SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 397
ESTUDOS DE COMPLEMENTAÇÃO DOS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS

        DA PCH PARANATINGA II PARA AS TERRAS INDÍGENAS

      PARABUBURE, UBAWAWE E PARQUE INDÍGENA DO XINGU




EMPREENDEDOR
PARANATINGA ENERGIA S/A
Av. Historiador Rubens de Mendonça n. 2000, Sala 1209
Edif. Centro Empresarial Cuiabá, Bosque da Saúde
Cuiabá / Mato Grosso. Cep 78.050-000. Fone (65) 2121-4400
Responsável: Sr. Manuel Gonçalves Martins (Diretor de Operação)




EXECUÇÃO
DOCUMENTO Antropologia e Arqueologia SS Ltda
Rua Alcides Mendes de Barros n. 116, Jardim Leopoldina, Carapicuíba /SP.
Cep 06382-330. Fones/fax: (11) 4169-4280 / 4169-9567
Email: arqueo@terra.com.br
Responsável: L.D. Dra. Erika Marion Robrahn-González




                                     2
INDICE


1. ANTROPOLOGIA      E   PATRIMÔNIO      CULTURAL      COM     ENFOQUE
  TRANSDISCIPLINAR                                                   6
  1.1 CONCEPÇÃO TEÓRICA DO PROGRAMA: DAS ABORDAGENS
     TRANSDISCIPLINARES EM ANTROPOLOGIA                              6
  1.2 DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO E O USO DO ENFOQUE DA
     ANTROPOLOGIA DA PAISAGEM                                       10
  1.3 TERRAS INDÍGENAS E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL                      14

2. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS                                       16
  2.1 CONCEITUAÇÃO GERAL                                            16
  2.2 PRODEDIMENTOS DE CAMPO NA PESQUISA DIAGNÓSTICA                24

3. OBJETIVOS DO PROGRAMA                                            26

4. LEGISLAÇÃO INTERVENIENTE                                         28

5. A ÁREA DE PESQUISA E COMUNIDADES ENVOLVIDAS                      32

6. ESTUDOS JUNTO À COMUNIDADE XAVANTE (TI PARABUBURE E
  UBAWAWE)                                                          37
  6.1 APRESENTAÇÃO                                                  37
  6.2 CARACTERIZAÇÃO LINGÜÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS
     POVOS XAVANTE                                                  43
  6.3 AS TERRAS INDÍGENAS PARABUBURE E UBAWAWE                      45
     6.3.1 Localização e situação fundiária da TI Parabubure        45
     6.3.2 Localização e situação fundiária da TI Ubawawe           49
  6.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DAS TERRAS INDÍGENAS            51
     6.4.1 Aspectos regionais                                       53
     6.4.2 Caracterização das TIs Parabubure e Ubawawe              78
  6.5 CARACTERIZAÇÃO DO MODO DE VIDA DO GRUPO INDÍGENA
     XAVANTE, COM ÊNFASE NA IMPORTÂNCIA DOS RECURSOS
     HÍDRICOS E VEGETAÇÃO/FAUNA RELACIONADOS                        95




                                   3
6.5.1 A territorialidade Xavante                                  95
     6.5.2 Caracterização do uso dos recursos naturais                 100
  6.6 RELAÇÃO     SÓCIO-POLÍTICA,       ECONÔMICA       E   CULTURAL   DO
     GRUPO INDÍGENA COM A SOCIEDADE ENVOLVENTE                         112
  6.7 LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES DE ATENÇÃO À SAÚDE                    115
  6.8 ANÁLISE DE IMPACTOS                                              117
  6.9 PROPOSIÇÃO DE MEDIDAS MITIGADORAS/COMPENSATÓRIAS 122
     6.9.1 Medidas mitigadoras                                         122
     6.9.2 Medidas Compensatórias                                      123

7. ESTUDOS JUNTO AOS POVOS DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU 128
  7.1 APRESENTAÇÃO                                                     128
  7.2 CARACTERIZAÇÃO LINGÜÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS
     GRUPOS INDÍGENAS                                                  140
     7.2.1 Caracterização lingüística                                  140
     7.2.2 Caracterização histórica e cultural                         144
  7.3 O PARQUE INDÍGENA DO XINGU                                       214
     7.3.1 Histórico do Parque                                         214
     7.3.2 Legislação Fundiária                                        216
  7.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DO PIX                             221
  7.5 CARACTERIZAÇÃO DO MODO DE VIDA DOS GRUPOS INDÍGENAS
     DO PIX, COM ÊNFASE NA IMPORTÂNCIA DOS RECURSOS
     HÍDRICOS E VEGETAÇÃO / FAUNA RELACIONADOS                         226
     7.5.1 Coleta e manejo da vegetação nativa                         229
     7.5.2 Agricultura                                                 238
     7.5.3 A pesca e a caça                                            250
     7.5.4 Calendário econômico-ecológico                              274
     7.5.5 O manejo informal dos recursos faunísticos                  279
  7.6 RELAÇÃO SÓCIO-POLÍTICA, ECONÔMICA E CULTURAL DOS
     GRUPOS INDÍGENAS COM A SOCIEDADE ENVOLVENTE                       288
     7.6.1 Organizações Indígenas                                      288
     7.6.2 Educação                                                    290
     7.6.3 Turismo Étnico                                              293




                                    4
7.6.4 Relações com a sociedade envolvente: o problema da
            degradação nas cabeceiras dos formadores do Xingu   298


   7.7 LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES DE ATENÇÃO À SAÚDE            304
   7.8 ANÁLISE DE IMPACTOS                                      308
   7.9 INDICAÇÃO DE MEDIDAS MITIGADORAS/ COMPENSATÓRIAS 325
      7.9.1 Considerações iniciais                              325
      7.9.2 Medidas Preventivas / Mitigadoras                   327
      7.9.3 Medidas Compensatórias                              330

8. BIBLIOGRAFIA                                                 337

9. EQUIPE TÉCNICA                                               346

ANEXOS:                                                         349

ANEXO 1 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DA TI PARABUBURE                  350

ANEXO 2 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DA TI UBAWAWE                     352

ANEXO 3 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU 354

ANEXO 4 – ANIMAIS SILVESTRES MENCIONADOS PELOS ÍNDIOS DO PIX,
           COM BREVE DESCRIÇÃO DE SUA UTILIDADE                 356

ANEXO 5 – PLANTAS NATIVAS ÚTEIS MENCIONADAS PELOS ÍNDIOS DO
           PIX, COM BREVE DESCRIÇÃO DE SUA UTILIDADE            360

ANEXO 6 – COORDENADAS GEOGRÁFICAS COLETADAS EM ALDEIAS,
           ROÇAS, CAPOEIRAS, ÁREAS DE CAÇA E PESCA, SÍTIOS
           ARQUEOLÓGICOS E OUTRAS LOCALIDADES NO PIX.           361

ANEXO 7– ATA DAS REUNIÃO REALIZADAS JUNTO ÀS COMUNIDADES
           INDÍGENAS DO PIX                                     369

ANEXO 8 – SIGLAS UTILIZADAS NO PRESENTE ESTUDO                  396




                                     5
1.    ANTROPOLOGIA           E    PATRIMÔNIO          CULTURAL          COM
      ENFOQUE TRANSDISCIPLINAR




1.1    CONCEPÇÃO TEÓRICA DO PROGRAMA: DAS ABORDAGENS
       TRANSDISCIPLINARES EM ANTROPOLOGIA



Atualmente os antropólogos têm questionado a plausibilidade e a utilidade de
uma antropologia dos mundos contemporâneos (Augé, 1998; García Canclini,
2000). Não se trata só de uma preocupação da Antropologia, mas, também, de
uma conjunção de fatos apontando para a construção de um objeto de estudo
cada vez mais complexo, ora pelos processos de imbricação entre as distintas
ciências sociais (que permite romper as fronteiras analíticas da especificação
disciplinar), ora pela influência política direta que os estudos em ciências
sociais vão adquirindo em nossas sociedades. Vale dizer que vamos exigindo
uma renovação e uma nova ponderação do espaço teórico-metodológico que
tem cruzado com a antropologia clássica (dos mundos exóticos constituídos
num exercício de alteridade profunda e por uma localização territorial fixa e
isolada), à luz do que devemos esclarecer sobre os nós que temos percorrido
no presente.


Como estímulo inicial à existência de uma renovação disciplinar surge o
problema a dimensionar, a saber, o de como a antropologia - com seus novos
projetos de analisar e perceber a realidade - pode assumir-se na prática de um
encontro de enfoques transdisciplinares (Friedman, 2001; King, 1991; Cardoso
de Oliveira, 1998; Boccara, 1999A; Viveros de Castro, 2002). Neste sentido,
para a prática antropológica já não cabe conceber uma abordagem etnográfica
com a única pretensão de abarcar um problema de pesquisa, num grupo
específico fixo, sem relacionar os esquemas locais, regionais e mundiais que




                                      6
confluem “no campo” (Ortiz, 2004b). Para alcançar este objetivo é necessário,
também, um novo tipo de profissional, capaz de compreender dinâmicas
integrais dos processos que estuda, e capaz, ademais, de integrar o trabalho
transdisciplinar como parte de seus fundamentos centrais para o planejamento
e execução de projetos específicos de pesquisa.

Neste ponto, o grande problema teórico surge quando são aplicadas visões
descontextualizantes, localizantes e essencializantes sobre os fenômenos de
estudo, o que tem gerado a partir de uma longa série de trabalhos, que vão
desde o particularismo histórico boasiano até os atuais enfoques pós-
estruturalistas e pós-modernos em Antropologia1.

Não obstante, os processos de mudança e transformação cultural, junto
com os espectros diversos desde os quais esses processos são gestados,
obriga a pensar uma relação estrutural, ao mesmo tempo em que conjuntural,
na qual se possam gerar descrições consistentes sobre processos particulares,
que do mesmo modo contribuam com visões interpretativas dispostas para a
construção de teorias regionais. Esta “estrutura da conjuntura”, ou a síntese
situacional entre a estrutura e o acontecimento, é uma realização prática das
categorias culturais num contexto histórico específico, tal como se expressa na
ação interessada dos agentes históricos, desenvolvendo-se em cada uma das
particularidades (Sahlins, 1997; Le Goff, 1991). Ao ocorrer isto, as sociedades
vão criando processos de construção de identidade cultural, o qual
desemboca ao mesmo tempo numa cristalização daqueles processos na
1
 Muitas destas críticas estão expostas nos trabalhos de Boccara, 1999a; Friedman, 2001;
Larraín, 2001; King, 1991; Saavedra, 2002, 2004. A respeito do grande problema teórico
insurgente da aplicação dos modelos do particularismo histórico boasiano, pós-estruturalistas e
pós-modernistas em antropologia, Boccara nos diz: ... quiçá seja importante insistir na idéia de
que a “pureza original” apenas exista na imaginação de quem assim a concebeu, como por
exemplo, nas utopias de certos nostálgicos do exotismo... [e que] o cientista social não deveria
deixar-se obstruir pelas concepções “naturalizantes” ou “arcaizantes” da sociedade e da
cultura. (Boccara, 1999b:32, traduçao livre do espanhol).Conseqüentemente, já que grande
parte destas concepções foram e são consignadas pelas etnografias sul-americanas para a
construção do panorama geral das relações inter-étnicas, a partir de registros sucintos e
objetos de estudo isolados (Viveros de Casto, 2002), temos uma tarefa adicional, qual seja,
corrigir e completar os quadros e visões gerais de análises etnográficas mais complexas a
partir de trabalhos integradores tanto teórica como metodologicamente. Isto comprometerá os
pesquisadores em adquirir ferramentas inéditas, capazes de abordar a mobilidade e as
transformações das sociedades e culturas a partir de relações inter-étnicas e inter-sociais
(Cashmore, 1996).




                                               7
história. Sem entender que as estruturas são componentes determinantes das
sociedades ao mesmo nível que os acontecimentos, poderíamos perguntar:
como se elaboram, na práxis, as categorias culturais? Neste ponto o aporte de
Sahlins é significativo. A “estrutura da conjuntura” permite indagar sobre os
processos sociais de uma forma muito mais elaborada e complexa, com os
procedentes desafios metodológicos e técnicos que esta questão requer
(Sahlins, 1997: 14-16)2. Com objetos de estudo mais dinâmicos é possível
planejar pesquisas mais integradoras e visões teóricas mais complexas.

A relevância dos estudos onde ficam envolvidos processos de conflitos
interétnicos, e que implicam compreender complexas intervenções sociais,
deve levar à definição de corpos teóricos que possam oferecer pontos de
sinergia para a posterior elaboração de uma metodologia transdisciplinar. Os
grupos humanos manejam uma ambigüidade estrutural para construir suas
identidades, suas economias e seus processos de transformação política,
porque nela descansam grande parte das expectativas por assegurar sua
sobrevivência e transcendência. A concepção e uso dos espaços materiais, em
relação às dinâmicas ou práticas culturais que dão forma e conteúdo ao dito


2
  Anteriormente a este ponto de vista, reinava a concepção estruturalista dos processos
históricos. Os aportes metodológicos são inegáveis. Não obstante, a etnologia concentrava-se
imponderavelmente nas revelações sincrônicas da realidade, fazendo perdurar certas
premissas que até hoje são imperativos inconscientes dos estudos antropológicos. O mesmo
Levi-Strauss, no Pensamento Selvagem, referia: “O etnólogo respeita a história, mas não lhe
concede um valor privilegiado. A concebe como uma busca complementar à sua: a uma lança
o leque das sociedades humanas no tempo, à outra no espaço... esta relação simétrica entre
etnologia e história parece ser rechaçada por filósofos que não crêem, implícita e
explicitamente, que o destacamento no espaço e a sucessão no tempo ofereçam perspectivas
equivalentes... a diversidade das formas sociais que a etnologia capta destacadas no espaço
oferece o aspecto de um sistema descontínuo; dessa forma imaginamos que, graças à
dimensão temporal, a história nos restitui não estados separados, mas, sim, de um estado ao
outro em uma forma contínua” (371). E prossegue: “A característica do pensamento selvagem
é ser atemporal; quer capte o mundo como totalidade diacrônica e sincrônica, e o
conhecimento que se toma pareça àquele que oferece, de uma habitação, espelhos fixados em
muros opostos que se refletem um ao outro... assim, o pensamento selvagem constrói edifícios
mentais que lhe facilitam a compreensão do mundo, por quanto se parecem, neste sentido,
definir como pensamento analógico... mas nesse sentido, também, distingue-se do
pensamento domesticado, do que o conhecimento histórico constitui um aspecto... (381) mas,
para que a práxis possa ser vivida como pensamento, é necessário primeiro (num sentido
lógico e não histórico) que o pensamento exista: vale dizer, que suas condições iniciais
estejam dadas na forma de uma estrutura objetiva do psiquismo e do cérebro que, na falta
desse último, não haveria práxis nem pensamento” (382).




                                             8
território, são as manifestações básicas da construção de qualquer identidade
(ver Hernández; 2003: 45).

Por identidade cultural – dentro desta perspectiva – compreendemos aquele
processo configurativo de práticas e manifestações culturais, presentes nos
grupos humanos que procuram uma cristalização de transcendência ligada à
sua permanência e reprodução. Não obstante, acreditamos que nunca se
alcança um grau real de cristalização e in-mobilidade histórica, e que também
não existe um início fundador (ou mito de origem real e objetivo das culturas).
As etnogêneses, nesse sentido, são sempre procedimentos construtivos,
apesar de que nas mentes dos indivíduos a representação daqueles processos
seja sempre mais estática e microscópica. Em conseqüência, o sistema de
identidades sociais, ao trabalhar indistintamente nas estruturas sociais e no
individuo, vai forjando um novo questionamento. Ao assumir que as identidades
são um processo constante de construção, presentes em um sistema, devemos
também admitir que são um fenômeno subjetivo, inter-subjetvo e, às vezes,
objetivo (Saavedra, 2002; Ortiz, 2004b). Dessa forma, poderemos afirmar uma
negativa teórico-metodológica de reduzir o trabalho antropológico a uma mera
tarefa de testificar e traduzir as realidades sócio-culturais estudadas.




                                         9
1.2   DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO E O USO DO ENFOQUE DA
      ANTROPOLOGIA DA PAISAGEM




Faz parte do objeto de estudo do presente trabalho conhecer os processos de
interação, apropriação e significação dos habitantes das TIs Parabubure,
Ubawawe e Parque Indígena do Xingu dentro de sua diversidade cultural,
assim como de seu entorno biótico, paisagístico e simbólico. Para que ele seja
bem definido, cabe-nos compreender a interpretação que esses grupos têm do
meio, assim como definir as estratégias diferenciadas e compartilhadas de
apropriação ambiental e, finalmente, relacionar tais aspectos com processos
etnopolíticos, territoriais e econômicos contingentes na área.

Aproximando-nos do nosso “objeto de estudo” surge a necessidade de definir
alguns marcos de apoio, úteis para o inicio do diálogo teórico. Enfrentando este
desafio e observando os atuais enfoques transdisciplinares para estudos de
contingência, surge-nos um conceito possível de abarcar nossas necessidades
específicas referentes à área de estudo. Tal conceito desenvolve-se a partir do
uso de uma Antropologia da Paisagem, plausível de integrar tópicos de estudos
ligados à ecologia (ou à etnoecologia), à interação das sociedades com os
espaços territoriais (etnopolítica e territorialidade), às configurações simbólicas
dos atores sobre seu entorno material e imaterial e, sobretudo, aos processos
de apropriação da paisagem num sentido holístico e histórico, integrando tanto
as estruturas sociais como culturais dos atores envolvidos.

Estudos de cunho antropológico na Amazônia têm contado com a ecologia
como ferramenta desde as décadas de 1960 e 70, com discussões
relacionadas tanto à densidade da ocupação na região, assim como ao grau de
influência que pode manter sobre os atuais grupos indígenas regionais.




                                        10
Um tema corrente no pensamento ecológico sul-americano é o da relação entre
nível de complexidade sócio-cultural e oferta de alimentos, em determinado
ambiente natural. Steward & Faron (1959) levam essa discussão ao extremo ao
abordarem "a integração sócio-cultural no nível familiar". Os principais
ingredientes dessa fórmula de subsistência são: população reduzida,
tecnologia de caça e de coleta, ambiente natural com uma oferta de alimentos
relativamente baixa. Carneiro (1968) chama a atenção para a importância do
crescimento da população em uma área geograficamente ilimitada a qual,
independentemente da fertilidade do solo, gera níveis cada vez mais elevados
de complexidade sócio-cultural. (De Cerqueira, 19793).

Embora os palcos sejam atualmente mais complexos, ora pelas transições
econômicas dos países de América Latina, ora pela crescente crise ambiental
sofrida pelos mesmos, não deixam se ser interessantes as propostas para
acercar-nos à compreensão dos atuais processos da sociedade xinguana,
tanto para se adaptar, como para se desenvolver, num palco cada vez mais
agressivo quanto às relações interétnicas presentes na área4.

Consequentemente,           a    compreensão         deste     fenômeno       por    parte     dos
pesquisadores        sul-americanos        promove        a   formação       de     consistentes
conhecimentos sobre as formas de vida e apropriação da paisagem, em
condições que necessariamente levam – tal como propõe Alvarado (2003) – ao
tema da identidade. Esta busca supõe um retorno (analítico e metodológico)
para a relação entre homem e natureza, já que os povos chamados “primitivos”
sofrem uma acelerada transformação (Alvarado, 2003). Os princípios de
organização social e sua relação com o meio ambiente serão discutidos, tendo
em vista a formulação de uma nova base de comparação das povoações
indígenas sul-americanas.
3
  Este artigo, publicado em Current Anthropology em Setembro de 1979, passou a representar
uma importante referência aos estudos sobre ecologia e índios sul-americanos. Posteriormente
foi publicado em português por Darcy Ribeiro, com tradução de Berta Ribeiro. Esta versão
digital consta na internet em http://www.jstor.org/view/00113204/dm991424/99p0380p/0 (versão
em Inglês) e http://www.georgezarur.com.br/pagina.php/97 (versão em português), obtida em
janeiro de 2006.
4
  Referimo-nos basicamente à agressividade das “agências”, formais e informais, da sociedade
brasileira e suas intervenções (científicas, econômicas, culturais, religiosas, políticas, etc.) que
atuam crescentemente no interior do PIX.




                                                11
É aqui onde os dualismos epistemológicos ficam fora de ação. Em mãos com
a cultura, os espaços territoriais se expressam tanto em significados
(representação do espaço) como em usos de espaços reais (condutas), onde,
do mesmo modo, configuram-se as transformações e cristalizações históricas.
Com respeito às sociedades tribais e de chefaturas simples, envolvidas em
torno de um âmbito de congregação direta, o espaço não só significa um
pertence restringido, senão, também, o uso de outros espaços territoriais de
alianças, ou bem, projeções de espaços míticos.

Neste espaço territorial se forjam sistemas de identidades sociais, referindo-
nos a que cada ator (individual ou coletivo) porta uma grande quantidade de
identidades simultâneas referidas a diferentes tipos de fenômenos. É dessa
forma que as culturas, as etnias, os gêneros, as nacionalidades, o status
familiar, a situação socioeconômica, etc. podem confluir num só ator, que
assume suas respectivas identidades ao mesmo tempo, e neste caso, no
marco de seu próprio território5.

Ante esse contexto, a noção de etnia, ou grupo étnico, deve re-conceitualizar-
se (Barth, 1976; Abramoff, 2001; Bonfil, 1992), já que, a partir da proliferação
dos conflitos de considerações étnicas, e partindo do pressuposto de que uma
etnia se reinventa e se redefine como um recurso dos atores sociais para lograr
estrategicamente certos interesses, os processos territoriais adquirem um
formato de luta política pelo território frente à opressão da sociedade
dominante. Nesse sentido, a etnicidade é parte integral da organização social,
e os fatores que distinguem os grupos étnicos de outros grupos geralmente se
conformam a partir de estratégias de contingência; por exemplo, a identidade
étnica aparece só quando os grupos sentem-se ameaçados pela perda de
alguns dos benefícios já adquiridos ou por aspirar a outros privilégios. É

5
  Para Todorov é impossível conceber um “eu” relegado de um “outro”. Isso é o que converte à
concepção unívoca do individuo em uma contradição interessante de considerar nos estudos
aplicados ao contato; diz-nos “yo es otro... pero los otros también son yos: sujetos como yo,
que sólo mi punto de vista, para el cual todos están allí y sólo yo estoy aquí, separa y distingue
verdaderamente de mí” (p. 13); isso se justapõe também ao plano do nós/outros que tão
complexamente vaticina a Antropologia. Para a questão das múltiplas identidades na era pós-
moderna e suas possibilidades interpretativas, ver as análises de Zygmund Bauman (2005), em
Identidades.




                                               12
conseqüente, e até esperado, então, compreender uma inter-relação direta
entre as expressões étnicas da identidade junto às expressões de classe (6) (7),
e não só especular sobre as intenções de busca de autonomia e
autodeterminação que teriam as populações indígenas (Ortiz, 2004a).

Enfim, o interesse por interagir teoricamente com propostas inovadoras deve
levar necessariamente a contribuir para uma teoria regional sobre os processos
territoriais e culturais fornecidos a partir de conflitos de considerações étnicas.
Para isso, precisaremos de maiores recursos integradores desde a etnografia,
a etnohistória, a etnoecologia, e obviamente a etnologia, para assim desafiar
nossas próprias limitações à hora de construir nossos objetos de estudo e
intervir cientificamente nas realidades que estudamos.




6
 Para uma excelente revisão entre a relação entre etnia e classe, ver Sánchez; 1987
7
 Muitos autores propõem que a “questão étnica” não pode separar-se de sua relação com os
Estados nacionais (Díaz-Polanco, 1991; Sánchez, 1987; Esteva Fabregat, 1984, entre outros).




                                            13
1.3 TERRAS INDÍGENAS E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL


Compreender      sistemas      de   manejo   de   recursos    naturais   envolve
necessariamente uma abordagem transdisciplinar. Elementos ecológicos, como
a capacidade de suporte do ambiente, sazonalidade e distribuição dos recursos
sobre uso são tão fundamentais quanto aspectos de ordem sociocultural, como
regimes de propriedade e regras locais de manejo (Berkes 1989, Ostrom 1993,
McCay 1993). A perda do conhecimento tradicional, que segundo essa lógica
ameaça a sustentabilidade dos sistemas sócioecológicos, é por Berkes et al.
(1993) atribuída às inovações tecnológicas, a pressões devido ao crescimento
populacional, à quebra dos sistemas tradicionais sociais, à perda do controle
das populações locais sobre áreas e recursos e a mudanças de visão
resultantes da urbanização.


Barragens têm causado impactos graves sobre povos indígenas em todo o
mundo, interferindo na vida, subsistência, cultura e existência espiritual. Fortes
desigualdades e dissonâncias culturais, racismo institucional, discriminação
social e marginalização política. Além disso, via de regra, as comunidades
indígenas são excluídas dos benefícios (Colchester 2000).


Na Amazônia, onde as terras indígenas superam em muito as Unidades de
Conservação em termos de área de abrangência, os povos indígenas
exerceram um papel histórico primordial na proteção da floresta. Vários
estudos neste bioma mostram, através de análises de imagens de satélite em
séries temporais e por sensoriamento remoto, que as Terras Indígenas agem
como barreiras contra o desmatamento, que avança ao redor das mesmas
(vide Nepstad et al 2005, entre outros).


As Terras Indígenas brasileiras são elementos-chave para a conservação dos
distintos biomas encontrados no Brasil, e de ecossistemas íntegros,
desempenhando       serviços    ambientais   essenciais,   principalmente    pela
dificuldade de implantação, na prática, de uma estrutura eficiente de




                                       14
fiscalização num país de dimensões continentais, como o Brasil. Como
resultado, hoje cerca de 85% das Unidades de Conservação brasileiras não
estão implantadas efetivamente.


Diversos autores concordam que, de fato, as terras indígenas na região
neotropical funcionam como importantes unidades de conservação (Redford
and Stearman 1993, Peres 1994, Peres e Terborgh 1995, Diegues 2000,
Zimmerman 2001). Silvius (2004) argumenta que reservas tradicionais podem
funcionar tão bem ou melhor que reservas estabelecidas simplesmente por
motivos ecológicos, pois as comunidades envolvidas de fato respeitam seus
limites.   Por exemplo, o manejo de queixadas envolve necessariamente a
manutenção de grandes extensões de áreas conservadas, florestais ou não,
que garantam abrigo e alimento para bandos grandes em constante
deslocamento. No caso dos Xavante da Reserva Rio das Mortes, também o
papel tradicional do Xamã vai fortalecer a importância dada ao conhecimento
etnoecológico e aos sistemas tradicionais de manejo.


A   importância   das   terras   indígenas   é   ainda   maior    pela   pequena
representatividade, tanto qualitativa quanto quantitativa, do nosso atual Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, Lei número 9.985, de 18 em julho
de 2002). Vale salientar que justamente o norte do Mato Grosso é região de
transição entre a floresta da terra firme e o planalto central, conhecida no meio
científico e na mídia como “arco do desmatamento”, e que tem sido um dos
principais focos de remoção da cobertura vegetal original nas últimas décadas.


As terras indígenas brasileiras já legalizadas totalizam mais de 110 milhões de
hectares de áreas de valor potencial para a conservação da biodiversidade. No
caso da bacia do Xingu, especificamente, diversas espécies consideradas
ameaçadas, como a onça pintada, a ariranha, o queixada, o tatu canastra, além
de inúmeras outras espécies, ocorrem na área, e estão, no caso do Parque
Indígena do Xingu, livres de pressão de caça por conta de tabus culturais,
como será detalhado mais adiante.




                                       15
2. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS




2.1 CONCEITUAÇÃO GERAL


Em atendimento, por um lado, às solicitações feitas pelas comunidades
indígenas envolvidas, pelo Termo de Referência emitido pela FUNAI8 e pelos
órgãos públicos; e, por outro lado, considerando as especificidades científicas
apresentadas, este Programa está baseado em 3 frentes de atuação, a saber:


        estudos antropológicos (caracterização das terras indígenas em seus
           aspectos históricos, legais, ambientais, etnológicos, etnopolíticos e
           socioeconômicos);


        estudos ecológicos referentes aos recursos ambientais existentes
           nas Terras Indígenas abordadas, com especial atenção para os
           recursos hídricos. Estes estudos envolvem não apenas uma
           caracterização     física do ambiente de recursos disponíveis, mas,
           também, os aspectos culturais de uso e classificação destes recursos
           (estudos etnoictiológicos e etnotaxonômicos).


Embora cada uma dessas frentes de atuação possua procedimentos e
metodologias específicas, são tratadas de forma integrada e interdisciplinar,
uma vez que têm o mesmo objetivo comum9.


Neste sentido, a base metodológica do projeto se sustenta na pesquisa
diagnóstica, a saber, uma estratégia de pesquisa apta e adequada para a
abordagem de problemáticas onde ficam envolvidas intervenções sociais,
8
  Uma listagem das siglas utilizadas no presente relatório e seus significados pode ser
encontrada no Anexo 9.
9
  Confrontar: Robrahn-González, E.M. 2005, “Projeto executivo do Programa Diagnóstico
Antropológico e Patrimônio Cultural, Paranatinga II, Estado de Mato Grosso”.




                                          16
expostas como “ações para o desenvolvimento”, as quais, ao mesmo tempo,
são parte de um fenômeno de intervenção sócio-política tendente a lograr
certos fins, sustentados na configuração de um, ou vários, atores sociais
determinados. A utilização da pesquisa diagnóstica deve oferecer uma
estratégia metodológica integrada para construir as bases da coleta, análise e
interpretação dos dados primários e secundários, tendo como referência
algumas questões teórico-metodológicas abaixo detalhadas.


Quando falamos de pesquisa diagnóstica nos referimos a uma “Estratégia
Metodológica” e não a uma “Metodologia”. A diferença é crucial. A estratégia
contém a possibilidade epistemológica, como técnica, de fornecer uma
variabilidade de visões teóricas, padrões de enfoque, delimitações de objeto de
estudo, etc., a partir de um trabalho interdisciplinar. A pesquisa diagnóstica,
como estratégia metodológica, também fornece diferentes planos de indagação
quanto aos alcances das investigações planejadas. É dizer, permite aproximar-
se à construção de um objeto de estudo mais complexo, na medida em que os
pesquisadores são capazes de identificar, nas diferentes intervenções sociais
que estão configurando, a problemática determinada. Dentro desta estratégia
de pesquisa há que se considerar questões que têm relação com os processos
diacrônicos de transformação, as relações de poder imbricadas nas distintas
intervenções sociais, bem como as conseqüentes repercussões sócio-culturais
daqueles processos (Wolf, 1987).


Então, o que estamos entendendo por intervenção social? A resposta a esta
pergunta é fundamental, porque é aquela que demanda a especificidade da
proposta metodológica deste Programa. Uma intervenção social é uma
interação de transformação material e imaterial que realizam certos atores
sociais, que procuram certos fins gerais e específicos através de certos
meios, em determinadas condições ou contextos. Esta é uma proposta da
sociologia funcionalista mertoniana (Merton 1957, 2003) que é de muita
utilidade nos estudos que requerem uma análise mais detalhada sobre
processos conflitivos contingentes, surgidos de uma luta de interesses.




                                      17
Os atores sociais sempre são complexos de determinar. Regularmente, têm
processos de configuração sócio-cultural que implicam desenvolvimentos de
identidade, território, economias, tradições, etc. Muitas vezes, os propósitos
dos pesquisadores fazem parte destes sujeitos sociais, o qual deve ficar muito
claro, e, além disso, deve ser exposto para manter a integridade científica do
projeto quanto à busca pelo conhecimento o mais válido, confiável e exato
possível. Os atores sociais também têm interesses diversos. Em outras
palavras, são conjuntos complexos de indivíduos que se desenvolvem
conjuntamente em diferentes graus de compromisso para o logro de certos fins.
Dentro dos atores sociais também há relações assimétricas de poder,
processos de negociação e estandardizações de certas imagens de identidade.
Em nossa contingência de análise, os atores envolvidos são principalmente
grupos indígenas (das TIs Parabubure e Ubawawe e do PIX), empreendedores
do projeto da PCH Paranatinga II e organismos oficiais (estatais) de
fiscalização e autorização. De fato, os atores sociais identificados neste
esquema são os mesmos que em tantos processos sociais na América Latina
se apresentam. Todavia, não é suficiente admitir somente esta relação
tautológica, senão, também identificar a complexidade interna destes atores
intervenientes no processo estudado.


Os fins que procuram os atores sociais são tão complexos como a
configuração dos mesmos atores. Existem fins explícitos e de curto alcance,
assim como fins implícitos e de longo alcance. Os primeiros, fins explícitos,
geralmente são simples de identificar, e ficam expressos nas declarações dos
atores a respeito do conflito particular. Mas os segundos, fins implícitos, muitas
vezes respondem a questões mais emaranhadas relacionadas com ideologias,
cosmologias, e cosmogonias dos atores envolvidos. Neste sentido, o
pesquisador que realiza uma indagação diagnóstica deve identificar aqueles
fins primários, práticos e estratégicos (que ao mesmo tempo são “fins de médio
alcance”), e reconhecer aqueles fins plasmados nas expectativas e esperanças
últimas, aquelas relacionadas com os fundamentos ideológicos do sujeito
social. Os “fins” também têm características sobre as bases de poder que




                                       18
sustentam o sujeito envolvido. Neste sentido, os fins podem ser “reformistas”,
“revolucionários”, “empreendedores”, “alienadores”, “secularizadores”, etc.


Os meios utilizados pelos atores sociais para lograr seus fins sempre serão
conseqüentes aos seus requerimentos. O dito “o fim justifica os meios” se faz
fundamental neste esquema. Se os fins são secularizadores, os meios estarão
ligados à utilização da doxa política do contexto social onde se planeja a
intervenção social. Se o fim, por outro lado, é revolucionário, os meios serão
também revolucionários, provavelmente vanguardistas e desestruturadores.


Talvez o esquema mertoniano fique diminuído enquanto se considerar as
“condições” ou “contextos” onde as intervenções sociais são desenvolvidas.
Este é um processo fundamental. Tanto a qualidade como as repercussões da
intervenção estarão restritas aos contextos de ação. Neste sentido, requer-se
um panorama etnográfico profundo, conjuntamente com uma exaustiva revisão
de fontes. Nos contextos devem identificar-se as condições políticas,
econômicas, ideológicas e culturais que definem os atores, os fins e os meios
utilizados.


Neste estado das coisas, converge o mais difícil de identificar, a saber: que os
processos sociais conformam-se a partir de uma série indefinida de
intervenções sociais, muitas vezes contrapostas, e sempre multi-direcionais, o
que vai definindo a particularidade da construção histórica. Podemos dizer,
assim, que a historia é um processo intrincado de transformação e cristalização
de acontecimentos (“estruturas da conjuntura”, como diria Sahlins10) e de
intervenções sociais diversas, competindo por estabelecer transformação e
perduração dos atores sociais (conforme demonstra o esquema abaixo).

10
   Salhins, 1997. Esta não é uma historia das particularidades. Sahlins não se refere a uma
história moldada na ortodoxia da sucessão de feitos não-repetíveis. O autor diz: “as questões
históricas não são tão exóticas”. As mudanças culturais já tipificadas são repetidas no tempo. Já
Wolf fala que as “sociedades primitivas” não estiveram tão isoladas quanto pensa a
antropologia do princípio do século XX. Daí que a abordagem de Sahlins na história é
pensando-a como uma só forma geral: “tanto no seio da sociedade dada, como na inter-relação
de distintas sociedades” (pág. 9-11)..




                                              19
Intervenções sociais




                                     Processos
                                                                            Construção
       Ocorrência                      sociais.
     plurilinear dos                                                       plurilinear da
                                    Estrutura da                              historia
       processos
         sociais
                                     conjuntura




                               Intervenções sociais




Também fundamentamos que as intervenções sociais estão teoricamente
definidas como “ações para o desenvolvimento”, o que necessita de outras
justificativas teóricas que não aquelas apresentadas explicitamente. Podemos
analisar com acuidade as bases teóricas do “desenvolvimento” através das
propostas críticas das atuais teorias sobre esse tema, vigentes e hegemônicas
na América Latina, carregadas de conteúdos pós-modernos, muitas vezes
desadaptados à nossa realidade regional (Teoria da Dependência11, Teorias de
Desenvolvimento Sustentável12, etc.). Nossa proposta é mais coerente com a
indagação de uma pesquisa diagnóstica, e diz respeito à capacidade dos
sujeitos sociais de transformar e utilizar a natureza. Compreendemos natureza
desde uma perspectiva monista, ou seja, desde uma perspectiva que não
denota um dualismo metodológico nem ontológico entre cultura e natureza,
mas, sim, que vê o processo cultural como parte de um desenvolvimento da
11
  Prebisch, R. 1981, Cardoso, F. H & E Faletto, E. 1970; Furtado, C. 1974
12
   Becker, E. & Jahn, T. 1999. Para conferir quadros teóricos extensos sobre a relação entre
sustentabilidade e Ciências Sociais ver especificamente Cap. I Exploring Uncommon Ground:
Sustentability and the Social Sciences, Cap, II: Sustentability: Its Cognitive Power for Emerging Fields
of Knowledge. E finalmente o Cap. III, intitulado: Sustentability and Territory: Meaningful
Practices and Material Transformations. Tambem confrontar García, R. et al. 2003.




                                                  20
mesma natureza em diversas manifestações de tipificação (Morin 1996, 2005).
Para os antropólogos, serão ações para o desenvolvimento tanto as distintas
intervenções dos grupos indígenas no que se refere à PCH Paranatinga II,
como a ação dos empreendedores que buscam sua construção.


O problema é mais complexo ainda, porque certamente esta perspectiva nos
obriga a identificar relações assimétricas de poder que certamente intervêm
nesse panorama. O conceito de desenvolvimento que estamos utilizando não
significa “controle”, ou seja, a maior ou menor capacidade de utilizar e
transformar a natureza pode ser um indicativo de maior ou menor
desenvolvimento, mas em nenhum caso de controle. Os exemplos estão à
vista: muitas das intervenções exercidas pelo ser humano no sistema biótico
geral, mesmo das sociedades mais desenvolvidas (com maior capacidade de
transformar e utilizar a natureza), são nefastas e incontroladas em termos das
conseqüências que elas provocam. Outras sociedades, seja por sua
organização social, seja por sua visão sobre o meio que habita, planejam
outras estratégias de intervenção que resultam menos influentes sobre o
esquema da biosfera, mas que igualmente geram desenvolvimento. Esta
perspectiva obriga a deixar de fora qualquer abordagem que abarque
estereótipos essencializantes ao nosso objeto de estudo. Dessa forma, o
pesquisador      deve     contextualizar     e    relacionar    as     “ações     para    o
desenvolvimento”       (tal   qual   e   como     é   entendido      pelos   agentes     de
desenvolvimento descritos) com o fim de cristalizar o quadro descritivo
adequado para nossa estratégia metodológica.


Dessa forma, a resposta de como os trabalhos possam contribuir na solução de
conflitos em situações de contingência está na metodologia. Estamos na frente
de uma intervenção social complexa, e qualquer estudo no marco de um
programa diagnóstico deverá ser planejado numa clareza diagnóstica. Mas
como executá-lo?13
13
  Para a apreciação de uma aplicação de um marco metodológico destas características, ver
Ortiz, 2004. As principais fontes de sistematização teórico-metodológica a respeito estão em
Saavedra, 2005; este último é professor da cátedra “Diagnóstico e Ação para o
Desenvolvimento”, Instituto de Ciências Sociais, Universidade Austral de Chile.




                                            21
Geralmente o diagnóstico é confundido, em ciências sociais, metodologicamente
falando, com a pesquisa avaliativa de impacto. Em nossa perspectiva este é um
erro fundamental. Nossa proposta é mais parecida ao funcionamento da medicina
alopática no momento de enfrentar um paciente. Neste sentido, os componentes
lógicos de uma pesquisa diagnóstica devem ser:


1.- descrever pertinentemente a situação problemática em termos de quais
são os atores, meios, fins e condições envolvidas nesta intervenção social ou
intervenções. Esta descrição deve ser a mais ampla possível, tratando de
juntar os dados primários com os secundários, avaliando problemáticas de
pesquisa, espaços de pouca indagação científica e processos chaves para
analisar.


2.- avaliar a situação problemática em termos da relação existente entre a
visão de desenvolvimento dos atores envolvidos (Agentes de desenvolvimento
e comunidades indígenas representados tanto pelas suas organizações como
por suas perspectivais). O mais difícil, neste caso, é a construção de um
modelo avaliativo competente. Geralmente os modelos avaliativos são
construídos com base em três perspectivas:


       a) pelos mesmos pesquisadores que determinam quais serão os
       modelos ideais que serão comparados com a descrição anterior;


       b) pela “comunidade do objetivo”, ou seja, considerando que o modelo
       deve ser totalmente êmico, e que esta informação deve ser comparada
       posteriormente com a descrição inicial;


       c) construído em uma relação dialética entre o que o pesquisador
       identifica e a visão êmica envolvida no processo. Neste caso será
       fundamental a comparação com situações ocorridas em contextos
       similares.




                                       22
Certamente, em nosso parecer, a terceira opção é a mais correta, não
obstante, a mais complexa. A distância entre a descrição contundente do
problema e o modelo avaliativo configurado será a magnitude do problema de
pesquisa, o qual dá fundamentos para, posteriormente:


3.- explicar - através de causas e associações - as razões que convertem as
estratégias dos agentes de desenvolvimento em conflitos no interior das
comunidades. Uma pesquisa diagnóstica não pode deixar de lado esta etapa
de investigação. A explicação deve ir mais além que a mera explicação
testemunhal    do    fenômeno,    senão,   também,      dever-se-ia   construir
metodologicamente aspetos relacionados com a prática experimental e as
análises integradas das associações concomitantes ao fenômeno.


4.- por último, embora não menos importante, é necessário oferecer
recomendações que tenham por fim dar solução à problemática apresentada,
entendendo que o problema seja comprovado empiricamente. Neste caso deve
existir uma racionalidade da ação, a qual é a relação lógica e equilibrada que
deve existir entre a descrição do modelo avaliativo (a identificação do
problema) e as recomendações. As recomendações devem ter coerência
interna e a possibilidade de aplicação lógica no contexto descrito. Este é o
processo mais cuidadoso e delicado, que será mais adequado na medida em
que as demais etapas da pesquisa diagnóstica sejam realizadas com a maior
consistência possível.




                                     23
2.2 PROCEDIMENTOS DE CAMPO NA PESQUISA DIAGNÓSTICA


A pesquisa diagnóstica em Antropologia requer a realização de certos
procedimentos de campo, além de certas especificações quanto à estratégia de
coleta de dados e às análises posteriores. A vantagem da Antropologia está
radicada em suas técnicas de campo, ligadas à etnografia, a qual permite
fornecer uma perspectiva enriquecedora dos processos através de suas
técnicas específicas. Neste caso, confluíram: a observação direta, a
observação participante, os encontros (social survey), as entrevistas com
informantes fixos, as entrevistas semi-estruturadas, as entrevistas grupais, os
focus group, entre muitas outras técnicas de campo, as quais forneceram as
bases de dados primárias, dispostas para análises posteriores.


Dentro da lógica da pesquisa diagnóstica, tanto a etapa descritiva como a
avaliativa, explicativa e recomendativa, requerem a utilização das técnicas
nomeadas acima, onde a estratégia etnográfica será a modeladora desses
processos. Nesse sentido, os instrumentos de coleta de dados devem ser
construídos neste marco geral, tratando de identificar as problemáticas
hipotéticas e, também, registrando as problemáticas surgidas in situ.


Não obstante, o “estar aí“, o compartilhar as experiências vitais de nossa
“comunidade objetivo”, não é indicador do sucesso do “trabalho de campo”. Em
geral, muitos antropólogos confundem esta etapa da pesquisa, porque para
eles é suficiente considerar suas próprias percepções como aceitável para
definir e validar os dados que posteriormente serão analisados. O feito de
testemunhar a realidade pode ser muito enriquecedor, mas é fundamental
identificar quais são aspectos surgidos das observações “objetivas” e quais são
as   observações    surgidas    das   interpretações    e   pré-conceitos   dos
pesquisadores. A despeito do que nossa proposta indica, é uma estratégia
trans-disciplinária, o que significa grupos de pesquisadores de diversas áreas
de formação (da ecologia, da etnologia, da antropologia, da etnohistória, etc.),




                                      24
trabalhando em conjunto sobre a confiabilidade dos dados e criando
instrumentos e técnicas transversais capazes de aproveitar os distintos
contextos de intervenção “no campo”.


Finalmente, os procedimentos de campo deverão sempre estar regidos por
uma ética profissional, ligada à sinceridade dos pesquisadores na hora de se
deparar com situações conflituosas, possíveis de acontecer no trabalho de
campo.




                                       25
3. OBJETIVOS DO PROGRAMA




Os objetivos do presente Programa podem ser sintetizados em três grandes
itens:


 Complementar os estudos referentes ao Licenciamento Ambiental da PCH
   Paranatinga II no que se refere ao componente indígena, abrangendo as
   Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe (ocupadas por grupos Xavante e
   localizadas às margens do rio Culuene, a montante da PCH), bem como o
   Parque Indígena do Xingu (ocupado por 14 etnias e localizado a jusante da
   PCH, já em terras banhadas pelo rio Xingu);


 Desenvolver, assim, os estudos complementares solicitados pela FUNAI
   através do Termo de Referência emitido, abrangendo: diagnóstico das
   Terras Indígenas acima citadas, identificação dos impactos sócio-
   ambientais provenientes da implantação do empreendimento e proposição
   de medidas mitigadoras e/ou compensatórias cabíveis, em conformidade
   com os pleitos existentes.


 Atender a legislação brasileira e instrumentos normativos existentes no que
   se refere aos estudos antropológicos do empreendimento.


 Produzir conhecimento científico e análise de situação dos grupos
   indígenas tratados, que permitam contribuir na sustentabilidade social,
   cultural e econômica dos grupos.




                                      26
O atendimento a esses objetivos se apóia na necessidade de regularização dos
estudos de Diagnóstico Antropológico da obra, na deferência às solicitações da
comunidade indígena envolvida e na análise dos seguintes documentos:


   •   Solicitações do Ministério Público Federal à Procuradoria Geral da
       República (Ofício n. 221), IBAMA (Ofício n. 141) e FEMA (Ofício n. 143).

   •   Laudo Antropológico solicitado pelo Ministério Público.

   •   Laudo Etno-Histórico e Avaliação Jurídica, solicitado pela Paranatinga
       Energia S/A.

   •   Acordo firmado com a comunidade indígena (Termo de Compromisso).



Como resultado geral, a utilização de todas as fontes informativas disponíveis –
escritas, orais, ecológicas, antropológicas, etnohistóricas e suas interfaces –
trabalhadas de forma independente e com resultados convergentes, deverá
subsidiar a compreensão dos grupos sociais indígenas que dela participaram,
tendo como finalidade última a análise de possíveis impactos gerados pela
implantação da PCH Paranatinga II e a indicação de soluções de contorno.




                                       27
4. LEGISLAÇÃO INTERVENIENTE




O presente trabalho visa atender a legislação brasileira e os instrumentos
normativos vigentes no que se refere ao campo dos estudos antropológicos
(componente indígena), a saber:



         •   Convenção OIT n° 169, de 07/06/1989, Convenção sobre Povos
             Indígenas e Tribais em Países Independentes;

         •   Lei 6001, de 19/12/1973 - Dispõe sobre o Estatuto do Índio;

         •   Decreto nº 88.985 de 10/11/1983 - Regulamenta os artigos 44 e
             45 da Lei n° 6.001 e dá outras providências;

         •   Decreto nº 58.821 de 4/07/1966 - Promulga a Convenção nº 104
             concernente à abolição das sanções penais;

         •   Convenção OIT nº 104 de 01/06/1955 - concernente à abolição
             das sanções penais por inadimplemento do contrato de trabalho
             por parte dos trabalhadores indígenas;

         •   Lei nº 5.371 de 05/12/1967 - Autoriza a instituição da “Fundação
             Nacional do Índio” e dá outras providências;

         •   Portaria MJ nº 542 de 21/12/1993 - Aprova o anexo Regimento
             Interno da Fundação Nacional do Índio- FUNAI;

         •   Decreto nº 1.775 de 08/01/1996 - Dispõe sobre o procedimento
             administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras
             providências;




                                      28
•   Portaria MJ nº 14 de 09/01/1996 - Estabelece regras sobre a
    elaboração do Relatório circunstanciado de identificação e
    delimitação de Terras Indígenas a que se refere o parágrafo 6º do
    artigo 2º, do Decreto nº 1.775/96;

•   Decreto-Lei nº 9.760 de 05 /09/1946 - Dispõe sobre os bens
    imóveis da União e dá outras providências;

•   Decreto 1.141, de 19 de maio de 1994 - Dispõe sobre as ações
    de proteção ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas
    para as comunidades indígenas;

•   Decreto nº 3.799 de 19/04/2001 - Altera dispositivos do decreto nº
    1.141, de 19/05/1994, que dispõe sobre as ações de proteção
    ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas para as
    comunidades indígenas;

•   Lei nº 6.634 de 02/05/1979 - Dispõe sobre a Faixa de Fronteira;

•   Decreto nº 4.412 de 07/12/2002 - Dispõe sobre a atuação das
    Forças Armadas e da Polícia Federal nas terras indígenas e dá
    outras providências;

•   Portaria MS nº 254 de 31/01/2002 - Aprova a Política Nacional de
    Atenção à Saúde dos Povos Indígenas;

•   Resolução MS/CNS nº 304 de 09/08/2000- Aprova as Normas
    para Pesquisas Envolvendo Seres Humanos- áreas de Povos
    Indígenas;

•   Decreto nº 98.830 de 15/01/1990- Dispõe sobre a coleta, por
    estrangeiros, de dados e materiais científicos no Brasil, e dá
    outras providências;

•   Portaria MCT nº 55 de 15/03/1990 - Regulamenta coleta, por
    estrangeiros, de dados e materiais científicos no Brasil;




                             29
•   Lei nº 10.172 de 09/01/2001 - Aprova o Plano Nacional de
    Educação e dá outras providências;

•   Lei nº 9.610 de 19/02/1998 - Altera, atualiza e consolida a
    legislação sobre direitos autorais e dá outras providências;

•   Decreto-Lei nº 25 de 30/11/1937 - Organiza a proteção do
    patrimônio histórico e artístico nacional;

•   Lei nº 3.924 de 26/07/1961 - Dispõe sobre os monumentos
    arqueológicos e pré-históricos;

•   Lei nº 9.051 de 18/05/1995 - Dispõe sobre a expedição de
    certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de
    situações;

•   Lei Complementar nº 75 de 20/05/1993- Dispõe sobre a
    organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da
    União;

•   Lei nº 6.938 de 31/08/1981- Dispõe sobre a Política Nacional de
    Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e
    aplicação, e dá outras providências;

•   Lei nº 5. 197 de 03/01/1967 - Dispõe sobre a proteção à fauna e
    dá outras providências;

•   Lei nº 7.754 de 14/04/1989 - Estabelece medidas para Proteção
    das Florestas Existentes nas nascentes dos rios e dá outras
    providências;

•   Lei nº 9.605 de 12/02/1998 - Dispõe sobre as sanções penais e
    administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao
    meio ambiente, e dá outras providências;




                              30
•    Resolução CONAMA nº 001 de 23/01/1986 - Relatório de impacto
              ao meio ambiente;

         •    Resolução CONAMA nº 237 de 27/12/1997 - Licenciamento
              ambiental;

         •    Decreto nº 24.643 de 10/07/1934 - Decreta o Código de Águas;

         •    Lei nº 9.433 de 08/01/1997 - Institui a Política Nacional de
              Recursos Hídricos;

         •    Arts. 231 e 232 da Constituição Federal promulgada em 1988 -
              Reconhecem aos índios sua organização social, costumes,
              línguas, crenças e tradições, e os direitos originários.




Por outro lado, os trabalhos de campo nas Terras Indígenas foram
devidamente oficializados e autorizados pela FUNAI, com aprovação da equipe
de trabalho pelas comunidades indígenas envolvidas (comunidades do Parque
Indígena do Xingu, e comunidades Xavante das Terras Indígenas Parabubure
e Ubawawe).




                                        31
5. A ÁREA DE PESQUISA E COMUNIDADES ENVOLVIDAS




Os grupos indígenas estudados habitam a região superior da bacia hidrográfica
do rio Xingu, um dos maiores tributários do Amazonas (Figura 1). Estes, e seus
afluentes menores, drenam uma região extremamente heterogênea e
composta por um mosaico de zonas ecológicas distintas.


No que se refere à área abrangida pela PCH Paranatinga II, localiza-se na
bacia do rio Culuene que, juntamente com o rio Sete de Setembro, Tanguro e
Suiá-Missu, irão formar o rio Xingu pouco antes do início do Parque Indígena
do Xingu (IBGE, citado em Projeto Radambrasil 1981) (Figura 2).


Na bacia do rio Culuene encontram-se, a montante da PCH Paranatinga II, as
Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe, pela sua margem direita. Já o
Parque Indígena do Xingu (PIX) se localiza na bacia do Xingu propriamente
dita. Por esta razão a área de pesquisa do presente Estudo abrange não
apenas a bacia do rio Culuene, mas se estende para o alto curso do rio Xingu,
no trecho abrangido pelo PIX. Desta forma, as comunidades indígenas
envolvidas são:




 T.I. Parabubure e T.I. Ubawawe, etnia: Xavante.


   Localização: a montante da PCH Paranatinga II, abrangendo terras na
   margem direita do rio Culuene. O início das TIs se encontra a 28,61 km
   lineares do final do reservatório da PCH Paranatinga II, ou ainda, a quase
   50km seguindo o traçado meândrico desse mesmo rio (Figura 3).




                                     32
 Parque Indígena do Xingu (formado por 14 etnias que integram o chamado
      “Complexo Cultural Xinguano”14. Compreendem grupos que habitavam a
      área anteriormente à criação do Parque e, também, grupos que para ali
      foram levados pela FUNAI, visado centralizar sua assistência). As etnias
      são: Waurá, Mehinaku, Yawalapiti, Kuikuro, Kalapalo, Nahukwa, Matipu,
      Kamayurá, Awetí, Trumai, Suyá, Ikpeng, Kayabi e Yudjá.


      Localização: a jusante da PCH Paranatinga II. O limite sul do PIX se
      encontra a 93,71km lineares do eixo da PCH, ou ainda, a 238 km seguindo
      o traçado meândrico do rio Culuene, assim como os quilômetros iniciais do
      rio Xingu.




14
     www.socioambiental.org.br




                                       33
34
     Figura 1 - Localização dos rios Xingu e Culuene na Bacia Amazônica.
Formadores
                                                     do Xingu




Figura 2 - Mapa de vegetação regional na bacia do Culuene.




                                            35
Figura 3 - Localização das Terras Indígenas pesquisadas.




                                            36
6. ESTUDOS JUNTO À COMUNIDADE XAVANTE (TI PARABUBURE
    E UBAWAWE)




6.1 APRESENTAÇÃO


Este estudo foi realizado seguindo os modelos metodológicos fundados na
Antropologia Social, com levantamento de campo para coleta de dados
quantitativos e qualitativos. Os procedimentos realizados para a elaboração
dos estudos e desenvolvimento dos trabalhos foram os seguintes: reuniões
técnicas, levantamento e análise dos dados disponíveis, definição e
identificação das áreas de estudo, contatos com instituições, vistorias e
levantamentos de campo, diagnóstico ambiental, identificação e avaliação dos
impactos ambientais e proposição das medidas mitigadoras/compensatórias.


Foram realizados levantamentos dos dados disponíveis que subsidiaram a
execução dos trabalhos, tais como: material cartográfico, dados secundários
sobre a região do empreendimento (bibliografia disponível e estudos
relacionados ao Licenciamento Ambiental da obra) e processos existentes na
FUNAI. Neste contexto foi consultada a documentação existente, como
decretos, portarias, legislação, relatórios de fontes oficiais, teses de mestrado e
doutorado e boletins científicos.


Por outro lado, foram mantidos contatos com as seguintes instituições: FUNAI
em Brasília, em Campinápolis e Nova Xavantina no Mato Grosso; IBAMA;
Agência de Água e Saneamento e Meio Ambiente de Mato Grosso; e com a
comunidade indígena Xavante, que auxiliaram no entendimento do problema e
no desenvolvimento dos estudos.




                                        37
Foi efetuado o reconhecimento da área nas terras indígenas através de
expedições terrestres, durante os meses de outubro e novembro/2005. As
pesquisas foram desenvolvidas, durante todo o período, com a presença de
índios Xavante juntamente com a equipe.


A primeira atividade desenvolvida quando da chegada da equipe nas aldeias foi
realizar reuniões informativas, esclarecendo sobre o escopo e objetivo do
trabalho e buscando incorporar aos estudos solicitações e recomendações
feitas pela comunidade indígena. As reuniões foram agendadas na AER e/ou
NAL que as aldeias estavam subordinadas.


Foram realizadas quatro reuniões com as lideranças das Terras Indígenas
Parabubure e Ubawawê. A primeira reunião foi realizada no Núcleo de Apoio
Nõrota, em 27/10/05, com as lideranças das aldeias subordinadas a esse
Núcleo (Prancha 1). A Tabela 1 traz a lista dos participantes.


As outras três reuniões com as lideranças Xavante jurisdicionadas à
Administração Executiva Regional de Campinápolis/AER, foram realizadas nos
dias 28, 29 e 30 de outubro de 2005, respectivamente no Posto Estrela, Aldeia
Buritizal e Aldeona/Culuene. Em todas as visitas os técnicos foram
acompanhados pelos índios Xavante Adriano, Henrique, Cláudio e Adalberto,
funcionários e representantes oficiais da AER de Campinápolis indicados pelo
administrador Isaac.


As lideranças que participaram da reunião realizada no dia 28/10/2005, no
Posto Estrela foram:


                       Liderança                    Aldeia
                   1. Ailton                  Aldeia Estrela
                   2. Armando                 Aldeia Barreiro
                   3. Rodrigo                 Aldeia Piranhão
                   4. Coreolano               Aldeia Nova Canaã




                                        38
PRANCHA 1 – A3




                 39
Tabela 1 – Participantes da reunião geral, Núcleo de Apoio Nõrota
   Nome da liderança                       Cargo e Aldeia
      1. Germano                   Cacique da aldeia Onça Preta
      2. Domingos                  Cacique da aldeia Matrixã
      3. Alfredo                   Cacique da aldeia Boa Vida
      4. Francisco                 Cacique da aldeia 2° Campinas
      5. Orlando                   Cacique da aldeia Podzenho’u
      6. Francisco                 Vice Cacique aldeia S. Felipe
      7. Lázaro                    Cacique da aldeia Chão Preto
      8. Joãozinho                 Cacique da aldeia S. D. Sávio
      9. Terezinho                 Vice Cacique aldeia S. D. Sávio
      10. Lino                     Vice Cacique aldeia Boa Vida
      11. Marinho                  Chefe aldeia 2° Campinas
      12. Amauri                   Cacique da aldeia Etepore
      13. Samuel                   Vice Cacique aldeia Aparecida
      14. Satornino                Cacique da aldeia S. Felipe
      15. Anselmo                  Cacique da aldeia Santa Clara
      16. Cleto                    Chefe aldeia Etepore
      17. Rita                     Vice Cacique aldeia Santa Cruz
      18. Ademar                   Representante aldeia Etepore
      19. Irineu                   Cacique da aldeia Couto Magalhães
      20. João                     Cacique da aldeia Santa Rosa
      21. Irineu                   Representante aldeia Boa Vida
      22. Isaias                   Cacique da aldeia São Pedro
      23. Cipriano                 Cacique da aldeia Bom Jesus da Lapa
      24. João Fidelis             Representante aldeia S. D. Sávio
      25. João Gilberto            Representante aldeia S. D. Sávio
      26. Aniceto                  Chefe aldeia S. D. Sávio
      27. Gustavo                  Chefe aldeia Etepore
      28. pedro                    Vice Cacique aldeia Tseredzatsé
      29. Norberto                 Secretário aldeia S. Felipe
      30. Miguel                   Representante aldeia Santa Clara
      31. Moisés                   Representante aldeia Parinai’a
      32. Silvério                 Representante aldeia Santa Rosa
      33. Zeferino                 Representante aldeia Santa Rosa
      34. Tarcísio                 Representante aldeia S. Felipe
      35. Jocelino                 Representante aldeia S.Felipe
      36. Domingos                 Representante aldeia Tseredzatsé
      37. Inácio                   Representante aldeia Santa Clara
      38. Zacaria                  Representante aldeia Santa Clara
      39. Felizberto               Representante aldeia S. Felipe
      40. Anita                    Representante aldeia Boa Vida
      41. Casimiro                 Motorista aldeia S. Felipe
      42. Antônio                  Motorista aldeia S. D. Sávio
      43. Amadeu                   Motorista aldeia S. D. Sávio
      44. Vitalina                 Motorista aldeia Boa Vida
      45. Izete                    Motorista aldeia Chão Preto
      46. Tobias                   Motorista aldeia S. Felipe
      47. Cesário                  Motorista aldeia S. Felipe
      48. Paulo                    Motorista aldeia S. Felipe
      49. Vitoriano                Motorista aldeia S. Felipe
      50. Albino                   Motorista aldeia S. Felipe




                                   40
Já as lideranças que participaram da reunião realizada no dia 29/10/2005, na
Aldeia Buritizal foram:



                 Liderança                         Aldeia

            1. Cacique Joaquim              Aldeia Biritiz
            2. Cacique Quirino              Aldeia Brasil
            3. Cacique Davi                 Aldeia Itaquera
            4. Cacique Luciano              Aldeia Santa Helena
            5. Cacique Guilherme            Aldeia Serrinha
            6. Cacique Ermínio              Aldeia Mato Grosso
            7. Cacique Enoch                Aldeia Egito



Finalmente, as lideranças que participaram da reunião realizada no dia
30/10/2005, na Aldeia Aldeona/Culuene foram:


                 Liderança                        Aldeia
           1. Cacique Eduardo              Aldeia Aldeona
           2. Cacique Simão                Aldeia Novo Paraíso
           3. Cacique Joel                 Aldeia Alvorada
           4. Cacique Ubiratan             Aldeia Sete Rios
           5. Cacique Rodinei              Aldeia Dzeiwahu
           6. Cacique Manoelito            Aldeia Aldeinha
           7. Cacique Arlindo              Aldeia Colina
           8. Vice Cacique Márcio          Aldeia Alto da Vitória
           9. Cacique Osvaldo              Aldeia Jacú
           10. Cacique Tomás               Aldeia Betel
           11. Cacique Jovêncio            Aldeia Tiriwawepa
           12. Cacique Bernardino          Aldeia Baixão
           13. Cacique Roberto             Aldeia Sobradinho
           14. Cacique Valério             Aldeia Sucuri
           15. Cacique Marcidez            Aldeia Cohab
           16. Cacique Abrão               Aldeia Lagoinha




                                    41
O objetivo dessas reuniões foi o esclarecimento das comunidades indígenas
Xavante sobre os estudos socioambientais da PCH Paranatinga II exigidos pelo
CGPIMA/FUNAI, visando o levantamento dos possíveis impactos decorrentes
do empreendimento e o registro do conhecimento indígena sobre o meio
ambiente e as práticas relacionadas às Terras Indígenas Parabubure e
Ubawawê.


Com isto buscou-se, através da análise combinada dos resultados das
pesquisas e a perspectiva dos atores sociais sobre o tema em questão,
subsídios para um diagnóstico equilibrado, que respeitasse os processos
culturais e circunstanciais do grupo indígena Xavante.


Após o levantamento e análise dos dados e do trabalho de campo foi elaborado
o diagnóstico ambiental envolvendo aspectos do meio físico, biótico e
socioeconômico, sendo possível caracterizar a situação pretérita e atual das
áreas indígenas frente ao empreendimento. A equipe técnica elaborou o
diagnóstico de cada área de estudo, e os reuniu para a análise integrada dos
aspectos estudados.


Assim, a partir da adequada caracterização das áreas de estudo e do
diagnóstico sobre a qualidade ambiental, foi possível identificar e avaliar
aqueles impactos advindos da PCH Paranatinga II com relação ao rio Culuene
e às Terras Indígenas estudadas, comparando-os com as condições
preexistentes, tanto os de natureza negativa quanto positiva. Após a
identificação e avaliação dos impactos mais relevantes foram recomendadas as
medidas de controle ambiental e ações destinadas a minimizá-los ou
compensá-los, conforme o caso e de acordo com o que estará sendo discutido
ao longo do presente Capítulo.




                                      42
6.2   CARACTERIZAÇÃO LINGUÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS
      POVOS XAVANTE




Os Xavante constituem povo da família lingüística Jê. Autodenominam-se
Akuên e formam com os Xerente do estado do Tocantins o ramo central das
sociedades de língua Jê (Lopes da Silva e Farias 1992).


Os Akuên habitavam originalmente a bacia do Tocantins, desde o sul de Goiás
até o Maranhão, estendendo-se da bacia do rio São Francisco à bacia do
Araguaia. Após os contatos com o colonizador europeu na aldeia do Carretão,
há cerca de 250 anos atrás, os Akuên retornaram ao seu antigo habitat
passando a haver uma polarização de opiniões sobre o contato e, asssim,
gerando duas facções: uma de simpatia pela manutenção do contato com os
brancos; e outra de aversão ao convívio com o homem branco. O grupo que
manifestava simpatia continuou a viver no território tradicional, passando a ser
conhecido como Xerente; a facção que denotava aversão iniciou um
deslocamento em direção ao Araguaia hostilizando os colonizadores, e passou
a ser chamada de Xavante (LOMBARDI, 1985).


Até meados do século XIX os sertões matogrossenses compreendidos nas
regiões   do   Xingu,   rio   das   Mortes   e   Araguaia,   eram   considerados
desconhecidos pelas autoridades da Província. O relato documental mais
antigo da presença dos Xavante em Mato Grosso, na região que viria a ser seu
habitat até a pacificação ocorrida em meados do século XX, consta do relatório
do presidente da província de Goiás, Pereira da Cunha, de 1856, no qual
noticia a expedição sob a direção de Frei Segismundo de Taggia, que procurou
estabelecer contato com um grupo Xavante hostil, na região do rio das Mortes
(LOMBARDI, 1985).


A travessia do rio Araguaia pelos Xavante ocorreu por volta de 1860-1870, mas
assinala-se que antes dessa grande travessia um outro grupo a havia




                                       43
realizado, mas que deles não se teve notícias. Os Xavante começaram a
deslocar-se para a margem esquerda do Tocantins em 1824, depois para o
Araguaia, em 1859, indo então se estabelecer nos campos do rio das Mortes,
em data não precisa (LOMBARDI, 1985).


É necessário considerar que a ocupação Xavante da região compreendida
entre os rios Araguaia e das Mortes era o habitat de outros grupos indígenas,
com os quais tiveram que entrar em guerra a fim de delimitarem novas
fronteiras espaciais e se apossarem das terras (LOMBARDI, 1985).


Durante a primeira metade do século XX, quando há uma nova frente de
expansão econômica no centro-oeste movida pela exploração pecuária, que
impunha o controle, posse e ocupação das terras habitadas pelos Xavante, a
região se transformou em um campo de hostilidades e massacres promovidos
contra os índios, malgrado a política indigenista protecionista e a existência de
um aparato institucional do Estado destinado a fazer cumprir o protecionismo.
À medida que os interesses econômicos da frente pecuária passam a
capitalizar os ânimos do Estado e das Missões, todos os esforços se
concentraram na pacificação dos Xavante, objetivo alcançado pela equipe
coordenada pelo sertanista Francisco Meireles. Ele passou a atuar a partir de
1944, conseguindo o primeiro contato em 1946. Em 1949 o principal grupo
Xavante já estava dentro do Posto Indígena Pimentel Barbosa (LOMBARDI,
1985).


Ainda em 1946 ocorreram os primeiros contatos com o grupo que vivia nas
imediações do rio Culuene, sendo atraídos para os Postos Indígenas Marechal
Rondon e Paraíso. No ano de 1969 foi reservada uma área aos índios Xavante
no rio Couto Magalhães, na margem esquerda do Rio das Mortes.


Conforme apresentado no item que se segue, as Terras Indígenas Parabubure
e Ubawawe foram criadas, respectivamente, na década de 1980 e 1990,
reunindo índios Xavante provenientes da área do Rio das Mortes e Araguaia.




                                       44
6.3 AS TERRAS INDÍGENAS PARABUBURE E UBAWAWE




6.3.1 Localização e situação fundiária da T.I. Parabubure


A Terra Indígena Parabubure localiza-se nos Municípios de Campinópolis e
Água Boa, Estado de Mato Grosso. A sociedade indígena é a Xavante, da
família lingüística Jê. A superfície da terra indígena é de 224.447 ha. A
população é de 2.624 índios (FUNAI, 1998).


As aldeias da TI Parabubure são: Santa Cruz, Bom Jesus da Lapa, São
Domingos Sávio, São Pedro, São Felipe, Santa Clara, Onça Preta, Parinai’a,
Santa Rosa, São Salvador, Nossa Senhora Aparecida, Tsredzatsé, Campinas,
Chão Preto, Boa Vida, Matrinxã, Eteipore, Tela Vive, Podznho’u, Upawapa e
Canguaçu, Aldeinha, Aldeona, Alto da Vitória, Alvorada, Auwê Ubtsibimedzé,
Baixão, Betel, Cohab, Colina, Córrego da Mata, Lagoinha, Novo Paraíso, Pedra
Branca, Santa Fé, Sucuri, Barreiro, Estrela, Jacu, Piranhão, Serrinha,
Campinas, Jerusalém, Mato Grosso, Santa Helena, Brasil, Buritizal, Egito,
Itaquere, São José, Santa Clara, Sete Rios, São Benedito, Panorama,
Dzeiwahu, Bela Vista, Nova Canaã, Sobradinho, Tiriwawepa, Santa Maria, São
Paulo, Cristalina, Santo Amaro, Deus é Amor, Nõrõtsu’rã, ti’irérepa, Monte
Pascoal, Espírito Santo, Três Marias, Ró’óredza’ódzé e Santana (vide Figura 4
e Mapa Etno-Ecológico, Anexo 1).


Como a cisão entre o Xavante faz parte de sua cultura, essas aldeias foram as
encontradas no período de outubro/novembro de 2005. O número de aldeias
em outra visita pode ser diferente.




                                      45
Figura 4 - Localização das Aldeias percorridas pela equipe nas TIs Ubawawe e Parabubure.




                                            46
Situação Fundiária


No ano de 1922 os Xavante ocupavam a margem esquerda do rio das Mortes,
tendo sido registrados vários ataques a seringueiros, sitiantes e missionários.


Em 1965 o líder Xavante Benedito, “atraído” para a Missão Salesiana,
transferiu-se para a sua antiga aldeia no Rio Couto Magalhães, área em que já
se havia instalado a fazenda Xavantina.


Em 1967 o Governo do Estado do Mato Grosso reservou uma área de 10.000
ha para a aldeia do Benedito, conforme Reg. nº 19.250, Lv. nº 34,fl.88 a 89 V,
Cartório do 4º Oficio Cuiabá – MT.


Em 1968, a FUNAI apresentou uma proposta de área que, embora não
abrangesse as cabeceiras do Rio Couto Magalhães nem a sua margem
esquerda onde estavam situadas suas principais aldeias, foi considerada
visionária.


O Decreto nº 65.212, de 23/09/1969, criou a Reserva Rio Couto Magalhães,
que foi alterada pelo Decreto nº 65.405, de 13/10/69. Este, por sua vez, foi
também alterado pelo Decreto nº 75.426, de 27/11/1975.


A Portaria n° 250/N/FUNAI, de 20.05.1975, criou o Posto Indígena Culuene na
margem direita do córrego Grotão, junto à sua confluência com o rio Culuene,
com superfície aproximada de 51.000 ha. Tal medida visava a proteção de uma
antiga área do grupo que, na época, estava sendo reocupada pela
comunidade. Com o Decreto n° 84.337, de 21.12.1979, foi criada a Reserva
Indígena Parabubure com superfície de 226.555 ha, abrangendo a área Couto
Magalhães e o Posto Indígena Culuene.




                                       47
Em 1981 foi demarcada com superfície de 224.447 hectares, registrada na D-
SPU/MT em 1987 e no CRI da Comarca de Nova Xavantina em 1988. Foi
homologada pelo Decreto nº 306, de 29.10.1991, com superfície de 224.447 ha
e perímetro de 294 km.


Mesmo com a regularização de parte da área o grupo continuou a reiterar seus
pedidos de alteração dos limites da terra. Em 1996 foram realizados estudos
das terras indígenas Chão Preto e Paraíso (atual Terra Indígena Ubawawê),
localizadas no limite sul. No mesmo ano a Portaria n° 343, de 21.05.1996,
determinou que os estudos de identificação e complementação de dados da
Terra Indígena Parabubure fossem realizados por etapas. A primeira etapa de
trabalho de campo agraciou as terras indígenas Chão Preto e Paraíso
(Ubawawê), que foram declaradas em 1998. A segunda etapa de identificação
e trabalho de campo realizaria os estudos da área Wai’re/Isou’pá; na terceira
etapa seriam realizados os estudos da área Norõtsurã; a quarta etapa
estudaria uma área denominada Hu’uhi, localizada na margem esquerda do rio
Culuene, no município de Paranatinga. A Portaria n° 891, de 31.08.1998,
instituiu um grupo técnico visando a identificação das etapas 2 (Wai’re/Isou’pá)
e 3 (Norõtsurã).


Administrativamente não existem as áreas 2 (Wai’re/Isou’pá) e 3 (Norõtsurã),
pois os relatórios de identificação e delimitação ainda estão em análise pela
FUNAI.




                                      48
6.3.2 Localização e situação fundiária da T.I. Ubawawê


A Terra Indígena Ubawawê localiza-se no Município de Novo São Joaquim no
Estado de Mato Grosso. A sociedade indígena é a Xavante, da família
lingüística Jê. A superfície da terra indígena é de 52.234 ha e superfície de 119
km. A população da TI é de 29 indíos (FUNAI, 1998).


UBAWAWE (Ponte Grande). Este nome faz referencia à existência, em tempos
remotos, de uma grande árvore derrubada sobre o Rio Paraíso, que era
utilizada na sua travessia durante os freqüentes deslocamentos que faziam
pela região. Este nome passou a identificar os próprios moradores dali,
especialmente uma facção dissidente da antiga Aldeia Oniudu, os quais hoje
habitam as Aldeias de Novo Paraíso, Aldeinha e Água Limpa (vide Mapa Etno-
Ecológico da TI Ubawawe, Anexo 2).




Situação Fundiária


Com o Decreto n° 84.337, de 21.12.1979, foi criada a Reserva Indígena
Parabubure com superfície de 226.555 ha, abrangendo a área Couto
Magalhães e o Posto Indígena Culuene.


Em 1981 foi demarcada a TI Parabubure com superfície de 224.447 ha. Mesmo
com a regularização de parte da área o grupo Xavante continuou a reiterar
seus pedidos de alteração dos limites sul da terra e, pela portaria n°
107/P/FUNAI, de 26.03.1996, foi designado um grupo de trabalho para efetuar
a identificação da área reivindicada, com superfície proposta de 51.900 ha e
perímetro de 120 Km. Pelo Despacho n° 49, de 29.08.1997, foi aprovado o
resumo do relatório circunstanciado de identificação e delimitação da TI
Ubawawê. A Portaria n° 456/MJ, de 25.06.1998, declarou a área de posse
permanente do grupo indígena Xavante com superfície aproximada de 51.900




                                       49
ha e determinando que a FUNAI promovesse a demarcação administrativa da
área.


Os trabalhos de demarcação da TI Ubawawê foram realizados em 1999, pela
FUNAI, resultando na superfície de 52.234 ha e perímetro de 119 km. Com a
demarcação física pode haver reajuste na área declarada, podendo haver
pequenas alterações (como é o caso da TI Ubawawê, que foi declarada com
51.900 ha e demarcada com 52.234 ha).


O levantamento fundiário procedido na TI Ubawawê pela FUNAI e pelo Instituto
de Terras de Mato Grosso, cadastrou dezenove ocupantes não-índios, dos
quais quatorze possuíam benfeitorias implantadas e passíveis de indenização,
por força do disposto no § 6º do art.231 da Constituição Federal.


As contestações opostas à identificação e delimitação da TI Ubawawê foram
julgadas improcedentes pelo Memo nº 157/DEID/DAF/FUNAI, de 5 de junho de
1998, conforme o art. 9º e o § 9º, do art. 2°, do Decreto 1.775, de 1996.


Em 2000, o Decreto s/n, de 30.08 homologa a demarcação administrativa da TI
Ubawawê, localizada no município de Novo São Joaquim/MT, com superfície
de 52.234 ha e perímetro de 119 km.




                                       50
6.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DAS TERRAS INDÍGENAS




O rio Culuene segue um traçado predominante de sudoeste para nordeste,
sendo que os principais contribuintes afluem na porção central da bacia. Pela
margem direita destacam-se o ribeirão Quinze de Agosto e os córregos São
José, Ouro Fino e Sem Nome; pela margem esquerda sobressaem os ribeirões
Azul, do Peixe e do Boi. De um modo geral o relevo é ondulado a suavemente
ondulado, e a cobertura vegetal é do tipo Cerrado, com grandes áreas
ocupadas pela pecuária extensiva (Prancha 2).


De suas cabeceiras, em altitudes da ordem dos 800 m, até o sítio da barragem,
já na cota 360 m, o curso do rio Culuene tem um desenvolvimento de 254 km,
o que lhe confere uma declividade média de cerca de 1,73 m/km. Essa
declividade moderada e a forma alongada da bacia (índice de compacidade de
2,1) são fatores fisiográficos que favorecem o amortecimento das ondas de
cheias afluentes ao aproveitamento.


Considerando que as TIs Parabubure e Ubawawe se localizam na bacia do rio
Culuene (ao contrário do Parque Indígena do Xingu, que já se encontra na
bacia do rio Xingu propriamente dito), serão apresentados abaixo dados de
meio físico-biótico obtidos nos estudos realizados pelo licenciamento ambiental
da PCH Paranatinga II, notadamente no que se refere a aspectos ambientais
regionais (clima, rede hídrica, entre outros). Apresenta-se, a seguir, dados
específicos obtidos através dos estudos de campo nas TIs, visando fornecer
uma visão tanto macro quanto micro ambiental da área.




                                      51
Prancha 2 – Instrumentos de pesca Xavante




                                            Área de pesca no rio
                                            Kuluene, próxima á aldeia
                                            Uawé,




                                            Rio Culuene dentro do
                                            perímetro das terras
                                            indígenas Xavante de
                                            Parabubure e Ubawawe.




     Rio Couto Magalhães,
   área de pesca xavante,
 interior da Terra Indígena
                Parabubure




                                   52
6.4.1 Aspectos regionais


    Clima


Segundo os critérios de classificação de Köeppen, o clima predominante na
bacia do rio Culuene é o Aw, tropical úmido com estação seca. Este tipo
climático é associado às regiões onde o total de chuva no período seco é
inferior a 30 mm, a temperatura média no mês mais quente é superior a 22 ºC,
e no mês mais frio é superior a 18 ºC.


Nesse sentido, observa-se que as temperaturas médias anuais oscilam entre
23ºC e 26ºC, aproximadamente. As temperaturas máximas podem ser
elevadas, chegando aos 40ºC, assim como podem ocorrer temperaturas
mínimas abaixo dos 10ºC, em função da entrada de massas de ar polar.
Apesar destes declínios, temperaturas de 30ºC são freqüentes no inverno.


A precipitação anual média sobre a bacia é de cerca de 1.825 mm, com o
padrão de distribuição espacial apresentando ligeira tendência de crescimento
de sul-sudeste (1750mm/ano) para norte-noroeste (1900 mm/ano). A exemplo
do que ocorre em grande parte da região Centro-Oeste, o período chuvoso vai
de novembro a março e concentra cerca de 80% das chuvas, com maiores
incidências no trimestre de dezembro a fevereiro. O período de estiagem vai de
maio a setembro, com o trimestre mais seco de junho a agosto.


O escoamento do rio Culuene acompanha o regime sazonal das chuvas, com
cerca de um mês de defasagem. A predominância de solos arenoquartzosos
profundos no trecho superior da bacia confere boas condições de regularização
natural de vazões, que perduram ainda depois, quando a bacia passa a
assentar em solos podzólicos e latossolos. Próximo à PCH Paranatinga II o rio
Culuene ainda sustenta vazões relativamente elevadas no trimestre crítico de
estiagem, da ordem dos 35 a 40% das vazões médias anuais. As Terra
Indígenas Parabubure (1) e Ubawawê (2) estão localizadas na região tropical,
na região quente semi-úmido (4 a 5 meses secos) (Figura 5).




                                         53
Figura 5 – Caracterização climática regional, com localização das TI’s Ubawawe, Parabubure e PIX.




                                               54
 Rede Hídrica


O rio Culuene, juntamente com o rio Sete de Setembro, é um dos principais
formadores do rio Xingu, integrando a sub-bacia 18 do Xingu que, por sua vez,
forma uma das sub-bacias da Bacia Amazônica.


Seus principais afluentes pela margem direita são os rios Suia-Missu (médio
curso) e Comandante Fontoura (baixo curso). Pela margem esquerda o Xingu
recebe os rios Curisevo, Tamitatoala e Ronuro (alto curso), Arraias e
Manissuiá-Missu (médio curso). A Bacia do rio Culuene apresenta altas taxas
de escoamento superficial, em média da ordem de 20 l/s/km2, onde a média do
período menos chuvoso nunca foi inferior a 11,0 l/s/km2 (Figura 6).


As cabeceiras do rio Culuene, situadas entre os municípios de Planalto da
Serra, Nova Brasilândia e Primavera do Leste, ultrapassam os limites da
Depressão Interplanáltica de Paranatinga, atingindo a parte mais elevada do
Planalto dos Guimarães (600-700m de altitude). Este rio comporta-se como o
maior coletor de águas da região da Depressão, tendo em seu alto curso
ocorrência de corredeiras e quedas d´água, com leito predominantemente
rochoso, na área onde faz limite com a Província Serrana e o Planalto do
Guimarães. Cerca de 30 km antes de chegar à escarpa limítrofe que separa a
Depressão Interplanaltica de Paranatinga do Planalto Dissecado dos Parecis,
este rio começa a emeandrar-se, formando planícies e terraços fluviais com
grande quantidade de meandros abandonados (PRODEAGRO, 1996).


Durante os estudos de diagnóstico realizados por conta do licenciamento
ambiental da PCH (portanto, em momento anterior ao início das obras), foram
obtidos dados referentes à qualidade da água do rio Culuene, abaixo
transcritos. Os estudos serviram para estimar possíveis cenários do ambiente
aquático no futuro reservatório nas fases de enchimento e estabilização; avaliar
a qualidade da água com relação aos limites da Resolução CONAMA nº
20/1989 para rios de Classe II, como é o caso, e suas adequações aos usos da
água atuais e futuros.




                                      55
Figura 6 – Caracterização hidrográfica regional, com localização das TI’s Ubawawe,
Parabubure e PIX.




                                       56
As coletas de água foram realizadas em outubro de 2002, que corresponde ao
final do período de estiagem na região. Foram amostradas duas estações de
coleta, uma à montante e outra à jusante do futuro barramento, codificadas
como sendo CULU1 e CULU2, respectivamente, localizadas próximas ao
empreendimento (portanto, não compreendendo as TIs aqui analisadas ou
mesmo suas proximidades).


Foram medidos 21 parâmetros físico-químicos e 6 parâmetros biológicos da
água, incluindo a comunidade de macroinvertebrados bentônicos que
colonizam o sedimento de fundo. Em campo foi medido a transparência de
Secchi, bem como feitas anotações sobre as condições do ambiente aquático e
seu entorno.


As amostragens qualitativas da comunidade fitoplanctônica foram realizadas
com rede de plâncton, malha 25µm, através de 20 arrastes contra a corrente. O
material concentrado foi preservado em solução de Transeau. Para as análises
quantitativas dessa comunidade, as coletas de água foram feitas através de
passagem de frasco de 300 mL na sub-superfície, onde foi adiconado 5 mL de
solução de lugol-acético a 1%.


Já as coletas de zooplâncton para as análises qualitativas foram realizadas
com rede cônica de malha 61 µm, através de arraste contra a corrente por
cerca de 5 minutos. Para as análises quantitativas dessa comunidade foram
filtrados 150 litros de água nesta mesma rede. Ambas as amostras foram
preservadas com 10mL de solução de formol à 40%.


As coletas de sedimento das margens do rio Culuene para análise da
comunidade de macroinvertebrados bentônicos foram realizadas manualmente,
devido à dificuldade em manusear a draga no leito rochoso. As amostras de
sedimento      para   análise    quali-quantitativa   desta   comunidade   foram
armazenadas em sacos plásticos e preservadas em formol a 8%.




                                         57
Todas as amostras coletadas nas quatro campanhas foram transportadas até o
laboratório AQUANÁLISE em Cuiabá e as análises foram realizadas seguindo
metodologias estabelecidas pelo APHA/AWWA (1990).


As análises da clorofila foram realizada pelo método espectrofotométrico em
µg/L. Cada resultado foi obtido a partir da média de tréplicas, ou seja, foram
analisadas três sub-amostras para cada frasco de coleta.


As determinações dos índices de coliformes seguiram o método Colilert, com
confiabilidade 95% e unidade em NMP/100mL.


As densidades das populações fitoplanctônicas (nº ind/mL) foram estimadas
pelo método de sedimentação, conforme Utermöhl (1958) em microscópio
invertido. Foram enumerados os indivíduos (células, colônias, cenóbios e
filamentos) em tantos campos aleatórios (Uhelinger, 1964) quanto os
necessários para alcançar 100 indivíduos da espécie mais freqüente, de modo
que o erro de contagem seja inferior a 20% (p< 0.05; Lund et all, 1958). Nas
amostras em que este critério não pôde ser atingido em função das baixas
concentrações de algas e/ou elevado teor de sedimento em suspensão,
contou-se tantos campos quantos os necessários para estabilizar o número de
espécies adicionadas a cada campo contado (método da área mínima). As
riquezas de espécies (nºtaxa/amostra) foram avaliadas considerando-se o
número total de espécies em cada amostra. A identificação das taxas foram
realizadas utilizando-se Bourrelly (1970), Bicudo & Bicudo (1970), De-
Lamonica-Freire (1985), Krammer & Lange-Bertalot (1991), Garcia de Emiliani
(1993), Bicudo et all (1995), Huszar & Silva (1999).


As análises da comunidade zooplanctônica foram feitas com microscópio
esteroscópico e óptico. A identificação foi realizada utilizando-se os trabalhos
de Koste (1978), Reid (1985), Paggi (1995), Elmoor-Loureiro (1997). Foram
feitas contagens dos organismos da amostra total, devido a pouca quantidade




                                       58
em número de indivíduos por m3. As contagens processaram-se em lâmina do
tipo “Sedgewich-rafter”.


As amostras de sedimento coletadas para a análise dos macroinvertebrados
bentônicos foram inicialmente lavadas em peneira de malha de 200µm de
abertura, em água corrente. Posteriormente, o material retido foi triado em
microscópio estereoscópico e em seguida os organismos foram preservados
em álcool 70%, devidamente identificados e contados a nível de classe, ordem
e família e, no caso da família Chironomidae, a nível de tribo. As identificações
taxonômicas foram feitas com auxílio de literatura especializada (McCafferty,
1981; Rosernberg & Resh, 1993; Trivinho Strixino & Strixino, 1995; Merritt &
Cummins, 1996).


    Descrição das metodologias de análise da água



    PARÂMETRO              UNIDADE                       MÉTODO
pH                                       pH-mêtro WTW
Condutividade elétrica       µS/cm       Condutivímetro WTW
Alcalinidade               mg/L CaCO3    Potenciométrico
Dureza Total               mg/L CaCO3    Titulométrico do EDTA
Turbidez                      UNT        Turbidímetro
Série de Sólidos              Mg/L       Gravimétrico
Oxigênio dissolvido           Mg/L       Winkler modificado
Nitrogênio Kjeldhal           Mg/L       Colorimétrico do Fenato
Amônia                        Mg/L       Colorimétrico do Fenato
Nitrato                       Mg/L       Colorimétrico do Fenoldissulfônico
Fósforo total                 Mg/L       Colorimétrico do Molibdato
Cálcio                        Mg/L       Espectrofotometria de absorção atômica
Ferro total                   Mg/L       Espectrofotométrico
Sílica                        Mg/L       Colorimétrico do Molibdato
Sulfato                       Mg/L       Espectrofotométrico
DBO                           Mg/L       Diluição e incubação
DQO                           Mg/L       Titulométrico com Sulfato Amoniacal




                                        59
Com os resultados de densidade e riqueza específica do fitoplâncton,
zooplâncton e bentos foi calculado o Índice de Diversidade de Shannon-
Weaver, descrito na fórmula abaixo, segundo Odum (1988):


                                 Onde:
        n                        Pi = n/N, sendo
    -   Σ Pi log Pi
        1                        n= valor de importância de cada espécie
                                 N= total dos valores de importância




Descrição das estações de coleta


Coleta CULU1: Margens com vegetação natural, com mata ciliar preservada.
                 Não ocorrência de macrófitas aquáticas. Fluxo intenso com
                 leito do tipo arenoso-predregoso. Coleta realizada às 11:15
                 horas na ponte sobre a MT-020, local do futuro corpo do
                 reservatório.


Coleta CULU2: Margens com vegetação natural, com mata ciliar preservada.
                 Não ocorrência de macrófitas aquáticas. Fluxo intenso com
                 leito do tipo arenoso-predregoso. Coleta realizada às 12:20
                 horas na margem direita do rio, à jusante da futura barragem.




Os resultados dos 21 parâmetros físico-químicos obtidos nas coletas
encontram-se no Quadro a seguir.




                                         60
Parâmetro               Unidade         CULU1         CULU2
  Condutividade elétrica         µS/cm            31,0            30,9
  PH                               -                7,6             7,7
  Transparência de Secchi          M              0,80            0,80
  Turbidez                        UNT                13             12
  Alcalinidade total           mgCaCO3/L             15             15
  DBO                             mg/L             <1              <1
  DQO                             mg/L             <6              <6
  Oxigênio dissolvido             mg/L              7,7             4,0
  Nitrogênio Kjeldhal             mg/L           0,027         < 0,020
  Amônia                          mg/L           0,006         < 0,001
  Nitrato                         mg/L           0,041           0,059
  Fosfato Total                    mg/L          0,026           0,085
  Sílica                           mg/L          2,528           2,428
  Ferro total                      mg/L           0,37           0,392
  Cálcio                           mg/L             3,8             3,8
  Sulfato                          mg/L          < 0,1              0,6
  Sólidos totais                   mg/L              10             54
  Sólidos totais dissolvidos       mg/L               4               4
  Sólidos totais suspensos         mg/L               6             50
  Sólidos sedimentáveis            mg/L          < 0,1           < 0,1



Os resultados encontrados nas duas estações de coleta foram semelhantes,
exceto quanto ao oxigênio dissolvido, fosfato total e sólidos suspensos. Essa
diferença deve estar relacionada à queda d´água que existe entre um local e
outro de coleta, o que favorece a resuspensão do sedimento, ocasionando leve
aumento dos sólidos suspensos que, por sua vez, resuspende também
compostos fosfatados retidos no sedimento. Quanto ao oxigênio dissolvido, era
de se esperar uma maior concentração abaixo da corredeira, o que não
ocorreu devido ao fato da coleta ter sido realizada na margem do rio na
estação CULU2, local onde há menor aeração pelo fluxo.




                                     61
Quanto aos valores de alcalinidade total e cálcio, observou-se a ocorrência de
carbonatos e formas de cálcio na água, aspecto certamente relacionado à
ocorrência de formações calcáreas na região das cabeceiras do rio Culuene,
aspecto que influenciou nos resultados levemente básicos do pH. Essa
característica será favorável no enchimento do reservatório, pois a alcalinidade
servirá de tampão às substâncias ácidas que serão liberadas com a
decomposição da biomassa inundável, controlando assim a diminuição do pH
da água.


A concentração dos nutrientes (NKT, NH3, NO2 e Pt) foi baixa, característica
também relacionada aos baixos resultados de DBO e DQO, indicando que o
aporte de matéria orgânica e inorgânica para o rio é pequeno. Provavelmente
com as chuvas esses resultados devem aumentar, mas não muito, uma vez
que as matas ciliares são preservadas, aspecto que não favorece o arraste de
detritos para o leito do rio, ou seja, as alterações da qualidade da água com as
chuvas deverão ser discretas. Barrela et allii (2001) frisam que o papel das
matas ciliares e dos ecótonos água-terra são muito importantes nos processos
de oxi-redução e ciclagem de nutrientes. Naturalmente os ecótonos água-terra
recebem uma grande quantidade de matéria orgânica e inorgânica dos
sistemas adjacentes, inclusive da própria mata ciliar, cuja deposição ocorre de
maneira discreta no tempo e no espaço. Em vista disto, essas zonas de
transição funcionam como filtros que retém e transformam a matéria,
amortecendo os impactos das áreas adjacentes e favorecendo, assim, a
manutenção da biota aquática. Essa função dos ecótonos água-terra também é
importante em lagos e reservatórios, sejam naturais ou de origem antrópica.


A concentração de sílica foi relativamente alta, aspecto relacionado à natureza
arenosa do leito do rio Culuene. Isto favoreceu a ocorrência de espécies de
diatomáceas (Bacillariophyceae), que precisam deste elemento para formar a
carapaça de sílica que envolve suas células.




                                      62
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06
Relatorio final paranatinga 12 05-06

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Cartilha residuos-da-construcao-civil
Cartilha residuos-da-construcao-civilCartilha residuos-da-construcao-civil
Cartilha residuos-da-construcao-civil
Markuns Amaral
 
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
Universidade Federal Fluminense
 
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol atApresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
Clotildes Clere Alcântara
 
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura geografia
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura   geografiaTese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura   geografia
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura geografia
pesquisamateus
 
Madeira - Uso Sustentável na Construção Civil
Madeira - Uso Sustentável na Construção CivilMadeira - Uso Sustentável na Construção Civil
Madeira - Uso Sustentável na Construção Civil
guest6ea8913
 
Manual de recuperação de áreas degradadas
Manual de recuperação de áreas degradadasManual de recuperação de áreas degradadas
Manual de recuperação de áreas degradadas
Diogo Brodt
 

Mais procurados (20)

Cartilha residuos-da-construcao-civil
Cartilha residuos-da-construcao-civilCartilha residuos-da-construcao-civil
Cartilha residuos-da-construcao-civil
 
Resumo executivo final
Resumo executivo finalResumo executivo final
Resumo executivo final
 
V encuentro sema luiza chomenko
V encuentro sema luiza chomenkoV encuentro sema luiza chomenko
V encuentro sema luiza chomenko
 
Lavras alianza . 28.10.2011
Lavras   alianza . 28.10.2011Lavras   alianza . 28.10.2011
Lavras alianza . 28.10.2011
 
Projeto de iniciação científica modelo
Projeto de iniciação científica   modeloProjeto de iniciação científica   modelo
Projeto de iniciação científica modelo
 
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
Planejamento e gestão ambiental das cidades dissertaçao final 23.07.2005
 
Percep n 9
Percep n 9Percep n 9
Percep n 9
 
Manual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadasManual recuperação áreas degradadas
Manual recuperação áreas degradadas
 
Lkfl brito modelagem de nicho em espécies vegetais da caatinga_ct14_aps [modo...
Lkfl brito modelagem de nicho em espécies vegetais da caatinga_ct14_aps [modo...Lkfl brito modelagem de nicho em espécies vegetais da caatinga_ct14_aps [modo...
Lkfl brito modelagem de nicho em espécies vegetais da caatinga_ct14_aps [modo...
 
Actividade Agricola
Actividade AgricolaActividade Agricola
Actividade Agricola
 
Ong's - fóruns de conhecimento - questões socioambientais (por Juliana Bussol...
Ong's - fóruns de conhecimento - questões socioambientais (por Juliana Bussol...Ong's - fóruns de conhecimento - questões socioambientais (por Juliana Bussol...
Ong's - fóruns de conhecimento - questões socioambientais (por Juliana Bussol...
 
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol atApresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
Apresentação do projeto turismo cultural em grao mogol at
 
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura geografia
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura   geografiaTese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura   geografia
Tese riscos de impactos ambientais negativos da suinocultura geografia
 
Relatorio bioma pampa
Relatorio bioma pampaRelatorio bioma pampa
Relatorio bioma pampa
 
Beira Rio - Piracicaba
Beira Rio - PiracicabaBeira Rio - Piracicaba
Beira Rio - Piracicaba
 
Madeira - Uso Sustentável na Construção Civil
Madeira - Uso Sustentável na Construção CivilMadeira - Uso Sustentável na Construção Civil
Madeira - Uso Sustentável na Construção Civil
 
Projeto 20 Doc
Projeto 20 DocProjeto 20 Doc
Projeto 20 Doc
 
Manual de recuperação de áreas degradadas
Manual de recuperação de áreas degradadasManual de recuperação de áreas degradadas
Manual de recuperação de áreas degradadas
 
Manual residuos solidos
Manual residuos solidosManual residuos solidos
Manual residuos solidos
 
Encarte6
Encarte6Encarte6
Encarte6
 

Destaque

Summary research
Summary researchSummary research
Summary research
Laura Nobel
 
29 2012
29  201229  2012
29 2012
CCDH75
 
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistro
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistroControldereportes codigoinsertarnuevoregistro
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistro
Willian Tecpa Sanchez
 
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA IIA COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
Paulo Dias Nogueira
 
30hr guitar_workout.ejercicios
 30hr guitar_workout.ejercicios 30hr guitar_workout.ejercicios
30hr guitar_workout.ejercicios
Rober Moreno A
 
Tiphaine_GAZAN_CV-créatif
Tiphaine_GAZAN_CV-créatifTiphaine_GAZAN_CV-créatif
Tiphaine_GAZAN_CV-créatif
Tiphaine Gazan
 
2016-17-Tour-TheActingCompany
2016-17-Tour-TheActingCompany2016-17-Tour-TheActingCompany
2016-17-Tour-TheActingCompany
Lisa M. Gutting
 
Reseña presentaciones orales
Reseña presentaciones oralesReseña presentaciones orales
Reseña presentaciones orales
Amara Marquez
 
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
Trina Savage
 
Taller gestión curricular
Taller gestión curricularTaller gestión curricular
Taller gestión curricular
Rodrigo Villa
 
Spinetta para el blog...
Spinetta para el blog...Spinetta para el blog...
Spinetta para el blog...
Frann Simiones
 

Destaque (20)

Summary research
Summary researchSummary research
Summary research
 
A metáfora do coração
A metáfora do coraçãoA metáfora do coração
A metáfora do coração
 
29 2012
29  201229  2012
29 2012
 
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistro
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistroControldereportes codigoinsertarnuevoregistro
Controldereportes codigoinsertarnuevoregistro
 
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA IIA COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
A COMPREENSÃO WESLEYANA DA GRAÇA II
 
30hr guitar_workout.ejercicios
 30hr guitar_workout.ejercicios 30hr guitar_workout.ejercicios
30hr guitar_workout.ejercicios
 
Tiphaine_GAZAN_CV-créatif
Tiphaine_GAZAN_CV-créatifTiphaine_GAZAN_CV-créatif
Tiphaine_GAZAN_CV-créatif
 
2016-17-Tour-TheActingCompany
2016-17-Tour-TheActingCompany2016-17-Tour-TheActingCompany
2016-17-Tour-TheActingCompany
 
Fabulous 4 Balsamiq's
Fabulous 4 Balsamiq'sFabulous 4 Balsamiq's
Fabulous 4 Balsamiq's
 
Reseña presentaciones orales
Reseña presentaciones oralesReseña presentaciones orales
Reseña presentaciones orales
 
Actividad N°2 "Todo es arte"
Actividad N°2 "Todo es arte"Actividad N°2 "Todo es arte"
Actividad N°2 "Todo es arte"
 
Tandakekuasaanallah 120928223303-phpapp01 (1)
Tandakekuasaanallah 120928223303-phpapp01 (1)Tandakekuasaanallah 120928223303-phpapp01 (1)
Tandakekuasaanallah 120928223303-phpapp01 (1)
 
Unidad I Computador e Internet
Unidad I Computador e InternetUnidad I Computador e Internet
Unidad I Computador e Internet
 
Pregadores leigos
Pregadores leigosPregadores leigos
Pregadores leigos
 
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
CHANGE AGENT ACTION PLAN 021213
 
L'escola mallorquina. Estudiem Rosselló Pòrcel
L'escola mallorquina. Estudiem Rosselló PòrcelL'escola mallorquina. Estudiem Rosselló Pòrcel
L'escola mallorquina. Estudiem Rosselló Pòrcel
 
2007 11 11 família kobayashi
2007 11 11   família kobayashi2007 11 11   família kobayashi
2007 11 11 família kobayashi
 
Taller gestión curricular
Taller gestión curricularTaller gestión curricular
Taller gestión curricular
 
Mini's Balsamiq's
Mini's Balsamiq'sMini's Balsamiq's
Mini's Balsamiq's
 
Spinetta para el blog...
Spinetta para el blog...Spinetta para el blog...
Spinetta para el blog...
 

Semelhante a Relatorio final paranatinga 12 05-06

Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
Islândia Sousa
 
Projeto Nascentes Urbanas
Projeto Nascentes Urbanas Projeto Nascentes Urbanas
Projeto Nascentes Urbanas
Deise Mara do Nascimento
 
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
Resgate Cambuí
 
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
cbsaf
 

Semelhante a Relatorio final paranatinga 12 05-06 (20)

Novas perspectivas na reconstituição do modo de vida dos sambaquieiros: uma...
Novas perspectivas na reconstituição do modo de vida dos sambaquieiros: uma...Novas perspectivas na reconstituição do modo de vida dos sambaquieiros: uma...
Novas perspectivas na reconstituição do modo de vida dos sambaquieiros: uma...
 
Apresentação do Workshop Colaborativo com Professores - Erika González
Apresentação do Workshop Colaborativo com Professores - Erika GonzálezApresentação do Workshop Colaborativo com Professores - Erika González
Apresentação do Workshop Colaborativo com Professores - Erika González
 
Art 6 Thomaz
Art 6 ThomazArt 6 Thomaz
Art 6 Thomaz
 
CULTURA DO SOLO.pdf
CULTURA DO SOLO.pdfCULTURA DO SOLO.pdf
CULTURA DO SOLO.pdf
 
Vera cruz
Vera cruzVera cruz
Vera cruz
 
Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
Parque Floresta Fóssil do Rio Poty, Teresina/PI - Apresentação iv etapa ofici...
 
Geografia e Historia Natural no Vale do Jurua -Acre
Geografia e Historia Natural no Vale do Jurua -AcreGeografia e Historia Natural no Vale do Jurua -Acre
Geografia e Historia Natural no Vale do Jurua -Acre
 
Projeto Nascentes Urbanas
Projeto Nascentes Urbanas Projeto Nascentes Urbanas
Projeto Nascentes Urbanas
 
Oficina_ONDAS_SAN_RURAL_1a_PARTE (1).pdf
Oficina_ONDAS_SAN_RURAL_1a_PARTE (1).pdfOficina_ONDAS_SAN_RURAL_1a_PARTE (1).pdf
Oficina_ONDAS_SAN_RURAL_1a_PARTE (1).pdf
 
LEAL&RODRIGUES_13CBGE
LEAL&RODRIGUES_13CBGELEAL&RODRIGUES_13CBGE
LEAL&RODRIGUES_13CBGE
 
Plano de uinidade
Plano de uinidade  Plano de uinidade
Plano de uinidade
 
GEOPARQUE Serra da Capivara (PI)
GEOPARQUE Serra da Capivara (PI)GEOPARQUE Serra da Capivara (PI)
GEOPARQUE Serra da Capivara (PI)
 
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
Contextualização da arborização urbana no brasil sob a prespectiva da gestão ...
 
ANAIS II SIMPHOBIO 2021 (1).pdf
ANAIS II SIMPHOBIO 2021 (1).pdfANAIS II SIMPHOBIO 2021 (1).pdf
ANAIS II SIMPHOBIO 2021 (1).pdf
 
Congeapa/Valm 27/3/18
Congeapa/Valm 27/3/18Congeapa/Valm 27/3/18
Congeapa/Valm 27/3/18
 
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
Dia 4 - SAFs na perspectiva da Agroecologia - A pesquisa em SAFs e as possibi...
 
Comitê estadual da reserva da biosfera da mata atlântica -26/06/2012
Comitê estadual da reserva da biosfera da mata atlântica -26/06/2012Comitê estadual da reserva da biosfera da mata atlântica -26/06/2012
Comitê estadual da reserva da biosfera da mata atlântica -26/06/2012
 
Oficina de projeto e publicação cientifica
Oficina de projeto e publicação cientificaOficina de projeto e publicação cientifica
Oficina de projeto e publicação cientifica
 
Plano de manejo REBIO de Una
Plano de manejo  REBIO de UnaPlano de manejo  REBIO de Una
Plano de manejo REBIO de Una
 
Apresentação - Dissertação de Mestrado em Antropologia e Arqueologia
Apresentação - Dissertação de Mestrado em Antropologia e ArqueologiaApresentação - Dissertação de Mestrado em Antropologia e Arqueologia
Apresentação - Dissertação de Mestrado em Antropologia e Arqueologia
 

Relatorio final paranatinga 12 05-06

  • 1.
  • 2. ESTUDOS DE COMPLEMENTAÇÃO DOS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS DA PCH PARANATINGA II PARA AS TERRAS INDÍGENAS PARABUBURE, UBAWAWE E PARQUE INDÍGENA DO XINGU EMPREENDEDOR PARANATINGA ENERGIA S/A Av. Historiador Rubens de Mendonça n. 2000, Sala 1209 Edif. Centro Empresarial Cuiabá, Bosque da Saúde Cuiabá / Mato Grosso. Cep 78.050-000. Fone (65) 2121-4400 Responsável: Sr. Manuel Gonçalves Martins (Diretor de Operação) EXECUÇÃO DOCUMENTO Antropologia e Arqueologia SS Ltda Rua Alcides Mendes de Barros n. 116, Jardim Leopoldina, Carapicuíba /SP. Cep 06382-330. Fones/fax: (11) 4169-4280 / 4169-9567 Email: arqueo@terra.com.br Responsável: L.D. Dra. Erika Marion Robrahn-González 2
  • 3. INDICE 1. ANTROPOLOGIA E PATRIMÔNIO CULTURAL COM ENFOQUE TRANSDISCIPLINAR 6 1.1 CONCEPÇÃO TEÓRICA DO PROGRAMA: DAS ABORDAGENS TRANSDISCIPLINARES EM ANTROPOLOGIA 6 1.2 DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO E O USO DO ENFOQUE DA ANTROPOLOGIA DA PAISAGEM 10 1.3 TERRAS INDÍGENAS E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL 14 2. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS 16 2.1 CONCEITUAÇÃO GERAL 16 2.2 PRODEDIMENTOS DE CAMPO NA PESQUISA DIAGNÓSTICA 24 3. OBJETIVOS DO PROGRAMA 26 4. LEGISLAÇÃO INTERVENIENTE 28 5. A ÁREA DE PESQUISA E COMUNIDADES ENVOLVIDAS 32 6. ESTUDOS JUNTO À COMUNIDADE XAVANTE (TI PARABUBURE E UBAWAWE) 37 6.1 APRESENTAÇÃO 37 6.2 CARACTERIZAÇÃO LINGÜÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS POVOS XAVANTE 43 6.3 AS TERRAS INDÍGENAS PARABUBURE E UBAWAWE 45 6.3.1 Localização e situação fundiária da TI Parabubure 45 6.3.2 Localização e situação fundiária da TI Ubawawe 49 6.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DAS TERRAS INDÍGENAS 51 6.4.1 Aspectos regionais 53 6.4.2 Caracterização das TIs Parabubure e Ubawawe 78 6.5 CARACTERIZAÇÃO DO MODO DE VIDA DO GRUPO INDÍGENA XAVANTE, COM ÊNFASE NA IMPORTÂNCIA DOS RECURSOS HÍDRICOS E VEGETAÇÃO/FAUNA RELACIONADOS 95 3
  • 4. 6.5.1 A territorialidade Xavante 95 6.5.2 Caracterização do uso dos recursos naturais 100 6.6 RELAÇÃO SÓCIO-POLÍTICA, ECONÔMICA E CULTURAL DO GRUPO INDÍGENA COM A SOCIEDADE ENVOLVENTE 112 6.7 LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES DE ATENÇÃO À SAÚDE 115 6.8 ANÁLISE DE IMPACTOS 117 6.9 PROPOSIÇÃO DE MEDIDAS MITIGADORAS/COMPENSATÓRIAS 122 6.9.1 Medidas mitigadoras 122 6.9.2 Medidas Compensatórias 123 7. ESTUDOS JUNTO AOS POVOS DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU 128 7.1 APRESENTAÇÃO 128 7.2 CARACTERIZAÇÃO LINGÜÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS GRUPOS INDÍGENAS 140 7.2.1 Caracterização lingüística 140 7.2.2 Caracterização histórica e cultural 144 7.3 O PARQUE INDÍGENA DO XINGU 214 7.3.1 Histórico do Parque 214 7.3.2 Legislação Fundiária 216 7.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DO PIX 221 7.5 CARACTERIZAÇÃO DO MODO DE VIDA DOS GRUPOS INDÍGENAS DO PIX, COM ÊNFASE NA IMPORTÂNCIA DOS RECURSOS HÍDRICOS E VEGETAÇÃO / FAUNA RELACIONADOS 226 7.5.1 Coleta e manejo da vegetação nativa 229 7.5.2 Agricultura 238 7.5.3 A pesca e a caça 250 7.5.4 Calendário econômico-ecológico 274 7.5.5 O manejo informal dos recursos faunísticos 279 7.6 RELAÇÃO SÓCIO-POLÍTICA, ECONÔMICA E CULTURAL DOS GRUPOS INDÍGENAS COM A SOCIEDADE ENVOLVENTE 288 7.6.1 Organizações Indígenas 288 7.6.2 Educação 290 7.6.3 Turismo Étnico 293 4
  • 5. 7.6.4 Relações com a sociedade envolvente: o problema da degradação nas cabeceiras dos formadores do Xingu 298 7.7 LEVANTAMENTO DAS CONDIÇÕES DE ATENÇÃO À SAÚDE 304 7.8 ANÁLISE DE IMPACTOS 308 7.9 INDICAÇÃO DE MEDIDAS MITIGADORAS/ COMPENSATÓRIAS 325 7.9.1 Considerações iniciais 325 7.9.2 Medidas Preventivas / Mitigadoras 327 7.9.3 Medidas Compensatórias 330 8. BIBLIOGRAFIA 337 9. EQUIPE TÉCNICA 346 ANEXOS: 349 ANEXO 1 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DA TI PARABUBURE 350 ANEXO 2 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DA TI UBAWAWE 352 ANEXO 3 – MAPA ETNO-ECOLÓGICO DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU 354 ANEXO 4 – ANIMAIS SILVESTRES MENCIONADOS PELOS ÍNDIOS DO PIX, COM BREVE DESCRIÇÃO DE SUA UTILIDADE 356 ANEXO 5 – PLANTAS NATIVAS ÚTEIS MENCIONADAS PELOS ÍNDIOS DO PIX, COM BREVE DESCRIÇÃO DE SUA UTILIDADE 360 ANEXO 6 – COORDENADAS GEOGRÁFICAS COLETADAS EM ALDEIAS, ROÇAS, CAPOEIRAS, ÁREAS DE CAÇA E PESCA, SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS E OUTRAS LOCALIDADES NO PIX. 361 ANEXO 7– ATA DAS REUNIÃO REALIZADAS JUNTO ÀS COMUNIDADES INDÍGENAS DO PIX 369 ANEXO 8 – SIGLAS UTILIZADAS NO PRESENTE ESTUDO 396 5
  • 6. 1. ANTROPOLOGIA E PATRIMÔNIO CULTURAL COM ENFOQUE TRANSDISCIPLINAR 1.1 CONCEPÇÃO TEÓRICA DO PROGRAMA: DAS ABORDAGENS TRANSDISCIPLINARES EM ANTROPOLOGIA Atualmente os antropólogos têm questionado a plausibilidade e a utilidade de uma antropologia dos mundos contemporâneos (Augé, 1998; García Canclini, 2000). Não se trata só de uma preocupação da Antropologia, mas, também, de uma conjunção de fatos apontando para a construção de um objeto de estudo cada vez mais complexo, ora pelos processos de imbricação entre as distintas ciências sociais (que permite romper as fronteiras analíticas da especificação disciplinar), ora pela influência política direta que os estudos em ciências sociais vão adquirindo em nossas sociedades. Vale dizer que vamos exigindo uma renovação e uma nova ponderação do espaço teórico-metodológico que tem cruzado com a antropologia clássica (dos mundos exóticos constituídos num exercício de alteridade profunda e por uma localização territorial fixa e isolada), à luz do que devemos esclarecer sobre os nós que temos percorrido no presente. Como estímulo inicial à existência de uma renovação disciplinar surge o problema a dimensionar, a saber, o de como a antropologia - com seus novos projetos de analisar e perceber a realidade - pode assumir-se na prática de um encontro de enfoques transdisciplinares (Friedman, 2001; King, 1991; Cardoso de Oliveira, 1998; Boccara, 1999A; Viveros de Castro, 2002). Neste sentido, para a prática antropológica já não cabe conceber uma abordagem etnográfica com a única pretensão de abarcar um problema de pesquisa, num grupo específico fixo, sem relacionar os esquemas locais, regionais e mundiais que 6
  • 7. confluem “no campo” (Ortiz, 2004b). Para alcançar este objetivo é necessário, também, um novo tipo de profissional, capaz de compreender dinâmicas integrais dos processos que estuda, e capaz, ademais, de integrar o trabalho transdisciplinar como parte de seus fundamentos centrais para o planejamento e execução de projetos específicos de pesquisa. Neste ponto, o grande problema teórico surge quando são aplicadas visões descontextualizantes, localizantes e essencializantes sobre os fenômenos de estudo, o que tem gerado a partir de uma longa série de trabalhos, que vão desde o particularismo histórico boasiano até os atuais enfoques pós- estruturalistas e pós-modernos em Antropologia1. Não obstante, os processos de mudança e transformação cultural, junto com os espectros diversos desde os quais esses processos são gestados, obriga a pensar uma relação estrutural, ao mesmo tempo em que conjuntural, na qual se possam gerar descrições consistentes sobre processos particulares, que do mesmo modo contribuam com visões interpretativas dispostas para a construção de teorias regionais. Esta “estrutura da conjuntura”, ou a síntese situacional entre a estrutura e o acontecimento, é uma realização prática das categorias culturais num contexto histórico específico, tal como se expressa na ação interessada dos agentes históricos, desenvolvendo-se em cada uma das particularidades (Sahlins, 1997; Le Goff, 1991). Ao ocorrer isto, as sociedades vão criando processos de construção de identidade cultural, o qual desemboca ao mesmo tempo numa cristalização daqueles processos na 1 Muitas destas críticas estão expostas nos trabalhos de Boccara, 1999a; Friedman, 2001; Larraín, 2001; King, 1991; Saavedra, 2002, 2004. A respeito do grande problema teórico insurgente da aplicação dos modelos do particularismo histórico boasiano, pós-estruturalistas e pós-modernistas em antropologia, Boccara nos diz: ... quiçá seja importante insistir na idéia de que a “pureza original” apenas exista na imaginação de quem assim a concebeu, como por exemplo, nas utopias de certos nostálgicos do exotismo... [e que] o cientista social não deveria deixar-se obstruir pelas concepções “naturalizantes” ou “arcaizantes” da sociedade e da cultura. (Boccara, 1999b:32, traduçao livre do espanhol).Conseqüentemente, já que grande parte destas concepções foram e são consignadas pelas etnografias sul-americanas para a construção do panorama geral das relações inter-étnicas, a partir de registros sucintos e objetos de estudo isolados (Viveros de Casto, 2002), temos uma tarefa adicional, qual seja, corrigir e completar os quadros e visões gerais de análises etnográficas mais complexas a partir de trabalhos integradores tanto teórica como metodologicamente. Isto comprometerá os pesquisadores em adquirir ferramentas inéditas, capazes de abordar a mobilidade e as transformações das sociedades e culturas a partir de relações inter-étnicas e inter-sociais (Cashmore, 1996). 7
  • 8. história. Sem entender que as estruturas são componentes determinantes das sociedades ao mesmo nível que os acontecimentos, poderíamos perguntar: como se elaboram, na práxis, as categorias culturais? Neste ponto o aporte de Sahlins é significativo. A “estrutura da conjuntura” permite indagar sobre os processos sociais de uma forma muito mais elaborada e complexa, com os procedentes desafios metodológicos e técnicos que esta questão requer (Sahlins, 1997: 14-16)2. Com objetos de estudo mais dinâmicos é possível planejar pesquisas mais integradoras e visões teóricas mais complexas. A relevância dos estudos onde ficam envolvidos processos de conflitos interétnicos, e que implicam compreender complexas intervenções sociais, deve levar à definição de corpos teóricos que possam oferecer pontos de sinergia para a posterior elaboração de uma metodologia transdisciplinar. Os grupos humanos manejam uma ambigüidade estrutural para construir suas identidades, suas economias e seus processos de transformação política, porque nela descansam grande parte das expectativas por assegurar sua sobrevivência e transcendência. A concepção e uso dos espaços materiais, em relação às dinâmicas ou práticas culturais que dão forma e conteúdo ao dito 2 Anteriormente a este ponto de vista, reinava a concepção estruturalista dos processos históricos. Os aportes metodológicos são inegáveis. Não obstante, a etnologia concentrava-se imponderavelmente nas revelações sincrônicas da realidade, fazendo perdurar certas premissas que até hoje são imperativos inconscientes dos estudos antropológicos. O mesmo Levi-Strauss, no Pensamento Selvagem, referia: “O etnólogo respeita a história, mas não lhe concede um valor privilegiado. A concebe como uma busca complementar à sua: a uma lança o leque das sociedades humanas no tempo, à outra no espaço... esta relação simétrica entre etnologia e história parece ser rechaçada por filósofos que não crêem, implícita e explicitamente, que o destacamento no espaço e a sucessão no tempo ofereçam perspectivas equivalentes... a diversidade das formas sociais que a etnologia capta destacadas no espaço oferece o aspecto de um sistema descontínuo; dessa forma imaginamos que, graças à dimensão temporal, a história nos restitui não estados separados, mas, sim, de um estado ao outro em uma forma contínua” (371). E prossegue: “A característica do pensamento selvagem é ser atemporal; quer capte o mundo como totalidade diacrônica e sincrônica, e o conhecimento que se toma pareça àquele que oferece, de uma habitação, espelhos fixados em muros opostos que se refletem um ao outro... assim, o pensamento selvagem constrói edifícios mentais que lhe facilitam a compreensão do mundo, por quanto se parecem, neste sentido, definir como pensamento analógico... mas nesse sentido, também, distingue-se do pensamento domesticado, do que o conhecimento histórico constitui um aspecto... (381) mas, para que a práxis possa ser vivida como pensamento, é necessário primeiro (num sentido lógico e não histórico) que o pensamento exista: vale dizer, que suas condições iniciais estejam dadas na forma de uma estrutura objetiva do psiquismo e do cérebro que, na falta desse último, não haveria práxis nem pensamento” (382). 8
  • 9. território, são as manifestações básicas da construção de qualquer identidade (ver Hernández; 2003: 45). Por identidade cultural – dentro desta perspectiva – compreendemos aquele processo configurativo de práticas e manifestações culturais, presentes nos grupos humanos que procuram uma cristalização de transcendência ligada à sua permanência e reprodução. Não obstante, acreditamos que nunca se alcança um grau real de cristalização e in-mobilidade histórica, e que também não existe um início fundador (ou mito de origem real e objetivo das culturas). As etnogêneses, nesse sentido, são sempre procedimentos construtivos, apesar de que nas mentes dos indivíduos a representação daqueles processos seja sempre mais estática e microscópica. Em conseqüência, o sistema de identidades sociais, ao trabalhar indistintamente nas estruturas sociais e no individuo, vai forjando um novo questionamento. Ao assumir que as identidades são um processo constante de construção, presentes em um sistema, devemos também admitir que são um fenômeno subjetivo, inter-subjetvo e, às vezes, objetivo (Saavedra, 2002; Ortiz, 2004b). Dessa forma, poderemos afirmar uma negativa teórico-metodológica de reduzir o trabalho antropológico a uma mera tarefa de testificar e traduzir as realidades sócio-culturais estudadas. 9
  • 10. 1.2 DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO E O USO DO ENFOQUE DA ANTROPOLOGIA DA PAISAGEM Faz parte do objeto de estudo do presente trabalho conhecer os processos de interação, apropriação e significação dos habitantes das TIs Parabubure, Ubawawe e Parque Indígena do Xingu dentro de sua diversidade cultural, assim como de seu entorno biótico, paisagístico e simbólico. Para que ele seja bem definido, cabe-nos compreender a interpretação que esses grupos têm do meio, assim como definir as estratégias diferenciadas e compartilhadas de apropriação ambiental e, finalmente, relacionar tais aspectos com processos etnopolíticos, territoriais e econômicos contingentes na área. Aproximando-nos do nosso “objeto de estudo” surge a necessidade de definir alguns marcos de apoio, úteis para o inicio do diálogo teórico. Enfrentando este desafio e observando os atuais enfoques transdisciplinares para estudos de contingência, surge-nos um conceito possível de abarcar nossas necessidades específicas referentes à área de estudo. Tal conceito desenvolve-se a partir do uso de uma Antropologia da Paisagem, plausível de integrar tópicos de estudos ligados à ecologia (ou à etnoecologia), à interação das sociedades com os espaços territoriais (etnopolítica e territorialidade), às configurações simbólicas dos atores sobre seu entorno material e imaterial e, sobretudo, aos processos de apropriação da paisagem num sentido holístico e histórico, integrando tanto as estruturas sociais como culturais dos atores envolvidos. Estudos de cunho antropológico na Amazônia têm contado com a ecologia como ferramenta desde as décadas de 1960 e 70, com discussões relacionadas tanto à densidade da ocupação na região, assim como ao grau de influência que pode manter sobre os atuais grupos indígenas regionais. 10
  • 11. Um tema corrente no pensamento ecológico sul-americano é o da relação entre nível de complexidade sócio-cultural e oferta de alimentos, em determinado ambiente natural. Steward & Faron (1959) levam essa discussão ao extremo ao abordarem "a integração sócio-cultural no nível familiar". Os principais ingredientes dessa fórmula de subsistência são: população reduzida, tecnologia de caça e de coleta, ambiente natural com uma oferta de alimentos relativamente baixa. Carneiro (1968) chama a atenção para a importância do crescimento da população em uma área geograficamente ilimitada a qual, independentemente da fertilidade do solo, gera níveis cada vez mais elevados de complexidade sócio-cultural. (De Cerqueira, 19793). Embora os palcos sejam atualmente mais complexos, ora pelas transições econômicas dos países de América Latina, ora pela crescente crise ambiental sofrida pelos mesmos, não deixam se ser interessantes as propostas para acercar-nos à compreensão dos atuais processos da sociedade xinguana, tanto para se adaptar, como para se desenvolver, num palco cada vez mais agressivo quanto às relações interétnicas presentes na área4. Consequentemente, a compreensão deste fenômeno por parte dos pesquisadores sul-americanos promove a formação de consistentes conhecimentos sobre as formas de vida e apropriação da paisagem, em condições que necessariamente levam – tal como propõe Alvarado (2003) – ao tema da identidade. Esta busca supõe um retorno (analítico e metodológico) para a relação entre homem e natureza, já que os povos chamados “primitivos” sofrem uma acelerada transformação (Alvarado, 2003). Os princípios de organização social e sua relação com o meio ambiente serão discutidos, tendo em vista a formulação de uma nova base de comparação das povoações indígenas sul-americanas. 3 Este artigo, publicado em Current Anthropology em Setembro de 1979, passou a representar uma importante referência aos estudos sobre ecologia e índios sul-americanos. Posteriormente foi publicado em português por Darcy Ribeiro, com tradução de Berta Ribeiro. Esta versão digital consta na internet em http://www.jstor.org/view/00113204/dm991424/99p0380p/0 (versão em Inglês) e http://www.georgezarur.com.br/pagina.php/97 (versão em português), obtida em janeiro de 2006. 4 Referimo-nos basicamente à agressividade das “agências”, formais e informais, da sociedade brasileira e suas intervenções (científicas, econômicas, culturais, religiosas, políticas, etc.) que atuam crescentemente no interior do PIX. 11
  • 12. É aqui onde os dualismos epistemológicos ficam fora de ação. Em mãos com a cultura, os espaços territoriais se expressam tanto em significados (representação do espaço) como em usos de espaços reais (condutas), onde, do mesmo modo, configuram-se as transformações e cristalizações históricas. Com respeito às sociedades tribais e de chefaturas simples, envolvidas em torno de um âmbito de congregação direta, o espaço não só significa um pertence restringido, senão, também, o uso de outros espaços territoriais de alianças, ou bem, projeções de espaços míticos. Neste espaço territorial se forjam sistemas de identidades sociais, referindo- nos a que cada ator (individual ou coletivo) porta uma grande quantidade de identidades simultâneas referidas a diferentes tipos de fenômenos. É dessa forma que as culturas, as etnias, os gêneros, as nacionalidades, o status familiar, a situação socioeconômica, etc. podem confluir num só ator, que assume suas respectivas identidades ao mesmo tempo, e neste caso, no marco de seu próprio território5. Ante esse contexto, a noção de etnia, ou grupo étnico, deve re-conceitualizar- se (Barth, 1976; Abramoff, 2001; Bonfil, 1992), já que, a partir da proliferação dos conflitos de considerações étnicas, e partindo do pressuposto de que uma etnia se reinventa e se redefine como um recurso dos atores sociais para lograr estrategicamente certos interesses, os processos territoriais adquirem um formato de luta política pelo território frente à opressão da sociedade dominante. Nesse sentido, a etnicidade é parte integral da organização social, e os fatores que distinguem os grupos étnicos de outros grupos geralmente se conformam a partir de estratégias de contingência; por exemplo, a identidade étnica aparece só quando os grupos sentem-se ameaçados pela perda de alguns dos benefícios já adquiridos ou por aspirar a outros privilégios. É 5 Para Todorov é impossível conceber um “eu” relegado de um “outro”. Isso é o que converte à concepção unívoca do individuo em uma contradição interessante de considerar nos estudos aplicados ao contato; diz-nos “yo es otro... pero los otros también son yos: sujetos como yo, que sólo mi punto de vista, para el cual todos están allí y sólo yo estoy aquí, separa y distingue verdaderamente de mí” (p. 13); isso se justapõe também ao plano do nós/outros que tão complexamente vaticina a Antropologia. Para a questão das múltiplas identidades na era pós- moderna e suas possibilidades interpretativas, ver as análises de Zygmund Bauman (2005), em Identidades. 12
  • 13. conseqüente, e até esperado, então, compreender uma inter-relação direta entre as expressões étnicas da identidade junto às expressões de classe (6) (7), e não só especular sobre as intenções de busca de autonomia e autodeterminação que teriam as populações indígenas (Ortiz, 2004a). Enfim, o interesse por interagir teoricamente com propostas inovadoras deve levar necessariamente a contribuir para uma teoria regional sobre os processos territoriais e culturais fornecidos a partir de conflitos de considerações étnicas. Para isso, precisaremos de maiores recursos integradores desde a etnografia, a etnohistória, a etnoecologia, e obviamente a etnologia, para assim desafiar nossas próprias limitações à hora de construir nossos objetos de estudo e intervir cientificamente nas realidades que estudamos. 6 Para uma excelente revisão entre a relação entre etnia e classe, ver Sánchez; 1987 7 Muitos autores propõem que a “questão étnica” não pode separar-se de sua relação com os Estados nacionais (Díaz-Polanco, 1991; Sánchez, 1987; Esteva Fabregat, 1984, entre outros). 13
  • 14. 1.3 TERRAS INDÍGENAS E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL Compreender sistemas de manejo de recursos naturais envolve necessariamente uma abordagem transdisciplinar. Elementos ecológicos, como a capacidade de suporte do ambiente, sazonalidade e distribuição dos recursos sobre uso são tão fundamentais quanto aspectos de ordem sociocultural, como regimes de propriedade e regras locais de manejo (Berkes 1989, Ostrom 1993, McCay 1993). A perda do conhecimento tradicional, que segundo essa lógica ameaça a sustentabilidade dos sistemas sócioecológicos, é por Berkes et al. (1993) atribuída às inovações tecnológicas, a pressões devido ao crescimento populacional, à quebra dos sistemas tradicionais sociais, à perda do controle das populações locais sobre áreas e recursos e a mudanças de visão resultantes da urbanização. Barragens têm causado impactos graves sobre povos indígenas em todo o mundo, interferindo na vida, subsistência, cultura e existência espiritual. Fortes desigualdades e dissonâncias culturais, racismo institucional, discriminação social e marginalização política. Além disso, via de regra, as comunidades indígenas são excluídas dos benefícios (Colchester 2000). Na Amazônia, onde as terras indígenas superam em muito as Unidades de Conservação em termos de área de abrangência, os povos indígenas exerceram um papel histórico primordial na proteção da floresta. Vários estudos neste bioma mostram, através de análises de imagens de satélite em séries temporais e por sensoriamento remoto, que as Terras Indígenas agem como barreiras contra o desmatamento, que avança ao redor das mesmas (vide Nepstad et al 2005, entre outros). As Terras Indígenas brasileiras são elementos-chave para a conservação dos distintos biomas encontrados no Brasil, e de ecossistemas íntegros, desempenhando serviços ambientais essenciais, principalmente pela dificuldade de implantação, na prática, de uma estrutura eficiente de 14
  • 15. fiscalização num país de dimensões continentais, como o Brasil. Como resultado, hoje cerca de 85% das Unidades de Conservação brasileiras não estão implantadas efetivamente. Diversos autores concordam que, de fato, as terras indígenas na região neotropical funcionam como importantes unidades de conservação (Redford and Stearman 1993, Peres 1994, Peres e Terborgh 1995, Diegues 2000, Zimmerman 2001). Silvius (2004) argumenta que reservas tradicionais podem funcionar tão bem ou melhor que reservas estabelecidas simplesmente por motivos ecológicos, pois as comunidades envolvidas de fato respeitam seus limites. Por exemplo, o manejo de queixadas envolve necessariamente a manutenção de grandes extensões de áreas conservadas, florestais ou não, que garantam abrigo e alimento para bandos grandes em constante deslocamento. No caso dos Xavante da Reserva Rio das Mortes, também o papel tradicional do Xamã vai fortalecer a importância dada ao conhecimento etnoecológico e aos sistemas tradicionais de manejo. A importância das terras indígenas é ainda maior pela pequena representatividade, tanto qualitativa quanto quantitativa, do nosso atual Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, Lei número 9.985, de 18 em julho de 2002). Vale salientar que justamente o norte do Mato Grosso é região de transição entre a floresta da terra firme e o planalto central, conhecida no meio científico e na mídia como “arco do desmatamento”, e que tem sido um dos principais focos de remoção da cobertura vegetal original nas últimas décadas. As terras indígenas brasileiras já legalizadas totalizam mais de 110 milhões de hectares de áreas de valor potencial para a conservação da biodiversidade. No caso da bacia do Xingu, especificamente, diversas espécies consideradas ameaçadas, como a onça pintada, a ariranha, o queixada, o tatu canastra, além de inúmeras outras espécies, ocorrem na área, e estão, no caso do Parque Indígena do Xingu, livres de pressão de caça por conta de tabus culturais, como será detalhado mais adiante. 15
  • 16. 2. PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS 2.1 CONCEITUAÇÃO GERAL Em atendimento, por um lado, às solicitações feitas pelas comunidades indígenas envolvidas, pelo Termo de Referência emitido pela FUNAI8 e pelos órgãos públicos; e, por outro lado, considerando as especificidades científicas apresentadas, este Programa está baseado em 3 frentes de atuação, a saber:  estudos antropológicos (caracterização das terras indígenas em seus aspectos históricos, legais, ambientais, etnológicos, etnopolíticos e socioeconômicos);  estudos ecológicos referentes aos recursos ambientais existentes nas Terras Indígenas abordadas, com especial atenção para os recursos hídricos. Estes estudos envolvem não apenas uma caracterização física do ambiente de recursos disponíveis, mas, também, os aspectos culturais de uso e classificação destes recursos (estudos etnoictiológicos e etnotaxonômicos). Embora cada uma dessas frentes de atuação possua procedimentos e metodologias específicas, são tratadas de forma integrada e interdisciplinar, uma vez que têm o mesmo objetivo comum9. Neste sentido, a base metodológica do projeto se sustenta na pesquisa diagnóstica, a saber, uma estratégia de pesquisa apta e adequada para a abordagem de problemáticas onde ficam envolvidas intervenções sociais, 8 Uma listagem das siglas utilizadas no presente relatório e seus significados pode ser encontrada no Anexo 9. 9 Confrontar: Robrahn-González, E.M. 2005, “Projeto executivo do Programa Diagnóstico Antropológico e Patrimônio Cultural, Paranatinga II, Estado de Mato Grosso”. 16
  • 17. expostas como “ações para o desenvolvimento”, as quais, ao mesmo tempo, são parte de um fenômeno de intervenção sócio-política tendente a lograr certos fins, sustentados na configuração de um, ou vários, atores sociais determinados. A utilização da pesquisa diagnóstica deve oferecer uma estratégia metodológica integrada para construir as bases da coleta, análise e interpretação dos dados primários e secundários, tendo como referência algumas questões teórico-metodológicas abaixo detalhadas. Quando falamos de pesquisa diagnóstica nos referimos a uma “Estratégia Metodológica” e não a uma “Metodologia”. A diferença é crucial. A estratégia contém a possibilidade epistemológica, como técnica, de fornecer uma variabilidade de visões teóricas, padrões de enfoque, delimitações de objeto de estudo, etc., a partir de um trabalho interdisciplinar. A pesquisa diagnóstica, como estratégia metodológica, também fornece diferentes planos de indagação quanto aos alcances das investigações planejadas. É dizer, permite aproximar- se à construção de um objeto de estudo mais complexo, na medida em que os pesquisadores são capazes de identificar, nas diferentes intervenções sociais que estão configurando, a problemática determinada. Dentro desta estratégia de pesquisa há que se considerar questões que têm relação com os processos diacrônicos de transformação, as relações de poder imbricadas nas distintas intervenções sociais, bem como as conseqüentes repercussões sócio-culturais daqueles processos (Wolf, 1987). Então, o que estamos entendendo por intervenção social? A resposta a esta pergunta é fundamental, porque é aquela que demanda a especificidade da proposta metodológica deste Programa. Uma intervenção social é uma interação de transformação material e imaterial que realizam certos atores sociais, que procuram certos fins gerais e específicos através de certos meios, em determinadas condições ou contextos. Esta é uma proposta da sociologia funcionalista mertoniana (Merton 1957, 2003) que é de muita utilidade nos estudos que requerem uma análise mais detalhada sobre processos conflitivos contingentes, surgidos de uma luta de interesses. 17
  • 18. Os atores sociais sempre são complexos de determinar. Regularmente, têm processos de configuração sócio-cultural que implicam desenvolvimentos de identidade, território, economias, tradições, etc. Muitas vezes, os propósitos dos pesquisadores fazem parte destes sujeitos sociais, o qual deve ficar muito claro, e, além disso, deve ser exposto para manter a integridade científica do projeto quanto à busca pelo conhecimento o mais válido, confiável e exato possível. Os atores sociais também têm interesses diversos. Em outras palavras, são conjuntos complexos de indivíduos que se desenvolvem conjuntamente em diferentes graus de compromisso para o logro de certos fins. Dentro dos atores sociais também há relações assimétricas de poder, processos de negociação e estandardizações de certas imagens de identidade. Em nossa contingência de análise, os atores envolvidos são principalmente grupos indígenas (das TIs Parabubure e Ubawawe e do PIX), empreendedores do projeto da PCH Paranatinga II e organismos oficiais (estatais) de fiscalização e autorização. De fato, os atores sociais identificados neste esquema são os mesmos que em tantos processos sociais na América Latina se apresentam. Todavia, não é suficiente admitir somente esta relação tautológica, senão, também identificar a complexidade interna destes atores intervenientes no processo estudado. Os fins que procuram os atores sociais são tão complexos como a configuração dos mesmos atores. Existem fins explícitos e de curto alcance, assim como fins implícitos e de longo alcance. Os primeiros, fins explícitos, geralmente são simples de identificar, e ficam expressos nas declarações dos atores a respeito do conflito particular. Mas os segundos, fins implícitos, muitas vezes respondem a questões mais emaranhadas relacionadas com ideologias, cosmologias, e cosmogonias dos atores envolvidos. Neste sentido, o pesquisador que realiza uma indagação diagnóstica deve identificar aqueles fins primários, práticos e estratégicos (que ao mesmo tempo são “fins de médio alcance”), e reconhecer aqueles fins plasmados nas expectativas e esperanças últimas, aquelas relacionadas com os fundamentos ideológicos do sujeito social. Os “fins” também têm características sobre as bases de poder que 18
  • 19. sustentam o sujeito envolvido. Neste sentido, os fins podem ser “reformistas”, “revolucionários”, “empreendedores”, “alienadores”, “secularizadores”, etc. Os meios utilizados pelos atores sociais para lograr seus fins sempre serão conseqüentes aos seus requerimentos. O dito “o fim justifica os meios” se faz fundamental neste esquema. Se os fins são secularizadores, os meios estarão ligados à utilização da doxa política do contexto social onde se planeja a intervenção social. Se o fim, por outro lado, é revolucionário, os meios serão também revolucionários, provavelmente vanguardistas e desestruturadores. Talvez o esquema mertoniano fique diminuído enquanto se considerar as “condições” ou “contextos” onde as intervenções sociais são desenvolvidas. Este é um processo fundamental. Tanto a qualidade como as repercussões da intervenção estarão restritas aos contextos de ação. Neste sentido, requer-se um panorama etnográfico profundo, conjuntamente com uma exaustiva revisão de fontes. Nos contextos devem identificar-se as condições políticas, econômicas, ideológicas e culturais que definem os atores, os fins e os meios utilizados. Neste estado das coisas, converge o mais difícil de identificar, a saber: que os processos sociais conformam-se a partir de uma série indefinida de intervenções sociais, muitas vezes contrapostas, e sempre multi-direcionais, o que vai definindo a particularidade da construção histórica. Podemos dizer, assim, que a historia é um processo intrincado de transformação e cristalização de acontecimentos (“estruturas da conjuntura”, como diria Sahlins10) e de intervenções sociais diversas, competindo por estabelecer transformação e perduração dos atores sociais (conforme demonstra o esquema abaixo). 10 Salhins, 1997. Esta não é uma historia das particularidades. Sahlins não se refere a uma história moldada na ortodoxia da sucessão de feitos não-repetíveis. O autor diz: “as questões históricas não são tão exóticas”. As mudanças culturais já tipificadas são repetidas no tempo. Já Wolf fala que as “sociedades primitivas” não estiveram tão isoladas quanto pensa a antropologia do princípio do século XX. Daí que a abordagem de Sahlins na história é pensando-a como uma só forma geral: “tanto no seio da sociedade dada, como na inter-relação de distintas sociedades” (pág. 9-11).. 19
  • 20. Intervenções sociais Processos Construção Ocorrência sociais. plurilinear dos plurilinear da Estrutura da historia processos sociais conjuntura Intervenções sociais Também fundamentamos que as intervenções sociais estão teoricamente definidas como “ações para o desenvolvimento”, o que necessita de outras justificativas teóricas que não aquelas apresentadas explicitamente. Podemos analisar com acuidade as bases teóricas do “desenvolvimento” através das propostas críticas das atuais teorias sobre esse tema, vigentes e hegemônicas na América Latina, carregadas de conteúdos pós-modernos, muitas vezes desadaptados à nossa realidade regional (Teoria da Dependência11, Teorias de Desenvolvimento Sustentável12, etc.). Nossa proposta é mais coerente com a indagação de uma pesquisa diagnóstica, e diz respeito à capacidade dos sujeitos sociais de transformar e utilizar a natureza. Compreendemos natureza desde uma perspectiva monista, ou seja, desde uma perspectiva que não denota um dualismo metodológico nem ontológico entre cultura e natureza, mas, sim, que vê o processo cultural como parte de um desenvolvimento da 11 Prebisch, R. 1981, Cardoso, F. H & E Faletto, E. 1970; Furtado, C. 1974 12 Becker, E. & Jahn, T. 1999. Para conferir quadros teóricos extensos sobre a relação entre sustentabilidade e Ciências Sociais ver especificamente Cap. I Exploring Uncommon Ground: Sustentability and the Social Sciences, Cap, II: Sustentability: Its Cognitive Power for Emerging Fields of Knowledge. E finalmente o Cap. III, intitulado: Sustentability and Territory: Meaningful Practices and Material Transformations. Tambem confrontar García, R. et al. 2003. 20
  • 21. mesma natureza em diversas manifestações de tipificação (Morin 1996, 2005). Para os antropólogos, serão ações para o desenvolvimento tanto as distintas intervenções dos grupos indígenas no que se refere à PCH Paranatinga II, como a ação dos empreendedores que buscam sua construção. O problema é mais complexo ainda, porque certamente esta perspectiva nos obriga a identificar relações assimétricas de poder que certamente intervêm nesse panorama. O conceito de desenvolvimento que estamos utilizando não significa “controle”, ou seja, a maior ou menor capacidade de utilizar e transformar a natureza pode ser um indicativo de maior ou menor desenvolvimento, mas em nenhum caso de controle. Os exemplos estão à vista: muitas das intervenções exercidas pelo ser humano no sistema biótico geral, mesmo das sociedades mais desenvolvidas (com maior capacidade de transformar e utilizar a natureza), são nefastas e incontroladas em termos das conseqüências que elas provocam. Outras sociedades, seja por sua organização social, seja por sua visão sobre o meio que habita, planejam outras estratégias de intervenção que resultam menos influentes sobre o esquema da biosfera, mas que igualmente geram desenvolvimento. Esta perspectiva obriga a deixar de fora qualquer abordagem que abarque estereótipos essencializantes ao nosso objeto de estudo. Dessa forma, o pesquisador deve contextualizar e relacionar as “ações para o desenvolvimento” (tal qual e como é entendido pelos agentes de desenvolvimento descritos) com o fim de cristalizar o quadro descritivo adequado para nossa estratégia metodológica. Dessa forma, a resposta de como os trabalhos possam contribuir na solução de conflitos em situações de contingência está na metodologia. Estamos na frente de uma intervenção social complexa, e qualquer estudo no marco de um programa diagnóstico deverá ser planejado numa clareza diagnóstica. Mas como executá-lo?13 13 Para a apreciação de uma aplicação de um marco metodológico destas características, ver Ortiz, 2004. As principais fontes de sistematização teórico-metodológica a respeito estão em Saavedra, 2005; este último é professor da cátedra “Diagnóstico e Ação para o Desenvolvimento”, Instituto de Ciências Sociais, Universidade Austral de Chile. 21
  • 22. Geralmente o diagnóstico é confundido, em ciências sociais, metodologicamente falando, com a pesquisa avaliativa de impacto. Em nossa perspectiva este é um erro fundamental. Nossa proposta é mais parecida ao funcionamento da medicina alopática no momento de enfrentar um paciente. Neste sentido, os componentes lógicos de uma pesquisa diagnóstica devem ser: 1.- descrever pertinentemente a situação problemática em termos de quais são os atores, meios, fins e condições envolvidas nesta intervenção social ou intervenções. Esta descrição deve ser a mais ampla possível, tratando de juntar os dados primários com os secundários, avaliando problemáticas de pesquisa, espaços de pouca indagação científica e processos chaves para analisar. 2.- avaliar a situação problemática em termos da relação existente entre a visão de desenvolvimento dos atores envolvidos (Agentes de desenvolvimento e comunidades indígenas representados tanto pelas suas organizações como por suas perspectivais). O mais difícil, neste caso, é a construção de um modelo avaliativo competente. Geralmente os modelos avaliativos são construídos com base em três perspectivas: a) pelos mesmos pesquisadores que determinam quais serão os modelos ideais que serão comparados com a descrição anterior; b) pela “comunidade do objetivo”, ou seja, considerando que o modelo deve ser totalmente êmico, e que esta informação deve ser comparada posteriormente com a descrição inicial; c) construído em uma relação dialética entre o que o pesquisador identifica e a visão êmica envolvida no processo. Neste caso será fundamental a comparação com situações ocorridas em contextos similares. 22
  • 23. Certamente, em nosso parecer, a terceira opção é a mais correta, não obstante, a mais complexa. A distância entre a descrição contundente do problema e o modelo avaliativo configurado será a magnitude do problema de pesquisa, o qual dá fundamentos para, posteriormente: 3.- explicar - através de causas e associações - as razões que convertem as estratégias dos agentes de desenvolvimento em conflitos no interior das comunidades. Uma pesquisa diagnóstica não pode deixar de lado esta etapa de investigação. A explicação deve ir mais além que a mera explicação testemunhal do fenômeno, senão, também, dever-se-ia construir metodologicamente aspetos relacionados com a prática experimental e as análises integradas das associações concomitantes ao fenômeno. 4.- por último, embora não menos importante, é necessário oferecer recomendações que tenham por fim dar solução à problemática apresentada, entendendo que o problema seja comprovado empiricamente. Neste caso deve existir uma racionalidade da ação, a qual é a relação lógica e equilibrada que deve existir entre a descrição do modelo avaliativo (a identificação do problema) e as recomendações. As recomendações devem ter coerência interna e a possibilidade de aplicação lógica no contexto descrito. Este é o processo mais cuidadoso e delicado, que será mais adequado na medida em que as demais etapas da pesquisa diagnóstica sejam realizadas com a maior consistência possível. 23
  • 24. 2.2 PROCEDIMENTOS DE CAMPO NA PESQUISA DIAGNÓSTICA A pesquisa diagnóstica em Antropologia requer a realização de certos procedimentos de campo, além de certas especificações quanto à estratégia de coleta de dados e às análises posteriores. A vantagem da Antropologia está radicada em suas técnicas de campo, ligadas à etnografia, a qual permite fornecer uma perspectiva enriquecedora dos processos através de suas técnicas específicas. Neste caso, confluíram: a observação direta, a observação participante, os encontros (social survey), as entrevistas com informantes fixos, as entrevistas semi-estruturadas, as entrevistas grupais, os focus group, entre muitas outras técnicas de campo, as quais forneceram as bases de dados primárias, dispostas para análises posteriores. Dentro da lógica da pesquisa diagnóstica, tanto a etapa descritiva como a avaliativa, explicativa e recomendativa, requerem a utilização das técnicas nomeadas acima, onde a estratégia etnográfica será a modeladora desses processos. Nesse sentido, os instrumentos de coleta de dados devem ser construídos neste marco geral, tratando de identificar as problemáticas hipotéticas e, também, registrando as problemáticas surgidas in situ. Não obstante, o “estar aí“, o compartilhar as experiências vitais de nossa “comunidade objetivo”, não é indicador do sucesso do “trabalho de campo”. Em geral, muitos antropólogos confundem esta etapa da pesquisa, porque para eles é suficiente considerar suas próprias percepções como aceitável para definir e validar os dados que posteriormente serão analisados. O feito de testemunhar a realidade pode ser muito enriquecedor, mas é fundamental identificar quais são aspectos surgidos das observações “objetivas” e quais são as observações surgidas das interpretações e pré-conceitos dos pesquisadores. A despeito do que nossa proposta indica, é uma estratégia trans-disciplinária, o que significa grupos de pesquisadores de diversas áreas de formação (da ecologia, da etnologia, da antropologia, da etnohistória, etc.), 24
  • 25. trabalhando em conjunto sobre a confiabilidade dos dados e criando instrumentos e técnicas transversais capazes de aproveitar os distintos contextos de intervenção “no campo”. Finalmente, os procedimentos de campo deverão sempre estar regidos por uma ética profissional, ligada à sinceridade dos pesquisadores na hora de se deparar com situações conflituosas, possíveis de acontecer no trabalho de campo. 25
  • 26. 3. OBJETIVOS DO PROGRAMA Os objetivos do presente Programa podem ser sintetizados em três grandes itens:  Complementar os estudos referentes ao Licenciamento Ambiental da PCH Paranatinga II no que se refere ao componente indígena, abrangendo as Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe (ocupadas por grupos Xavante e localizadas às margens do rio Culuene, a montante da PCH), bem como o Parque Indígena do Xingu (ocupado por 14 etnias e localizado a jusante da PCH, já em terras banhadas pelo rio Xingu);  Desenvolver, assim, os estudos complementares solicitados pela FUNAI através do Termo de Referência emitido, abrangendo: diagnóstico das Terras Indígenas acima citadas, identificação dos impactos sócio- ambientais provenientes da implantação do empreendimento e proposição de medidas mitigadoras e/ou compensatórias cabíveis, em conformidade com os pleitos existentes.  Atender a legislação brasileira e instrumentos normativos existentes no que se refere aos estudos antropológicos do empreendimento.  Produzir conhecimento científico e análise de situação dos grupos indígenas tratados, que permitam contribuir na sustentabilidade social, cultural e econômica dos grupos. 26
  • 27. O atendimento a esses objetivos se apóia na necessidade de regularização dos estudos de Diagnóstico Antropológico da obra, na deferência às solicitações da comunidade indígena envolvida e na análise dos seguintes documentos: • Solicitações do Ministério Público Federal à Procuradoria Geral da República (Ofício n. 221), IBAMA (Ofício n. 141) e FEMA (Ofício n. 143). • Laudo Antropológico solicitado pelo Ministério Público. • Laudo Etno-Histórico e Avaliação Jurídica, solicitado pela Paranatinga Energia S/A. • Acordo firmado com a comunidade indígena (Termo de Compromisso). Como resultado geral, a utilização de todas as fontes informativas disponíveis – escritas, orais, ecológicas, antropológicas, etnohistóricas e suas interfaces – trabalhadas de forma independente e com resultados convergentes, deverá subsidiar a compreensão dos grupos sociais indígenas que dela participaram, tendo como finalidade última a análise de possíveis impactos gerados pela implantação da PCH Paranatinga II e a indicação de soluções de contorno. 27
  • 28. 4. LEGISLAÇÃO INTERVENIENTE O presente trabalho visa atender a legislação brasileira e os instrumentos normativos vigentes no que se refere ao campo dos estudos antropológicos (componente indígena), a saber: • Convenção OIT n° 169, de 07/06/1989, Convenção sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes; • Lei 6001, de 19/12/1973 - Dispõe sobre o Estatuto do Índio; • Decreto nº 88.985 de 10/11/1983 - Regulamenta os artigos 44 e 45 da Lei n° 6.001 e dá outras providências; • Decreto nº 58.821 de 4/07/1966 - Promulga a Convenção nº 104 concernente à abolição das sanções penais; • Convenção OIT nº 104 de 01/06/1955 - concernente à abolição das sanções penais por inadimplemento do contrato de trabalho por parte dos trabalhadores indígenas; • Lei nº 5.371 de 05/12/1967 - Autoriza a instituição da “Fundação Nacional do Índio” e dá outras providências; • Portaria MJ nº 542 de 21/12/1993 - Aprova o anexo Regimento Interno da Fundação Nacional do Índio- FUNAI; • Decreto nº 1.775 de 08/01/1996 - Dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências; 28
  • 29. Portaria MJ nº 14 de 09/01/1996 - Estabelece regras sobre a elaboração do Relatório circunstanciado de identificação e delimitação de Terras Indígenas a que se refere o parágrafo 6º do artigo 2º, do Decreto nº 1.775/96; • Decreto-Lei nº 9.760 de 05 /09/1946 - Dispõe sobre os bens imóveis da União e dá outras providências; • Decreto 1.141, de 19 de maio de 1994 - Dispõe sobre as ações de proteção ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas para as comunidades indígenas; • Decreto nº 3.799 de 19/04/2001 - Altera dispositivos do decreto nº 1.141, de 19/05/1994, que dispõe sobre as ações de proteção ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas para as comunidades indígenas; • Lei nº 6.634 de 02/05/1979 - Dispõe sobre a Faixa de Fronteira; • Decreto nº 4.412 de 07/12/2002 - Dispõe sobre a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal nas terras indígenas e dá outras providências; • Portaria MS nº 254 de 31/01/2002 - Aprova a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas; • Resolução MS/CNS nº 304 de 09/08/2000- Aprova as Normas para Pesquisas Envolvendo Seres Humanos- áreas de Povos Indígenas; • Decreto nº 98.830 de 15/01/1990- Dispõe sobre a coleta, por estrangeiros, de dados e materiais científicos no Brasil, e dá outras providências; • Portaria MCT nº 55 de 15/03/1990 - Regulamenta coleta, por estrangeiros, de dados e materiais científicos no Brasil; 29
  • 30. Lei nº 10.172 de 09/01/2001 - Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências; • Lei nº 9.610 de 19/02/1998 - Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências; • Decreto-Lei nº 25 de 30/11/1937 - Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional; • Lei nº 3.924 de 26/07/1961 - Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos; • Lei nº 9.051 de 18/05/1995 - Dispõe sobre a expedição de certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações; • Lei Complementar nº 75 de 20/05/1993- Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União; • Lei nº 6.938 de 31/08/1981- Dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências; • Lei nº 5. 197 de 03/01/1967 - Dispõe sobre a proteção à fauna e dá outras providências; • Lei nº 7.754 de 14/04/1989 - Estabelece medidas para Proteção das Florestas Existentes nas nascentes dos rios e dá outras providências; • Lei nº 9.605 de 12/02/1998 - Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências; 30
  • 31. Resolução CONAMA nº 001 de 23/01/1986 - Relatório de impacto ao meio ambiente; • Resolução CONAMA nº 237 de 27/12/1997 - Licenciamento ambiental; • Decreto nº 24.643 de 10/07/1934 - Decreta o Código de Águas; • Lei nº 9.433 de 08/01/1997 - Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos; • Arts. 231 e 232 da Constituição Federal promulgada em 1988 - Reconhecem aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários. Por outro lado, os trabalhos de campo nas Terras Indígenas foram devidamente oficializados e autorizados pela FUNAI, com aprovação da equipe de trabalho pelas comunidades indígenas envolvidas (comunidades do Parque Indígena do Xingu, e comunidades Xavante das Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe). 31
  • 32. 5. A ÁREA DE PESQUISA E COMUNIDADES ENVOLVIDAS Os grupos indígenas estudados habitam a região superior da bacia hidrográfica do rio Xingu, um dos maiores tributários do Amazonas (Figura 1). Estes, e seus afluentes menores, drenam uma região extremamente heterogênea e composta por um mosaico de zonas ecológicas distintas. No que se refere à área abrangida pela PCH Paranatinga II, localiza-se na bacia do rio Culuene que, juntamente com o rio Sete de Setembro, Tanguro e Suiá-Missu, irão formar o rio Xingu pouco antes do início do Parque Indígena do Xingu (IBGE, citado em Projeto Radambrasil 1981) (Figura 2). Na bacia do rio Culuene encontram-se, a montante da PCH Paranatinga II, as Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe, pela sua margem direita. Já o Parque Indígena do Xingu (PIX) se localiza na bacia do Xingu propriamente dita. Por esta razão a área de pesquisa do presente Estudo abrange não apenas a bacia do rio Culuene, mas se estende para o alto curso do rio Xingu, no trecho abrangido pelo PIX. Desta forma, as comunidades indígenas envolvidas são:  T.I. Parabubure e T.I. Ubawawe, etnia: Xavante. Localização: a montante da PCH Paranatinga II, abrangendo terras na margem direita do rio Culuene. O início das TIs se encontra a 28,61 km lineares do final do reservatório da PCH Paranatinga II, ou ainda, a quase 50km seguindo o traçado meândrico desse mesmo rio (Figura 3). 32
  • 33.  Parque Indígena do Xingu (formado por 14 etnias que integram o chamado “Complexo Cultural Xinguano”14. Compreendem grupos que habitavam a área anteriormente à criação do Parque e, também, grupos que para ali foram levados pela FUNAI, visado centralizar sua assistência). As etnias são: Waurá, Mehinaku, Yawalapiti, Kuikuro, Kalapalo, Nahukwa, Matipu, Kamayurá, Awetí, Trumai, Suyá, Ikpeng, Kayabi e Yudjá. Localização: a jusante da PCH Paranatinga II. O limite sul do PIX se encontra a 93,71km lineares do eixo da PCH, ou ainda, a 238 km seguindo o traçado meândrico do rio Culuene, assim como os quilômetros iniciais do rio Xingu. 14 www.socioambiental.org.br 33
  • 34. 34 Figura 1 - Localização dos rios Xingu e Culuene na Bacia Amazônica.
  • 35. Formadores do Xingu Figura 2 - Mapa de vegetação regional na bacia do Culuene. 35
  • 36. Figura 3 - Localização das Terras Indígenas pesquisadas. 36
  • 37. 6. ESTUDOS JUNTO À COMUNIDADE XAVANTE (TI PARABUBURE E UBAWAWE) 6.1 APRESENTAÇÃO Este estudo foi realizado seguindo os modelos metodológicos fundados na Antropologia Social, com levantamento de campo para coleta de dados quantitativos e qualitativos. Os procedimentos realizados para a elaboração dos estudos e desenvolvimento dos trabalhos foram os seguintes: reuniões técnicas, levantamento e análise dos dados disponíveis, definição e identificação das áreas de estudo, contatos com instituições, vistorias e levantamentos de campo, diagnóstico ambiental, identificação e avaliação dos impactos ambientais e proposição das medidas mitigadoras/compensatórias. Foram realizados levantamentos dos dados disponíveis que subsidiaram a execução dos trabalhos, tais como: material cartográfico, dados secundários sobre a região do empreendimento (bibliografia disponível e estudos relacionados ao Licenciamento Ambiental da obra) e processos existentes na FUNAI. Neste contexto foi consultada a documentação existente, como decretos, portarias, legislação, relatórios de fontes oficiais, teses de mestrado e doutorado e boletins científicos. Por outro lado, foram mantidos contatos com as seguintes instituições: FUNAI em Brasília, em Campinápolis e Nova Xavantina no Mato Grosso; IBAMA; Agência de Água e Saneamento e Meio Ambiente de Mato Grosso; e com a comunidade indígena Xavante, que auxiliaram no entendimento do problema e no desenvolvimento dos estudos. 37
  • 38. Foi efetuado o reconhecimento da área nas terras indígenas através de expedições terrestres, durante os meses de outubro e novembro/2005. As pesquisas foram desenvolvidas, durante todo o período, com a presença de índios Xavante juntamente com a equipe. A primeira atividade desenvolvida quando da chegada da equipe nas aldeias foi realizar reuniões informativas, esclarecendo sobre o escopo e objetivo do trabalho e buscando incorporar aos estudos solicitações e recomendações feitas pela comunidade indígena. As reuniões foram agendadas na AER e/ou NAL que as aldeias estavam subordinadas. Foram realizadas quatro reuniões com as lideranças das Terras Indígenas Parabubure e Ubawawê. A primeira reunião foi realizada no Núcleo de Apoio Nõrota, em 27/10/05, com as lideranças das aldeias subordinadas a esse Núcleo (Prancha 1). A Tabela 1 traz a lista dos participantes. As outras três reuniões com as lideranças Xavante jurisdicionadas à Administração Executiva Regional de Campinápolis/AER, foram realizadas nos dias 28, 29 e 30 de outubro de 2005, respectivamente no Posto Estrela, Aldeia Buritizal e Aldeona/Culuene. Em todas as visitas os técnicos foram acompanhados pelos índios Xavante Adriano, Henrique, Cláudio e Adalberto, funcionários e representantes oficiais da AER de Campinápolis indicados pelo administrador Isaac. As lideranças que participaram da reunião realizada no dia 28/10/2005, no Posto Estrela foram: Liderança Aldeia 1. Ailton Aldeia Estrela 2. Armando Aldeia Barreiro 3. Rodrigo Aldeia Piranhão 4. Coreolano Aldeia Nova Canaã 38
  • 39. PRANCHA 1 – A3 39
  • 40. Tabela 1 – Participantes da reunião geral, Núcleo de Apoio Nõrota Nome da liderança Cargo e Aldeia 1. Germano Cacique da aldeia Onça Preta 2. Domingos Cacique da aldeia Matrixã 3. Alfredo Cacique da aldeia Boa Vida 4. Francisco Cacique da aldeia 2° Campinas 5. Orlando Cacique da aldeia Podzenho’u 6. Francisco Vice Cacique aldeia S. Felipe 7. Lázaro Cacique da aldeia Chão Preto 8. Joãozinho Cacique da aldeia S. D. Sávio 9. Terezinho Vice Cacique aldeia S. D. Sávio 10. Lino Vice Cacique aldeia Boa Vida 11. Marinho Chefe aldeia 2° Campinas 12. Amauri Cacique da aldeia Etepore 13. Samuel Vice Cacique aldeia Aparecida 14. Satornino Cacique da aldeia S. Felipe 15. Anselmo Cacique da aldeia Santa Clara 16. Cleto Chefe aldeia Etepore 17. Rita Vice Cacique aldeia Santa Cruz 18. Ademar Representante aldeia Etepore 19. Irineu Cacique da aldeia Couto Magalhães 20. João Cacique da aldeia Santa Rosa 21. Irineu Representante aldeia Boa Vida 22. Isaias Cacique da aldeia São Pedro 23. Cipriano Cacique da aldeia Bom Jesus da Lapa 24. João Fidelis Representante aldeia S. D. Sávio 25. João Gilberto Representante aldeia S. D. Sávio 26. Aniceto Chefe aldeia S. D. Sávio 27. Gustavo Chefe aldeia Etepore 28. pedro Vice Cacique aldeia Tseredzatsé 29. Norberto Secretário aldeia S. Felipe 30. Miguel Representante aldeia Santa Clara 31. Moisés Representante aldeia Parinai’a 32. Silvério Representante aldeia Santa Rosa 33. Zeferino Representante aldeia Santa Rosa 34. Tarcísio Representante aldeia S. Felipe 35. Jocelino Representante aldeia S.Felipe 36. Domingos Representante aldeia Tseredzatsé 37. Inácio Representante aldeia Santa Clara 38. Zacaria Representante aldeia Santa Clara 39. Felizberto Representante aldeia S. Felipe 40. Anita Representante aldeia Boa Vida 41. Casimiro Motorista aldeia S. Felipe 42. Antônio Motorista aldeia S. D. Sávio 43. Amadeu Motorista aldeia S. D. Sávio 44. Vitalina Motorista aldeia Boa Vida 45. Izete Motorista aldeia Chão Preto 46. Tobias Motorista aldeia S. Felipe 47. Cesário Motorista aldeia S. Felipe 48. Paulo Motorista aldeia S. Felipe 49. Vitoriano Motorista aldeia S. Felipe 50. Albino Motorista aldeia S. Felipe 40
  • 41. Já as lideranças que participaram da reunião realizada no dia 29/10/2005, na Aldeia Buritizal foram: Liderança Aldeia 1. Cacique Joaquim Aldeia Biritiz 2. Cacique Quirino Aldeia Brasil 3. Cacique Davi Aldeia Itaquera 4. Cacique Luciano Aldeia Santa Helena 5. Cacique Guilherme Aldeia Serrinha 6. Cacique Ermínio Aldeia Mato Grosso 7. Cacique Enoch Aldeia Egito Finalmente, as lideranças que participaram da reunião realizada no dia 30/10/2005, na Aldeia Aldeona/Culuene foram: Liderança Aldeia 1. Cacique Eduardo Aldeia Aldeona 2. Cacique Simão Aldeia Novo Paraíso 3. Cacique Joel Aldeia Alvorada 4. Cacique Ubiratan Aldeia Sete Rios 5. Cacique Rodinei Aldeia Dzeiwahu 6. Cacique Manoelito Aldeia Aldeinha 7. Cacique Arlindo Aldeia Colina 8. Vice Cacique Márcio Aldeia Alto da Vitória 9. Cacique Osvaldo Aldeia Jacú 10. Cacique Tomás Aldeia Betel 11. Cacique Jovêncio Aldeia Tiriwawepa 12. Cacique Bernardino Aldeia Baixão 13. Cacique Roberto Aldeia Sobradinho 14. Cacique Valério Aldeia Sucuri 15. Cacique Marcidez Aldeia Cohab 16. Cacique Abrão Aldeia Lagoinha 41
  • 42. O objetivo dessas reuniões foi o esclarecimento das comunidades indígenas Xavante sobre os estudos socioambientais da PCH Paranatinga II exigidos pelo CGPIMA/FUNAI, visando o levantamento dos possíveis impactos decorrentes do empreendimento e o registro do conhecimento indígena sobre o meio ambiente e as práticas relacionadas às Terras Indígenas Parabubure e Ubawawê. Com isto buscou-se, através da análise combinada dos resultados das pesquisas e a perspectiva dos atores sociais sobre o tema em questão, subsídios para um diagnóstico equilibrado, que respeitasse os processos culturais e circunstanciais do grupo indígena Xavante. Após o levantamento e análise dos dados e do trabalho de campo foi elaborado o diagnóstico ambiental envolvendo aspectos do meio físico, biótico e socioeconômico, sendo possível caracterizar a situação pretérita e atual das áreas indígenas frente ao empreendimento. A equipe técnica elaborou o diagnóstico de cada área de estudo, e os reuniu para a análise integrada dos aspectos estudados. Assim, a partir da adequada caracterização das áreas de estudo e do diagnóstico sobre a qualidade ambiental, foi possível identificar e avaliar aqueles impactos advindos da PCH Paranatinga II com relação ao rio Culuene e às Terras Indígenas estudadas, comparando-os com as condições preexistentes, tanto os de natureza negativa quanto positiva. Após a identificação e avaliação dos impactos mais relevantes foram recomendadas as medidas de controle ambiental e ações destinadas a minimizá-los ou compensá-los, conforme o caso e de acordo com o que estará sendo discutido ao longo do presente Capítulo. 42
  • 43. 6.2 CARACTERIZAÇÃO LINGUÍSTICA, HISTÓRICA E CULTURAL DOS POVOS XAVANTE Os Xavante constituem povo da família lingüística Jê. Autodenominam-se Akuên e formam com os Xerente do estado do Tocantins o ramo central das sociedades de língua Jê (Lopes da Silva e Farias 1992). Os Akuên habitavam originalmente a bacia do Tocantins, desde o sul de Goiás até o Maranhão, estendendo-se da bacia do rio São Francisco à bacia do Araguaia. Após os contatos com o colonizador europeu na aldeia do Carretão, há cerca de 250 anos atrás, os Akuên retornaram ao seu antigo habitat passando a haver uma polarização de opiniões sobre o contato e, asssim, gerando duas facções: uma de simpatia pela manutenção do contato com os brancos; e outra de aversão ao convívio com o homem branco. O grupo que manifestava simpatia continuou a viver no território tradicional, passando a ser conhecido como Xerente; a facção que denotava aversão iniciou um deslocamento em direção ao Araguaia hostilizando os colonizadores, e passou a ser chamada de Xavante (LOMBARDI, 1985). Até meados do século XIX os sertões matogrossenses compreendidos nas regiões do Xingu, rio das Mortes e Araguaia, eram considerados desconhecidos pelas autoridades da Província. O relato documental mais antigo da presença dos Xavante em Mato Grosso, na região que viria a ser seu habitat até a pacificação ocorrida em meados do século XX, consta do relatório do presidente da província de Goiás, Pereira da Cunha, de 1856, no qual noticia a expedição sob a direção de Frei Segismundo de Taggia, que procurou estabelecer contato com um grupo Xavante hostil, na região do rio das Mortes (LOMBARDI, 1985). A travessia do rio Araguaia pelos Xavante ocorreu por volta de 1860-1870, mas assinala-se que antes dessa grande travessia um outro grupo a havia 43
  • 44. realizado, mas que deles não se teve notícias. Os Xavante começaram a deslocar-se para a margem esquerda do Tocantins em 1824, depois para o Araguaia, em 1859, indo então se estabelecer nos campos do rio das Mortes, em data não precisa (LOMBARDI, 1985). É necessário considerar que a ocupação Xavante da região compreendida entre os rios Araguaia e das Mortes era o habitat de outros grupos indígenas, com os quais tiveram que entrar em guerra a fim de delimitarem novas fronteiras espaciais e se apossarem das terras (LOMBARDI, 1985). Durante a primeira metade do século XX, quando há uma nova frente de expansão econômica no centro-oeste movida pela exploração pecuária, que impunha o controle, posse e ocupação das terras habitadas pelos Xavante, a região se transformou em um campo de hostilidades e massacres promovidos contra os índios, malgrado a política indigenista protecionista e a existência de um aparato institucional do Estado destinado a fazer cumprir o protecionismo. À medida que os interesses econômicos da frente pecuária passam a capitalizar os ânimos do Estado e das Missões, todos os esforços se concentraram na pacificação dos Xavante, objetivo alcançado pela equipe coordenada pelo sertanista Francisco Meireles. Ele passou a atuar a partir de 1944, conseguindo o primeiro contato em 1946. Em 1949 o principal grupo Xavante já estava dentro do Posto Indígena Pimentel Barbosa (LOMBARDI, 1985). Ainda em 1946 ocorreram os primeiros contatos com o grupo que vivia nas imediações do rio Culuene, sendo atraídos para os Postos Indígenas Marechal Rondon e Paraíso. No ano de 1969 foi reservada uma área aos índios Xavante no rio Couto Magalhães, na margem esquerda do Rio das Mortes. Conforme apresentado no item que se segue, as Terras Indígenas Parabubure e Ubawawe foram criadas, respectivamente, na década de 1980 e 1990, reunindo índios Xavante provenientes da área do Rio das Mortes e Araguaia. 44
  • 45. 6.3 AS TERRAS INDÍGENAS PARABUBURE E UBAWAWE 6.3.1 Localização e situação fundiária da T.I. Parabubure A Terra Indígena Parabubure localiza-se nos Municípios de Campinópolis e Água Boa, Estado de Mato Grosso. A sociedade indígena é a Xavante, da família lingüística Jê. A superfície da terra indígena é de 224.447 ha. A população é de 2.624 índios (FUNAI, 1998). As aldeias da TI Parabubure são: Santa Cruz, Bom Jesus da Lapa, São Domingos Sávio, São Pedro, São Felipe, Santa Clara, Onça Preta, Parinai’a, Santa Rosa, São Salvador, Nossa Senhora Aparecida, Tsredzatsé, Campinas, Chão Preto, Boa Vida, Matrinxã, Eteipore, Tela Vive, Podznho’u, Upawapa e Canguaçu, Aldeinha, Aldeona, Alto da Vitória, Alvorada, Auwê Ubtsibimedzé, Baixão, Betel, Cohab, Colina, Córrego da Mata, Lagoinha, Novo Paraíso, Pedra Branca, Santa Fé, Sucuri, Barreiro, Estrela, Jacu, Piranhão, Serrinha, Campinas, Jerusalém, Mato Grosso, Santa Helena, Brasil, Buritizal, Egito, Itaquere, São José, Santa Clara, Sete Rios, São Benedito, Panorama, Dzeiwahu, Bela Vista, Nova Canaã, Sobradinho, Tiriwawepa, Santa Maria, São Paulo, Cristalina, Santo Amaro, Deus é Amor, Nõrõtsu’rã, ti’irérepa, Monte Pascoal, Espírito Santo, Três Marias, Ró’óredza’ódzé e Santana (vide Figura 4 e Mapa Etno-Ecológico, Anexo 1). Como a cisão entre o Xavante faz parte de sua cultura, essas aldeias foram as encontradas no período de outubro/novembro de 2005. O número de aldeias em outra visita pode ser diferente. 45
  • 46. Figura 4 - Localização das Aldeias percorridas pela equipe nas TIs Ubawawe e Parabubure. 46
  • 47. Situação Fundiária No ano de 1922 os Xavante ocupavam a margem esquerda do rio das Mortes, tendo sido registrados vários ataques a seringueiros, sitiantes e missionários. Em 1965 o líder Xavante Benedito, “atraído” para a Missão Salesiana, transferiu-se para a sua antiga aldeia no Rio Couto Magalhães, área em que já se havia instalado a fazenda Xavantina. Em 1967 o Governo do Estado do Mato Grosso reservou uma área de 10.000 ha para a aldeia do Benedito, conforme Reg. nº 19.250, Lv. nº 34,fl.88 a 89 V, Cartório do 4º Oficio Cuiabá – MT. Em 1968, a FUNAI apresentou uma proposta de área que, embora não abrangesse as cabeceiras do Rio Couto Magalhães nem a sua margem esquerda onde estavam situadas suas principais aldeias, foi considerada visionária. O Decreto nº 65.212, de 23/09/1969, criou a Reserva Rio Couto Magalhães, que foi alterada pelo Decreto nº 65.405, de 13/10/69. Este, por sua vez, foi também alterado pelo Decreto nº 75.426, de 27/11/1975. A Portaria n° 250/N/FUNAI, de 20.05.1975, criou o Posto Indígena Culuene na margem direita do córrego Grotão, junto à sua confluência com o rio Culuene, com superfície aproximada de 51.000 ha. Tal medida visava a proteção de uma antiga área do grupo que, na época, estava sendo reocupada pela comunidade. Com o Decreto n° 84.337, de 21.12.1979, foi criada a Reserva Indígena Parabubure com superfície de 226.555 ha, abrangendo a área Couto Magalhães e o Posto Indígena Culuene. 47
  • 48. Em 1981 foi demarcada com superfície de 224.447 hectares, registrada na D- SPU/MT em 1987 e no CRI da Comarca de Nova Xavantina em 1988. Foi homologada pelo Decreto nº 306, de 29.10.1991, com superfície de 224.447 ha e perímetro de 294 km. Mesmo com a regularização de parte da área o grupo continuou a reiterar seus pedidos de alteração dos limites da terra. Em 1996 foram realizados estudos das terras indígenas Chão Preto e Paraíso (atual Terra Indígena Ubawawê), localizadas no limite sul. No mesmo ano a Portaria n° 343, de 21.05.1996, determinou que os estudos de identificação e complementação de dados da Terra Indígena Parabubure fossem realizados por etapas. A primeira etapa de trabalho de campo agraciou as terras indígenas Chão Preto e Paraíso (Ubawawê), que foram declaradas em 1998. A segunda etapa de identificação e trabalho de campo realizaria os estudos da área Wai’re/Isou’pá; na terceira etapa seriam realizados os estudos da área Norõtsurã; a quarta etapa estudaria uma área denominada Hu’uhi, localizada na margem esquerda do rio Culuene, no município de Paranatinga. A Portaria n° 891, de 31.08.1998, instituiu um grupo técnico visando a identificação das etapas 2 (Wai’re/Isou’pá) e 3 (Norõtsurã). Administrativamente não existem as áreas 2 (Wai’re/Isou’pá) e 3 (Norõtsurã), pois os relatórios de identificação e delimitação ainda estão em análise pela FUNAI. 48
  • 49. 6.3.2 Localização e situação fundiária da T.I. Ubawawê A Terra Indígena Ubawawê localiza-se no Município de Novo São Joaquim no Estado de Mato Grosso. A sociedade indígena é a Xavante, da família lingüística Jê. A superfície da terra indígena é de 52.234 ha e superfície de 119 km. A população da TI é de 29 indíos (FUNAI, 1998). UBAWAWE (Ponte Grande). Este nome faz referencia à existência, em tempos remotos, de uma grande árvore derrubada sobre o Rio Paraíso, que era utilizada na sua travessia durante os freqüentes deslocamentos que faziam pela região. Este nome passou a identificar os próprios moradores dali, especialmente uma facção dissidente da antiga Aldeia Oniudu, os quais hoje habitam as Aldeias de Novo Paraíso, Aldeinha e Água Limpa (vide Mapa Etno- Ecológico da TI Ubawawe, Anexo 2). Situação Fundiária Com o Decreto n° 84.337, de 21.12.1979, foi criada a Reserva Indígena Parabubure com superfície de 226.555 ha, abrangendo a área Couto Magalhães e o Posto Indígena Culuene. Em 1981 foi demarcada a TI Parabubure com superfície de 224.447 ha. Mesmo com a regularização de parte da área o grupo Xavante continuou a reiterar seus pedidos de alteração dos limites sul da terra e, pela portaria n° 107/P/FUNAI, de 26.03.1996, foi designado um grupo de trabalho para efetuar a identificação da área reivindicada, com superfície proposta de 51.900 ha e perímetro de 120 Km. Pelo Despacho n° 49, de 29.08.1997, foi aprovado o resumo do relatório circunstanciado de identificação e delimitação da TI Ubawawê. A Portaria n° 456/MJ, de 25.06.1998, declarou a área de posse permanente do grupo indígena Xavante com superfície aproximada de 51.900 49
  • 50. ha e determinando que a FUNAI promovesse a demarcação administrativa da área. Os trabalhos de demarcação da TI Ubawawê foram realizados em 1999, pela FUNAI, resultando na superfície de 52.234 ha e perímetro de 119 km. Com a demarcação física pode haver reajuste na área declarada, podendo haver pequenas alterações (como é o caso da TI Ubawawê, que foi declarada com 51.900 ha e demarcada com 52.234 ha). O levantamento fundiário procedido na TI Ubawawê pela FUNAI e pelo Instituto de Terras de Mato Grosso, cadastrou dezenove ocupantes não-índios, dos quais quatorze possuíam benfeitorias implantadas e passíveis de indenização, por força do disposto no § 6º do art.231 da Constituição Federal. As contestações opostas à identificação e delimitação da TI Ubawawê foram julgadas improcedentes pelo Memo nº 157/DEID/DAF/FUNAI, de 5 de junho de 1998, conforme o art. 9º e o § 9º, do art. 2°, do Decreto 1.775, de 1996. Em 2000, o Decreto s/n, de 30.08 homologa a demarcação administrativa da TI Ubawawê, localizada no município de Novo São Joaquim/MT, com superfície de 52.234 ha e perímetro de 119 km. 50
  • 51. 6.4 CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-BIÓTICA DAS TERRAS INDÍGENAS O rio Culuene segue um traçado predominante de sudoeste para nordeste, sendo que os principais contribuintes afluem na porção central da bacia. Pela margem direita destacam-se o ribeirão Quinze de Agosto e os córregos São José, Ouro Fino e Sem Nome; pela margem esquerda sobressaem os ribeirões Azul, do Peixe e do Boi. De um modo geral o relevo é ondulado a suavemente ondulado, e a cobertura vegetal é do tipo Cerrado, com grandes áreas ocupadas pela pecuária extensiva (Prancha 2). De suas cabeceiras, em altitudes da ordem dos 800 m, até o sítio da barragem, já na cota 360 m, o curso do rio Culuene tem um desenvolvimento de 254 km, o que lhe confere uma declividade média de cerca de 1,73 m/km. Essa declividade moderada e a forma alongada da bacia (índice de compacidade de 2,1) são fatores fisiográficos que favorecem o amortecimento das ondas de cheias afluentes ao aproveitamento. Considerando que as TIs Parabubure e Ubawawe se localizam na bacia do rio Culuene (ao contrário do Parque Indígena do Xingu, que já se encontra na bacia do rio Xingu propriamente dito), serão apresentados abaixo dados de meio físico-biótico obtidos nos estudos realizados pelo licenciamento ambiental da PCH Paranatinga II, notadamente no que se refere a aspectos ambientais regionais (clima, rede hídrica, entre outros). Apresenta-se, a seguir, dados específicos obtidos através dos estudos de campo nas TIs, visando fornecer uma visão tanto macro quanto micro ambiental da área. 51
  • 52. Prancha 2 – Instrumentos de pesca Xavante Área de pesca no rio Kuluene, próxima á aldeia Uawé, Rio Culuene dentro do perímetro das terras indígenas Xavante de Parabubure e Ubawawe. Rio Couto Magalhães, área de pesca xavante, interior da Terra Indígena Parabubure 52
  • 53. 6.4.1 Aspectos regionais  Clima Segundo os critérios de classificação de Köeppen, o clima predominante na bacia do rio Culuene é o Aw, tropical úmido com estação seca. Este tipo climático é associado às regiões onde o total de chuva no período seco é inferior a 30 mm, a temperatura média no mês mais quente é superior a 22 ºC, e no mês mais frio é superior a 18 ºC. Nesse sentido, observa-se que as temperaturas médias anuais oscilam entre 23ºC e 26ºC, aproximadamente. As temperaturas máximas podem ser elevadas, chegando aos 40ºC, assim como podem ocorrer temperaturas mínimas abaixo dos 10ºC, em função da entrada de massas de ar polar. Apesar destes declínios, temperaturas de 30ºC são freqüentes no inverno. A precipitação anual média sobre a bacia é de cerca de 1.825 mm, com o padrão de distribuição espacial apresentando ligeira tendência de crescimento de sul-sudeste (1750mm/ano) para norte-noroeste (1900 mm/ano). A exemplo do que ocorre em grande parte da região Centro-Oeste, o período chuvoso vai de novembro a março e concentra cerca de 80% das chuvas, com maiores incidências no trimestre de dezembro a fevereiro. O período de estiagem vai de maio a setembro, com o trimestre mais seco de junho a agosto. O escoamento do rio Culuene acompanha o regime sazonal das chuvas, com cerca de um mês de defasagem. A predominância de solos arenoquartzosos profundos no trecho superior da bacia confere boas condições de regularização natural de vazões, que perduram ainda depois, quando a bacia passa a assentar em solos podzólicos e latossolos. Próximo à PCH Paranatinga II o rio Culuene ainda sustenta vazões relativamente elevadas no trimestre crítico de estiagem, da ordem dos 35 a 40% das vazões médias anuais. As Terra Indígenas Parabubure (1) e Ubawawê (2) estão localizadas na região tropical, na região quente semi-úmido (4 a 5 meses secos) (Figura 5). 53
  • 54. Figura 5 – Caracterização climática regional, com localização das TI’s Ubawawe, Parabubure e PIX. 54
  • 55.  Rede Hídrica O rio Culuene, juntamente com o rio Sete de Setembro, é um dos principais formadores do rio Xingu, integrando a sub-bacia 18 do Xingu que, por sua vez, forma uma das sub-bacias da Bacia Amazônica. Seus principais afluentes pela margem direita são os rios Suia-Missu (médio curso) e Comandante Fontoura (baixo curso). Pela margem esquerda o Xingu recebe os rios Curisevo, Tamitatoala e Ronuro (alto curso), Arraias e Manissuiá-Missu (médio curso). A Bacia do rio Culuene apresenta altas taxas de escoamento superficial, em média da ordem de 20 l/s/km2, onde a média do período menos chuvoso nunca foi inferior a 11,0 l/s/km2 (Figura 6). As cabeceiras do rio Culuene, situadas entre os municípios de Planalto da Serra, Nova Brasilândia e Primavera do Leste, ultrapassam os limites da Depressão Interplanáltica de Paranatinga, atingindo a parte mais elevada do Planalto dos Guimarães (600-700m de altitude). Este rio comporta-se como o maior coletor de águas da região da Depressão, tendo em seu alto curso ocorrência de corredeiras e quedas d´água, com leito predominantemente rochoso, na área onde faz limite com a Província Serrana e o Planalto do Guimarães. Cerca de 30 km antes de chegar à escarpa limítrofe que separa a Depressão Interplanaltica de Paranatinga do Planalto Dissecado dos Parecis, este rio começa a emeandrar-se, formando planícies e terraços fluviais com grande quantidade de meandros abandonados (PRODEAGRO, 1996). Durante os estudos de diagnóstico realizados por conta do licenciamento ambiental da PCH (portanto, em momento anterior ao início das obras), foram obtidos dados referentes à qualidade da água do rio Culuene, abaixo transcritos. Os estudos serviram para estimar possíveis cenários do ambiente aquático no futuro reservatório nas fases de enchimento e estabilização; avaliar a qualidade da água com relação aos limites da Resolução CONAMA nº 20/1989 para rios de Classe II, como é o caso, e suas adequações aos usos da água atuais e futuros. 55
  • 56. Figura 6 – Caracterização hidrográfica regional, com localização das TI’s Ubawawe, Parabubure e PIX. 56
  • 57. As coletas de água foram realizadas em outubro de 2002, que corresponde ao final do período de estiagem na região. Foram amostradas duas estações de coleta, uma à montante e outra à jusante do futuro barramento, codificadas como sendo CULU1 e CULU2, respectivamente, localizadas próximas ao empreendimento (portanto, não compreendendo as TIs aqui analisadas ou mesmo suas proximidades). Foram medidos 21 parâmetros físico-químicos e 6 parâmetros biológicos da água, incluindo a comunidade de macroinvertebrados bentônicos que colonizam o sedimento de fundo. Em campo foi medido a transparência de Secchi, bem como feitas anotações sobre as condições do ambiente aquático e seu entorno. As amostragens qualitativas da comunidade fitoplanctônica foram realizadas com rede de plâncton, malha 25µm, através de 20 arrastes contra a corrente. O material concentrado foi preservado em solução de Transeau. Para as análises quantitativas dessa comunidade, as coletas de água foram feitas através de passagem de frasco de 300 mL na sub-superfície, onde foi adiconado 5 mL de solução de lugol-acético a 1%. Já as coletas de zooplâncton para as análises qualitativas foram realizadas com rede cônica de malha 61 µm, através de arraste contra a corrente por cerca de 5 minutos. Para as análises quantitativas dessa comunidade foram filtrados 150 litros de água nesta mesma rede. Ambas as amostras foram preservadas com 10mL de solução de formol à 40%. As coletas de sedimento das margens do rio Culuene para análise da comunidade de macroinvertebrados bentônicos foram realizadas manualmente, devido à dificuldade em manusear a draga no leito rochoso. As amostras de sedimento para análise quali-quantitativa desta comunidade foram armazenadas em sacos plásticos e preservadas em formol a 8%. 57
  • 58. Todas as amostras coletadas nas quatro campanhas foram transportadas até o laboratório AQUANÁLISE em Cuiabá e as análises foram realizadas seguindo metodologias estabelecidas pelo APHA/AWWA (1990). As análises da clorofila foram realizada pelo método espectrofotométrico em µg/L. Cada resultado foi obtido a partir da média de tréplicas, ou seja, foram analisadas três sub-amostras para cada frasco de coleta. As determinações dos índices de coliformes seguiram o método Colilert, com confiabilidade 95% e unidade em NMP/100mL. As densidades das populações fitoplanctônicas (nº ind/mL) foram estimadas pelo método de sedimentação, conforme Utermöhl (1958) em microscópio invertido. Foram enumerados os indivíduos (células, colônias, cenóbios e filamentos) em tantos campos aleatórios (Uhelinger, 1964) quanto os necessários para alcançar 100 indivíduos da espécie mais freqüente, de modo que o erro de contagem seja inferior a 20% (p< 0.05; Lund et all, 1958). Nas amostras em que este critério não pôde ser atingido em função das baixas concentrações de algas e/ou elevado teor de sedimento em suspensão, contou-se tantos campos quantos os necessários para estabilizar o número de espécies adicionadas a cada campo contado (método da área mínima). As riquezas de espécies (nºtaxa/amostra) foram avaliadas considerando-se o número total de espécies em cada amostra. A identificação das taxas foram realizadas utilizando-se Bourrelly (1970), Bicudo & Bicudo (1970), De- Lamonica-Freire (1985), Krammer & Lange-Bertalot (1991), Garcia de Emiliani (1993), Bicudo et all (1995), Huszar & Silva (1999). As análises da comunidade zooplanctônica foram feitas com microscópio esteroscópico e óptico. A identificação foi realizada utilizando-se os trabalhos de Koste (1978), Reid (1985), Paggi (1995), Elmoor-Loureiro (1997). Foram feitas contagens dos organismos da amostra total, devido a pouca quantidade 58
  • 59. em número de indivíduos por m3. As contagens processaram-se em lâmina do tipo “Sedgewich-rafter”. As amostras de sedimento coletadas para a análise dos macroinvertebrados bentônicos foram inicialmente lavadas em peneira de malha de 200µm de abertura, em água corrente. Posteriormente, o material retido foi triado em microscópio estereoscópico e em seguida os organismos foram preservados em álcool 70%, devidamente identificados e contados a nível de classe, ordem e família e, no caso da família Chironomidae, a nível de tribo. As identificações taxonômicas foram feitas com auxílio de literatura especializada (McCafferty, 1981; Rosernberg & Resh, 1993; Trivinho Strixino & Strixino, 1995; Merritt & Cummins, 1996).  Descrição das metodologias de análise da água PARÂMETRO UNIDADE MÉTODO pH pH-mêtro WTW Condutividade elétrica µS/cm Condutivímetro WTW Alcalinidade mg/L CaCO3 Potenciométrico Dureza Total mg/L CaCO3 Titulométrico do EDTA Turbidez UNT Turbidímetro Série de Sólidos Mg/L Gravimétrico Oxigênio dissolvido Mg/L Winkler modificado Nitrogênio Kjeldhal Mg/L Colorimétrico do Fenato Amônia Mg/L Colorimétrico do Fenato Nitrato Mg/L Colorimétrico do Fenoldissulfônico Fósforo total Mg/L Colorimétrico do Molibdato Cálcio Mg/L Espectrofotometria de absorção atômica Ferro total Mg/L Espectrofotométrico Sílica Mg/L Colorimétrico do Molibdato Sulfato Mg/L Espectrofotométrico DBO Mg/L Diluição e incubação DQO Mg/L Titulométrico com Sulfato Amoniacal 59
  • 60. Com os resultados de densidade e riqueza específica do fitoplâncton, zooplâncton e bentos foi calculado o Índice de Diversidade de Shannon- Weaver, descrito na fórmula abaixo, segundo Odum (1988): Onde: n Pi = n/N, sendo - Σ Pi log Pi 1 n= valor de importância de cada espécie N= total dos valores de importância Descrição das estações de coleta Coleta CULU1: Margens com vegetação natural, com mata ciliar preservada. Não ocorrência de macrófitas aquáticas. Fluxo intenso com leito do tipo arenoso-predregoso. Coleta realizada às 11:15 horas na ponte sobre a MT-020, local do futuro corpo do reservatório. Coleta CULU2: Margens com vegetação natural, com mata ciliar preservada. Não ocorrência de macrófitas aquáticas. Fluxo intenso com leito do tipo arenoso-predregoso. Coleta realizada às 12:20 horas na margem direita do rio, à jusante da futura barragem. Os resultados dos 21 parâmetros físico-químicos obtidos nas coletas encontram-se no Quadro a seguir. 60
  • 61. Parâmetro Unidade CULU1 CULU2 Condutividade elétrica µS/cm 31,0 30,9 PH - 7,6 7,7 Transparência de Secchi M 0,80 0,80 Turbidez UNT 13 12 Alcalinidade total mgCaCO3/L 15 15 DBO mg/L <1 <1 DQO mg/L <6 <6 Oxigênio dissolvido mg/L 7,7 4,0 Nitrogênio Kjeldhal mg/L 0,027 < 0,020 Amônia mg/L 0,006 < 0,001 Nitrato mg/L 0,041 0,059 Fosfato Total mg/L 0,026 0,085 Sílica mg/L 2,528 2,428 Ferro total mg/L 0,37 0,392 Cálcio mg/L 3,8 3,8 Sulfato mg/L < 0,1 0,6 Sólidos totais mg/L 10 54 Sólidos totais dissolvidos mg/L 4 4 Sólidos totais suspensos mg/L 6 50 Sólidos sedimentáveis mg/L < 0,1 < 0,1 Os resultados encontrados nas duas estações de coleta foram semelhantes, exceto quanto ao oxigênio dissolvido, fosfato total e sólidos suspensos. Essa diferença deve estar relacionada à queda d´água que existe entre um local e outro de coleta, o que favorece a resuspensão do sedimento, ocasionando leve aumento dos sólidos suspensos que, por sua vez, resuspende também compostos fosfatados retidos no sedimento. Quanto ao oxigênio dissolvido, era de se esperar uma maior concentração abaixo da corredeira, o que não ocorreu devido ao fato da coleta ter sido realizada na margem do rio na estação CULU2, local onde há menor aeração pelo fluxo. 61
  • 62. Quanto aos valores de alcalinidade total e cálcio, observou-se a ocorrência de carbonatos e formas de cálcio na água, aspecto certamente relacionado à ocorrência de formações calcáreas na região das cabeceiras do rio Culuene, aspecto que influenciou nos resultados levemente básicos do pH. Essa característica será favorável no enchimento do reservatório, pois a alcalinidade servirá de tampão às substâncias ácidas que serão liberadas com a decomposição da biomassa inundável, controlando assim a diminuição do pH da água. A concentração dos nutrientes (NKT, NH3, NO2 e Pt) foi baixa, característica também relacionada aos baixos resultados de DBO e DQO, indicando que o aporte de matéria orgânica e inorgânica para o rio é pequeno. Provavelmente com as chuvas esses resultados devem aumentar, mas não muito, uma vez que as matas ciliares são preservadas, aspecto que não favorece o arraste de detritos para o leito do rio, ou seja, as alterações da qualidade da água com as chuvas deverão ser discretas. Barrela et allii (2001) frisam que o papel das matas ciliares e dos ecótonos água-terra são muito importantes nos processos de oxi-redução e ciclagem de nutrientes. Naturalmente os ecótonos água-terra recebem uma grande quantidade de matéria orgânica e inorgânica dos sistemas adjacentes, inclusive da própria mata ciliar, cuja deposição ocorre de maneira discreta no tempo e no espaço. Em vista disto, essas zonas de transição funcionam como filtros que retém e transformam a matéria, amortecendo os impactos das áreas adjacentes e favorecendo, assim, a manutenção da biota aquática. Essa função dos ecótonos água-terra também é importante em lagos e reservatórios, sejam naturais ou de origem antrópica. A concentração de sílica foi relativamente alta, aspecto relacionado à natureza arenosa do leito do rio Culuene. Isto favoreceu a ocorrência de espécies de diatomáceas (Bacillariophyceae), que precisam deste elemento para formar a carapaça de sílica que envolve suas células. 62