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         América Latina
          Populismo na América Latina




                              Trabalho de conclusão do curso
                              América Latina, sob orientação do
                              professor Igor Fuser




           Plínio Fábio Teodoro da Silva
      Curso: Política e Relações Internacionais
                    R.A. 0014468
Populismo na América Latina



        Assim como um fantasma, o “libertador” Símon Bolívar importou diretamente das
matrizes européias a indignação que faria dele uma das fontes de inspiração do "fantasma" que
assolou - e ainda assola - a América Latina, usando uma definição cunhada pelo cientista
político de Oxford, Ionescu Ghita, e o antropólogo social judeu-checo nascido na França,
Ernest Gellner, citado por Ricardo Sáenz Tejada no ensaio “Populismo y la crítica a la
democracia”.

       Ao redigir, em 1812, o “Manifesto de Cartagena”, Bolívar – que tornou-se a grande fonte
de inspiração do chamado neopopulismo latino-americano – inflamava o povo de Nova
Granada (região da atual Venezuela) afirmando que “não nos resta, portanto, outro recurso
para nos precavermos destas calamidades a não ser o de pacificar rapidamente as nossas
províncias sublevadas, para depois erguer as nossas armas contra os inimigos e formar, deste
modo, soldados e oficiais dignos de serem chamados as colunas da pátria”.

        Esse culto ao “excesso de soberania popular”, definido pelo filósofo húngaro Georg
Lukács, marcaria, ao menos, duas de três gerações populistas na América Latina descritas por
Sáenz Tejada. Embora ressaltando o sentido vago do conceito – que se atribui a outros, na
tentativa de desqualificar movimentos que questionam o status quo -, o pesquisador social
divide o populismo na região em três gerações ou períodos.

       O primeiro, denominado populismo clássico, vai desde a crise de 29 até a década de 50
e acontece no centro do processo de modernização dos países do cone sul e do caribe. Esse
“nacionalismo modernizador”, definido pelo antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro (ministro da
Educação e Cultura durante o governo “populista” de João Goulart) seria uma “alternativa de
ruptura com a constrição imperialista e oligárquica e com a estrutura de poder que garante sua
perpetuação”1.

       O principal nome da geração foi o presidente argentino Juan Domingo Perón, que
recebera, em 1946, uma Argentina caótica deixada pela infundada Revolução de 1943. Após
ser submetido ao exílio, Perón retratou o cenário político e econômico da Argentina, que se
estendera à maioria dos países da América Latina.

                     “submetidos às metrópoles, pouco interessava aos argentinos sua própria
                     economia, que se manobrava, totalmente, na City (New York) e em Wall Street.
                     O povo argentino era explorado, em maior ou menor grau, segundo as
                     necessidades e os caprichos do imperialismo em ação. Era costume também
                     que, da City se indicasse quem devia ser o Presidente. Eles diziam quem devia




1
 Ribeiro, Darcy. As Américas e a Civilização – Formação histórica e causas do desenvolvimento desigual dos povos americanos. 4 edição, 1983.
Editora Vozes, Petrópolis.
ser o Presidente e imediatamente os ‘nativos’ se encarregavam de preparar a
                        fraude eleitoral para que fosse ‘eleito’”2.

        Perón renunciou ao cargo no dia 18 de setembro de 1955, quando um levante armado
pela Marinha com o apoio de forças de interesses internacionais (entenda-se conglomerados
industriais e financeiros anglo-americanos) ameaçou bombardear a capital, Buenos Aires. Em
uma carta ao então Ministro do Exército, Franklin Lucero, o presidente argentino grafou, antes
de deixar o cargo: “embora meu espírito de lutador me impulsione à peleja, meu patriotismo,
minha honradez de cidadão, me inclinam à renúncia pessoal, em holocausto à Pátria e ao
Povo”3.

Populismo errático

       A segunda geração de governos populistas na América Latina não se limita a uma data
específica, mas compreende-se, especialmente, entre os anos 70 (após a crise do Petróleo) e
90. Esta geração é tida por Sáens Tejada como um “populismo errático” que, em muitos casos,
tinham como pressupostos a implantação das políticas liberalizantes, que tomaram forma oficial
no Consenso de Washington, em 1989.

        No período, é facilmente detectado um dos principais entraves para o estudo do
fenômeno: a ausência de um aspecto ideológico que norteie as ações dos governantes. Nesta
geração, transitam de políticos de direita nascidos nos berços das elites locais e moldados na
academia estadunidense, como o peruano Alberto Fujimori, a esquerdistas convertidos ao
neoliberalismo, como o brasileiro Fernando Henrique Cardoso, que chegou a cair nas graças
do povo durante a implantação do Plano Real, mas viu sua popularidade despencar,
principalmente durante o seu segundo mandato.

       Para Ernesto Laclau, ideologias das mais diversas índoles – do comunismo ao fascismo
– podem adotar vieses populistas. No entanto, ele assegura que, em todos os casos, estará
presente a ruptura com o estado encontrado que pode ser mais ou menos profunda, seguindo
conjunturas específicas.

                        “El corolario es que, desde mi punto de vista, la categoría de populismo no
                        implica necesariamente una evaluación peyorativa, lo que no significa, desde
                        luego, que todo populismo sea, por definición, bueno.”4




2
    Perón, Juan Domingo. A força é o direito das bestas”. 1956. Editora Brasil, Rio de Janeiro.

3
    Idem 2.

4
  Laclau, Ernesto. “La deriva populista y la centroizquierda latinoamericana”, Nueva Sociedad, septiembre-octobre 2006. Buenos Aires:
Fundación Friedrich Ebert.
‘Neo-bolivarianismo’

       A nova geração de governantes populistas, segundo Sáenz Tejada, surgiu no final do
século XX, com a derrocada das ações de governos liberalizantes na América Latina. O novo
foco populista teria sido impulsionado pelo fortalecimento de movimentos políticos sociais que
desafiam no discurso e na prática o status quo.

      Estes governos – que tem seu expoente máximo na Venezuela, de Hugo Chávez -
adotam a retórica revolucionária de Simón Bolívar alinhada aos anseios socialistas e são
apresentados pelos grandes grupos midiáticos como o retorno da esquerda à América Latina.

        A nova “ameaça populista” – que já não mais “come criancinhas” ou vive à mercê do
temor do fim do petróleo, como outrora – é constantemente achacada pelos grupos elitistas
como responsável pelo subdesenvolvimento e pelos problemas sociais da região. Estes grupos
– alinhados com os interesses dos grandes grupos transnacionais e com os governos dos
países centrais – também tentam destituir pela força os governos neo-populistas, como a
tentativa de golpe do governo chavista, ocorrida em abril de 2002.

       A mais recente tentativa de golpe para destituir governos eleitos democraticamente -
apoiados por movimentos que contestam o status quo – ocorreu em Honduras e, ainda, se
encontra em curso, mesmo sendo rechaçada pela comunidade internacional.

        Após aproximação com governos “populistas” da Venezuela, Equador e Bolívia, o
presidente hondurenho eleito, Manuel Zelaya, foi deposto por uma junta militar, apoiada pelo
judiciário e pelas elites locais.

       Mais de duzentos anos depois, as palavras escritas por Simón Bolívar em seu
Manifesto de Cartagena ainda define muito bem os caminhos traçados pelos governos dos
países da América Latina e as “interferências” em suas administrações.

        Grafara o “libertador” latino: “é preciso que o Governo se identifique, por assim dizer,
com o caráter das circunstâncias dos tempos e dos homens que o rodearam. Se estes são
prósperos e serenos, ele deve ser doce e protetor; mas se são calamitosos e turbulentos, ele
deve mostrar-se terrível e armar-se de uma firmeza igual aos perigos, sem atender a leis nem
constituições, enquanto a felicidade e a paz não se restabeleçam”.

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Populismo na américa latina plínio teodoro

  • 1. Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo América Latina Populismo na América Latina Trabalho de conclusão do curso América Latina, sob orientação do professor Igor Fuser Plínio Fábio Teodoro da Silva Curso: Política e Relações Internacionais R.A. 0014468
  • 2. Populismo na América Latina Assim como um fantasma, o “libertador” Símon Bolívar importou diretamente das matrizes européias a indignação que faria dele uma das fontes de inspiração do "fantasma" que assolou - e ainda assola - a América Latina, usando uma definição cunhada pelo cientista político de Oxford, Ionescu Ghita, e o antropólogo social judeu-checo nascido na França, Ernest Gellner, citado por Ricardo Sáenz Tejada no ensaio “Populismo y la crítica a la democracia”. Ao redigir, em 1812, o “Manifesto de Cartagena”, Bolívar – que tornou-se a grande fonte de inspiração do chamado neopopulismo latino-americano – inflamava o povo de Nova Granada (região da atual Venezuela) afirmando que “não nos resta, portanto, outro recurso para nos precavermos destas calamidades a não ser o de pacificar rapidamente as nossas províncias sublevadas, para depois erguer as nossas armas contra os inimigos e formar, deste modo, soldados e oficiais dignos de serem chamados as colunas da pátria”. Esse culto ao “excesso de soberania popular”, definido pelo filósofo húngaro Georg Lukács, marcaria, ao menos, duas de três gerações populistas na América Latina descritas por Sáenz Tejada. Embora ressaltando o sentido vago do conceito – que se atribui a outros, na tentativa de desqualificar movimentos que questionam o status quo -, o pesquisador social divide o populismo na região em três gerações ou períodos. O primeiro, denominado populismo clássico, vai desde a crise de 29 até a década de 50 e acontece no centro do processo de modernização dos países do cone sul e do caribe. Esse “nacionalismo modernizador”, definido pelo antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro (ministro da Educação e Cultura durante o governo “populista” de João Goulart) seria uma “alternativa de ruptura com a constrição imperialista e oligárquica e com a estrutura de poder que garante sua perpetuação”1. O principal nome da geração foi o presidente argentino Juan Domingo Perón, que recebera, em 1946, uma Argentina caótica deixada pela infundada Revolução de 1943. Após ser submetido ao exílio, Perón retratou o cenário político e econômico da Argentina, que se estendera à maioria dos países da América Latina. “submetidos às metrópoles, pouco interessava aos argentinos sua própria economia, que se manobrava, totalmente, na City (New York) e em Wall Street. O povo argentino era explorado, em maior ou menor grau, segundo as necessidades e os caprichos do imperialismo em ação. Era costume também que, da City se indicasse quem devia ser o Presidente. Eles diziam quem devia 1 Ribeiro, Darcy. As Américas e a Civilização – Formação histórica e causas do desenvolvimento desigual dos povos americanos. 4 edição, 1983. Editora Vozes, Petrópolis.
  • 3. ser o Presidente e imediatamente os ‘nativos’ se encarregavam de preparar a fraude eleitoral para que fosse ‘eleito’”2. Perón renunciou ao cargo no dia 18 de setembro de 1955, quando um levante armado pela Marinha com o apoio de forças de interesses internacionais (entenda-se conglomerados industriais e financeiros anglo-americanos) ameaçou bombardear a capital, Buenos Aires. Em uma carta ao então Ministro do Exército, Franklin Lucero, o presidente argentino grafou, antes de deixar o cargo: “embora meu espírito de lutador me impulsione à peleja, meu patriotismo, minha honradez de cidadão, me inclinam à renúncia pessoal, em holocausto à Pátria e ao Povo”3. Populismo errático A segunda geração de governos populistas na América Latina não se limita a uma data específica, mas compreende-se, especialmente, entre os anos 70 (após a crise do Petróleo) e 90. Esta geração é tida por Sáens Tejada como um “populismo errático” que, em muitos casos, tinham como pressupostos a implantação das políticas liberalizantes, que tomaram forma oficial no Consenso de Washington, em 1989. No período, é facilmente detectado um dos principais entraves para o estudo do fenômeno: a ausência de um aspecto ideológico que norteie as ações dos governantes. Nesta geração, transitam de políticos de direita nascidos nos berços das elites locais e moldados na academia estadunidense, como o peruano Alberto Fujimori, a esquerdistas convertidos ao neoliberalismo, como o brasileiro Fernando Henrique Cardoso, que chegou a cair nas graças do povo durante a implantação do Plano Real, mas viu sua popularidade despencar, principalmente durante o seu segundo mandato. Para Ernesto Laclau, ideologias das mais diversas índoles – do comunismo ao fascismo – podem adotar vieses populistas. No entanto, ele assegura que, em todos os casos, estará presente a ruptura com o estado encontrado que pode ser mais ou menos profunda, seguindo conjunturas específicas. “El corolario es que, desde mi punto de vista, la categoría de populismo no implica necesariamente una evaluación peyorativa, lo que no significa, desde luego, que todo populismo sea, por definición, bueno.”4 2 Perón, Juan Domingo. A força é o direito das bestas”. 1956. Editora Brasil, Rio de Janeiro. 3 Idem 2. 4 Laclau, Ernesto. “La deriva populista y la centroizquierda latinoamericana”, Nueva Sociedad, septiembre-octobre 2006. Buenos Aires: Fundación Friedrich Ebert.
  • 4. ‘Neo-bolivarianismo’ A nova geração de governantes populistas, segundo Sáenz Tejada, surgiu no final do século XX, com a derrocada das ações de governos liberalizantes na América Latina. O novo foco populista teria sido impulsionado pelo fortalecimento de movimentos políticos sociais que desafiam no discurso e na prática o status quo. Estes governos – que tem seu expoente máximo na Venezuela, de Hugo Chávez - adotam a retórica revolucionária de Simón Bolívar alinhada aos anseios socialistas e são apresentados pelos grandes grupos midiáticos como o retorno da esquerda à América Latina. A nova “ameaça populista” – que já não mais “come criancinhas” ou vive à mercê do temor do fim do petróleo, como outrora – é constantemente achacada pelos grupos elitistas como responsável pelo subdesenvolvimento e pelos problemas sociais da região. Estes grupos – alinhados com os interesses dos grandes grupos transnacionais e com os governos dos países centrais – também tentam destituir pela força os governos neo-populistas, como a tentativa de golpe do governo chavista, ocorrida em abril de 2002. A mais recente tentativa de golpe para destituir governos eleitos democraticamente - apoiados por movimentos que contestam o status quo – ocorreu em Honduras e, ainda, se encontra em curso, mesmo sendo rechaçada pela comunidade internacional. Após aproximação com governos “populistas” da Venezuela, Equador e Bolívia, o presidente hondurenho eleito, Manuel Zelaya, foi deposto por uma junta militar, apoiada pelo judiciário e pelas elites locais. Mais de duzentos anos depois, as palavras escritas por Simón Bolívar em seu Manifesto de Cartagena ainda define muito bem os caminhos traçados pelos governos dos países da América Latina e as “interferências” em suas administrações. Grafara o “libertador” latino: “é preciso que o Governo se identifique, por assim dizer, com o caráter das circunstâncias dos tempos e dos homens que o rodearam. Se estes são prósperos e serenos, ele deve ser doce e protetor; mas se são calamitosos e turbulentos, ele deve mostrar-se terrível e armar-se de uma firmeza igual aos perigos, sem atender a leis nem constituições, enquanto a felicidade e a paz não se restabeleçam”.