a dica: “Nós não ficamos ricas, mas pode- mos pelo menos colocar comi- da na mesa, e até pagar o estu- do de nossos filhos”. Quem está fora do merca- do formal e deseja trabalhar com revenda de cosméticos, pode entrar em contato com as marcas desses produtos pe- los sites. Outra possibilidade é contatar as revendedoras, fazer um cadastro e pagar uma taxa de matrícula. [AK] Alessandra Kupas Alessandra Kupas
  • 15. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de outubro de 2002 15 Cotidiano Um salário de dois mil reais por quatro horas de trabalho por dia pode parecer um sonho para uma família de classe média, mas é a realidade de muitas garotas de programa de Joinville, que vivem da prostituição. O resultado é a exclusão familiar e social. Carla, 34 anos, é uma destas prostitutas que buscam a qualquer preço um reinserção na socieda- de, por meio de emprego, mas até agora não conseguiu. “Quando a gente está na rua, ninguém olha, a não ser para fazer sexo”, diz ela, ressaltando que deixou o filho com a mãe, em Londrina, e veio para Joinville em busca de uma vida melhor. Com ensino funda- mental incompleto, sem dinheiro e profissão indefinida, acabou na Rua do Príncipe, vendendo o pró- prio corpo para viver. Mora em um quarto de pensão alugado com mais quatrogarotas. “Não ligo para minha mãe, porque tenho vergonha do que faço, mas sem- pre deposito dinheiro para meu filho”, justifica Carla, afirmando que não tem contato com a famí- lia há mais de três anos. Outra garota de programa que perdeu vínculo familiar é Bernadete, 42 anos, que mora no quarto com Carla. “Quando mi- nha mãe morreu, meu pai arru- mou outra esposa e eu fugi de casa”, conta a prostituta, acrescen- tando que já consumiu e comercializou drogas, mas que agora só vende o corpo. Com 1,50 metro, setenta quilos, uma mini- saia e, na boca, batom de 1,99, Bernadete reclama que o merca- do está fraco. “Quando tinha meus dezoito anos, ganhava bem, mas hoje apenas alguns trocados”, compara. Para ludibriar a concor- rência, a prostituta inovou e ago- ra aceita até pagamento pré-data- do e ticket-refeição. “Até agora ninguém sustou o cheque”, co- menta Bernadete, ressaltando que O outro lado da prostituição A maioria das garotas de programa ganha bem, mas querem largar a prostituição não teve espírito empreendedor. “ O que ganhei, gastei”, lastima. Ganhar muito, mas não des- frutar é o que acontece diariamen- te com as garotas que trabalham nas boates fazendo strip-tease em Joinville. Silvia, 27 anos, foi uma das que ganhou, mas não levou o dinheiro. “Cobravam por progra- ma R$ 100, 00, fora à bebida, que o cliente consumia”, diz, contrari- ada, porque oitenta por cento fi- cava com o dono do estabeleci- mento. Silvia trabalhou numa bo- ate as margens da BR 101 e hoje faz ponto na Rua Abdon Batista. Com um corpo bem definido, diz que faz mais de sete programas por dia e seu faturamento supera a casa dos três mil reais. “Procuro guardar um pouco, mas nem sem- pre dá”, lastima. Além de traba- lhar na rua, Silvia também atende a domicílio. “Coloquei um anún- cio no jornal e eles ligam para meu celular”, diz. Questionada se quer mudar de vida, disse que um dia irá largar a prostituição, mas ago- ra não. “Preciso de mais dinheiro, quero montar meu próprio negó- cio”, argumenta, ressaltando que um dia terá um restaurante. O sonho de ter uma vida me- lhor, ainda persiste na cabeça das garotas de programa joinvilenses, principalmente para uma pré-ado- lescente que não conheceu as bo- necas e já faz sexo como uma mulher. Roberta, 14 anos, deixou o convívio familiar com nove anos. Seus pais foram mortos por trafi- cantes em Curitiba. Não gosta de comentar sobre o passado, apenas sobre o futuro. “Acredito que um príncipe irá me tirar desta vida”, sonha. Roberta não tem traços de uma prostituta e, sim, de uma cri- ança abandonada. Com 1,50 de altura, cabelos cacheados e emba- raçados, chinelos de dedo, cami- seta, bermuda e boné, ela freqüen- ta a Rua do Príncipe. “Fico sem- pre andando, pois não posso parar num local, porque tem alguém que denuncia”, explica Roberta, com medo da polícia, que pouco pode fazer para coibir, pois o código penal brasileiro oferece dúbia ex- plicação (veja box ao lado). Além de conviver com a rejei- ção da sociedade, comercializar o próprio corpo, as garotas progra- ma joinvilenses sobrevivem num mundo de incertezas, que na bus- ca de agradar o cliente, deixam seus desejos de lado. Entre os principais riscos está o tráfico de drogas, que encontra na prostitu- ta seu ponto de distribuição, a agressão por parte do cliente in- satisfeito e o próprio risco de con- tágio com um doença sexualmen- te transmissível. Os artigos 227 e 230, do Código Penal, caracte- rizam a prostituição como crime quando uma pessoa convence, induz ou atrai alguém a praticar o ato se- xual. Já no artigo 228, ela só será encarada como crime quando alguém usa da prostituição ou obte- nha lucro com ela, ou seja, sustentado com a prosti- tuição de outra pessoa. O que os artigos concordam é que a pena prevista é de reclusão de um a dez anos, mais multa que é estipulada pela Justiça. O que diz a lei As esquinas das principais ruas do centro da cidade são os locais preferidos Francisco Carlos Farias e Manoela de Borba KennedyNunes
  • 16. Primeira Pauta Joinville/SC, 15 de Outubro de 2002 16 Cotidiano O preço varia de R$ 3,00 à R$ 5,00. O benefício é a segu- rança do carro no horário das compras, do trabalho ou do lazer. As conseqüências podem ser desagradáveis. Os guardado- res de carros, ou simplesmente “flanelinhas”, são presença cons- tante nas ruas de maior movi- mento em Joinville. O freqüen- tador paga pela vaga ao estaci- onar, o que “garante” a segu- rança do carro. Os flanelinhas escolhem a dedo os locais. Eles podem surgir de forma indivi- dual ou em grupo, dependen- do do local escolhido pelo mo- torista. Visando uma maior seguran- ça e a garantia da rotatividade do espaço de estacionamento nas ruas da cidade, surgiu a chama- da Zona Azul, sob responsabili- dade da Conurb (Companhia de Desenvolvimento e Urbaniza- ção). Antes da implantação do serviço, os veículos ocupavam vagas nas ruas mais movimenta- das durante o dia inteiro. Segun- do o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Joinville, Gilson Bohn,azonaazul conta mais com 1,5 mil vagas. Os preços variam de acordo com a localização. Nas ruas cen- trais da cidade o custo é de R$ 1,50, sendo que o número de va- gas comporta aproximadamente 300 veículos. Mesmo com a im- plantação e o pleno funcionamen- to, a Zona Azul não absorveu os “informais”. Nos arredores de um grande Shopping, no centro, a situação é flagrante. O freqüentador é abordado logo ao estacionar. O flanelinha Cláudio Felipe, o Cacá, de 18 anos atua há 2 anos em Joinville. “É o úni- co jeito de ganhar alguma coisa”, Boa vaga tem preço Trânsito de Joinville é marcado pela informalidade. Flanelinhas atuam principalmente à noite diz. Ele afirma não gostar de fi- car pedindo dinheiro pelo ser- viço, e garante: “Quem deixa alguma coisa é sempre bem re- cebido”. Ao ser questionado sobre o freqüentador que não paga, Cacá desconversa: “A gente tenta tratar sempre igual, não tem outro jeito. Sempre tem um troquinho pra dar”. Maior organização No período noturno, a pre- sença de guardadores de carros também é constante. Dificilmen- te um freqüentador irá a qual- quer casa noturna ou clube da ci- dade sem encontrar os informais. Os principais pontos são as Avenidas Getúlio Vargas e João Colin, além da Rua Visconde de Taunay, que apresentam movi- mento semanal constante em três das principais casas noturnas da cidade. José Ignácio, de 54 anos é um dos informais no setor que trabalham na noite. Para ele, a falta de oportunidade foi o prin- cipal motivo para dar início a esse tipo de serviço. “Tenho 54 anos e já trabalhei com várias coisas. Fazia pequenos arranjos de palha pra vender, mas ficou muito complicado”, explica. Ignácio trabalha há cinco anos como guardador de car- ros no centro de Joinville e tem clientes assíduos. “Uso esse ter- reno faz tempo, e ele fica lotado todo sábado. Muita gente que vem aqui sabe que o trabalho é sério”, garante. Ele exalta ain- da a organização dos guarda- dores de carros que trabalham na noite e não aceita ser cha- mado de flanelinha. “Com 54 anos? Eu trabalho sério! Flanelinhas são as crianças na rua que não tem outra opção”, conclui. Histórias como a de José Ignácio não são as predomi- nantes entre os informais que trabalham na área. A maior parte dos flanelinhas entrevis- tados durante a reportagem atua durante o dia e tem ida- des entre 15 e 22 anos. Mui- tos deles vieram do Paraná em busca de oportunidade aqui e não foram absorvidos pelo mercado formal. Um dos casos é o de J.S., de 17 anos. A família continua mo- rando em Curitiba. Ele veio para Joinville acompanhado de dois amigos que também são flanelinhas e se alternam nas re- giões centrais e do Centreventos Cau Hansen, quando há algum evento. “Juntamos dinheiro em Curitiba. Deu pra comprar uma passagem só”, diz ele, que ape- sar das dificuldades não pensa em voltar. Quando pergun- tado sobre o local onde pas- sa a noite, tenta mudar de assunto e se mostra disper- so: “Dou um jeito”. J.S., as- sim como tantos outros flanelinhas que atuam na ci- dade, tenta sobreviver na informalidade e não perde a esperança: “Não quero fi- car aqui pra sempre. Quero voltar pra escola”. [IRWS] Ação: com idades que variam entre 15 e 22 anos, flanelinhas estão por toda parte KennedyNunes Adolescentes vivem drama pessoal Igor R. W. Schulenburg