1) A Revolução Inglesa marcou o fim da monarquia absoluta na Inglaterra e o início da democracia parlamentar.
2) A monarquia inglesa tornou-se dependente do Parlamento para obter financiamento, levando a concessões de poder ao longo do tempo.
3) Fatores como a Reforma Protestante e o surgimento do puritanismo enfraqueceram ainda mais o controle real sobre a sociedade e alimentaram o descontentamento com a monarquia.
1. Revolução Inglesa
Revolução Inglesa
“Foi a revolução das liberdades mais do que da liberdade, dos privilégios da fortuna ou da
educação mais do que da igualdade, da harmonia e do compromisso mais que da Fraternidade.”
Bourde, A J.
O
ano de 1648 ficou para sempre mar Com efeito, no decorrer do século XVI, a Ingla-
cado na memória dos europeus, afinal, terra conseguiu ultrapassar seus rivais ibéricos, assu-
terminava a terrível Guerra dos 30 mindo a condição de nação mais desenvolvida do con-
Anos que sangrou a Europa em três décadas de des- tinente. Os ingleses com uma inteligente, esperta e bem
truição. Com o término do conflito, França e Inglaterra aplicada política mercantilista, passaram do simples es-
se tornaram as nações mais poderosas do continente, tágio de produtores de fibra de lã, ao status de produ-
encerrando o longo período de hegemonia espanhola. tores da mais vigorosa manufatura têxtil da Europa,
Estranhamente, nesse mesmo ano, terminava também importando grande quantidade de lã de carneiro e drogas
a guerra civil inglesa, destronando a monarquia dos de tintura utilizadas na produção dos tecidos.
Stuart’s após a vitória das forças do Parlamento. Exportavam, em seguida, produtos têxteis de alto valor
Na época, poucas pessoas se deram conta da comercial, abastecendo quase todas as nações
importância do episódio, pois as atenções estavam européias. A fraqueza e debilidade dos países ibéricos
voltadas para o final do conflito europeu e a assinatura levou-os a aceitar essa humilhante situação.
dos acordos de paz. Na verdade, a derrubada da mo-
narquia significava a primeira revolução burguesa da
História, e sua influência se entenderia em vários epi-
sódios posteriores. A explicação para a precocidade
das mudanças inglesas encontra-se na peculiar evolu-
ção histórica desse país, que, em muitos aspectos, foi
diferente dos demais.
“Na Inglaterra durante o
século XVI houve um verdadeiro
boom no mercado de terras. Entre-
tanto, este fenômeno, ao invés de
provocar uma refeudalização,
como aconteceu na França, acele-
rou a desintegração da proprieda- Nos campos da Inglaterra, a produção de lã se
Quadro
de e das relações feudais”. desenvolveu com uma estrutura mercantil assentada
mostra a
em bases capitalistas. A penetração do capitalismo nas cidade de
áreas rurais deu-se pelo estímulo do mercado externo e Londres, em
Modesto Florenzano pelo crescimento do mercado interno. 1666.
2. O dinâmico núcleo mercantil tinha em Londres Entretanto, aqui, esse fenômeno ao invés de
seu “centro nervoso” e para lá convergiam todas as aten- provocar uma feudalização, como aconteceu na Fran-
ções, numa época em que ainda reinavam os monarcas ça, acelerou a desintegração da propriedade e das
absolutistas. No restante do país, a alteração da relações feudais. A existência de uma agricultura co-
estrutura agrária provocou uma significativa mudança mercial, com características capitalistas e de uma no-
na sociedade. A tradicional nobreza feudal empobrecida breza com mentalidade empresarial acabariam trans-
foi vendendo suas terras para uma moderna e formando a terra numa mercadoria, como outra qual-
progressista nobreza rural, logo apelidada de - gentry. quer, que se comprava e vendia livremente ”. 1
A “Revolução dos Preços” do final do século XVI, A contrapartida era a precária condição dos
desencadeou a espiral inflacionária que levou muitos camponeses ingleses. A transformação da estrutura
nobres feudais à falência, obrigando-os à venda de pro- fundiária expulsou centenas de pequenos
Revolução Inglesa
priedades por valores irrisórios. proprietários, impedindo-os de garantir a posse das ter-
A renovação no campo, designada como ras. A criação de ovelhas exigia mão-de-obra reduzi-
cercamentos, fez desaparecer a diferença entre o mun- da, excluindo diversos camponeses dessa opção de tra-
do rural e o mundo urbano. Os descendentes da antiga balho. As comunidades aldeãs foram desfeitas para des-
nobreza que ainda conseguiam manter as terras tive- pejar nas cidades uma quantidade imensa de habitan-
ram de se adaptar às novas regras da economia, optan- tes convertidos em mão-de-obra barata e abundante
do pela produção de lã que tinha mercado consumidor para as manufaturas burguesas. Completamente desar-
garantido. A criação de carneiros para a venda de lã, ticulada e desprovida de um projeto político, restaria à
indiretamente engajava-os nas mudanças capitalistas. população mais humilde um papel de coadjuvante nos
Na França, a maioria das terras ainda pertencia à nobre- acontecimentos, que conduziriam a Inglaterra ao iní-
za tradicional que resistia às transformações com receio cio da revolução.
de perder os infinitos privilégios. Foi preciso a revolu-
ção burguesa de 1789 para tirar o país da letargia feudal A MONARQUIA INGLESA
que atrasava a economia francesa.
Cercada por cortesãos e
damas de companhia ricamente
trajados, Elizabeth é levada
numa cadeira pelas ruas de
Londres, nessa pintura de 1600.
Esses desfiles e as visitas de
verão da rainha, ao interior eram
exercícios calculados de
propaganda: a opulência de seu
vestdo, a dignidade de sua
postura, até as palavras que
trocava graciosamente com os
espectadores destinavam-se a
firmar a leadade de seus súditos
à Coroa.
“Todas as mudanças sociais que estavam trans-
formando a sociedade inglesa da época tinham por No período de formação do Estado Moderno, a
base a terra, sua posse e seu uso. A propriedade da Inglaterra desenvolveu traços particulares distinguin-
terra, ainda a principal forma e fonte de riqueza, dava do-se do restante do continente. Na maioria dos países,
a quem a possuía prestígio social e poder. Por isso as os Parlamentos eram acessórios decorativos, somente
pessoas ligadas ao mundo dos negócios, às ativida- convocados em ocasiões excepcionais, a exemplo do
des urbanas, investiam suas fortunas na aquisição de Parlamento de Paris. Na Inglaterra, o Parlamento
propriedades rurais. Na Inglaterra, como de resto em desempenhava um papel fiscalizador em relação à
todo o continente, havia uma verdadeira compulsão, monarquia, coibindo eventuais abusos na cobrança
por parte da burguesia para adquirir terras. Durante de impostos.
o século XVI, houve um verdadeiro boom no mercado
de terras.
3. A Magna Carta de 1215, garantiu prerrogativas A casa real portuguesa sustentava-se com o açú-
importantes ao Parlamento, creditando vantagens à car de suas colônias, os reis espanhóis lotaram seus
nobreza e à burguesia. A casa parlamentar era consti- cofres com o ouro retirado da América, possibilitando
tuída da Câmara dos Lordes e Câmara dos Comuns, ao rei, autonomia para administrar as contas do tesou-
representando respectivamente nobres e burgueses. ro. Na França, a agricultura e o comércio de sal permiti-
Diferente de outras nações, a monarquia ingle- ram expressivas arrecadações sob controle direto da
sa não conseguiu a arrecadação de recursos próprios monarquia.
que lhe permitisse autonomia em relação aos outros
grupos sociais. A exploração colonial na América do
Norte realizou-se a partir da iniciativa do capital priva-
do e o comércio desenvolvido com as colônias portu-
Revolução Inglesa
guesas e espanholas, drenava a maior parte do capital
para a burguesia. A arrecadação de impostos do co-
mércio colonial era insuficiente para o sustento da corte,
levando-a ao recurso humilhante de pedir socorro aos
ricos burgueses através de petições ao Parlamento.
Diferente de suas
congêneres, a monarquia inglesa
não conseguiu a arrecadação de À medida que aumentavam
recursos próprios que lhe per- as necessidades financeiras da
mitisse autonomia em relação coroa, crescia o poder do Parla-
A criação de
aos outros grupos sociais. mento. Cada vez que o rei pedia carneiros e
ovelhas
dinheiro ao Parlamento, o Par- enriqueceu os
“Embora, no início, a câmara dos lordes fosse lamento extorquia certas con- novos
proprietários de
o corpo parlamentar dominante, no decorrer do sé- cessões régias. terra.
culo XVI ela perdeu gradualmente sua preeminência
quando os comuns consolidaram sua influência apoi-
ando lealmente a coroa. Com os Tudor, a câmara dos
comuns conquistara certos poderes e privilégios que “Os poderes especiais do Parlamento diziam
eram reais embora limitados. Tinha o direito de fazer respeito ao controle dos gastos do país. Embora o rei,
petições e levar protestos ao monarca, além de pro- na qualidade de grande latifundiário na Inglaterra e
porcionar um espaço importante para a veiculação de beneficiário de certos tributos feudais, possuísse
das queixas”2 renda independente para as despesas comuns da co-
O envolvimento em sucessivos conflitos en- roa, era obrigado a apelar para o Parlamento quan-
fraqueceu a monarquia tornando-a refém do capital do precisava de recursos suplementares - isto porque
burguês. Nos outros Estados europeus atenuava-se o só o Parlamento podia lançar impostos. Teoricamente
problema com explorações particulares realizadas di- isso devia funcionar muito bem. Com efeito, no começo
retamente pelos reis. do século XVII as fontes de renda do rei eram insufici-
entes para as suas necessidades.
O Tempo da História
SÉCULO XVI SÉCULO XVII 1640 1648 1658
CONSOLIDAÇÃO DECLÍNIO DO GUERRA CIVIL REPÚBLICA 1689
DO ABSOLUTISMO ABSOLUTISMO
PURITANA
1653 REVOLUÇÃO
. HENRIQUE VIII . JAIME I GLORIOSA
. ELISABETH I . CARLOS I ATOS DE
NAVEGAÇÃO
4. O
puritanismo
nasceu como
uma reação aos
maus costumes
da Igreja
Anglicana. Os
Revolução Inglesa
pastores
puritanos
conseguiram com
sermões e hinos
religiosos a
conversão de
muitos fiéis.
A rainha Elisabeth, profundamente endividada
vendera algumas terras da coroa, e a continuada in- PURITANISMO
flação reduzira o valor das restantes. À medida que
aumentavam as necessidades financeiras da coroa, Também na religião a monarquia inglesa não
crescia o poder do Parlamento. Cada vez que o rei teve muita sorte, mesmo criando o Anglicanismo, na
pedia dinheiro ao Parlamento, o Parlamento extor- época da Reforma Protestante. Henrique VIII enfren-
quia certas concessões régias. Dificilmente a situação tou o papa, rompeu com o catolicismo, fundando em
poderia ter sido mais instável.” 3 seguida, a Igreja Anglicana, em 1534. A atitude corajo-
No aspecto militar, a monarquia inglesa vivia sa serviu para reforçar a mística em torno do monarca
uma grande contradição. Sua marinha mercante estava e sua corte. Porém, logo cedo, constatou-se que o tiro
entre as melhores do mundo, mas em contrapartida, o havia saído pela culatra. A Igreja Anglicana que era um
exército real era despreparado para enfrentar conflitos clone mal feito da Igreja Católica, modificava apenas
de grande envergadura. A opção pela marinha concre- os aspectos formais, desprezando as alterações
tizou-se em função do temor de invasão do território exigidas pelos protestantes.
inglês. A frota naval assegurou a proteção do territó- O Anglicanismo nasceu da turbulência religio-
rio, provando sua eficácia na luta contra a Invencível sa da Reforma Protestante, porém, não conseguiu iden-
Armada, em 1588. O rei espanhol Filipe II pretendia tidade própria, limitando-se ao papel de “meio-termo”
destronar a rainha Elisabeth I, mas teve de se aceitar a perigoso. Não rompeu totalmente com o catolicismo,
perda de dezenas de navios afundados pela esquadra preservando ritos, hierarquias e privilégios anteriores
inglesa. Porém a mesma marinha que se mostrara zelo- e também não aderiu ao protestantismo com medo das
sa em defender a monarquia não vacilaria em apoiar a dissensões religiosas.
burguesia na crise que desencadeou a revolução em
1640.
O Tâmisa
congelava nos
invernos
rigorosos e os
“Os maiores inimigos
cidadãos faziam dos católicos eram os protes-
feiras sobre o
gelo, como se vê tantes rigorosos conhecidos
nesta pintura do
final do século
como puritanos — homens
XVII devotos e sérios que queriam
purificar a igreja da Inglater-
ra, removendo dela todos os
traços do papismo.
5. O vazio religioso deixado pelo Anglicanismo “À medida que Londres se tornava um dos mer-
foi preenchido pelo Puritanismo, religião originada das cados e centros mais prósperos do mundo, crescia o
pregações calvinistas. A degeneração dos pastores espírito comercial. As mercadorias abrilhantavam nas
anglicanos estimulou a conversão de fiéis à pregação ruas não iluminadas; um viajante que percorreu muitos
puritana. A maioria dos fiéis convertidos à nova reli- outros países, achou as joalherias de Londres as mais
gião se enquadrava no conceito social de burguesia suntuosas que vira até então. Negociantes comprimi-
ou pequena-burguesia. O Puritanismo propunha uma am-se pelos quarteirões, e alguns deles utilizavam-se
religião associada à imagem de retidão, honestidade e da nave da Catedral de São Paulo como escritório
amor a pátria, ao contrário do Anglicanismo, que se provisório, certos que Cristo modificara suas idéias
corrompera pelos cofres e favores da monarquia desde o advento de Calvino; advogados tratavam ali
Stuart’s. com seus clientes, homens contavam dinheiro sobre os
Revolução Inglesa
Ao confrontar o rei, a burguesia faria do Purita- túmulos e, no pátio, mascates vendiam pão, carne,
nismo a base ideológica e bandeira de seus ideais, peixes, frutas e cervejas. Pedestres, bufarineiros, car-
uniformizando os descontentes na luta contra o des- ruagens e carroças atravancavam as estreitas e lama-
potismo real. Os monarcas Stuart’s se encarregaram centas ruas”.
de incendiar o país, desencadeando uma perseguição O rio Tâmisa constituía a via principal, nele
atroz ao Puritanismo, acentuando o êxodo dos refugi- deslizando barcaças, balsas e barcos de passeio; em
ados em direção ao continente americano. qualquer ponto encontrava-se um barqueiro com seu
“Os maiores inimigos dos católicos eram os barco pronto para transportar mercadorias ou passa-
protestantes rigorosos, conhecidos como puritanos geiros de uma margem para outra, para descer ou su-
— homens devotos e sérios que queriam purificar a bir o rio. (...) A parte norte era o
igreja da Inglaterra, removendo dela todos os traços principal centro de comércio;
do papismo. Muitos deles tomaram suas idéias do ali, o negociante era o se-
reformador francês João Calvino, cuja insistência nhor e os lordes titu-
austera na salvação pela fé já dominara a igreja lados apenas tolera-
escocesa. Uma minoria puritana radical pertencia a dos; grande parte
uma diversidade de seitas dissidentes e não confor- da realeza e da
mistas que ficariam mais fortes no decorrer do século nobreza viviam
XVII. Esses homens estavam fortemente representa- em palácios
dos na câmara dos comuns”. 4 fora de Londres.
Apesar dos rigores e da fiscalização implacável We s t m i n s t e r,
do Estado absolutista, a burguesia inglesa desfrutava onde se reunia
de invejável condição econômica. A necessidade de o Parlamento,
enriquecimento do Estado havia estimulado o cresci- era então uma
mento das atividades econômicas através de uma série cidade à parte.
de leis de incentivo à construção de navios. A obriga- Também ali o
ção do consumo de peixe desenvolveu a pesca em todo homem de ne-
o país. A política protecionista criou dificuldades para gócios se fez
as mercadorias importadas, protegendo a próspera ma- ouvir; por vol-
nufatura nacional e a criação de uma série interminá- ta de 1600, ate-
vel de companhias de comércio. Em pouco tempo, a morizou a rainha e,
Inglaterra transformou-se num celeiro de navios, ma- meio século depois, de-
rinheiros e comércio. Desenvolveram-se manufaturas capitou o rei.” 5
de canhões, pólvora, ferro, tecidos leves, panos pesa-
dos etc. Além do mais, em 1545, uma eficaz reforma Vestido com
monetária estabilizou a moeda inglesa, tornando-a a armadura de
mais estável de todo o continente. cerimônia, o rei
A REVOLUÇÃO Carlos I da
Inglaterra lança um
olhar orgulhoso
A partir de 1603, o trono inglês foi ocupado por neste retrato feito
“Os maiores inimigos Jaime I, filho de Maria Stuart. Desde que assumiu a por um artista da
dos católicos eram os protes- monarquia, o rei não escondeu a simpatia pelo catoli- corte. A postura
régia na pintura é
cismo, tornando-se antipático para a maioria da popu-
tantes rigorosos, conhecidos lação. Tanto anglicanos como puritanos não admitiam
mais
impressionante
como puritanos — homens a política do monarca, de ostensiva aproximação com a que seu porte na
devotos e sérios que queriam Igreja Católica. Além do mais, os problemas econômi- vida real - era um
cos provocaram sucessivos atritos com o Parlamento, homem baixo, de
purificar a igreja da Inglater- levando o rei a fechá-lo entre 1614 e 1621. A morte do
compleição frágil e
gago - mas reflete
ra, removendo dela todos os rei não mudou o quadro, pois o filho, Carlos I, conse- com acuidade sua
guiu provocar mais confusões, acirrando os ânimos com concepção
traços do papismo”. os deputados do Parlamento. exaltada de realeza
6. A propagação das hostilida-
des obrigou Carlos I a deslocar-se
para o norte com as tropas leais à
sua autoridade. As forças solidárias
com o Parlamento concentraram-se
no sul, dividindo o país ao meio.
Nos primeiros anos da guerra
civil, houve o equilíbrio com ligeira
vantagem para as tropas reais, que
eram mais bem preparadas e experi-
entes. A vitória do Parlamento
Revolução Inglesa
tornou-se viável após o carismático
líder Oliver Cronwell assumir o
comando das tropas rebeldes. Com
firmeza, conseguiu transformar um
bando de rebeldes desordenados,
num grupo consistente e preparado
para a luta.
Durante meses a fio, Cronwell
treinou centenas de insurgentes,
conseguindo transformá-los no New
Model Army - Novo Exército Mode-
Insatisfeito com seus desafetos, o rei fechou o lo. Com o acirramento dos combates, a balança pen-
Representação Parlamento, comprando uma briga que não tinha como deu para o lado do exército de Cronwell. A presença
da época da sustentar. Logo em seguida, Escócia e Irlanda, regiões marcante de puritanos nas tropas do Parlamento, le-
execução de dominadas pela Inglaterra, iniciaram uma revolta de gou-lhes o apelido de “cabeças redondas”, em alusão
Carlos I
conotação religiosa, colocando em risco o domínio ao cabelo curto dos seguidores de Calvino. Depois de
inglês na região. Desprovido de um exército poderoso, oito anos de guerra civil, concretizou-se a vitória em
o rei Carlos I foi obrigado a 1648, após a captura do rei seguida da decisão de
recorrer ao Parlamento, enforcá-lo em praça pública.
solicitando recursos para ar- “Os pequenos senhores e os puritanos forma-
mar um exército capaz de en- ram o núcleo desse exército de liberdade. Oliver
frentar os insurgentes. Cronwell, da pequena nobreza rural, puritano faná-
A revolta na Escócia tico, desenvolveu uma especial atividade. Percorreu
e Irlanda colocou o Parla- os povoados à procura de todos os jovens fortes que
mento numa situação difícil, acreditavam em Deus. Este grupo de puritanos cres-
pois apoiando o rei fortalece- ceu sem cessar. No princípio eram sessenta; em se-
ria a monarquia a ponto de guida trezentos. Cole-
encorajá-lo a esmagar o pró- tas e ajudas proporci-
prio Parlamento. Deixando a onaram as armas e o
revolta se propagar, corria o dinheiro necessári-
risco de perder regiões im- os. Cronwell impôs
portantes para o abastecimen- uma férrea discipli-
to de matéria-prima e mão- na àqueles homens
de-obra. A indecisão do Par- vestidos de verme-
lamento fez o rei sentir-se lho.
fortalecido, encerrando as ati- Aos cavalei-
vidades parlamentares, até ros realistas que com-
No mapa, a que outra ordem fosse expedida em contrário. O impulso batiam com ardor pela
divisão das áreas do rei teve efeito detonador, desencadeando em 1640 a honra, opôs seus Ironsides
em conflito. reação parlamentar e incendiando a revolução. (Costelas de Ferro) que tinham uma paixão: sua fé.
Fonte: Leonel Foram distribuídas bíblias de bolso. Os próprios sol-
Itaussu. op. cit.
dados converteram-se em pregadores; a mística e a fé
foram as forças de choque daqueles soldados. No exér-
No exército revolucionário a cito revolucionário a hierarquia de valor substituiu
hierarquia de valor substituiu a do a do nascimento e os oficiais saíam dentre os comba-
tentes. Todos lutavam com ardor ao grito de: Religião,
nascimento e os oficiais saíam dentre Religião! ”. 6
os combatentes. Todos lutavam com
ardor ao grito de: Religião, Religião!
7. REPÚBLICA PURITANA A RESTAURAÇÃO PROVISÓRIA
A monarquia derrotada foi sucedida pela im- De imediato, Carlos II, o monarca da Restaura-
plantação da república, que representava o poder ção, prometeu realizar um governo constitucional em
controlado pelo exército rebelde e comandado por sintonia com o Parlamento. A certeza de ter escolhido
Cronwell de forma extremamente rigorosa. Na ótica dos o melhor caminho contagiou o Parlamento, levando-o
rebeldes, o poder ilimitado justificava-se pela a recepcionar o rei, num cortejo de 20.000 soldados. O
necessidade de conter os excessos de eventuais resis- palácio real ficou lotado de nobres de todas as regiões,
tências às medidas reformistas. No que se refere, à que disputavam o lugar mais próximo do rei. A
coação das classes populares, a República Puritana restauração da monarquia alterou a estética londrina,
Revolução Inglesa
pouca diferença fez em relação ao absolutismo. As aproximando a cidade dos padrões em evidência na
forças populares que haviam participado da revolução França de Luís XIV. O rei Carlos II viveu o exílio na corte
foram aniquiladas pelas milícias burguesas. O grupo do rei-sol, aprendendo com o anfitrião o gosto pelo
dos Niveladores — espécie de sem-terra e sem-em- luxo e suntuosidade. Nem a peste de 1566 foi capaz de
prego da época — foi eliminado por insistir no atrapalhar as realizações de Carlos II. Após o incêndio
aprofundamento das reformas sociais. que arrasou vários bairros londrinos, a monarquia deu
A ditadura de Cronwell cumpriu a expectativa início à reconstrução da cidade, modernizando-a e am-
da burguesia, consolidando a revolução nos pliando-a com novas construções, dentre elas, a mara-
parâmetros desejados pelos burgueses. No âmbito in- vilhosa catedral de São Paulo.
terno sufocou iniciativas populares e no âmbito exter- O que não esperava o Parlamento é que por de-
no golpeou a Holanda, que era a grande rival da trás da calma e prosperidade retumbava o coração in-
Inglaterra no comércio marítimo. Em 1653, Cronwell quieto do rei, procurando a oportunidade adequada para
decretou os Atos de Navegação, determinando a a monarquia de direito divino. O monarca, bem mais
restrição de transporte às mercadorias produzidas em esperto do que seus predecessores, aliou-se ao Parla-
solo inglês. Dali em diante, só os navios ingleses mento aproximando-se de parlamentares mais conser-
poderiam transportar mercadorias produzidas na vadores. Usando de chantagem, suborno e nomeações,
Inglaterra. conseguiu garantir uma base de apoio respeitável,
A medida foi um duro golpe na Holanda, pois, identificada com a vontade real.
durante várias décadas, os holandeses auferiram lucros
exorbitantes com os fretes de produtos ingleses. Para
garantir a eficácia das medidas de Cronwell, foi preciso
incentivar o crescimento da indústria naval e a
produção ligada à construção de navios. Surgiram cen-
tenas de empregos, dinamizando a economia, acele-
rando o ritmo de prosperidade. Com os Atos de Nave-
gação, a indústria naval foi obrigada a suprir a carên-
cia do mercado interno, gerando, em conseqüência, o
aumento da produção e o aparecimento de inúmeros
empregos.
A ditadura de Cronwell
cumpriu a expectativa da bur-
guesia, consolidando a revolu-
ção nos parâmetros desejados
Para garantir o esquema político aliou-se à Fran- Na pintura
pelos burgueses. ça, prevendo a necessidade de adquirir recursos do te- acima, o rei
Carlos II aparece
souro francês, na eventualidade de uma revolta bur-
dançando com
Cronwell morreu em 1658 após dez anos de guesa. Tudo indicava “pelo andar da carruagem” , que sua irmã Maria,
República Puritana. Ao contrário do que se esperava, a Inglaterra estava a um passo do retorno ao absolutis- princesa de
mo. Entretanto, a habilidade política de Carlos II e sua Orange
a burguesia optou pelo retorno da monarquia,
empossando no trono Carlos II, que era filho do rei capacidade de conciliar, deram gás para que terminasse
enforcado em 1648. A falta de opções entre as lideran- o reinado sem grandes sobressaltos. Em 1685, ao mor-
ças burguesas levou o Parlamento a escolher o certo rer, deixou o trono para seu irmão Jaime II.
pelo duvidoso, ou seja, era mais seguro ter um rei aliado O último reinado dos Stuart’s seria o mais breve
no governo do que arriscar o nome de algum de todos. A disposição de restaurar o absolutismo a
aventureiro que colocasse em risco as conquistas bur- qualquer custo selou o destino de Jaime II, mesmo por-
guesas. Além do mais, era difícil imaginar o monarca que, não era nem sombra do antecessor, Carlos II.
enfrentando o Parlamento e seus aliados.
8. direito constitucional. A força desse direito emanava
Antes de ocupar o trono, o rei já tinha anuncia- do povo e embora o sistema não fosse uma democra-
do a intenção de restabelecer o catolicismo como reli- cia, representava uma esmagadora maioria da po-
gião oficial. Em poucos meses de reinado, para mos- pulação cujas opiniões contavam no século XVII: a
trar que não estava blefando, nomeou diversos minis- nobreza, os proprietários de bens de raiz e os comer-
tros e oficiais da corte, identificados com a religião ca- ciantes abastados”. 7
tólica. No Parlamento, os deputados começaram a tra- Mas, dessa vez, para garantir efetivamente que
mar a derrubada do rei, que só não aconteceu de ime- nada desse errado, o Parlamento impôs ao novo mo-
diato, em função de sua idade avançada. Mas em 1688 narca a Declaração dos Direitos, lançando os funda-
aconteceu o inacreditável! O rei tornou-se pai de um mentos da monarquia de base parlamentar. Nos seus
garoto que seria o próximo monarca, permitindo mais termos mais importantes consagrava o Parlamento, co-
Revolução Inglesa
fôlego aos monarcas Stuart’s. A notícia foi a gota d’água locando-o acima da monarquia. Em nenhuma hipótese
para a articulação de bastidores visando a deposição poderiam os monarcas executarem leis, não aprovadas
do rei. no Parlamento. A criação da Monarquia Parlamentar
Agindo com rapidez, os parlamentares se alia- foi o primeiro golpe no absolutismo, prenunciando o
ram à filha de Jaime II, casada com o príncipe holan- que aconteceria um século mais tarde nas barricadas
dês, Guilherme de Orange. Ambos eram protestantes e da Revolução Francesa.
ajustados com os interesses do Parlamento inglês. Em Os acontecimentos que levaram à derrubada
novembro de 1688, uma força militar comandada por do absolutismo inglês foram acompanhados de perto
Guilherme de Orange cercou a cidade de Londres, exi- por John Locke, levando-o a escrever a magnífica obra
gindo a renúncia imediata de Jaime II. Abandonado pelo — Tratados sobre o Governo Civil. A prerrogativa de
seu próprio exército, o rei deposto foi para o exílio na o povo se rebelar quando os governos não agissem
França. A Revolução Gloriosa como foi chamada, ter- de acordo com o bem comum foi o combustível que
minou sem vio- incendiou rebeldes no mundo inteiro. Ironicamente, a
lência. Sem dispa- colônia inglesa da América do Norte foi a primeira a
rar um único tiro, seguir à risca os princípios revolucionários, voltando-
a burguesia, mais se contra os abusos da metrópole inglesa. A Declara-
uma vez, coorde- ção de Independência dos Estados Unidos, elaborada
nava o governo por Tomas Jefferson, foi inspirada na Declaração dos
em defesa de seus Direitos de 1689 e na obra de John Locke.
interesses.
“A impor- 1 In. Florenzano, Modesto. As Revoluções Bur-
tância da revolu- guesas. Editora Brasiliense. Coleção Tudo é História.
ção não residiu Pág 71.
no drama dos 3 In. Blitzer, Charles. A Era dos Reis. Biblio-
acontecimentos teca de História Universal Life. Livraria José Olympio
imediatos, e sim Editora. Pág 140.
nas conseqüênci- 4 In. Tyache, Nicholas. Op. Cit. Pág. 82.
as. No princípio 5 In. Durant, Will. A História da Civilização.
de 1689 reuniu- Começa a Idade da Razão. Editora Record. Pág. 45.
se um Parlamen- 6 In. Roland, Jacques-Francis. A Grande Aven-
to especial com o fito de dar um novo governo à Ingla- tura do Homem. Apud. Pazzinato, Alceu e Senise,
terra. Começou por aprovar a Declaração dos Maria Helena. História Moderna e Contemporânea.
O grande Direitos, estabelecendo as condições pelos quais a Editora Ática. Pág.86.
incêndio de Inglaterra iria ser governada. Tendo aceito essas con- 7 In. Blitzer, Charles. Op cit. Pág. 148.
Londres, em dições, Guilherme e Maria tornaram-se rei e rainha 9 In. Hill, Christopher. Apud, Elza Nadai e
1666, começou
numa padaria
da Inglaterra e o país converteu-se no primeiro Esta- Joana Neves. História Moderna e Contemporânea.
perto do rio do moderno a reger-se por um sistema coerente de Editora Saraiva. Pág. 34.
Tâmisa e ardeu
durante três dias
por 160 hectares Declaração dos Direitos do Homem - 1689
de casas de
madeira,
deixando 38 mil Artigo I - Que o pretendido poder de suspender as leis ou a sua execução pela autoridade real
pessoas sem sem o consentimento do Parlamento é ilegal.
teto. Artigo IV - Que toda arrecadação de dinheiro para uso da Coroa, sob pretexto da prerrogativa real
sem o consentimento do Parlamento, é ilegal.
Artigo V - Que é um direito dos cidadãos apresentar petições ao rei e que todas as prisões e
perseguições por petições são ilegais.
Artigo VIII - Que as eleições dos membros do Parlamento devem ser livres.
Artigo XIII - Que para corrigir todos os agravos, para emendar, garantir e manter as leis, é
necessário reunir freqüentemente o Parlamento. 1