mostra o que está em jogo e o que podemos esperar da conferência apresentando um panorama histórico do debate sobre Desenvolvimento Sustentável no sistema ONU e abordando os dois temas centrais em debate:
- Economia Verde no contexto do Desenvolvimento Sustentável e da redução de pobreza e desigualdades
- Instrumentos de governança para o Desenvolvimento Sustentável
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
As conferências da ONU e o desenvolvimento sustentável
1. Por dentro da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável
2. O Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Escola de Administração de
Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP) é um espaço aberto de estudo,
aprendizado, reflexão, inovação e de produção de conhecimento, composto por
pessoas de formação multidisciplinar, engajadas e comprometidas, e com genuína
vontade de transformar a sociedade. O GVces trabalha no desenvolvimento de
estratégias, políticas e ferramentas de gestão públicas e empresariais para a sustenta-
bilidade, no âmbito local, nacional e internacional. Seus programas são orientados
por quatro linhas de atuação: formação; pesquisa e produção de conhecimento;
articulação e intercâmbio; e mobilização e comunicação.
COOrdEnAdOr
Mario Monzoni
O Instituto Socioambiental (ISA)é uma Organização da Sociedade Civil de Interes-
se Público (Oscip), fundada em 22 de abril de 1994, por pessoas com formação
e experiência marcantes na luta por direitos sociais e ambientais. Tem como
objetivo defender bens e direitos coletivos e difusos, relativos ao meio ambiente,
ao patrimônio cultural, aos direitos humanos e dos povos. O ISA produz estudos
e pesquisas, implanta projetos e programas que promovam a sustentabilidade
socioambiental, valorizando a diversidade cultural e biológica do país.
www.socioambiental.org
COnSElhO dIrETOr
Neide Esterci (presidente), Marina Kahn (vice-presidente),
Ana Valéria Araújo, Jurandir Craveiro, Tony Gross
SECrETárIO ExECuTIVO
André Villas-Bôas
SECrETárIO ExECuTIVO AdjunTO
Adriana Ramos
O Vitae Civilis é uma Organização da Sociedade Civil brasileira, sem fins lu-
crativos, cujo objetivo é a construção de sociedades sustentáveis, conciliando o
Cidadania e Sustentabilidade desenvolvimento humano à conservação ambiental, com base na democracia e
justiça social.
COOrdEnAçãO ExECuTIVA
Marcelo Cardoso
COOrdEnAçãO ExECuTIVA AdjunTA
Rubens Harry Born
COOrdEnAçãO AdmInISTrATIVA E FInAnCEIrA
Danny Rivian
COOrdEnAçãO dE PrOCESSOS InTErnACIOnAIS
Aron Belinky
COOrdEnAçãO dE PrOjETOS
Pilar Cunha
3. Por dentro da Conferência das Nações Unidas
sobre Desenvolvimento Sustentável
Novembro de 2011
São Paulo, SP
Realização
Cidadania e Sustentabilidade
4. Realização
Edição
Maria Inês Zanchetta
Pedro Telles
Ricardo Barretto
Pesquisa e textos
José Alberto Gonçalves Pereira
Cidadania e Sustentabilidade
Colaboradores
Adriana Ramos
Aron Belinky
Rubens Born Apoio
Revisão
Julio Cezar Garcia
Revisão das referências
bibliográficas
Leila Maria Monteiro
Projeto Gráfico
Eric Peleias
Gabi Juns
5. Sumário
4
Apresentação
6
As conferências da ONU
20
O que é Economia Verde
e o Desenvolvimento
Sustentável
37
30
Governança
Referências bibliográficas
39
Siglário
6. 4
Apresentação
A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20, prevista
para junho de 2012, no Rio de Janeiro, acontece em um momento importante e delicado.
Enquanto a necessidade de urgência para solucionar problemas ambientais, econômicos e
sociais cresce e coloca todos diante de situações-limite, a eficiência do sistema multilateral
e das resoluções da ONU é cada vez mais questionada. Simultaneamente, no atual contexto
de crise política e econômica internacional, também não se observa grande propensão dos
governos nacionais a assumir os compromissos necessários e implementar os já assumidos.
Ainda assim, a Rio+20 traz grandes oportunidades. Além de ser apresentada pela ONU como
uma conferência do mais alto nível, com importância reforçada pelo governo brasileiro e de
diversos outros países, os temas centrais a serem debatidos na conferência agregam questões
diversas e estruturais, tornando-a uma oportuna ocasião para a convergência de debates re-
lacionados ao Desenvolvimento Sustentável. A Rio+20 abre ainda a possibilidade de se gerar
decisões e encaminhamentos urgentes e estruturantes para o avanço rumo a um modelo de
desenvolvimento verdadeiramente sustentável.
cronograma da rio+20
16 dias no rio de janeiro
seg ter qua qui sex sab dom seg ter
11/06 12/06 13/06 14/06 15/06 16/06 17/06 18/06 19/06
Pré-evento PrepCom3 Negociações e consultas informais
Chegada de gover- Última reunião preparatória Dias fundamentais para o diálogo entre
nantes, diplomatas para a Rio+20, de onde sairá governos e sociedade civil, com diversos
e da sociedade civil rascunho do documento final eventos planejados
ao Rio de Janeiro da Conferência
7. Dois temas centrais foram selecionados para discussão na Rio+20, e serão abordados nesta
publicação:
a transição para uma Economia Verde no contexto da preservação do meio ambiente e
biodiversidade e com a perspectiva de erradicação da pobreza e de desigualdades;
o quadro institucional (instrumentos de governança) para o Desenvolvimento Sustentável.
A Rio+20 é um evento que vai além da conferência em si. Está desencadeando junto à so-
ciedade civil de todo o mundo uma série de processos conscientizadores e mobilizadores.
Soma-se a esse esforço o papel da mídia para alimentar o debate, qualificar, aprofundar as
informações e dar visibilidade às discussões que estão em curso para os mais diversos públicos
e a sociedade como um todo. A mídia é ator decisivo nesse processo. Por essa razão, espe-
ramos que esta publicação, mesmo não esgotando todos os assuntos que estarão em debate,
seja útil aos profissionais que estarão trabalhando na cobertura do evento, contribuindo para
informar do melhor jeito e com a profundidade necessária o público brasileiro. Reproduzimos
abaixo um breve cronograma das reuniões que antecederão a conferência e que devem ser
objeto de atenção da mídia.
Os editores
qua qui sex sab dom seg ter
20/06 21/06 22/06 23/06 24/06 25/06 26/06
Rio+20 Balanço e próximos passos
Realização da Conferência e de eventos Avaliação dos resultados por parte dos
paralelos organizados pela sociedade civil governos e por parte da sociedade civil
8. 6
Capítulo 1
As conferências da ONU e o
Desenvolvimento Sustentável
A
Rio+20 insere-se no contexto dos Após quase quatro décadas da realização da
esforços de diferentes atores sociais, Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente
sobretudo nas três últimas décadas, Humano, realizada em Estocolmo (1972), a pri-
para associar as agendas de desenvolvimento meira a associar de forma consistente questões
e meio ambiente. ambientais ao Desenvolvimento Sustentável na
pauta internacional, o mundo possui centenas de
Entre as décadas de 1960 e 1980, cientistas, convenções, protocolos, declarações e legislações
movimentos sociais, ambientalistas e um nacionais para reverter o quadro de agravamento
punhado de políticos e funcionários públicos nas condições ambientais e sociais e desequilí-
denunciaram os problemas ecológicos e sociais brios socioeconômicos entre países do Norte
das economias herdeiras da Revolução Indus- e do Sul. Novos e estratégicos atores, como as
trial. Em resposta à crescente preocupação empresas, entraram no debate, muitos sob o alerta
pública com os efeitos negativos do modelo emitido em 2007 pelo 4º Relatório de Avaliação
industrial, a Organização das Nações Unidas do Painel Intergovernamental sobre Mudança do
(ONU) iniciou um ciclo de conferências, Clima (IPCC). O desafio é colocar em prática o
consultas e estudos para alinhar as nações em que foi acordado na arena diplomática e acelerar
torno de princípios e compromissos por um a transição para uma economia de baixo carbono
desenvolvimento mais inclusivo e harmônico e socioambientalmente sustentável, que será um
com a natureza. dos principais temas da Rio+20.
Linha do tempo do Desenvolvimento Sustentável
Set/1962: Publicação nos Estados Ago/1968: Paul Jun/1971: Relatório
Unidos de Primavera Silenciosa, de Ehrlich lança nos Founex preparado por um
Rachel Carson, que denuncia os Estados Unidos o po- painel de especialistas
malefícios dos agrotóxicos à saúde lêmico livro A Bomba em Founex, na Suíça,
humana e à vida selvagem. O livro Populacional, que defende a integração das
levou o governo norte-americano a atribui os problemas estratégias de desenvol-
banir o inseticida DDT em 1972. ambientais ao cresci- vimento e meio ambiente.
mento demográfico.
9. O mUNDO póS-gUerrA
Terminada a Segunda Guerra Mundial, em na esfera socioeconômica, o presidente John F.
1945, as políticas de desenvolvimento con- Kennedy instituiu a Aliança para o Progresso,
centraram-se inicialmente na reconstrução para financiar políticas de desenvolvimento
da Europa e do Japão, arrasados pelo maior na América Latina. E na área militar, os EUA
conflito armado do século XX. As duas po- apoiaram golpes militares contra governos
tências vencedoras, Estados Unidos e União progressistas e o aparelhamento das Forças
Soviética, investiram na retomada econômica Armadas dos regimes ditatoriais. Países eu-
de seus antigos e novos aliados, que se torna- ropeus empreenderam forte reação militar
riam peças fundamentais no xadrez da Guerra contra os movimentos anticolonialistas na
Fria. Para recuperar a economia capitalista do Ásia e na África.
pós-guerra, foram criadas em 1944 as duas
instituições do Acordo de Bretton Woods: o DeSeNvOLvimeNtiSmO – Na ótica do modelo
Fundo Monetário Internacional e o Banco econômico desenvolvimentista, que deu o tom
Internacional de Reconstrução e Desenvol- das políticas de expansão econômica do pós-
vimento (Bird), que viria a compor o Grupo guerra, a superação da pobreza extrema, da
Banco Mundial com outras quatro agências fome e da marginalização social das maiorias
de financiamento. viria naturalmente como resultado dos inves-
timentos em grandes obras de infraestrutura,
Apesar da rápida recuperação da Europa e do tais como rodovias, hidrelétricas e projetos de
Japão e da poderosa máquina econômica dos irrigação. Salvaguardas ambientais eram vistas
EUA, o chamado Terceiro Mundo continuava como entraves ao progresso, concebido como
periférico ao centro decisório mundial. Movi- resultado de taxas elevadas de crescimento
mentos sociais, sindicatos e partidos políticos de do Produto Interno Bruto (PIB).
esquerda intensificaram nos anos 1950 e 1960
protestos contra a dependência das potências No Brasil, em vez de privilegiar a distribuição
ocidentais e por investimentos sociais e na de renda, uma economia mais autônoma e a
reforma agrária, bem como elegeram governos proteção ambiental, o que vingou foram incen-
progressistas mais autônomos em relação ao tivos públicos que levaram ao desmatamento
centro do poder global. União Soviética e Cuba do Cerrado, da Mata Atlântica e da Amazônia
emprestaram apoio às guerrilhas e apavoraram e a instalação do parque automobilístico em
os EUA, que reagiram em diferentes campos: detrimento das ferrovias. Importava remover
Mar/1972: Clube de Jun/1972: Jun/1974: Os cientistas Jul/1975: Entra em
Roma publica Limites ONU realiza a Mario Molina e Frank vigor a Convenção
do Crescimento. O Conferência Sherwood Rowland sobre o Comércio
relatório provoca con- sobre Meio mostram que os cloro- Internacional de Espé-
trovérsia ao associar Ambiente fluorcarbonos (CFCs) cies da Flora e Fauna
o crescimento econô- Humano, em danificam a camada Selvagens em Perigo
mico ao esgotamento Estocolmo, de ozônio em artigo na de Extinção (Cites).
dos recursos naturais. na Suécia. revista Nature.
10. 8 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
OS reLAtóriOS BrANDt e BrUNDtLAND
O Relatório Brandt, publicado em julho de 1980 com o título Norte-Sul: um Progra-
ma para a Sobrevivência, decorreu do trabalho da Comissão Independente sobre
Questões de Desenvolvimento Internacional, chefiada pelo ex-chanceler alemão
Willy Brandt. O documento propôs medidas que diminuíssem a crescente assime-
tria econômica entre países ricos do hemisfério Norte e pobres do hemisfério Sul.
Mas a onda neoliberal da década de 1980 fez com que o Relatório Brandt fosse
ignorado pelos governos, que estavam mais preocupados com a livre circulação
de capitais, o livre comércio e a desregulação dos mercados, com remoção de
barreiras ambientais e trabalhistas e presença mínima do Estado na economia.
Paralelamente, personalidades influentes da política, da ciência, de empresas e de
organizações não governamentais concentraram os debates sobre Desenvolvimento
Sustentável na Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD),
criada em dezembro de 1983 pela Assembleia Geral da ONU e chefiada pela
primeira ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland.
Seu relatório final, publicado em abril de 1987, consagrou a expressão Desenvolvimento
Sustentável: “É aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a
possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”. Deriva
diretamente do Relatório Brundtland o conceito dos três pilares do Desenvolvimento
Sustentável: desenvolvimento econômico, equidade social e proteção ambiental.
As recomendações do documento, publicado com o título Nosso Futuro Comum,
levaram à realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CNUMAD), em junho de 1992, no Rio de Janeiro. A Conferência
também é chamada de Cúpula da Terra, Rio-92 e ECO-92.
A terceira iniciativa, também gestada ao longo dos anos 1980, visou formular um
modelo alternativo de desenvolvimento centrado nas necessidades humanas mais
do que nos mercados. Entre os mentores do novo conceito, que se traduziu nos
relatórios anuais de desenvolvimento humano do Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento (Pnud), estavam os economistas Amartya Sen e Mahbub ul Hak.
Mai/1976: Realizada em Jun/1977: Wangari Mar/1979: Mar/1980: Estratégia Mundial de Con-
Vancouver, no Canadá, Maathai funda o Movi- Acidente servação é lançada pela IUCN (em
de 31 de maio a 11 de mento Cinturão Verde na usina português União Internacional para a
junho, a Habitat I foi a no Quênia para pre- nuclear de Conservação da Natureza) em cola-
primeira conferência in- venir a desertificação Three Mile boração com WWF e Pnuma, levando
ternacional a relacionar por meio do plantio Island, na em conta as pressões econômicas
meio ambiente e assen- comunitário de árvo- Pensilvânia sobre a natureza e a necessidade do
tamentos humanos. res por mulheres. (EUA). Desenvolvimento Sustentável.
11. obstáculos naturais para o progresso avançar, recursos hídricos, desmatamento, devastação
como foi o caso da chamada Revolução ver- de mangues e áreas úmidas, contaminação por
de, iniciada na década de 1940. A expressão agrotóxicos e outras substâncias químicas e
cunhada em 1966 refere-se a uma estratégia uma montanha de lixo que se esparrama por
para aumentar a produção agrícola no mun- cidades, mares, rios e lagos.
do e assim acabar com a fome, por meio de
sementes melhoradas, uso de agrotóxicos, Apesar da prevalência do desenvolvimentismo,
fertilizantes, maquinário e plantas genetica- ambientalistas, movimentos sociais e cientistas
mente modificadas (transgênicas). que pesquisavam os efeitos do modelo de pro-
dução e consumo vigentes na saúde humana e
No Brasil, além da expansão do agronegócio no meio ambiente gradualmente aumentavam
em regiões antes não intensamente ocupadas sua influência sobre a opinião pública.
pelo ser humano, houve rápida e desordenada
urbanização. Em consequência da falta de mODeLO NA BerLiNDA – O primeiro grande
preocupação com o bem-estar das pessoas nas encontro internacional a questionar a ótica
últimas cinco décadas, expandiram-se favelas economicista e perdulária do conceito de
e moradias insalubres e cresceu a poluição desenvolvimento vigente no pós-guerra foi a
ambiental (também resultante do déficit em Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
saneamento). Por outro lado, demandas por Ambiente Humano, realizada em Estocolmo,
mais “desenvolvimento”, sobretudo no setor Suécia, em junho de 1972. Foi, também, a
industrial, para ofertar empregos à população primeira vez que a comunidade internacional
urbana, passaram a povoar o imaginário de reuniu-se para considerar conjuntamente as
progresso de pequenas, médias e grandes necessidades globais do desenvolvimento e do
cidades brasileiras. meio ambiente. Em tempos de Guerra Fria, a
conferência foi boicotada pela União Soviética
Afora o agravamento dos problemas sociais e e aliados no Leste Europeu em protesto contra
da herança econômica – hiperinflação, elevado a ausência da Alemanha Oriental, que não
endividamento externo e arrocho salarial –, as integrava a ONU na ocasião.
políticas convencionais de desenvolvimento
afetaram profundamente o meio ambiente. O boicote abriu espaço para emergir a principal
Tornaram-se corriqueiros desastres ecológicos polêmica da cúpula, o embate entre países
por conta de acidentes químicos e derra- desenvolvidos do hemisfério Norte e nações
mamento de petróleo, poluição do ar e dos em desenvolvimento do hemisfério Sul, que
Jul/1980: A Comissão Inde- Dez/1982: Adoção Dez/1984: Vazamento de gás da fábrica de
pendente sobre Questões de da Convenção das agrotóxicos da Union Carbide em Bhopal, na
Desenvolvimento Internacional Nações Unidas sobre Índia, matou perto de 22 mil pessoas. Foi o
publica Norte-Sul: um Pro- o Direito do Mar em maior acidente químico já registrado.
grama para a Sobrevivência Montego Bay, na Ja- A indenização de 2 mil libras por vítima paga
(Relatório Brandt), que defende maica. O tratado só pela Dow Química, que comprou a Union
maior equilíbrio entre países passaria a vigorar em Carbide em 1999, é contestada há anos pelos
ricos e em desenvolvimento. novembro de 1994. sobreviventes do desastre industrial.
12. 10 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
defenderam seu direito à industrialização e diretrizes aprovadas na Conferência de Esto-
ao desenvolvimento econômico. Criticaram colmo visando aproximar as agendas de meio
abertamente o que entendiam como tenta- ambiente e desenvolvimento permaneceram
tivas dos países desenvolvidos em frear seu na gaveta praticamente até a publicação do
desenvolvimento com políticas ambientais Relatório Brundtland, em 1987. (Veja quadro
restritivas à atividade econômica. No lado dos à pág. 8).
países ricos, a maior preocupação foi apoiar
políticas rigorosas de controle da poluição, Configurou-se, contudo, período de emergên-
sem aludir à revisão de padrões de produção cia de novos atores na cena social, como se
e consumo e estilo de vida. observou no Brasil. Na luta por democracia
durante a ditadura militar (1964-1985) ressurgiram
Avalia-se, hoje, que o evento tornou global a movimentos de mulheres, negros, indígenas
temática ambiental, que até então era tratada, e homossexuais, movimentos populares nas
sobretudo em âmbito local e às vezes nacional. periferias urbanas reivindicando melhores
A conferência aprovou a criação do Programa condições de habitação, transporte e saúde
das Nações Unidas para o Meio Ambiente e ganhou força o novo sindicalismo, autôno-
(Pnuma), a comemoração do Dia Mundial mo em relação aos patrões e ao governo. A
do Meio Ambiente em 5 de junho e inspirou temática ecológica continuava marginalizada,
países a instituírem legislações nacionais de uma vez que não era vista mesmo por esses
proteção ambiental. novos atores sociais como prioritária para
melhorar as condições de vida da maioria
DitADUrAS, pOLUiçãO e DeSeNvOLvi- pobre da população.
meNtO – A conjuntura política e econômica
da América Latina, da África e da Ásia nas No meio intelectual, nos partidos políticos e
décadas de 1970 e 1980 foi bastante adversa na classe média, o que ecoava mais facilmente
à adoção e execução de legislações e políti- era o debate sobre desenvolvimento. Para os
cas públicas favoráveis ao Desenvolvimento setores mais conservadores, desenvolvimento
Sustentável. Ditaduras militares proliferavam era basicamente sinônimo de crescimento eco-
nos três continentes e vários países africanos nômico, e daí viria a solução para os problemas
estavam virtualmente paralisados por regimes sociais e o atraso econômico dos países em
autoritários, pelas guerras de libertação e pelo desenvolvimento. Já os grupos progressistas
Apartheid (discriminação racial) na África do concebiam o desenvolvimento como uma
Sul. Face ao quadro político desanimador, as combinação entre crescimento econômico,
Mai/1985: Cientistas Abr/1986: Explosão em reator da esta- Abr/1987: Nosso Fu-
britânicos publicam ção nuclear de Chernobyl na Ucrânia (na turo Comum (Relatório
carta na Nature co- época, parte da então União Soviética) Brundtland) populariza
municando desco- espalha nuvem radioativa pela Europa. O a expressão Desenvol-
berta do buraco na maior acidente nuclear de todos os tem- vimento Sustentável e
camada de ozônio pos obrigou a retirada de 350 mil pesso- lança as bases para a
sobre a Antártida. as das áreas contaminadas. Rio-92.
13. DOCUmeNtOS DA riO-92
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – Reúne 27 princípios para
guiar os países nas suas políticas de Desenvolvimento Sustentável. O artigo 15, por
exemplo, advoga o uso do princípio da precaução.
Declaração de Princípios sobre Florestas – Primeiro acordo global a respeito do manejo,
conservação e desenvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas.
Agenda 21 – Programa de transição para o Desenvolvimento Sustentável inspirado no
Relatório Brundtland. Com 40 capítulos, tem sua execução monitorada pela Comissão
sobre o Desenvolvimento Sustentável da ONU (CDS) e serviu de base para a elaboração
das Agendas 21 nacionais e locais.
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (CQNUMC) – Disponível
para assinaturas na Rio-92, vigora desde março de 1994, reconhecendo que o sistema
climático é um recurso compartilhado cuja estabilidade pode ser afetada por atividades
humanas – industriais, agrícolas e o desmatamento – que liberam dióxido de carbono e
outros gases que aquecem o planeta Terra, os gases de efeito estufa.
Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB) – Aberta para assi-
natura na Rio-92, começou a valer em dezembro de 1993. Desde então, já foram apro-
vados dois protocolos à CDB – o de Cartagena sobre Biossegurança, vigorando desde
setembro de 2003, e o de Nagoya, adotado em outubro de 2010. O Protocolo de Nagoya
institui princípios para o regime global de acesso a recursos genéticos e repartição de
benefícios de sua utilização, um dos três objetivos centrais da CDB. Os outros dois são
a conservação e o uso sustentável da biodiversidade.
Convenção sobre Combate à Desertificação – Adotada em junho de 1994, fruto de uma
solicitação da Rio-92 à Assembleia Geral da ONU, entrou em vigor em dezembro de 1996.
Set/1987: Adoção do Dez/1988: Herói da luta contra o Mar/1989 – O navio-
Protocolo de Montreal, desmatamento na Amazônia e pe- tanque Exxon Val-
que inicia o controle de las reservas extrativistas, o serin- dez colide com um
CFCs e outras substân- gueiro Chico Mendes é assassina- recife e derrama
cias químicas que danifi- do em Xapuri (AC) por pistoleiros a em torno de 355 mil
cam a camada de ozônio. mando de seus inimigos políticos. barris de petróleo
na costa do Alasca.
14. 12 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
distribuição de renda, investimentos sociais
rio-92 em números
e relações justas no comércio internacional.
Enquanto isso, a discussão sobre distintos
2.400 108
representantes chefes
modelos de desenvolvimento avançava na da sociedade civil de Estado
frente diplomática e nos fóruns da ONU,
contribuindo para materializar o conceito
do Desenvolvimento Sustentável. Talvez as
três mais notáveis iniciativas empreendidas
172
países
mundialmente para ampliar o enfoque do participantes
desenvolvimento além de seu tradicional vín-
culo com o crescimento econômico foram os
relatórios Brandt e Brundtland e o lançamento 17.000
do Relatório de Desenvolvimento Humano ativistas no Fórum Global (evento paralelo
com seu inovador índice, o IDH (Índice de promovido por ONGs e movimentos sociais
no Aterro do Flamengo)
Desenvolvimento Humano).
ações que promovessem a convergência dos
DA riO-92 à riO+20 três pilares do Desenvolvimento Sustentável.
Foi a Rio-92, realizada no Rio de Janeiro em
O Relatório Brundtland forneceu o roteiro para o junho de 1992, que selou os acordos políticos
mundo organizar o debate sobre desenvolvimento entre os países que teriam como finalidade
em novas instituições, princípios e programa de rechear o roteiro do Relatório Brundtland e
Abr/1992: Changing Course é publi- Jun/1992: Também Jun/1993: Set/1994:
cado pelo industrial suíço Stephan conhecida como Viena, na Conferência
Schmidheiny, que fundara o Business Cúpula da Terra, Áustria, Internacional
Council of Sustainable Development Eco-92 e Rio-92, sedia a sobre Popula-
em 1990 para preparar a participação a Conferência das Conferên- ção e Desen-
do setor privado na Rio-92. O livro Nações Unidas so- cia Mun- volvimento é
apresenta caminhos para a comunida- bre Meio Ambiente dial sobre realizada no
de de negócios internalizar critérios de e Desenvolvimento Direitos Cairo, Egito.
sustentabilidade socioambiental em acontece na cidade Humanos.
suas operações. do Rio de Janeiro.
Mar/1995: Set/1995: Nov/1995: Enforcamento do escri- Jun/1996: Confe-
ONU organiza A capital chi- tor e ativista ambiental nigeriano rência das Nações
a Cúpula Mun- nesa Pequim Ken Sarowiwa pelo governo de Unidas sobre Assen-
dial sobre De- recebe a 4ª seu país atrai atenção internacio- tamentos Humanos
senvolvimento Conferência nal para as ligações entre direitos (Habitat II) acontece
Social em sobre Mulhe- humanos, justiça ambiental, segu- em Istambul, na
Copenhague, res, promovida rança e crescimento econômico. Turquia.
na Dinamarca. pela ONU.
15. negociar metas e o arcabouço institucional
Os Objetivos de
do novo momento. A Rio-92 pautou ainda as Desenvolvimento
negociações sobre Desenvolvimento Sustentável
e meio ambiente nas duas décadas seguintes
do milênio (ODm)
graças à aprovação de um conjunto de tratados
e declarações sob a chancela da ONU. (Veja Foram estabelecidos em 2000 pela ONU
quadro Documentos da Rio-92, à pág.11). e são oito:
A Rio-92 ocorreu em um cenário global mais
1 Erradicar a pobreza extrema e a fome
otimista do que o da Conferência de Estocol- 2 Atingir o ensino básico universal
mo. Ditaduras militares tornavam-se raras no
mundo em desenvolvimento, o que favoreceu
3 Promover igualdade entre os sexos e
autonomia das mulheres
a multiplicação de movimentos e organizações
cívicas dedicadas a causas ecológicas, sociais 4 Reduzir a mortalidade na infância
e políticas. No campo da ciência, já havia
massa crítica consistente e ampla em estudos
5 Melhorar a saúde materna
sobre o aumento na concentração de gases- 6 Combater o HIv, a malária e outras
estufa na atmosfera, a destruição da camada doenças
de ozônio, o esgotamento dos recursos pes-
queiros, a poluição atmosférica e hídrica, a
7 Garantir a sustentabilidade ambiental
desertificação, a contaminação química, o 8 Estabelecer uma parceria mundial
aumento exorbitante nas taxas de extinção de para o desenvolvimento
espécies animais e vegetais e o desmatamento
de florestas e savanas.
Set/1996: ISO Nov/1996: Set/1999: Lança- Nov/1999: Jul/2000: Lançamento
14001 é formal- Roma sedia mento dos índices Durante sua do Pacto Global da
mente adotada a Cúpula de sustentabilidade terceira confe- ONU, iniciativa que
como padrão Mundial da da Dow Jones, em rência ministerial, reúne empresas com-
voluntário Alimenta- Nova York, para realizada em prometidas a alinhar
internacional ção, convo- medir o desempe- Seattle, nos operações e estratégias
para sistemas cada pela nho nas bolsas de Estados Unidos, com dez princípios
de gestão am- FAO. valores de empre- a OMC é alvo do nas áreas de direitos
biental corpo- sas com políticas primeiro grande humanos, condições de
rativos. de responsabilida- protesto antiglo- trabalho, meio ambiente
de socioambiental. balização. e combate à corrupção.
Set/2000: Cúpula do Milênio Jan/2001: Movimentos sociais Set/2001: Ataques ter-
promovida pela ONU em Nova promovem em Porto Alegre (RS) o roristas ao World Trade
York estabelece oito objetivos I Fórum Social Mundial (FSM), que Center e ao Pentágono
de desenvolvimento (ODM) a desde então repete-se anualmente. nos Estados Unidos mar-
serem alcançados até 2015, Tem como finalidade discutir pro- ginalizam temas socioam-
tais como diminuir pela me- postas alternativas de sociedade, bientais na agenda global,
tade a proporção de pessoas contemplando os direitos humanos, que é tomada pela preo-
com fome e cuja renda diária é direitos trabalhistas, proteção am- cupação com a segurança
inferior a um dólar. biental e economia solidária. nos países do Ocidente.
16. 14 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
eCOSSiStemAS SãO BASe pArA AçãO iNterNACiONAL
peLA SUSteNtABiLiDADe
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio (AEM), estudo realizado a pedido da ONU
entre 2001 e 2005 envolvendo mais de 1.360 especialistas de 95 países, revelou que
cerca de 60% (15 entre 24) dos serviços dos ecossistemas examinados (incluindo 70%
dos serviços reguladores e culturais) vêm sendo degradados ou utilizados de forma
não sustentável. Para Rubens Born, coordenador executivo adjunto do Instituto vitae
Civilis, entre os serviços dos ecossistemas degradados nos últimos 50 anos estão:
pesca de captura, fornecimento de água, tratamento de resíduos e destoxificação,
purificação da água, proteção contra desastres naturais, regulação da qualidade do
ar, regulação climática local e regional, regulação da erosão, realização espiritual e
apreciação estética. “Se o uso de dois serviços dos ecossistemas – pesca de captura
e água doce – já atingiu patamares muito acima dos níveis sustentáveis mesmo nas
demandas atuais, que dirá futuramente”. A Avaliação Ecossistêmica do Milênio foi
realizada para avaliar as conseqüências das mudanças nos ecossistemas sobre o
bem-estar humano, e assim oferecer base científica para as decisões sobre o desen-
volvimento de forma a assegurar a conservação e o uso sustentável dos ecossistemas.
A AEM resultou de solicitações governamentais por informações provenientes de
quatro convenções internacionais – Convenção sobre Diversidade Biológica, Con-
venção das Nações Unidas de Combate à Desertificação, Convenção Ramsar sobre
Zonas Úmidas e Convenção sobre Espécies Migratórias – e visa suprir também as
necessidades de outros grupos de interesse, incluindo comunidade empresarial,
setor de saúde, organizações não governamentais e povos nativos.
Mar/2002: ONU realiza Conferência Internacio- Abr/2002: Global Ago/2002: Cúpula
nal sobre Financiamento para o Desenvolvimen- Report Initiative (GRI) Mundial sobre Desen-
to em Monterrey, no México, seis meses após inicia suas atividades volvimento Sustentável,
os ataques terroristas aos Estados Unidos. A focadas em desen- a Rio+10, aprova em
prioridade para a agenda de segurança frustrou volver padrões de Joanesburgo, na África
a intenção de criar mecanismos para financiar relato de políticas e do Sul, plano para
ações definidas nas conferências mundiais dos ações corporativas implementar os com-
anos 1990. de sustentabilidade. promissos da Rio-92.
Jun/2003: Lançamento Dez/2004: Pela pri- Fev/2005: Adotado em Mar/2005: Ava-
pelos bancos dos Princípios meira vez, o Prêmio dezembro de 1997, liação Ecossistê-
do Equador em Washington Nobel da Paz é con- o Protocolo de Kyoto mica do Milênio
D.C., capital dos Estados cedido a um ambien- passa a vigorar, obri- mostra os efei-
Unidos, com diretrizes para talista, a queniana gando os países indus- tos das modi-
gerenciar riscos socioam- Wangari Maathai, por trializados a cortar em ficações nos
bientais do crédito para sua luta em defesa do 5% suas emissões de ecossistemas
grandes projetos industriais meio ambiente e dos gases-estufa em rela- sobre o bem-
e de infraestrutura. direitos humanos. ção aos níveis de 1990. estar humano.
17. protocolo de Kyoto
reviSõeS DA riO-92 – O baixo grau de
implementação dos compromissos assumidos
define meta de emissões
no Rio de Janeiro, em 1992, marcou a Sessão A 3ª Conferência das Partes da Convenção do
Especial da Assembleia Geral da ONU para Clima, realizada em Kyoto, no Japão, em de-
a revisão e avaliação da implementação da zembro de 1997, adotou o Protocolo de Kyoto,
Agenda 21 (Rio+5), em Nova York, em junho de que entrou em vigor em fevereiro de 2005.
1997. Enquanto a saúde do planeta continuava vinculado à Convenção do Clima, Kyoto definiu
piorando, a avaliação da Rio+5 (conhecida metas obrigatórias de redução nas emissões de
pela sigla em inglês UNGASS) sobre os cinco gases-estufa para 38 países industrializados e a
anos pós-Rio-92 observou retrocessos como a União Europeia que fazem parte do Anexo B do
diminuição da assistência oficial ao desenvol- Protocolo (nações desenvolvidas e economias de
vimento de 0,34% em 1991 para 0,27% (1995) transição do Leste Europeu e Rússia). As emissões
do Produto Nacional Bruto (PNB) dos países devem ser diminuídas em 5%, em média, entre
doadores. Na Rio-92, os países ricos haviam se 2008 e 2012 em comparação aos níveis de 1990.
comprometido a aumentar para 0,7% a ajuda Os Estados Unidos não ratificaram o Protocolo,
financeira aos países em desenvolvimento. A apesar de fazerem parte dele.
Rio+5 contribuiu para criar ambiente político
propício à aprovação do Protocolo de Kyoto
em dezembro de 1997.
Apesar da avaliação realista produzida em a infelicidade de ocorrer sob os reflexos
Nova York, pouca coisa mudou nos cinco dos ataques terroristas aos EUA em 11 de
anos seguintes. A Cúpula Mundial sobre setembro de 2001.
Desenvolvimento Sustentável (Rio+10),
promovida pela ONU em Joanesburgo, na O principal documento da conferência foi o
África do Sul, (de 26/8 a 4/9/2002) teve ainda Plano de Implementação de Joanesburgo, que
Ago/2005: Furacão Katrina devasta várias Fev/2006: Pi- Out/2006: Relatório
cidades da costa do Golfo do México nos nhais (PR) sedia Stern sobre a economia
Estados Unidos. O fenômeno consumiu o a 8ª Conferência das mudanças climáticas
maior valor em sinistros já pago pelas se- das Partes da é publicado em Londres
guradoras e chamou a atenção da opinião Convenção so- por encomenda do go-
pública para o aumento na frequência de bre Diversidade verno britânico.
eventos climáticos extremos. Biológica.
Fev/2007: IPCC lança a primeira par- 2008: Crises alimentar, 2008: Aconte-
te do 4º Relatório de Avaliação, que energética e financeira con- cimento inédito
afirma ser muito provável que a maior vergem, provocando reces- na história da
parte do aumento na temperatura glo- são econômica. Incentivos humanidade, a
bal é devida ao aumento nas concen- à tecnologias verdes são população urba-
trações atmosféricas de gases-estufa incluídos nos pacotes de es- na ultrapassa a
emitidos por atividades humanas. tímulo econômico anticrise. das zonas rurais.
18. 16 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
fortaleceu o papel da Comissão sobre o Desen- US$ 235 milhões, foram identificadas na
volvimento Sustentável da ONU (CDS) e reiterou conferência. A CDS registra hoje cerca de 348
metas para reduzir a perda de biodiversidade parcerias com focos em transporte, químicos,
até 2010 e cortar pela metade a população gestão de resíduos, mineração e mudança de
sem acesso à água potável até 2015. A CDS, padrões insustentáveis de consumo e produção,
entretanto, vem se desgastando no decorrer entre outros temas.
dos anos e sua 19ª Reunião Anual, em maio de
2011, foi considerada um fracasso. As parcerias compreendem iniciativas voluntárias
multissetoriais promovidas por combinações
Um debate característico da Rio+10 foi a pro- de governos, agências intergovernamentais,
moção de parcerias público-privadas (PPPs), ONGs, povos indígenas, grupos de jovens e
refletindo abordagens neoliberais mais vigoro- mulheres, sindicatos, empresas, agricultores e
sas com a globalização que se acentuou nos a comunidade científica e tecnológica.
anos 1990, com uma maior atuação do setor
privado (e a correspondente expectativa menor A riO-92 reviSitADA – O mundo atual é
de intervenção de governos) e da sociedade bem distinto do mundo da Rio-92. Na oca-
em questões de conservação ambiental e de sião, a economia mundial voltava a crescer
Desenvolvimento Sustentável. Já para diversos a um ritmo mais veloz, após os dois choques
atores isso foi mais um sinal do malogro da nos preços do petróleo na década de 1970
Rio+10. Eles esperavam dos governos maior e a crise da dívida externa dos países em
capacidade política de implementar compro- desenvolvimento nos anos 1980. Outro ele-
missos internacionais. Para outros, entretanto, mento de estímulo foi o fim da Guerra Fria
as PPPs foram o destaque na Rio+10. com a queda do Muro de Berlim em agosto
de 1989 e a dissolução da União Soviética
Mais de 220 parcerias globais para o Desenvol- em 1991. A redemocratização da América
vimento Sustentável, com projetos totalizando Latina consolidou-se e as questões ambientais
Dez/2009: A 15ª Conferência das Out/2010: Out/2010: A aprovação do
Partes da Convenção sobre Mudanças Publicação da Protocolo de Nagoya sobre
Climáticas (COP-15), realizada em Co- síntese do estudo acesso aos recursos gené-
penhague, consolida o tema climático A Economia dos ticos e repartição de bene-
nas agendas pública, corporativa e da Ecossistemas e fícios foi o destaque da 10ª
sociedade civil, mas decepciona pelo da Biodiversidade Conferência das Partes da
insucesso em fechar um acordo para (TEEB). Convenção sobre Diversi-
diminuir as emissões após 2012. dade Biológica (COP-10),
no Japão.
Fev/2011: – Pnuma lança Out/2011: Jun/2012: Rio de Janeiro se-
Rumo à Economia Verde: A população mundial diará a Conferência das Na-
Caminhos para o Desen- chega a sete bilhões. ções Unidas sobre Desenvolvi-
volvimento Sustentável e a mento Sustentável, a Rio+20.
Erradicação da Pobreza.
19. Como surge a rio+20
ganharam espaço inédito nas políticas públicas
e na diplomacia internacional. A proposta foi apresentada pelo Presidente Luiz
Inácio Lula da Silva em 2007 e embora dada
O vigor econômico das economias ricas provou, como certa a realização da conferência no Rio
porém, ser pouco sustentável. Desde 2007, o de Janeiro em 2012, ela só foi convocada ofi-
mundo tem testemunhado uma grande crise cialmente pela ONU em 24/12/2009.
global dos alimentos, volatilidade nos preços
Entretanto, logo depois da proposta de Lula, o
do petróleo, crescente instabilidade climática e
cenário mundial mudou: a crise econômica de
a pior crise financeira mundial desde a grande
2008, os fiascos da ONU na Convenção do Clima
depressão causada pela queda na Bolsa de
(COP-15) e na Comissão sobre o Desenvolvi-
Nova York em 1929. Após anos de declínio, a
mento Sustentável (CDS 19) e o fortalecimento
pobreza, a fome e a desnutrição voltaram a
dos países do G-20 geram expectativas diversas
aumentar e a esperança de realizar os Objetivos
sobre a Rio+20, marcadas pela cautela.
de Desenvolvimento do Milênio até 2015 está
ameaçada. (Veja quadro sobre os Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio à pág. 13).
Se a Rio-92 mostrou que a segurança eco- Desenvolvimento Sustentável galgou degraus
nômica e o bem-estar humano dependem nas agendas corporativas e foi incorporado
umbilicalmente de ecossistemas saudáveis e por muitas companhias como conceito central
fortaleceu a noção da necessidade de acordos nos seus processos de produção e relacio-
políticos globais para promover a transição namento com comunidades, sociedade civil
rumo ao Desenvolvimento Sustentável, de e consumidores. Infelizmente, o conceito
outro lado o progresso tem sido lento nos também virou instrumento publicitário de
últimos 20 anos e insuficiente na materiali- empresas sem políticas e ações efetivas em
zação de tais acordos em ações concretas nome da sustentabilidade, gerando o chamado
de proteção ao ambiente planetário. greenwashing ou maquiagem verde.
Além disso, parcela substancial da economia Investimentos em tecnologias verdes e na
contemporânea, mesmo os setores mais de transição para uma economia sustentável têm
ponta, como o de tecnologia da informação aumentado - mesmo durante a crise financeira
e o de telecomunicações, funcionam graças à internacional que eclodiu nos Estados Unidos
existência de relações de trabalho degradantes. em setembro de 2008, ainda que em ritmo
Quase um terço da população mundial tenta mais lento - e algumas companhias come-
sobreviver com renda diária inferior a US$ 2. çam a comunicar publicamente sua pegada
ecológica e desempenho de indicadores de
Houve, contudo, considerável envolvimen- sustentabilidade, ainda que timidamente.
to, no período pós-Rio-92, de governos,
organizações da sociedade civil e empresas Destacam-se ainda as ações voltadas para a
com iniciativas para proteger ativos ambien- chamada economia de baixo carbono, conceito
tais e sociais nas cadeias de negócios. O menos abrangente que o da Economia verde,
20. 18 AS CONFERêNCIAS DA ONU E O DESENvOLvIMENTO SUSTENTÁvEL
pois localiza as iniciativas em sustentabilidade tirar as economias da crise. Em torno de 15%
no contexto da redução de emissões de gases do total de US$ 3,1 trilhões dos pacotes foram
do efeito estufa e na adaptação de produtos, relativos a incentivos à tecnologias verdes, de
serviços e sistemas produtivos aos novos acordo com o organismo da ONU.
desafios e às oportunidades associadas à
mudança do clima. Essa vertente da econo- Tudo isso ocorre em meio a um cenário em
mia se apoia tanto em estudos científicos e que rapidamente, o planeta aproxima-se do
socioeconômicos cada vez mais frequentes ponto além do qual evitar uma catástrofe
que revelam a urgência das ações de mitigação provocada pelas mudanças climáticas se
e adaptação às mudanças climáticas, quanto tornará substancialmente menos provável.
nas diretrizes da Convenção-Quadro da ONU A maior parte dos ecossistemas do planeta
sobre Mudança do Clima, cuja principal refe- encontra-se degradada ou sob severa pressão
rência até hoje é o Protocolo de Kyoto. (Veja em consequência das atividades humanas
quadro à página 15). (Veja quadro Ecossistemas são base para ação
internacional pela sustentabilidade, à pág. 14).
A transição, entretanto, precisa ser acelerada, Caso o crescimento econômico prossiga sob
e isso poderia acontecer se os países fossem o ritmo atual, a humanidade precisará de pelo
mais ambiciosos na criação de incentivos a menos dois outros planetas Terra no final do
negócios verdes, que levaria à geração de maior século XXI para manter os padrões correntes
número de empregos e crescimento do PIB nos de consumo.
cenários de médio e longo prazos, de acordo
com as projeções do relatório sobre Economia Para atenuar e reverter esses inúmeros proble-
verde publicado pelo Pnuma em fevereiro de mas, espera-se que na Rio+20 os líderes globais
2011. (Veja Para Saber Mais ao final do texto). definam um caminho para a transição rápida
Foi, também, o próprio Pnuma que defendeu e justa ao Desenvolvimento Sustentável que
a incorporação de medidas ambientalmente assegure um padrão de vida razoável para a
amigáveis nos pacotes de estímulo econômico população mundial e interrompa a destruição
lançados entre o final de 2008 e 2009 para dos ecossistemas.
21. pArA SABer mAiS
todas as referências a sites e publicações mencionadas neste capítulo podem ser encontradas também
em: www.radarrio20.org.br.
CARSON, Rachel. primavera Silenciosa. São Paulo: Editora Gaia, 2010.
MEADOWS, Dennis L.; MEADOWS, Donella; RANDERS Jorgen. Limites do Crescimento: a atualização
de 30 anos. São Paulo: QualityMark, 2007.
ERLICH, Paul R. population bomb. Nova York, Buccanner Books, 1995.
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENvOLvIMENTO. Nosso futuro comum. Rio de
Janeiro: Editora da Fundação Getúlio vargas, 1991.
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
Sobre o conceito de desenvolvimento humano veja:
UNDP. the Human Development concept. Disponível em: hdr.undp.org/en/humandev. Acesso em:
25 out. 2011.
Sobre os tratados das ONGs consulte:
tHe NgO Alternative treaties. Disponível em: http://habitat.igc.org/treaties/. Acesso em: 25 out. 2011.
ROCKSTRÖM, J. et al. A Safe Operating Space for Nature. Nature, Londres, v. 461, p. 473-475, 24 set. 2009.
POLLARD, Duncan (Ed.). 2010 Living planet report: biodiversity, biocapacity and development. Gland:
WWF Internacional, out. 2010. Disponível em: wwf.panda.org/about_our_earth/all_publications/
living_planet_report/2010_lpr. Acesso em: 26 out. 2011.
UNEP. towards a green economy: pathways to sustainable development and poverty eradication. Nairobi,
2011. Disponível em www.unep.org/greeneconomy. Acesso em 26 out. 2011.
PNUMA. rumo a uma economia verde: caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da
pobreza – uma síntese para tomadores de decisão. Brasília, 2011. Disponível em: http://www.pnuma.
org.br/arquivos/EconomiaVerde_ResumodasConclusoes.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
UNEP. global green New Deal: An Update for the G20 Pittsburgh Summit. Nairobi, set. 2009. Disponível
em: http://www.unep.ch/etb/publications/Green%20Economy/G%2020%20policy%20brief%20
FINAL.pdf. Acesso em: 26 out. 2011.
22. 20
Capítulo 2
O que é Economia Verde
E
conomia Verde é uma expressão de signi- polonês Ignacy Sachs que desenvolvesse
ficados e implicações ainda controversos, o conceito para inspirar documentos e
relacionada ao conceito mais abrangente projetos do Pnuma, criado na Conferência
de Desenvolvimento Sustentável, consagrado de Estocolmo. Sachs escreveu vários livros
pelo Relatório Brundtland (Veja quadro Relatório e artigos sobre o ecodesenvolvimento, que
Brandt e Brundtland), de 1987, e assumido compreende cinco dimensões da susten-
oficialmente pela comunidade internacional tabilidade: social, econômica, ecológica,
na Rio-92, gradualmente tomando o lugar do espacial e cultural. Em sua autobiografia
termo “ecodesenvolvimento” nos debates, intitulada A Terceira Margem, Sachs conta
discursos e formulação de políticas envolvendo que o termo caiu em desgraça em conse-
ambiente e desenvolvimento. quência da repercussão negativa que teve
no governo dos Estados Unidos a Decla-
A ideia central da Economia Verde é que o ração de Cocoyoc, aprovada em outubro
conjunto de processos produtivos da sociedade de 1974 na cidade mexicana de mesmo
e as transações deles decorrentes contri- nome e que tratava de meio ambiente e
buam cada vez mais para o Desenvolvimento desenvolvimento.
Sustentável, tanto em seus aspectos sociais
quanto ambientais. Para isso, propõe como Embora não haja consenso teórico sobre
essencial que, além das tecnologias produtivas uma definição universal do Desenvolvimento
e sociais, sejam criados meios pelos quais Sustentável, a expressão popularizou-se
fatores essenciais ligados à sustentabilidade no mundo a partir da Rio-92. Depois da
socioambiental, hoje ignorados nas análises conferência, a expressão foi sendo pouco a
e decisões econômicas, passem a ser consi- pouco absorvida por governos, corporações
derados. (Veja os quadros sobre os temas da e entidades da sociedade civil, geralmente
Economia Verde e alguns exemplos de meios relacionada à formulação e execução tanto
para alcançá-la, págs. 21 e 24). de políticas públicas quanto de iniciati-
vas privadas ligadas à responsabilidade
O ecodesenvolvimento foi mencionado ini- socioambiental.
cialmente pelo canadense Maurice Strong,
primeiro diretor executivo do Programa Uma parcela dos movimentos sociais e
das Nações Unidas para o Meio Ambiente ambientalistas e pesquisadores das áreas
(Pnuma) e secretário-geral da Conferência de meio ambiente e desenvolvimen-
de Estocolmo (1972) e da Rio-92. Foi Strong to têm questionado o que consideram
quem pediu ao economista e sociólogo a banalização, ou esvaziamento, do
23. Os tEmas da EcOnOmia VErdE
Há basicamente três grandes blocos temáticos essenciais para entender a transição
à Economia Verde. O primeiro compreende assuntos relacionados à sociedade
urbano-industrial, cujo modelo econômico foi herdado da Revolução Industrial e
exacerbado no pós-guerra. É um modelo que não sabe o que fazer com o lixo que
gera, depende de substâncias químicas perigosas para a saúde humana e o meio
ambiente, baseia-se em uma matriz energética dominada por combustíveis fósseis
com grande impacto ambiental e articula-se a sistemas de transporte que priorizam
os carros e poluem a atmosfera.
O segundo bloco inclui questões mais relacionadas à utilização dos ativos naturais pelos
agentes econômicos. São ativos estruturais para o bom funcionamento da economia
a longo prazo, tais como florestas, biodiversidade, ecossistemas aquáticos e solo,
que vêm sendo violentamente destruídos em detrimento do lucro fácil e imediato.
O terceiro grupo refere-se a ações relacionadas à redução da pobreza e de
desigualdades.
Entre os principais temas da Economia Verde destacam-se energia e mudanças
climáticas, construção civil, resíduos, químicos, transporte, florestas e uso da bio-
diversidade, agricultura e pesca, economia solidária e finanças sustentáveis. Estes
temas estão detalhados no site: www.radarrio20.org.br. Confira!
conceito de Desenvolvimento Sustentável, Há, também, movimentos sociais que veem
erroneamente apresentado como objetivo no Desenvolvimento Sustentável uma nova
de práticas superficiais e de pouca relevância. roupagem para o sistema econômico, que
É o que se tornou conhecido como green- até implicaria melhorias em áreas como
washing ou maquiagem verde, em português. eficiência energética e gerenciamento da
água, mas que não modificaria o capitalis-
Em outras palavras, avaliam que, para mo contemporâneo em seus fundamentos,
muitos a expressão transformou-se em sobretudo os da maximização do lucro,
artifício para melhorar a imagem pública do rebaixamento dos custos de produção
de governos e empresas, sem que seu uso e – especialmente – da mercantilização
traduza mudanças efetivas na sua gestão e da vida e da natureza. Ainda que essa
práticas, sintonizadas com os princípios e nunca tenha sido a proposta original de
diretrizes emanados da Rio-92 por meio de Desenvolvimento Sustentável.
seus principais documentos. (Veja quadro
Documentos da Rio-92, à pág. 11). A diminuição de restrições ambientais,
24. 22 O qUE É ECONOMIA VERDE
característica do neoliberalismo dos anos Ecodesenvolvimento, sustentabilidade,
1980 e 1990, e a falta de internalização sociedade sustentável, economia de baixo
das externalidades (ou seja, a não valo- carbono, economia sustentável, econo-
ração e não contabilização dos impactos mia inclusiva e economia solidária. Esses
socioambientais negativos nos preços de jargões – e muitos outros no campo do
bens e serviços) reforçam a equação básica Desenvolvimento Sustentável – possuem
de custos de produção baixos combinados definições várias, muitas vezes ambíguas
com lucro elevado. Do mesmo modo, a e imprecisas. Assim, mais importante que a
transformação de bens comuns em merca- definição precisa de cada termo é a noção
dorias – por exemplo, a compra e venda de de que todos eles sintetizam ideias para
espaço na atmosfera por meio do mercado chamar a atenção da opinião pública e
de emissões de carbono – é vista por alguns dos especialistas quanto à necessidade de
desses movimentos não como a forma de tornar os processos de desenvolvimento e
gestão de um patrimônio natural, mas os instrumentos econômicos ferramentas de
como meio de criação de novos mercados promoção da igualdade social e erradica-
e mercadorias, passíveis de especulação e ção da pobreza, com respeito aos direitos
de apropriação privada, e assim capazes de humanos e sociais e conservação e uso
servir à contínua acumulação capitalista. sustentável dos recursos naturais.
Segundo estudiosos e ambientalistas, uma O mesmo ocorre com a expressão Economia
solução para os dilemas teóricos com a Verde, mas com uma importante diferença:
formulação do Desenvolvimento Sustentável ao ser colocada no centro dos debates da
seria substituí-la ou, ao menos, subordiná-la a Rio+20, passou a ser vista como um grande
outra ainda mais abrangente, a de sociedades guarda-chuva, sob o qual, espera-se, poderão
sustentáveis. De alguma maneira, a ideia se abrigar e articular as várias propostas
da sociedade sustentável resgata a pioneira de alcance mais específico. Por exemplo, a
formulação do ecodesenvolvimento por ser Economia Verde é mais abrangente do que
composta de várias dimensões da susten- a economia de baixo carbono, visto que
tabilidade (característica de uma situação não se limita a processos econômicos com
que pode manter-se em equilíbrio ao longo baixa ou nenhuma emissão de gases de efeito
do tempo), incluindo a cultural. “Sociedade estufa. Ela inclui processos relacionados ao
sustentável” soa, ainda, compatível com a combate às mudanças climáticas de origem
noção de sustentabilidade, que geralmente antrópica, mas também trata de reverter
é utilizada para ampliar o escopo do “De- outras tendências insustentáveis, quer so-
senvolvimento Sustentável”, questionado por ciais – como o consumismo e a crescente
alguns que o entendem como um termo que desigualdade – quer ambientais – como a
traz implicitamente a noção de crescimento vasta contaminação dos ecossistemas e do
contínuo, e também mais associado à dimensão próprio corpo humano por substâncias quí-
econômica do que ao modelo de sociedade micas. Pode-se afirmar que a economia de
como um todo, com seus múltiplos aspectos baixo carbono está geralmente contemplada
culturais e materiais. pela Economia Verde, mas esta vai além,
25. Projeção de tendência da taxa de crescimento anual do PiB global
% 4.0
3.5
3.0
2.5
2.0
1.5
1.0
0.5
0.0
2010 2015 2020 2025 2030 2035 2040 2045 2050
Cenário de investimento verde Cenário tendencial
Fonte: Pnuma, fevereiro, 2011.
pois implica promover processos limpos dEfiniçãO dO Pnuma
de produção e consumo que não agravem
as tendências atuais de rompimento dos A Iniciativa Economia Verde (IEV, ou GEI-
limites de sustentabilidade dos sistemas Green Economy Initiative, em inglês) do
naturais que propiciam as condições para Programa das Nações Unidas para o Meio
a manutenção da vida no planeta. Ambiente (Pnuma), lançada em 2008,
concebe a Economia Verde como aquela que
Como elemento do Desenvolvimento Sus- resulta em melhoria do bem-estar humano
tentável, a Economia Verde também deve e da igualdade social, ao mesmo tempo
ser necessariamente inclusiva, demandando em que reduz significativamente os riscos
a erradicação da pobreza, a redução das ambientais e a escassez ecológica. Ela tem
desigualdades e a promoção dos direitos três características preponderantes: é pouco
humanos e sociais, segundo preconizam intensiva em carbono, eficiente no uso de
seus principais defensores junto a fóruns recursos naturais e socialmente inclusiva.
internacionais e agências multilaterais, como
o Pnuma, o Banco Mundial e a Organiza- Nessa proposta de Economia Verde, o
ção para Cooperação e Desenvolvimento crescimento na renda e no emprego é puxado
Econômico (OCDE). por investimentos públicos e privados que
26. 24 O qUE É ECONOMIA VERDE
ExEmPlOs dE mEiOs Para ViaBilizar a EcOnOmia VErdE
A Economia Verde é entendida como um conjunto de ações e instituições que trazem
para a prática econômica cotidiana os aspectos sociais e ambientais relacionados à
construção de uma sociedade mais justa e sustentável. Além de produtos/serviços
“mais sustentáveis” junto com os negócios e atividades econômicas que os produzem,
a Economia Verde é constituida também pelo conjunto de instituições, práticas e
instrumentos que direcionam a atividade econômica nessa direção.
Assim, há uma série de mecanismos que ajudam a compreender como – na prática – está
sendo construído um sistema voltado a tornar predominantes as atividades econômicas
que tenham a sustentabilidade social e ambiental em seu cerne. Entre esses instrumentos
destacam-se: políticas públicas; autorregulação; incentivos fiscais; compras públicas;
novos indicadores; crédito subsidiado para acelerar a transição e gestão corporativa sus-
tentável. Esta relação não se pretende completa e seu detalhamento está disponível no site
www.radarrio20.org.br. Confira!
reduzem emissões de carbono e a poluição. incentivos a tecnologias verdes nas estratégias
Essa rota de desenvolvimento deve manter, de recuperação econômica que os países
aprimorar e, onde necessário, recuperar o lançaram para atenuar os efeitos nefastos da
capital natural degradado, enfocando-o como crise financeira global iniciada nos Estados
ativo econômico crítico e fonte de benefícios Unidos em setembro de 2008.
públicos, especialmente para a população
pobre cuja sobrevivência e segurança são O segundo documento é o Relatório de
mais direta e imediatamente afetadas por Economia Verde (REV), uma das principais
desequilíbrios nos sistemas naturais (como contribuições do Pnuma para a Rio+20.
demonstram os efeitos das secas e cheias Publicado em fevereiro de 2011, ele possui
em regiões pobres, por exemplo). uma versão compacta para formuladores de
política sob o título Rumo a uma Economia
Análises detalhadas sobre as perspectivas Verde: Caminhos para o Desenvolvimento
da Economia Verde, com cenários de curto, Sustentável e a Erradicação da Pobreza. (Veja
médio e longo prazos, podem ser conferidas Para Saber Mais ao final do texto). Resultado
em dois relatórios lançados pela IEV. O de um trabalho de diversos especialistas de
primeiro foi o Global Green New Deal, em diferentes partes do mundo, o documento
2009, que teve como finalidade recomendar indica que a transição para a Economia Verde
27. redundaria em taxas superiores de crescimento crítica aO
global do Produto Interno Bruto (PIB) e do crEscimEntO VErdE
nível de emprego nos cenários de médio e
longo prazos, em comparação ao cenário Para o REV, a Economia Verde poderá gerar
tendencial (conhecido pela expressão em crescimento ainda maior do que aponta o
inglês business-as-usual - BAU). cenário atual, mas com utilização muito
inferior de recursos naturais. A noção de
Para isso, o estudo compara, por meio de descasamento (ou descolamento, do inglês
modelos econométricos, o cenário tendencial decoupling) nutre-se de alguma maneira da
(BAU) com um cenário alternativo, com “curva de Kuznets” (que associa o crescimento
investimentos totalizando 2% do PIB global contínuo da renda per capita ao aumento
ao ano em áreas como eficiência energética, na desigualdade durante uma fase inicial,
energias renováveis, tecnologias ambientais mas depois compensada, com vantagens, na
e incentivos públicos verdes. medida em que a renda per capita continue a
crescer) e também foi objeto do estudo ICC
initial comments on the UNEP draft Green
rEPErcussãO Economy Report, publicado pela ONU.
aO cOncEitO dO Pnuma
Economistas mais vinculados à economia
A repercussão do REV entre distintos atores ecológica criticam abordagens que, como
sociais oscila de um alinhamento geral com a do REV, concebem a Economia Verde
questionamentos tópicos à oposição frontal ao predominantemente sob o prisma do
relatório e à própria ideia de Economia Verde. descolamento. Avaliam que a perspectiva
As posições são as mais diversas tanto entre de crescimento econômico constante tende
movimentos sociais e organizações da sociedade fatalmente a neutralizar em algum momento
civil quanto entre governos e empresas. ganhos com eficiência energética e uso
de matérias-primas. Há, ainda, o efeito
A grosso modo, o empresariado mais ativo bumerangue ou ricochete, que se refere à
no campo da sustentabilidade foi o setor aplicação, em mais consumo, dos recursos
mais favorável ao REV, ainda que levante economizados no decoupling, criando ao final
problemas pontuais no documento. É o caso pressões adicionais sobre os ecossistemas.
da avaliação divulgada pela Câmara Interna-
cional de Comércio (ICC) denominada ICC O professor Ricardo Abramovay, do Núcleo
initial comments on the UNEP draft Green de Economia Socioambiental da Faculdade de
Economy Report. Economia e Administração da Universidade
de São Paulo, lamenta a falta no estudo do
Publicada em maio de 2011, a avaliação Pnuma de questionamento mais incisivo aos
recomendou ao Pnuma que defina mais atuais padrões perdulários de consumo e
claramente ou estimule a elaboração de estilos de vida nas economias de mercado.
indicadores e métricas para expressões como “Com esses padrões, as indicações são de que
“investimentos verdes” e “Economia Verde”. a economia mundial continuará dependente
28. 26 O qUE É ECONOMIA VERDE
das energias fósseis até pelo menos 2050.” condição de representante do segmento
acadêmico na comissão, recomenda estra-
Por outro lado, estudiosos como Alexandre tégias para gerar mais bem-estar humano
D´Avignon e Luiz Antônio Cruz Caruso, e sustentabilidade ambiental com menos
pesquisadores da Universidade Federal do consumo. A comissão foi desativada em
Rio de Janeiro (UFRJ), avaliam positivamente março de 2011 pelo governo britânico,
o relatório do Pnuma, que representaria uma alegando-se contenção de gastos.
superação da visão antropocêntrica da natureza,
como assinalam em artigo na revista Política
Ambiental, publicada em junho de 2011, dEmandas dOs PaísEs Em
pela Conservação Internacional (CI). Eles não dEsEnVOlVimEntO
deixam de observar, porém, uma limitação
básica do REV: “Pintar a economia neoclássica Como ocorre em outras negociações multi-
de verde não será a solução. É necessária uma laterais, como nas de clima e biodiversidade,
mudança estrutural da ‘administração da casa’ dilemas históricos entre países desenvolvidos
(...), referindo-se ao planeta como a casa de e em desenvolvimento também fazem parte
todos os seres vivos e, como tal, necessitando dos debates preparatórios da Rio+20. Algumas
ser conservado e respeitado.” organizações da sociedade civil proeminentes
e governos do hemisfério Sul alinham-se na
Ao questionarem a noção de crescimento agenda de desconfianças quanto às intenções dos
verde do Pnuma, os economistas ecológicos países ricos com a proposta da Economia Verde.
trazem a noção do desenvolvimento sem
crescimento, tese que desde 1970 é debatida Um porta-voz bastante influente das nações
e condenada por muitos, tachada de obscu- em desenvolvimento é o South Centre – or-
rantista, pois não incorporaria a possibilidade ganização intergovernamental dos países em
de grandes saltos tecnológicos. Há toda uma desenvolvimento com sede em Genebra,
linhagem de pensadores que atuam nesse Suíça –, que publicou um documento de
campo, como o americano Herman Daly, pesquisa sobre o tema em julho de 2011.
um dos fundadores da economia ecológica,
cujas ideias voltaram a circular nos debates De acordo com o texto, o acordo político
contemporâneos sobre desenvolvimento, central na Rio-92 foi o reconhecimento de
globalização e sustentabilidade após quase que a crise ecológica precisava ser resolvida
três décadas de ostracismo. por meio de um caminho equitativo, com
parcerias. Isso foi capturado no princípio
Nessa mesma direção, Tim Jackson elaborou das responsabilidades comuns, porém di-
o célebre e controverso estudo Prosperity ferenciadas da Declaração do Rio. O do-
without Growth? – The transition to a sus- cumento afirma que é nesse contexto que a
tainable economy, publicado em março de Economia Verde deve ser inserida. Apesar de
2009 pela Comissão de Desenvolvimento reconhecer aspectos positivos na formulação
Sustentável do governo do Reino Unido. de Economia Verde do Pnuma, o documento
No trabalho, Jackson, que o preparou na do South Centre aponta os seguintes riscos:
29. que – apesar de sua formulação ampla – a da Economia Verde, defendendo que esta não
EV seja adotada de maneira unidimensio- questiona ou modifica a estrutura básica da
nal, puramente ambiental, sem considerar economia capitalista global. Pelo contrário,
as dimensões do desenvolvimento e da a Economia Verde seria a ponta de lança de
igualdade social; um novo ciclo do capitalismo, na medida
em que transformaria bens comuns (como
Uso da EV como nova condicionalidade a água, a atmosfera, as florestas, oceanos
sobre os países em desenvolvimento em e mesmo os seres vivos) em mercadorias
casos de assistência financeira, empréstimos propícias à apropriação privada, acumulação
e reescalonamento ou cancelamento da e especulação.
dívida externa de alguns países;
Numa perspectiva menos radical, mas ainda
Dúvidas sobre em que medida a utilização estrutural, questiona-se que a Economia Verde,
de mecanismos de mercado para empresas conduzida pela lógica de mercado, tenderia
de países ricos compensarem emissões de a abrigar predominantemente medidas su-
poluentes em outras empresas ou países perficiais, de pouca relevância porém mais
não implicaria a manutenção de uma atrativas no curto prazo, gerando apenas uma
injusta divisão internacional do trabalho ilusão de avanço rumo à sustentabilidade. Por
e da riqueza, mantendo o Sul pobre e essas mesmas razões, tenderia a favorecer os
fornecedor de “serviços ambientais” mais ricos e a impedir que soluções realmente
(além das tradicionais matérias-primas e transformadoras emergissem, mantendo as
mão-de-obra barata), enquanto o Norte causas estruturais das desigualdades sociais
permanece afluente e consumista. e econômicas.
b. Ceticismo com relação ao termo e à
OlharEs da sua relevância
sOciEdadE ciVil
Outro questionamento frequente é quanto
A proposição da Economia Verde também é à necessidade e efetividade de se criar mais
objeto de debates na sociedade civil global, um termo relacionado ao Desenvolvimento
com posições as mais diversas, além dos Sustentável. Pondera-se que, como existe uma
questionamentos acima, que oscilam desde enorme quantidade de nomes e conceitos
uma oposição mais frontal à ideia da Econo- para abarcar as questões da sustentabili-
mia Verde a um alinhamento mais próximo dade, forçar a emergência de um conceito
da tese do Pnuma. Entre elas, destacamos: de Economia Verde – que ainda não tem
definição muito clara e precisa – irá gerar
a. Resistência ao “ambientalismo de mais dúvidas e conflitos do que soluções.
mercado” E que muita energia será gasta com debates
improdutivos, em vez de manter o foco nas
Há organizações e movimentos sociais que se questões já conhecidas, que podem de fato
posicionam contra as propostas de promoção engendrar mudanças. Nessa perspectiva, a
30. 28 O qUE É ECONOMIA VERDE
colocação da Economia Verde no debate sua rápida incorporação aos processos de
seria uma cortina de fumaça para, simul- análise e decisão cotidianamente adotados
taneamente, fugir do enfrentamento dos por consumidores, empresas, governos e
problemas reais e criar novos campos para demais atores sociais.
atuação de pesquisadores e consultores,
abrindo oportunidades de negócio em vez Nessa perspectiva, o desafio central da
de promover avanços reais. Economia Verde seria utilizar o poder da
economia para dar centralidade e força às
c. Economia Verde como ferramenta de propostas de sustentabilidade com justiça
mudança social e ambiental, enquanto, ao mesmo
tempo, evitam-se os riscos e “efeitos co-
Uma perspectiva mais pragmática, também laterais” da apropriação distorcida dessas
presente na sociedade civil, entende as propostas pelo sistema hegemônico. Para
críticas acima como alertas importantes, isso, o caminho seria construir um siste-
mas que não eliminam a importância da ma de instituições e políticas, com eficaz
Economia Verde como proposta que visa controle social, voltado a direcionar a
articular diferentes instrumentos e práticas atividade econômica no rumo desejado.
econômicas capazes de dar centralidade à Nesse sentido, a consistência nas práticas
conexão entre questões sociais e ambientais. e propostas e a firmeza na sua adoção são
A chave para isso seria traduzir em lingua- vistas como mais importantes que a expres-
gem econômica tais assuntos, viabilizando são Economia Verde ou sua conceituação.
31. Para saBEr mais
todas as referências a sites e publicações mencionadas neste capítulo podem ser encontradas também
em: www.radarrio20.org.br.
SACHS, Ignacy. a terceira margem: em busca do ecodesenvolvimento. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
UNEP. towards a Green Economy: pathways to sustainable development and poverty eradication – a
synthesis for policy makers. Nairobi, 2011. Disponível em: http://www.unep.org/greeneconomy/
Portals/88/documents/ger/GER_synthesis_en.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
Na versão em espanhol:
PNUMA. hacia una economía verde: guía para el desarrollo sostenible y la erradicación de la pobreza - síntesis
para los encargados de la formulación de políticas. St-Martin-Bellevue, 2011. Disponível em: http://www.
unep.org/greeneconomy/Portals/88/documents/ger/GER_synthesis_sp.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
Uma versão resumida em português, com menos de três páginas:
PNUMA. rumo a uma economia verde: caminhos para o desenvolvimento sustentável e a erradicação da
pobreza – uma síntese para tomadores de decisão. Brasília, 2011. Disponível em: http://www.pnuma.
org.br/arquivos/EconomiaVerde_ResumodasConclusoes.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
ICC. icc initial comments on the unEP draft Green Economy report. Paris, 06 mai. 2011. Disponível
em: http://www.iccwbo.org/uploadedFiles/ICC-business-initial-comments-GER-May2011-FINAL.pdf.
Acesso em: 27 out. 2011.
ECONOMIA Verde: Desafios e Oportunidades. Política ambiental, Belo Horizonte, n. 8, jun. 2011. Dis-
ponível em: http://www.conservation.org.br/publicacoes/files/politica_ambiental_08_portugues.pdf.
Acesso em: 27 out. 2011.
INTERNATIONAL RESOURCE PANEL. decoupling natural resource use and environmental impacts from
economic growth: summary. Nairobi: UNEP, 2011. Disponível em: http://www.unep.org/resourcepanel/
Portals/24102/PDFs/DecouplingENGSummary.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
D’AVIGNON, A.; CARUSO, L. A. C. O caráter necessariamente sistêmico da transição rumo à economia
verde. Política ambiental, Belo Horizonte, n. 8, p. 24-35, jun. 2011. Disponível em: http://www.
conservation.org.br/publicacoes/files/politica_ambiental_08_portugues.pdf. Acesso em: 27 out. 2011.
JACKSON, Tim. Prosperity without Growth?: the transition to a sustainable economy. Londres: Sustainable
Development Commission, mar. 2009. Disponível em: http://www.sd-commission.org.uk/data/files/
publications/prosperity_without_growth_report.pdf. Acesso em: 29 out. 2011.
KHOR, Martin. risks and uses of the Green Economy concept in the context of sustainable development,
poverty and equity. Genebra: South Centre, jul. 2011. (Research Paper, 40). Disponível em: http://
www.southcentre.org/index.php?option=com_contentview=articleid=1598:risks-and-uses-of-the-green-
economy-concept-in-the-context-of-sustainable-development-poverty-and-equitycatid=69:environment-
a-sustainable-developmentItemid=67lang=en. Acesso em: 27 out. 2011 .
Sobre o tema Economia Verde consulte também: www.greeneconomycoalition.org e www.greeneconomy.org.br
32. 30
Capítulo 3
Governança
D
os dois conjuntos de temas que serão A Rio+20 discutirá propostas para reformar a
discutidos na Rio+20, o de governança governança global relacionadas às questões
é talvez o menos midiático, mas de ambientais e ao Desenvolvimento Sustentável
fundamental importância para os debates. como um todo. Se este é, em geral, percebido
Diz respeito ao quadro institucional global por meio das dimensões social, econômica
para viabilizar a transição rumo ao Desenvol- e ambiental do desenvolvimento que provê
vimento Sustentável. E é essencial para tirar justas condições de vida para as gerações
do papel um emaranhado de convenções, atuais e futuras, então o debate de governan-
protocolos, declarações e compromissos ça na Rio+20 deveria levar a conclusões e
pelo Desenvolvimento Sustentável negocia- medidas que permitam à ONU e aos países
dos nas três últimas décadas. A governança escolher as formas e instrumentos adequados
compreende os seguintes ângulos: para promover e acelerar a transição rumo
a sociedades sustentáveis.
Instrumentos regulatórios (convenções,
tratados, protocolos, decisões de con- Entretanto, os debates sobre o tema da gover-
ferências internacionais e legislações nança no processo preparatório da Rio+20
nacionais); têm ocorrido sob dois enfoques:
Planos regionais e nacionais de execução Governança ambiental: busca por uma
dos acordos; nova configuração institucional no âmbito
da ONU que promova sinergia e eficácia
Órgãos gestores; na implementação dos acordos ambientais
multilaterais, conhecidos em inglês como
Mecanismos de penalização para quem multilateral environmental agreements
descumprir tratados internacionais; (MEAs), e, por meio deles e de melhor
articulação das atividades de órgãos da
Participação e controle social nas fases de ONU e dos países, restaurar e conservar
discussão, deliberação e implementação; a integridade ambiental no planeta.
Fundos públicos e privados para assegurar Governança do Desenvolvimento Sus-
o cumprimento dos acordos; tentável: inserir a perspectiva de De-
senvolvimento Sustentável no coração
Transparência e acesso à informação. decisório das Nações Unidas de modo
que o tema, nas suas três dimensões
33. principais (social, econômica e ambiental) Enquanto a OMC detém instrumentos efetivos
seja tratado de fato como transversal nas para obrigar os países a cumprirem suas regras
estratégias nacionais e internacionais de e decisões, os tratados ambientais seguem
desenvolvimento. impotentes para fazer valer suas diretrizes.
Em decorrência do quadro adverso, a au-
O tema da governança ambiental é objeto toridade do Pnuma está erodindo e fundos
de discussão há pelo menos 20 anos, e, que apoiam a implementação dos acordos
por isso, na fase preparatória da Rio+20 estão sendo desperdiçados.
a tendência é haver maior destaque ou
maior número de propostas relacionadas a Há, entretanto, três indicações recentes
ele, quando comparado aos debates sobre mais favoráveis a uma reforma do sistema
governança do Desenvolvimento Sustentável de governança ambiental, conforme ob-
como um todo. serva a pesquisadora Maria Ivanova, da
Universidade de Massachusetts (EUA) em
O tema DO DeSenvOlvimentO SuS- seu livro Global Governance in the 21st
tentável na Onu — Atualmente, não Century. Em primeiro lugar, há um grupo
apenas o Desenvolvimento Sustentável carece muito maior de analistas experientes nos
de tratamento prioritário na agenda da ONU, países, assim como boas práticas desenvol-
como também o pilar ambiental do tripé da vidas ao longo do tempo. Outra indicação
sustentabilidade segue sendo o mais frágil. é a de que vários governos emergiram
como líderes nas deliberações ambientais
Como não é uma agência especializada, o internacionais e têm injetado espírito mais
Programa das Nações Unidas para o Meio positivo e colaborativo.
Ambiente (Pnuma) não possui autonomia,
verba e poder similares aos desfrutados por Finalmente, os ministros do meio ambiente
organizações tais como as dedicadas aos te- abriram à sociedade civil o processo de
mas de alimentação (FAO), comércio (OMC), discussão sobre a reforma institucional da
educação e cultura (Unesco), saúde (OMS) e governança a partir de uma decisão tomada
trabalho (OIT). Cada um dos acordos multi- na 11ª Sessão do Fórum Ministerial Global
laterais (MEAs) possui seu próprio sistema de do Pnuma, realizada em Bali, na Indonésia,
gestão, sem vínculo hierárquico com o Pnuma. em fevereiro de 2010.
Trata-se de situação preocupante, quando se Foi formado um grupo assessor com a parti-
leva em conta a complexidade e a gravidade cipação de representantes dos nove grupos
dos problemas ambientais contemporâneos principais (major groups) definidos pela
e a profusão de MEAs já aprovados (mais de Agenda 21 (mulheres, crianças e jovens,
500). A gestão da política ambiental global povos indígenas, organizações não governa-
está fragmentada em dezenas de acordos, mentais, autoridades locais, trabalhadores e
secretariados e conferências, com baixo grau sindicatos, negócios e indústria, comunida-
de cooperação, sobreposição ineficiente de des científica e tecnológica e agricultores)
papéis, competição pelos mesmos recursos, para articular os esforços da sociedade
impunidade para países que descumprem as civil global, auxiliados pelas ferramentas
regras e ausência de indicadores de desempenho. de comunicação das redes sociais.
34. 32 GOvERNANçA
RefORma Da GOveRnança autonomia para escolher o diretor-geral,
DO DeSenvOlvimentO fundos próprios e poder para negociar pro-
SuStentável jetos com outras agências e penalizar países
que não cumprissem suas decisões e regras.
Há pelo menos uma dúzia de propostas Seria chamada Organização das Nações
para reformar a governança ambiental e Unidas para o Meio Ambiente (UNEO, na
do Desenvolvimento Sustentável no Siste- sigla em inglês) ou Organização Mundial do
ma ONU. Algumas são complementares e Meio Ambiente (WEO, na sigla em inglês).
outras concorrentes. O debate central gira Precisaria ser instituída por um tratado es-
em torno de dois níveis de governança: pecífico, com grande probabilidade de que
um mais estritamente relacionado à gestão o Pnuma fosse absorvido em sua estrutura.
dos acordos multilaterais e o outro voltado
ao espaço político do Desenvolvimento fORtalecimentO DO pnuma — Para
Sustentável nas Nações Unidas. Seguem as isso, a Assembleia Geral da ONU precisaria
principais propostas de reforma, que podem aprovar resolução adicionando mandatos,
ser encaminhadas durante a Rio+20. tais como o poder de implementar ações no
âmbito nacional. Além do mais, o programa
SineRGia entRe OS meaS — Problemas continuaria limitado em sua autonomia,
ambientais são complexos e demandam porque manteria sua subordinação oficial à
respostas específicas, o que pode justificar a Assembleia Geral, não podendo, por exemplo,
necessidade de um conjunto amplo de con- escolher seu diretor-geral.
venções internacionais. Contudo, o resultado
prático tem sido uma série de sobreposições ecOSOc - DeSenvOlvimentO SuSten-
jurisdicionais, lacunas e inabilidade institu- tável — Com a finalidade de promover
cional e política de responder a problemas maior convergência entre os três pilares
ambientais abrangentes. A combinação, do Desenvolvimento Sustentável (desen-
integração ou fusão de acordos ambientais volvimento econômico, equidade social e
multilaterais poderia torná-los mais eficientes conservação ambiental), o atual Conselho
e efetivos. Uma opção é promover sinergia Econômico e Social da ONU (Ecosoc, sigla
entre convenções de uma mesma área temá- em inglês) seria transformado em Conselho
tica, como já vem ocorrendo no caso das três de Desenvolvimento Sustentável, também se
convenções químicas – Poluentes Orgânicos reportando à Assembleia Geral como ocorre
Persistentes (POPs), Consentimento Prévio hoje. O problema das propostas relativas à
Informado (PIC, Roterdã) e a da Basileia, governança do Desenvolvimento Sustentável
que controla o movimento transfronteiriço é que o Ecosoc e a Comissão sobre o Desen-
de resíduos perigosos. volvimento Sustentável (CDS) são vistos como
órgãos fragilizados, sem poder de fato para
aGência eSpecializaDa paRa meiO influenciar o Sistema ONU. Formado por 54
ambiente — Seria similar à Organização países eleitos pela Assembleia Geral, o Ecosoc
Mundial de Saúde (OMS) e à Organiza- tem como função revitalizar as atividades da
ção Internacional do Trabalho (OIT), com ONU nas esferas econômica, social e áreas
35. ORGanOGRama DO DeSenvOlvimentO SuStentável
nO SiStema Onu
Programa das Nações Unidas
PNUMA* para o Meio Ambiente
ASSEMBLEIA
GERAL
Programa das Nações Unidas para o
PNUD Desenvolvimento
Organização Mundial
OMC do Comércio
ONU
CDS
Organização Internacio-
Comissão sobre o Desenvol- OIT nal do Trabalho
ECOSOC vimento Sustentável
Conselho Econômico BANCO MUNDIAL
e Social da ONU
AGÊNCIAS
ESPECIALIZADAS Organização das Nações
FAO Unidas para Agricultura
e Alimentação
Organização Mundial
OMS da Saúde
(*) O Pnuma abriga os secretariados das convenções sobre diversidade biológica, comércio internacio-
nal de espécies sob perigo, ozônio, espécies migratórias e POPs e as de Basileia e Roterdã (Pnuma e
FAO dividem responsabilidade nessa última convenção). As convenções sobre clima e desertificação
recebem apoio do Secretariado da ONU. Fonte: ONU/Pnuma
relacionadas. Gerencia a implementação (CDS) foi criada logo depois da Rio-92
da Agenda 21, resultante da Rio-92 (Veja para acompanhar e estimular a execução
Documentos da Rio-92 à pág 11) dentro da da Agenda 21 no Sistema ONU e pelos
ONU, sendo responsável por integrar temas países que a assinaram no Rio. Sua missão
ambientais e de desenvolvimento nas políticas oficial é examinar pontos de sinergia entre
e programas das Nações Unidas. A Agenda 21 diferentes organismos para implementar
pode ser definida como um instrumento de políticas de Desenvolvimento Sustentável
planejamento para a construção de sociedades que promovam diálogo entre as agendas
sustentáveis conciliando proteção ambiental ambiental, econômica, social e cultural.
com justiça social e eficiência econômica. Nesta proposta, a comissão ganharia status
de conselho, passando a conectar-se direta-
cOnSelhO De DeSenvOlvimentO mente à Assembleia Geral da ONU. Hoje a
SuStentável — A enfraquecida Comis- CDS é subordinada ao Conselho Econômico
são sobre o Desenvolvimento Sustentável e Social (Ecosoc).