Propõe-se primeiramente uma abordagem ética da comunicação, explorando o seu significado e razão de ser. Por outro lado, atende-se às especificidades do Marketing Social e o recurso à comunicação pelas organizações como ferramenta para chegar aos diferentes públicos e subordinada a um propósito de mudança comportamental em vista do bem individual e colectivo. Apresentam-se alguns princípios éticos da comunicação na sua relação com problemas e questões emergentes da prática do Marketing Social.
4. ÉTICA (1)
“… relativa às normas, valores e crenças
enraizados nos processos sociais e que definem o
correcto (√) e o incorrecto (×) para um indivíduo
ou uma comunidade.”
(Crane & Matten, 2010)
• Ética = Moral
4
6. ÉTICA (2)
“… esse saber viver, ou arte de viver.”
(Savater, 1991)
“… a arte do difícil compromisso.”
(Plaisance, 2009)
• Ética = Modo ou forma de vida do indivíduo
6
7. ÉTICA (3)
“… relativa ao estudo da moral e à aplicação da
razão para elucidar as regras e princípios
específicos que determinam o correcto e o
incorrecto numa dada situação. Estas regras e
princípios são designados teorias éticas.”
(Crane & Matten, 2010)
• Ética = Disciplina filosófica
7
11. EMERGÊNCIA DA ÉTICA (2,3)
“A Ética tem origem na vida quotidiana.”
(Popkin & Stroll, 1956)
11
12. … i.e. nos dilemas morais que decorrem das
situações particulares da vida dos indivíduos,
das organizações e sociedades e desafiam a
consciência, pessoal e colectiva, reclamando a
necessidade de uma tomada de decisão.
12
13. Há ética para além do código e da lei
“As inscrições constantes nos
sinais [de trânsito] são escritas em
português, salvo o que resulte das
convenções
internacionais.”
(Código da Estrada, Art.º 6º, 2)
“A sede da pessoa colectiva é a que
os respectivos estatutos fixarem
ou, na falta de designação
estatutária, o lugar em que
funciona
normalmente
a
administração principal.” (Código
Civil Português, Art.º 159 º, 1)
“A lealdade à empresa deve
prevalecer sobre a lealdade
a si próprio.”
“A prática da caridade só se
justifica
moralmente
quando
os
benefícios
revertem em exclusivo a
favor do(s) visado(s).”
“A abnegação dos bens
materiais é o caminho da
felicidade.”
“Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de
qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções
políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.”
(Constituição da República Portuguesa, Art.º 13º, 2)
“Todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem” (Código Civil
Português, Art.º 80º, 1)
“A vida humana é inviolável.” (Constituição da República Portuguesa, Art.º 24º, 1)
13
14. Entre
O Bem
O Mal
há áreas cinzentas, i.e. para as quais não há
resposta universal e definitiva
14
17. Neste sentido, a Ética
envolve, mais do que a
proposta de enunciados
morais, a deliberação e
justificação da razão
porque, numa dada
situação, devemos
preferir um valor
relativamente a outro.
17
19. ÉTICA DA COMUNICAÇÃO
O Que Significa?
Discussão ou reflexão sobre os princípios e
valores, a conduta correcta e incorrecta
aplicada aos contextos da comunicação
interpessoal e organizacional, por um lado, e do
exercício das actividades profissionais ligadas
aos meios de comunicação, por outro.
19
20. ÉTICA DA COMUNICAÇÃO
O Que Significa?
“…a essência do pensamento responsável, da
tomada de decisão e desenvolvimento das relações e
comunidades no âmbito dos vários contextos,
culturas, canais e meios de comunicação.”
(National Communication Association)
https://www.natcom.org/
20
21. ÉTICA DA COMUNICAÇÃO
Porquê?
A comunicação – o uso de recursos disponíveis
para transmitir informação, mobilizar, inspirar,
persuadir, esclarecer, conectar – é uma realização
inerentemente ética.
(Makau, 2009)
21
22. Envolve escolha e responsabilidade
Todo o acto comunicacional ocorre num
contexto relativamente ao qual existem opções
disponíveis, algumas delas com significado e
implicações éticos.
• Sobre com quem comunicar (alvo)
• Sobre como comunicar (meios)
• Sobre o que se pretende alcançar (fim)
22
23. Reflecte princípios e valores
Todo o acto comunicacional é permeado pelos
valores do indivíduo, que sancionam ou não os
valores e princípios éticos profissional e/ou
socialmente estabelecidos
• Veracidade?
• Confiança?
• Respeito?
• Transparência?
• …
23
25. Gera efeitos (consequências)
Todo o acto comunicacional gera efeitos no seu
interlocutor/público (receptor), pelo que o seu
significado ético terá de ser observado para além
dos fins ou motivos da comunicação (emissor).
• Danos e benefícios são equacionados tendo como quadro de
referência:
• Valores socialmente apreciados
• Valores individuais
• Valores profissionais
• Consequências expectáveis /desejáveis da comunicação
25
26. "Pensem que as palavras a que não se
segue nenhuma consequência são ditas
para nada.“
(Demóstenes)
"A acção põe o ardor no trabalho,
mas é a palavra que a suscita.“
(de Gaulle)
26
28. ÉTICA E COMUNICAÇÃO NO MARKETING
SOCIAL (MS)
Marketing Social
Comunicação no Marketing Social
Ética - Porquê?
Valores
Exemplos
28
29. MS: O Que Significa?
“… é o processo que aplica os princípios e técnicas
de marketing para criar, comunicar e entregar
valor de modo a influenciar os comportamentos do
público-alvo que beneficiam a sociedade (saúde
pública, segurança, ambiente e comunidades) e o
próprio público-alvo.”
(Kotler, Lee, Rothschild, 2006)
29
30. MS: O Que Significa?
“… é a adaptação das técnicas do marketing
comercial a programas concebidos para
influenciar o comportamento voluntário dos
públicos-alvo a fim de melhorar o seu bem-estar
e o da sociedade de que fazem parte.”
(Andreasen, 1994)
30
31. MS: O Que Significa?
• O objectivo principal do MS é o bem público ou social
(Andreasen, 1994; Mahesh, 2007) e, neste sentido, visa alcançar
a
manifestação
comportamental
voluntária
necessária
(mudança ou manutenção) para o atingir;
• É levado a cabo por entidades governamentais, organizações
públicas ou privadas sem fins lucrativos, na medida em que
estão implicadas em problemas e questões de interesse público
e que carecem da atenção e envolvimento da sociedade (saúde,
comportamento ecológico, violência doméstica…);
31
35. MS: Especificidades
• Problemas/assuntos do domínio público ou que vêm
a ganha visibilidade pela sua relevância social
• Problemas/assuntos
normalmente
sensíveis
do
ponto de vista moral ou emocional
• Dirigido a uma procura inexistente (indiferente) ou
negativa (adversa)
• Os
benefícios
proclamados
muitas
vezes
são
invisíveis, não garantidos ou tardam a ser notados
35
36. Produto social “doação de sangue” com
procura inexistente se o público é
indiferente à sua prática
Produto social “não consumir drogas” com
procura negativa se o público é adverso à
sua prática (toxicodependentes)
36
37. COMUNICAÇÃO NO MS: Sentido Restrito
À semelhança do que sucede com o Marketing
comercial, para o MS, a comunicação é uma das
variáveis do marketing-mix e, por conseguinte, o
conjunto dos instrumentos que se usam para
influenciar o comportamento do público-alvo.
37
38. COMUNICAÇÃO NO MS: Sentido Restrito
Neste sentido, a comunicação no MS é desenvolvida
em articulação com
O Produto
O Preço
A Distribuição
38
39. PRINCIPAIS OBJECTIVOS DA
COMUNICAÇÃO NO MS
Gerar consciência, mudar valores
e crenças
Persuadir e motivar
Educar
Facilitar a acção
Reforçar a mudança /manutenção
e relembrar
39
40. COMUNICAÇÃO NO MS: Sentido Amplo
Em sentido mais amplo, porém, comunicação no MS
refere a transmissão de uma proposta de bem social.
E sob esta perspectiva, ela torna-se uma matéria
de ética por excelência
40
41. ÉTICA PORQUÊ?
1. Quem decide o que é o bem social?
2. Quais os limites da comunicação e quem os decide?
3. Que valores devem governar a sua comunicação?
41
43. Poderão a natureza instrumental do MS e a sua
consequente neutralidade ética deixá-lo à mercê de “bens
sociais” concorrentes, alguns deles “não tão bons assim”?
43
44. Que visão de bem social deve prevalecer e
qual o papel do profissional de MS na
construção desse bem social?
Apenas o de um técnico executante ou o de
um profissional eticamente orientado?
44
45. 2. Quais os Limites da Comunicação e Quem os
Decide?
Existem? Devem existir? Quem os estabelece?
Que dimensões da natureza humana devem ser
exploradas (cognitiva, emocional) e como?
Que ideias e emoções se aceitam como comunicáveis,
seja através da escrita ou da imagem?
45
50. Aspectos Discutidos na Literatura
• Assentar a prática numa definição consensual de MS que
estabeleça os limites da sua aplicação (Andreasen, 1994);
• Aprimorar a ética pessoal no sentido de se discernirem as
organizações e indivíduos que solicitam os serviços e
competências do profissional (Andreasen, 1994);
• Assegurar que o comportamento visado no MS pode
ser medido nos seus benefícios para a sociedade (Spotswood et
al., 2012);
• Atender ao nível de consenso social acerca matérias vistas
como bem para a sociedade (Andreasen, 1994; Spotswood et al., 2012);
50
51. 3. Que Valores Devem Governar a Comunicação?
Código de Ética dos Profissionais de Marketing
“Os profissionais do Marketing devem reconhecer
que não servem apenas a sua empresa mas também
a sociedade na criação, facilitação e execução de
transacções eficientes e eficazes que fazem parte do
ambiente económico mais abrangente.”
(AMA)
www.ama.org
https://archive.ama.org/Archive/AboutAMA/Pages/Statement%20of%20Ethics.aspx
51
53. •
Conceito identificado com ‘ofender o outro’ ou ‘violar
os seus direitos’, implica uma previsão relativa aos
efeitos de uma decisão que possam prejudicar a
integridade pessoal
•
Com base neste valor, um programa de MS deve evitar
acções ou omissões que se presumam danosas para
stakeholders/sociedade,
apelar
a
padrões
de
comportamento ético e exibir respeito pela legalidade
53
54. VALORES
VERACIDADE → HONESTIDADE → CONFIANÇA
Representa a obrigação de se comunicar a percepção da
verdade, com base em informação disponível, credível e
verificável.
(Adaptado de Makau, 2009)
54
55. • Com base neste valor, um programa de MS deve
contribuir para o esclarecimento e elevação do
nível de informação e conhecimento da sociedade,
repudiando a mentira, o engano deliberado.
•
Factos, estatísticas e respectivas fontes
•
Visão abrangente e multidisciplinar
•
Consequências ou custos da mudança comportamental
• O agir ético deve assumir o ser humano como
capaz
de
discernimento
e
desenvolvimento
cognitivos, assim como favorável à noção de
verdade
55
56. "É de bom cidadão preferir as palavras
que salvam às palavras que agradam.“
(Demóstenes)
“Há 3 espécies de mentiras: mentiras,
malditas mentiras e estatísticas.”
(Benjamin Disraeli)
56
57. VALORES
TRANSPARÊNCIA
“… conduta que presume uma abertura (openness) na
comunicação e responde à expectativa razoável de
uma troca franca (forthright exchange) quando as
partes têm um interesse legítimo (legitimate stake) nas
consequências que se seguem ao envio ou recepção
de uma mensagem.”
(Plaisance, 2009)
57
58. •
… é deixar claras as nossas motivações, aspirações e
intenções aos outros, para que assim possam, como seres
racionais que são, avaliar as nossas acções e propostas;
•
O agir ético deve assumir o ser humano não como um
meio, mas como um fim em si mesmo. Ao (so)negarmos
informação relevante negamos, a fortiori, a capacidade
racional do Outro, portanto, a sua liberdade de
julgamento;
•
Com base neste valor, um programa de MS deve
comunicar claramente os custos e riscos envolvidos na
mudança comportamental pretendida
58
59. VALORES
RESPEITO
“… reconhecer a dignidade humana básica de todos os
stakeholders”
(AMA)
“… é uma relação de resposta [face ao Outro] e o discurso
vulgar sobre o respeito identifica alguns elementos-chave
da resposta, incluindo atenção, deferência, juízo,
reconhecimento, valorização e comportamento.”
(Standford Encyclopedia of Philosophy, http://plato.stanford.edu/entries/respect)
59
60. • O dever fundamental de humanidade obriga ao
reconhecimento da individualidade, da vontade
livre e da racionalidade dos outros;
• Com base neste valor, um programa de MS deve
atender ao relativismo cultural, às sensibilidades
do diferentes stakeholders, evitando a comunicação
assente no estereótipo e preconceito; como base de
legitimação do respeito é aconselhável a adopção
da Regra Dourada
60
61. VALORES
RESPONSABILIDADE
Relacionada com a noção de liberdade de escolha e
efeitos decorrentes dessa escolha. Nas situações
concretas, a escolha determina-se na primazia que se
dá a um valor/princípio ético relativamente a outro
e que os resultados da acção não são moralmente
indiferentes, sobretudo no que se refere ao impacto
que geram nos alvos da comunicação.
61
62. •
Com base neste valor, um programa de MS deve
atender às necessidades e vulnerabilidades dos
públicos-alvo, repudiando o uso da coerção;
•
Mais geralmente, está em causa a capacidade de
cumprimento das obrigações sociais para com os
stakeholders, incluindo o meio ambiente
•
No
que
respeita
ao
profissional
de
MS,
a
responsabilidade é tanto maior quanto mais se
reconhece o poder instrumental do marketing na
realização de objectivos
62
63. VALORES
JUSTIÇA → EQUIDADE
“… engloba um conjunto de ideias e teorias,
incluindo as pretensões de que temos certos direitos,
que estes direitos legais se baseiam numa concepção
e obrigações morais, que de alguma forma a noção de
justiça se relaciona com ideias acerca da equidade,
igualdade, imparcialidade e bem social.”
(Plaisance, 2009)
63
64. • Com base neste valor, um programa de MS deve
acolher uma visão de equilíbrio entre os interesses de
todos os stakeholders;
• Numa
lógica
de
democracia
representativa
e
partilhada, o MS deve dispor-se a aceitar o sacrifício
do indivíduo ou do seu grupo-alvo em nome do
que a sociedade democraticamente determina ser o
bem social… ou vice-versa!!!
64
65. VALORES
COMUNIDADE/DEMOCRACIA → CIDADANIA
“… refere-se à rede de indivíduos em relações sociais
uns com os outros que nos ajuda a definir quem
somos, ao mesmo tempo que constitui a base de
acção e expressão de valores e objectivos
partilhados.”
(Plaisance, 2009)
65
66. • Com base neste valor, um programa de MS carece
de fundamentação na legitimidade política/cívica
para
representar
os
valores
da
maioria
da
comunidade, ou seja, aqueles que essa maioria
considera ser o bem social (perspectiva de inclusão).
• Neste
sentido,
parece
existir
uma
relação
indissociável entre o bem social, democracia e
responsabilidade
social,
residindo
o
valor
instrumental do MS na consolidação desta relação.
66
67. “Só pode existir uma comunidade global com uma
comunicação global, o que significa algo mais do
que vastas instalações eléctricas espalhadas pelo
mundo. Significa um entendimento comun, uma
tradição comum, ideias comuns e ideais comuns.”
(Robert Maynard Hutchins)
67
75. Agência publicitária produz video para a THINK!, uma campanha governamental para a
segurança rodoviária dirigida pelo Ministério dos Transportes britânico
http://www.youtube.com/watch?v=lTHeDcvaPfg
http://www.dailymail.co.uk/news/article-2338000/Shocking-anti-drink-drivingcampaign-scares-pub-goers-simulating-car-crash-complete-fake-blood-toiletmirror.html
video
75
77. CÓDIGO DE ÉTICA DOS PROFISSIONAIS DE
MARKETING
“Os profissionais do Marketing devem reconhecer
que não servem apenas a sua empresa mas
também a sociedade na criação, facilitação e
execução de transacções eficientes e eficazes que
fazem parte do ambiente económico mais
abrangente.”
www.ama.org
(AMA)
https://archive.ama.org/Archive/AboutAMA/Pages/Statement%20of%20Ethics.aspx
77
78. Referências
Andreasen, A. R. (1994) Social Marketing: Its Definition and Domain. Journal of Public Policy &
Marketing, 13(1), 108-114
Durif, F., Graf, R., Chaput, M.-A., Ducharme, R., Elbakkali, A. (2009) Do Ethics Have a Place in
Marketing? Na Overview of the Last 20 Years. Innovative Marketing, 5(1), 6-15
Ferreira, R. A. (2007) Ética e Deontologia no Fenómeno da Comunicação. Comunicação e
Sociedade, 11, 31-35
Mahesh, P. (2007) Social Marketing: A Communication Tool For Development. International
Marketing Conference on Marketing & Society, 8-10, IIMK
Makau, J. M. (2009) Ethical and Unethical Communication. 21st Century Communication: A
Reference Handbook, Thousand Oaks, Sage, 433-444
Plaisance, P. L. (2009) Media Ethics, Key Principles for Responsible Practice, Sage, London
Savater, F. (1991) Ética Para um Jovem, D. Quixote, Alfragide
Spotswood, F., French, J., Tapp, A., Stead, M. (2012) Some Reasonable but Unconfortable
Questions About Social Marketing. Journal of Social Marketing, 2(3), 163-175
78