2. Lingua Ferina, cérebro obtuso
Já está provado que nossas palavras têm mesmo muito
poder, e quanto mais íntimo for o relacionamento entre
duas pessoas, maior será esse poder. O vínculo
emocional faz com que seja muito difícil para alguém
desprezar os insultos de um amigo, cônjuge, pai, mãe,
filho, ou patrão (difícil, mas não impossível). A
verdade é que nem todos têm esse poder sobre nós.
Ninguém se ofende, por exemplo, com os latidos
irados de um cachorro, os xingamentos de um bêbado
ou de um louco da esquina, mas se magoa com frases
impensadas ditas por pessoas do circulo mais íntimo.
Essa diferença é evidência de que Deus nos deu
alguma capacidade de escolher, nem sempre
conscientemente se vamos aceitar ou não as ofensas,
insultos ou abusos verbais que nos são dirigidos.
Como ensina um conto oriental, quando você não
aceita um presente, ele continua nas mãos de quem o
oferece.
Se, por um lado, nem sempre podemos escolher aquilo
que vamos ouvir da boca de outros, por outro, temos
uma tremenda responsabilidade diante de Deus em
relação àquilo que sai de nossa própria boca. Cristo
disse que "de toda a palavra frívola que proferirem os
homens, dela darão conta no dia do juízo". E
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3. acrescenta: "Por tuas palavras serás justificado, e pelas
tuas palavras serás condenado" (Mt 12:36, 37). E por
que Deus considera esse assunto com tanta seriedade?
Porque através de nossas palavras podemos transmitir
ideias que serão como que materializadas na mente de
quem as escuta. É um processo físico mesmo.
Os psicólogos hoje, falam também das profecias auto-
realizadoras, que é um processo através do qual você
tem o poder de, pela repetição, como que programar a
reação futura da outra pessoa. Isso pode ser utilizado
tanto para o bem quanto para o mal. Vou dar um
exemplo: um pai pode viver dizendo que o filho é uma
pessoa boa ou responsável, baseado não tanto nas
evidencias atuais, naquilo que ele está observando na
vida do filho, mas na visão que ele tem para com o
futuro do filho, ou seja, baseado naquilo que ele deseja
que o filho seja. E normalmente isso vai se realizar.
Mas se ele fica sempre dizendo que o filho não presta,
que é preguiçoso, etc., as chances de que isso também
aconteça são grandes, porque, como li certa vez, "se
tratarmos as pessoas como são, não podemos ajudá-las
a se tornarem naquilo que poderiam ser". Na verdade,
o princípio da profecia autógena afirma que nós
escolhemos se profetizamos o fracasso ou o sucesso
3
4. das pessoas com quem nos relacionamos. E o incrível
é que quase sempre a gente acerta!
É nesse sentido que nossas palavras também têm o
poder de criar ou destruir, e podemos por meio delas
escolher participar, ou com o Criador no processo de
construir, ajudar animar, melhorar a outros, ou com
Satanás, humilhando, derrubando, piorando,
destruindo e criticando. E, nesse caso, a sinceridade
pode até ser utilizada como desculpa para aplacar a
consciência de quem arrebenta com a vida dos outros
com suas palavras.
Sinceridade não é simplesmente falar tudo o que se
pensa, de qualquer jeito, mas também é pensar tudo o
que se fala. Quem fala tudo o que quer, do jeito que
quiser, vai acabar colhendo da vida o que não quer.
Um velho ditado dizia mesmo que "uma língua ferina
e um cérebro obtuso, normalmente se encontram na
mesma cabeça"!
Outra virtude invocada por esses destruidores da vida
dos outros, além da sinceridade, é a veracidade. Essas
pessoas imaginam estar certas porque pensam que
estão dizendo a verdade a respeito de outra pessoa.
Mas a verdade é apenas uma das peneiras que
deveriam servir de critério para escolhermos o que
dizer ou não a respeito dos outros. O fato de que algo
seja verdade não é suficiente para que deva ser dito.
Para que um juízo ou uma ideia sobre alguém saia de
4
5. nossa boca, além de verdadeira, deveria ser também
bondosa, e necessária. Se uma ideia não for, digamos,
"do bem", ou se não for necessária, jamais deveria
baixar do cérebro para a língua, ainda que fosse
verdadeira.
Tanto a verdade como a sinceridade são virtudes
imperfeitas, quando estão sozinhas. Elas precisam da
bondade, da santidade, da cortesia e do amor para se
tornarem completas.
É por isso que Paulo afirma na carta aos Efésios
(4:29): "Não saia da vossa boca nenhuma palavra
torpe, e sim unicamente a que for boa para edificação,
conforme a necessidade, e assim transmita graça aos
que ouvem."
Que Deus faça hoje de sua boca uma benção para os
que o(a) rodeiam.
Marcos Faiock Bomfim
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