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* Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Professora de Direito Cons-
titucional, Direito Processual Administrativo e Direito Processual Cons-
titucional da Faculdade de Direito da Universidade Metodista de São
Paulo. Professora de Direito Administrativo do Curso de Direito do
UNISAL. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC
Artigo entregue em abril de 2008. mcristinateixeira@uol.com.br
RESUMO
A educação, direito fundamental social, tem sido obje-
to de disciplina de todas as Constituições brasileiras.
O objetivo deste trabalho é descrever a repartição de
competências relativas ao tema. Para a adequada ex-
posição, é necessário analisar o contexto no qual tem
se desenvolvido a educação no Brasil, de modo que a
reflexão seja realizada considerando os aspectos his-
tóricos, econômicos e sociais de cada período.
Palavras-chave: Educação; Constituição; direito fun-
damental; repartição de competências
ABSTRACT
The education, social basic right, have been object of
discipline of all the Brazilian Constitutions. The
objective of this work is to describe the distribution of
relative abilities to the subject. For the adjusted
exposition, it is necessary to describe the context in
which it has developed the education in Brazil, in way
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS
CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
Maria Cristina Teixeira*
147
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
that the reflection is carried through considering the
historical, economic and social aspects of each period.
Key-words: Education; Constitution; social basic right;
distribution of abilities
INTRODUÇÃO
O direito à educação é um direito fundamental que se
inclui entre os direitos sociais previstos na Constituição, no
artigo 6º, segundo o qual “são direitos sociais a educação, a
saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previ-
dência social, a proteção à maternidade e à infância, a assis-
tência aos desamparados”. Sua disciplina expressa se encon-
tra nos artigos 205 a 214. Está vinculado ao princípio da dig-
nidade da pessoa humana que, conforme o artigo 1º, inciso
III da Constituição, é fundamento do Estado brasileiro.
Nesse sentido, pode-se dizer que de sua adequada presta-
ção decorre a realização dos objetivos fundamentais do País,
estabelecidos no artigo 3º da Lei Maior, quais sejam, a cons-
trução de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação
da pobreza e da marginalidade, a redução das desigualdades
sociais e regionais e a promoção do bem comum.
1. A CONSTITUIÇÃO DE 1824
O contexto histórico, político e social da época em que
foi outorgada a Constituição de 1824 era o da ascensão do
liberalismo e do constitucionalismo no ideário econômico,
político e jurídico, e do positivismo nos campos filosófico e
científico. Essas correntes foram representadas no cenário
nacional pelo Partido Liberal Brasileiro que, conforme Antonio
Chizzoti (2001:32), “professava um ideário anticolonialista,
apoiado em um liberalismo difuso”, que incluía em sua base
desde comerciantes e proprietários de províncias até nativos
dos centros urbanos que estavam em situação precária, em
face dos favores prestados à Corte no Rio de Janeiro, bem
como artesãos, oficiais de serviços autorizados e intelectuais
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
148
influenciados pelo ideário francês. Sua base teórica era o
constitucionalismo europeu, consubstanciado na obra de
Benjamin Constant denominada Princípios de política aplicá-
veis a todos os governos representativos.
Para fazer oposição a esse grupo, foi criado o partido
denominado Português ou Idealista, formado, segundo o autor
(2001:32), por “reinóis, militares e burocratas, comerciantes
e prepostos do absolutismo luso”, os quais defendiam o regi-
me colonial pelas razões mais diversas, como a manutenção
de usos, tradições, direitos, leis e regulamentos anteriores à
proclamação da Independência. Sua base era a Revolução
Liberal do Porto, de 1820, e a submissão da Corte Portuguesa
às normas dali oriundas.
A educação foi tratada no discurso inaugural do Impera-
dor, na abertura da Assembléia Constituinte, ocasião em que
afirmou ser necessária uma legislação especial que discipli-
nasse a matéria. Para Chizzoti (2001:40-41), a Constituinte
procurou dar unicidade à instrução pública, tendo sido apre-
sentado um “sistematizado programa de instrução pública
[...], com seqüências de séries, organização curricular e ob-
jetivos definidos de cada grau”. Não foi possível fixar diretri-
zes fundamentais para a educação, uma vez que as discus-
sões eram continuamente desviadas para temas de menor
importância. A questão da instrução ou ensino fundamental
foi relegada ao segundo plano e superada por aquela relativa
à criação das universidades.
Com a dissolução da Assembléia Constituinte, os realis-
tas obtiveram uma vitória que dividiu os liberais, até então
defensores da monarquia. Foi, então, nomeada uma comissão
especial para redigir o texto constitucional e, em 17 de de-
zembro de 1823, o Imperador enviou ao Parlamento um docu-
mento denominado “Bases da Nova Constituição”. Em 25 de
março de 1824, uma lei determinava a obediência à Carta
Constitucional do Brasil.
149
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
O texto constitucional disciplinou a educação no artigo
179, XXXII e XXXIII. Foi estabelecida a garantia do ensino pri-
mário a todos os cidadãos e sua realização, preferencialmente,
pela família e pela Igreja, bem como a criação de colégios e
universidades para o ensino de Ciências, Artes e Letras. Não
havia, nesse momento, a atribuição de competências específi-
cas às províncias para sua efetivação. A esse respeito, José
Antonio Pimenta Bueno (2002:521), o Marquês de São Vicente,
defendia o controle e a contribuição financeira do governo cen-
tral com a educação básica, para que fosse efetivamente criada
uma “educação nacional homogênea e uniforme”.
Em 1828, foi promulgada uma lei que descentralizou a
competência para o ensino fundamental, determinando a
criação, em cada cidade e vila do Império, de escolas de pri-
meiras letras e, nas cidades e vilas mais populosas, de esco-
las de meninas, com a fiscalização sob a responsabilidade das
Câmaras Municipais.
O progresso que se pretendia obter com a atribuição da
competência relativa ao ensino fundamental às províncias foi
questionado. Para Newton Sucupira (2001:59), a lei não atin-
giu seu objetivo em face do pequeno número de professores
atraído pelo projeto, pela remuneração irrisória atribuída para
a realização do trabalho. Relatou ainda o autor (2001:59) que,
em 1848, foi elaborado um relatório a respeito do assunto pelo
Visconde de Macaé, ministro do Império, no qual foram
indicadas como principais causas para a situação em que se
encontrava a educação: a falta de qualificação dos professores;
o descontentamento docente em razão dos baixos salários
recebidos; a precariedade das instalações escolares; e a de-
ficiência dos métodos aplicados ao ensino.
Em 1834 entrou em vigor o Ato Adicional nº 16, incorpo-
rado à Constituição, que determinou, também, a descen-
tralização da educação de segundo grau. De acordo com o
referido Ato, tornou-se competência das Assembléias das
Províncias, nos moldes do artigo 10, § 2º, legislar e promover
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
150
a instrução pública. Não estão compreendidas aí as faculda-
des de medicina, os cursos jurídicos, as academias que já
existiam na época. Esse ato normativo repercutiu de forma
nociva para o desenvolvimento da educação básica, uma vez
que a maioria dos parlamentares entendia que se tratava de
competência concorrente. Tal compreensão foi alterada duran-
te o reinado de dom Pedro II, ainda que houvesse opiniões
divergentes de ministros e juristas (Sucupira, 2001:65).
De acordo com Maria Lúcia de Arruda Aranha (2000:152),
a reforma impediu a “unicidade orgânica do sistema educaci-
onal”, na medida em que atribuiu a pessoas políticas distintas
a responsabilidade pela disciplina e manutenção do ensino
superior e fundamental. Na época, a principal questão jurídica
que se discutia, em relação à educação, dizia respeito à defi-
nição da atribuição de competências entre as pessoas políticas.
O caráter elitista da educação brasileira foi reforçado
nessa época com a preferência que continua sendo atribuída
ao ensino superior, cujo acesso era possibilitado apenas aos
membros da nobreza e da burguesia. Em 1827, foram criados
em São Paulo e Recife cursos jurídicos, transformados em
faculdade em 1854.
Em relação ao ensino fundamental e ao secundário, con-
vém esclarecer que não foi dada a eles ênfase idêntica à que
vinham merecendo em outros países. No secundário, não
havia um currículo próprio, e a escolha das matérias minis-
tradas era feita aleatoriamente em cada estabelecimento,
bem como não existia a exigência do término de um curso
para o início de outro. Contribuiu para essa estrutura precá-
ria a falta de recursos, que resultava da tributação ineficiente
e que se traduziu no pequeno número de estabelecimentos e
na baixa remuneração dos professores.
No ensino fundamental a situação não era melhor: o
modelo econômico brasileiro, agrário e latifundiário, que
sofreu pequenas alterações em face do comércio e da indús-
tria no final do século XIX, de acordo com Aranha (2000:155),
151
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
não favoreceu seu desenvolvimento. A educação dos filhos
das classes mais abastadas era realizada em casa, por meio
de preceptores. Nesse período foi implantado o método de
ensino mútuo, que perdurou entre 1823 e 1838, com resul-
tados insatisfatórios.
Em face do entendimento de que a descentralização ha-
via contribuído para a desorganização do sistema educacional,
a partir de 1870 a interferência do governo central na maté-
ria educacional atribuída às províncias voltou a ser defendida
como “medida necessária, indispensável ao desenvolvimento
da instrução pública”, de acordo com Sucupira (2001:63).
Para Anísio Teixeira,
A dualidade da educação formal traduzia a dualidade da soci-
edade brasileira. O sistema provincial e, mais tarde, estadual
das escolas primárias e vocacionais para o “povo”, e do ensino
acadêmico secundário e das escolas superiores para a “elite”.
Os dois sistemas eram independentes, não dando um passa-
gem ao outro. Como a sociedade continuava escravocrata, o
povo seria o dos homens livres, porque os escravos eram o
chão da sociedade e não chegavam a constituir classes.
(TEIXEIRA, 1969:293)
Assim, podemos dizer que durante o período de vigência
da Constituição de 1824 não existiu, sob o aspecto constituci-
onal, uma atribuição clara e precisa de competências entre as
pessoas políticas para seu desenvolvimento. O que havia era
a disciplina da matéria por meio da legislação ordinária, com
a conseqüente descentralização, que não trouxe benefícios
para o progresso da educação no País, pois privilegiou o ensino
superior em detrimento da criação de políticas que cuidassem
da implantação do ensino fundamental público e gratuito, es-
sencial para a formação da maior parte da população.
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
152
2. A CONSTITUIÇÃO DE 1891
Com a proclamação da República, iniciou-se uma nova
fase para o Direito Constitucional Brasileiro. O País adotou
nova forma de governo e de estado, tornando-se uma Repúbli-
ca Federativa. Antes da promulgação da Constituição de
1891, alguns atos normativos trataram, de forma direta ou
indireta, da educação. Entre eles, podemos mencionar:
• Decreto nº 6, de 19/11/1889: extinguiu o voto
censitário e impôs como condição para o exercício da
cidadania a alfabetização dos indivíduos;
• Decreto nº 7, de 20/11/1889: atribuiu aos estados à
instrução pública em todos os graus;
• Aviso nº 17, de 24/04/1890: tornou laico o currículo do
Instituto Nacional, ex-Pedro II;
• Criação da Secretaria de Instrução Pública, Correios e
Telégrafos, em 19/04/1890: embora esse órgão tenha
sido extinto em 30/10/1891, várias iniciativas reali-
zadas durante o período merecem atenção: criação do
Pedagogium, órgão responsável pela reforma da instru-
ção pública primária e secundária no Distrito Federal,
bem como do ensino superior, que possibilitou o sur-
gimento de faculdades livres e oficiais, bem como do
Conselho de Instrução Superior no Distrito Federal.
Conforme salientou Carlos Roberto Jamil Cury (2001:73),
“estas iniciativas mostram ações indicadoras de descen-
tralização, embora com direção oficial (não obrigatória)
advinda do regulamento do Pedro II e de outros institutos
oficiais da União e do Distrito Federal”.
A educação, de acordo com o autor (2001:75), foi objeto de
debates em várias ocasiões de modo direto e indireto. Em
algumas o tema assumiu papel fundamental, entre as quais
podem ser citadas:
153
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
• a organização do ensino, no que se refere à repartição
de competência entre os entes federados e a possibili-
dade da atribuição de sua realização a pessoas de di-
reito privado;
• a laicidade: a determinação de uma postura não-reli-
giosa da escola pública (do que não se deve deduzir
qualquer tipo de defesa da irreligião);
• a obrigatoriedade e gratuidade da instrução pública pri-
mária: omissão explicável, ao menos no âmbito das
falas sobre a gratuidade, pelo princípio federativo.
O direito à educação foi disciplinado nos artigos 35 e 72
da Constituição de 1891. O tratamento dado ao tema foi modi-
ficado, principalmente no que se refere à descentralização e
concentração das atividades educacionais da União e dos es-
tados. Ficou estabelecida a competência do Congresso para “o
desenvolvimento das letras, artes e ciências”, bem como para
a criação de estabelecimento de ensino superior e secundário
nos estados e para prover a instrução secundária no Distrito
Federal. Também, estabeleceu-se a separação entre Estado e
Igreja no que se refere à educação, uma vez que o ensino
ministrado nos estabelecimentos oficiais era laico.
Para Alberto Venâncio Filho,
Da análise sistemática que se faça do texto constitucional,
depreender-se-á que, por omissão, uma vez que os poderes
remanescentes pertencem aos Estados, a instrução primária
será de responsabilidade deles. A interpretação sistemática dos
incisos 3 e 4 do artigo 35 dispõe que cabe ao Congresso Naci-
onal, em caráter não exclusivo, criar instituições de ensino
superior e secundário nos Estados e promover a instrução
secundária no Distrito Federal. (VENÂNCIO FILHO, 2001:114)
Em relação ao tratamento dispensado à educação no iní-
cio da República, ensina Anísio Teixeira que
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
154
Com efeito, apesar de uma pregação, a que não faltou eloqüência
e brilho, a República não logrou ampliar consideravelmente as
oportunidades educativas. A situação, após a Primeira Guerra
Mundial, apresentava-se deficiente quanto ao ensino primário
e, em relação ao ensino médio, com a dualidade dos sistemas
educacionais, poucas oportunidades oferecia para a ascensão
social. O sistema era adequado à estagnação social necessária
à manutenção dos privilégios existentes. (TEIXEIRA, 1969:295)
Quanto à atribuição de competências às pessoas políticas,
em matéria educacional assevera Teixeira que,
Não constituía, assim, uma simples divisão de trabalho ou
de atribuições entre os Estados e a União, o que se confirma
pelo fato de, voluntariamente, tanto a União ministrar ensino
médio vocacional, quanto os Estados ministrarem ensino
acadêmico secundário e superior. A dualidade refletia a orga-
nização real da sociedade brasileira e representava um dos
mais ricos exemplos da tese de que a educação não é proble-
ma abstrato, cujos fins e objetivos se discutem abstratamen-
te, mas problema concreto de manifesta intencionalidade,
sendo sua distribuição em quantidade e seu conteúdo em
qualidade determinados pela estrutura e organização da so-
ciedade. (TEIXEIRA, 1969:296)
Entre 1925 e 1926, foi realizada uma revisão constituci-
onal, finalizada em 7 de setembro daquele ano. Em relação à
educação, podemos destacar a discussão a respeito do dever
do Estado de oferecer ensino a todos, especialmente a instru-
ção primária. Encerrados os trabalhos, de acordo com Cury,
ficou estabelecido que:
À União caberia centralizar a instrução pública mediante a
“escola única”. Dela – dever do Estado e direito do cidadão –
emergiria a coesão nacional, o caráter nacional, patrocinados
155
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
pela orientação também fornecida pela União. Em termos sim-
ples, a unidade nacional é resultante de uma unidade peda-
gógica coordenada pela União. [...] A Revisão de 1926 antecipa
em oito anos a concepção da educação como direito social pelo
qual o Estado dá uma resposta que não é a da “outorga”, às
pressões de vários movimentos civis, entre os quais as pres-
sões do operariado. (CURY, 2001:101)
Assim, podemos concluir que a Constituição de 1891
atribuiu competência em matéria educacional às pessoas
políticas, dando um passo, ainda que insuficiente, para a
sistematização da matéria e a melhora das condições em
que era desenvolvida a educação no País.
3. A CONSTITUIÇÃO DE 1934
A Constituinte que deu origem à nova Carta Magna
afastou-se do ideário liberal e se filiou aos princípios das
Constituições Mexicana (1917) e Alemã (1919), que traziam
disposições relativas aos direitos sociais. Embora, conforme
preleciona Marlos Bessa Mendes da Rocha (2001:118), a edu-
cação tenha sido objeto de renovação, “houve a manutenção
de um vetor tradicional, próprio da estruturação sociopolítica
da Velha República”. Para o autor (2001:122), cinco questões
relativas à educação foram objeto de discussão nessa oportu-
nidade: “a participação da União em todos os níveis de ensi-
no; o direito à educação; a ação supletiva da União aos Esta-
dos e municípios; a aplicação de recursos públicos em educa-
ção; o ensino religioso.”
A Constituição disciplinou o direito à educação no artigo
5º, XVI, e 148 a 158. O artigo 149 o caracterizou como direito
subjetivo público:
[...] direito de todos e deve ser ministrada pela família e os
poderes públicos, cumprindo a estes proporcionar o acesso a
brasileiros e estrangeiros domiciliados no país, de modo que
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
156
possibilite o desenvolvimento eficiente de valores da vida
moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito bra-
sileiro a consciência da solidariedade humana.
A competência de fixar diretrizes para a educação naci-
onal passou a ser exercida pelo governo federal, princípio que
se manteve presente em todos os textos constitucionais des-
de então. A difusão da instrução pública, em todos os graus,
tornou-se atribuição concorrente da União e Estados.
Foi trazida para o texto constitucional a previsão da exis-
tência do Conselho Federal de Educação que, segundo José
Silvério Baía Horta (2001:139), foi instituído na reforma educa-
cional de 1931. Na Constituição de 1934, esse órgão assumiu
forma diversa, com a atribuição de elaborar o Plano Nacional de
Educação, o qual deveria ser aprovado pelo Poder Legislativo.
No que se refere à gratuidade do ensino primário, de
acordo com o Texto Constitucional, fora dos centros escolares
sua prestação tornou-se dever das empresas industriais ou
agrícolas que contassem com mais de cinqüenta trabalhado-
res, sendo requisito que existissem, entre eles e seus filhos,
mais de dez analfabetos.
Em relação aos recursos destinados a essa finalidade, foi
fixada pela primeira vez a aplicação de receitas de cada ente
da Federação para sua implementação, incluindo-se aqui os
municípios. Estados e Distrito Federal aplicariam, pelo menos,
20% da renda resultante dos impostos na manutenção e de-
senvolvimento dos sistemas educativos. Os municípios e a
União direcionariam, pelo menos, 10% da renda resultante
dos impostos na manutenção e desenvolvimento de educação.
A Constituição previu, também, a formação de fundos de
educação com a participação da União, estados, Distrito Fe-
deral e municípios, cujos valores deveriam ser utilizados em
obras educativas previstas em lei, bem como para o auxílio de
alunos necessitados, nos termos do artigo 157. Finalmente,
garantiu a liberdade de cátedra e a realização de concurso
157
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
público de provas e títulos para provimento de cargos no
magistério oficial.
Podemos verificar que a Constituição de 1934 promoveu
avanços significativos no que se refere à melhoria na quali-
dade da prestação da atividade educacional pelo Estado, uma
vez que destinou recursos dos orçamentos das pessoas políti-
cas para sua realização, bem como para o auxílio daqueles
que não possuíam condições de freqüentar o ensino, mesmo
nos estabelecimentos oficiais.
4. A CONSTITUIÇÃO DE 1937
A Constituição do Estado Novo disciplinou a matéria nos
artigos 15, IX, 16, XXIV, e 124 a 134. Estabeleceu como com-
petência privativa da União fixar as diretrizes, bases e qua-
dros da educação nacional, bem como para a formação física,
intelectual e moral de crianças e jovens, nos artigos 16, XXIV
e 15, IX, respectivamente.
Da leitura do artigo 129 verifica-se a existência de dis-
tinção entre as escolas destinadas à elite e aquelas voltadas
à população menos favorecida. Estabelecia o referido artigo:
À infância e à juventude, a que faltarem os recursos neces-
sários à educação em instituições particulares, é dever da
Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela funda-
ção de instituições públicas de ensino em todos os seus
graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às
suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais. O ensino
pré-vocacional profissional destinado às classes menos
favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever do
Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando
institutos de ensino profissional e subsidiando os de inicia-
tiva dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associ-
ações particulares e profissionais.
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
158
Foi mantida a gratuidade do ensino do ensino primário e
considerada obrigatória a educação física, o ensino cívico e
os trabalhos manuais, nos moldes do artigo 131, bem como
tornado facultativo o ensino religioso.
5. A CONSTITUIÇÃO DE 1946
De acordo com Romualdo Portela de Oliveira (2001:165), a
Constituinte de 1946 refletiu o momento histórico e social
vivenciados pelo mundo e pelo País. Terminada a Segunda
Guerra Mundial, assinados os acordos de Teerã, Yalta e
Postdam, bem como realizados os julgamentos de Nuremberg,
ficaram delimitadas as áreas de influência americana e sovi-
ética em nível internacional. No cenário nacional, 1945 e
1946 foram anos marcados por um grande número de greves,
para as quais contribuíram várias categorias, entre elas ban-
cários e portuários, o que contrariava as orientações do Par-
tido Trabalhista do Brasil (PTB) e do Partido Comunista (PC).
Ainda conforme o autor (2001:166), nos debates consti-
tuintes a respeito da educação, “o ponto mais polêmico foi o
do ensino religioso, de matrícula facultativa nos estabeleci-
mentos oficiais, que extrapola o âmbito educacional e se in-
sere na relação Estado – Igreja Católica”. Duas espécies de
argumentos fundamentaram a oposição ao texto. A primeira
referia-se à separação feita entre Igreja e Estado pela Repú-
blica, cujos defensores entendiam que a volta do ensino
religioso seria um retrocesso em face do lema republicano
“Igreja Livre num Estado Livre”. A segunda corrente, certa
da aprovação do dispositivo, centrava suas atividades para
tornar difícil sua implantação.
Entretanto, bastante próxima dessa questão estava outra
polêmica, também enfrentada pelos constituintes de 1934 e
que dizia respeito à titularidade do dever de educar, cujos
sujeitos continuavam sendo a família e o Estado, e sua loca-
lização no texto constitucional. Por ter se estabelecido que
isso competia ao Estado e à família, os deputados dividiram-
159
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
se entre aqueles que entendiam que o assunto deveria ser
mantido no capítulo relativo à família e os que postulavam
sua colocação no capítulo destinado à educação (2001:178).
Também foi discutida a gratuidade do ensino, e o texto,
de acordo com Oliveira,
Recuperado parte da formulação de 1934, garantindo-a para
todos no ensino primário, propondo a “tendência” à gratuidade
nos demais níveis, mas apenas para aqueles os que provarem
insuficiência de recursos, sendo, portanto, menos ampla que
a de 1934. (OLIVEIRA, 2001:189)
No que diz respeito ao financiamento da educação, foram
discutidas duas propostas centrais: a primeira, que referia-se
à criação de um imposto específico destinado a seu custeio; e
a segunda, relativa à destinação de recursos para sua realiza-
ção. Constou do texto final a última: foi estabelecido que as
pessoas políticas investiriam a renda obtida da arrecadação de
impostos, no percentual de pelo menos 10% para a União e
20% para estados, Distrito Federal e municípios (2001:184).
Outro aspecto que suscitou debates acalorados tratava da
responsabilidade das pessoas políticas em relação à educação.
De acordo com Oliveira (2001:184), havia três posições predo-
minantes: a primeira, que entendia que o papel fundamental
em relação à educação devia ser desempenhado pelo municí-
pio, “como forma mais próxima de colocar o ensino totalmente
nas mãos dos particulares”; a segunda, segundo a qual cabia
à União competência para legislar sobre educação, restringin-
do bastante o papel das demais pessoas políticas; e a última,
que advogava pela responsabilidade dos estados para a realiza-
ção do ensino primário e médio. Prevaleceu a possibilidade de
estados e União se encarregarem do ensino primário, facultan-
do-o aos municípios, desde que estes não constituíssem siste-
ma autônomo em relação ao respectivo estado.
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
160
No texto aprovado e promulgado em setembro de 1946, o
direito à educação foi disciplinado nos artigos 5º, XV, d, e 166
a 175. Novamente, nos moldes da Constituição de 1934, a
educação continuou caracterizada como direito subjetivo
público. A União manteve a competência para legislar sobre
as diretrizes e bases da educação nacional, facultando aos
estados legislarem em caráter complementar.
A Carta Magna estabeleceu, no artigo 168, os princípios
que deveriam ser obedecidos pela legislação, dentre eles: o
ensino primário obrigatório e em língua nacional; o ensino
oficial ulterior para aqueles que provassem insuficiência de
recursos, bem como a manutenção de ensino primário pelas
empresas industriais, comerciais e agrícolas com mais de cem
trabalhadores; e exigência de concurso de provas e títulos para
as cátedras do ensino secundário oficial, bem como do superi-
or, oficial ou livre. Também foram garantidas a liberdade de
cátedra e a vitaliciedade aos professores concursados.
No que se refere aos recursos destinados à manutenção
e desenvolvimento do ensino, estabeleceu o artigo 169 daquele
texto que a União deveria aplicar pelo menos 10% da renda
resultante dos impostos nessa atividade, e os estados, Distrito
Federal e municípios 20%. Finalmente, dividiu o sistema de
ensino em dois: federal e dos territórios, organizado pela
União, nos termos do artigo 170; e dos estados e Distrito Fede-
ral. Ambos deveriam possuir serviços de assistência educaci-
onal para o atendimento da clientela carente (artigo 172).
De acordo com Edivaldo M. Boaventura, com essa Carta
Começa o ciclo das Leis de Diretrizes e Bases (...) que permi-
tiu a descentralização da educação da esfera federal para a
estadual, com a institucionalização dos sistemas de educação
e recriação dos Conselhos de Educação com funções nor-
mativas. (BOAVENTURA, 2001:196)
161
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
6. A CONSTITUIÇÃO DE 1967
Essa Constituição disciplinou a matéria nos artigos 8º,
XVI, XVII, q e § 2º, e 167, § 4º, e 168 a 172. O artigo 168
estabeleceu os princípios da educação e da legislação de
ensino, acrescentando, com relação à primeira, a unidade
nacional e a solidariedade humana.
Não foram fixados percentuais da receita tributária para
aplicação obrigatória e estabeleceu-se, ainda, que a
gratuidade do ensino ulterior ao primário seria substituída,
sempre que possível, pela concessão de bolsas de estudo, cujo
reembolso seria exigido no caso do ensino superior. A cátedra
continuou livre e, no caso do ensino oficial, seu acesso se
manteve subordinado a concurso público de provas e títulos.
Foi estabelecida para empresas comerciais, industriais e
agrícolas a obrigatoriedade de manutenção de ensino primário
gratuito aos empregados e filhos, bem como, no caso das duas
primeiras, o oferecimento de cursos de aprendizagem aos
trabalhadores menores.
6.1. A Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de
1969
Fruto do agravamento da situação de exceção política
vivida pelo País, a Emenda Constitucional nº 1, de 1969, al-
terou profundamente as disposições relativas ao direito à
educação. Merece destaque a substituição da liberdade de
cátedra pela liberdade de comunicação de conhecimentos no
exercício do magistério.
A obrigatoriedade para investimentos foi estabelecida
somente aos municípios. Em 1983, por intermédio da Emen-
da Constitucional nº 24, esse dever foi estendido à União,
estados e Distrito Federal.
7. A CONSTITUIÇÃO DE 1988
A Carta de 1988 é a mais pródiga de nossas Constitui-
ções no que diz respeito ao reconhecimento de direitos fun-
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
162
damentais e garantias para seu exercício. A educação está
relacionada entre os direitos sociais, no “caput” do artigo 6-º.
Sua disciplina específica encontra-se no título relativo à
Ordem Social, nos artigos 205 a 214.
7.1. Princípios constitucionais da educação
Da disciplina estabelecida no texto constitucional, pode-
mos destacar, além do princípio da dignidade da pessoa hu-
mana, indicado no artigo 1º, III, e dos objetivos do Estado
brasileiro, estabelecidos no artigo 3º, os princípios especifica-
mente voltados à educação, indicados nos artigos 206 a 209.
Quanto ao primeiro, é relevante destacar:
• a obediência aos princípios da igualdade de condições
para acesso e permanência na escola;
• a liberdade para aprender, ensinar e divulgar o pensa-
mento, a arte e o saber;
• o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas e
a coexistência de instituições públicas e privadas de
ensino;
• a gratuidade do ensino público em estabelecimentos
oficiais;
• a valorização dos profissionais do ensino, garantidos,
na forma da lei, planos de carreira para o magistério
público, com piso salarial profissional e ingresso exclu-
sivamente por concurso público de provas e títulos;
• a gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
• garantia de padrão de qualidade;
O artigo 207, direcionado especificamente ao ensino su-
perior, estabeleceu a autonomia didático-científica, adminis-
trativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades
e tornou indissociáveis o ensino, a pesquisa e extensão.
163
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
7.2. Garantias constitucionais do direito à educação
O artigo 208 estabelece o dever do Estado com a educa-
ção, indicando as seguintes garantias:
• ensino fundamental obrigatório e gratuito;
• ensino fundamental gratuito para aqueles que não ti-
veram acesso a ele na idade própria;
• progressiva universalização do ensino médio gratuito;
• atendimento especializado aos portadores de deficiência;
• atendimento para crianças de zero a seis anos em cre-
ches e pré-escolas;
• acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa
e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
• oferta de ensino noturno adequado às condições dos
alunos;
• programas complementares de atendimento para o
educando carente no ensino fundamental.
A livre participação da iniciativa privada na prestação de
serviços educacionais, submetida às normas pelas pessoas
políticas e autorização e avaliação do padrão de qualidade
pelos órgãos competentes, é garantida pelo artigo 209.
7.3. Competências materiais e legislativas
A competência legislativa da União para estabelecer
normas gerais em matéria educacional foi fixada no artigo 22,
XXIV, e faculta o parágrafo único do referido artigo à possibi-
lidade de os Estados legislarem acerca do tema, desde que
autorizados por lei complementar, a respeito de questões
específicas. Esse dever foi cumprido com a edição das leis
9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e 10.172/
01 (Plano Nacional de Educação), previsto no artigo 214, que
tem como objetivo possibilitar o desenvolvimento articulado
do ensino, em relação às ações do Poder Público e seus ní-
veis, para contribuir com a “erradicação do analfabetismo,
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
164
universalização do atendimento escolar, melhoria da qualida-
de de ensino, formação para o trabalho e promoção huma-
nística, científica e tecnológica do País.”
Por outro lado, o artigo 24, IX, estabelece competência
legislativa concorrente para União, estados e Distrito Federal
quanto à educação. Os municípios, conforme autorizado pelo
artigo 30, inciso II, suplementar a legislação federal e esta-
dual no âmbito de seu interesse.
Em relação à competência material, o artigo 23, inciso
V, atribuiu competência comum a todas as pessoas políticas
para “proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação
e à ciência.”
No artigo 211, a Constituição fixou a competência das
pessoas políticas para a realização da atividade educacional.
Estabelece o parágrafo 2° que os Municípios devem atuar
prioritariamente no ensino fundamental e na educação infan-
til. Estados e Distrito Federal devem criar e manter o ensino
fundamental e médio, de acordo com o parágrafo 3º. É respon-
sabilidade da União o sistema de ensino federal e dos Terri-
tórios, além da realização de atividade supletiva e redis-
tributiva, que garanta o padrão de qualidade do ensino, nos
moldes do parágrafo 1º.
A organização dos sistemas de ensino pelos entes fede-
rados deve ser feita em regime de colaboração, a fim de as-
segurar a universalização do ensino obrigatório, conforme
disposto no artigo 211, § 4º.
7.4. Financiamento da educação
No que diz respeito ao financiamento da educação (de-
senvolvimento e manutenção), a Constituição estabelece, no
artigo 212, os percentuais a serem aplicados pelas pessoas
políticas. O ensino fundamental conta, ainda, com os valores
relativos ao salário-educação, fixado pelo artigo 212, § 5º.
165
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
7.5. Aspectos constitucionais do direito à educação
Conforme disposto no artigo 205 da Constituição, “a edu-
cação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo
para o exercício da cidadania e sua qualificação para o traba-
lho”. Para Celso Bastos (2000:482), “esse dispositivo possui
caráter bifronte, pois, simultaneamente à garantia do direito
do povo de receber educação, concede-lhe o direito de exigir
essa prestação estatal, como também atribui à própria soci-
edade o direito de ministrar o ensino”.
Esclarece o autor que as palavras educação e ensino
são utilizadas como sinônimas, embora possuam significa-
dos distintos:
[...] educação é o processo de desenvolvimento da capacidade
física, intelectual e moral da criança e do ser humano em
geral, visando à sua melhor integração individual e social. [...]
Ensino é o conjunto de tarefas planejadas e realizadas para
promover a aprendizagem, exercida sobre o aluno, com o in-
tuito de transmitir conhecimentos. (BASTOS, 2000:491)
Ensina Nina Ranieri (2000) que, embora os conceitos
relacionados indiquem realidades diferentes, ainda que se-
melhantes, deve o intérprete verificar seu sentido em face do
contexto em que se coloca. Ela esclarece que
Educação [...] constitui o ato ou efeito de educar-se; o proces-
so de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e
moral do ser humano, visando a sua melhor integração indi-
vidual e social. Significa também os conhecimentos ou as
aptidões resultantes de tal processo, ou o cabedal científico
e os métodos empregados na obtenção de tais resultados [...]
[...] Ensino, por sua vez, designa a transmissão de conheci-
mentos, informações ou esclarecimentos úteis ou indispen-
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
166
sáveis à educação; os métodos empregados para se ministrar
o ensino, o esforço orientado para a formação ou modificação
da conduta humana [...]. (RANIERI, 2000:168)
De acordo com Marcos Augusto Maliska (2001:156), para
que se interprete corretamente o conteúdo constitucional do
direito à educação, é necessário analisar “(i) a educação
como direito de todos; (ii) o dever do Estado e da família e a
colaboração da sociedade; (iii) o pleno desenvolvimento da
pessoa; (iv) o preparo para o exercício da cidadania; (v) a
qualificação para o trabalho”. Quanto ao papel da família, de
acordo com o autor,
Pode ser compreendido como o direito prioritário dos pais de
escolher o gênero de educação a dar a seus filhos e como o
dever, propriamente, de assegurar a educação a eles [...] as-
sim como um dever jurídico que se fundamenta na exigência
que a Constituição faz aos pais de educar seus filhos.
(MALISKA, 2001:158-9)
Um dos aspectos sob os quais pode ser considerada a edu-
cação é o pleno desenvolvimento da pessoa que, segundo Piaget,
[...] está subordinado a dois grupos de fatores: os fatores de
hereditariedade e adaptação biológicas, dos quais depende a
evolução do sistema nervoso e dos mecanismos psíquicos ele-
mentares, e os fatores de transmissão ou de interação sociais,
que intervêm desde o berço e desempenham um papel de pro-
gressiva importância, durante todo o crescimento, na constitui-
ção dos comportamentos e da vida mental. (PIAGET, 2000:29)
Ainda com relação a esse ponto, é necessário distinguir
entre indivíduo e personalidade. Segundo o mesmo autor
(2000:30), o direito ao pleno desenvolvimento da personalida-
167
O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
MARIA CRISTINA TEIXEIRA
de humana consiste em “formar indivíduos capazes de auto-
nomia intelectual e moral e respeitadores dessa autonomia
em outrem, em decorrência precisamente da regra de reci-
procidade que a torna legítima para eles mesmos”.
O exercício da cidadania é o quarto aspecto do direito à
educação e se explica pelo fato de o exercício dos direitos
relativos à cidadania estar intimamente ligado à utilização de
instrumentos que permitam ao indivíduo a efetiva participa-
ção social.
O último ponto a ser examinado é a qualificação para o
trabalho. O preparo profissional dos indivíduos está intima-
mente ligado à educação, que, conforme Carlos Augusto
Maliska (2001:161), “é elemento indispensável até mesmo na
realização de tarefas consideradas em princípio, como traba-
lho não intelectual.”. Além disso, essa qualificação hoje pode
ser entendida também nas situações de aperfeiçoamento e
atualização profissionais, bastante comuns para as tarefas
técnicas, principalmente aquelas vinculadas à tecnologia.
CONCLUSÃO
O objetivo deste artigo foi sistematizar a repartição de
competências em educação nas Constituições brasileiras. Do
exposto, podemos concluir que referido direito tem evoluído
em relação à sua realização e garantia no direito nacional.
A Constituição de 1988 possibilitou avanços significativos no
tratamento normativo da matéria, estabelecendo princípios
que devem nortear as atividades dos entes federados quanto
ao desenvolvimento dos respectivos sistemas de ensino, bem
como na fixação de recursos orçamentários para a manuten-
ção e o desenvolvimento da educação.
Avanços também foram registrados quanto à
universalização do acesso e à avaliação das entidades públi-
cas e particulares de ensino superior e médio, por meio de
instrumentos periódicos utilizados nos estabelecimentos de
ensino de todo o território nacional. As questões relativas à
REVISTA DA FACULDADE
DE DIREITO
168
capacitação dos professores e à educação dos portadores de
necessidades especiais merecem maior atenção do Poder
Público, no sentido de serem objeto de políticas públicas que
garantam sua adequada realização.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia.
São Paulo: Saraiva, 2003.
BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição Brasileira. Vol. 8. São
Paulo: Saraiva, 2000.
______. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2001.
COSTA, Messias. A Educação nas Constituições do Brasil: dados e dire-
ções. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
FÁVERO, Omar (Coord.). A Educação nas Constituintes Brasileiras: 1823-
1988. Campinas: Autores Associados, 2001.
KUGELMAS, Eduardo. José Antonio Pimenta Bueno, Marquês de São
Vicente – Coleção Formadores do Brasil. São Paulo: Editora 34, 2002.
MALISKA, Marcos Augusto. O Direito à Educação e a Constituição. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2001.
PIAGET, Jean. Para onde vai a Educação? Rio de Janeiro: José Olympio,
2000.
RANIERI, Nina Beatriz. Autonomia Universitária. São Paulo: Edusp, 2000.
TEIXEIRA, Anísio. Educação no Brasil. Rio de Janeiro: Companhia Edi-
tora Nacional, 1969.

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  • 1. * Mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. Professora de Direito Cons- titucional, Direito Processual Administrativo e Direito Processual Cons- titucional da Faculdade de Direito da Universidade Metodista de São Paulo. Professora de Direito Administrativo do Curso de Direito do UNISAL. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional – IBDC Artigo entregue em abril de 2008. mcristinateixeira@uol.com.br RESUMO A educação, direito fundamental social, tem sido obje- to de disciplina de todas as Constituições brasileiras. O objetivo deste trabalho é descrever a repartição de competências relativas ao tema. Para a adequada ex- posição, é necessário analisar o contexto no qual tem se desenvolvido a educação no Brasil, de modo que a reflexão seja realizada considerando os aspectos his- tóricos, econômicos e sociais de cada período. Palavras-chave: Educação; Constituição; direito fun- damental; repartição de competências ABSTRACT The education, social basic right, have been object of discipline of all the Brazilian Constitutions. The objective of this work is to describe the distribution of relative abilities to the subject. For the adjusted exposition, it is necessary to describe the context in which it has developed the education in Brazil, in way O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS Maria Cristina Teixeira*
  • 2. 147 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA that the reflection is carried through considering the historical, economic and social aspects of each period. Key-words: Education; Constitution; social basic right; distribution of abilities INTRODUÇÃO O direito à educação é um direito fundamental que se inclui entre os direitos sociais previstos na Constituição, no artigo 6º, segundo o qual “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previ- dência social, a proteção à maternidade e à infância, a assis- tência aos desamparados”. Sua disciplina expressa se encon- tra nos artigos 205 a 214. Está vinculado ao princípio da dig- nidade da pessoa humana que, conforme o artigo 1º, inciso III da Constituição, é fundamento do Estado brasileiro. Nesse sentido, pode-se dizer que de sua adequada presta- ção decorre a realização dos objetivos fundamentais do País, estabelecidos no artigo 3º da Lei Maior, quais sejam, a cons- trução de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e da marginalidade, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem comum. 1. A CONSTITUIÇÃO DE 1824 O contexto histórico, político e social da época em que foi outorgada a Constituição de 1824 era o da ascensão do liberalismo e do constitucionalismo no ideário econômico, político e jurídico, e do positivismo nos campos filosófico e científico. Essas correntes foram representadas no cenário nacional pelo Partido Liberal Brasileiro que, conforme Antonio Chizzoti (2001:32), “professava um ideário anticolonialista, apoiado em um liberalismo difuso”, que incluía em sua base desde comerciantes e proprietários de províncias até nativos dos centros urbanos que estavam em situação precária, em face dos favores prestados à Corte no Rio de Janeiro, bem como artesãos, oficiais de serviços autorizados e intelectuais
  • 3. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 148 influenciados pelo ideário francês. Sua base teórica era o constitucionalismo europeu, consubstanciado na obra de Benjamin Constant denominada Princípios de política aplicá- veis a todos os governos representativos. Para fazer oposição a esse grupo, foi criado o partido denominado Português ou Idealista, formado, segundo o autor (2001:32), por “reinóis, militares e burocratas, comerciantes e prepostos do absolutismo luso”, os quais defendiam o regi- me colonial pelas razões mais diversas, como a manutenção de usos, tradições, direitos, leis e regulamentos anteriores à proclamação da Independência. Sua base era a Revolução Liberal do Porto, de 1820, e a submissão da Corte Portuguesa às normas dali oriundas. A educação foi tratada no discurso inaugural do Impera- dor, na abertura da Assembléia Constituinte, ocasião em que afirmou ser necessária uma legislação especial que discipli- nasse a matéria. Para Chizzoti (2001:40-41), a Constituinte procurou dar unicidade à instrução pública, tendo sido apre- sentado um “sistematizado programa de instrução pública [...], com seqüências de séries, organização curricular e ob- jetivos definidos de cada grau”. Não foi possível fixar diretri- zes fundamentais para a educação, uma vez que as discus- sões eram continuamente desviadas para temas de menor importância. A questão da instrução ou ensino fundamental foi relegada ao segundo plano e superada por aquela relativa à criação das universidades. Com a dissolução da Assembléia Constituinte, os realis- tas obtiveram uma vitória que dividiu os liberais, até então defensores da monarquia. Foi, então, nomeada uma comissão especial para redigir o texto constitucional e, em 17 de de- zembro de 1823, o Imperador enviou ao Parlamento um docu- mento denominado “Bases da Nova Constituição”. Em 25 de março de 1824, uma lei determinava a obediência à Carta Constitucional do Brasil.
  • 4. 149 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA O texto constitucional disciplinou a educação no artigo 179, XXXII e XXXIII. Foi estabelecida a garantia do ensino pri- mário a todos os cidadãos e sua realização, preferencialmente, pela família e pela Igreja, bem como a criação de colégios e universidades para o ensino de Ciências, Artes e Letras. Não havia, nesse momento, a atribuição de competências específi- cas às províncias para sua efetivação. A esse respeito, José Antonio Pimenta Bueno (2002:521), o Marquês de São Vicente, defendia o controle e a contribuição financeira do governo cen- tral com a educação básica, para que fosse efetivamente criada uma “educação nacional homogênea e uniforme”. Em 1828, foi promulgada uma lei que descentralizou a competência para o ensino fundamental, determinando a criação, em cada cidade e vila do Império, de escolas de pri- meiras letras e, nas cidades e vilas mais populosas, de esco- las de meninas, com a fiscalização sob a responsabilidade das Câmaras Municipais. O progresso que se pretendia obter com a atribuição da competência relativa ao ensino fundamental às províncias foi questionado. Para Newton Sucupira (2001:59), a lei não atin- giu seu objetivo em face do pequeno número de professores atraído pelo projeto, pela remuneração irrisória atribuída para a realização do trabalho. Relatou ainda o autor (2001:59) que, em 1848, foi elaborado um relatório a respeito do assunto pelo Visconde de Macaé, ministro do Império, no qual foram indicadas como principais causas para a situação em que se encontrava a educação: a falta de qualificação dos professores; o descontentamento docente em razão dos baixos salários recebidos; a precariedade das instalações escolares; e a de- ficiência dos métodos aplicados ao ensino. Em 1834 entrou em vigor o Ato Adicional nº 16, incorpo- rado à Constituição, que determinou, também, a descen- tralização da educação de segundo grau. De acordo com o referido Ato, tornou-se competência das Assembléias das Províncias, nos moldes do artigo 10, § 2º, legislar e promover
  • 5. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 150 a instrução pública. Não estão compreendidas aí as faculda- des de medicina, os cursos jurídicos, as academias que já existiam na época. Esse ato normativo repercutiu de forma nociva para o desenvolvimento da educação básica, uma vez que a maioria dos parlamentares entendia que se tratava de competência concorrente. Tal compreensão foi alterada duran- te o reinado de dom Pedro II, ainda que houvesse opiniões divergentes de ministros e juristas (Sucupira, 2001:65). De acordo com Maria Lúcia de Arruda Aranha (2000:152), a reforma impediu a “unicidade orgânica do sistema educaci- onal”, na medida em que atribuiu a pessoas políticas distintas a responsabilidade pela disciplina e manutenção do ensino superior e fundamental. Na época, a principal questão jurídica que se discutia, em relação à educação, dizia respeito à defi- nição da atribuição de competências entre as pessoas políticas. O caráter elitista da educação brasileira foi reforçado nessa época com a preferência que continua sendo atribuída ao ensino superior, cujo acesso era possibilitado apenas aos membros da nobreza e da burguesia. Em 1827, foram criados em São Paulo e Recife cursos jurídicos, transformados em faculdade em 1854. Em relação ao ensino fundamental e ao secundário, con- vém esclarecer que não foi dada a eles ênfase idêntica à que vinham merecendo em outros países. No secundário, não havia um currículo próprio, e a escolha das matérias minis- tradas era feita aleatoriamente em cada estabelecimento, bem como não existia a exigência do término de um curso para o início de outro. Contribuiu para essa estrutura precá- ria a falta de recursos, que resultava da tributação ineficiente e que se traduziu no pequeno número de estabelecimentos e na baixa remuneração dos professores. No ensino fundamental a situação não era melhor: o modelo econômico brasileiro, agrário e latifundiário, que sofreu pequenas alterações em face do comércio e da indús- tria no final do século XIX, de acordo com Aranha (2000:155),
  • 6. 151 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA não favoreceu seu desenvolvimento. A educação dos filhos das classes mais abastadas era realizada em casa, por meio de preceptores. Nesse período foi implantado o método de ensino mútuo, que perdurou entre 1823 e 1838, com resul- tados insatisfatórios. Em face do entendimento de que a descentralização ha- via contribuído para a desorganização do sistema educacional, a partir de 1870 a interferência do governo central na maté- ria educacional atribuída às províncias voltou a ser defendida como “medida necessária, indispensável ao desenvolvimento da instrução pública”, de acordo com Sucupira (2001:63). Para Anísio Teixeira, A dualidade da educação formal traduzia a dualidade da soci- edade brasileira. O sistema provincial e, mais tarde, estadual das escolas primárias e vocacionais para o “povo”, e do ensino acadêmico secundário e das escolas superiores para a “elite”. Os dois sistemas eram independentes, não dando um passa- gem ao outro. Como a sociedade continuava escravocrata, o povo seria o dos homens livres, porque os escravos eram o chão da sociedade e não chegavam a constituir classes. (TEIXEIRA, 1969:293) Assim, podemos dizer que durante o período de vigência da Constituição de 1824 não existiu, sob o aspecto constituci- onal, uma atribuição clara e precisa de competências entre as pessoas políticas para seu desenvolvimento. O que havia era a disciplina da matéria por meio da legislação ordinária, com a conseqüente descentralização, que não trouxe benefícios para o progresso da educação no País, pois privilegiou o ensino superior em detrimento da criação de políticas que cuidassem da implantação do ensino fundamental público e gratuito, es- sencial para a formação da maior parte da população.
  • 7. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 152 2. A CONSTITUIÇÃO DE 1891 Com a proclamação da República, iniciou-se uma nova fase para o Direito Constitucional Brasileiro. O País adotou nova forma de governo e de estado, tornando-se uma Repúbli- ca Federativa. Antes da promulgação da Constituição de 1891, alguns atos normativos trataram, de forma direta ou indireta, da educação. Entre eles, podemos mencionar: • Decreto nº 6, de 19/11/1889: extinguiu o voto censitário e impôs como condição para o exercício da cidadania a alfabetização dos indivíduos; • Decreto nº 7, de 20/11/1889: atribuiu aos estados à instrução pública em todos os graus; • Aviso nº 17, de 24/04/1890: tornou laico o currículo do Instituto Nacional, ex-Pedro II; • Criação da Secretaria de Instrução Pública, Correios e Telégrafos, em 19/04/1890: embora esse órgão tenha sido extinto em 30/10/1891, várias iniciativas reali- zadas durante o período merecem atenção: criação do Pedagogium, órgão responsável pela reforma da instru- ção pública primária e secundária no Distrito Federal, bem como do ensino superior, que possibilitou o sur- gimento de faculdades livres e oficiais, bem como do Conselho de Instrução Superior no Distrito Federal. Conforme salientou Carlos Roberto Jamil Cury (2001:73), “estas iniciativas mostram ações indicadoras de descen- tralização, embora com direção oficial (não obrigatória) advinda do regulamento do Pedro II e de outros institutos oficiais da União e do Distrito Federal”. A educação, de acordo com o autor (2001:75), foi objeto de debates em várias ocasiões de modo direto e indireto. Em algumas o tema assumiu papel fundamental, entre as quais podem ser citadas:
  • 8. 153 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA • a organização do ensino, no que se refere à repartição de competência entre os entes federados e a possibili- dade da atribuição de sua realização a pessoas de di- reito privado; • a laicidade: a determinação de uma postura não-reli- giosa da escola pública (do que não se deve deduzir qualquer tipo de defesa da irreligião); • a obrigatoriedade e gratuidade da instrução pública pri- mária: omissão explicável, ao menos no âmbito das falas sobre a gratuidade, pelo princípio federativo. O direito à educação foi disciplinado nos artigos 35 e 72 da Constituição de 1891. O tratamento dado ao tema foi modi- ficado, principalmente no que se refere à descentralização e concentração das atividades educacionais da União e dos es- tados. Ficou estabelecida a competência do Congresso para “o desenvolvimento das letras, artes e ciências”, bem como para a criação de estabelecimento de ensino superior e secundário nos estados e para prover a instrução secundária no Distrito Federal. Também, estabeleceu-se a separação entre Estado e Igreja no que se refere à educação, uma vez que o ensino ministrado nos estabelecimentos oficiais era laico. Para Alberto Venâncio Filho, Da análise sistemática que se faça do texto constitucional, depreender-se-á que, por omissão, uma vez que os poderes remanescentes pertencem aos Estados, a instrução primária será de responsabilidade deles. A interpretação sistemática dos incisos 3 e 4 do artigo 35 dispõe que cabe ao Congresso Naci- onal, em caráter não exclusivo, criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados e promover a instrução secundária no Distrito Federal. (VENÂNCIO FILHO, 2001:114) Em relação ao tratamento dispensado à educação no iní- cio da República, ensina Anísio Teixeira que
  • 9. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 154 Com efeito, apesar de uma pregação, a que não faltou eloqüência e brilho, a República não logrou ampliar consideravelmente as oportunidades educativas. A situação, após a Primeira Guerra Mundial, apresentava-se deficiente quanto ao ensino primário e, em relação ao ensino médio, com a dualidade dos sistemas educacionais, poucas oportunidades oferecia para a ascensão social. O sistema era adequado à estagnação social necessária à manutenção dos privilégios existentes. (TEIXEIRA, 1969:295) Quanto à atribuição de competências às pessoas políticas, em matéria educacional assevera Teixeira que, Não constituía, assim, uma simples divisão de trabalho ou de atribuições entre os Estados e a União, o que se confirma pelo fato de, voluntariamente, tanto a União ministrar ensino médio vocacional, quanto os Estados ministrarem ensino acadêmico secundário e superior. A dualidade refletia a orga- nização real da sociedade brasileira e representava um dos mais ricos exemplos da tese de que a educação não é proble- ma abstrato, cujos fins e objetivos se discutem abstratamen- te, mas problema concreto de manifesta intencionalidade, sendo sua distribuição em quantidade e seu conteúdo em qualidade determinados pela estrutura e organização da so- ciedade. (TEIXEIRA, 1969:296) Entre 1925 e 1926, foi realizada uma revisão constituci- onal, finalizada em 7 de setembro daquele ano. Em relação à educação, podemos destacar a discussão a respeito do dever do Estado de oferecer ensino a todos, especialmente a instru- ção primária. Encerrados os trabalhos, de acordo com Cury, ficou estabelecido que: À União caberia centralizar a instrução pública mediante a “escola única”. Dela – dever do Estado e direito do cidadão – emergiria a coesão nacional, o caráter nacional, patrocinados
  • 10. 155 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA pela orientação também fornecida pela União. Em termos sim- ples, a unidade nacional é resultante de uma unidade peda- gógica coordenada pela União. [...] A Revisão de 1926 antecipa em oito anos a concepção da educação como direito social pelo qual o Estado dá uma resposta que não é a da “outorga”, às pressões de vários movimentos civis, entre os quais as pres- sões do operariado. (CURY, 2001:101) Assim, podemos concluir que a Constituição de 1891 atribuiu competência em matéria educacional às pessoas políticas, dando um passo, ainda que insuficiente, para a sistematização da matéria e a melhora das condições em que era desenvolvida a educação no País. 3. A CONSTITUIÇÃO DE 1934 A Constituinte que deu origem à nova Carta Magna afastou-se do ideário liberal e se filiou aos princípios das Constituições Mexicana (1917) e Alemã (1919), que traziam disposições relativas aos direitos sociais. Embora, conforme preleciona Marlos Bessa Mendes da Rocha (2001:118), a edu- cação tenha sido objeto de renovação, “houve a manutenção de um vetor tradicional, próprio da estruturação sociopolítica da Velha República”. Para o autor (2001:122), cinco questões relativas à educação foram objeto de discussão nessa oportu- nidade: “a participação da União em todos os níveis de ensi- no; o direito à educação; a ação supletiva da União aos Esta- dos e municípios; a aplicação de recursos públicos em educa- ção; o ensino religioso.” A Constituição disciplinou o direito à educação no artigo 5º, XVI, e 148 a 158. O artigo 149 o caracterizou como direito subjetivo público: [...] direito de todos e deve ser ministrada pela família e os poderes públicos, cumprindo a estes proporcionar o acesso a brasileiros e estrangeiros domiciliados no país, de modo que
  • 11. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 156 possibilite o desenvolvimento eficiente de valores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito bra- sileiro a consciência da solidariedade humana. A competência de fixar diretrizes para a educação naci- onal passou a ser exercida pelo governo federal, princípio que se manteve presente em todos os textos constitucionais des- de então. A difusão da instrução pública, em todos os graus, tornou-se atribuição concorrente da União e Estados. Foi trazida para o texto constitucional a previsão da exis- tência do Conselho Federal de Educação que, segundo José Silvério Baía Horta (2001:139), foi instituído na reforma educa- cional de 1931. Na Constituição de 1934, esse órgão assumiu forma diversa, com a atribuição de elaborar o Plano Nacional de Educação, o qual deveria ser aprovado pelo Poder Legislativo. No que se refere à gratuidade do ensino primário, de acordo com o Texto Constitucional, fora dos centros escolares sua prestação tornou-se dever das empresas industriais ou agrícolas que contassem com mais de cinqüenta trabalhado- res, sendo requisito que existissem, entre eles e seus filhos, mais de dez analfabetos. Em relação aos recursos destinados a essa finalidade, foi fixada pela primeira vez a aplicação de receitas de cada ente da Federação para sua implementação, incluindo-se aqui os municípios. Estados e Distrito Federal aplicariam, pelo menos, 20% da renda resultante dos impostos na manutenção e de- senvolvimento dos sistemas educativos. Os municípios e a União direcionariam, pelo menos, 10% da renda resultante dos impostos na manutenção e desenvolvimento de educação. A Constituição previu, também, a formação de fundos de educação com a participação da União, estados, Distrito Fe- deral e municípios, cujos valores deveriam ser utilizados em obras educativas previstas em lei, bem como para o auxílio de alunos necessitados, nos termos do artigo 157. Finalmente, garantiu a liberdade de cátedra e a realização de concurso
  • 12. 157 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA público de provas e títulos para provimento de cargos no magistério oficial. Podemos verificar que a Constituição de 1934 promoveu avanços significativos no que se refere à melhoria na quali- dade da prestação da atividade educacional pelo Estado, uma vez que destinou recursos dos orçamentos das pessoas políti- cas para sua realização, bem como para o auxílio daqueles que não possuíam condições de freqüentar o ensino, mesmo nos estabelecimentos oficiais. 4. A CONSTITUIÇÃO DE 1937 A Constituição do Estado Novo disciplinou a matéria nos artigos 15, IX, 16, XXIV, e 124 a 134. Estabeleceu como com- petência privativa da União fixar as diretrizes, bases e qua- dros da educação nacional, bem como para a formação física, intelectual e moral de crianças e jovens, nos artigos 16, XXIV e 15, IX, respectivamente. Da leitura do artigo 129 verifica-se a existência de dis- tinção entre as escolas destinadas à elite e aquelas voltadas à população menos favorecida. Estabelecia o referido artigo: À infância e à juventude, a que faltarem os recursos neces- sários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela funda- ção de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais. O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever do Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de inicia- tiva dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associ- ações particulares e profissionais.
  • 13. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 158 Foi mantida a gratuidade do ensino do ensino primário e considerada obrigatória a educação física, o ensino cívico e os trabalhos manuais, nos moldes do artigo 131, bem como tornado facultativo o ensino religioso. 5. A CONSTITUIÇÃO DE 1946 De acordo com Romualdo Portela de Oliveira (2001:165), a Constituinte de 1946 refletiu o momento histórico e social vivenciados pelo mundo e pelo País. Terminada a Segunda Guerra Mundial, assinados os acordos de Teerã, Yalta e Postdam, bem como realizados os julgamentos de Nuremberg, ficaram delimitadas as áreas de influência americana e sovi- ética em nível internacional. No cenário nacional, 1945 e 1946 foram anos marcados por um grande número de greves, para as quais contribuíram várias categorias, entre elas ban- cários e portuários, o que contrariava as orientações do Par- tido Trabalhista do Brasil (PTB) e do Partido Comunista (PC). Ainda conforme o autor (2001:166), nos debates consti- tuintes a respeito da educação, “o ponto mais polêmico foi o do ensino religioso, de matrícula facultativa nos estabeleci- mentos oficiais, que extrapola o âmbito educacional e se in- sere na relação Estado – Igreja Católica”. Duas espécies de argumentos fundamentaram a oposição ao texto. A primeira referia-se à separação feita entre Igreja e Estado pela Repú- blica, cujos defensores entendiam que a volta do ensino religioso seria um retrocesso em face do lema republicano “Igreja Livre num Estado Livre”. A segunda corrente, certa da aprovação do dispositivo, centrava suas atividades para tornar difícil sua implantação. Entretanto, bastante próxima dessa questão estava outra polêmica, também enfrentada pelos constituintes de 1934 e que dizia respeito à titularidade do dever de educar, cujos sujeitos continuavam sendo a família e o Estado, e sua loca- lização no texto constitucional. Por ter se estabelecido que isso competia ao Estado e à família, os deputados dividiram-
  • 14. 159 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA se entre aqueles que entendiam que o assunto deveria ser mantido no capítulo relativo à família e os que postulavam sua colocação no capítulo destinado à educação (2001:178). Também foi discutida a gratuidade do ensino, e o texto, de acordo com Oliveira, Recuperado parte da formulação de 1934, garantindo-a para todos no ensino primário, propondo a “tendência” à gratuidade nos demais níveis, mas apenas para aqueles os que provarem insuficiência de recursos, sendo, portanto, menos ampla que a de 1934. (OLIVEIRA, 2001:189) No que diz respeito ao financiamento da educação, foram discutidas duas propostas centrais: a primeira, que referia-se à criação de um imposto específico destinado a seu custeio; e a segunda, relativa à destinação de recursos para sua realiza- ção. Constou do texto final a última: foi estabelecido que as pessoas políticas investiriam a renda obtida da arrecadação de impostos, no percentual de pelo menos 10% para a União e 20% para estados, Distrito Federal e municípios (2001:184). Outro aspecto que suscitou debates acalorados tratava da responsabilidade das pessoas políticas em relação à educação. De acordo com Oliveira (2001:184), havia três posições predo- minantes: a primeira, que entendia que o papel fundamental em relação à educação devia ser desempenhado pelo municí- pio, “como forma mais próxima de colocar o ensino totalmente nas mãos dos particulares”; a segunda, segundo a qual cabia à União competência para legislar sobre educação, restringin- do bastante o papel das demais pessoas políticas; e a última, que advogava pela responsabilidade dos estados para a realiza- ção do ensino primário e médio. Prevaleceu a possibilidade de estados e União se encarregarem do ensino primário, facultan- do-o aos municípios, desde que estes não constituíssem siste- ma autônomo em relação ao respectivo estado.
  • 15. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 160 No texto aprovado e promulgado em setembro de 1946, o direito à educação foi disciplinado nos artigos 5º, XV, d, e 166 a 175. Novamente, nos moldes da Constituição de 1934, a educação continuou caracterizada como direito subjetivo público. A União manteve a competência para legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional, facultando aos estados legislarem em caráter complementar. A Carta Magna estabeleceu, no artigo 168, os princípios que deveriam ser obedecidos pela legislação, dentre eles: o ensino primário obrigatório e em língua nacional; o ensino oficial ulterior para aqueles que provassem insuficiência de recursos, bem como a manutenção de ensino primário pelas empresas industriais, comerciais e agrícolas com mais de cem trabalhadores; e exigência de concurso de provas e títulos para as cátedras do ensino secundário oficial, bem como do superi- or, oficial ou livre. Também foram garantidas a liberdade de cátedra e a vitaliciedade aos professores concursados. No que se refere aos recursos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino, estabeleceu o artigo 169 daquele texto que a União deveria aplicar pelo menos 10% da renda resultante dos impostos nessa atividade, e os estados, Distrito Federal e municípios 20%. Finalmente, dividiu o sistema de ensino em dois: federal e dos territórios, organizado pela União, nos termos do artigo 170; e dos estados e Distrito Fede- ral. Ambos deveriam possuir serviços de assistência educaci- onal para o atendimento da clientela carente (artigo 172). De acordo com Edivaldo M. Boaventura, com essa Carta Começa o ciclo das Leis de Diretrizes e Bases (...) que permi- tiu a descentralização da educação da esfera federal para a estadual, com a institucionalização dos sistemas de educação e recriação dos Conselhos de Educação com funções nor- mativas. (BOAVENTURA, 2001:196)
  • 16. 161 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA 6. A CONSTITUIÇÃO DE 1967 Essa Constituição disciplinou a matéria nos artigos 8º, XVI, XVII, q e § 2º, e 167, § 4º, e 168 a 172. O artigo 168 estabeleceu os princípios da educação e da legislação de ensino, acrescentando, com relação à primeira, a unidade nacional e a solidariedade humana. Não foram fixados percentuais da receita tributária para aplicação obrigatória e estabeleceu-se, ainda, que a gratuidade do ensino ulterior ao primário seria substituída, sempre que possível, pela concessão de bolsas de estudo, cujo reembolso seria exigido no caso do ensino superior. A cátedra continuou livre e, no caso do ensino oficial, seu acesso se manteve subordinado a concurso público de provas e títulos. Foi estabelecida para empresas comerciais, industriais e agrícolas a obrigatoriedade de manutenção de ensino primário gratuito aos empregados e filhos, bem como, no caso das duas primeiras, o oferecimento de cursos de aprendizagem aos trabalhadores menores. 6.1. A Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969 Fruto do agravamento da situação de exceção política vivida pelo País, a Emenda Constitucional nº 1, de 1969, al- terou profundamente as disposições relativas ao direito à educação. Merece destaque a substituição da liberdade de cátedra pela liberdade de comunicação de conhecimentos no exercício do magistério. A obrigatoriedade para investimentos foi estabelecida somente aos municípios. Em 1983, por intermédio da Emen- da Constitucional nº 24, esse dever foi estendido à União, estados e Distrito Federal. 7. A CONSTITUIÇÃO DE 1988 A Carta de 1988 é a mais pródiga de nossas Constitui- ções no que diz respeito ao reconhecimento de direitos fun-
  • 17. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 162 damentais e garantias para seu exercício. A educação está relacionada entre os direitos sociais, no “caput” do artigo 6-º. Sua disciplina específica encontra-se no título relativo à Ordem Social, nos artigos 205 a 214. 7.1. Princípios constitucionais da educação Da disciplina estabelecida no texto constitucional, pode- mos destacar, além do princípio da dignidade da pessoa hu- mana, indicado no artigo 1º, III, e dos objetivos do Estado brasileiro, estabelecidos no artigo 3º, os princípios especifica- mente voltados à educação, indicados nos artigos 206 a 209. Quanto ao primeiro, é relevante destacar: • a obediência aos princípios da igualdade de condições para acesso e permanência na escola; • a liberdade para aprender, ensinar e divulgar o pensa- mento, a arte e o saber; • o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas e a coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; • a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; • a valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclu- sivamente por concurso público de provas e títulos; • a gestão democrática do ensino público, na forma da lei; • garantia de padrão de qualidade; O artigo 207, direcionado especificamente ao ensino su- perior, estabeleceu a autonomia didático-científica, adminis- trativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades e tornou indissociáveis o ensino, a pesquisa e extensão.
  • 18. 163 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA 7.2. Garantias constitucionais do direito à educação O artigo 208 estabelece o dever do Estado com a educa- ção, indicando as seguintes garantias: • ensino fundamental obrigatório e gratuito; • ensino fundamental gratuito para aqueles que não ti- veram acesso a ele na idade própria; • progressiva universalização do ensino médio gratuito; • atendimento especializado aos portadores de deficiência; • atendimento para crianças de zero a seis anos em cre- ches e pré-escolas; • acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; • oferta de ensino noturno adequado às condições dos alunos; • programas complementares de atendimento para o educando carente no ensino fundamental. A livre participação da iniciativa privada na prestação de serviços educacionais, submetida às normas pelas pessoas políticas e autorização e avaliação do padrão de qualidade pelos órgãos competentes, é garantida pelo artigo 209. 7.3. Competências materiais e legislativas A competência legislativa da União para estabelecer normas gerais em matéria educacional foi fixada no artigo 22, XXIV, e faculta o parágrafo único do referido artigo à possibi- lidade de os Estados legislarem acerca do tema, desde que autorizados por lei complementar, a respeito de questões específicas. Esse dever foi cumprido com a edição das leis 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e 10.172/ 01 (Plano Nacional de Educação), previsto no artigo 214, que tem como objetivo possibilitar o desenvolvimento articulado do ensino, em relação às ações do Poder Público e seus ní- veis, para contribuir com a “erradicação do analfabetismo,
  • 19. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 164 universalização do atendimento escolar, melhoria da qualida- de de ensino, formação para o trabalho e promoção huma- nística, científica e tecnológica do País.” Por outro lado, o artigo 24, IX, estabelece competência legislativa concorrente para União, estados e Distrito Federal quanto à educação. Os municípios, conforme autorizado pelo artigo 30, inciso II, suplementar a legislação federal e esta- dual no âmbito de seu interesse. Em relação à competência material, o artigo 23, inciso V, atribuiu competência comum a todas as pessoas políticas para “proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência.” No artigo 211, a Constituição fixou a competência das pessoas políticas para a realização da atividade educacional. Estabelece o parágrafo 2° que os Municípios devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e na educação infan- til. Estados e Distrito Federal devem criar e manter o ensino fundamental e médio, de acordo com o parágrafo 3º. É respon- sabilidade da União o sistema de ensino federal e dos Terri- tórios, além da realização de atividade supletiva e redis- tributiva, que garanta o padrão de qualidade do ensino, nos moldes do parágrafo 1º. A organização dos sistemas de ensino pelos entes fede- rados deve ser feita em regime de colaboração, a fim de as- segurar a universalização do ensino obrigatório, conforme disposto no artigo 211, § 4º. 7.4. Financiamento da educação No que diz respeito ao financiamento da educação (de- senvolvimento e manutenção), a Constituição estabelece, no artigo 212, os percentuais a serem aplicados pelas pessoas políticas. O ensino fundamental conta, ainda, com os valores relativos ao salário-educação, fixado pelo artigo 212, § 5º.
  • 20. 165 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA 7.5. Aspectos constitucionais do direito à educação Conforme disposto no artigo 205 da Constituição, “a edu- cação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o traba- lho”. Para Celso Bastos (2000:482), “esse dispositivo possui caráter bifronte, pois, simultaneamente à garantia do direito do povo de receber educação, concede-lhe o direito de exigir essa prestação estatal, como também atribui à própria soci- edade o direito de ministrar o ensino”. Esclarece o autor que as palavras educação e ensino são utilizadas como sinônimas, embora possuam significa- dos distintos: [...] educação é o processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social. [...] Ensino é o conjunto de tarefas planejadas e realizadas para promover a aprendizagem, exercida sobre o aluno, com o in- tuito de transmitir conhecimentos. (BASTOS, 2000:491) Ensina Nina Ranieri (2000) que, embora os conceitos relacionados indiquem realidades diferentes, ainda que se- melhantes, deve o intérprete verificar seu sentido em face do contexto em que se coloca. Ela esclarece que Educação [...] constitui o ato ou efeito de educar-se; o proces- so de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral do ser humano, visando a sua melhor integração indi- vidual e social. Significa também os conhecimentos ou as aptidões resultantes de tal processo, ou o cabedal científico e os métodos empregados na obtenção de tais resultados [...] [...] Ensino, por sua vez, designa a transmissão de conheci- mentos, informações ou esclarecimentos úteis ou indispen-
  • 21. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 166 sáveis à educação; os métodos empregados para se ministrar o ensino, o esforço orientado para a formação ou modificação da conduta humana [...]. (RANIERI, 2000:168) De acordo com Marcos Augusto Maliska (2001:156), para que se interprete corretamente o conteúdo constitucional do direito à educação, é necessário analisar “(i) a educação como direito de todos; (ii) o dever do Estado e da família e a colaboração da sociedade; (iii) o pleno desenvolvimento da pessoa; (iv) o preparo para o exercício da cidadania; (v) a qualificação para o trabalho”. Quanto ao papel da família, de acordo com o autor, Pode ser compreendido como o direito prioritário dos pais de escolher o gênero de educação a dar a seus filhos e como o dever, propriamente, de assegurar a educação a eles [...] as- sim como um dever jurídico que se fundamenta na exigência que a Constituição faz aos pais de educar seus filhos. (MALISKA, 2001:158-9) Um dos aspectos sob os quais pode ser considerada a edu- cação é o pleno desenvolvimento da pessoa que, segundo Piaget, [...] está subordinado a dois grupos de fatores: os fatores de hereditariedade e adaptação biológicas, dos quais depende a evolução do sistema nervoso e dos mecanismos psíquicos ele- mentares, e os fatores de transmissão ou de interação sociais, que intervêm desde o berço e desempenham um papel de pro- gressiva importância, durante todo o crescimento, na constitui- ção dos comportamentos e da vida mental. (PIAGET, 2000:29) Ainda com relação a esse ponto, é necessário distinguir entre indivíduo e personalidade. Segundo o mesmo autor (2000:30), o direito ao pleno desenvolvimento da personalida-
  • 22. 167 O DIREITO À EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS MARIA CRISTINA TEIXEIRA de humana consiste em “formar indivíduos capazes de auto- nomia intelectual e moral e respeitadores dessa autonomia em outrem, em decorrência precisamente da regra de reci- procidade que a torna legítima para eles mesmos”. O exercício da cidadania é o quarto aspecto do direito à educação e se explica pelo fato de o exercício dos direitos relativos à cidadania estar intimamente ligado à utilização de instrumentos que permitam ao indivíduo a efetiva participa- ção social. O último ponto a ser examinado é a qualificação para o trabalho. O preparo profissional dos indivíduos está intima- mente ligado à educação, que, conforme Carlos Augusto Maliska (2001:161), “é elemento indispensável até mesmo na realização de tarefas consideradas em princípio, como traba- lho não intelectual.”. Além disso, essa qualificação hoje pode ser entendida também nas situações de aperfeiçoamento e atualização profissionais, bastante comuns para as tarefas técnicas, principalmente aquelas vinculadas à tecnologia. CONCLUSÃO O objetivo deste artigo foi sistematizar a repartição de competências em educação nas Constituições brasileiras. Do exposto, podemos concluir que referido direito tem evoluído em relação à sua realização e garantia no direito nacional. A Constituição de 1988 possibilitou avanços significativos no tratamento normativo da matéria, estabelecendo princípios que devem nortear as atividades dos entes federados quanto ao desenvolvimento dos respectivos sistemas de ensino, bem como na fixação de recursos orçamentários para a manuten- ção e o desenvolvimento da educação. Avanços também foram registrados quanto à universalização do acesso e à avaliação das entidades públi- cas e particulares de ensino superior e médio, por meio de instrumentos periódicos utilizados nos estabelecimentos de ensino de todo o território nacional. As questões relativas à
  • 23. REVISTA DA FACULDADE DE DIREITO 168 capacitação dos professores e à educação dos portadores de necessidades especiais merecem maior atenção do Poder Público, no sentido de serem objeto de políticas públicas que garantam sua adequada realização. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia. São Paulo: Saraiva, 2003. BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição Brasileira. Vol. 8. São Paulo: Saraiva, 2000. ______. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2001. COSTA, Messias. A Educação nas Constituições do Brasil: dados e dire- ções. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. FÁVERO, Omar (Coord.). A Educação nas Constituintes Brasileiras: 1823- 1988. Campinas: Autores Associados, 2001. KUGELMAS, Eduardo. José Antonio Pimenta Bueno, Marquês de São Vicente – Coleção Formadores do Brasil. São Paulo: Editora 34, 2002. MALISKA, Marcos Augusto. O Direito à Educação e a Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2001. PIAGET, Jean. Para onde vai a Educação? Rio de Janeiro: José Olympio, 2000. RANIERI, Nina Beatriz. Autonomia Universitária. São Paulo: Edusp, 2000. TEIXEIRA, Anísio. Educação no Brasil. Rio de Janeiro: Companhia Edi- tora Nacional, 1969.