Grupo de engenheiros da Chesf produziu novo documento sobre o uso múltiplo da água do Rio São Francisco e o desenvolvimento do Nordeste.
O documento analisa a questão sob o aspecto dos vários usos da água e salienta a importância do Rio São Francisco para o desenvolvimento regional, principalmente quando considerado o uso da água para a irrigação e a proposta do MME (Minas e Energia) para reordenamento do modelo institucional do Setor Elétrico.
Gestão da água do Rio São Francisco para irrigação e energia
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GESTÃO INTEGRADA DO SÃO FRANCISCO - GISF
O USO MÚLTIPLO DA ÁGUA
DO RIO SÃO FRANCISCO E O
DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
- Pedro Alves de Melo
- Sergio Balaban
- José Altino Bezerra
- Iony Patriota de Siqueira
- Roberto Gomes
01/10/2017
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O USO MÚLTIPLO DA ÁGUA DO RIO SÃO FRANCISCO E
O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
I – CONSIDERAÇÕES GERAIS
1. O Rio São Francisco sendo a principal fonte hídrica do Nordeste, tende a
desempenhar um papel cada vez mais relevante para o desenvolvimento regional,
principalmente quando considerado o uso múltiplo de sua água. Nesse sentido,
apenas para efeito de comparação, em 1999, quando da implantação das atuais
bases institucionais do Setor Elétrico, o consumo da Região Nordeste era cerca
de 5700 MW médios para uma geração hidrelétrica local de 5050 MW médios.
Em 2016, a geração hidrelétrica local foi 2500 MW médios para um consumo de
cerca de 10500 MW médios.
2. Embora no ano de 2016 a geração hidrelétrica das usinas do Rio São Francisco,
tenha representado apenas 25% do consumo da Região Nordeste, este foi
plenamente atendido pelas demais fontes geradoras tais como, termelétricas,
eólicas e solar (ainda incipiente mas, com perspectiva de crescimento
substancial), além do recebimento de energia pelas interligações elétricas com
outras regiões do país. O planejamento setorial, elaborado pelo MME, mostra que
esta diversificação de fontes energéticas será irreversível no país, especialmente,
no Nordeste, o que significa que o São Francisco deverá cada vez mais ser
dedicado a finalidades mais nobres do que produzir energia elétrica.
3. Após o Projeto RESEB, primeira Reforma Estrutural do Setor Elétrico Brasileiro,
liderada pela Eletrobrás, começaram a surgir conflitos entre os agentes geradores
hidrelétricos e os demais usuários da água, uma vez que esses outros usos
passaram a interferir nas relações contratuais entre estes. Esses conflitos foram
tratados no nível infra legal através de resoluções normativas expedidas pelas
Agências Reguladoras, ANA e ANEEL, levando a um aumento da judicialização
da questão conforme observado mais recentemente.
4. No momento, conforme nota técnica colocada em audiência pública pelo MME,
está em curso a discussão de uma proposta de reforma do Setor Elétrico
Brasileiro, o que abre a oportunidade para ser examinado o tema: Uso Múltiplo
da Água do Rio São Francisco, de forma abrangente.
5. A reforma proposta pelo MME, embora trate de forma objetiva as relações
contratuais entre os agentes do mercado no nível legal, deixou para o nível
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infralegal a questão do uso múltiplo da água, de grande relevância para o
desenvolvimento socioeconômico da Região Nordeste, em especial no rio São
Francisco, restando assim, uma fonte de conflitos potenciais que se intensificarão
posteriormente
6. Portanto, fica evidente a oportunidade para uma revisão na legislação do Setor
relativa a geração de energia hidrelétrica, especialmente na bacia do São
Francisco, de forma a buscar um equilíbrio entre os aspectos hídricos e
energéticos, independentemente da situação hidrológica.
7. Essa revisão deve ter como objetivo principal rever, à luz da realidade atual. a
prioridade que historicamente tem sido dada à geração de energia elétrica,
levando o setor hidrelétrico a atuar, praticamente, como único agente do processo
de gestão dos recursos hídricos do País, em flagrante desrespeito à Lei Nº 9.433
de 8 de janeiro de 1997 que definiu a Política Nacional de Recursos Hídricos.
8. Isto se deveu a constatação de que esses outros usos implicavam em custos
adicionais para o Setor Elétrico. Ademais, o Setor de Recursos Hídricos não
avançou suficientemente nos processos para a quantificação clara e precisa dos
benefícios econômicos para a sociedadeassociados a estes outros usos, levando a
uma relação assimétrica entre os dois usos.
9. Por outro lado, os 48 bilhões de m3 de volume útil para fins de regularização de
vazões no rio São Francisco, representam 54.000 MW mês de energia
armazenada, significando 25,0 % de toda a capacidade de armazenamento de
energia do Sistema Interligado Nacional – SIN, sendo decisivos para a
otimização energética deste Sistema considerando as interligações regionais.
10. Além disso, o Setor Elétrico nunca procurou enfrentar esta questão,
principalmente, na bacia do rio São Francisco, procurando sempre tentar
contorna-la no nível operacional, através de restrições operativas definidas pelas
instituições ligadas a gestão de recursos hídricos, que nem sempre são
respeitadas no momento da operação, quando é priorizada a racionalidade da
geração de energia elétrica.
11. Essa lógica tem funcionado de forma satisfatória em situações hidrológicas
normais, quando a água dá para todos. No entanto ela precisa ser revista uma vez
que já se registram sérios conflitos quando ocorrem sequências de vazões
afluentes aos reservatórios, baixas ou excepcionalmente baixas como as
observadas no rio São Francisco nos últimos dois anos. Situação na qual estas
restrições operativas tiveram de ser profundamente violadas, como é o caso atual
no trecho do rio a jusante de Sobradinho.
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12. Os usos múltiplos da água são usualmente classificados em duas categorias
gerais
a - Usos não consuntivos - são aqueles que ao não reduzirem as vazões afluentes
às usinas não têm impacto direto sobre a geração de energia elétrica. Estes usos
apenas deslocam a geração ao longo do tempo sem, no entanto, reduzirem o
montante gerado, atendendo a restrições operativas impostas as usinas. Porém,
pode acontecer que este deslocamento, em algumas situações, não seja
comercialmente interessante para a Empresa Geradora. Dentre estes cabe
destaque a vazão mínima para navegação, a vazão mínima para fins ecológicos e
os volumes de espera para controle de cheias. Estes volumes de espera não são
interessantes, em termos comerciais, quando reduzem as chances de
reenchimento dos reservatórios ou são obtidos através de vertimentos não
turbinados.
b – Usos consuntivos - são aqueles que ao reduzirem as vazões afluentes às
usinas provocam uma redução direta na geração de energia elétrica. Dentre estes
usos cabe destacar a irrigação. Julga-se que, uma vez esgotados os maiores
potenciais hidrelétricos na Bacia do São Francisco, como já é o caso, a vocação
econômica da bacia para a agricultura irrigada poderá se impor a geração de
energia elétrica uma vez que terras aptas não lhe faltarão. Este será no futuro,
também, o caso da agricultura irrigada nas bacias receptoras da água da
transposição. No caso da Bacia do Rio São Francisco os investimentos na
agricultura irrigada possibilitaram a criação de polos importantes. Para o futuro,
desde que garantido o abastecimento da água, esta atividade crescerá
substancialmente uma vez que já foram identificados, segundo a CODEVASF,
1.300.000 hectares potencialmente irrigáveis.
Por sua vez, o Projeto de Integração do São Francisco – PISF viabilizará a
implantação de áreas irrigadas com culturas perenes nos estados de Pernambuco,
Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Segundo estudos do Ministério da
Integração Nacional existem cerca de 265.000 hectares potencialmente irrigáveis
já identificados nessa área.
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II - PROPOSTA
1. Por isto tudo, antes de qualquer iniciativa de alterar o atual modelo do Setor
Elétrico, no que tange as usinas do Rio São Francisco, conforme previsto na Nota
Técnica do MME, deve ser garantido que o USO DA ÁGUA para irrigação na
própria Bacia do Rio São Francisco e nas bacias receptoras da água da
transposição, seja regulamentado por lei específica.
2. A lei deve incorporar no texto legal, o seguinte:
Artigo nº x – Afim de resguardar o interesse público no uso da água do
Rio São Francisco, a Garantia Física das usinas que serão objeto de
descotização deverão ser revistas considerando a redução decorrente dos
desvios de água para irrigação na bacia do São Francisco e dos desvios
de água para atendimento aos usos previstos pelo Projeto de Integração
do São Francisco-PISF, conforme projeto do Ministério da Integração
Nacional.
Parágrafo 1º. -Nas revisões ordinárias destas Garantias Físicas conforme
o Decreto nº 2.655 de julho de 1998, serão considerados:
I - Para a Bacia do Rio São Francisco, os cenários de irrigação previstos
nos Planos Decenais de Recursos Hídricos da Bacia, aprovados pela
Agência Nacional de Águas – ANA;
II - Para as bacias receptoras da água na área de influência do PISF, os
cenários previstos pelo Comitê Gestor, aprovados pela ANA.