Ideias e práticas de educadores sobre maus tratos infantis
1. Campus Académico de Vila Nova de Gaia
Escola Superior de Educação Jean Piaget/Arcozelo - Canelas
(Decreto-Lei nº 468/88, de 16 de Dezembro)
Lizete Gomes da Silva Tavares
Maus Tratos Infantis:
Ideias e práticas de profissionais de educação de infância do
ensino regular e de intervenção precoce
Mestrado em Educação Especial - Domínio Intervenção Precoce
Março 2013
2.
3.
4.
5. Campus Académico de Vila Nova de Gaia
Escola Superior de Educação Jean Piaget/Arcozelo - Canelas
(Decreto-Lei nº 468/88, de 16 de Dezembro)
Lizete Gomes da Silva Tavares
Maus Tratos Infantis:
Ideias e práticas de profissionais de educação de infância do
ensino regular e de intervenção precoce
Tese de Mestrado orientada pela Doutora Carla Elisabete Duarte Peixoto
Março 2013
9. Lizete Gomes da Silva Tavares
Tese apresentada na escola Superior de Educação Jean-Piaget de
Arcozelo – Canelas no Campus Académico de Vila Nova de Gaia como parte dos
requisitos para a obtenção do grau de mestre.
10.
11. RESUMO
O número de crianças vítimas de maus tratos tem evoluído de uma forma significativa em
todo o mundo. De acordo com a UNICEF (2003), aproximadamente 3500 crianças com menos de 15
anos morrem todos os anos em consequência de maus tratos nos países desenvolvidos, sendo as
crianças mais pequenas aquelas que se encontram em maior risco. Os profissionais de educação que
fazem parte do dia-a-dia de muitas destas crianças desempenham um papel fulcral na prevenção, na
deteção e na intervenção rápida e precoce (Cid, Machado, & Matos, 2010; Magalhães, 2004) destas
situações de forma a minimizar os riscos e consequências decorrentes dos maus tratos. Apesar da
relevância do papel dos profissionais de educação nesta problemática, pouco se sabe em Portugal
sobre as suas ideias e práticas. Neste sentido, o presente estudo teve por objetivo conhecer as ideias
e as práticas de educadores de infância do ensino regular e de intervenção precoce relativamente à
problemática dos maus tratos infantis. A amostra do presente estudo é constituída por 58
profissionais de educação de infância (96.6% do sexo feminino), com idades compreendidas entre os
12. 25 e os 56 anos (M = 39.22, DP = 8.05), incluindo 30 educadores de infância do regular e 28
educadores de intervenção precoce. A recolha de dados decorreu entre Fevereiro e Maio de 2012,
tendo sido utilizado para o efeito um questionário organizado em duas partes: (1) Dados pessoais e
profissionais; (2) Ideias e práticas dos profissionais relacionadas com a problemática dos maus tratos
infantis. Em geral, os resultados obtidos indicam que a maioria dos profissionais de educação: (1) não
tem formação específica na área dos maus tratos infantis, mas considera razoável o seu
conhecimento técnico no domínio; (2) consideram que a deteção desta problemática é um assunto
que lhes diz respeito; (3) não conhece casos particulares de maus tratos infantis; (4) actuam ou
actuariam de diferentes formas em caso de evidência ou suspeita de maus tratos infantis, entre elas,
alertar as autoridades competentes em matéria de infância e juventude (e.g., escola) e as entidades
responsáveis pela proteção da criança (e.g., CPCJ), assim como conversar com a criança sobre a
situação. Face aos resultados obtidos no presente estudo, e assumindo que os educadores de infância
têm um papel crucial na prevenção maus tratos infantis (Cid, Machado, & Matos, 2010), parece-nos
pertinente apostar na formação destes profissionais no sentido de potenciar os seus conhecimentos e
competências de atuação no âmbito desta problemática. Atendendo à escassez de estudos
desenvolvidos em Portugal sobre esta temática, particularmente junto de profissionais de educação
de infância do ensino regular e de intervenção precoce, destacamos ainda a necessidade de realizar
novos estudos com amostras mais alargadas de forma a compreender os fatores associados à
variabilidade existente a nível das ideias e práticas destes profissionais.
13. ABSTRACT
The number of child victims of abuse has evolved in a significant way in the world. According
to UNICEF (2003), approximately 3500 children under the age of 15 die each year as a result of
maltreatment in developed countries, being young children at greater risk. Teachers are part of dayto-day of many of children, playing a key role in prevention, detection and early intervention (Cid,
Machado, & Matos, 2010; Magalhães, 2004) in order to minimize the risk and consequences of child
maltreatment. Despite this key role of teachers, little is known in Portugal about their ideas and
practices. Therefore, the present study aimed to analyze the ideas and practices of preschool and
early childhood intervention teachers about child maltreatment. The sample consists of 58 childhood
education professionals (96.6% female), aged between 25 and 56 years (M = 39.22, SD = 8.05),
including 30 preschool teachers and 28 early childhood intervention teachers. Data collection took
place between February and May 2012, having been used for that purpose a questionnaire organized
in two parts: (1) teachers’ personal and professional data; (2) teachers’ ideas and practices about
14. child maltreatment. In general, the results indicate that the majority of childhood education
professionals: (1) has no specific training in the area of child maltreatment, but considers reasonable
your technical knowledge in the field, (2) considers that the detection of this problem is an issue that
concerns them, (3) knows no particular cases of child abuse, (4) acts or would act in different ways in
the event of evidence or suspicion of child abuse, among them, alerts the relevant authorities
regarding children and youth (e.g., school) and the entities responsible for child protection (e.g.,
CPCJ), as well as talks with the child about the situation. Given the results obtained in this study, and
assuming that childhood education professionals have a key role in preventing child maltreatment
(Cid, Machado, & Matos, 2010), it seems appropriate to promote training for professionals in order to
enhance their knowledge and skills to work within this problem. Due to the scarcity of studies
developed in Portugal on this issue, particularly with preschool teachers and early childhood
intervention teachers, we highlight the need to conduct further studies with broader samples in order
to understand the factors associated with variability in terms of the ideas and practices of these
professionals.
15. AGRADECIMENTOS
Não basta o esforço realizado, o tempo empenhado, as noites em branco: basta apenas um
obrigado sincero a TODOS os que direta ou indiretamente estiveram comigo neste percurso que
chega agora ao fim sem no entanto ficar terminado. As palavras que transcrevo na sua subtileza não
são suficientes para agradecer o quão desejado. De um modo particular agradeço…
À Doutora Carla Peixoto, cuja orientação estímulo foram sem dúvida imprescindíveis para
que pudesse concluir este trabalho, pela compreensão, respeito, paciência;
À Professora Florinda Maciel que incentivou ao esforço e à coragem nos momentos mais
angustiantes;
16. Aos profissionais que se mostraram dispostos a participar nesta investigação, partilhando os
seus conhecimentos, obrigado pela disponibilidade e tempo concedido;
À minha família, de forma muito especial aos pais, irmãos, que sempre me encorajaram nos
momentos mais difíceis;
Aos meus amigos pela força, amizade e coragem transmitidas;
Ao Drº Vitor Reis pela disponibilidade concedida e tempo dispensado;
Às colegas da CPCJ de Arouca pela informação partilhada e tempo disponibilizado;
Ao meu filho Henrique e ao meu irmão Pedro em que tantas vezes pensei cada vez que via
um documentário, notícia ou filme sobre crianças vítimas de maus tratos, a eles um muito obrigado
por estarem sempre comigo e puderem partilhar a felicidade de serem crianças felizes;
Ao meu marido João Paulo a quem tanto tempo privei mas que me deu força nos dias de
maior tempestade e me alimentou a chama para puder ingressar e concluir esta etapa.
Um obrigado muito especial a todos os profissionais que lutam pela prevalência dos Direitos
das Crianças.
UM OBRIGADO ESPECIAL…. a todos os que não refiro mas que me ajudaram a elencar este
trabalho.
18. Definição(ões), fatores, consequências e prevalência………………………………
1.1 Definição de maus tratos infantis ………………………………………………………..
1.2 Fatores de risco e fatores de proteção ………………………………………………..
23
Atuação nos maus tratos infantis ……………………………………………………………
26
26
30
APRESENTAÇÃO DO ESTUDO EMPÍRICO
37
Enquadramento do estudo e objetivos ……………………………………………………
Método ………………………………………………………………………………………………….
39
40
2.1 Participantes ………………………………………………………………………………………..
2.2
Instrumento
de
recolha
de
dados
40
43
…………………………………………………………
2.3 Procedimentos de recolha de dados e de análise de dados
1.
2.
Prevalência dos maus tratos infantis em Portugal ………….......................
3.2 O papel da escola na deteção e prevenção dos maus tratos infantis …...
CAPÍTULO II
19
3.1 Enquadramento legal em Portugal ……………………………………………………….
3.
6
14
1.3 Consequências os maus tratos infantis …………………………………………………
2.
6
44
………………….
CAPÍTULO III
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
1.
Ideias dos profissionais de educação de infância, intervenção precoce no
2.
âmbito da problemática dos maus tratos infantis……………………………………
Práticas dos profissionais de educação de infância, intervenção precoce
45
47
5
19. no âmbito da problemática dos maus tratos infantis……………………………….
57
Considerações Finais …………………………………………………………………………………………………………
65
Referências Bibliográficas …………………………………………………………………………………………………
69
Anexos
Anexo I
Anexo II
79
81
Lei 147/99 de 1 de Setembro …………………………………………………………………….
Questionário - Maus tratos infantis: Ideias e práticas dos profissionais de
Educação de Infância do Ensino Regular e do Ensino Especial
…………….
8
83
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1
Sinais, sintomas e indicadores de maus tratos físicos
Tabela 2
Sinais, sintomas e indicadores de maus tratos psicológicos
Tabela 3
Sinais, sintomas e indicadores de abusos sexuais
Tabela 4
Sinais, sintomas e indicadores de negligência
Tabela 5
Fatores de risco associados aos maus tratos infantis
Tabela 6
Consequências psicossociais e orgânicas das crianças vítimas de
Tabela 7
maus tratos
Caracterização sócio - demográfica dos participantes
Tabela 8
Distribuição dos participantes em função da formação específica
Tabela 9
na área dos maus tratos infantis
Distribuição dos educadores de infância do regular em função do
8
8
10
12
13
16
21
41
42
1
1
1
1
2
4
4
4
20. Tabela 10
local e tipo de estabelecimento de funções
Distribuição dos educadores de intervenção precoce em função da
42
Tabela 11
integração em ELI e número de elementos constituintes
Distribuição dos participantes em função do tipo de maus tratos
43
Tabela 12
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do
papel dos profissionais de educação quanto à deteção dos maus
Tabela 13
Tabela 15
Tabela 16
50
5
52
Distribuição dos participantes em função do seu conhecimento
sobre entidades/instituições que apoiam crianças vítimas de maus
5
52
tratos
Distribuição dos participantes em função das medidas para
melhorar a intervenção dos profissionais na área dos maus tratos
5
53
Tabela 17
infantis
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do
Tabela 18
impacto da denúncia na criança
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do
55
Tabela 19
impacto da denúncia na família
Distribuição dos participantes em função do conhecimento de
56
Tabela 20
casos de maus tratos infantis
Distribuição dos participantes em função do tipo de casos de maus
57
Tabela 21
tratos infantis conhecidos
Distribuição dos participantes em função da experiência de
58
Tabela 22
denúncia de casos de maus tratos infantis
Distribuição dos participantes em função das entidades com maior
58
Tabela 23
frequência de denúncias
Distribuição dos participantes em função do feedback obtido após
59
Tabela 24
denúncia de casos de maus tratos infantis
Distribuição dos participantes em função dos procedimentos
60
adotados ou a adotar no caso de suspeita ou evidência de maus
62
tratos infantis
4
5
tratos
Distribuição dos participantes em função do conhecimento geral
sobre a legislação
4
49
tratos infantis
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do
papel dos profissionais de educação face à problemática dos maus
Tabela 14
48
4
5
5
5
5
5
5
6
6
21. ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1
Hierarquia de intervenção para a promoção dos direitos e
Figura 2
proteção da criança e do jovem em perigo
Níveis de prevenção e respetivas entidades intervenientes
2
28
3
32
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do
seu conhecimento técnico para atuar perante um caso de maus
tratos infantis
5
51
25. Falar da problemática dos maus tratos infantis é um assunto tão complexo como a sua
própria existência. A nível mundial existem cerca de 3500 crianças até aos 15 anos de idade que
morrem todos os anos vítimas de maus tratos, sendo as crianças com idades mais precoces as que
mais sofrem (UNICEF, 2005). De acordo com a UNICEF, Portugal é o país com maior taxa de incidência
de maus tratos a crianças e jovens, verificando-se em cada cem mil crianças portuguesas com menos
de 15 anos, três a sete mortes vítimas de maus tratos (Rosa, com citado em UNICEF, 2005). Por sua
vez, os dados estatísticos apresentados recentemente sobre os maus tratos infantis em Portugal pela
Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens (2010) revelam que as crianças até aos 6 anos de
idade são aquelas que mais sofrem de abusos, particularmente as do sexo feminino.
As atrocidades cometidas outrora e que se flagelam ainda nos nossos dias constituem
objeto de preocupação a nível social, político e científico (Martins, 2002). Os fatores associados aos
maus tratos infantis, quer as consequências que podem advir desses, têm sido alvo de estudo no
sentido da sua prevenção. Esta responsabilidade torna-se de maior envergadura para as escolas em
geral, e para os profissionais de educação em particular, uma vez que a escola é o espaço educativo
mais precoce que a criança frequenta e onde se socializa (Moreira, 2007). Os profissionais de
educação que fazem parte do dia-a-dia de muitas crianças vítimas de maus tratos desempenham
assim um papel fulcral na prevenção, na deteção e na intervenção rápida e precoce destas situações
de forma a minimizar os riscos decorrentes dos maus tratos (Magalhães, 2004). Apesar da relevância
do seu papel nesta problemática, pouco se sabe em Portugal sobre as práticas subjacentes à
prevenção e à intervenção no âmbito dos maus tratos infantis por parte de profissionais de educação
que atuam junto de crianças com idades compreendidas até aos 6 anos.
Neste sentido, pretendemos com este trabalho, enquadrado no âmbito do Mestrado em
Educação Especial da Escola Superior de Educação Jean-Piaget de Arcozelo, contribuir para o estudo
dos maus tratos infantis em Portugal através da análise da problemática junto de profissionais de
educação que desempenham funções com crianças entre os 0 e os 6 anos, incluindo aqueles que
acompanham crianças abrangidas por serviços de Intervenção Precoce. Especificamente, o presente
estudo pretende aprofundar o conhecimento sobre as ideias e as práticas de profissionais de
educação de infância relacionadas com a problemática dos maus tratos infantis.
3
26. A presente dissertação encontra-se organizada em três capítulos. No primeiro capítulo,
intitulado Enquadramento concetual e empírico dos maus tratos infantis, tratamos de forma breve de
alguns aspetos considerados essenciais para a compreensão da problemática em questão. Assim,
começamos por fazer referência à definição de maus tratos infantis e diferentes tipologias, aos
fatores de risco e de proteção que potenciam ou desencadeiam os maus tratos a crianças, às
consequências que os maus tratos podem deixar na criança a curto, médio e longo prazo e à
prevalência da problemática em Portugal. Num segundo ponto, abordamos as medidas de apoio às
crianças vítimas de maus tratos e organismos associados, referindo a legislação que vigora
atualmente em Portugal nesta área de atuação. Por fim, fazemos referência ao papel da escola e dos
profissionais de educação enquanto agentes primários na prevenção dos maus tratos a crianças.
No segundo capítulo apresentaremos o estudo empírico, nomeadamente o seu
enquadramento, os objetivos desta investigação e o método apresentado, onde são discriminados os
participantes, os instrumentos utilizados e os procedimentos de recolha e análise de dados.
No terceiro capítulo, serão apresentados e discutidos os resultados obtidos no presente
estudo, tendo por referência os objetivos delineados, assim como investigações prévias
desenvolvidas no domínio dos maus tratos infantis.
Como nota conclusiva apresentaremos algumas considerações sobre os principais
resultados obtidos no presente estudo, as limitações e algumas propostas de intervenção, ao nível da
problemática dos maus tratos infantis.
4
29. 1.
Maus tratos infantis: Definição(ões), fatores, consequências e prevalência
1.1
Definição e tipologias de maus tratos infantis
A problemática dos maus tratos infantis tem sido alvo de grande evolução. A partir do
século XX, o problema passou a fazer parte da consciência e do conhecimento comum e científico,
nomeadamente quanto às suas implicações, fatores, formas de manifestação, medidas de prevenção,
sinalização e intervenção (Canha, 2000). No entanto, estabelecer uma definição de maus tratos
infantis consensual é um desafio (Azevedo & Maia, 2006). O conceito de maus tratos infantis não
possui uma definição única, uma vez que este pode obedecer a critérios distintos em função da
cultura, ainda que seja consensual que qualquer situação que coloque em perigo ou em risco a vida e
o desenvolvimento das crianças é uma situação de maus tratos. Barudy (1998) refere a necessidade
de formular uma definição adequada do conceito de forma a facilitar a emergência de critérios de
identificação e programas de prevenção. De Paúl e Arruaberrena Madariaga (1996), sublinham que
para avaliar uma situação de mau trato há que ter em conta a frequência, a intensidade e a
intencionalidade do comportamento.
Para Leandro (1988), o fenómeno dos maus tratos é uma realidade complexa e que
necessita de uma abordagem interdisciplinar, sistémica e global desde o domínio da investigação à
própria prevenção, uma vez que só assim tomaremos uma visão mais global e integrada espelhando a
verdadeira realidade. Assim, assente no princípio que toda a criança tem direito a cuidados básicos de
saúde, bem-estar, desenvolvimento integral, direitos sociais, económicos e cívicos, Barudy (1998)
define maus tratos como todos os atos ou omissões praticados pela sociedade em geral, ou por um
indivíduo, e que priva as crianças dos seus cuidados, e que não lhes garanta os seus direitos e
liberdades.
Por sua vez, Magalhães (2002, p. 33) refere que os maus tratos infantis podem ser definidos
como qualquer:
7
30. “forma de tratamento físico e (ou) emocional, não acidental e inadequado,
resultante de disfunções e (ou) carências nas relações entre crianças ou jovens e
pessoas mais velhas, num contexto de uma relação de responsabilidade, confiança e
(ou) poder. Podem manifestar-se por comportamentos activos (físicos, emocionais ou
sexuais) ou passivos (omissão ou negligência nos cuidados e (ou) afectos). Pela
maneira reiterada como geralmente acontecem, privam o menor dos seus direitos e
liberdades afectando, de forma concreta ou potencial, a sua saúde, desenvolvimento
(físico, psicológico e social) e(ou) dignidade.”
Finalmente, importa referir que para o Ministério da Saúde:
“Os maus tratos constituem um fenómeno complexo e multifacetado que se
desenrola de forma dramática ou insidiosa, em particular nas crianças e nos jovens,
mas sempre com repercussões negativas no crescimento, desenvolvimento, saúde,
bem-estar, segurança, autonomia e dignidade dos indivíduos. Pode causar sequelas
físicas (neurológicas e outras), cognitivas, afectivas e sociais, irreversíveis, a médio e
longo prazo ou, mesmo, provocar a morte” (Despacho nº 31292/2008 de 5 de
Dezembro como citado em Azevedo & Maia, 2006).
Posto o presente verifica-se uma grande diversidade de definições do conceito de maus
tratos infantis (Calheiros, 2006; Fávero, 2003; Kaufman, 1983; Magalhães, 2005, entre outros) e que
está inevitavelmente associada à abrangência do fenómeno em causa, daí a pertinência de se
diferenciar os vários tipos de maus tratos para uma melhor compreensão, prevenção e intervenção
dos mesmos (Azevedo & Maia, 2006; Martins, 2002). No entanto, Azevedo e Maia (2006) sublinham
que este processo de categorização torna-se também ele complexo dado que uma criança pode ser
vítima de diferentes tipos de maus tratos em diferentes períodos da sua vida.
A literatura revela-nos o consenso entre vários autores no que concerne à existência de
quatro tipos de maus tratos, nomeadamente: (1) maus tratos físicos, (2) maus tratos psicológicos, (3)
abuso sexual e (4) negligência (e.g., Azevedo & Maia, 2006; Calheiros, 2006; Canha, 2000; Magalhães,
2002; Martins, 2002). Neste sentido, assumindo que compreender a complexidade de cada tipo de
mau trato é de extrema relevância para a identificação, prevenção e intervenção junto da criança e
dos restantes membros envolvidos, passamos a referir de forma mais aprofundada de cada um dos
tipos de maus tratos infantis.
8
31. Maus Tratos Físicos
Cantón Duarte e Cortés Arboleda (1997) denominam por mau trato físico um conjunto de
comportamentos perpetrados pelos familiares biológicos ou adotivos, ou outras pessoas a quem foi
delegada a responsabilidade da criança, que colocam a vida da criança em perigo nomeadamente ao
nível físico social ou emocional (como citado em Azevedo & Maia, 2006). Estes comportamentos
podem ser, segundo Magalhães (2002), atos intencionais cometidos de forma isolada ou repetitiva à
criança por parte do adulto através do abuso de poder, confiança e responsabilidade e que provoca
nestas lesões físicas. Podem ocorrer através de situações de espancamento, empurrões, golpes feitos
com objectos, pontapés, sufocação, intoxicação, infanticídio, mordeduras, trabalhos pesados e
inadequados à idade da criança, entre outros (Azevedo & Maia, 2006; Magalhães,2002; Martins,
2002; Moreira,2004).
Na tabela 1 podemos encontrar, segundo vários autores, sinais ou sintomas associados às
práticas dos maus tratos ao nível físico.
Tabela 1.
Sinais, sintomas e indicadores de maus tratos físicos (adaptado de Magalhães, 2005, Prazeres, 2008)
Equimoses, hematomas, escoriações, queimaduras, cortes e mordeduras em locais pouco comuns aos
traumatismos de tipo acidental (face, periocular, orelhas, boca e pescoço ou na parte proximal das
extremidades, genitais e nádegas);
Síndroma da criança abanada (sacudida ou chocalhada);
Alopécia traumática e/ou por postura prolongada com deformação do crânio;
Sequelas de traumatismo antigo (calos ósseos resultantes de fratura);
Fraturas das costelas e corpos vertebrais, fratura de metáfise;
História inadequada ou recusa em explicar o mecanismo da lesão pela criança ou pelos diferentes
cuidadores;
Perturbações do desenvolvimento (peso, estatura, linguagem);
Alterações graves do estado nutricional;
Perturbações do desenvolvimento (peso, estatura, linguagem);
História inadequada ou recusa em explicar o mecanismo da lesão pela criança ou pelos diferentes
cuidadores;
História de lesões repetidas.
Maus tratos psicológicos
9
32. Entende-se por mau trato psicológico todo o “acto de natureza intencional caracterizado
pela ausência ou inadequação, persistente ou significativa, activa ou passiva, do suporte afectivo e do
reconhecimento das necessidades emocionais do menor” (Magalhães, 2002, p. 35), assim como “a
ameaça de abandono ou obstaculização consciente das iniciativas de interação da criança, que pode
ir do evitamento ao confinamento” (Martins, 2002, p. 111). Para Sani (2006) refere que o mau trato
psicológico inclui comportamentos de hostilidade e indiferença prejudiciais à auto-estima da criança e
que diminuem o sentido de realização e sentimento de pertença. Realça-se ainda como abusos
psicológicos os insultos verbais, humilhação, exposição ao ridículo, desvalorização pessoal, ameaças,
atitudes discriminatórias, assistência a formas de violência doméstica, culpabilização permanente,
abandono, rejeição (Magalhães, 2002), entre outros conforme nos é apresentado na Tabela 2.
De Paúl e Arruabarrena Madariaga (199) atentam à diferença entre mau trato psicológico e
abandono emocional, uma vez que o primeiro ultrapassa situações do foro emocional, abarcando
quer as dimensões cognitivas e as afetivas, tais como hostilidade verbal crónica através do insulto,
depreciação, crítica ou ameaça de abandono e impedimento das iniciativas de interação da criança.
Por abandono emocional entende-se a ausência de resposta aos sinais, expressões emocionais e
comportamentos de proximidade e interacção iniciadas pela criança e pela falta de iniciativa de
interacção e contacto por parte de uma figura adulta estável.
Sumariamente, pode considerar-se por mau trato psicológico todo o ato que
conscientemente aterroriza, menospreza e nega o bem-estar da criança, fruto da incapacidade que os
progenitores ou responsáveis pela criança têm para assegurar o bem-estar, a tranquilidade da
criança, nomeadamente ao nível emocional e afetivo, critérios básicos para o pleno desenvolvimento
da criança (Sani, 2006).
Importa no entanto referir que apesar desta distinção, o mau trato psicológico ou
emocional é de difícil deteção e operacionalização, daí a sua avaliação ser mais subjetiva e relativa
(Azevedo & Maia, 2006; Magalhães, 2005). Na Tabela 2 encontram-se sintetizados, segundo vários
autores, sinais ou sintomas associados às práticas dos maus tratos psicológicos.
Tabela 2.
Sinais, sintomas e indicadores de maus tratos psicológicos (adaptado de Alberto, 1999, Magalhães, 2005,
Prazeres, 2008)
Comportamento ou ideação suicida;
10
33.
Episódios de urgência repetidos por cefaleias, dores musculares e abdominais sem causa orgânica aparente;
Choro incontrolável no primeiro ano de vida;
Alterações do controlo dos esfíncteres (enurese, encoprese);
Excessiva ansiedade ou dificuldade nas relações afetivas interpessoais;
Perturbações do comportamento alimentar;
Comportamentos agressivos (autoagressividade e/ou hétero-agressividade) e/ou automutilação.
Perturbações funcionais (e.g., anorexia, bulimia, sono, alterações do controlo dos esfíncteres (enurese,
encoprese), episódios de urgência repetidos por cefaleias, dores musculares e abdominais sem causa
orgânica aparente;
Perturbações cognitivas (e.g., atraso na linguagem, dificuldades de aprendizagem, alterações na
concentração, memória e atenção, perturbações de memória)
Perturbações afectivas (e.g., choro incontrolável no primeiro ano de vida; sentimentos de vergonha e culpa,
medos, timidez, imaturidade inadequada)
Perturbações no comportamento (e.g., desinteresse pessoal, défice de ludicidade, ansiedade ou dificuldade
nas relações afetivas interpessoais, isolamento, afastamento, medo, timidez, problemas escolares,
comportamentos desviantes, relações sociais passivas, agressividade, falta de confiança…)
Comportamentos agressivos (e.g., auto-agressividade e/ou hétero-agressividade)
Alterações do foro psiquiátrico (e.g., mudanças súbitas de comportamento, neuroses, alterações de
personalidade, falta de integração entre o pensamento e a linguagem, ansiedade, depressão.
Abuso Sexual
Tal como as tipologias de maus tratos já referidas, o abuso sexual levantam algumas
questões na sua definição (Azevedo & Maia, 2006). Tendo por base os trabalhos de autores como
Papalia e colaboradores (2001), Alarcão (2002, p. 119) define abuso sexual como:
“qualquer actividade ou exploração da criança, com o objectivo de provocar
prazer, excitação e/ou gratificação sexual ao adulto, podendo ir desde a exibição
até á violação, como por exemplo: exibição de órgãos sexuais de adultos,
exploração corporal através da masturbação e contactos sexuais forçados, relações
sexuais ou participação activa em cenas pornográficas…”.
Nesta linha de pensamento, López Sánchez (1999) e o National Center on Child Abuse and
Neglect (1978, como citado em Fávero, 2003) consideram que para se definir abusos sexuais é
necessário ter em consideração os conceitos de coerção (força física, pressão ou engano) e assimetria
de idade cuja impede a verdadeira liberdade de decisão, impossibilitando uma atividade sexual
conjunta dados os participantes terem experiências, maturidade biológica e expetativas diferentes.
Realçando estes critérios, a organização National Center of Child Abuse and Neglect propõe como
definição de abuso sexual: “os contactos entre uma criança e um adulto através dos quais se utiliza
uma criança como objecto gratificantes para as necessidades e desejos do adulto, interferindo ou
podendo interferir esta experiência no desenvolvimento normal da saúde da criança (como citado em
11
34. Azevedo & Maia, 2006, p. 36), sendo esta atividade praticada entre uma criança e um adulto maior
que ela (5 ou mais anos), mesmo que não haja coerção (Cantón Duarte & Cortés Arbodela, 1997,
como citados em Azevedo & Maia, 2006).
Martinez Roig e De Paúl (1993) salientam ainda que este tipo de abuso pode apresentar-se
em três categorias:
a)
Pedofilia: delito homossexual ou heterossexual para/ com uma criança;
b)
Hebofilia: comércio sexual de adolescentes por parte dos adultos;
c)
Incesto: relações sexuais entre familiares.
Segundo a literatura de referência (e.g., Fávero, 2003; López, 1999; Magalhães, 2002), os
abusos sexuais não implicam necessariamente contato físico. Coexiste abuso com/ou sem penetração
sexual, toques e carícias intencionais em determinadas regiões do corpo, exibição de vídeos ou
imagens pornográficas, utilização de objetos para estimular a excitação, masturbação perante uma
criança, exibição dos órgãos sexuais à criança, sedução verbal, posar para filmes e fotografias de
fórum sexual.
No que concerne à visibilidade social, a par dos maus tratos psicológicos, os abusos sexuais
são difíceis de detetar, visto ocorrerem maioritariamente na esfera familiar (Magalhães, 2002, pp. 3435). Na Tabela 3 sintetizamos os sinais e sintomas característicos de crianças/jovens vítimas de
abusos sexuais.
Tabela 3.
Sinais, sintomas e indicadores de abusos sexuais (adaptado de Lopez, 1999, Magalhães, 2005, Prazeres,
2008)
Lesões externas nos órgãos genitais (eritema, edema, laceração, fissuras, erosão, infecção);
Gravidez;
Presença de esperma no corpo da criança/jovem;
Infeções de transmissão sexual;
Lassidão anormal do esfíncter anal ou do hímen, fissuras anais;
Prurido, dor ou edema na região vaginal ou anal;
Equimoses e/ou petéquias na mucosa oral e/ou laceração do freio dos lábios;
Leucorreia persistente ou recorrente;
Laceração do hímen;
Lesões no pénis ou região escrotal.
Perturbações funcionais (e.g., anorexia, bulimia, terrores nocturnos, dores abdominais);
Perturbações do foro sexual e psiquiátrico;
Comportamentos desviantes e bizarros;
12
35.
Comportamentos agressivos
Relações empáticas pobres;
Condutas sexualizadas (e.g., masturbação compulsiva, desenhos ou brincadeiras sexuais explicitas; interesse
e conhecimentos desadequados sobre questões de foro sexual.
Negligência
Barudy (1998) entende por negligência os atos ou comportamentos deliberados ou
extraordinariamente negligentes por parte dos cuidadores da criança que não correspondem à
satisfação das suas necessidades básicas que, de acordo com Canha (2000), podem incluir cuidados
básicos de higiene, alimentação, afeto e saúde, cuidados. Este tipo de mau trato pode ocorrer de
forma consciente ou por ignorância, ausência de formação e informação, pobreza e/ou
incompetência parental (e.g., Canha, 2000; Martinez Roig & De Paúl, 1993).
Para Polansky e Chalmers (1981, como citado em Azevedo & Maia, 2006, p. 33), a
“negligência é um fenómeno silencioso e fácil de negar, uma vez que concerne a gestos não
realizados e uma falta de acção causada pela indiferença”.
Importa referir que existem dois tipos de negligência: a negligência emocional e a
negligência física. Por negligência emocional entende-se a ausência sistemática de resposta por parte
dos pais ou responsáveis pela criança aos sinais emitidos por esta (pranto, sorriso), bem como às suas
expressões emocionais e comportamentos de busca de proximidade e interação (Martins, 2002). Este
tipo de mau trato pode tomar percursos incontornáveis com consequências graves a curto e longo
prazo para a criança na medida em que as evidências são menos reveladoras e difíceis de detetar
(Azevedo & Maia, 2006). Por sua vez, considera-se negligência física a falta de capacidade ou omissão
dos adultos em facultarem à criança os bens necessários mais básicos à sua própria sobrevivência,
nomeadamente no que respeita à alimentação, vestuário, saúde, hábitos de higiene, acesso à
educação, cuidados de higiene com a habitação e até mesmo abandono (Martins, 2002).
Na Tabela 4 apresentamos informação sobre os sinais e/ou sintomas característicos de
crianças vítimas de negligência.
Tabela 4.
Sinais, sintomas e indicadores de negligência (adaptado de Magalhães, 2005, Prazeres, 2008)
13
36.
Inexistência de rotinas (nomeadamente, alimentação e ciclo sono/vigília);
Carência de higiene (tendo em conta as normas culturais e o meio familiar);
Hematomas ou outras lesões inexplicadas e acidentes frequentes por falta de supervisão de situações
perigosas;
Vestuário desadequado em relação à estação do ano e lesões consequentes de exposições climáticas
adversas;
Perturbações no desenvolvimento e nas aquisições sociais (linguagem, motricidade, socialização) que não
estejam a ser devidamente acompanhadas;
Incumprimento do Programa-Tipo de Actuação em Saúde Infantil e Juvenil e/ou do Programa Nacional de
Vacinação;
Doença crónica sem cuidados adequados (falta de adesão a vigilância e terapêutica programadas);
Intoxicações e acidentes de repetição.
Vitaminopatias;
Atraso no desenvolvimento sexual;
Perturbações de aprendizagem e absentismo escolar;
Chamadas de atenção para o adulto;
Relacionamentos entre pares pobres;
Comportamentos anti-sociais;
Tendência à fantasia;
Falta persistente dos cuidadores ou pais na procura e acompanhamento das crianças à escola e nos
cuidados de saúde.
Outras formas de maus tratos infantis
Apesar da literatura consultada referir de forma sistemática os quatro tipos de maus tratos
infantis abordados anteriormente, existem outros tipos de maus tratos igualmente puníveis, como
por exemplo, o abandono, a mendicidade, a prostituição infantil, o mau-trato intra-uterino, a
exploração do trabalho infantil e o mau trato institucional.
Tal como nos é apresentado os maus tratos à criança é um fenómeno complexo e que se
pode evidenciar de maneiras diversas, com maior visibilidade social (e.g., abusos físicos, negligência
ou abandono) ou com menor visibilidade social (e.g., abusos sexuais, maus tratos psicológicos) sendo
portanto mais difíceis de detectar. Apesar desta dualidade importa procurar identificar os principais
factores de risco ou causas que estão na origem dos maus-tratos. Sendo assim, dedicamos
seguidamente especial atenção aos fatores de risco que promovem os maus tratos e fatores de
proteção que ajudam a criança a superar os momentos e situações traumáticas de maus tratos.
1.2 Fatores de risco e fatores de proteção
14
37. Por fatores de risco entendem-se todo o tipo de “influências que aumentam a probabilidade
de ocorrência ou de manutenção de tais situações” (Magalhães, 2005, p. 45). Por consequência,
vários autores destacam a necessidade de compreender os fatores que levam à ocorrência e
perpetuação dos maus tratos infantis através de uma análise dinâmica e holística das interações
contínuas entre a criança, a família e o contexto social, atendendo às características da criança e dos
pais, à estrutura familiar, ao contexto cultural e socioeconómico (Alves, 2007; Azevedo & Maia, 2006;
Canha, 2003; Magalhães, 2002; Montano, sd; Prazeres, 2008). Na Tabela 5 sintetizamos os vários
fatores de risco identificados no âmbito da revisão de literatura.
Os fatores de risco relacionados com a criança estão intimamente ligados às características
físicas (e.g., idade, sexo, prematuridade) e de personalidade (e.g., apatia, conduta oposicionista, baixa
resposta a estímulos, insucesso escolar).
Relativamente aos fatores de risco associados aos pais, contemplam-se características
demográficas (e.g., idade, sexo, etnia), o historial de infância (e.g., maus tratos, carências afetivas), o
poder paternal (e.g., atitudes educativas inadequadas, precocidade/imaturidade), características de
personalidade (e.g., falta de expectativas, baixa auto-estima, patologias psicóticas ou depressivas) e,
por outro lado, as condutas desviantes (e.g., prostituição, delinquência, alcoolismo).
Ao nível do contexto familiar apresentam-se como fatores de risco características da própria
estrutura familiar (e.g., família reconstituída, mãe com vários companheiros, famílias numerosas), das
interações e dinâmicas familiares (e.g., ausência de regras familiares ou regras inadequada, punição
exagerada, papéis invertidos), assim como questões relacionadas com o nível socioeconómico e
cultural (e.g., desemprego, falta de expectativas profissionais), habitação (e.g., falta de condições de
habitabilidade, superlotação), rede social (e.g., isolamento social, estigma cultural e social) e
mobilidade geográfica (e.g., emigração, nomadismo).
Finalmente, ao nível dos fatores socioeconómicos e culturais, apontam-se como
características propícias aos maus tratos a crise económica e a instabilidade social, assim como
questões relacionadas com a ideologia social (e.g., atitudes face á família, infância e maternidade).
15
38. Tabela 5.
Fatores de risco associados aos maus tratos infantis (adaptado de Alves, 2007, Azevedo & Maia, 2006, Garbarino &
Ganzel, 2000, Magalhães, 2002, Montano, sd, Prazeres, 2008)
Demográficas:
- Idade, sexo
Características da
criança
Físicas:
- Prematuridade, deficiência física ou psíquica, sonos e
ritmos alimentares desregulados, problemas de saúde
crónicos
Personalidade e/ou conduta:
- Hiperatividade/ apatia, conduta oposicionista, baixa
resposta a estímulos, insucesso escolar
Demográficas:
- Idade/ sexo, estatuto
educacional, etnia
FATORES INDIVIDUAIS
socioeconómico,
nível
Historial de infância:
- Maus tratos, carências afetivas, ruturas familiares,
institucionalização
Características dos pais
Poder paterna:
- Precocidade/imaturidade, paternidade tardia,
excesso de atividade profissional, atitudes educativas
inadequadas
Personalidade:
- Isolamento social, impulsividade, fraco autocontrolo,
baixa auto-estima, limitações intelectuais severas,
patologias psicóticas ou depressivas, falta de
expetativas, filosofias e valores morais extremistas
Condutas desviantes:
- Prostituição, delinquência, alcoolismo,
toxicodependência
FATORES FAMILIARES
Estrutura familiar
- Famílias numerosas, escassa diferença de idades
entre irmãos, pais adolescentes, filhos não planeados,
família monoparental, família reconstituída, mãe com
vários companheiros, falta de suporte de família
extensa
16
39. Interação e dinâmica
familiar
Relações familiares:
- Violência familiar, défice no relacionamento conjugal,
fraca ou ausência de comunicação, ausência de regras
familiares ou regras inadequadas, ruturas consecutivas
da estrutura familiar, ausências duradoiras do
domicílio
Interação pais- filhos:
- Punição exagerada, papeis invertidos, ausência de
afetividade, escassez de interações, défice de
expetativas dos pais para com os filhos
Nível socioeconómico e
cultural
- Desemprego, falta de expetativas profissionais,
atividade profissional longa da mulher, rendimentos
baixos/ insuficientes
Habitação
- Falta de habitação, falta
habitabilidade, superlotação
Rede social
- Isolamento social, estigma cultural e social, ausência
ou reduzido apoio social
Mobilidade geográfica
Desenvolvimento
económico
FATORES CULTURAIS E
SOCIOECONOMICOS
Ideologia social
de
condições de
- Emigração, nomadismo, mudanças frequentes de
domicílio
- Crise económica, instabilidade social
- Atitudes face á família, infância e maternidade,
atitudes face à marginalização, atitudes face à
violência
17
40. Fatores de proteção
Segundo Azevedo e Maia (2006, p. 91), “as consequências dos maus tratos só podem ser
compreendidas se enquadradas num espaço e tempo desenvolvimental em que ocorrem,
considerando as características das crianças, os mecanismos protetores de que dispõe, e os
recursos, nomeadamente relacionais, a que pode aceder”. Surge, assim, a importância de
considerar os fatores de proteção, entendidos aqui como fatores que têm capacidade para
moderar ou reduzir os efeitos de risco identificados no próprio indivíduo, no meio e nas
interacções entre todos os contextos e intervenientes (Cicchetti & Carlson, 1989).
A resiliência, enquanto capacidade para uma adaptação bem-sucedida, apesar das
circunstâncias penosas, é considerada um fator de proteção determinante para as crianças
(Haggerty et al., 1996). Outros fatores apresentados como fontes de proteção dizem respeito aos
atributos individuais das crianças, entre eles, boas competências cognitivas, criatividade, autoestima elevada, locus de controlo interno e elevado controlo do ego, o temperamento da criança e
as relações de vinculação estabelecidas (Lombo, 2000), facilidade no relacionamento com os
outros, capacidade de antecipar as consequências dos seus próprios atos, capacidade de se
adaptar a novas e diferentes situações (Gross & Capuzzi, 2000, como citado em Fonseca et al.,
2004).
Salienta-se ainda como fatores de proteção a existência de relações familiares seguras e
adequadas, as quais podem impedir a ocorrência do mau trato, e/ou diminuir o impacto
psicológico da vítima e desta forma a contribuir para um bom funcionamento de todos os níveis
do desenvolvimento da criança (Lombo, 2000).
Em suma, para compreender o fenómeno dos maus tratos infantis importa conhecer os
múltiplos fatores associados à sua ocorrência, os quais atuam de forma interactiva, não podendo
ser entendidos de forma isolada. Importa, ainda, referir que determinadas características, quer da
criança, quer da família, podem constituir fatores de risco ou fatores de protecção, conforme o
contexto em que se desenvolve ou a etapa de desenvolvimento do indivíduo (Azevedo e Maia,
2006).
18
41. 1.3 Consequências dos maus tratos infantis
É vasta a evidência que mostra as consequências nefastas, persistentes e duradouras dos
maus tratos infantis para o desenvolvimento psicológico, físico e comportamental das crianças,
quer na infância, adolescência e em idade adulta (Azevedo & Maia, 2006). Além das consequências
que os maus tratos comportam a nível individual, esta problemática envolve igualmente custos
muito elevados na sociedade, quer ao nível da educação, justiça e cuidados de saúde (Butchart et
al., 2006; Pinheiro, 2006; WHO, 2007 como citado em Cid et al., 2010). Neste sentido, é
extremamente importante que se conheça os efeitos que os maus tratos podem comportar no
desenvolvimento da criança, não apenas no período de infância, mas também nos períodos de
desenvolvimento que se seguem, muitas vezes mesmo até à idade adulta de forma a implementar
estratégias preventivas e interventivas mais eficazes que conduzirão à diminuição da frequência e
da intensidade do fenómeno (Azevedo & Maia, 2006).
Segundo Magalhães (2002), as consequências dos maus tratos infantis dependem de
vários aspetos, nomeadamente:
a)
o tipo de mau tratos a que a criança ou jovem foram sujeitos;
b)
a duração da violência;
c)
o grau de violência a que foram submetidos;
d)
a idade da criança;
e)
o nível desenvolvimental da criança à data do mau trato;
f)
o grau de parentesco entre a criança e agressor;
g)
a personalidade da criança.
No entanto, para a autora as consequências são mais graves quando os maus tratos
ocorrem dentro do seio familiar, pois quebram-se laços de confiança e segurança, provocando
uma profunda ameaça ao desenvolvimento da criança (Magalhães, 2002).
Os maus tratos infantis dependem de vários fatores e que são o produto das interações e
transações entres as características das crianças, dos pais, e do ambiente em que a criança se
circunscreve e, deste modo, as suas consequências também só podem ser entendidas numa
19
42. perspectiva sistémica e na relação espaço e tempo desenvolvimental, os mecanismos protetores e
os recursos existentes (Azevedo & Maia, 2006).
Segundo Magalhães (2005), para além das consequências a nível orgânico e psicossocial,
a morte é a consequência mais grave dos maus tratos infantis. Estudos americanos referem que
76% das vítimas de maus tratos tiveram como consequência a morte tendo elas crianças com
idades compreendidas até aos 4 anos (Azevedo & Maia, 2006).
Os problemas psicossociais são aqueles aos quais devemos estar mais atentos, devido às
sequelas que podem advir e portanto a sua intervenção e prevenção tornam-se essenciais o mais
precoce possível (Magalhães, 2002). Apesar de existirem algumas consequências muito visíveis a
curto prazo no desenvolvimento psicológico, físico e social da criança vítima de maus tratos, estas
revelam-se de forma mais acentuada a médio e longo prazo, permanecendo como marca
traumática ao longo de toda a vida do indivíduo. No entanto, e segundo Magalhães (2002), estas
consequências ou períodos traumáticos podem ser minimizados se atempadamente houver uma
intervenção adequada. Na Tabela 6 destacamos algumas das consequências que os maus tratos
infantis podem trazer para o desenvolvimento das crianças a curto, médio e longo prazo, com
repercussões nefastas ao nível físico, cognitivo, comportamental, social, emocional, moral
(Azevedo & Maia, 2006; Cicchetti & Carlson, 1989; Figueiredo, 1998; Magalhães, 2005).
20
43. Tabela 6.
Consequências orgânicas e psicossociais das crianças vítimas de maus tratos (adaptado de Azevedo & Maia,
2006, Cicchetti & Carlson, 1989; Figueiredo, 1998, Magalhães, 2005)
Orgânicas
- défice de crescimento físico;
- doenças neurológicas;
- alterações hormonais;
- alterações no metabolismo.
Cognitivas
- défice intelectual;
- défice de linguagem;
- baixo rendimento académico;
- baixo rendimento profissional.
21
44. - isolamento;
- agressividade;
- dificuldades na percepção e aceitação das normas morais e sociais;
- sentimentos de culpabilidade;
- baixa iniciativa e motivação;
- violência conjugal;
Comportamentais
- maus tratos nos próprios filhos, reproduzindo a violência de que foi vítima em criança;
- violência e tentativas de suicídio associadas à gravidez e no período pós-parto;
- toxicodependência;
- prostituição;
-conduta anti-social e delinquente;
- maior reciprocidade nas relações de amizade;
- menor capacidade de resolver problemas sociais;
- menor tolerância á agressividade;
- maior acessos de cólera;
- menor capacidade empática;
- comportamentos agressivos e violentos (rapazes);
- comportamentos de passividade (raparigas);
- maior dificuldade na interacção com os pares;
- comportamentos exibicionistas;
- automutilação.
- baixa auto-estima;
- medo, angústia e raiva;
- disfunções sexuais;
Afetivas
- ideação e ou tentativa de suicídio.
- pouca expressão afetiva;
- falta de prazer e envolvimento;
- comunicação de afetos negativos;
- inconsistência e imprevisibilidade;
- ambivalência e ambiguidade;
- perturbações nas relações de vinculação;
- dificuldades as nível da expressão emocional;
22
46. 2.
Prevalência dos maus tratos infantis em Portugal
No âmbito da investigação da problemática dos maus tratos infantis assume-se de
particular interesse o estudo da sua prevalência, uma vez que nos permite perceber a verdadeira
dimensão do problema, contribuindo desta forma para uma melhor atuação e planificação, quer
ao nível da detecção, intervenção e prevenção ( Palacios, Moreno, & Jiménez, 1995). A nível
mundial, o fenómeno tem vindo a atingir grandes dimensões e Portugal parece não ser excepção.
De acordo com a UNICEF, Portugal é o país com maior taxa de incidência de maus tratos a crianças
e jovens, verificando-se em cada cem mil crianças portuguesas com menos de 15 anos, três a sete
mortes vítimas de maus tratos (Rosa, como citado em UNICEF, 2005). Além disso, parece existir
um aumento do número de sinalizações de crianças vítimas de maus tratos em Portugal (CNPCJ,
2012).
Na literatura é possível encontrar vários estudos sobre a problemática dos maus tratos
no nosso país (e.g., Canha, 2000; Figueiredo, 2004, Martins, 2005), ainda que com algumas
limitações de natureza metodológica que recomendam cautela na leitura das suas conclusões
acerca do panorama dos maus tratos infantis no nosso país (Almeida, 1995). Porém, não deixam
de ter a sua relevância e pertinência, nomeadamente porque servem para o avanço de outros
estudos e linhas de orientação para a intervenção e implementação de programas de prevenção a
nível local (Azevedo & Maia, 2006).
Em seguida, apresentamos de forma assumidamente sucinta um retrato da realidade do
nosso país quanto à problemática dos maus tratos infantis a partir dos dados publicados pela
Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens (CNPCJ, 2012), pelo que à data se consideram
os dados mais atualizados e abrangentes.
À semelhança dos relatórios anuais de avaliação dos anos de 2006 e de 2008 da CNPCJ,
durante o primeiro semestre do ano de 2012, o volume processual de sinalizações nas CPCJ era de
24
47. 52.166 crianças e jovens vítimas de maus tratos, das quais foram arquivadas cerca de 15.054. Estes
resultados sugerem que as intervenções dos técnicos e os programas de prevenção têm
demonstrado resultados positivos, nomeadamente na transmissão de conhecimentos aos
profissionais, assim como na sensibilização pública acerca da problemática (CNPCJ, 2012).
De acordo os dados relativos a 2012, tal como nos estudos anuais anteriores, as
sinalizações de maus tratos prevalecem em crianças com idades compreendidas entre os 11 e os
14 anos (29.9%), com predomínio do sexo masculino. O segundo escalão etário com um maior
número de sinalizações corresponde a crianças entre os 0 e os 5 anos (27.5%), sendo que mais de
metade corresponde a crianças entre os 0 e os 2 anos, sendo 15.5% do total de crianças
acompanhadas nos primeiros seis meses de 2012. Em terceiro lugar, surgem as sinalizações de
crianças com idades compreendidas entre os 6 e os 10 anos (24,3%), prevalecendo, mais uma vez,
o sexo masculino. O escalão etário com um menor número de sinalizações corresponde a jovens
entre os 15 e 21 anos (18,3%). Importa referir, ainda, que as entidades com maior número de
sinalizações de situações de perigo às CPCJ são os estabelecimentos de ensino (27.9%), seguindose as autoridades policiais (18%), pais/cuidadores (8.1%) e as CPCJ (7.1%).
No que se refere ao tipo de situações de perigo mais identificados nas CPCJ em 2012,
registaram-se os seguintes resultados: (a) 25.7 % dos casos são de negligência (e.g., falta de
supervisão e acompanhamento/familiar, negligência a nível educativo e/ou de saúde e a nível
psicoafetivo); (b) 25.2% dos casos dizem respeito a situações de exposição a modelos de
comportamentos que comprometem o bem-estar da criança (e.g., violência doméstica, consumo
de estupefacientes, consumo de álcool); (c) 17.5% dos casos envolvem comportamentos que
colocam em causa o direito à educação (e.g., absentismo escolar, abandono escolar, insucesso
escolar); (d) 10,8% dos casos dizem respeito a modelos de comportamento que possam
comprometer o bem-estar da criança (e.g., comportamentos graves de natureza anti-social e/ou
de indisciplina, bullying); (e) 6.1% dos casos estão relacionados com maus tratos físicos (e.g.,
ofensa física em contexto de violência doméstica e/ou por castigo corporal). De entre outras
situações de perigo sinalizadas menos representativas em termos de número, é de salientar o mau
trato psicológico ou ausência de afetividade (3,8%), o abuso sexual (2,4%), o abandono (1.6%) e a
prática de crime qualificado (1.1%).
25
48. Do total das medidas aplicadas pelas CPCJ, a maioria (88.4%) corresponde a medidas em
meio natural de vida, nomeadamente junto dos pais, enquanto as medidas de colocação
institucional representam 11.6% das situações. Salienta-se, no entanto, que dos 21.370 casos
instaurados com medidas de proteção, 6.238 casos (29%) correspondem a crianças entre os 0 e os
5 anos de idade e 30% correspondem a crianças com idades compreendidas entre os 11 e os 14
anos. Face aos dados apresentados, é particularmente preocupante o número de processos
instaurados, assim como, o número elevado de crianças institucionalizadas (CNPCJ, 2012).
Pese embora a relevância e abrangência destes dados, e à semelhança do que se passa a
nível mundial, é desconhecida a verdadeira realidade dos maus tratos a crianças, nomeadamente
quanto à sua incidência e prevalência, devido à sua complexidade, de onde emergem inúmeros
fatores (Azevedo & Maia, 2006). Urge, portanto, a necessidade de se desenvolver estudos de
natureza epidemiológica no nosso país, de forma a obter uma visão mais global e integrada da
verdadeira dimensão do problema (Magalhães, 2005).
26
49. 3. Atuação nos maus tratos infantis
3.1 Enquadramento legal em Portugal
Atualmente, vigora em Portugal a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei nº
147/99) (Anexo I), com o intuito de salvaguardar os direitos das crianças, visando a prevenção e
tratamento de situações de risco e perigo, delineando condições propícias à proteção e promoção
da segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral da criança de
forma a garantir condições psicológicas e físicas das crianças vítimas de maus tratos, exploração e
abusos.
De acordo com este documento legal (art. 3º, n.º 2), criança em perigo é aquela que (a)
se encontra em abandono ou entregue a si própria, (b) sofre maus-tratos físicos, psicológicos ou
abusos sexuais, (c) não recebe os cuidados básicos de sobrevivência ou de vinculação afeição
adequados; (d) é obrigada a trabalhos esforçados, falta de dignidade e situação pessoal ou
prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; (e) está sujeita a comportamentos que colocam
em causa a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional e, (f) assume comportamentos
desajustados à sua idade, como consumos ou prostituição colocando em perigo a sua saúde,
segurança, formação, educação ou desenvolvimento, sem que os pais, ou representante legal se
oponham perante tal situação (Pinto, sd).
No que se refere à intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do
jovem em perigo, o Artigo 4º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo indica os
seguintes princípios orientadores:
27
50. a) Interesse superior da criança e do jovem — “a intervenção deve atender
prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, sem prejuízo da consideração que
for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso
concreto”;
b) Privacidade — “a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem deve ser
efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada”;
c) Intervenção precoce — “ a intervenção deve ser efetuada logo que a situação de
perigo seja conhecida”;
d) Intervenção mínima — “a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas
entidades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção
da criança e do jovem em perigo”;
e) Proporcionalidade e atualidade — “a intervenção deve ser a necessária e a adequada à
situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é
tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente
necessário a essa finalidade”;
f) Responsabilidade parental — “a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais
assumam os seus deveres para com a criança e o jovem”;
g) Prevalência da família — “na promoção de direitos e na proteção da criança e do
jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem na sua família ou que promovam a
sua adoção”;
h) Obrigatoriedade da informação — “a criança e o jovem, os pais, o representante legal
ou a pessoa que tenha a sua guarda de facto têm direito a ser informados dos seus direitos, dos
motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa”;
i) Audição obrigatória e participação — “a criança e o jovem, em separado ou na
companhia dos pais ou de pessoa por si escolhida, bem como os pais, representante legal ou
28
51. pessoa que tenha a sua guarda de facto, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na
definição da medida de promoção dos direitos e de proteção”;
j) Subsidiariedade — “a intervenção deve ser efetuada hierarquicamente pelas entidades
com competência em matéria da infância e juventude, pelas comissões de proteção de crianças e
jovens e, em última instância, pelos tribunais”.
De acordo com o princípio da subsidiariedade, a acção intencional de salvaguardar os
direitos das crianças, visando a prevenção e tratamento de situações de risco e perigo processa-se
segundo uma hierarquia que estabelece três patamares de intervenção, articulados e
complementares (cf. Figura 1). No primeiro patamar, a intervenção passa pelas entidades com
competência em matéria da infância e juventude (ECMIJ), entre elas, as instituições ligadas à área
da saúde, educação, ocupação dos tempos livres. Perante a impossibilidade das ECMIJ atuarem de
forma adequada e suficiente para remover a criança da situação de perigo, as Comissões de
Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), incluídas no segundo patamar da hierarquia de
intervenção, iniciam a sua atuação. Finalmente, no terceiro patamar, faz parte a intervenção
judicial, que se pretende residual.
T
Tribunais
CPCJ
Comissão de Proteção de Crianças e Jovens
ECMIJ-- Entidades com competência em matéria de infância e
juventude
(Saúde, educação, Segurança Social, Forças Policiais,
autarquias, programas, Projetos, IPSS e ONG)
29
52. Figura 1.
Hierarquia de intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo
(adaptado de Montano, sd)
No âmbito da intervenção onde se preconizem todas as diligências para o bem-estar da
criança, o trabalho deve ser transdisciplinar. Ninguém nem nenhuma instituição podem agir de
maneira isolada. O conhecimento do risco e a responsabilidade deve ser partilhado por todos os
intervenientes no processo, nomeadamente a própria comunidade através de uma intervenção
primária, uma intervenção centrada na própria criança, no maltratante e em todos os envolvidos
no ecossistema da criança, ou seja, o trabalho transdisciplinar permite atenção da criança, criança
-família -contexto e desta forma assumir uma perspectiva global, sistémica, contextual ou
ecológica (Franco, 2007). Esta partilha passa necessariamente pela denúncia sempre que haja
suspeita ou conhecimento evidente de maus tratos infantis. Como nos refere a Lei 147/99, artigo
66º do Capitulo II, “a comunicação é obrigatória por qualquer pessoa que tenha conhecimento de
situações que ponham em risco a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade da criança ou
do jovem”.
As Comissões de Proteção de Crianças e Jovens desempenham um papel fundamental,
no centro do sistema e tem como funcionalidade não uma atuação judiciária (artigo 12º), mas que
com a colaboração da polícia e autoridades administrativas ou outras entidades, nomeadamente
as ECMIJ. Quando coordenada pelas ECMIJ ou pelas CPCJ, a intervenção necessita do
consentimento dos pais e a não-oposição das crianças quando têm mais de onze anos. Mediante
as medidas aplicadas pelas Comissões, ou em processo judicial por decisão negociada, devem
integrar um acordo de promoção e proteção (art. 36.º) de que constam (art. 55.º):
a) a identificação do responsável pelo acompanhamento do caso;
b) o seu prazo de vigência e de revisão do processo;
c) as declarações de consentimento ou de não-oposição necessários;
d) outras especificações de acordo com o tipo de medidas adoptadas.
A intervenção dos profissionais de educação e formação pode ser feita no âmbito das
famílias das crianças em risco ou perigo de acordo com as suas competências, articulando com
30
53. outras entidades com competência em matéria de infância e juventude, sempre com o
consentimento dos pais. Esta intervenção para além do diagnóstico passa pela programação e
aplicação de medidas e programas, mas também pela sensibilização, formação e ajuda nas
adequações de processos e métodos das pessoas maltratantes para com as crianças, visando
comportamentos mais adequados e sensíveis à família e à própria criança. Este trabalho exige
pluridisciplinaridade e envolvência para que a intervenção seja eficaz.
Segundo Magalhães (2002, p. 74) esta envolvência dos profissionais tem como objetivo:
a) “esclarecer os factos relativamente às circunstâncias que deram lugar à suspeita de
abuso;
b) avaliar a suspeita e o grau de perigo em que se encontra o menor (examinando a
informação disponível sobre ele e a família) e identificar as fontes;
c) fazer diagnóstico inicial, determinando se há matéria para preocupação: situação de
emergência ou situação de perigo;
d) intervir de imediato nos casos em que tal se justifique.”
3.2 O papel da Escola na deteção e prevenção dos maus tratos infantis
Tal como referido anteriormente, de acordo com a Lei de protecção de crianças e jovens
em perigo, Lei nº 147/99, de 1 de Setembro, “a comunicação é obrigatória para qualquer pessoa
que tenha conhecimento de situações que ponham em risco a vida, integridade física ou psíquica
ou a liberdade da criança ou do jovem”. Neste sentido, é fulcral que os profissionais de educação
estejam aptos para agir em conformidade, uma vez que, atualmente, as crianças passam grande
parte do seu tempo na escola, implicando diretamente estes profissionais na deteção e prevenção
dos maus tratos infantis (e.g., Abramhams, et al., 1992; Cid et al., 2010).
Por outro lado, os profissionais pelo contato diário que passam com as crianças e pelo
conhecimento do seu processo de desenvolvimento devem estar em condições para atuar face a
comportamentos irregulares e susceptíveis de alterações que possam induzir ao mau trato.
31
54. Concomitantemente, estes profissionais estabelecem com as crianças laços de empatia que
podem potenciar a confiança entre ambos de forma que as crianças possam partilhar e
confidenciar os seus problemas. Portanto, dos profissionais envolvidos pretende-se a
sistematização e a criação de sistemas estáveis, alicerçados na base da confiança e da
disponibilidade dos profissionais para com a criança (Lombo, 2000).
Importa, ainda, referir que os profissionais de educação, na interação que mantém com
os pais das crianças, podem observar e avaliar a atitude dos pais em relação à educação dos filhos,
a perceção que têm deles e as características da interação que mantêm com as suas crianças,
assim como conhecer as características do seu meio envolvente. Esta interação permitirá aos
profissionais observarem certos indicadores comportamentais dos pais e que de algum modo
possam conduzir a situações de maus tratos (Montano, sd). Sendo assim, é de relevância e de
responsabilidade de toda a comunidade educativa a deteção das crianças em risco ou perigo na
medida em que só assim, conseguem planear a sua intervenção e prevenção de forma
generalizada todo o tipo de situações, ou, quando for necessário, intervindo articuladamente com
outras entidades com competência em matéria de infância e juventude.
Apesar da legislação obrigar os profissionais de educação (ou qualquer cidadão) a
denunciar, alguns estudos têm mostrado que esta prática nem sempre é exercida, sendo que
alguns profissionais optam por não denunciar (e.g., Lombo, 2000; Martins, 1998). Os resultados
obtidos no âmbito de um estudo desenvolvido em Portugal com professores indicaram que, pese
embora a preocupação destes profissionais com esta problemática, os professores afirmaram
sentir pouca competência para reconhecer e sinalizar casos de maus tratos infantis. Além disso, os
resultados obtidos mostraram que, apesar da maioria (89%) destes professores não possuir
qualquer formação específica no domínio, aproximadamente metade (52%) considerou a
formação na matéria como uma “medida essencial para melhorar a sua intervenção” (Magalhães,
Ribeiro-Lopes, Matos, Airosa, & Amado, 2001, como citados em Cid et al., 2010, p. 125).
Além da ausência de formação, podemos encontrar como fatores dissuadores de
denúncia de casos de maus tratos infantis: a) incapacidade de reconhecer sinais indicadores de
abusos na criança; b) falta de conhecimento sobre as leis de protecção infantil e sobre os
procedimentos a tomar nestes casos; c) o receio de consequências da denúncia, com medo da
32
55. desaprovação por parte dos pais e a negação dos atos; d) as crenças e preconceitos pessoais dos
profissionais (Kenny, 2001); “e) as experiências passadas de denúncia e respostas institucionais
pouco positivas; e f) as características específicas do caso (características da criança, ou do alegado
abusador e circunstâncias da ocorrência” (Zellman, 1992, como citado em Cid et al., 2010, p. 125).
Com efeito, na sequência do reconhecimento dos profissionais de educação enquanto
agentes privilegiados para a deteção dos maus tratos infantis, exige-se que estes estejam
minimamente capacitados para atuar perante uma situação de maus tratos ou suspeita. Deste
modo, a deteção dos maus tratos, mais do que uma exigência pessoal, social e legal, torna-se uma
exigência pedagógica (Magalhães, 2005), cuja formação é extremamente necessária como referido
anteriormente.
A escola, em geral, e os docentes, em particular, além de constituírem agentes de
primeira linha na deteção e sinalização precoce dos maus tratos infantis, devem ser capazes de
adotar medidas de prevenção dos maus tratos infantis de modo a minimizar a ocorrência e a
reincidência dos maus tratos infantis.
A complexidade inerente aos maus tratos infantis, ou outras situações de perigo, implica
necessariamente estratégias de intervenção que tenham em conta os três níveis de atuação de
carácter preventivo associado a diferentes patamares de intervenção - Prevenção primária,
secundária e terciária, tal como é possível verificar na Figura 2 (Montano, sd). Apesar desta
delimitação, vários autores (Azevedo & Maia, 2006; Barudy, 1998; Magalhães, 2005) salientam
que estes três níveis devem ser trabalhados através duma dinâmica integrada e ecossistémica.
33
56. Figura 2.
Patamares de Prevenção e respetivas entidades intervenientes ( adaptado de Montano, sd)
Para Magalhães (2002), os três níveis de atuação devem ser concertados em políticas
integradas para a infância que partam do conhecimento concreto da realidade e, em particular, do
registo de vítimas de maus-tratos, e incluam: toda a sociedade em geral, os governos e as suas
instituições, as associações, as organizações não governamentais, escolas, universidades,
investigadores.
Por prevenção primária em contexto educativo entende-se ações desenvolvidas no
contexto educativo, pelos profissionais de educação, em cooperação com outras entidades,
dirigidas a todas as crianças e jovens e até às suas famílias, sem qualquer distinção, com o objetivo
de promover o seu bem-estar e de evitar casos de risco e perigo, por exemplo, ensinando as
crianças, além das matérias programadas para as disciplinas, outras competências necessárias à
34
57. prevenção de maus tratos (Montano, sd). Ao serem implementados programas de atuação
preventiva de carácter primário em contexto educativo os profissionais devem ter em conta os
seguintes aspetos:
a) Projeto educativo;
b) As mudanças do ambiente na implementação dos programas;
c) A formação de todos os profissionais que fazem parte do contexto educativo.
De acordo com Azevedo e Maia (2006), as ações devem ser delineadas por todos os
membros da comunidade educativa, incluindo temas transversais como educar para a saúde, para
a cidadania, para a sexualidade, prevenção de toxicodependências, prevenção da violência, entre
outros, fomentando, assim, o desenvolvimento das competências pessoais e sociais e mediação de
conflitos. Estes programas destinam-se a promover o desenvolvimento de dimensões da
personalidade e favorecem o bem-estar e o comportamento pró-social da criança (Montano, sd).
Na literatura (Azevedo & Maia, 2006; Cid et al., 2010; Montano, sd) é possível encontrar
vários programas a serem implementados nas escolas os quais envolvem todos os membros da
comunidade educativa e que de algum modo têm tido resultados muito positivos. Entre os
programas que estão a ser implementados nas escolas, importa destacar:
a)
Programas de resolução de conflitos nas escolas (e.g., não se pretende
eliminar os conflitos, antes ajudar a solucionar os problemas de forma adequada e justa);
b)
Programas de prevenção da agressividade e da violência entre pares (e.g.,
estes programas pretendem a adoção de medidas corretivas ou disciplinares
proporcionais ao carácter das infrações, e a aplicação de estratégias de prevenção
centradas nas componentes emocionais, cognitivas e comportamentais das crianças);
c)
Programas de educação para a saúde (e.g., consiste em dotar as crianças e
os jovens de conhecimentos, atitudes e valores que os ajudem a fazer opções e a tomar
decisões adequadas à sua saúde e ao seu bem-estar integral);
d)
Programas de promoção da "inteligência emocional" (programas de
autocontrolo emocional ou conhecimento das próprias emoções; empatia ou
reconhecimento das emoções dos outros; controlo e gestão das relações com os outros).
35
58. A prevenção secundária reporta-se ao domínio da actuação atempada, junto de grupos
vulneráveis, evitando a recorrência e a prevalência de um determinado problema (Caplan, 1964,
como citado em Montano, sd). Neste âmbito a actuação das Entidades com competência em
matéria de infância e juventude têm como objetivo de identificar as potenciais famílias que podem
maltratar suas crianças, de forma a prevenir-se maus tratos futuros.
Especificamente, entende-se por ações de prevenção secundária desenvolvidas em
contexto educativo, ou por esta em cooperação com outras entidades, todas as ações dirigidas às
crianças que apresentam fatores de risco, prevenindo e a minimizando as consequências e
prevenindo a ocorrência de maus tratos. Concomitantemente, desenvolvem-se programas e
estratégias específicas de apoio a essas famílias, nomeadamente na promoção das competências
parentais (Montano, sd).
Estas ações podem ser integradas no projeto curricular de turma ou da escola, no plano
de atividades ou nas atividades desenvolvidas pelos serviços de psicologia e orientação em
colaboração com outras entidades com competência em matéria de infância e juventude,
nomeadamente os serviços de ação social local, serviços de saúde, ACIDI (no que concerne a apoio
a imigrantes) e pelo IEFP através de contactos para o encaminhamento dos alunos para cursos
profissionais (Montano, sd).
Estes programas ao serem implementados nas escolas devem contemplar: (a) apoio e
aconselhamento às crianças e famílias de risco, através da sensibilização e informação para
eventuais ações que visam o bem-estar e as necessidades das crianças; assim como, ações para
compensar o rendimento académico nomeadamente através da aplicação das medidas do
Despacho nº 50/2005 de 9 de Novembro que envolve todos os profissionais através das
intervenções e avaliações das equipas multidisciplinares (Montano, sd).
Este tipo de prevenção deve assentar ao nível da promoção das competências individuais
através da modificação do ambiente e na redução ou eliminação das situações negativas, melhorar
36
59. as capacidades dos indivíduos para que consigam enfrentar as situações negativas da melhor
forma e superá-las. Por outro lado, este tipo de prevenção prevê que cada indivíduo consiga
desenvolver estratégias em resposta a problemas concretos e, por isso, defende-se que estes
programas devam ser incrementados a longo prazo (Azevedo & Maia, 2006).
Finalmente por prevenção terciária, entende-se as ações que se destinam a crianças
vítimas de maus tratos ou em situações de perigo, com intuito de a proteger. Este tipo de
prevenção prevê a minimização do impacto da situação vivida pela criança, impedindo a
revitimização/reincidência do ato nas crianças e suas consequências, através de ações de carácter
reparador e reabilitativo (Montano, sd).
Como exemplos de prevenção terciária em contexto educativo encontram-se programas
que fomentam:
a)
Integração dos alunos com processos de abandono escolar em Percursos
Curriculares Alternativos ou em outras medidas educativas de integração;
b)
Apoio psicológico às crianças vítimas de maus tratos;
c)
Programas de apoio a crianças vítimas de bullying e a crianças agressoras;
d)
Acompanhamento das crianças com medidas aplicadas pelas CPCJ ou tribunais.
Como referido anteriormente, existe uma multiplicidade de fatores que podem induzir
ao mau trato infantil e da mesma forma existem medidas e estratégias diversificadas para atuar na
deteção e prevenção. No entanto, estas medidas não podem ser implementadas de forma isolada,
visto a envolvência e a influência dos níveis sistémicos em que a criança se insere. Posto o
presente, destaca-se o papel primordial que é reconhecido às escolas e todos os profissionais que
fazem parte desse núcleo e que são considerados essenciais para a deteção e prevenção.
37
61. Depois do primeiro capítulo onde se apresentou a revisão bibliográfica que enquadra a
investigação realizada no âmbito da presente Tese de Mestrado, faremos no capítulo que se segue
a apresentação do estudo empírico.
39
62. 1. Enquadramento do estudo e objetivos
Os profissionais da educação têm um papel privilegiado no contacto com as crianças,
dado que estas passam grande parte do seu tempo em contextos educativos formais. Por
consequência, estes profissionais têm responsabilidades específicas relativamente a matéria de
infância e juventude, sendo-lhes delegado o papel de agentes prioritários e fulcrais na deteção e
na sinalização de situações de maus tratos ou de perigo, assim como na sua prevenção (e.g., Cid et
al., 2010; Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens, 2011; Kenny, 2001; Magalhães,
2004; Montano, sd).
Apesar do avanço significativo nas últimas décadas da investigação no que respeita à
problemática dos maus tratos infantis, principalmente no nosso país (Azevedo & Maia, 2006), é
escassa a investigação desenvolvida sobre esta temática com profissionais de educação que
atendem crianças dos 0 aos 6 anos, particularmente junto de profissionais de educação que atuam
diretamente com crianças com incapacidades ou em risco. Assim sendo, a investigação que
apresentamos no âmbito da presente dissertação visa contribuir para o estudo dos maus tratos
infantis em Portugal através da análise da problemática junto de profissionais de educação que
desempenham funções com crianças em idade pré-escolar, incluindo aqueles que acompanham
crianças abrangidas por serviços de Intervenção Precoce. Especificamente, o presente estudo
pretende aprofundar o conhecimento sobre as ideias e as práticas de profissionais de educação de
infância relacionadas com a problemática dos maus tratos infantis.
Para dar resposta aos objectivos definidos para o presente trabalho optou-se por levar a
cabo um estudo descritivo de natureza quantitativa.
2. Método
40
63. 2.1 Participantes
A amostra do presente estudo é de conveniência, tendo a sua seleção respeitado os
seguintes critérios: a) Os profissionais de educação deveriam ter formação na área de educação de
infância, de intervenção precoce; b) Os profissionais de educação deveriam estar em exercício de
funções junto de crianças dos 0 aos 6 anos.
A amostra do presente estudo é de conveniência, sendo constituída por 58 profissionais
de educação a exercer funções na região norte do país, nomeadamente 30 educadores de infância
do ensino regular (Grupo 1) e 28 educadores de intervenção precoce (Grupo 2).
Tal como é possível verificar na Tabela 7, os participantes são maioritariamente do
sexo feminino e têm idades compreendidas entre os 25 e os 56 anos (M = 39.22, DP = 8.05). A
maioria dos participantes é casada (Grupo 1 = 63.3%; Grupo 2 = 64.3%) e tem filhos (Grupo 1 =
66.7%; Grupo 2 = 64.3%).
Tabela 7.
41
64. Caracterização sócio - demográfica dos participantes
GRUPO 1
Educadores de
infância do regular
(n = 30)
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
Amostra total
(N = 58)
Sexo
Feminino
Masculino
26 (96.7)
1 (3.3)
27 (96.4)
1 (3.6)
56 (96.6)
2 (3.4)
Solteiro
Casado
Divorciado
7 (23.3)
19 (63.3)
4 (13.3)
7 (25)
18 (64.3)
3 (10.7)
14 (24.1)
37 (63.8)
7 (12.1)
0
1
2
3
4
10 (33.3)
6 (20)
10 (33.3)
3 (10)
1 (3.3)
10 (35.7)
7 (25)
9 (32.1)
2 (7.1)
0 (0)
20 (34.5)
13 (22.4)
19 (32.8)
5 (8.6)
1 (1.7)
Habilitações académicas
Bacharelato
Licenciatura
Pós-graduação
Especialização
Mestrado
4 (13.3)
15 (50)
6 (20)
3 (10)
2 (6.7)
1 (3.6)
9 (32.1)
4 (14.3)
12 (42.9)
2 (7.1)
5 (8.6)
24 (41.4)
10 (17.2)
15 (25.9)
4 (6.9)
Estado civil
Número de filhos
Quanto às habilitações académicas, verifica-se que a metade dos profissionais do Grupo
1 possui licenciatura (50%), sendo que mais de metade dos profissionais do Grupo 2 possui
formação pós-graduada (pós-graduação, especialização, mestrado).
A maioria dos profissionais, quer do Grupo 1 (96.7%) quer do Grupo 2 (92.9%), não
possui formação específica na área dos maus tratos infantis (cf. Tabela 8). Só uma percentagem
muito reduzida refere ter alguma formação complementar, nomeadamente, ações de formação,
palestras, congressos, entre outros.
Tabela 8.
Distribuição dos participantes em função da formação específica na área dos maus tratos infantis
42
65. GRUPO 1
Educadores de infância do regular
(n = 30)
1 (3.3)
29 (96.7)
Sim
Não
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
2 (7.1)
26 (92.9)
Amostra total
(N = 58)
3 (5.2)
55 (94.8)
No que respeita ao tempo de serviço, os profissionais do Grupo 1 têm em média
16.3 anos (DP = 10.17) e os profissionais do Grupo 2 têm em média 3.86 anos (DP = 2.01).
Conforme é possível verificar na Tabela 9, os educadores de infância do ensino
regular exercem maioritariamente funções em jardins-de-infância (73.3%), do ensino privado sem
fins lucrativos (60%).
Tabela 9.
Distribuição dos educadores de infância do regular em função do local e tipo de estabelecimento de funções
GRUPO 1
Educadores de infância do regular
(n = 30)
Local de funções
Tipo de estabelecimento
Creche
8 (26.7)
Jardim-de-Infância
22 (73.3)
Ens. Público
12 (40)
Ens. Privado sem fins lucrativos
18 (60)
De acordo com a Tabela 10, mais de metade dos profissionais de intervenção precoce
(53.6%) que constituem a amostra trabalham em Equipas Locais de Intervenção, constituídas por
técnicos na área de educação, saúde, psicologia, serviços sociais, fisioterapia e terapia ocupacional
e terapia da fala.
Tabela 10.
43
66. Distribuição dos educadores de intervenção precoce em função da integração em ELI e número de elementos
constituintes
Integração nas ELI
Número de técnicos das ELI
2.2
GRUPO 2
Educadores de intervenção precoce
Sim
15 (53.6)
Não
13 (46.4)
3-5
3 (9)
6-9
22 (83.7)
12-14
2 (7.4)
Instrumento de recolha de dados
Tendo em linha de conta os objectivos da presente investigação, optou-se por utilizar o
questionário (Anexo II) como técnica de recolha de dados. De acordo com Quivy e Campenhoudt
(1998, p. 188), o inquérito por questionário “consiste em colocar a um conjunto de inquiridos,
geralmente representativo de uma população, uma série de perguntas relativas à sua situação
social, profissional ou familiar, às suas opiniões, à sua atitude em relação a opções ou a questões
humanas e sociais, às suas expectativas, ao seu nível de conhecimentos ou de consciência de um
acontecimento ou de um problema, ou ainda sobre qualquer outro ponto que interesse os
investigadores”. Os mesmos autores sublinham que a utilização desta técnica é vantajosa na
medida em que, entre outras vantagens, garante o anonimato dos participantes, é pouco
dispendioso, não necessita de ser respondido no imediato e n ão expõe os inquiridos à influência
do investigador.
Para a construção do instrumento de recolha de dados do presente estudo tivemos
como referência a literatura no domínio dos maus-tratos infantis, assim como outros instrumentos
que têm sido utilizados em trabalhos de investigação sobre a temática (e.g., Fernandes, 2008;
Lombo, 2000; Martins, 2004; Neves, 2006). A versão final do questionário é constituída por duas
partes e inclui 13 questões de natureza distinta: fechadas e abertas. A primeira parte diz respeito a
questões relativas a variáveis sociodemográficas (e.g., sexo, idade, habilitações académicas) e
profissionais (e.g., formação inicial, categoria profissional actual, tempo de serviço como
educadora de infância e tempo de serviço em Intervenção Precoce). A segunda parte do
questionário inclui questões sobre as ideias e as práticas dos profissionais relacionadas com a
44
67. problemática dos maus tratos infantis, entre as quais: definição e tipologia dos maus tratos
infantis; posição dos profissionais relativamente à problemática; conhecimento pessoal sobre
casos de maus-tratos; procedimentos a tomar relativamente a uma suspeita ou evidência de mau
trato; conhecimento da legislação sobre a problemática e as entidades que apoiam crianças que
passam por este tipo de situações; impacto da denúncia na criança e na família; experiência de
denúncia e razões que a motivaram.
Previamente à fase de recolha de dados, realizou-se um estudo piloto do questionário
num grupo de educadoras de infância do ensino regular e de intervenção precoce não
participantes no presente estudo com o intuito de averiguar a clareza do conteúdo das questões.
Na sequência das questões e sugestões dadas pelas educadoras, foram realizados os devidos
ajustes ao questionário.
2.3 Procedimentos de recolha e de análise de dados
A recolha de dados decorreu entre Fevereiro e Maio de 2012. Para a distribuição do
questionário foram utilizados dois procedimentos. Inicialmente, optou-se pela distribuição portaa-porta junto de aproximadamente 80 profissionais e, posteriormente, face à recusa de muitos
profissionais no preenchimento do questionário, optou-se também pelo envio do questionário via
email a cerca de 70 profissionais. Na totalidade, foram entregues 150 questionários e
rececionados apenas 58, dos quais 12 via email. Importa referir que os motivos apresentados
pelos profissionais para recusar a participação neste trabalho prenderam-se, essencialmente,
com a complexidade da problemática em análise e por não se sentirem minimamente preparados
para o preenchimento do questionário.
A análise dos dados quantitativos realizou-se com recurso ao programa de análise
estatística SPSS, versão 19.0. Após a fase de introdução de dados, realizou-se uma primeira
verificação dos dados com o intuito de confirmar a ausência de erros neste processo. Tendo por
45
68. referência os objetivos do estudo, foram realizadas análises de estatística descritiva,
nomeadamente medidas de tendência central e de dispersão, a nível das diferentes variáveis em
estudo. Procedemos ainda a análise de conteúdo dos dados qualitativos obtidos através das
questões de resposta aberta.
CAPÍTULO III.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
46
70. Neste capítulo, e mediante os objetivos definidos para esta investigação, referidos
no capítulo anterior, apresentamos e discutimos os resultados obtidos de acordo com a
seguinte estrutura: (a) ideias dos profissionais de educação face à problemática dos maus
tratos infantis; (b) práticas dos profissionais de educação ao nível dos maus tratos infantis.
No final do capítulo, destacamos as considerações finais sobre a presente investigação.
1.
Ideias dos profissionais de educação sobre maus tratos
infantis
Relativamente às ideias dos profissionais sobre a definição de maus tratos infantis,
os resultados obtidos através da análise de conteúdo indicaram que a maior parte dos
participantes entendem maus tratos infantis como atos que põem em risco o
desenvolvimento integral da criança. Alguns dos participantes referem mesmo que os maus
tratos infantis constituem uma privação aos direitos da criança, reconhecendo algumas
consequências que podem advir de tais situações. Destacamos, em seguida, algumas das
respostas dos participantes:
“Maus tratos são atos sobre as crianças que põem em risco o seu
desenvolvimento biopsicossocial.” [E1, Grupo 1]
“Maus tratos são todas as atitudes de falta de respeito pelos direitos da
criança…” [E4, Grupo 1]
“Maus tratos infantis são uma forma desajustada de tratar as crianças,
incluindo comportamentos prejudiciais e abusivos em relação aquilo que a
criança tem direito, são o uso excessivo de poder físico e/ou psicológico.” [E7,
Grupo 2]
“Todo o acto que coloque em causa a integridade física, emocional,
psicológica, social e educativa da criança, de forma continuada ou esporádica,
mas com consequências nefastas.” [E20, Grupo 2]
48
71. “Maus tratos são o desrespeito pela criança enquanto ser humano,
privando-a de amor, alimento e educação. É expô-la a situações de violência
(física e psicológica) e de exploração que a afaçam crescer no medo, na
insegurança e na revolta.” [E30, Grupo 1]
“Falta de cuidados, assistência e tratamento…” [E28, Grupo 2]
Importa referir ainda que, além da ausência de resposta por parte de alguns
participantes, verificou-se imprecisão conceptual em algumas respostas. Estes resultados
podem estar associados ao facto dos maus tratos infantis serem um assunto complexo e
multifacetado, uma vez que abarca um conjunto de características, factores e
consequências relacionados com a própria criança e com o adulto que perpetra o mau trato
(Magalhães, 2004). Além disso, a ausência de formação dos participantes no domínio, tal
como descrito na caraterização dos participantes em função da formação específica (cf.
Tabela 8), também pode explicar estes resultados.
Relativamente à questão que se prendia com as ideias dos participantes sobre
tipologias de maus tratos infantis existentes, os participantes referiram quatro tipos,
nomeadamente, maus tratos físicos, maus tratos psicológicos, negligência e abuso sexual.
Tal como é possível verificar na Tabela 11, mais de metade dos participantes referiu maus
tratos físicos (Grupo 1 = 76.7%; Grupo 2 = 67.9%) e maus tratos psicológicos (Grupo 1 = 70%;
Grupo 2 = 67.9%). A negligência (Grupo 1 = 50%; Grupo 2 = 53.6%) e o abuso sexual (Grupo
1 = 30%; Grupo 2 = 42.9%) também foram tipos de mau trato infantil destacados pelos
participantes.
Mais uma vez, é preocupante perceber que 14.3% do Grupo 2 referiram não
conhecer nenhuma tipologia de maus tratos infantis. Este resultado pode estar relacionado
com a ausência de conhecimento na matéria ou, por outro lado, com a dificuldade em
estabelecer uma definição concreta do conceito e respetivas tipologias.
Tabela 11.
Distribuição dos participantes em função do tipo de maus tratos
GRUPO 1
Educadores de infância do
regular
(n = 30)
49
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
Amostra total
(N = 58)
72. Psicológicos
21 (70)
19 (67.9)
Físicos
23 (76.7)
19 (67.9)
Negligência
15 (50)
15 (53.6)
Abuso sexual
9 (30)
12 (42.9)
Não conhece nenhuma
0 (0)
4 (14.3)
tipologia
Nota. Os participantes referiram mais do que uma tipologia de maus tratos.
40 (68.9)
42 (72.4)
30 (51.7)
21 (36.2)
4 (6.9)
Reconhecendo o papel dos profissionais de educação enquanto agentes primários
de prevenção (Azevedo & Maia, 2006; Magalhães 2002; Moreira, 2007), colocou-se a
seguinte questão aos participantes: “Na sua opinião considera que a deteção dos maus
tratos infantis é um assunto que diz respeito aos profissionais de educação, nomeadamente
aos educadores de infância ou educadores de IP?”
Tal como podemos verificar no Tabela 12, a maior parte dos participantes (Grupo 1
= 96.4%; Grupo 2 = 96.3%) considera que a detecção dos maus tratos infantis é um assunto
que diz respeito aos profissionais de educação. Refira-se que aqueles (Grupo 1 = 3.6%;
Grupo 2 = 3.7%) que consideram não ter responsabilidade profissional nesta matéria,
justificam a sua posição com a falta de formação na área e a existência de outras entidades
com competência para uma melhor actuação junto de crianças vítimas de maus tratos.
Tabela 12.
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do papel dos profissionais de
educação quanto à deteção dos maus tratos infantis
Sim
Não
GRUPO 1
Educadores de infância
do regular
(n = 28)
27 (96.4)
1 (3.6)
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
Amostra total
(N = 56)
27 (96.3)
1 (3.7)
54 (96.4)
2 (3.6)
Procurou-se igualmente perceber de que forma os profissionais entendem esse
papel. Dos resultados obtidos (cf. Tabela 13), podemos destacar que mais de metade dos
educadores de infância consideram a sua atuação na problemática dos maus tratos infantis
50
73. como uma exigência pessoal (63.3%), um dever enquanto agentes educativos (66.7%) e um
direito das crianças (66.7%). Por sua vez, uma percentagem considerável de educadores de
IP assume o seu papel quanto à problemática dos maus tratos infantis como um direito da
criança (71.4%), uma exigência pessoal (64.3%) e uma exigência profissional (46.4%).
Tabela 13.
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do papel dos profissionais de
educação face à problemática dos maus tratos
GRUPO 1
Educadores de infância
do regular
(n = 30)
19 (63.3)
16 (53.3)
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
Exigência pessoal
18 (64.3)
Exigência profissional
13 (46.4)
Dever enquanto agente
20 (66.7)
12 (42.9)
educativo
Direito da criança
20 (66.7)
20 (71.4)
Obrigação perante a
10 (33.3)
11 (39.3)
comunidade
Nota. Os participantes seleccionaram mais do que uma opção de resposta.
Amostra total
(N = 58)
37 (63.8)
29 (50)
22 (55.2)
40 (69)
21 (36.2)
Para vários autores de referência no domínio (Magalhães, 2002; Moreira, 2007), é
uma obrigação social e legal e até uma exigência pedagógica das escolas detectar situações
de maus tratos. Neste sentido, considerando que as crianças passam grande parte do seu
tempo na escola e o tipo de relação que estabelecem com os professores, é imprescindível
que todos os profissionais de educação tenham formação específica nesta área para
reconhecerem os sinais de maus tratos o mais precocemente possível.
Apesar de grande parte da amostra do presente estudo não possuir formação
específica na área dos maus tratos infantis, tal como referido na caraterização dos
participantes (cf. Tabela 8), podemos verificar no Gráfico 1 que mais de metade dos
profissionais do Grupo 1 e do Grupo 2, consideram ter um grau razoável a bom de
51
74. conhecimento para atuar em caso de vitimização da criança. No entanto, importa salientar
que uma percentagem considerável de participantes de ambos os grupos avalia de forma
negativa os seus conhecimentos técnicos sobre maus tratos infantis.
Gráfico 1.
Distribuição dos participantes em função das suas ideias acerca do seu conhecimento técnico para
atuar perante um caso de maus tratos infantis
No âmbito do presente estudo procurou-se também analisar o conhecimento dos
profissionais sobre a legislação respeitante à denúncia dos maus tratos infantis. Tal como
referido anteriormente, de acordo com a Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens
em Perigo (Lei 147/99 de 1 de Setembro), a denúncia é obrigatória, podendo ser realizada
de maneira identificada ou anónima. Conforme é possível verificar na Tabela 14, mais de
metade da amostra (58.6%) tem conhecimento sobre a obrigatoriedade da denúncia.
Importa salientar ainda que, embora em número mais reduzido, existem profissionais que
colocam em dúvida a obrigatoriedade da denúncia (25.9%) ou mesmo desconhecem a
obrigatoriedade da denúncia de casos de suspeita ou evidência de maus tratos (12.1%).
Perante estes resultados, não podemos deixar de mostrar preocupação quanto ao nível de
52
75. conhecimento acerca da legislação no domínio dos maus tratos infantis por parte destes
profissionais.
Tabela 14.
Distribuição dos participantes em função do conhecimento geral sobre a legislação
GRUPO 1
Educadores de infância
do regular
(n = 30)
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
Amostra total
(N = 58)
A lei obriga a denúncia
17 (56.6)
17 (60.7)
34 (58.6)
Provavelmente a lei obriga a
denúncia
10 (33.3)
5 (17.8)
15 (25.8)
Não tenho conhecimento se
é obrigatório denunciar
3 (1)
4 (14.2)
7 (12)
Procuramos saber também quais as entidades que podem atuar junto das crianças
vítimas de maus tratos conhecidas pelos profissionais. Os dados obtidos nesta questão
foram analisados em função da hierarquia de intervenção para a promoção dos direitos e
proteção da criança e do jovem em perigo prevista na Lei de Promoção e Proteção de
Crianças e Jovens em Perigo (Lei 147/99 de 1 de Setembro).
Tabela 15.
Distribuição dos participantes em função do seu conhecimento sobre entidades/instituições que
apoiam crianças vítimas de maus tratos
ECMIJ
GRUPO 1
Educadores de
infância do regular
(n = 30)
30 (100)
GRUPO 2
Educadores de IP
(n = 28)
28 (100)
53
Amostra total
(N = 58)
58 (100)