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Baixar para ler offline
Túlio Carapiá,
formado na Escola de
Belas Artes da UFBa,
é designer gráfico e
artista visual, já ilustrou
dezenas de livros, revistas,
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além de ter suas obras
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kaintsaritsumpalu carregava o filho Ata-
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Essa é uma das histórias que Atapucha Waurá
escutousobreamãe,daépocaemqueelanãopreci-
savadosufixorespeitoso–tsumpalu,reservadoàs
mulheresWaujaquemorreram.ComooAliásmos-
trou no domingo passado, Atapucha e mais dois
Wauja – Kuratu Waurá e Tukupe Waurá – visita-
riam,nessasemana,oacervodoMuseudeArqueo-
logia e Etnologia (MAE) da Universidade de São
Paulo (USP) para tentar encontrar uma foto de
Akaintsaritsumpalu.Atapuchanãolembravaoros-
todamãe,quemorreuquandoeleerabebê,eespe-
ravaqueoetnógrafoHaraldSchultz(1909-1966)a
tivesseregistradoemsuaexpediçãoaoAltoXingu.
Na madrugada, antes de visitar o MAE, Atapu-
chateveumsonhoemqueumapessoao apoiava
na busca pela foto. Horas de-
pois, após ver muitas imagens,
Kuratu,de61anos,reconheceu
Akaintsaritsumpalu. Ela é a
quinta da direita para a esquer-
daemumafotonaqualelacan-
ta ao lado de outras Wauja, e
carregaumbebê–opróprioAta-
pucha. Ele finalmente voltou a
ver sua mãe. A espera de mais
de 50 anos havia terminado.
“Comecei a chorar muito. Não
acrediteiqueissoestavaaconte-
cendo comigo. Meu sonho foi
realizado”,diz.“Parecequemi-
nhamãeestavadomeuladona-
quela hora. Fiquei muito emo-
cionado.” De quebra, ele tam-
bémdescobriuadataaproxima-
da de seu nascimento: entre o
fimde1963eocomeçode1964.
A redescoberta de Akaintsa-
ritsumpalu foi só uma das mui-
tas que os três Wauja fizeram
no MAE. Durante as seis horas
que ficaram ali, reconheceram
muitos outros parentes, entre
elesaavódeTukupe,Pulutapatumpalu.“Éacara
daminhamãequandoerabemnovinha.”Antes,a
única imagem que tinham dela estava em uma
ediçãodaNationalGeographicde1966,comprada
no eBay, em que seu rosto não pode ser visto.
SegundoaantropólogaSandraMariaChristia-
ni de la Torre, pesquisadora do acervo do MAE,
osWaujaviramainda peçasdoacervo efotogra-
faram objetos que não são mais confeccionados
para mostrá-los à aldeia. Também levaram có-
pias das fotos que serão vistas por outros an-
ciões para, então, recuperarem o nome de mais
pessoas. “A estada deles aqui foi muito emocio-
nante”, diz Sandra.
Na verdade, as últimas sete semanas têm sido
emocionantes para os Wauja. Entre 5 de setem-
bro e 14 de outubro, Kuratu, Atapucha e Tukupe
estiveramnosEstadosUnidosparaparticipardo
projeto “Recovering Voices”, do instituto Smi-
thsonian.Ainiciativafomentaoregistroeaprote-
çãodelínguaseculturasindígenasameaçadasde
extinção. Além de descrever objetos na língua
wauja, Atapucha procurou sua mãe em imagens
de Schultz que estavam no acervo do Smithso-
nian. A foto que tanto buscou, porém, só encon-
traria no retorno ao Brasil.
NosEUA,osWaujaficaramnacasadaantropó-
loga e pesquisadora do Smithsonian Emilienne
Irelandedeseumarido,PhilTajitsuNash,profes-
sordeEstudosAsiático-AmericanosdaUniversi-
dade de Maryland. Emilienne conhece os Wauja
desde 1981, viveu com eles e fala fluentemente
sua língua. O pai de Atapucha, Yawalatumpa, foi
seu professor e a tratava como uma irmã. Por
isso, Atapucha a chama de tia.
A antropóloga conta que os Wauja ficam tris-
tes pela multidões nas cidades, que desconhe-
cem as relações familiares entre si. Os Wauja
criamlaçosdefamíliamesmosemterelossanguí-
neos,sabemosnomeseashistóriasdeseusante-
passados. Seus ancestrais são muito preciosos
para eles. “Seria terrível para eles verem essas
imagens,no futuro, enão saber quem são aspes-
soasretratadas.É ótimoqueconseguimos evitar
isso”, diz Emilienne.
No entanto, no passado, os Wauja não gosta-
vam de ver fotos e até de pro-
nunciar o nome daqueles que
morreram.Paraasantigasgera-
ções, as imagens e o apego fa-
riamcomqueosespíritosficas-
sem presos na Terra; também
fariammalaosvivos,poisatris-
tezacausadoenças,segundoos
Wauja.Mas,háalgunsanos,co-
meçaram a entender que era
preciso mudar, e que as fotos
são fundamentais para que as
histórias de seus heróis ances-
trais não desapareçam. “Está
bemclaroparamimquenãoda-
va mais para a gente ficar desse
jeito”, diz Tukupe, de 34 anos.
“Nosso conhecimento está
ameaçado. Vou falar para meu
povo para a gente estudar cada
vez mais, para ver se encontra-
mos mais coisas.”
Em São Paulo, os Wauja fo-
ramacompanhadospelosantro-
pólogos Marcelo Fortaleza Flo-
res–queosconhecedesde1996
– e sua mulher, Rafaela Vargas,
queestudaadançadoyamurikuma.SegundoMar-
celo,asimagenstêmumpapeltransformador.“O
próprioencontrodasfotoscomelespreencheum
vaziotremendo.Asfotos,antes,oqueeram?Fotos
de índios em rituais, dançando. Agora, não. São
pessoasreais,comhistóriasreais,conhecidaspelo
grupo indígena que vai dizer em que contexto
aquela imagem foi tirada. De repente essas fotos
voltaramaviver.”
Naquinta-feira,osWaujavoltaramparaoXin-
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bagagem (tesouro exclusivo, já que os trâmites
da USP não permitem, por exemplo, que a foto
seja publicada em um jornal sem autorização de
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desuaprópriacultura”.Tambémdesejamqueas
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BETTY FARIA, atriz, em entrevista a Pedro
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Teje preso. O ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é conduzido por policiais federais ao IML de Curitiba para exame de corpo de delito. Ele foi preso na
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IMAGEM DA SEMANA
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História. Atapucha mostra a foto da mãe, Akaintsaritsumpalu (a quinta
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Após mais de 50 anos, Atapucha
Waurá – do povo Wauja, do
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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 23 DE OUTUBRO DE 2016 Aliás E3

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  • 1. Túlio Carapiá, formado na Escola de Belas Artes da UFBa, é designer gráfico e artista visual, já ilustrou dezenas de livros, revistas, trabalhos publicitários, além de ter suas obras autorais expostas no Brasil e no exteriora “Artistas fazem tudo para tirar uma foto comigo, mas ele não. Ele apertou minha mão e saiu” Daniel Trielli Juliana Ravelli / WASHINGTON A kaintsaritsumpalu carregava o filho Ata- puchaenquantocantavacomoutrasWau- ja durante o yamurikuma. Nesse festival, asmulherestomamopapelqueoshomensgeral- mente têm nos festejos do Alto Xingu: dançam, cantamecompetememlutas.Eraomeiode1964 eAkaintsaritsumpalu,segundaesposadeYawala- tumpa, mostrava o bom humor pelo qual era co- nhecida. Momentos antes de as integrantes de outras aldeias chegarem para o yamurikuma, ela fazia a piada: “Vamos lá, vamos treinar (para as lutas)”,sabendoqueotreino,naverdade,erafei- to com muita antecedência; àquela altura, não dava mais para se preparar. 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Não acrediteiqueissoestavaaconte- cendo comigo. Meu sonho foi realizado”,diz.“Parecequemi- nhamãeestavadomeuladona- quela hora. Fiquei muito emo- cionado.” De quebra, ele tam- bémdescobriuadataaproxima- da de seu nascimento: entre o fimde1963eocomeçode1964. A redescoberta de Akaintsa- ritsumpalu foi só uma das mui- tas que os três Wauja fizeram no MAE. Durante as seis horas que ficaram ali, reconheceram muitos outros parentes, entre elesaavódeTukupe,Pulutapatumpalu.“Éacara daminhamãequandoerabemnovinha.”Antes,a única imagem que tinham dela estava em uma ediçãodaNationalGeographicde1966,comprada no eBay, em que seu rosto não pode ser visto. SegundoaantropólogaSandraMariaChristia- ni de la Torre, pesquisadora do acervo do MAE, osWaujaviramainda peçasdoacervo efotogra- faram objetos que não são mais confeccionados para mostrá-los à aldeia. 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O pai de Atapucha, Yawalatumpa, foi seu professor e a tratava como uma irmã. Por isso, Atapucha a chama de tia. A antropóloga conta que os Wauja ficam tris- tes pela multidões nas cidades, que desconhe- cem as relações familiares entre si. Os Wauja criamlaçosdefamíliamesmosemterelossanguí- neos,sabemosnomeseashistóriasdeseusante- passados. Seus ancestrais são muito preciosos para eles. “Seria terrível para eles verem essas imagens,no futuro, enão saber quem são aspes- soasretratadas.É ótimoqueconseguimos evitar isso”, diz Emilienne. No entanto, no passado, os Wauja não gosta- vam de ver fotos e até de pro- nunciar o nome daqueles que morreram.Paraasantigasgera- ções, as imagens e o apego fa- riamcomqueosespíritosficas- sem presos na Terra; também fariammalaosvivos,poisatris- tezacausadoenças,segundoos Wauja.Mas,háalgunsanos,co- meçaram a entender que era preciso mudar, e que as fotos são fundamentais para que as histórias de seus heróis ances- trais não desapareçam. “Está bemclaroparamimquenãoda- va mais para a gente ficar desse jeito”, diz Tukupe, de 34 anos. “Nosso conhecimento está ameaçado. Vou falar para meu povo para a gente estudar cada vez mais, para ver se encontra- mos mais coisas.” Em São Paulo, os Wauja fo- ramacompanhadospelosantro- pólogos Marcelo Fortaleza Flo- res–queosconhecedesde1996 – e sua mulher, Rafaela Vargas, queestudaadançadoyamurikuma.SegundoMar- celo,asimagenstêmumpapeltransformador.“O próprioencontrodasfotoscomelespreencheum vaziotremendo.Asfotos,antes,oqueeram?Fotos de índios em rituais, dançando. Agora, não. São pessoasreais,comhistóriasreais,conhecidaspelo grupo indígena que vai dizer em que contexto aquela imagem foi tirada. De repente essas fotos voltaramaviver.” Naquinta-feira,osWaujavoltaramparaoXin- gu,comotesourodafotodemãedeAtapuchana bagagem (tesouro exclusivo, já que os trâmites da USP não permitem, por exemplo, que a foto seja publicada em um jornal sem autorização de um conselho). Agora, sonham com um museu próprio. “Um museu força a cultura a olhar para si mesma. É um reconhecimento dessa cultura como parte de uma coisa maior”, diz Nash. Co- modisseEmilienne:“Elesqueremsercuradores desuaprópriacultura”.Tambémdesejamqueas portas dos museus do homem branco permane- çam sempre abertas. “Peço isso no Brasil não só para os Wauja, mas para todos os povos indíge- nas. Acredito que ainda existam pessoas mais velhas, com 80, 100 anos que podem identificar objetos que estão lá”, diz Tukupe. Para ele, não hácomoprotegeraculturaindígenasemapartici- pação direta dos donos dessa história: os índios. BETTY FARIA, atriz, em entrevista a Pedro Bial, questionando as incoerências entre drogas legalizadas e permitidas no Brasil Teje preso. O ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, é conduzido por policiais federais ao IML de Curitiba para exame de corpo de delito. Ele foi preso na quinta-feira pela Lava Jato e levado à carceragem da PF em Curitiba. Acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução de divisas, Cunha teve R$ 220,7 milhões bloqueados, estimativa de prejuízo ao erário. A prisão deixa o governo Michel Temer e o Congresso apreensivos, por receio do que ele possa revelar “Maconha não vicia, o que vicia é Marlboro vermelho” OUTUBRO TUKUPE WAURÁ 20 HEDESON ALVES/EFE BARACK OBAMA, presidente dos EUA, sobre o dia em que encontrou o cantor Bob Dylan, agora Nobel de Literatura, depois de um show. “Mas é o máximo que você espera de Bob Dylan, certo?” IMAGEM DA SEMANA PASSADO COM NOME História. Atapucha mostra a foto da mãe, Akaintsaritsumpalu (a quinta da direita para a esquerda), que morreu quando ele era bebê Após mais de 50 anos, Atapucha Waurá – do povo Wauja, do Alto Xingu – conhece o rosto de sua mãe em uma fotografia guardada no acervo do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 23 DE OUTUBRO DE 2016 Aliás E3