O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), requereu e bloqueio dos bens de dois ex-servidores do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) e de um empresário do setor de tecnologia. O bloqueio objetiva garantir o ressarcimento de mais de R$ 2 milhões ao erário, prejuízo resultante de irregularidades na execução de um contrato para prestação de serviços ao arquivo central do Poder Judiciário catarinense.
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Fls. 3/32
Judiciário do Arquivo Central – SAJARC (sistema desenvolvido para a Divisão de
Arquivo que permitia o cadastramento de nova localização física para o processo
judicial), com revisão dos dados cadastrados, incluindo gerenciamento das
atividades, fornecimentos de mão de obra, uniformes e equipamentos contidos no
Anexo Único do contrato (fl. 08).
A execução dos serviços seria realizada no Arquivo Central do Tribunal de
Justiça do Estado de Santa Catarina, no horário de expediente da empresa
demandada, qual seja: entre às 07:00 e às 19:00 horas, sendo que a fiscalização
destes ficaria ao encargo do ex-servidor Almir Tadeu Peres, ora requerido e, à
época, responsável pela Diretoria de Documentação e Informações – DDI.
Como contraprestação dos serviços realizados, a referida sociedade
empresária teria os seus pagamentos realizados da seguinte forma: os serviços
prestados nos processos migrados do Sistema de Automação do Judiciário – SAJ
teriam o custo unitário de R$ 0,12 (doze centavos) por processo, e os serviços
prestados nos processos criados no Sistema de Automação do Judiciário do Arquivo
Central – SAJARC custariam R$ 0,02 (dois centavos) por processo.
O pagamento deveria ser efetivado até o 30º (trigésimo) dia após o aceite
e liberação da Nota Fiscal/Fatura pela Divisão de Arquivo e Memória do Judiciário –
Diretoria de Documentação e Informações, que como dito alhures, era de
responsabilidade do requerido Almir.
Todavia, no decorrer da execução do contrato, o Sindicato dos Servidores
do Poder Judiciário de Santa Catarina – SINJUSC, diante do recebimento de
diversas reclamações que colocavam em dúvida a lisura da empresa contratada,
protocolizou uma denúncia na Presidência do TJSC, relatando supostas
irregularidades que estariam ocorrendo nas dependências do Arquivo Central do
Poder Judiciário, referente à prestação do serviços efetuados pela empresa ré,
vinculados ao contrato nº 181/2007.
Na referida denúncia, dentre as inúmeras irregularidades apontadas,
destacou-se a existência de um esquema montado entre os ex-servidores e ora
requeridos Almir e Gilberto, os quais manipulavam a contagem dos serviços
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Fls. 4/32
prestados inserindo valores incompatíveis com a produção, com o intento de
auferirem vantagem indevida, tudo isso em conluio com o representante legal da
empresa requerida, responsável pela confecção das notas fiscais superfaturadas.
A denúncia especificava, ainda, de modo minucioso o modus operandis
dos requeridos, que envolvia a prática de condutas como: alteração contratual pelo
gestor do contrato, sem justificativas plausíveis e sem a prévia anuência do TJSC;
transferência de parte do objeto do contrato a terceiros (estagiários e terceirizados
contratados pelo TJSC); ausência de pessoal suficiente e qualificado para
atendimento dos serviços contratados; pagamento por serviços não previstos no
contrato; falta de fiscalização do contrato; ausência de boa-fé do ex-servidores no
exercício da função pública; execução do serviços em quantidades superiores ao
efetivamente realizado e registrado no sistema SAJ e superfaturamento dos serviços
realizados pelos particulares (RBM e Rogério).
O prazo de vigência contratual que, inicialmente, era até o dia 31
dezembro de 2007, foi prorrogado sucessivamente por meio de diversos aditivos
contratuais, findando-se somente em 29/08/2012.
Diante de tais fatos, o Presidente do TJSC determinou a instauração do
Processo Administrativo Disciplinar nº 451321-2012.5, por meio da Portaria nº
365/2012. Após a devida instrução e realização de Perícia Técnica, atendendo aos
procedimentos da Lei Complementar nº 491/2010, apresentou-se relatório conclusivo
apontando as irregularidades na execução do contrato.
Posteriormente, a Presidência do Tribunal de Justiça reconheceu o
cometimento das infrações capituladas na peça pórtica, aplicando os requeridos
Almir Tadeu e Gilberto Machado, em decisão fundamentada, as penalidades de
demissão qualificada, com incompatibilidade para o exercício de cargo ou emprego
público pelo período de 5 (cinco) anos.
Inconformados com a referida decisão, os ex-servidores impetraram
Mandado de Segurança no Grupo de Câmaras de Direito Público do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, sob o nº 2013.037944-8, momento em que sustentaram
cerceamento de defesa, o que foi reconhecido com a concessão parcial da ordem
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para anular o processo disciplinar a partir da Perícia, bem como para que se
observasse o disposto no art. 59 da LC nº 491/2010 antes de ser prolatada a decisão
final nos autos.
Diante disso, foi instaurada nova Portaria (nº 21/2015-GP) sob
constituição de outra comissão disciplinar.
Findos os trabalhos, inclusive com realização de nova Perícia Técnica
[cuja conclusão não difere da anterior], por meio de relatório conclusivo devidamente
fundamentado, a comissão disciplinar entendeu estarem configurados os ilícitos
previstos no art. 137, inciso I, itens 1 e 3, e inciso II, item 14, da Lei nº 6.745/1985,
por parte do requerido Almir Tadeu Peres, e no art. 137, inciso I, itens 1 e 3, e inciso
III, item 6, da Lei nº 6.745/1985, por parte do demandado Gilberto Machado,
mantendo a pena que já havia sido imposta no procedimento administrativo anterior,
qual seja, a de demissão qualificada, com incompatibilidade para o exercício de
cargo ou emprego público pelo período de 5 (cinco) anos.
Quanto à empresa RBM – Soluções para Gerenciamento da Informação
Ltda., após regular trâmite do processo administrativo nº 492034-2013.1, e
comprovado o inadimplemento doloso do contrato, foram impostas as seguintes
penalidades: multa, suspensão temporária de participar de licitações e impedimento
para contratar com a Administração Pública pelo prazo de 5 (cinco) anos.
Giz-se, por oportuno, que as perícias supramencionadas apuraram que o
pagamento indevido em favor da empresa contratada alcançou o patamar de R$
1.800.936,76 (um milhão oitocentos mil novecentos e trinta e seis reais e setenta e
seis centavos), confirmando o dano causado aos cofres do Poder Judiciário
Catarinense, dano este que só ocorreu em razão dos atos ilícitos e ímprobos
cometidos por todos os demandados e que ensejam a propositura da presente
demanda, conforme será melhor detalhado na sequência.
Este é, portanto, o relato do necessário.
2. ANÁLISE JURÍDICA
Visando facilitar o entendimento das irregularidades presentes no caso,
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[...]
Gilberto acrescenta que o arquivamento e o desarquivamento eram feitos
pelos funcionários terceirizados ligados à Empresa Plansul. Contudo, em
razão do grande volume de atribuições e da mudança realizada no setor, a
equipe não conseguiu manter a regularidade dos serviços, momento em que
Almir determinou que os funcionários vinculados à RBM auxiliassem nessas
tarefas (Mídia Eletrônica – fl. 1.679).
[...]
Logo, não bastasse a inclusão do referido serviço nos pagamentos realizados
à Empresa RBM, os servidores acusados criaram um método distinto de
contagem para pagamento, mais gravoso ao Estado e sem nenhum termo
aditivo contratual que lhe desse respaldo.
Digitalização de coletâneas de jurisprudências
A inclusão da digitalização de coletâneas de jurisprudências nos serviços
pagos para a Empresa RBM, em função do Contrato . 181/2007, foi relatada
por Almir com detalhes.
[...]
Quando as coletâneas chegaram ao Arquivo Central, dois anos após a
assinatura do contrato, Almir determinou que a digitalização fosse feita pelos
funcionários terceirizados da Empresa RBM, pois entendeu estarem previstas
no Contrato n. 181/2007, uma vez que era a migração de um documento do
meio físico para o meio digital (Mídia Eletrônica – fl. 1.679).
O cálculo da produtividade também não confere com o proposto no Contrato
n; 181/2007. A cada folha digitalizada computava-se uma migração.
É evidente que o referido serviço não poderia ter sido executado pelos
empregados terceirizados pela Empresa RBM. Primeiro, porque não se
tratavam de processos, mas, sim, de acórdãos. Depois, não havia
cadastramento ou migração para serem feitos, mas, sim, digitalização de
documentos. Forçoso concluir, pois, qua digitalização de coletâneas de
jurisprudência não está arrolada no Contrato n. 181/2007.
Digitalização de processos e-STJ e e-STF
O serviço de digitalização de processos para envio pelo sistema e-STJ iniciou
após a assinatura no Termo de Cooperação Técnica entre o Superior
Tribunal de Justiça e a Corte catarinense, em 3 de setembro de 2009. Na
mesma época começou também a remessa de processos pelo e-STF.
Almir relatou que inicialmente a tarefa seria executada pela Diretoria
Judiciária, entretanto, em razão da falta de estrutura, por determinação da
Administração (fls. 1.471-1.473), passou a ser realizada no Arquivo Central.
Ao assumir a responsabilidade, Almir estabeleceu que o mencionado serviço
fosse feito pelos terceirizados da Empresa RMB, sob a coordenação de
Gilberto, já que a seu ver o Contrato n. 181/2007 previa todas as etapas a
serem executadas na digitalização (Mídia Eletrônica – fl. 1.679).
Disse, ainda, que autorizou a utilização da mão de obra da RBM diante da
obrigatoriedade de cumprimento do termo de cooperação e da Meta 7 do
Conselho Nacional de Justiça, da emergencialidade do serviço e da escassez
dos servidores.
Todavia, é evidente a impossibilidade de enquadrar o serviço de digitalização
de processos dentre aqueles previstos no Contrato n. 181/2007, pois são
muitas as diferenças entre tal operação e as de cadastramento e migração.
A primeira diz respeito ao processo envolvido. O Contrato n. 181/2007
aplicava-se tão somente aos processos de 1º Grau, originários das comarcas
e inativos, que ensejavam a guarda definitiva.
Já a digitalização de autos para envio ao STJ e STF abarcava os processos
de 2º Grau, vindos do Tribunal de Justiça, pendentes de recursos às Cortes
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Superiores e que ali permaneciam temporariamente.
Assim, a digitalização de processos para envio pelo sistema e-STF e e-STJ
não poderia ter sido incluída nos processos de pagamento referentes aos
serviços prestados em conformidade com o Contrato n. 181/2007, porque
nele não se enquadra.
Processos Históricos
A produtividade dos processos históricos (assim reconhecidos aqueles que
tramitavam no Século XIX, até o ano de 1950) passou a ser incluída nos
serviços pagos pelo Contrato n. 181/2007 a partir de meados de 2011.
[...]
Os documentos eram retirados de caixas de papel e levados à mesa de
trabalho. Iniciava-se a retirada da costura para a higienização, com o uso de
pó de borracha e biscuri, e após eram removidos os resíduos de cola para
posterior secagem, Ato contínuo, colocavam-se folhas plásticas entre entra
as páginas, para não grudar, preenchia-se uma ficha que constava a
comarca, o século, observações importantes e o nome das pessoas wue
haviam mexido no processo, bem como o que tinha sido feito.
Montavam-se caixas poliondas, ideais para conservação de documentos, e
guardavam-se os processos. Afixava-se uma etiqueta com número da caixa,
a comarca à qual pertencia, o ano, a classe dos processos e outras
informações diversas e essa era colocada nas estantes. Por fim, os
processos eram cadastrados em uma planilha no Excel.
Vê-se, pois, que o serviço realizado com os processos históricos também era
peculiar e, assim, incompatível com os previstos no objeto do Contrato n.
181/2007.
No que concerne à contagem de produção, os acusados têm versões
distintas. Gilberto sustenta que o número informado era multiplicado por 50
(cinquenta), que seria a média de folhas por processo, e Almir defende que
30 (trinta) era o fator de multiplicação.
Contudo, não importa se os números eram multiplicados por 30 (trinta) ou por
50 (cinquenta), porquanto o serviço não poderia ter sido incluído nos
pagamentos da Empresa RBM, quanto mais formulado em cálculo específico
para seu pagamento.
Processos Temporários
Gilberto esclarece que os processos temporários são aqueles que
aguardavam decisão do STJ e STF (digitalizados no sistema) ou na Turma
de Recursos e necessitavam de movimentação apenas para fins de
localização.
Almir explicou que a produção era cotada pelo número de movimentações
realizadas no processo [...]
O aludido trabalho igualmente não se encaixava nos previstos no objeto do
Contrato n. 181/2007.
Isso porque, consoante já mencionado no tópico referente à digitalização ao e-
STF e e-STJ, diz respeito a processos de 2º Grau, pendentes de recursos às
Cortes Superiores , vindos do Tribunal de Justiça, e não àqueles objeto de
migração e cadastramento originados das comarcas, para arquivamento
definitivo.
Remanejamento de caixas
Sobre o remanejamento de caixas, Almir disse ter enquadrado o trabalho no
Contrato n. 181/2007, pois está previsto como uma das etapas dos serviços
de cadastro e migração. Esclareceu, ainda, que a realização ocorreu de
forma excepcional, durante 3 ou 4 meses do ano de 2011, em razão da
mudança do novo Galpão do Arquivo, em Palhoça. Explicou que o Tribunal
de Justiça forneceu o transporte, mas não havia mão de obra para organizar
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[...]
Existem certas cláusulas que são mutáveis unilateralmente pela
Administração. Já outras somente podem ser alteradas mediante
concordância do particular contratado.
As cláusulas mutáveis unilateralmente são aquelas pertinentes à adequação
do objeto à satisfação da finalidade buscada por meio da contratação. Isso
envolve o projeto e suas decorrências, tais como o local, o material, o prazo,
a tecnologia, os quantitativos.
Já as cláusulas mutáveis consensualmente são aqueles que envolvem a
alteração do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, o qual não pode ser
alterado unilateralmente pela Administração. (FILHO, Marçal Justen,
Comentários à Lei de Licitações, Dialética, São Paulo, 2012, p. 879 e 881)
Acerca das condições de pagamento, a Constituição Federal em seu
artigo 37, inciso XXI, determina:
Art. 37. A administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
e, também, ao seguinte:
[...]
XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,
compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação
pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com
cláusulas que estabelecem obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá
as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia
do cumprimento das obrigações; [...] (grifo e sublinhado acrescido).
Neste contexto, Marçal Justen Filho completa:
A regra da alínea "c" tem de ser interpretada restritivamente, sob pena de
inconstitucionalidade. O art. 37, XXI, da Constituição Federal determina que
as contratações administrativas devem prever cláusulas que "estabeleçam
obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta(..)".
Logo, não se pode cogitar de uma alteração acerca da forma de
pagamento, imposta unilateralmente pela Administração simplesmente
para reduzir os desembolsos inerentes à contratação. Alteração dessa
ordem seria impedida pelos princípios da moralidade, isonomia e da
vinculação do contrato ao ato convocatório. Se a alteração tornasse o
contrato mais vantajoso para o particular, haveria vício porque outros
terceiros poderiam ter manifestado interesse em participar da licitação.
(FILHO, Marçal Justen, Comentários à Lei de Licitações, Dialética, São
Paulo, 2012, p. 887 – grifo e sublinhado acrescido).
Ou seja, analisando as hipóteses supramencionadas, resta claro que as
inclusões inseridas de forma deliberada, ofendem não só os ditames legais
preconizados em nossa Carta Magna, como as premissas administrativas elencadas
na Lei de Licitações, sobretudo no que diz respeito à obediência das cláusulas
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grande monta, não restando outra alternativa senão a de responsabilizar o ex-
servidor Almir Tadeu Peres, pelos seus atos lesivos praticados em comum acordo
com os demais demandados, com a imposição das sanções inerentes aos atos
ímprobos por ele praticado.
2.1.3. Do ato de faltar com a verdade e agir de má-fé, no exercício da
função pública (Gilberto Machado)
Por sua vez, no tocante ao ex-servidor Gilberto Machado, sabe-se que
este fornecia subsídios para os pagamentos em desconformidade com o Contrato nº
181/2007 e, além disso, praticava outras irregularidades, as quais passo a discorrer.
De acordo com as provas coletadas nos autos nº 451321-2012.5, Gilberto
era responsável pela captação dos funcionários terceirizados, bem como
intermediava os acertos com a empresa ré e efetuava pagamentos que lhes eram
devidos, agindo como se fiscal do contrato fosse e, também, como uma espécie de
preposto da contratada.
O demandado Gilberto, em diversos processos de pagamento das
despesas relativas à execução do Contrato nº 181/2007, dos meses de maio de 2010
a fevereiro de 2012, informou ao fiscal/gestor do aludido contrato, por meio de
correspondências eletrônicas juntadas aos processos respectivos, que a empresa
RBM executou serviços em quantidade superiores ao efetivamente realizado e
registrado no Sistema SAJARC, inclusive com a inserção, em seus relatórios, de
procedimentos que sequer eram objeto do referido contrato, relacionados a
processos judiciais de 2º Grau, fornecendo subsídios – em cristalina união de
esforços – para que o gestor autorizasse os pagamentos indevidos, que oneraram
indevidamente os cofres públicos.
Não resta dúvida que Gilberto, ao fornecer dados inverídicos para
computação exacerbada dos serviços prestados, agiu dolosamente, pois como
servidor público tinha plena ciência que, ao influir determinado procedimento deveria
respeitar o objeto contratual, afim de evitar informações errôneas, principalmente no
que diz respeito ao quantitativo dos serviços prestados para não incorrer em prejuízo
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aos cofres públicos.
Assim sendo, diante de tudo que restou exposto, denota-se que os ex-
servidor contribuiu ativamente para o esquema fraudulento formado com os demais
requeridos no intuito de causar dano ao erário e obter vantagem ilícita, devendo ser
responsabilizado por suas condutas, que além do dano monetário ao Estado,
enriqueceram ilicitamente os demandados RBM e Rogério (seu representante legal),
conforme ver-se-á na sequência.
2.1.4. Do descumprimento dos serviços previstos no contrato
Conforme restou comprovado, a empresa Ré RBM – Soluções para
Gerenciamento da Informação Ltda., por intermédio de seu representante legal
Rogério, transferiu parte do objeto do Contrato nº 181/2007 a terceiros sem prévia
anuência do Tribunal de Justiça, além disso, não mantinha funcionários suficientes e
qualificados para prestação dos serviços contratados, acrescido aos fatos de que
muitos deles não possuírem anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social.
Sabe-se que a "Obrigatoriedade do Contrato" é um dos princípios que
regem a execução contratual. Conforme o artigo 66 da Lei nº 8.666/1993: "O contrato
deverá ser executado fielmente pelas partes, de acordo com as cláusulas avençadas
e as normas desta Lei, respondendo cada uma pelas consequências de sua
inexecução total ou parcial."
Em sua gênese, por esse princípio entende-se que as partes devem
cumprir as obrigações que lhe incubem na forma, no tempo e local previstos.
Todavia, perpetrando a ilegalidade praticada pela contratada, de acordo
com o aludido processo disciplinar, nos meses de setembro de 2007 e março de
2012, a empresa Ré – em diversas oportunidades – fez constar nas notas relativas à
execução do Contrato nº 181/2007 quantidade de serviços prestados que não eram
coerentes com os dados elencados nos relatórios estatísticos de produtividade no
Sistema SAJARC, utilizados para registro de informações relativas aos processos
arquivados sob a responsabilidade da Divisão de Arquivo e Memória do Judiciário,
sendo dessa forma, beneficiados pelos atos de improbidade dos demais Réus,
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conforme depreende-se do parecer do Secretário-Geral (Juiz) do Tribunal de Justiça,
in verbis:
Todavia, restou comprovado que a sociedade empresaria transferiu parte do
objeto a terceiros sem prévia anuência deste Tribunal de Justiça, não
mantinha pessoal suficiente e qualificado para o atendimento dos serviços
contratados e infringiu diversos dispositivos da legislação trabalhista.
Nesse sentido, apanha-se da manifestação da Assessoria da Diretoria de
Material e Patrimônio de fls. 1113-1137:
Diante de toda instrução realizada, percebe-se que, de fato, a empresa
contratada utilizava da mão de obra das demais empresas contratadas pelo
Tribunal de Justiça para a execução de seus serviços, descumprindo
claramente as normas contratuais.
[...]
No relatório da Comissão Disciplinar foi tratada a questão da informalidade
dos trabalhadores que estavam vinculados à empresa RBM – Soluções para
Gerenciamento da Informação Ltda.
Conforme o depoimento dos funcionários, vários deles não possuíam
anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social para formalizar o
vínculo empregatício, gerando negligencia aos direitos trabalhistas dos
empregados.
[...]
Verifica-se que, de toda forma, a empresa contratada infringiu norma
contratual, bem como norma legal, uma vez que é sua obrigação a aplicação
exata das disposições contidas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT,
sob pena de gerar passivo trabalhista, podendo ser acionada pelo seu
empregado, a qualquer momento, para que este tenha seus direitos
trabalhistas reconhecidos (fls. 113-1137).
Essa constatação não foi afetada pela realização de nova perícia no processo
administrativo n. 492034-2013.1, consoante manifestação da Diretora de
Material e Patrimônio de fl. 1814
De outro tanto, os argumentos apresentados na defesa administrativa
apresentada pela contratada não são aptos a afastar os descumprimentos
contratuais constatados.
Com efeito, a alegação de existência de vícios no processo administrativo
disciplinar que culminou na demissão dos servidores Almir Tadeu Peres e
Gilberto Gomes não afeta as conclusões destes autos, que tratam
especificamente da responsabilidade da sociedade empresária contratada
por descumprimento contratual e do ressarcimento civil dos prejuízos
causados.
Ainda, ressalta-se que o fato de existirem decisões da Justiça do Trabalho
reconhecendo o vínculo empregatício não afasta a constatação de que a
sociedade empresária se beneficia da mão de obra de postos terceirizados e
de estagiários deste Poder Judiciário, na medida em que lastreada em
inúmeros depoimentos que atestam essa utilização.
Mais do que isso, essas decisões judiciais só reforçam a falta de
cumprimento da legislação trabalhista por parte da contratada, haja vista ter
sido condenada ao pagamento de diversas verbas trabalhistas aos autores.
Assim, diante do descumprimento contratual apurado, e tendo sido afastados
os argumentos apresentados na defesa apresentada, não resta outra
alternativa que não a aplicação das correspondentes sanções administrativas
em obediência aos princípios da legalidade e da indisponibilidade do
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Fls. 19/32
interesse público.
Ao dispor sobre as sanções administrativas por descumprimento contratual, a
Lei n. 8.666/1993 estabelece em seu art. 87 que:
[...]
Desta forma, restando comprovado que a contratada descumpriu os incisos
VI, XIII e XVII da cláusula sexta do Contrato 181/2007, conforme
manifestações da Diretoria de Material e Patrimônio de fls. 1113-1137,
1559-1562 e 1810-1814, indelével a necessidade de aplicação da penalidade
de multa correspondente.
Além disso, as condutas perpetradas pela contratada estão inseridas entre as
hipóteses de aplicação da penalidade de suspensão temporária de participar
de licitações e impedimento de contratar com a Administração Pública,
conforme manifestação da diretoria de Material e Patrimônio (fls. 113-1137):
[...]
Com isso, verificado o descumprimento dos incisos I e VIII do § 4º da
cláusula décima do Contrato n. 181/2007, surge a obrigação de aplicação da
penalidade de suspensão temporária do direito de participar em licitação e
contratar com a Administração, entendendo-se razoável seja estipulado o
prazo de 2 (dois) anos, conforme sugestão da área técnica.
Para arrematar, considerando a gravidade da conduta da contratada, que
gerou, segundo informação da perícia de fl. 1705- verso, pagamento a maior
no montante de R$ 1,224,647,33 (um milhão duzentos e vinte e quatro mil
seiscentos e quarenta e sete reais e trinta e sete centavos), surge a
necessidade da aplicação da penalidade de declaração de inidoneidade para
licitar e contratar com a Administração Pública pelo prazo de 5 (cinco) anos.
A propósito, retira-se da manifestação da Diretoria de Material e Patrimônio
(fls. 1113-1337):
[...]
Diante de todo o exposto, e na esteira das manifestações do Diretor-Geral
Administrativo e da Diretoria de Material e Patrimônio, opino pela aplicação
das seguintes penalidades à sociedade empresaria RBM – Soluções para
Gerenciamento da Informação Ltda. pelo descumprimento do Contrato n.
181/2007: a) multa prevista na cláusula décima §2º, II, pelo descumprimento
dos incisos VI, XIII e XVII da cláusula sexta do contrato; b) suspensão
temporária de participar em licitações e impedimento para contratar com a
Administração, pelo prazo de 2 (dois) anos, pela incidência nos incisos I e VIII
do §4º da cláusula décima do contrato e c) declaração de inidoneidade para
licitar e contratar com a Administração Pública pelo prazo de 5 (cinco) anos,
com base na cláusula décima, §6º do contrato.
Além dessas penalidades, opino seja o Procurador do Estado em atuação
neste Poder Judiciário cientificado a adotar as medidas cabíveis visando o
ressarcimento civil do prejuízo causado, calculado pela perícia em R$
1.224.647,33 ( um milhão, duzentos e vinte e quatro reais e trinta e três
centavos), com as devidas atualizações monetárias. [...].
No que concerne à informalidade dos trabalhadores vinculados à empresa
requerida, verificou-se a ausência de anotação na Carteira Nacional de Trabalho e
Previdência Social, razão pela qual a empresa infringiu não só norma contratual,
mas, também, norma legal trabalhista, uma vez que é sua obrigação a aplicação
exata das disposições contidas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT,
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Fls. 21/32
projeto de Interesse público (v.g.: custeio de viagens em razão de convênio
celebrado com o Poder Público). Não sendo verificada a presença de
qualquer dessas Justificantes, ter-se-á um relevante Indício da ilicitude da
vantagem, o que, a evidencia, não dispensa a identificação do elemento
subjetivo e a utilização do critério de proporcionalidade, em especial no que
diz respeito a boa ou a má-fé do agente (GARCIA, 2013, op cit, p.436).
Pois bem.
No caso da empresa RBM e seu representante legal, o enriquecimento
mostra-se evidente quando do recebimento dos valores manifestamente
superfaturados em total desrespeito ao que previa o instrumento contratual,
sobretudo porque quando deveriam receber o importe de R$ 573.877,31 (quinhentos
e setenta e três mil, oitocentos e setenta e sete reais e trinta e um centavos) pelos
serviços que seriam prestados, auferiram, de fato, o valor de R$ 1.800.936,76 (um
milhão, oitocentos mil, novecentos e trinta e seis reais e setenta e seis centavos), ou
seja, um acréscimo escancarado de R$ 1.227.059,45 (um milhão, duzentos e vinte e
sete mil e cinquenta e nove reais e quarenta e cinco centavos) sobre o montante que
realmente deveria receber.
No tocante aos ex-servidores Almir Tadeu Peres e Gilberto Machado
destaca-se que, conquanto não haja prova específica que demonstre o auferimento
por parte destes de valores indevidos, o enriquecimento ilícito neste caso se
encontra implícito com relação ao exorbitante valor que a empresa contratada
recebeu em razão do superfaturamento praticado pelos aludidos demandados, com
base na indevida fórmula de cálculo criada por estes, de modo que igualmente
merece enquadramento a conduta ímproba destes no que dispõe o art. 9º da Lei nº
8.429/92.
Nesse contexto, ainda que não exista uma figura típica nos incisos do art.
9º da LIA que se amolde a aludida situação, resta configurado o enriquecimento
ilícito dos requeridos, mormente da sociedade empresária que recebeu os valores
manifestamente superfaturados da contratação realizada com a Corte Catarinense.
Isso porque as condutas tipificadas aos incisos dos arts. 9º, 10 e 11 da LIA dão conta
apenas de exemplos, não se tratando, portanto, de rol taxativo das condutas
puníveis, senão um rol exemplificativo.
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Fls. 23/32
típicas do art. 9º e art. 10, ambos da Lei nº 8.429/92.
É quase que inexorável ao enriquecimento ilícito a lesão ao Patrimônio
Público, ressalvados as hipóteses em que haja a utilização dos bens ou verbas
pertencentes ao Estado e para que o agente venha a obter lucro ilícito, o Estado
ficará à míngua da utilização destes, conforme entende a doutrina:
Além do dano ao patrimônio público, não raro ocorrerá que os atos de
improbidade enquadrados na tipologia do art. 10 resultem em enriquecimento
ilícito de terceiros, o que tornará aplicável a sanção de perda dos bens ou
valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio destes (art. 12, II). Tratando-se
de vantagem indevida auferida pelo próprio agente público, ter-se-á o
deslocamento da tipificação para uma das figuras do art. 9º da Lei n.
8.429/1992 (GARCIA, op cit. 2013, p. 453).
Nesse viés, a ação que desencadeou o enriquecimento ilícito resultou,
consequentemente, na dilapidação do Patrimônio Público, mormente pelo
pagamento de diversos serviços que não estavam abarcados pelo contrato firmado
entre o Tribunal de Justiça e a empresa demandada, em valor bem acima do
contratado, ou melhor, com valores superfaturados, em razão da criação de uma
fórmula para contagem dos serviços executados.
Impende, novamente, sustentar que o pagamento indevido em favor da
empresa contratada foi no valor de R$ 1.800.936,76 (um milhão oitocentos mil
novecentos e trinta e seis reais e setenta e seis centavos), quando o valor devido de
fato era de R$ 573.877,31 (quinhentos e setenta e três mil, oitocentos e setenta e
sete reais e trinta e um centavos), é inegável, portanto, que o prejuízo aos cofres
públicos alcançou o importe de R$ 1.227.059,45 (um milhão, duzentos e vinte e sete
mil, cinquenta e nove reais e quarenta e cinco centavos).
Isto é, não resta dúvida quanto à dilapidação do Patrimônio Público, diante
das vantagens patrimoniais que foram indevidamente auferidas pela sociedade
empresária requerida a partir da manipulação dos relatórios com
superdimensionamento dos trabalhos realizados e com a inserção indevida de dados
relativos à produtividade que acarretaram em um escancarado superfaturamento dos
valores pagos em razão dos supostos serviços prestados.
Desse modo, os atos foram praticados com o propósito de resultar na
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Fls. 24/32
subtração do patrimônio público, tendo em vista que os réus incorporaram
ilicitamente – por meio de pagamento a empresa contratada de valores
manifestamente superfaturados –, ao seu patrimônio quantia que deveria ter sido
convertida em serviços públicos, o que enseja, portanto, o ressarcimento destes aos
cofres públicos.
3.3. Da lesão aos princípios da Administração Pública
O Art. 37, caput, da Constituição Federal instituiu em sua redação os
preceitos básicos para a regência da Administração Público em todos os seus
âmbitos visando a boa gestão e o atendimento do melhor interesse público. A fim de
dar efetividade a busca da lisura na Administração e da aplicação do referidos
princípios, a Lei nº 8.429, através do art. 11, tornou possível a penalização daqueles
que atuassem em contrariedade com o dispositivo.
É entendimento doutrinário:
Ante a natureza e a importância dos interesses passíveis de serem lesados
pelo ímprobos, afigura-se louvável a técnica adotada pelos arts. 4º e 11 da
Lei n. 8.429/1992, preceitos em que a violação aos princípios regentes da
atividade estatal, ainda que daí não resulte dano ao erário, consubstanciará
ato de improbidade. Deve-se observar, ainda, que referidos dispositivos da
Lei 8.429/1992 apresentam-se como verdadeiras normas de integração de
eficácia da Constituição da República, pois os princípios por eles tutelados há
muito foram consagrados nesta. [...] A leitura do caput do dispositivo denota
claramente que a improbidade poderá estar consubstanciada com a violação
aos princípios da legalidade e da imparcialidade (rectius: impessoalidade), o
mesmo ocorrendo com a inobservância dos valores da honestidade e a
lealdade as instituições, derivações diretas do princípio da moralidade. A
moralidade, por sua vez, concentra o sumo de todos os valores extraídos dos
princípios regentes da atividade estatal, o que permite fazer com que a
tipologia constante no art. 11 da Lei 8.429/1992 a todos alcança, ainda que
advenham de princípios implícitos no sistema. Evidentemente, o rol de
princípios constantes do art. 1 é meramente exemplificativo, pois não seria
dado ao legislador infraconstitucional restringir ou suprimir aqueles previstos
na Constituição. (GARCIA, 2010, op. cit. p. 457).
De análise pormenorizada das condutas praticadas, de pronto vislumbra-
se a violação dos princípios atinentes à legalidade, por consequência, o da
moralidade, o da eficiência e, subsidiariamente, o da igualdade e o da supremacia do
interesse publico, dentre outros.
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A legalidade restou ofendida a partir do momento em que não foram
observados os ditames legais do Contrato nº 181/2007, desrespeitando as regras
que regem não só a Administração Pública, como os Contratos Administrativos, tanto
na ausência de fiscalização da execução contratual, quanto na inclusão de serviços
não previstos no objeto do certame, bem como a inexecução de atividades previstas
do aludido contrato, modificações estas feitas ao arrepio da legislação vigente.
Nessa mesma toada, os ilícitos praticados pelos requeridos ofenderam,
também, aos principios basilares da Licitação, quais sejam, o princípio da livre
concorrência e do preço justo, dando-se maior valor ao interesse de particulares do
que ao interesse público, restando escancaradamente configurado, também, ofensa
aos princípios constitucionais subsidiários da Administração, quais sejam, o da
igualdade e o da supremacia do interesse público.
Igualmente, a moralidade vê-se afrontada por conta da supressão dos
aludidos princípios e de todas as ilegalidades praticadas no certame, importando,
dessa forma, em uma desvirtuação do conceito de Administração Pública, bem como
uma afronta à sua lisura e o bem geral da população que viu a coisa pública sendo
tratada com tamanho descaso e deslealdade. Não se podendo olvidar a manifesta
ofensa ao princípio da eficiência que tem como desiderato a busca do melhor
resultado com os recursos disponíveis que se viu obstada em decorrência de um
esquema de pagamento de valores exorbitantes e superfaturados à empresa
contratada, restando incontestável a prática de atos de improbidade administrativa
que revelam afronta às proposições norteadoras da Administração Pública, bem
como do zelo para com o erário.
Nesta toada, podemos dizer, inclusive, que os agentes públicos Almir e
Gilberto, ora demandados, violaram o princípio da boa-fé, este que se encontra
positivado no nosso ordenamento jurídico, vinculando, ainda, ao já mencionado
princípio da moralidade administrativa, visto que a boa-fé está pautada na confiança,
lealdade e transparência, elementos que são imprescindíveis à conduta do agente
público no exercício de sua função.
Nesse sentido, o autor Egon Bockmann Moreira, aduz:
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Fls. 26/32
A boa-fé, portanto, impõe a supressão de surpresas, ardis ou armadilhas. A
conduta administrativa deve guiar-se pela estabilidade, transparência e
previsibilidade. Não se permite qualquer possibilidade de engodo – seja ele
direto ou indireto, visando à satisfação de interesse secundário da
Administração. Nem tampouco poderá ser prestigiada juridicamente a
conduta processual de má-fé dos particulares. Ambas as partes (ou
interessados) no processo devem orientar seu comportamento, endo e
extraprocessual, em atenção à boa-fé. Caso comprovada a má-fé, o ato (ou o
pedido) será nulo, por violação à moralidade administrativa (MOREIRA, Egon
Bockmann. Processo Administrativo: Princípios Constitucionais e a Lei
9.784/1999. São Paulo: Editora Malheiros, 2007, p. 116).
Portanto, diante dos ilícitos cometidos pelos demandados, ficou
evidenciado que suas condutas ensejaram atos de improbidade administrativa, bem
como prejuízo de grande monta ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina,
de modo que não há outro instrumento para ver ressarcido o erário e
responsabilizados os agentes ímprobos, senão pela presente ação civil pública,
razão pela qual impõe-se a condenação dos requeridos, solidariamente, ao
ressarcimento da quantia lesada supramencionada, bem como a aplicação das
sanções impostas no artigo 12, incisos I, II e III, da Lei nº 8.429/92.
4. DA MEDIDA LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS
Presentes fundados indícios de responsabilidade, conforme anteriormente
demonstrado, necessária a decretação, liminarmente, inaudita altera pars, da
indisponibilidade dos bens dos responsáveis para assegurar a futura devolução dos
valores referentes aos prejuízos provocados ao erário, através da execução de
diversos atos de improbidade realizados pelos meios descritos.
A indisponibilidade de bens visa garantir que o responsável pelo dano ao
erário não dissipe seus bens, com a intenção de não ressarcir os cofres públicos.
Acerca do tema, Fábio Medina Osório diz tratar-se a indisponibilidade
patrimonial de medida obrigatória "pois traduz consequência jurídica do
processamento da ação, forte no art. 37, §4º, da Constituição Federal". Afirma, ainda,
que esperar a dilapidação patrimonial "é equivalente a autorizar tal ato, na medida
em que o ajuizamento de ação de sequestro assumiria dimensão de 'justiça tardia', o
que poderia se equiparar a denegação de justiça". (Improbidade Administrativa. Porto
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Fls. 27/32
Alegre: Síntese, 1997, p. 163)
A Constituição Federal dispõe:
Art. 37 [...]
4§º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo
da ação penal cabível.
A Lei 8.429/92 prevê em seu artigo 7º:
Art. 7º. Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou
ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade administrativa responsável
pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos
bens dos indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo
recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou
sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.
A concessão liminar é indiscutivelmente aceita pelo art. 12, caput, da Lei
da Ação Civil Pública, onde é previsto que "poderá o juiz conceder mandado liminar,
com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo." A medida tem por
escopo assegurar a suficiência de bens para fins indenizatórios. Os fundamentos
legais apontados tornam despicienda a evocação da tutela liminar.
Nada impede que o pedido liminar seja feito no corpo da ação principal. A
lição de Rogério Pacheco Alves reforça o entendimento:
No campo da tutela de interesses difusos, tomando partido sobre a questão,
permite o art. 12 da Lei n. 7.347/85 ao juiz que conceda 'mandado liminar,
com ou sem justificação prévia' nos próprios autos da ação principal, regra
que merece aplausos por sua economicidade e informalidade, corolários do
acesso à justiça. (Improbidade Administrativa, Lumem Juris, RJ, 2010, p.
934).
Os requisitos essenciais à indisponibilidade de bens decorrentes de ato de
improbidade administrativa estão patentes. Fábio Medina Osório sustenta que "o
periculum in mora emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade
dos fatos, do montante, em tese, dos prejuízos causados ao erário" (Improbidade
Administrativa, 2008, p. 751).
O próprio legislador dispensou a demonstração do perigo de dano,
conforme se constata da redação do art. 37, §4º, da CF, e do art. 7º, da Lei