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unesp    UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
                     “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
               Faculdade de Ciências e Letras
                Campus de Araraquara - SP




                   Arie Storch

O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIIVERSIIDADE DE
  PROCESSO DE OLONHA E A N VERS DADE DE
      AVEIIRO: ESTUDO EXPLORATÓRIIO
        VE RO ESTUDO EXPLORATÓR O




              ARARAQUARA – SP.
                   2010
ARIE STORCH




O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIIVERSIIDADE
  PROCESSO DE OLONHA E A N VERS DADE

  DE AVEIRO: ESTUDO EXPLORATÓRIO
  DE VEIRO ESTUDO EXPLORATÓRIO




                    Relatório de Estágio (RL), apresentado ao
                    Departamento de Administração Pública, da
                    Faculdade de Ciências e Letras –
                    Unesp/Araraquara, como requisito para
                    obtenção do título de Bacharel em
                    Administração Pública.

                    Orientador: Prof. Dr. José Vaidergorn




                                                            2
“Interroga a propriedade:
          De onde vens?
   Pergunta a cada idéia:
        Serves a quem?”

          Bertolt Brecht
Elogio do revolucionário




                       3
Sumário

Agradecimentos ................................................................................................................ 5
Resumo ............................................................................................................................. 6
  LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no trabalho .......... 8
  LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no trabalho .......... 8
1) Introdução................................................................................................................. 9
  a) Contexto – o processo em curso ........................................................................... 9
  b) Condições para a realização do estágio .............................................................. 10
2) O processo de Bolonha ........................................................................................... 13
  a) Um precedente: o programa Erasmus................................................................. 13
  b) 1998 - Sorbonne ................................................................................................. 14
  c) 1999 - Bolonha ................................................................................................... 15
  d) 2001 - Praga........................................................................................................ 17
  e) 2003 - Berlim...................................................................................................... 19
  f) 2005 – 2009 – Bergen, Londres e Lovaina......................................................... 22
  g) Bolonha: um processo em formação .................................................................. 22
3) Bolonha na prática: Europa e Aveiro ..................................................................... 23
  a) Dinamismo local de Aveiro................................................................................ 24
  b) Reconhecimento de Bolonha: comparável sem ser igual ................................... 25
  c) O projeto Tuning: estruturação do processo....................................................... 26
4) Conclusões.............................................................................................................. 33
  a) Balanço preliminar de Bolonha em Portugal...................................................... 33
  b) Balanço em Aveiro ............................................................................................. 34
  c) Possíveis questionamentos ................................................................................. 35
  d) Bolonha hoje....................................................................................................... 35
5) Bibliografia............................................................................................................. 39




                                                                                                                                    4
Agradecimentos


       De início, agradeço à família, porto seguro que me entende e apóia na busca dos
objetivos. Pelo investimento em educação que o judaísmo sobrevive às crises.
       Aos colegas da Faculdade de Ciências e Letras, a todos os que conheci dentro do
Programa de Educação Tutorial, início do trabalho de estudo da política educacional de
ensino superior. Diversas reflexões começaram aí, até pensando nos exemplos e
dificuldades internos.
       Aos Erasmus, mesmo àqueles que não eram Erasmus, mas que eram tratados
como tal ou se identificam. Em especial, Aline, Mogli, André, Tanja, Chiara, Antonia,
Larisse, Mateusz, Karina, Volkan, Alex, Auste, Patrícia, Alex, Rhaul, Ivona. Ao Manuel
e à Verônica pelo intensivo de política e cultura galega e ibérica quando moramos
juntos, dicas valiosas para seguir em frente. À Sara e ao Adriano, estimulando com
bibliografia e com debates acalorados quanto às condições de estudo nos países irmãos
de língua portuguesa.
       À Universidade de Aveiro, nomeadamente à Secção Autônoma de Ciências
Sociais Jurídicas e Políticas, pela acolhida durante o estágio e um ano antes do estágio.
Agradecimento especial às professoras Maria Cristina Sousa Gomes e Maria Luis Pinto,
que me abriram a oportunidade de inovar com o estágio curricular em Portugal. E
também aos professores Carlos Jalali, Rui Santiago e Filipe Teles, que me apresentaram
cultura política e educacional portuguesa nas disciplinas cursadas e em conversas.
       Ao Pedro e à Márcia, da Graduação da FCL, pela paciência e pelo apoio na
resolução dos problemas. E ao Fernando nas consultas jurídicas.
       Aos amigos da faculdade, Fernanda, Daniel, Luis Fernando, para quem eu
telefonava de saudades. Aos amigos do Limoeiro pelo aprendizado na vida em república.
       Ao professor José Vaidergorn, estímulo na vida intelectual.
       Ao Mestre Gabriel.




                                                                                       5
RESUMO

O estudo aqui apresentado foi construído como resultado de estágio curricular em
Administração Pública realizado na Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídicas e
Políticas na Universidade de Aveiro, Portugal. Por meio do estudo do Processo de
Bolonha, que envolve 47 países europeus e asiáticos, trata-se de um relatório das
experiências do estágio. Por meio de método qualitativo, principalmente pelo estudo da
bibliografia originária em inglês, mas também de outras análises e debates, foi feito um
mapeamento das atividades desenvolvidas desde a gênese do Processo de Bolonha até a
época de realização do estágio. Foram objetivos do estudo a aquisição de uma visão
global do Processo de Bolonha e conseqüentemente da estrutura de ensino superior
européia, em específico no caso da Universidade de Aveiro. O projeto contou com uma
reflexão crítica quanto à realidade encontrada, questionando iniciativas do projeto
estudado. Também teve como objetivo a criação de material sobre o Processo de
Bolonha em português, focada no público brasileiro.


Palavras – chave: Processo de Bolonha. Ensino superior. Reforma educacional. Europa.




                                                                                      6
Lista de TABELAS

Tabela 1 - participantes do Tuning por país ................................................................... 27
Tabela 2 - Especialistas no Tuning por área e país......................................................... 27
Tabela 3 - Países signatários em 2009............................................................................ 36




                                                                                                                  7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no
   trabalho

PET – Programa de Educação Tutorial
EHEA – European Higher Eduacion Área, ou Espaço Europeu de Ensino Superior
ECTS – European Credit Transfer System
EUA – Associação Européia das Universidades
ESIB - Associações Nacionais de Estudantes na Europa
EURASCHE - Associação Europeia das Insituições de Ensino Superior
Fundo Monetário Internacional (FMI)
Organização Mundial de Comércio (OMC).
UE – União Européia
UA – Universidade de Aveiro




                                                                             8
1) Introdução
a)         Contexto – o processo em curso
           Ao visar a construção de um espaço europeu de ensino superior que articulasse
as universidades e os institutos de pesquisa dos vários países da Europa, bem como seus
laboratórios e pesquisas, o Processo de Bolonha impôs, juntamente com as benesses das
parcerias, mudanças radicais na estrutura das instituições que dele participam. Tais
mudanças foram idealizadas para facilitar a adoção do Processo, com programas
específicos e expansão de outras políticas de aprofundamento das relações entre os
países, em especial da União Europeia, mas que também abre portas para que países que
não façam parte do bloco compartilhem destes interesses comuns. Assim, além de
determinar uma formação comum dos quadros acadêmicos da União Europeia, o
processo garante que esta tenha influência na formação de outros países, potenciais
membros do bloco ou não.
           Diversos foram os objetivos traçados para a concretização do Processo, tais
como maior mobilidade docente e discente, garantia de empregabilidade dos formados
nas instituições de ensino superior europeias e uniformização na formação das
universidades, como forma de garantia de critérios de comparação da qualidade dos
diferentes cursos.

Histórico e justificativa do projeto
           Nascido em meio a um intercâmbio estudantil, este trabalho é reflexo da vontade
do autor de se embrenhar pelos estudos de política educacional. Trata-se, antes, de uma
experiência de intercâmbio estudantil que se aprofundou pelo querer de transformar em
acadêmico um trabalho de cunho pessoal. Assim, o presente relatório não é somente
sobre o estágio feito, afinal a própria existência do estágio se deveu ao intercâmbio que
já estava em curso.
           Dentre os objetivos do estágio curricular de Administração Pública da UNESP1,
são aqui citados dois, expressos no art. 3º:
                   I. Aprofundar os conhecimentos já adquiridos, à luz de experiências concretas
                   de trabalho, propiciando uma oportunidade de articulação entre os conceitos e
                   técnicas apreendidas durante o curso, com a prática administrativa desenvolvida
                   em organizações ou instituições públicas, governamentais ou não;
                   (...)



1
    Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, 2008


                                                                                                9
III. Aprofundar os conhecimentos em uma área ou setor especializado de
               atividade do setor público, governamental ou não, elegendo um tema ou
               problema específico para estudo, de forma a poder operacionalizar os conceitos
               apreendidos durante o curso.

       Sendo o trabalho de conclusão de curso, foi feita uma reflexão sobre os rumos
que o autor tomou durante o curso. Ainda no primeiro ano a atividade começou na
diretoria acadêmica do Centro Acadêmico do curso. Simultaneamente, aconteceu a
entrada como bolsista no grupo PET Administração Pública, programa no qual ganhou
renome nacional pelo trabalho em prol de um ensino superior de qualidade. Com isso,
foi eleito representante discente do programa no Comitê Local de Acompanhamento,
órgão colegiado responsável pelo acompanhamento e avaliação dos grupos dentro da
Reitoria da Universidade, e ainda convidado para proferir conferências e participar de
debates em diversas universidades sobre a atuação dentro do órgão e sobre a avaliação
do programa.
       Ao deixar o vínculo formal com o grupo PET, foram cursados dois semestres da
graduação na Universidade de Aveiro, em Portugal, como intercambista na Licenciatura
em Administração Pública e no Mestrado em Ciência Política, ambos os cursos
estruturados de acordo com o Processo de Bolonha. Haja vista a oportunidade de
continuar o trabalho iniciado ainda no primeiro ano do curso, deu-se a opção de realizar
um estudo exploratório do Processo. Com a consciência de que é uma política de nível
europeu, o que por si só já acarretaria grande trabalho de pesquisa, o trabalho teve como
foco obter uma visão global do Processo e das mudanças em curso no Ensino Superior
Europeu.
       O autor do trabalho percebeu tão logo começou a cursar disciplinas na
Universidade de Aveiro que o estímulo à leitura de bibliografia estrangeira é bem maior
do que o encontrado na graduação no Brasil. Então, também como forma de
aprendizado de idiomas estrangeiros, foi dada prioridade neste trabalho à leitura de
artigos em inglês, ainda que a contextualização do Processo de Bolonha ao estudo de
caso da Universidade de Aveiro exigisse bibliografia também em português. Os textos
originais em inglês que aqui são citados foram traduzidos pelo autor deste relatório.

b)     Condições para a realização do estágio
       No início do estágio foi feito um acordo entre o orientador do relatório docente
da FCL, professor doutor José Vaidergorn, o estudante propositor do trabalho e a
docente Maria Cristina Rocha Pinto, da Universidade de Aveiro, no qual ficou decidido



                                                                                          10
que a orientação do estágio ficaria por conta da docente portuguesa e caberia ao docente
brasileiro a orientação da feitura do relatório e da forma do estágio, principalmente nos
trâmites relativos à inovação de se fazer o estágio em país distinto do Brasil.
       O projeto do estágio aqui relatado previa uma abordagem distinta da que foi
possível realizar no andamento do estágio propriamente dito. O primeiro motivo para a
mudança do enfoque foi o ambiente encontrado para a realização do mesmo, posto que,
por mais bem intencionada que estivesse, a orientadora designada para acompanhar
localmente o autor do trabalho não foi capaz de fazer a orientação de forma adequada.
Isso se deve ao fato de a orientadora não estar inteirada diretamente quanto ao assunto
do projeto, mas também pela inexperiência em orientar um trabalho de instituição
estrangeira, com exigências distintas daquelas encontradas nas universidades
portuguesas. Assim, perdeu-se muito tempo para encontrar os pontos de encontro entre
o estágio ao qual ela estava habituada e o estágio curricular exigido em Administração
Pública na UNESP.
       Outro motivo se deve ao tema escolhido para o trabalho. O Processo de Bolonha
é um assunto ainda novo na própria União Europeia e são poucos os trabalhos
acadêmicos feitos para analisar o processo. Desta forma, o material utilizado nos
estudos é praticamente em sua íntegra primário, dificultando uma abordagem de curto
prazo feita com as condições de um estágio curricular por um estudante de graduação.
       Por outro lado, se as universidades europeias ainda estão aprendendo a lidar com
Bolonha, considerou-se que qualquer contribuição, genérica que fosse, já seria
esclarecedora para o autor do trabalho, servindo também como forma de divulgar o
aprendizado em nível europeu para a comunidade acadêmica brasileira. Assim, o
trabalho se pautou por uma leitura mais genérica do Processo de Bolonha, de forma que
pudesse ser produzido ao final um material que apresentasse Bolonha à comunidade
acadêmica de origem do autor, basicamente os estudantes de Administração Pública e
dos demais cursos de graduação da UNESP. Desta forma, pelos motivos acima expostos,
o trabalho aqui apresentado está sujeito a problemas estruturais.
       A análise aqui feita é fruto de incontáveis entrevistas feitas informalmente pelo
autor com estudantes europeus intercambistas na Universidade de Aveiro, pois
considera-se que diversas conversas contribuíram para a formação do ponto de vista do
autor, contextualizando Bolonha aos países participantes. Além das entrevistas com os
estudantes, também foram feitas conversas informais com docentes da Universidade de
Aveiro durante o curso das disciplinas feitas no período de estudos.


                                                                                       11
Foi feita, durante a realização do estágio, uma longa entrevista com Estela
Pereira, professora catedrática e vice-reitora da Universidade de Aveiro. A entrevista
estava prevista para ser feita ainda no início do período do estágio, entretanto, por
motivos de agenda da entrevistada a mesma só pôde ser realizada na última semana do
estágio. Posto que quando da realização da entrevista o autor do trabalho já tinha boas
noções do Processo de Bolonha, o encontro foi mais uma conversa do que uma
entrevista, e, dado o denso conteúdo da gravação, a mesma foi praticamente
parafraseada no capítulo do trabalho referente à implantação de Bolonha na
Universidade de Aveiro.




                                                                                    12
2) O processo de Bolonha
       Assinada em junho de 1999, a Declaração de Bolonha é, na verdade, um
processo de sucessivos encontros, de modo que para compreender o processo como um
todo seja importante notar as demais reuniões. Conferências têm sido realizadas desde
1998, e assuntos específicos são tratados em cada uma entre os ministros participantes.
O processo é, então, construído e acompanhado em cada uma dessas conferências.
Ainda assim, o percurso inicial, notadamente entre a Declaração de Sorbonne (1998) e a
de Praga (2001), passando pela de Bolonha (1999), é o que delineou mais firme o
Processo, sendo portanto maior objeto de estudo.

a)     Um precedente: o programa Erasmus
       Tendo iniciado em 1987, O programa Erasmus (sigla para European Community
Action Scheme for Mobility of University Students, mas também referência à figura do
acadêmico e teólogo Erasmo de Roterdã) é uma das várias iniciativas européias para a
integração harmônica de seus cidadãos. Consiste em realizar parte dos estudos
universitários em uma universidade de outro país, por um período de 3 a 12 meses.
Além de abranger os países-membros da União Européia (UE), o Erasmus inclui
instituições de outros países, totalizando 31 os países-membros da rede. Assim, um
estudante inglês pode ir para a Romênia, um grego vai para a Suécia, um esloveno vai
para a Espanha.
       Ao mesmo tempo em que proporciona a vivência de novas culturas, o Erasmus é
também uma forma de estímulo à mobilidade, já que um estudante quando em Erasmus
entra em contato com pessoas de diversas nacionalidades e desenvolve uma rede de
relacionamentos que ultrapassa em muito aquela que cada um tem em seu próprio país.
Para Inês Costa Pessoa (2003),
               Para além de proporcionar uma experiência de vivência no exterior e de
               contacto com um novo habitat, permitirá a estimulação do sentimento de
               pertença a um espaço supranacional.
       Além do convívio diário, os estudantes Erasmus têm aulas do idioma oficial
local, e diversos deles valorizam bastante essa experiência. Fato é que, quando a UE
estava sendo criada, os países-membros e a comunidade internacional perceberam que,
se a Europa continuasse em guerra, em pouco tempo não haveria mais Europa. Então, a
forma de sobrevivência e de preservar a paz foi integrar os países a partir dos interesses
comuns. O respeito às culturas locais é um dos princípios básicos, de modo que hoje a




                                                                                       13
Europa tem 27 estados-membros e 23 idiomas oficiais2. Ainda que as minorias locais
sigam procurando formas de autonomia (vide esforços na Galícia, Catalunha e em
outras regiões para preservar os idiomas locais), somente considerar as maiorias
culturais já dá margem para grande gama de pensamentos distintos.
        Desenvolver ou resgatar valores europeus é também uma forma de garantir a
sobrevivência cultural, e investir no público univesitário é uma estratégia que tem
gerado resultados visíveis. Desde que foi criado, mais de 1,2 milhão de estudantes já
passaram pelo programa, sendo que atualmente mais de 2000 estabelecimentos de
ensino superior participam da rede Erasmus3.
        Quem quiser participar do programa Erasmus deve participar de um processo
seletivo dentro da própria instituição, de acordo com as vagas existentes para cada curso
ou para cada destino. O processo seletivo pode incluir noções do idioma do destino,
inglês ou francês, avaliação quanto aos hábitos sócio-culturais, tais como a facilidade de
adaptação em uma terra estranha. Assim, os estudantes Erasmus não são propriamente
representativos de seus países de origem, pois o que os faz Erasmus são as
características que cada um tem em comum com os demais, dentre elas a vontade de
conhecer outras culturas e de romper um possível isolamento cultural.
        Um relato de experiências como Erasmus na Universidade de Aveiro foi
produzido em forma de documentário por Matthias Noé e Paulina Toporowska, quando
preparavam material para divulgação do programa em seus países 4 . O autor deste
relatório foi um dos entrevistados. Entretanto, como o documento tratava somente de
estudantes europeus, a entrevista foi justificada pela ascendência polonesa. Outra
experiência relevante relativa ao programa Erasmus, mas referente ao mestrado, é o
Erasmus Mundus, relatado em Storch (2008).

b)      1998 - Sorbonne
        Sabe-se que o processo teve início em 1998, quando ministros responsáveis pelo
ensino superior da França, Alemanha, Itália e Reino Unido se reuniram na França para
assinar a Declaração de Sorbonne. As maiores economias européias trataram, na ocasião,
de iniciar o trabalho, lançando algumas idéias-chave para que o processo tivesse
continuidade. Foi detectada a necessidade de compatibilidade entre os cursos dos


2
  Exemplos da diversidade linguística européia podem ser vistos no sítio oficial da União Européia:
http://europa.eu/languages/
3
  PESSOA, 2003
4
  O vídeo (em inglês) pode ser visto em http://ariestorch.multiply.com/video/item/39/Erasmus_in_Aveiro


                                                                                                    14
diversos países, posto que, com a mobilidade européia crescendo, a tendência seria de
cada vez mais ter um diploma de um país reconhecido em outro. De acordo com a
declaração assinada por ministros da França, Itália, Reino Unido e Alemanha,
              O reconhecimento internacional e a atração potencial dos nossos sistemas estão
              diretamente relacionados com a sua compreensão interna e externa. Um sistema,
              em que dois ciclos principais, pré-graduado e graduado, deverão ser
              reconhecíveis para comparação e equivalência internacional, parece estar
              emergindo5.
       O princípio básico presente em Sorbonne é proposto por Jacques Attali, ex-
presidente do Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento e à época assessor
do governo francês, que declara que
              Não se pode ter a livre circulação de mercadorias, de capitais, de pessoas, de
              idéias (...), e manter uma situação em que não é mesmo possível comparar o
              valor dos diplomas expedidos pelas universidades dos países membros da União
              Européia (...). Não se pode ter a Europa do emprego sem a Europa da Educação.
              Sem uniformizar seus sistemas, os países da Europa deverão decidir a respeito
              de uma certa harmonização dos cursos e dos diplomas e definir um modelo
              europeu específico, nem burocrático nem submetido ao mercado.6
       Outras proposições foram lançadas em Sorbonne, tais como a noção de que a
melhoria dos cursos teria reflexo direto na melhoria da competitividade das economias
dos países envolvidos.

c)     1999 - Bolonha
       Em 1999, já na cidade que dá o nome para o processo, ministros da área de
educação de 29 países europeus se reúnem para a assinatura de um documento que
estabelece um Espaço Europeu de Ensino Superior até o ano de 2010, visando
harmonizar e uniformizar os sistemas de ensino superior de todos os países envolvidos
para nivelamento em níveis europeus. Lançando o conceito de Europa do Conhecimento,
o documento retoma a Declaração de Sorbonne ao afirmar que esta “salientou o papel
essencial das universidades no desenvolvimento das dimensões culturais européias”,
mas indo além da reunião anterior ao também definir o que se queria para um Espaço
Europeu de Ensino Superior (EHEA, na sigla em inglês).
       Desta forma, a Declaração de Bolonha instituiu metas “para promover a
empregabilidade dos cidadãos europeus e a competitivdade internacional do sistema de
ensino superior europeu”7. Foi definida então a adoção de um sistema de graus baseado
em dois ciclos principais, sendo eles estudos pós-graduados e graduados. Estabeleceu-se


5
  ALLEGRE, BERLINGUER, BLACKSTONE e RÜTTGERS, 1998
6
  ATTALI, 1998, apud AZEVEDO, 2007
7
  Bolonha, 1999


                                                                                         15
para tanto que o primeiro ciclo tivesse duração mínima de três anos, equivalendo à
formação básica do ensino superior e sendo pré-requisito para o curso do segundo ciclo.
       Para possibilitar a equivalência de créditos cursados, foi estabelecido o sistema
ECTS (European Credit Transfer System), já existente então nos programas de
mobilidade estudantil Socrates e Erasmus. Os ECTS consideram, além das horas de aula,
as horas estimadas de estudo fora da sala de aula. Desta forma, podem entrar no mesmo
sistema diferentes metodologias de ensino, desde as que cobram maior presença em aula
às que têm um ensino semi-presencial, mas que compensam as poucas aulas com estudo
individual. É lançado também o conceito de aprendizagem ao longo da vida (longlife
learning) ao considerar que uma experiência de voluntariado ou em grupo de estudos,
por exemplo possa contar créditos para um curso, “contanto que estes sejam
reconhecidos pelas respectivas universidades receptoras” (idem).
       Bem como as demais decisões, o sistema de graus não foi uma lei, mas sim uma
diretriz. Não ficou instituído um modelo único que deveria ser seguido, ainda que a
maioria dos países tenha optado por implementar o chamado modelo “3+2”, consistindo
de três anos de formação inicial e dois anos de formação pós-graduada. É esse o sistema
adotado por Portugal, onde o primeiro ciclo é denominado “licenciatura”, e o segundo,
mestrado. Alguns cursos específicos seguem tendo uma formação mais longa, com até
seis anos, como é o caso de medicina. Outros países adotaram estruturas de curso como
“4+1” e cursos intermediários para entrar no mercado de trabalho. Ficou também
decidido que o ano curricular pleno teria 60 créditos ECTS, cabendo às universidades a
decisão de quantos créditos ECTS cada disciplina valeria.
       De acordo com relatório do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior
de Portugal (CNAVES, 2001), alguns países já tinham tradição na estrutura de graus
que estava sendo proposta. Dentre eles, destacam-se Reino Unido, Irlanda e Malta.
Outros não tinham tanta tradição, mas já tinham o sistema implementado com
estabilidade, caso específico da Escandinávia (Suécia, Noruega e Dinamarca) e da
Islândia. Já nos países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia) e na Itália o sistema foi
implantado após grande reforma do sistema educacional.
       O sistema de ciclos é uma das mudanças mais criticadas em Bolonha. Ao
instituirem uma formação básica e outra complementar, mais avançada, os países
signatários também se isentavam da responsabilidade de financiar todo o curso superior.
Com a justificativa de criar o Espaço Europeu de Ensino Superior, optaram pela
flexibilização dos cursos, mas também como conseqüência pela precarização.


                                                                                     16
De acordo com Correia (2009), o grande desafio do sistema de ciclos é manter a
qualidade do curso. Ao analisar o campo das engenharias em Portugal, ele afirma que
em três anos de formação básica só é possível formar engenheiros técnicos, enquanto
que para formar engenheiros de concepção e de projeto são necessários mais dois anos.
Para ele, “trata-se no fundo de procurar um equilíbrio entre a empregabilidade a curto
prazo e a empregabilidade a longo prazo”, já que, se em três anos se tem a formação de
técnico, a mesma não é suficiente para projetos mais avançados de engenharia.
        Correia (2009) segue a crítica à diminuição do Estado no financiamento do
ensino superior ao levantar o atraso português em relação aos outros países:
               A reestruturação do sistema de graus acadêmicos não pode ser transformada
               apenas numa ocasião para a redução da responsabilidade do Estado no bem
               público e estratégico que é a Educação Superior. Temos que assegurar aos
               nossos jovens as mesmas oportunidades dos seus colegas Europeus.
        Em outro trabalho, Correia (2004) afirma que
               A formação de 2º grau em Engenharia (seja 3+2 seja 4+1) tem que ser
               considerada tendencialmente gratuita como a do 1º grau. Se Portugal quiser
               recuperar o atraso e ser um ator interveniente na sociedade do conhecimento, a
               nossa Engenharia tem que se manter ao melhor nível, e isso só será possível
               com uma freqüência numerosa do 2ºciclo de formação. Só com custos, para os
               estudantes, semelhantes aos do 1º grau, será isso possível. É aliás o que está a
               acontecer por essa Europa fora. A reestruturação do sistema de graus
               acadêmicos não pode ser transformada apenas numa ocasião para a redução da
               responsabilidade do Estado no bem público e estratégico que é a Educação
               Superior.
        Moraes (2006) vai além e debate até mesmo que a mudança de foco no
financiamento denota o seguimento de uma agenda proposta por organismos
multilaterais como Fundo Monetário Internacional (FMI) e Organização Mundial de
Comércio (OMC). A autora levanta a idéia de que “há inquietações com a possibilidade
de a redução prevista na duração de alguns cursos implique em menos financiamento às
instituições e que os custos das formações recaiam sobre os alunos e suas famílias” (p.
188).
        Outros aspectos citados na declaração são a promoção da mobilidade de
estudantes, de docentes e de pesquisadores e o estabelecimento de maior cooperação
européia na avaliação da qualidade de ensino, visando o desenvolvimento de critérios e
metodologias comparáveis.

d)      2001 - Praga
        Uma crítica marcante até então era de que o processo que estava em gestação
contava somente com uma parte dos envolvidos no processo. Nomeadamente, somente
ministros participaram das negociações iniciais, sendo que o processo já estava


                                                                                            17
começando a afetar as universidades dos países signatários. Diversas críticas foram
feitas entre a reunião de Bolonha e a seguinte, dois anos depois em Praga, destacando os
problemas que o processo já em curso tinha.
        Ken Edwards (2001) afirma que, “enquanto muito está acontecendo no
desenvolvimento do processo identificado como Bolonha, existe uma grande falta de
conscientização da declaração e do seu significado, em especial da parte das próprias
universidades” (p. 29) 8 . Edwards é um dos que tinham alguma propriedade para
reclamar, posto que participou da Conferência de Praga em 2001 como presidente da
Associação Européia das Universidades. Criticando o modelo de cima para baixo
imposto pelos ministros reunidos em Bolonha, Edwards ainda ataca a idéia de
uniformizar o ensino, pois “isso seria arriscar inibir a inovação e o experimento das
universidades no desenvolvimento de novos cursos e novos métodos de ensino” (p. 30).
        Previamente à Conferência de Praga, houve uma Convenção das Instituições de
Ensino Superior Européias (EHEA, na sigla em inglês) em Salamanca, que destacou a
necessidade de as universidades participarem do processo, precisando para tanto do que
chamam de uma “nova liberdade” 9 . Para que as mesmas pudessem cumprir com o
Processo de Bolonha, precisariam de “liberdade de ação como o único caminho para
uma maior eficiência”. As críticas levantadas à ausência das universidades no início do
processo são tantas que o documento levanta que “a confiança mútua entre governos e
universidades é um pré-requisito para uma parceria de base. Por último, mas não menos
importante, incentivar a autonomia intelectual é uma tarefa essencial e um requisito para
as instituições acadêmicas”.
        Se as universidades reclamam que não foram consultadas antes, elas também se
colocam à disposição para participar do processo:
                A universidades não pedem só mais liberdade. Estas também estão dispostas a
                aceitar a correspondente responsabilidade: elas querem ser responsabilizadas
                pelo que fazem e pela maneira como usam a liberdade que lhes é dada.
        Enquanto as universidades fizeram a conferência em Salamanca, a Associação
Nacional de Estudantes da Europa (ESIB) se reuniu em Gotemburgo para dizer que
“uma área européia de ensino superior deve incluir todos os estudantes europeus em
bases iguais (...) ao divulgar boas práticas e promover a cooperação e a solidariedade
entre os Estados Europeus”.10 Interesses estudantis como mobilidade, financiamento por


8
  EDWARDS, Ken. European higher education and the Bologna Process. p 28
9
  European Higher Education Area, 2001
10
   The National Unions of Students in Europe, 2001


                                                                                         18
meio de bolsas de estudo e reconhecimento das atividades feitas têm destaque no
documento, que, tal como a Associação Européia das Universidades, é proposto também
um plano de participação nos debates:
                Deve ser destacado que os estudantes, como parceiros competentes, ativos e
                construtivos, devem ser vistos como uma das forças dirigentes nas mudanças
                educacionais. A participação dos estudantes no Processo de Bolonha é um dos
                passos-chave para formalizar o envolvimento estudantil em todos os órgãos
                decisórios e de discussão para lidar com o ensino superior em nível europeu.
       A reunião seguinte à de Bolonha aconteceu na República Checa também por um
motivo simbólico: se a Universidade de Bolonha é a mais antiga da Europa, a
Universidade de Praga é a mais antiga do leste europeu, representando assim países que
estavam em vias de entrar na União Européia, simbolizando o interesse explícito de
“envolver toda a Europa no processo” (Praga, 2001).
       De fato, em Praga houve uma inflexão nos rumos do Processo de Bolonha. Além
do destaque dado à participação de todos os países envolvidos, tiveram ingresso no
processo entidades representes das universidades, dos estudantes de órgãos
supranacionais, como a Associação Europeia das Universidades (EUA); Associação
Europeia das Insituições de Ensino Superior (EURASHE); Associações Nacionais de
Estudantes na Europa (ESIB) e Comissão Européia. Assim também ingressaram no
processo mais quatro países, mostrando que a expansão estava aberta para outros
interessados.

e)     2003 - Berlim
       Seguindo o rumo tomado após a reunião de Bolonha, bienalmente são feitas
conferências. Cabe-se notar, contudo, que após as manifestações prévias a Praga as
conferências em parte perderam valor, pois outros grupos de trabalho se formaram,
agora com todas as partes envolvidas no processo. Os demais documentos serão
analisados nos capítulos seguintes, onde faremos uma análise crítica da implantação de
Bolonha. Desta forma, coloca-se aqui uma síntese das decisões das conferências já
somadas a reflexões pontuais, para fins de completar o quadro de decisões fundamentais.
       A reunião ministerial seguinte à de Praga teve lugar em Berlim em 2003. O
documento “O papel das universidades na Europa do conhecimento” resultou da
conferência, concluindo que o ensino superior europeu tinha algumas dificuldades para
ter uma uniformidade dada a “grande heterogeneidade, que se reflete em termos de
organização, gestão e condições de funcionamento, bem como em matéria de estatuto e
condições de emprego e contratação de professores e investigadores”.



                                                                                         19
Um dos obstáculos para se estruturar o EEES é a exígua mobilidade estudantil,
sendo que em 2000 apenas 2,3% dos estudantes europeus realizavam os seus estudos em
outro país europeu.
       Alguns outros desafios são traçados, dentre eles:
           •   Crescimento da procura de formação superior. Enquanto a natalidade nos
               países europeus é cada vez menor, aumenta a procura das pessoas por
               uma formação superior, já denotando a sociedade do conhecimento.
           •   Internacionalização da educação e da investigação. Comparadas com as
               universidades americanas, as universidades européias atraem poucos
               estudantes estrangeiros. De acordo com o documento, “enquanto as
               universidades europeias acolhiam, em 2000, cerca de 450 000 estudantes
               estrangeiros, as americanas contavam mais de 540 000, a maior parte dos
               quais proveniente da Ásia”. Isso não chega a ser problema, mas chegou-
               se à conclusão de que as universidades européias tinham pouca
               atratividade para fixar residência dos diplomados após o curso. O
               documento afirma que as universidades européias “muitas vezes não
               possuem a massa crítica necessária, o que as obriga a adotar abordagens
               baseadas na colaboração sob a forma de redes, cursos ou diplomas
               comuns”.
           •   Reorganização do conhecimento. Se há a necessidade de áreas cada vez
               mais avançadas e precisas do conhecimento, também surgem novas
               abordagens interdisciplinares para compreensão dos grandes problemas
               da sociedade. Devem-se buscar possibilidades para mudar a inércia das
               universidades, que “tendem a conservar a organização de um quadro
               disciplinar tradicional”.
       Um ponto polêmico do documento trata do financiamento das universidades,
propondo fontes de financiamento alternativas ao investimento público. Os Estados
Unidos são novamente modelo ao serem sugeridas as doações privadas. Entretanto,
outras formas de financiamento são citadas, também visando diminuir a intervenção
estatal: prestação de serviços, cobrança dos alunos, exploração dos resultados da
pesquisa e criação de empresas de base tecnológica são algumas das possibilidades.
       Tradicionalmente, o ensino superior europeu depende em muito do
financiamento público. Até há poucos anos, as cobranças de propinas (gratificações)
tinham valores apenas simbólicos na maioria dos países. Entretanto, a diminuição do


                                                                                     20
financiamento estatal aumentou o valor das propinas e algumas universidades que eram
gratuitas passaram a deixar de ser, como é o caso da Universidade de Viena. Criar
novos cursos pagos também é uma forma estimulada no documento, o que pode também
ser justificado pela lei da oferta e da demanda. Cabe aqui novamente a crítica da
importância de direcionar os docentes para as atividades essenciais da universidade:
com os novos cursos pagos, a tendência é de que muitos quadros se dediquem somente
aos cursos pagos, abandonando o ensino superior básico.
           O objetivo central das análises feitas serviria de base para “tornar a União
Europeia (UE) na economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo”.
A proposição veio ao encontro daquela que estava sendo desenvolvida pelos chefes de
estado da União Européia, que de acordo com a Estratégia de Lisboa se propuseram a
                   Fazer da União Europeia, até 2010, a economia baseada no conhecimento mais
                   dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico
                   sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social e
                   respeito pelo ambiente.11
           Um outro conceito de destaque em Berlim é o de aprendizagem ao longo da vida,
ou longlife learning. De acordo com a proposta, a tendência hoje é de as pessoas
estudarem continuamente. Com o conhecimento sendo transformado em velozes
revoluções, considera-se inútil investir muito em uma formação, já que em poucos anos
boa parte do aprendizado estará obsoleta – algo notado especificamente no campo das
engenharias. Isso diminui o valor de um mestrado e principalmente de um doutoramento,
tido antes como a tese que balizaria toda a produção acadêmica do indivíduo. O sistema
de ciclos ganhou então uma terceira etapa após a formação básica e o mestrado.
Novamente, o propósito de flexibilizar a formação ficou sugerido. O terceiro ciclo,
doutoral, também serviria para vincular o Espaço Europeu de Ensino Superior ao
Espaço Europeu de Investigação, este já ligado diretamente às empresas.
           Ainda em Berlim foi decidida a aceleração do processo em curso. Se antes a
meta era de criar o Espaço Europeu de Ensino Superior até 2010, o prazo se tornou mais
exíguo, tendo estabelecido o objetivo do ano de 2005 para cumprir algumas etapas do
processo. Outro fato importante ocorrido foi a adesão de mais países do leste europeu e
da Rússia, expandindo o número de países signatários para 40.




11
     Centro de Informação Européia Jacques Delors, 2007


                                                                                           21
f)        2005 – 2009 – Bergen, Londres e Lovaina
          A reunião interministerial seguinte à de Berlim ocorreu em 2005 em Bergen, na
Noruega. Contribuições pontuais foram feitas, a saber: compromisso do Grupo de
Acompanhamento do Processo de Bolonha a reforçar a dimensão social do processo;
remover os obstáculos à mobilidade; implementar as linhas orientadoras de gestão e
certificação da qualidade; criar diplomas conjuntos; flexibilização de aprendizagem no
ensino superior.
          Após Bergen, a capital inglesa sediou a reunião em 2007. Foi proposta a adoção
do processo com respeito às particularidades locais, em favor da diversidade cultural do
espaço europeu e com vistas de aumento da competitividade. Com a expansão do
acordo para países não membros da União Européia nem signatários dos acordos de
livre mobilidade, foi reconhecida a necessidade de empenho dos governos para facilitar
os vistos de estudo e de trabalho dentre os países signatários do Processo de Bolonha.
          Quando da realização do estágio que originou este relatório, a conferência de
Lovaina (Bélgica) ainda não tinha ocorrido, e por isso colocam-se aqui as metas
estabelecidas pela conferência de Londres: aumento da mobilidade; maior efetividade
da dimensão social do processo; parcerias com o Eurostat para manutenção de bancos
de dados estatísticos das universidades; definição de estudos quanto à empregabilidade
dos formados no sistema de três ciclos.

g)        Bolonha: um processo em formação
          Ao analisar o processo construído, Diogo (2009) considera interessante notar
que o envolvimento da União Européia e dos demais participantes aumentou de acordo
com o seguimento das conferências. Para ela, isso “tem consequências para o desenho
político em todos os níveis de ação onde o processo opera, especialmente quando o
número de países participantes aumenta, trazendo com isso um aumento da
complexidade do processo”12. Veiga e Amaral (2006) seguem pela mesma linha, ao
lançarem a tese de que a construção de Bolonha não pode ser considerada como uma
política clara, racional e linear, visto que em nenhum momento o processo foi definido
como concluído.




12
     DIOGO, p. 39


                                                                                         22
3) Bolonha na prática: Europa e Aveiro
       Como relatado anteriormente, o processo de Bolonha não contou a princípio
com a participação ativa da comunidade acadêmica, somente dos governos. Em
entrevista, a professora Estela Pereira relatou que a transição do espaço decisório dos
governos para as universidades não foi fácil, visto que as universidades não tinham
unidade de pensamento no início do processo. Entretanto, alguns objetivos já eram
idéias esparsas, como diminuir a evasão dos cursos universitários.
       Simultaneamente, a reforma neoliberal recente em países europeus considerou a
educação como mercadoria, levando os países europeus a diminuírem o financiamento
direto nas instituições de nível superior. Parte daí a idéia de que o Estado deveria
financiar somente os três primeiros anos da formação superior, deixando o restante da
formação a cargo dos cidadãos.
       No início, sequer havia nomenclatura comum para os mesmos graus de
formação, sendo que cada cultura tinha o hábito de chamar o formado com um nome. O
equivalente francês à palavra bacharelado (baccalauréat), por exemplo, é na verdade
como são chamados os formados no segundo grau (o atual ensino médio do Brasil). Nas
palavras da professora Estela Pereira, “é preciso nós sabermos entender para podermos
cooperar”, e também “sabermos do que estamos a falar e não termos más traduções”.
Por este motivo, e pelo interesse em construir um espaço europeu de ensino superior,
pode-se dizer que as universidades estavam preparadas para ser comparáveis, o que
seria uma forma de evitar o receio de o Estado se eximir das responsabilidades para com
o ensino superior.
       Quando houve a Declaração de Bolonha (1999 – vide capítulo 3), a
Universidade de Aveiro estava em um momento de revisão curricular de todos os cursos.
Isso facilitou para que Aveiro entrasse nos debates de Bolonha, quando foram pensadas
competências básicas e transversais que deveriam ser cumpridas por todos os formados
na universidade. Não se trata de um ciclo básico para o nível superior, mas sim pensar
uma estrutura matricial de formação, na qual determinadas características deveriam
influir de alguma forma em todas as disciplinas e cursos ministrados na Universidade,
aplicáveis a qualquer área do saber acadêmico. São exemplos dessas competências
transversais:
           •    Boa expressão oral e escrita na língua materna (no caso, o português);




                                                                                         23
•   Boa    compreensão     no   mínimo    escrita   de    língua   estrangeira
               (principalmente o inglês, mas dependendo da área também o francês,
               dada a forte influência histórico-cultural exercida pela França em
               Portugal);
           •   Conhecimentos básicos em informática, tanto nas ciências exatas como
               nas humanas e nas artes.
       Simultaneamente, foram buscadas metas objetivas para avaliar a qualidade de
cada formação oferecida em Aveiro. Como exemplos, Estela Pereira cita a formação em
música, na qual é possível ter como meta que um estudante seja capaz de interpretar
com excelência algum determinado compositor ou peça erudita.
       O processo feito na Universidade de Aveiro visou repensar a formação,
mudando o foco da transmissão do conhecimento para identificar se os estudantes
aprendiam a usar o conhecimento adquirido, ou, segundo Estela Pereira, “não está em
causa aquilo que o aluno decorou, mas sim para o que ele usa”. Por ter sido um processo
lento, Aveiro de certa forma já implantava Bolonha sem falar de Bolonha, e por isso
teve um caminho facilitado quando o acordo foi feito no âmbito dos governos. Para
Estela Pereira, partícipe direta do processo local, o grande impulsionador da reforma em
Aveiro foi um antigo reitor da universidade, Joaquim Renato Ferreira Araújo, que, ainda
que tenha sido reitor de 1986 até 1994, teve forte influência na implantação das
mudanças aqui citadas, concretizadas entre 1999 e 2000.

a)     Dinamismo local de Aveiro
       Aqui cabe um aparte quanto às facilidades encontradas na Universidade de
Aveiro para pensar a formação. Tão logo chegou à Universidade de Aveiro, o autor
deste trabalho percebeu o perfil inovador da universidade, com grande parte dos cursos
voltados para as ciências aplicadas. Pela experiência pessoal e para efeito de parâmetro
de comparação com a realidade brasileira, o autor considera a Universidade Estadual de
Campinas e a Universidade Federal de São Carlos, ambas propulsionadoras de parques
tecnológicos, como semelhantes à Universidade de Aveiro no Brasil. A percepção é
corroborada pela professora Estela Pereira, ela mesma participante de projeto de
pesquisa conjunto com ambas as instituições na área de engenharia.
       A história da Universidade de Aveiro também é recente se comparada à do
ensino superior europeu – enquanto a Universidade de Coimbra foi criada em 1290,
Aveiro é fruto da democratização das universidades portuguesas feita na década de 1970.



                                                                                      24
O contexto deixa claro que Aveiro não tem muitas tradições firmadas, tendo
recebido em sua gênese pessoas de diversas universidades portuguesas e muitos
docentes doutorados no exterior durante a ditadura portuguesa (de 1932 até 1974). A
heterogeneidade da formação dos docentes rendeu uma tendência de dinamismo
diferente da estabelecida em universidades mais tradicionais, sendo também a única
universidade portuguesa de grande porte com estrutura departamental e sem faculdades,
ilhas isoladas de conhecimento. A horizontalidade dos departamentos, que cooperam
para oferecer todos os cursos oferecidos, facilita a dinâmica interna por desenvolver o
respeito mútuo entre os docentes.
       É fruto também da dinâmica de uma universidade nova o fato de não existirem
feudos acadêmicos tradicionais, posto que a filosofia da educação atual considerou que
a produção do conhecimento não está estagnada e vive por constantes transformações,
diferentemente dos momentos de estabilidade que Kuhn identifica como o da “ciência
normal”, intercalados pela instabilidade pré-revolucionária onde os novos paradigmas se
impõem sobre os antigos e a ciência avança aos saltos. A concepção científica lembra,
eventualmente, a proposta por Karl Popper, com a atividade científica desenvolvendo-se
pela constância da sua comunidade através do acúmulo de conhecimentos gerados pela
experiência submetida ao escrutínio dos pares, confirmando provisoriamente as
afirmações teóricas ou reformulando-as de acordo com os novos conhecimentos.

b)     Reconhecimento de Bolonha: comparável sem ser igual
       Se a Universidade de Aveiro tem a dinâmica como prática, pode se considerar
uma tendência de dificuldade de implantação do Processo de Bolonha nas grandes
escolas de pensamento, como Sorbonne na França, London School of Economics e as
universidades de Oxford e Harvard na Inglaterra. Para que possa ser aplicada a
unificação do ensino superior europeu, Estela Pereira afirma que existe uma grande
dificuldade da parte dos professores em reconhecer que um curso possa ser feito sem a
sua disciplina. A mudança da mentalidade – tanto dos professores quanto
principalmente das instituições consolidadas – leva tempo e a história local deve ser
respeitada, sem pular etapas. Portanto, o primeiro passo é reconhecer que existem
diferenças em cada instituição no que tange ao pensamento e à prática docente e de
pesquisa, e o reconhecimento é mais efetivo quando ocorre internamente.
       Pelas conversas com estudantes Erasmus notou-se a dificuldade que os
estudantes têm de reconhecer as disciplinas cursadas no exterior, sendo que em muitos



                                                                                    25
casos as mesmas só entram como atividades complementares no currículo de origem.
Usa-se como argumento para a não validação dos créditos ECTS, por exemplo, não ter
estudado determinado autor, referência no país de origem mas que, exatamente pela
experiência de conhecer novas abordagens, o estudante procura algo distinto quando em
intercâmbio.

c)         O projeto Tuning: estruturação do processo
           Estela Pereira avalia que os professores devem estar abertos para reconhecer
coisas diferentes do que eles ensinariam, mas que também podem ser interessantes para
a formação, ou uma forma de tornar um curso “comparável sem ser igual”. Evolução
grande foi feita nesse sentido no âmbito do projeto Tuning13, do qual fez parte como
especialista em ensino superior, função coordenativa do projeto.
           O relatório, um dos documentos-chave produzidos quando da implantação de
Bolonha, considera requisitos básicos para a formação de diversas carreiras dentro do
ciclo proposto. É considerado para tanto que qualquer país da Europa pudesse ter a
formação sugerida.
           Cabe aqui destacar a importância do Tuning no processo formador de Bolonha:
tratou-se de projeto essencial para reunir especialistas nos mais diversos campos do
conhecimento em toda a comunidade acadêmica européia. O significado é o mesmo da
palavra inglesa: afinação, ato de sintonizar. Ao reunir em grupos de trabalho pessoas de
mais de cem universidades, foi elemento-chave na inserção das universidades no
processo criado pelos governos.
           Ainda que centenas de instituições tenham feito parte do projeto nos debates
internos por país e por área, o número de especialistas que participaram da elaboração
dos documentos foi reduzido.

Participantes e áreas do projeto
           A tabela 1 aponta o número de participantes institucionais por país. Nota-se que,
apesar da pouca importância econômica para a União Européia, Portugal contou com o
5º maior número de especialistas no projeto, atrás somente das potências Itália,
Alemanha, França e Reino Unido e empatado com Bélgica e Irlanda.
           Dos nove participantes portugueses, ressalta-se que quatro foram da
Universidade de Aveiro. Estela Pereira entrou como especialista em ensino superior,


13
     Vide http://tuning.unideusto.org/tuningeu/


                                                                                         26
função coordenativa do projeto. Além de Pereira, Portugal também teve Tito Fernandes,
da Universidade Técnica de Lisboa, como membro do comitê gestor do Tuning.
                        Tabela 1 - Participantes do Tuning por país14
                                    País                Total
                                    Alemanha              11
                                    Áustria                6
                                    Bélgica                9
                                    Espanha                9
                                    Finlândia              6
                                    França                11
                                    Grécia                 6
                                    Irlanda                9
                                    Islândia               1
                                    Itália                15
                                    Lituânia               1
                                    Noruega                5
                                    Países Baixos          6
                                    Polônia                2
                                    Portugal               9
                                    Reino Unido            7
                                    Reino Unido           10
                                    Romênia                1
                                    Suécia                 7
                                    Total geral          131
          Sete áreas básicas entraram na pauta da primeira rodada de debates do Tuning,
cuja representatividade por país pode ser observada na tabela 2: Ciências da Educação
(na tabela, Edu); Física (Fís); Geologia (Geol); História (His); Matemática (Mat);
Negócios (Neg); e Química (Quí). O número total de participantes na tabela 2 é menor
do que o número da tabela 1 por não estarem contabilizados os especialistas e
coordenadores-gerais do projeto.
                     Tabela 2 - Especialistas no Tuning por área e país15
                         País     Edu Fís Geol His Mat Neg Quí Total
                     Alemanha      1   1   1    1   1   3   1    9
                       Áustria     1   1   1    1   1   1        6
                       Bélgica     1   1   1    1   1   1   1    7
                     Dinamarca     1   1   1    1   1   2        7
                      Espanha      1   1   1    1   2   1   1    8
                      Finlândia    1   1   1    1   1       1   6
                       França      1   1   1    2   2   1   3   11
                       Grécia      1   1            1   1   1   5
                       Irlanda     1   1   2    1   2   1   1    9
                      Islândia                  1               1
                         Itália    1   3   1    2   1   1   2   11
                      Noruega      1       1    1       1   1   5
                       Países
                                        1    1      1     1       1     5
                       Baixos

14
     Elaboração do autor, baseada em GONZALEZ e WAGENAAR, 2003
15
     Idem


                                                                                    27
Portugal       1     1      1     1     1     1     1    7
                     Reino Unido       1     1     2     1     1     1     1    8
                       Suécia          2     1           1     1     1     1    7
                      Total geral     15    16    15    17    17    16    16   112
        Outras áreas foram debatidas posteriormente e geraram relatórios exclusivos.
São os casos, por exemplo, de Estudos Europeus, Terapia Ocupacional, Estudos da
Terra e Música, dentre outros16.

Objetivos do projeto
        O projeto visou deixar as instituições de ensino superior em contato direto com
os rumos de Bolonha, aprofundando o debate por área para definir as competências e
habilidades básicas que um formado no ensino superior europeu deveria ter, aí inclusos
também os conteúdos específicos das sete áreas temáticas citadas anteriormente.
        Também buscou-se aumentar a transparência e a lisura do Processo de Bolonha,
gerando possibilidades de pesquisa acadêmica na área para posterior inovação nos
processos comunicativos. A troca de experiências entre as instituições participantes
pode ser considerada bastante relevante, posto que houve estímulo à criação de redes
européias capazes de apresentar exemplos de boas práticas, “fomentando a inovação e a
qualidade na reflexão conjunta e na troca, também para outras disciplinas”17.
        O intercâmbio de informação relativa à estrutura curricular dos cursos nas
respectivas áreas também foi útil para considerar quais eram os eixos fundamentais na
formação européia, garantindo também que os pontos de referência de cada área fossem
condizentes com as políticas educacionais de cada país.
        Por ter se tratado de meio oficial de debate da União Européia, contando
inclusive com observadores da Comissão Européia nos debates, o Tuning foi também
uma forma de “construir pontes entre esta rede (a das universidades européias) e outros
organismos qualificados para produzir convergência nas áreas selecionadas” 18 .
Também por isso o Tuning foi visto como possibilidade de ação coordenada entre
“todos os atores envolvidos no processo de sintonia das estruturas educacionais”, aí
inclusos os Ministros da Educação dos países-membros da UE, a EURASCHE -
Associação Europeia das Insituições de Ensino Superior, outras associações e
sociedades científicas, conferências de reitores e o grupo interministerial europeu de
acompanhamento do Processo de Bolonha.

16
   Todos os materiais produzidos podem ser acessados na internet, pelo sítio
http://www.tuning.unideusto.org
17
   GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 25
18
   Idem, p. 26


                                                                                     28
A oportunidade de ter reunidos em um só fórum especialistas das distintas áreas
e nacionalidades também foi útil para elaborar metodologias de análise dos elementos
comuns, para então encontrar formas de sintonizar as políticas educacionais dos países
participantes. Simultaneamente, considerou-se a possibilidade de gerar sinergia com o
intercâmbio entre áreas correlatas, que poderiam atuar em parceria para o
desenvolvimento de novos processos de formação.

Exemplos de áreas de formação: Química e História
          Ainda que todas as áreas citadas anteriormente tenham sido objeto de largo
debate no âmbito do projeto Tuning, colocam-se aqui, por questões metodológicas, dois
exemplos de áreas distantes, objetivando com isso abrir possibilidades para
considerações futuras a respeito, sem esgotar portanto a temática.
          Nota-se que as áreas tiveram autonomia durante o Tuning para escolherem as
metodologias mais adequadas para cada campo do conhecimento. Por se tratarem de
indicações, são listados no presente somente elementos do programa pensado para cada
área, visto que debater todos os tópicos demandaria trabalho mais aprofundado. Foram
selecionadas as áreas de Química, na qual teve participação Estela Pereira, e História,
pela maior proximidade conceitual com as ciências sociais das quais se originam a
Administração Pública, campo do autor deste trabalho.

A área de Química
          O que aqui se coloca são resultados expostos em GONZALEZ e WAGENAAR
(2003)19.
                  Habilidades que podem ser desenvolvidas no âmbito da química e que são
                  de natureza geral e aplicável em outros contextos.

                  Sugere-se que todos os programas devem garantir que os alunos estejam
                  familiarizados com os seguintes aspectos principais da química:
                      Principais aspectos da terminologia química, nomenclatura, convenções
                           e unidades.
                      Os principais tipos de reações químicas e as características associadas a
                           eles.
                      Os princípios e procedimentos usados na análise química e a
                           caracterização dos compostos químicos.
                      As características dos diferentes estados da matéria e as teorias usadas
                           para descrevê-los.
                     (...)
                      A relação entre as propriedades do solo e as propriedades dos átomos e
                           moléculas individuais, inclusive macromoléculas.


19
     GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, pp 113-114. Grifos originais do texto, tradução do autor


                                                                                             29
Resultados: competências e habilidades

              Em um nível de bacharelado europeu, é esperado que os estudantes
              desenvolvam um largo leque de competências e habilidades. Elas podem ser
              divididas em três amplas categorias:
                  a) Química relacionada a habilidades cognitivas e de competências, ou
                      seja, relacionadas com as tarefas intelectuais, incluindo a resolução de
                      problemas;
                  b) Química relacionada a habilidades práticas, por exemplo, habilidades
                      relativas à condução dos trabalhos de laboratório; (...)

       Por serem mais específicas do campo da química, detalho aqui de forma mais
aprofundada algo do exposto dentre as competências e habilidades dos itens A e B supra
citados.
                  a. Competências e habilidades cognitivas relacionadas à Química.
                        o Habilidade para demonstrar conhecimento e compreensão de
                            fatos essenciais, conceitos, princípios e teorias relacionados às
                            áreas abaixo.
                        o Habilidade para aplicar o conhecimento e a compreensão à
                            solução de problemas qualitativos e quantitativos de natureza
                            familiar.
                        o Conhecimentos em avaliação, interpretação e síntese de dados e
                            informações químicas. (...)
                        o Competências em apresentação e argumentação de material
                            científico de forma escrita e oral para uma platéia esclarecida.
                        o Habilidades em processamento de dados computacionais
                            relativos à informação e ao conhecimento químico.
                  b. Química relacionada a habilidades práticas.
                        o Conhecimentos em manipulação segura de elementos químicos
                            tendo em conta as propriedades físicas e químicas, incluindo
                            perigos específicos associados ao uso dos mesmos. (...)
                        o Conhecimentos em monitoramento, pela observação e
                            manipulação, de propriedades químicas, eventos e mudanças, e
                            o sistema adequado para armazenamento das informações
                            coletadas.
                        o Habilidade para interpretar dados derivados de observação
                            laboratorial e manipulação nos termos relevantes e relacioná-
                            los às teorias apropriadas. (...)

A área de História
       O campo da História é apresentado no relatório de forma distinta da Química:
“definir pontos de referência europeus comuns para a História é uma tarefa
extremamente delicada” (GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 147). Considera-se
que as formas de desenvolvimento e transmissão do pensamento da História são
bastante distintos de um para outro país europeu. Portanto, o trabalho teve início ao
identificarum “núcleo curricular” para a História, questionando a própria adoção do
termo devido à pluralidade política e cultural dos contextos locais. Assim, foram
pensados elementos da formação para que um estudante de história pudesse, por sua


                                                                                           30
conta, continuar estudando a disciplina para complementar a formação recebida.
Chegou-se então à idéia de que não se pode falar de um currículo simplificado, mas sim
de “currículos básicos, no plural”.
          Também concluiu-se que “cada sistema nacional deve ser visto como um todo
coerente, em que a ordem, o conteúdo, o processo de ensino-aprendizagem e os métodos
de avaliação estão relacionados uns aos outros”. Notou-se ainda a importância de
“ressaltar as vantagens que o estudo de História oferece à sociedade”, intencionando
inserir a área entre os conteúdos transversais dos cursos de graduação. Entretanto, ainda
os debates tenham considerado a amplitude do campo do conhecimento, notou-se que
alguns elementos já existentes no cursos deveriam “aparecer em qualquer proposta de
currículo: isto não seria apenas o mínimo denominador comum, mas sim ratificar um
acordo quanto aos conteúdos básicos necessários”.
          Constatou-se ainda que outras disciplinas e competências são “essenciais ou
convenientes” para a formação de um historiador, em especial para a formação de uma
mentalidade crítica: a língua materna, língua estrangeira, Filologia, Arqueologia e
Ciências Sociais são dadas como exemplos. Além disso, foi considerado como essencial
o “uso de métodos de ensino que estimulem as capacidades”, como “a habilidade de
trabalho em equipe e a capacidade de organizar projetos”, e outras competências
transversais do estudo da História, como escrever e falar bem e precisão e honestidade
intelectual.
          Por subjetivos que possam ser, são citados aqui alguns dos elementos listados
como de conhecimentos e habilidades específicas para a área de História20.
                     1. Consciência crítica da relação entre os eventos e processos atuais e do
                         passado.
                     2. Consciência das diferenças nas perspectivas historiográficas de
                         diferentes períodos e contextos.
                     3. Consciência e respeito dos pontos de vista resultantes de outras origens
                         nacionais ou culturais. (...)
                     7. O conhecimento detalhado de um ou mais períodos específicos do
                         passado humano. (...)
                     11. Capacidade para ler textos historiográficos ou documentos originais em
                         outras línguas, para resumir e transcrever textos em catálogos
                         informativos, conforme apropriado. (...)
                     15. Conhecimento e capacidade de usar ferramentas específicas necessárias
                         para o estudo dos documentos de períodos específicos (por exemplo,
                         epigrafia e paleografia). (...)
                     17. Conhecimento de línguas antigas. (...)
                     19. Conhecimento da própria história nacional.
                     20. Conhecimento da história européia, numa perspectiva comparativa.

20
     A relação completa encontra-se em GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 158-159


                                                                                             31
21. Conhecimento da história da integração européia. (...)
                     23. Consciência e capacidade de usar ferramentas de outras ciências
                         humanas (por exemplo, literatura crítica, história da linguagem, história
                         da arte, arqueologia, antropologia, direito, filosofia, etc). (...)
                     25. Capacidade para definir temas de pesquisa adequados para contribuir
                         para o conhecimento e o debat historiográficos. (...)
                     29. Habilidade para comentar, fazer anotações ou editar textos e
                         documentos corretamente, de acordo com os cânones críticos da
                         disciplina.
                     30. Conhecimentos de didática da história.

Uma Lei de Diretrizes e Bases para o Espaço Superior Europeu
          Nota-se, pelos exemplos das áreas de História e Química, claramente a intenção
de encontrar denominadores comuns para os diversos campos do ensino superior. Uma
leitura mais atenta aponta para princípios presentes na Lei 9.394/96, também conhecida
no Brasil como Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Em seu artigo
26, a LDB estabelece normas basilares para a formação nos níveis fundamental e médio,
por exemplo no parágrafo 4º quando define que “o ensino da História do Brasil levará
em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo
brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia”.21
          O capítulo IV da LDB (“Da Educação Superior) resume para o Brasil aquilo que
Bolonha pensou para o espaço europeu no que tange à definição dos conteúdos
abordados nos cursos. Exemplo é o inciso IV, que define que o ensino superior
brasileiro deva “estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular
os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com
esta uma relação de reciprocidade”22.
          Ainda que não tivesse força de lei européia, deduz-se que o projeto Tuning tenha
sido uma forma de gerar doutrina acadêmica para os campos de formação superior,
balisando os debates nacionais.




21
     BRASIL, Lei 9394/96
22
     Idem


                                                                                               32
4) Conclusões
a)      Balanço preliminar de Bolonha em Portugal
        Ainda que o processo de Bolonha ainda esteja em curso, já podemos traçar
algumas tendências. O processo ainda não está concluído e, como educação, provável
que siga com divergências para que possa evoluir. Portanto, continua sendo alterado e
permanentemente avaliado, buscando a melhoria na qualidade do ensino superior
europeu. É o que Estela Pereira ressalta quando afirma que “progressivamente, o
espírito de Bolonha tende a ser cada vez mais integrado na universidade” 23. Pereira
entende que o processo também segue a educação ao longo da vida, cujo conceito é
reafirmado ao considerar que Bolonha segue em constante aprendizado.
        Ao falar da experiência da Universidade do Minho (assim como Aveiro, situada
na região norte de Portugal, com campi em Braga e Guimarães), Montenegro (2009)
levanta algumas das principais atividades inseridas para a modernização do ensino
superior com o Processo de Bolonha, tais como introdução da aprendizagem à distância
com módulos tutoriais, aprendizagem cooperativa, baseada na resolução de problemas.
Montenegro ainda fala da inserção de módulos extracurriculares nos cursos para o
desenvolvimento de competências transversais.
        Montenegro, entretanto, considera alguns aspectos negativos na implementação
de Bolonha24:
            •   Dificuldade de mudar as pessoas e as instituições.
            •   “Objetivos associados ao processo de Bolonha não se constroem por
                decreto”, mas sim por experiência.
            •   A meta de Bolonha para 2010 é um “horizonte temporal demasiado curto
                para se implementar e amadurecer as mudanças”.
            •   Orçamento escasso.
        O caso da Universidade do Minho também é interessante pelo destaque dado ao
envolvimento de estudantes de graduação em projetos de pesquisa. Ressalta-se que,
diferente do Brasil, que tem por princípio constitucional a “indissociabilidade entre
ensino, pesquisa e extensão” 25 no ensino superior, a educação superior européia



23
   PEREIRA, 2009
24
   MONTENEGRO, 2009
25
   BRASIL, 1988, art. 207


                                                                                  33
considera apenas o ensino como parte relevante de um curso de graduação, deixando a
pesquisa como parte integrante somente da pós-graduação.
          Já Ferrão Filipe (2009) apresenta inovações inseridas no IPAM – Instituto
Português de Administração de Marketing. Valendo-se da flexibilidade que uma
instituição direcionada a uma área de atuação permite, foi criada a figura do
“educational trainer”, dedicado a “acompanhar e monitorizar a performance acadêmica
de cada um dos alunos, ao longo da permanência na escola”.
          Filipe apresenta melhoras advindas do modelo Bolonha: interdisciplinariedade,
construção individual da aprendizagem, melhor preparação para o mundo do trabalho e
exigência maior da responsabilidade discente. Entretanto, considera como pontos
negativos o pouco tempo livre e a dificuldade da gestão do tempo entre curso, profissão
e família e, assim como Montenegro, afirma que o método Bolonha nem sempre é
interiorizado pelos docentes de forma igual.
          Ferrari26, por sua vez, destaca que o tempo de avaliação ainda é curto para ter
conhecimento adequado dos diplomados em cursos estruturados com Bolonha.
Entretanto, tece que o maior receio é a respeito da maturidade dos diplomados no
primeiro ciclo em relação ao mercado de trabalho, posto que a formação em dois ciclos
pode ser impeditiva para que alguém tenha boas bases acadêmicas e de experiência para
exercer uma profissão. Por isso considera como fundamental a idéia de aprendizagem
ao longo da vida, que deve estar inserida nos cursos superiores para que os alunos
sempre procurem qualificação. Ferrari ainda realça algumas habilidades importantes
inseridas ou postas em evidência com Bolonha: a importância do trabalho em grupo, a
capacidade de comunicação e a liderança. De acordo com ele, as universidades têm
procurado responder à altura a essas necessidades crescentes.

b)        Balanço em Aveiro
          Seguindo o raciocínio de Ferrari, Estela Pereira apresenta uma preocupação em
abrir a universidade para a educação ao longo da vida. Para ela,
                 Universidade não deve dar formação contínua, mas deve ser ela própria uma
                 universidade que integra todos os públicos na sua formação. Deve abrir
                 formação inicial para pessoas das mais diversas origens27.
          Pereira apresenta a abertura da universidade como um dos grandes desafios da
próxima década, contextualizando que cada vez menos jovens e mais adultos devem
adentrar estar inseridos no ensino superior. Com os novos públicos que buscam manter-
26
     FERRARI, 2009
27
     PEREIRA, 2009


                                                                                       34
se atualizados, a universidade também recicla seus conhecimentos, complementando a
formação também dos docentes. Para tanto, a Universidade de Aveiro já oferece
módulos independentes nos cursos e qualquer pessoa que reúna as pré-qualificações
pode freqüentar esses módulos. A certificação dos módulos, por disciplina cursada,
pode ser utilizada como equivalência de créditos para compor um curso mais longo.
       Quando questionada sobre uma possível criação de cursos noturnos – a exemplo
do que já ocorre no Brasil, para inserir pessoas que precisam trabalhar durante o curso
universitário –, ressalta a dificuldade de fazer com que os professores aceitem lecionar à
noite. Entretanto, afirma que os cursos são flexíveis e que essa inovação ainda é passível
de ser adotada.

c)     Possíveis questionamentos
       Colocam-se, visando reflexões futuras a respeito de Bolonha alguns
questionamentos que vieram à tona quando da realização deste trabalho, mas que não
puderam ser resolvidos, alguns por motivo de necessidade de estudos quantitativos mais
aprofundados e outros que demandam base teórica mais elaborada:
           •   Qual a real capacidade de inserção profissional dos formados no primeiro
               ciclo? A formação de três anos é suficiente para garantir a
               empregabilidade?
           •   Como se dá o financiamento da universidade no âmbito do Tratado de
               Lisboa?
           •   Houve melhoras reais relativas à taxa de evasão nos cursos?
           •   Considerando a autonomia relativa dos departamentos universitários, a
               adoção de Bolonha acontece de forma equilibrada dentro das
               universidades?
           •   Pode-se de fato afirmar que os objetivos basilares que justificaram a
               criação do Processo de Bolonha estejam sendo cumpridos?

d)     Bolonha hoje
       Criado inicialmente por quatro ministros da educação da União Européia, o
Processo de Bolonha segue recebendo adesões de outros países interessados. Quando da
realização do estágio aqui relatado eram 47 os países signatários do acordo, ainda que
nem todos participantes da íntegra do processo (lembrando que cada país define
internamente regulamentação a respeito). Assim, não se pode mais dizer que é somente



                                                                                       35
um tratado europeu: diversas nações asiáticas também já aderiram, fazendo dele um
acordo euro-asiático. A tabela 3 apresenta a lista de todos os países que aderiram a
Bolonha até a realização da conferência de Lovaina (2009).

                          Tabela 3 - Países signatários em 2009
                        Países signatários do Processo de Bolonha
                   Albânia        Dinamarca        Itália       Portugal
                  Alemanha        Eslováquia      Letônia      Reino Unido
                                                                República
                   Andorra         Eslovênia Liechtenstein
                                                                  Checa
                  Armênia          Espanha       Lituânia       Romênia
                   Áustria          Estônia Luxemburgo            Rússia
                 Azerbaijão        Finlândia Macedônia            Sérvia
                   Bélgica           França        Malta          Suécia
                   Bósnia-
                                    Geórgia      Moldávia         Suiça
                 Herzegovina
                  Bulgária           Grécia     Montenegro       Turquia
                 Cazaquistão        Hungria      Noruega         Ucrânia
                                                   Países
                   Chipre            Irlanda                    Vaticano
                                                  Baixos
                   Croácia          Islândia      Polônia
       A expansão do espaço europeu de ensino superior para a Ásia é uma
demonstração do poderio europeu para influenciar a cultura e a educação para além das
fronteiras da União Européia, o que segue de acordo com os princípios da Estratégia de
Lisboa, que colocou como objetivo fazer da Europa “a economia baseada no
conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo”, aumentando assim o grau de
influência sobre os outros países. Exemplo disso é uma potência política e militar como
a Rússia adotando um sistema europeu, colocando-se como parceira da União Europeia.
Outras nações do antigo bloco socialista também encontraram em Bolonha uma forma
de inserção na sociedade européia. É o caso de Azerbaijão, Cazaquistão, Geórgia e
Ucrânia, dentre outros.
       Nota-se uma adoção de Bolonha em níveis bastante distintos de acordo com o
país envolvido: mais avançado nos Países Baixos e com mais demora em países como o
Reino Unido. Assim, a tendência é de postergar o prazo para cumprimento das metas
propostas, visando melhor nivelamento das estruturas curriculares.
       Entretanto, os maiores gargalos não se dão exatamente em adotar ou não adotar
Bolonha, mas sim nas diferentes experiências do processo em curso. Para Hortale e
Mora (2004), “as universidades européias ainda são muito dependentes dos docentes e
dos estudantes para a tomada de decisões (...) sem eles é impossível empreender alguma



                                                                                    36
reforma”. O argumento é utilizado para afirmar que ainda é necessária maior
participação docente e estudantil para que as mudanças institucionais sejam assimiladas,
pois a comunidade acadêmica européia, habituada à participação no processo decisório,
segue distante dos objetivos de Bolonha. Consequência disso é a morosidade para
alterar as estruturas universitárias, que carecem de reformas basilares para a inserção
qualificada de novos métodos de aprendizagem e no desenvolvimento de cursos
multidisciplanares. Parte disso também se deve à tradição das universidades, onde o
processo de criação de uma nova área do conhecimento frequentemente é combatido
pelas áreas mais tradicionais.
       Quando da realização do estágio que serve de base para este relatório, a crise
financeira que desvalorizou o Euro e levou diversas instituições empresariais à falência
ainda estava em seu início e não era possível um diagnóstico de como a situação
alteraria os acordos europeus. Todavia, o debate do financiamento da educação superior
européia já estava em pauta, e ainda é uma incógnita saber como um processo da
dimensão de Bolonha será influenciado pelo contexto político-econômico dos países
signatários. Mas um indicador relevante e que merece mais atenção é a necessidade de
aumentar os recursos financeiros das universidades, o que pode ser feito tanto pela via
pública quanto pela iniciativa privada. Hortale e Mora destacam que
               não é possível que com o mesmo nível de gasto atual da educação superior
               européia, que é a metade daquele dos EUA, possa-se alcançar um nível de
               qualidade semelhante ao desse país. No entanto, a insistência dos estudantes
               europeus em considerar a educação superior um bem público (quando
               tecnicamente é um bem semipúblico) não facilita o aporte financeiro de fontes
               privadas.
        O processo de Bolonha ainda não está totalmente implementado, fazendo das
conclusões deste trabalho mais suposições que prognósticos. Ainda é cedo para que as
reformas feitas como consequência do Processo de Bolonha sejam avaliadas pois o
momento ainda é de correção dos rumos. Contudo, as entrevistas feitas com estudantes
europeus intercambistas na Universidade de Aveiro fazem crer que a mudança na
duração dos cursos não foi útil para melhorar a empregabilidade, pois dificilmente um
formado em curso de 3 anos é capaz de desenvolver as mesmas atividades profissionais
de alguém que tenha estudado por 5 anos. Uma possível consequência disso é o
abandono sistemático da universidade tão logo o primeiro ciclo seja concluído, fazendo
com que poucos estudantes concluam a formação em dois ciclos. Um estudo mais
aprofundado que avalie a média de anos de escolaridade antes e depois de Bolonha pode




                                                                                         37
chegar à conclusão de que a divisão por ciclos tirou estudantes dos cursos, o que seria
um indicador de fracasso do processo.
       Outra dificuldade é fazer com que as disciplinas cursadas em um país sejam
tidas como equivalentes de formação no país de origem do estudante. A adoção dos
créditos ECTS facilitou a creditação dos cursos pelo critério formal de carga horária.
Porém a divergência de cada universidade no nível de cobrança para aprovação nas
diversas disciplinas ainda gera confusão nos estudantes, que se sujeitam a dupla
avaliação dos conhecimentos adquiridos: uma enquanto cursa a disciplina e outra para
que a disciplina tenha equivalência na universidade de origem.
       Apesar das dificuldades enfrentadas, alguns sucessos são evidentes no que tange
à integração de universidades por meio de redes de pesquisas. Diversas instituições
européias estão abarcadas em projetos de mestrado europeu, o chamado Erasmus
Mundus. Tais programas são formados por consórcios de universidades, de modo que
cada semestre do curso é feito em uma instituição. Essa é uma estratégia exitosa para
demonstrar como as universidades podem crescer de forma cooperativa, ampliando o
intercâmbio de pesquisadores e também de publicações em revistas indexadas.
       Experiências como as redes de pesquisa, intercâmbio estudantil e a formação de
um currículo básico adaptável às particularidades locais são pontos elementares para se
considerar a sociedade do conhecimento que se desenha e que pretende se desenvolver
por meio da tecnologia. São também formas de adaptar experiências milenares de
algumas das instituições envolvidas, mesclando seus ideais acadêmicos com os de
universidades mais recentes.
       Assim, Bolonha segue delineando um padrão de sistema internacional de
identidade de ensino superior voltado para o mercado de trabalho, ainda que atualmente
seus projetos ainda estejam muito atrelados aos países europeus. Mas é certo, contudo,
que o Processo de Bolonha ainda está em seu início e que seu curso ainda carece de
maturidade para ser absorvido pelos governos, pelas instituições mais principalmente
pelas pessoas que constituem a sociedade contemporânea.




                                                                                    38
5) Bibliografia
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  Sorbonne, Paris, 1998.
  AZEVEDO, M. N. A. A integração dos sistemas de educação superior na Europa: de
  Roma a Bolonha ou da integração econômica à integração acadêmica. In Educação
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  FERRARI, António B. Aprofundar Bolonha – conclusões do ciclo de seminários e
  propostas de linhas de actuação prioritárias. Apresentação feita em O Processo de
  Bolonha em Portugal – Presente e Futuro. Aveiro, 2009
  FERRÃO FILIPE, António. Relatório de concretização do Processo de Bolonha:
  apresentação do caso do IPAM. Apresentação feita em O Processo de Bolonha em
  Portugal – Presente e Futuro. Aveiro, 2009


                                                                                       39
GONZÁLEZ, Julia; WAGENAAR, Robert. Tuning Educational Structures in Europe –
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http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
73302004000300014&lng=pt&nrm=iso (acesso em 22 de abril de 2009)
MONTENEGRO, Irene. Relatório de concretização do Processo de Bolonha:
apresentação do caso da Universidade do Minho. Apresentação feita em O Processo de
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MORAES, Maria Célia Marcondes de. O processo de Bolonha vis a vis a globalização de
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                                                                                    40

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O processo de bolonha e a universidade de aveiro: estudo exploratório

  • 1. unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara - SP Arie Storch O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIIVERSIIDADE DE PROCESSO DE OLONHA E A N VERS DADE DE AVEIIRO: ESTUDO EXPLORATÓRIIO VE RO ESTUDO EXPLORATÓR O ARARAQUARA – SP. 2010
  • 2. ARIE STORCH O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIIVERSIIDADE PROCESSO DE OLONHA E A N VERS DADE DE AVEIRO: ESTUDO EXPLORATÓRIO DE VEIRO ESTUDO EXPLORATÓRIO Relatório de Estágio (RL), apresentado ao Departamento de Administração Pública, da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Administração Pública. Orientador: Prof. Dr. José Vaidergorn 2
  • 3. “Interroga a propriedade: De onde vens? Pergunta a cada idéia: Serves a quem?” Bertolt Brecht Elogio do revolucionário 3
  • 4. Sumário Agradecimentos ................................................................................................................ 5 Resumo ............................................................................................................................. 6 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no trabalho .......... 8 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no trabalho .......... 8 1) Introdução................................................................................................................. 9 a) Contexto – o processo em curso ........................................................................... 9 b) Condições para a realização do estágio .............................................................. 10 2) O processo de Bolonha ........................................................................................... 13 a) Um precedente: o programa Erasmus................................................................. 13 b) 1998 - Sorbonne ................................................................................................. 14 c) 1999 - Bolonha ................................................................................................... 15 d) 2001 - Praga........................................................................................................ 17 e) 2003 - Berlim...................................................................................................... 19 f) 2005 – 2009 – Bergen, Londres e Lovaina......................................................... 22 g) Bolonha: um processo em formação .................................................................. 22 3) Bolonha na prática: Europa e Aveiro ..................................................................... 23 a) Dinamismo local de Aveiro................................................................................ 24 b) Reconhecimento de Bolonha: comparável sem ser igual ................................... 25 c) O projeto Tuning: estruturação do processo....................................................... 26 4) Conclusões.............................................................................................................. 33 a) Balanço preliminar de Bolonha em Portugal...................................................... 33 b) Balanço em Aveiro ............................................................................................. 34 c) Possíveis questionamentos ................................................................................. 35 d) Bolonha hoje....................................................................................................... 35 5) Bibliografia............................................................................................................. 39 4
  • 5. Agradecimentos De início, agradeço à família, porto seguro que me entende e apóia na busca dos objetivos. Pelo investimento em educação que o judaísmo sobrevive às crises. Aos colegas da Faculdade de Ciências e Letras, a todos os que conheci dentro do Programa de Educação Tutorial, início do trabalho de estudo da política educacional de ensino superior. Diversas reflexões começaram aí, até pensando nos exemplos e dificuldades internos. Aos Erasmus, mesmo àqueles que não eram Erasmus, mas que eram tratados como tal ou se identificam. Em especial, Aline, Mogli, André, Tanja, Chiara, Antonia, Larisse, Mateusz, Karina, Volkan, Alex, Auste, Patrícia, Alex, Rhaul, Ivona. Ao Manuel e à Verônica pelo intensivo de política e cultura galega e ibérica quando moramos juntos, dicas valiosas para seguir em frente. À Sara e ao Adriano, estimulando com bibliografia e com debates acalorados quanto às condições de estudo nos países irmãos de língua portuguesa. À Universidade de Aveiro, nomeadamente à Secção Autônoma de Ciências Sociais Jurídicas e Políticas, pela acolhida durante o estágio e um ano antes do estágio. Agradecimento especial às professoras Maria Cristina Sousa Gomes e Maria Luis Pinto, que me abriram a oportunidade de inovar com o estágio curricular em Portugal. E também aos professores Carlos Jalali, Rui Santiago e Filipe Teles, que me apresentaram cultura política e educacional portuguesa nas disciplinas cursadas e em conversas. Ao Pedro e à Márcia, da Graduação da FCL, pela paciência e pelo apoio na resolução dos problemas. E ao Fernando nas consultas jurídicas. Aos amigos da faculdade, Fernanda, Daniel, Luis Fernando, para quem eu telefonava de saudades. Aos amigos do Limoeiro pelo aprendizado na vida em república. Ao professor José Vaidergorn, estímulo na vida intelectual. Ao Mestre Gabriel. 5
  • 6. RESUMO O estudo aqui apresentado foi construído como resultado de estágio curricular em Administração Pública realizado na Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídicas e Políticas na Universidade de Aveiro, Portugal. Por meio do estudo do Processo de Bolonha, que envolve 47 países europeus e asiáticos, trata-se de um relatório das experiências do estágio. Por meio de método qualitativo, principalmente pelo estudo da bibliografia originária em inglês, mas também de outras análises e debates, foi feito um mapeamento das atividades desenvolvidas desde a gênese do Processo de Bolonha até a época de realização do estágio. Foram objetivos do estudo a aquisição de uma visão global do Processo de Bolonha e conseqüentemente da estrutura de ensino superior européia, em específico no caso da Universidade de Aveiro. O projeto contou com uma reflexão crítica quanto à realidade encontrada, questionando iniciativas do projeto estudado. Também teve como objetivo a criação de material sobre o Processo de Bolonha em português, focada no público brasileiro. Palavras – chave: Processo de Bolonha. Ensino superior. Reforma educacional. Europa. 6
  • 7. Lista de TABELAS Tabela 1 - participantes do Tuning por país ................................................................... 27 Tabela 2 - Especialistas no Tuning por área e país......................................................... 27 Tabela 3 - Países signatários em 2009............................................................................ 36 7
  • 8. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS por ordem de aparição no trabalho PET – Programa de Educação Tutorial EHEA – European Higher Eduacion Área, ou Espaço Europeu de Ensino Superior ECTS – European Credit Transfer System EUA – Associação Européia das Universidades ESIB - Associações Nacionais de Estudantes na Europa EURASCHE - Associação Europeia das Insituições de Ensino Superior Fundo Monetário Internacional (FMI) Organização Mundial de Comércio (OMC). UE – União Européia UA – Universidade de Aveiro 8
  • 9. 1) Introdução a) Contexto – o processo em curso Ao visar a construção de um espaço europeu de ensino superior que articulasse as universidades e os institutos de pesquisa dos vários países da Europa, bem como seus laboratórios e pesquisas, o Processo de Bolonha impôs, juntamente com as benesses das parcerias, mudanças radicais na estrutura das instituições que dele participam. Tais mudanças foram idealizadas para facilitar a adoção do Processo, com programas específicos e expansão de outras políticas de aprofundamento das relações entre os países, em especial da União Europeia, mas que também abre portas para que países que não façam parte do bloco compartilhem destes interesses comuns. Assim, além de determinar uma formação comum dos quadros acadêmicos da União Europeia, o processo garante que esta tenha influência na formação de outros países, potenciais membros do bloco ou não. Diversos foram os objetivos traçados para a concretização do Processo, tais como maior mobilidade docente e discente, garantia de empregabilidade dos formados nas instituições de ensino superior europeias e uniformização na formação das universidades, como forma de garantia de critérios de comparação da qualidade dos diferentes cursos. Histórico e justificativa do projeto Nascido em meio a um intercâmbio estudantil, este trabalho é reflexo da vontade do autor de se embrenhar pelos estudos de política educacional. Trata-se, antes, de uma experiência de intercâmbio estudantil que se aprofundou pelo querer de transformar em acadêmico um trabalho de cunho pessoal. Assim, o presente relatório não é somente sobre o estágio feito, afinal a própria existência do estágio se deveu ao intercâmbio que já estava em curso. Dentre os objetivos do estágio curricular de Administração Pública da UNESP1, são aqui citados dois, expressos no art. 3º: I. Aprofundar os conhecimentos já adquiridos, à luz de experiências concretas de trabalho, propiciando uma oportunidade de articulação entre os conceitos e técnicas apreendidas durante o curso, com a prática administrativa desenvolvida em organizações ou instituições públicas, governamentais ou não; (...) 1 Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, 2008 9
  • 10. III. Aprofundar os conhecimentos em uma área ou setor especializado de atividade do setor público, governamental ou não, elegendo um tema ou problema específico para estudo, de forma a poder operacionalizar os conceitos apreendidos durante o curso. Sendo o trabalho de conclusão de curso, foi feita uma reflexão sobre os rumos que o autor tomou durante o curso. Ainda no primeiro ano a atividade começou na diretoria acadêmica do Centro Acadêmico do curso. Simultaneamente, aconteceu a entrada como bolsista no grupo PET Administração Pública, programa no qual ganhou renome nacional pelo trabalho em prol de um ensino superior de qualidade. Com isso, foi eleito representante discente do programa no Comitê Local de Acompanhamento, órgão colegiado responsável pelo acompanhamento e avaliação dos grupos dentro da Reitoria da Universidade, e ainda convidado para proferir conferências e participar de debates em diversas universidades sobre a atuação dentro do órgão e sobre a avaliação do programa. Ao deixar o vínculo formal com o grupo PET, foram cursados dois semestres da graduação na Universidade de Aveiro, em Portugal, como intercambista na Licenciatura em Administração Pública e no Mestrado em Ciência Política, ambos os cursos estruturados de acordo com o Processo de Bolonha. Haja vista a oportunidade de continuar o trabalho iniciado ainda no primeiro ano do curso, deu-se a opção de realizar um estudo exploratório do Processo. Com a consciência de que é uma política de nível europeu, o que por si só já acarretaria grande trabalho de pesquisa, o trabalho teve como foco obter uma visão global do Processo e das mudanças em curso no Ensino Superior Europeu. O autor do trabalho percebeu tão logo começou a cursar disciplinas na Universidade de Aveiro que o estímulo à leitura de bibliografia estrangeira é bem maior do que o encontrado na graduação no Brasil. Então, também como forma de aprendizado de idiomas estrangeiros, foi dada prioridade neste trabalho à leitura de artigos em inglês, ainda que a contextualização do Processo de Bolonha ao estudo de caso da Universidade de Aveiro exigisse bibliografia também em português. Os textos originais em inglês que aqui são citados foram traduzidos pelo autor deste relatório. b) Condições para a realização do estágio No início do estágio foi feito um acordo entre o orientador do relatório docente da FCL, professor doutor José Vaidergorn, o estudante propositor do trabalho e a docente Maria Cristina Rocha Pinto, da Universidade de Aveiro, no qual ficou decidido 10
  • 11. que a orientação do estágio ficaria por conta da docente portuguesa e caberia ao docente brasileiro a orientação da feitura do relatório e da forma do estágio, principalmente nos trâmites relativos à inovação de se fazer o estágio em país distinto do Brasil. O projeto do estágio aqui relatado previa uma abordagem distinta da que foi possível realizar no andamento do estágio propriamente dito. O primeiro motivo para a mudança do enfoque foi o ambiente encontrado para a realização do mesmo, posto que, por mais bem intencionada que estivesse, a orientadora designada para acompanhar localmente o autor do trabalho não foi capaz de fazer a orientação de forma adequada. Isso se deve ao fato de a orientadora não estar inteirada diretamente quanto ao assunto do projeto, mas também pela inexperiência em orientar um trabalho de instituição estrangeira, com exigências distintas daquelas encontradas nas universidades portuguesas. Assim, perdeu-se muito tempo para encontrar os pontos de encontro entre o estágio ao qual ela estava habituada e o estágio curricular exigido em Administração Pública na UNESP. Outro motivo se deve ao tema escolhido para o trabalho. O Processo de Bolonha é um assunto ainda novo na própria União Europeia e são poucos os trabalhos acadêmicos feitos para analisar o processo. Desta forma, o material utilizado nos estudos é praticamente em sua íntegra primário, dificultando uma abordagem de curto prazo feita com as condições de um estágio curricular por um estudante de graduação. Por outro lado, se as universidades europeias ainda estão aprendendo a lidar com Bolonha, considerou-se que qualquer contribuição, genérica que fosse, já seria esclarecedora para o autor do trabalho, servindo também como forma de divulgar o aprendizado em nível europeu para a comunidade acadêmica brasileira. Assim, o trabalho se pautou por uma leitura mais genérica do Processo de Bolonha, de forma que pudesse ser produzido ao final um material que apresentasse Bolonha à comunidade acadêmica de origem do autor, basicamente os estudantes de Administração Pública e dos demais cursos de graduação da UNESP. Desta forma, pelos motivos acima expostos, o trabalho aqui apresentado está sujeito a problemas estruturais. A análise aqui feita é fruto de incontáveis entrevistas feitas informalmente pelo autor com estudantes europeus intercambistas na Universidade de Aveiro, pois considera-se que diversas conversas contribuíram para a formação do ponto de vista do autor, contextualizando Bolonha aos países participantes. Além das entrevistas com os estudantes, também foram feitas conversas informais com docentes da Universidade de Aveiro durante o curso das disciplinas feitas no período de estudos. 11
  • 12. Foi feita, durante a realização do estágio, uma longa entrevista com Estela Pereira, professora catedrática e vice-reitora da Universidade de Aveiro. A entrevista estava prevista para ser feita ainda no início do período do estágio, entretanto, por motivos de agenda da entrevistada a mesma só pôde ser realizada na última semana do estágio. Posto que quando da realização da entrevista o autor do trabalho já tinha boas noções do Processo de Bolonha, o encontro foi mais uma conversa do que uma entrevista, e, dado o denso conteúdo da gravação, a mesma foi praticamente parafraseada no capítulo do trabalho referente à implantação de Bolonha na Universidade de Aveiro. 12
  • 13. 2) O processo de Bolonha Assinada em junho de 1999, a Declaração de Bolonha é, na verdade, um processo de sucessivos encontros, de modo que para compreender o processo como um todo seja importante notar as demais reuniões. Conferências têm sido realizadas desde 1998, e assuntos específicos são tratados em cada uma entre os ministros participantes. O processo é, então, construído e acompanhado em cada uma dessas conferências. Ainda assim, o percurso inicial, notadamente entre a Declaração de Sorbonne (1998) e a de Praga (2001), passando pela de Bolonha (1999), é o que delineou mais firme o Processo, sendo portanto maior objeto de estudo. a) Um precedente: o programa Erasmus Tendo iniciado em 1987, O programa Erasmus (sigla para European Community Action Scheme for Mobility of University Students, mas também referência à figura do acadêmico e teólogo Erasmo de Roterdã) é uma das várias iniciativas européias para a integração harmônica de seus cidadãos. Consiste em realizar parte dos estudos universitários em uma universidade de outro país, por um período de 3 a 12 meses. Além de abranger os países-membros da União Européia (UE), o Erasmus inclui instituições de outros países, totalizando 31 os países-membros da rede. Assim, um estudante inglês pode ir para a Romênia, um grego vai para a Suécia, um esloveno vai para a Espanha. Ao mesmo tempo em que proporciona a vivência de novas culturas, o Erasmus é também uma forma de estímulo à mobilidade, já que um estudante quando em Erasmus entra em contato com pessoas de diversas nacionalidades e desenvolve uma rede de relacionamentos que ultrapassa em muito aquela que cada um tem em seu próprio país. Para Inês Costa Pessoa (2003), Para além de proporcionar uma experiência de vivência no exterior e de contacto com um novo habitat, permitirá a estimulação do sentimento de pertença a um espaço supranacional. Além do convívio diário, os estudantes Erasmus têm aulas do idioma oficial local, e diversos deles valorizam bastante essa experiência. Fato é que, quando a UE estava sendo criada, os países-membros e a comunidade internacional perceberam que, se a Europa continuasse em guerra, em pouco tempo não haveria mais Europa. Então, a forma de sobrevivência e de preservar a paz foi integrar os países a partir dos interesses comuns. O respeito às culturas locais é um dos princípios básicos, de modo que hoje a 13
  • 14. Europa tem 27 estados-membros e 23 idiomas oficiais2. Ainda que as minorias locais sigam procurando formas de autonomia (vide esforços na Galícia, Catalunha e em outras regiões para preservar os idiomas locais), somente considerar as maiorias culturais já dá margem para grande gama de pensamentos distintos. Desenvolver ou resgatar valores europeus é também uma forma de garantir a sobrevivência cultural, e investir no público univesitário é uma estratégia que tem gerado resultados visíveis. Desde que foi criado, mais de 1,2 milhão de estudantes já passaram pelo programa, sendo que atualmente mais de 2000 estabelecimentos de ensino superior participam da rede Erasmus3. Quem quiser participar do programa Erasmus deve participar de um processo seletivo dentro da própria instituição, de acordo com as vagas existentes para cada curso ou para cada destino. O processo seletivo pode incluir noções do idioma do destino, inglês ou francês, avaliação quanto aos hábitos sócio-culturais, tais como a facilidade de adaptação em uma terra estranha. Assim, os estudantes Erasmus não são propriamente representativos de seus países de origem, pois o que os faz Erasmus são as características que cada um tem em comum com os demais, dentre elas a vontade de conhecer outras culturas e de romper um possível isolamento cultural. Um relato de experiências como Erasmus na Universidade de Aveiro foi produzido em forma de documentário por Matthias Noé e Paulina Toporowska, quando preparavam material para divulgação do programa em seus países 4 . O autor deste relatório foi um dos entrevistados. Entretanto, como o documento tratava somente de estudantes europeus, a entrevista foi justificada pela ascendência polonesa. Outra experiência relevante relativa ao programa Erasmus, mas referente ao mestrado, é o Erasmus Mundus, relatado em Storch (2008). b) 1998 - Sorbonne Sabe-se que o processo teve início em 1998, quando ministros responsáveis pelo ensino superior da França, Alemanha, Itália e Reino Unido se reuniram na França para assinar a Declaração de Sorbonne. As maiores economias européias trataram, na ocasião, de iniciar o trabalho, lançando algumas idéias-chave para que o processo tivesse continuidade. Foi detectada a necessidade de compatibilidade entre os cursos dos 2 Exemplos da diversidade linguística européia podem ser vistos no sítio oficial da União Européia: http://europa.eu/languages/ 3 PESSOA, 2003 4 O vídeo (em inglês) pode ser visto em http://ariestorch.multiply.com/video/item/39/Erasmus_in_Aveiro 14
  • 15. diversos países, posto que, com a mobilidade européia crescendo, a tendência seria de cada vez mais ter um diploma de um país reconhecido em outro. De acordo com a declaração assinada por ministros da França, Itália, Reino Unido e Alemanha, O reconhecimento internacional e a atração potencial dos nossos sistemas estão diretamente relacionados com a sua compreensão interna e externa. Um sistema, em que dois ciclos principais, pré-graduado e graduado, deverão ser reconhecíveis para comparação e equivalência internacional, parece estar emergindo5. O princípio básico presente em Sorbonne é proposto por Jacques Attali, ex- presidente do Banco Europeu para Reconstrução e Desenvolvimento e à época assessor do governo francês, que declara que Não se pode ter a livre circulação de mercadorias, de capitais, de pessoas, de idéias (...), e manter uma situação em que não é mesmo possível comparar o valor dos diplomas expedidos pelas universidades dos países membros da União Européia (...). Não se pode ter a Europa do emprego sem a Europa da Educação. Sem uniformizar seus sistemas, os países da Europa deverão decidir a respeito de uma certa harmonização dos cursos e dos diplomas e definir um modelo europeu específico, nem burocrático nem submetido ao mercado.6 Outras proposições foram lançadas em Sorbonne, tais como a noção de que a melhoria dos cursos teria reflexo direto na melhoria da competitividade das economias dos países envolvidos. c) 1999 - Bolonha Em 1999, já na cidade que dá o nome para o processo, ministros da área de educação de 29 países europeus se reúnem para a assinatura de um documento que estabelece um Espaço Europeu de Ensino Superior até o ano de 2010, visando harmonizar e uniformizar os sistemas de ensino superior de todos os países envolvidos para nivelamento em níveis europeus. Lançando o conceito de Europa do Conhecimento, o documento retoma a Declaração de Sorbonne ao afirmar que esta “salientou o papel essencial das universidades no desenvolvimento das dimensões culturais européias”, mas indo além da reunião anterior ao também definir o que se queria para um Espaço Europeu de Ensino Superior (EHEA, na sigla em inglês). Desta forma, a Declaração de Bolonha instituiu metas “para promover a empregabilidade dos cidadãos europeus e a competitivdade internacional do sistema de ensino superior europeu”7. Foi definida então a adoção de um sistema de graus baseado em dois ciclos principais, sendo eles estudos pós-graduados e graduados. Estabeleceu-se 5 ALLEGRE, BERLINGUER, BLACKSTONE e RÜTTGERS, 1998 6 ATTALI, 1998, apud AZEVEDO, 2007 7 Bolonha, 1999 15
  • 16. para tanto que o primeiro ciclo tivesse duração mínima de três anos, equivalendo à formação básica do ensino superior e sendo pré-requisito para o curso do segundo ciclo. Para possibilitar a equivalência de créditos cursados, foi estabelecido o sistema ECTS (European Credit Transfer System), já existente então nos programas de mobilidade estudantil Socrates e Erasmus. Os ECTS consideram, além das horas de aula, as horas estimadas de estudo fora da sala de aula. Desta forma, podem entrar no mesmo sistema diferentes metodologias de ensino, desde as que cobram maior presença em aula às que têm um ensino semi-presencial, mas que compensam as poucas aulas com estudo individual. É lançado também o conceito de aprendizagem ao longo da vida (longlife learning) ao considerar que uma experiência de voluntariado ou em grupo de estudos, por exemplo possa contar créditos para um curso, “contanto que estes sejam reconhecidos pelas respectivas universidades receptoras” (idem). Bem como as demais decisões, o sistema de graus não foi uma lei, mas sim uma diretriz. Não ficou instituído um modelo único que deveria ser seguido, ainda que a maioria dos países tenha optado por implementar o chamado modelo “3+2”, consistindo de três anos de formação inicial e dois anos de formação pós-graduada. É esse o sistema adotado por Portugal, onde o primeiro ciclo é denominado “licenciatura”, e o segundo, mestrado. Alguns cursos específicos seguem tendo uma formação mais longa, com até seis anos, como é o caso de medicina. Outros países adotaram estruturas de curso como “4+1” e cursos intermediários para entrar no mercado de trabalho. Ficou também decidido que o ano curricular pleno teria 60 créditos ECTS, cabendo às universidades a decisão de quantos créditos ECTS cada disciplina valeria. De acordo com relatório do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior de Portugal (CNAVES, 2001), alguns países já tinham tradição na estrutura de graus que estava sendo proposta. Dentre eles, destacam-se Reino Unido, Irlanda e Malta. Outros não tinham tanta tradição, mas já tinham o sistema implementado com estabilidade, caso específico da Escandinávia (Suécia, Noruega e Dinamarca) e da Islândia. Já nos países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia) e na Itália o sistema foi implantado após grande reforma do sistema educacional. O sistema de ciclos é uma das mudanças mais criticadas em Bolonha. Ao instituirem uma formação básica e outra complementar, mais avançada, os países signatários também se isentavam da responsabilidade de financiar todo o curso superior. Com a justificativa de criar o Espaço Europeu de Ensino Superior, optaram pela flexibilização dos cursos, mas também como conseqüência pela precarização. 16
  • 17. De acordo com Correia (2009), o grande desafio do sistema de ciclos é manter a qualidade do curso. Ao analisar o campo das engenharias em Portugal, ele afirma que em três anos de formação básica só é possível formar engenheiros técnicos, enquanto que para formar engenheiros de concepção e de projeto são necessários mais dois anos. Para ele, “trata-se no fundo de procurar um equilíbrio entre a empregabilidade a curto prazo e a empregabilidade a longo prazo”, já que, se em três anos se tem a formação de técnico, a mesma não é suficiente para projetos mais avançados de engenharia. Correia (2009) segue a crítica à diminuição do Estado no financiamento do ensino superior ao levantar o atraso português em relação aos outros países: A reestruturação do sistema de graus acadêmicos não pode ser transformada apenas numa ocasião para a redução da responsabilidade do Estado no bem público e estratégico que é a Educação Superior. Temos que assegurar aos nossos jovens as mesmas oportunidades dos seus colegas Europeus. Em outro trabalho, Correia (2004) afirma que A formação de 2º grau em Engenharia (seja 3+2 seja 4+1) tem que ser considerada tendencialmente gratuita como a do 1º grau. Se Portugal quiser recuperar o atraso e ser um ator interveniente na sociedade do conhecimento, a nossa Engenharia tem que se manter ao melhor nível, e isso só será possível com uma freqüência numerosa do 2ºciclo de formação. Só com custos, para os estudantes, semelhantes aos do 1º grau, será isso possível. É aliás o que está a acontecer por essa Europa fora. A reestruturação do sistema de graus acadêmicos não pode ser transformada apenas numa ocasião para a redução da responsabilidade do Estado no bem público e estratégico que é a Educação Superior. Moraes (2006) vai além e debate até mesmo que a mudança de foco no financiamento denota o seguimento de uma agenda proposta por organismos multilaterais como Fundo Monetário Internacional (FMI) e Organização Mundial de Comércio (OMC). A autora levanta a idéia de que “há inquietações com a possibilidade de a redução prevista na duração de alguns cursos implique em menos financiamento às instituições e que os custos das formações recaiam sobre os alunos e suas famílias” (p. 188). Outros aspectos citados na declaração são a promoção da mobilidade de estudantes, de docentes e de pesquisadores e o estabelecimento de maior cooperação européia na avaliação da qualidade de ensino, visando o desenvolvimento de critérios e metodologias comparáveis. d) 2001 - Praga Uma crítica marcante até então era de que o processo que estava em gestação contava somente com uma parte dos envolvidos no processo. Nomeadamente, somente ministros participaram das negociações iniciais, sendo que o processo já estava 17
  • 18. começando a afetar as universidades dos países signatários. Diversas críticas foram feitas entre a reunião de Bolonha e a seguinte, dois anos depois em Praga, destacando os problemas que o processo já em curso tinha. Ken Edwards (2001) afirma que, “enquanto muito está acontecendo no desenvolvimento do processo identificado como Bolonha, existe uma grande falta de conscientização da declaração e do seu significado, em especial da parte das próprias universidades” (p. 29) 8 . Edwards é um dos que tinham alguma propriedade para reclamar, posto que participou da Conferência de Praga em 2001 como presidente da Associação Européia das Universidades. Criticando o modelo de cima para baixo imposto pelos ministros reunidos em Bolonha, Edwards ainda ataca a idéia de uniformizar o ensino, pois “isso seria arriscar inibir a inovação e o experimento das universidades no desenvolvimento de novos cursos e novos métodos de ensino” (p. 30). Previamente à Conferência de Praga, houve uma Convenção das Instituições de Ensino Superior Européias (EHEA, na sigla em inglês) em Salamanca, que destacou a necessidade de as universidades participarem do processo, precisando para tanto do que chamam de uma “nova liberdade” 9 . Para que as mesmas pudessem cumprir com o Processo de Bolonha, precisariam de “liberdade de ação como o único caminho para uma maior eficiência”. As críticas levantadas à ausência das universidades no início do processo são tantas que o documento levanta que “a confiança mútua entre governos e universidades é um pré-requisito para uma parceria de base. Por último, mas não menos importante, incentivar a autonomia intelectual é uma tarefa essencial e um requisito para as instituições acadêmicas”. Se as universidades reclamam que não foram consultadas antes, elas também se colocam à disposição para participar do processo: A universidades não pedem só mais liberdade. Estas também estão dispostas a aceitar a correspondente responsabilidade: elas querem ser responsabilizadas pelo que fazem e pela maneira como usam a liberdade que lhes é dada. Enquanto as universidades fizeram a conferência em Salamanca, a Associação Nacional de Estudantes da Europa (ESIB) se reuniu em Gotemburgo para dizer que “uma área européia de ensino superior deve incluir todos os estudantes europeus em bases iguais (...) ao divulgar boas práticas e promover a cooperação e a solidariedade entre os Estados Europeus”.10 Interesses estudantis como mobilidade, financiamento por 8 EDWARDS, Ken. European higher education and the Bologna Process. p 28 9 European Higher Education Area, 2001 10 The National Unions of Students in Europe, 2001 18
  • 19. meio de bolsas de estudo e reconhecimento das atividades feitas têm destaque no documento, que, tal como a Associação Européia das Universidades, é proposto também um plano de participação nos debates: Deve ser destacado que os estudantes, como parceiros competentes, ativos e construtivos, devem ser vistos como uma das forças dirigentes nas mudanças educacionais. A participação dos estudantes no Processo de Bolonha é um dos passos-chave para formalizar o envolvimento estudantil em todos os órgãos decisórios e de discussão para lidar com o ensino superior em nível europeu. A reunião seguinte à de Bolonha aconteceu na República Checa também por um motivo simbólico: se a Universidade de Bolonha é a mais antiga da Europa, a Universidade de Praga é a mais antiga do leste europeu, representando assim países que estavam em vias de entrar na União Européia, simbolizando o interesse explícito de “envolver toda a Europa no processo” (Praga, 2001). De fato, em Praga houve uma inflexão nos rumos do Processo de Bolonha. Além do destaque dado à participação de todos os países envolvidos, tiveram ingresso no processo entidades representes das universidades, dos estudantes de órgãos supranacionais, como a Associação Europeia das Universidades (EUA); Associação Europeia das Insituições de Ensino Superior (EURASHE); Associações Nacionais de Estudantes na Europa (ESIB) e Comissão Européia. Assim também ingressaram no processo mais quatro países, mostrando que a expansão estava aberta para outros interessados. e) 2003 - Berlim Seguindo o rumo tomado após a reunião de Bolonha, bienalmente são feitas conferências. Cabe-se notar, contudo, que após as manifestações prévias a Praga as conferências em parte perderam valor, pois outros grupos de trabalho se formaram, agora com todas as partes envolvidas no processo. Os demais documentos serão analisados nos capítulos seguintes, onde faremos uma análise crítica da implantação de Bolonha. Desta forma, coloca-se aqui uma síntese das decisões das conferências já somadas a reflexões pontuais, para fins de completar o quadro de decisões fundamentais. A reunião ministerial seguinte à de Praga teve lugar em Berlim em 2003. O documento “O papel das universidades na Europa do conhecimento” resultou da conferência, concluindo que o ensino superior europeu tinha algumas dificuldades para ter uma uniformidade dada a “grande heterogeneidade, que se reflete em termos de organização, gestão e condições de funcionamento, bem como em matéria de estatuto e condições de emprego e contratação de professores e investigadores”. 19
  • 20. Um dos obstáculos para se estruturar o EEES é a exígua mobilidade estudantil, sendo que em 2000 apenas 2,3% dos estudantes europeus realizavam os seus estudos em outro país europeu. Alguns outros desafios são traçados, dentre eles: • Crescimento da procura de formação superior. Enquanto a natalidade nos países europeus é cada vez menor, aumenta a procura das pessoas por uma formação superior, já denotando a sociedade do conhecimento. • Internacionalização da educação e da investigação. Comparadas com as universidades americanas, as universidades européias atraem poucos estudantes estrangeiros. De acordo com o documento, “enquanto as universidades europeias acolhiam, em 2000, cerca de 450 000 estudantes estrangeiros, as americanas contavam mais de 540 000, a maior parte dos quais proveniente da Ásia”. Isso não chega a ser problema, mas chegou- se à conclusão de que as universidades européias tinham pouca atratividade para fixar residência dos diplomados após o curso. O documento afirma que as universidades européias “muitas vezes não possuem a massa crítica necessária, o que as obriga a adotar abordagens baseadas na colaboração sob a forma de redes, cursos ou diplomas comuns”. • Reorganização do conhecimento. Se há a necessidade de áreas cada vez mais avançadas e precisas do conhecimento, também surgem novas abordagens interdisciplinares para compreensão dos grandes problemas da sociedade. Devem-se buscar possibilidades para mudar a inércia das universidades, que “tendem a conservar a organização de um quadro disciplinar tradicional”. Um ponto polêmico do documento trata do financiamento das universidades, propondo fontes de financiamento alternativas ao investimento público. Os Estados Unidos são novamente modelo ao serem sugeridas as doações privadas. Entretanto, outras formas de financiamento são citadas, também visando diminuir a intervenção estatal: prestação de serviços, cobrança dos alunos, exploração dos resultados da pesquisa e criação de empresas de base tecnológica são algumas das possibilidades. Tradicionalmente, o ensino superior europeu depende em muito do financiamento público. Até há poucos anos, as cobranças de propinas (gratificações) tinham valores apenas simbólicos na maioria dos países. Entretanto, a diminuição do 20
  • 21. financiamento estatal aumentou o valor das propinas e algumas universidades que eram gratuitas passaram a deixar de ser, como é o caso da Universidade de Viena. Criar novos cursos pagos também é uma forma estimulada no documento, o que pode também ser justificado pela lei da oferta e da demanda. Cabe aqui novamente a crítica da importância de direcionar os docentes para as atividades essenciais da universidade: com os novos cursos pagos, a tendência é de que muitos quadros se dediquem somente aos cursos pagos, abandonando o ensino superior básico. O objetivo central das análises feitas serviria de base para “tornar a União Europeia (UE) na economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo”. A proposição veio ao encontro daquela que estava sendo desenvolvida pelos chefes de estado da União Européia, que de acordo com a Estratégia de Lisboa se propuseram a Fazer da União Europeia, até 2010, a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social e respeito pelo ambiente.11 Um outro conceito de destaque em Berlim é o de aprendizagem ao longo da vida, ou longlife learning. De acordo com a proposta, a tendência hoje é de as pessoas estudarem continuamente. Com o conhecimento sendo transformado em velozes revoluções, considera-se inútil investir muito em uma formação, já que em poucos anos boa parte do aprendizado estará obsoleta – algo notado especificamente no campo das engenharias. Isso diminui o valor de um mestrado e principalmente de um doutoramento, tido antes como a tese que balizaria toda a produção acadêmica do indivíduo. O sistema de ciclos ganhou então uma terceira etapa após a formação básica e o mestrado. Novamente, o propósito de flexibilizar a formação ficou sugerido. O terceiro ciclo, doutoral, também serviria para vincular o Espaço Europeu de Ensino Superior ao Espaço Europeu de Investigação, este já ligado diretamente às empresas. Ainda em Berlim foi decidida a aceleração do processo em curso. Se antes a meta era de criar o Espaço Europeu de Ensino Superior até 2010, o prazo se tornou mais exíguo, tendo estabelecido o objetivo do ano de 2005 para cumprir algumas etapas do processo. Outro fato importante ocorrido foi a adesão de mais países do leste europeu e da Rússia, expandindo o número de países signatários para 40. 11 Centro de Informação Européia Jacques Delors, 2007 21
  • 22. f) 2005 – 2009 – Bergen, Londres e Lovaina A reunião interministerial seguinte à de Berlim ocorreu em 2005 em Bergen, na Noruega. Contribuições pontuais foram feitas, a saber: compromisso do Grupo de Acompanhamento do Processo de Bolonha a reforçar a dimensão social do processo; remover os obstáculos à mobilidade; implementar as linhas orientadoras de gestão e certificação da qualidade; criar diplomas conjuntos; flexibilização de aprendizagem no ensino superior. Após Bergen, a capital inglesa sediou a reunião em 2007. Foi proposta a adoção do processo com respeito às particularidades locais, em favor da diversidade cultural do espaço europeu e com vistas de aumento da competitividade. Com a expansão do acordo para países não membros da União Européia nem signatários dos acordos de livre mobilidade, foi reconhecida a necessidade de empenho dos governos para facilitar os vistos de estudo e de trabalho dentre os países signatários do Processo de Bolonha. Quando da realização do estágio que originou este relatório, a conferência de Lovaina (Bélgica) ainda não tinha ocorrido, e por isso colocam-se aqui as metas estabelecidas pela conferência de Londres: aumento da mobilidade; maior efetividade da dimensão social do processo; parcerias com o Eurostat para manutenção de bancos de dados estatísticos das universidades; definição de estudos quanto à empregabilidade dos formados no sistema de três ciclos. g) Bolonha: um processo em formação Ao analisar o processo construído, Diogo (2009) considera interessante notar que o envolvimento da União Européia e dos demais participantes aumentou de acordo com o seguimento das conferências. Para ela, isso “tem consequências para o desenho político em todos os níveis de ação onde o processo opera, especialmente quando o número de países participantes aumenta, trazendo com isso um aumento da complexidade do processo”12. Veiga e Amaral (2006) seguem pela mesma linha, ao lançarem a tese de que a construção de Bolonha não pode ser considerada como uma política clara, racional e linear, visto que em nenhum momento o processo foi definido como concluído. 12 DIOGO, p. 39 22
  • 23. 3) Bolonha na prática: Europa e Aveiro Como relatado anteriormente, o processo de Bolonha não contou a princípio com a participação ativa da comunidade acadêmica, somente dos governos. Em entrevista, a professora Estela Pereira relatou que a transição do espaço decisório dos governos para as universidades não foi fácil, visto que as universidades não tinham unidade de pensamento no início do processo. Entretanto, alguns objetivos já eram idéias esparsas, como diminuir a evasão dos cursos universitários. Simultaneamente, a reforma neoliberal recente em países europeus considerou a educação como mercadoria, levando os países europeus a diminuírem o financiamento direto nas instituições de nível superior. Parte daí a idéia de que o Estado deveria financiar somente os três primeiros anos da formação superior, deixando o restante da formação a cargo dos cidadãos. No início, sequer havia nomenclatura comum para os mesmos graus de formação, sendo que cada cultura tinha o hábito de chamar o formado com um nome. O equivalente francês à palavra bacharelado (baccalauréat), por exemplo, é na verdade como são chamados os formados no segundo grau (o atual ensino médio do Brasil). Nas palavras da professora Estela Pereira, “é preciso nós sabermos entender para podermos cooperar”, e também “sabermos do que estamos a falar e não termos más traduções”. Por este motivo, e pelo interesse em construir um espaço europeu de ensino superior, pode-se dizer que as universidades estavam preparadas para ser comparáveis, o que seria uma forma de evitar o receio de o Estado se eximir das responsabilidades para com o ensino superior. Quando houve a Declaração de Bolonha (1999 – vide capítulo 3), a Universidade de Aveiro estava em um momento de revisão curricular de todos os cursos. Isso facilitou para que Aveiro entrasse nos debates de Bolonha, quando foram pensadas competências básicas e transversais que deveriam ser cumpridas por todos os formados na universidade. Não se trata de um ciclo básico para o nível superior, mas sim pensar uma estrutura matricial de formação, na qual determinadas características deveriam influir de alguma forma em todas as disciplinas e cursos ministrados na Universidade, aplicáveis a qualquer área do saber acadêmico. São exemplos dessas competências transversais: • Boa expressão oral e escrita na língua materna (no caso, o português); 23
  • 24. Boa compreensão no mínimo escrita de língua estrangeira (principalmente o inglês, mas dependendo da área também o francês, dada a forte influência histórico-cultural exercida pela França em Portugal); • Conhecimentos básicos em informática, tanto nas ciências exatas como nas humanas e nas artes. Simultaneamente, foram buscadas metas objetivas para avaliar a qualidade de cada formação oferecida em Aveiro. Como exemplos, Estela Pereira cita a formação em música, na qual é possível ter como meta que um estudante seja capaz de interpretar com excelência algum determinado compositor ou peça erudita. O processo feito na Universidade de Aveiro visou repensar a formação, mudando o foco da transmissão do conhecimento para identificar se os estudantes aprendiam a usar o conhecimento adquirido, ou, segundo Estela Pereira, “não está em causa aquilo que o aluno decorou, mas sim para o que ele usa”. Por ter sido um processo lento, Aveiro de certa forma já implantava Bolonha sem falar de Bolonha, e por isso teve um caminho facilitado quando o acordo foi feito no âmbito dos governos. Para Estela Pereira, partícipe direta do processo local, o grande impulsionador da reforma em Aveiro foi um antigo reitor da universidade, Joaquim Renato Ferreira Araújo, que, ainda que tenha sido reitor de 1986 até 1994, teve forte influência na implantação das mudanças aqui citadas, concretizadas entre 1999 e 2000. a) Dinamismo local de Aveiro Aqui cabe um aparte quanto às facilidades encontradas na Universidade de Aveiro para pensar a formação. Tão logo chegou à Universidade de Aveiro, o autor deste trabalho percebeu o perfil inovador da universidade, com grande parte dos cursos voltados para as ciências aplicadas. Pela experiência pessoal e para efeito de parâmetro de comparação com a realidade brasileira, o autor considera a Universidade Estadual de Campinas e a Universidade Federal de São Carlos, ambas propulsionadoras de parques tecnológicos, como semelhantes à Universidade de Aveiro no Brasil. A percepção é corroborada pela professora Estela Pereira, ela mesma participante de projeto de pesquisa conjunto com ambas as instituições na área de engenharia. A história da Universidade de Aveiro também é recente se comparada à do ensino superior europeu – enquanto a Universidade de Coimbra foi criada em 1290, Aveiro é fruto da democratização das universidades portuguesas feita na década de 1970. 24
  • 25. O contexto deixa claro que Aveiro não tem muitas tradições firmadas, tendo recebido em sua gênese pessoas de diversas universidades portuguesas e muitos docentes doutorados no exterior durante a ditadura portuguesa (de 1932 até 1974). A heterogeneidade da formação dos docentes rendeu uma tendência de dinamismo diferente da estabelecida em universidades mais tradicionais, sendo também a única universidade portuguesa de grande porte com estrutura departamental e sem faculdades, ilhas isoladas de conhecimento. A horizontalidade dos departamentos, que cooperam para oferecer todos os cursos oferecidos, facilita a dinâmica interna por desenvolver o respeito mútuo entre os docentes. É fruto também da dinâmica de uma universidade nova o fato de não existirem feudos acadêmicos tradicionais, posto que a filosofia da educação atual considerou que a produção do conhecimento não está estagnada e vive por constantes transformações, diferentemente dos momentos de estabilidade que Kuhn identifica como o da “ciência normal”, intercalados pela instabilidade pré-revolucionária onde os novos paradigmas se impõem sobre os antigos e a ciência avança aos saltos. A concepção científica lembra, eventualmente, a proposta por Karl Popper, com a atividade científica desenvolvendo-se pela constância da sua comunidade através do acúmulo de conhecimentos gerados pela experiência submetida ao escrutínio dos pares, confirmando provisoriamente as afirmações teóricas ou reformulando-as de acordo com os novos conhecimentos. b) Reconhecimento de Bolonha: comparável sem ser igual Se a Universidade de Aveiro tem a dinâmica como prática, pode se considerar uma tendência de dificuldade de implantação do Processo de Bolonha nas grandes escolas de pensamento, como Sorbonne na França, London School of Economics e as universidades de Oxford e Harvard na Inglaterra. Para que possa ser aplicada a unificação do ensino superior europeu, Estela Pereira afirma que existe uma grande dificuldade da parte dos professores em reconhecer que um curso possa ser feito sem a sua disciplina. A mudança da mentalidade – tanto dos professores quanto principalmente das instituições consolidadas – leva tempo e a história local deve ser respeitada, sem pular etapas. Portanto, o primeiro passo é reconhecer que existem diferenças em cada instituição no que tange ao pensamento e à prática docente e de pesquisa, e o reconhecimento é mais efetivo quando ocorre internamente. Pelas conversas com estudantes Erasmus notou-se a dificuldade que os estudantes têm de reconhecer as disciplinas cursadas no exterior, sendo que em muitos 25
  • 26. casos as mesmas só entram como atividades complementares no currículo de origem. Usa-se como argumento para a não validação dos créditos ECTS, por exemplo, não ter estudado determinado autor, referência no país de origem mas que, exatamente pela experiência de conhecer novas abordagens, o estudante procura algo distinto quando em intercâmbio. c) O projeto Tuning: estruturação do processo Estela Pereira avalia que os professores devem estar abertos para reconhecer coisas diferentes do que eles ensinariam, mas que também podem ser interessantes para a formação, ou uma forma de tornar um curso “comparável sem ser igual”. Evolução grande foi feita nesse sentido no âmbito do projeto Tuning13, do qual fez parte como especialista em ensino superior, função coordenativa do projeto. O relatório, um dos documentos-chave produzidos quando da implantação de Bolonha, considera requisitos básicos para a formação de diversas carreiras dentro do ciclo proposto. É considerado para tanto que qualquer país da Europa pudesse ter a formação sugerida. Cabe aqui destacar a importância do Tuning no processo formador de Bolonha: tratou-se de projeto essencial para reunir especialistas nos mais diversos campos do conhecimento em toda a comunidade acadêmica européia. O significado é o mesmo da palavra inglesa: afinação, ato de sintonizar. Ao reunir em grupos de trabalho pessoas de mais de cem universidades, foi elemento-chave na inserção das universidades no processo criado pelos governos. Ainda que centenas de instituições tenham feito parte do projeto nos debates internos por país e por área, o número de especialistas que participaram da elaboração dos documentos foi reduzido. Participantes e áreas do projeto A tabela 1 aponta o número de participantes institucionais por país. Nota-se que, apesar da pouca importância econômica para a União Européia, Portugal contou com o 5º maior número de especialistas no projeto, atrás somente das potências Itália, Alemanha, França e Reino Unido e empatado com Bélgica e Irlanda. Dos nove participantes portugueses, ressalta-se que quatro foram da Universidade de Aveiro. Estela Pereira entrou como especialista em ensino superior, 13 Vide http://tuning.unideusto.org/tuningeu/ 26
  • 27. função coordenativa do projeto. Além de Pereira, Portugal também teve Tito Fernandes, da Universidade Técnica de Lisboa, como membro do comitê gestor do Tuning. Tabela 1 - Participantes do Tuning por país14 País Total Alemanha 11 Áustria 6 Bélgica 9 Espanha 9 Finlândia 6 França 11 Grécia 6 Irlanda 9 Islândia 1 Itália 15 Lituânia 1 Noruega 5 Países Baixos 6 Polônia 2 Portugal 9 Reino Unido 7 Reino Unido 10 Romênia 1 Suécia 7 Total geral 131 Sete áreas básicas entraram na pauta da primeira rodada de debates do Tuning, cuja representatividade por país pode ser observada na tabela 2: Ciências da Educação (na tabela, Edu); Física (Fís); Geologia (Geol); História (His); Matemática (Mat); Negócios (Neg); e Química (Quí). O número total de participantes na tabela 2 é menor do que o número da tabela 1 por não estarem contabilizados os especialistas e coordenadores-gerais do projeto. Tabela 2 - Especialistas no Tuning por área e país15 País Edu Fís Geol His Mat Neg Quí Total Alemanha 1 1 1 1 1 3 1 9 Áustria 1 1 1 1 1 1 6 Bélgica 1 1 1 1 1 1 1 7 Dinamarca 1 1 1 1 1 2 7 Espanha 1 1 1 1 2 1 1 8 Finlândia 1 1 1 1 1 1 6 França 1 1 1 2 2 1 3 11 Grécia 1 1 1 1 1 5 Irlanda 1 1 2 1 2 1 1 9 Islândia 1 1 Itália 1 3 1 2 1 1 2 11 Noruega 1 1 1 1 1 5 Países 1 1 1 1 1 5 Baixos 14 Elaboração do autor, baseada em GONZALEZ e WAGENAAR, 2003 15 Idem 27
  • 28. Portugal 1 1 1 1 1 1 1 7 Reino Unido 1 1 2 1 1 1 1 8 Suécia 2 1 1 1 1 1 7 Total geral 15 16 15 17 17 16 16 112 Outras áreas foram debatidas posteriormente e geraram relatórios exclusivos. São os casos, por exemplo, de Estudos Europeus, Terapia Ocupacional, Estudos da Terra e Música, dentre outros16. Objetivos do projeto O projeto visou deixar as instituições de ensino superior em contato direto com os rumos de Bolonha, aprofundando o debate por área para definir as competências e habilidades básicas que um formado no ensino superior europeu deveria ter, aí inclusos também os conteúdos específicos das sete áreas temáticas citadas anteriormente. Também buscou-se aumentar a transparência e a lisura do Processo de Bolonha, gerando possibilidades de pesquisa acadêmica na área para posterior inovação nos processos comunicativos. A troca de experiências entre as instituições participantes pode ser considerada bastante relevante, posto que houve estímulo à criação de redes européias capazes de apresentar exemplos de boas práticas, “fomentando a inovação e a qualidade na reflexão conjunta e na troca, também para outras disciplinas”17. O intercâmbio de informação relativa à estrutura curricular dos cursos nas respectivas áreas também foi útil para considerar quais eram os eixos fundamentais na formação européia, garantindo também que os pontos de referência de cada área fossem condizentes com as políticas educacionais de cada país. Por ter se tratado de meio oficial de debate da União Européia, contando inclusive com observadores da Comissão Européia nos debates, o Tuning foi também uma forma de “construir pontes entre esta rede (a das universidades européias) e outros organismos qualificados para produzir convergência nas áreas selecionadas” 18 . Também por isso o Tuning foi visto como possibilidade de ação coordenada entre “todos os atores envolvidos no processo de sintonia das estruturas educacionais”, aí inclusos os Ministros da Educação dos países-membros da UE, a EURASCHE - Associação Europeia das Insituições de Ensino Superior, outras associações e sociedades científicas, conferências de reitores e o grupo interministerial europeu de acompanhamento do Processo de Bolonha. 16 Todos os materiais produzidos podem ser acessados na internet, pelo sítio http://www.tuning.unideusto.org 17 GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 25 18 Idem, p. 26 28
  • 29. A oportunidade de ter reunidos em um só fórum especialistas das distintas áreas e nacionalidades também foi útil para elaborar metodologias de análise dos elementos comuns, para então encontrar formas de sintonizar as políticas educacionais dos países participantes. Simultaneamente, considerou-se a possibilidade de gerar sinergia com o intercâmbio entre áreas correlatas, que poderiam atuar em parceria para o desenvolvimento de novos processos de formação. Exemplos de áreas de formação: Química e História Ainda que todas as áreas citadas anteriormente tenham sido objeto de largo debate no âmbito do projeto Tuning, colocam-se aqui, por questões metodológicas, dois exemplos de áreas distantes, objetivando com isso abrir possibilidades para considerações futuras a respeito, sem esgotar portanto a temática. Nota-se que as áreas tiveram autonomia durante o Tuning para escolherem as metodologias mais adequadas para cada campo do conhecimento. Por se tratarem de indicações, são listados no presente somente elementos do programa pensado para cada área, visto que debater todos os tópicos demandaria trabalho mais aprofundado. Foram selecionadas as áreas de Química, na qual teve participação Estela Pereira, e História, pela maior proximidade conceitual com as ciências sociais das quais se originam a Administração Pública, campo do autor deste trabalho. A área de Química O que aqui se coloca são resultados expostos em GONZALEZ e WAGENAAR (2003)19. Habilidades que podem ser desenvolvidas no âmbito da química e que são de natureza geral e aplicável em outros contextos. Sugere-se que todos os programas devem garantir que os alunos estejam familiarizados com os seguintes aspectos principais da química:  Principais aspectos da terminologia química, nomenclatura, convenções e unidades.  Os principais tipos de reações químicas e as características associadas a eles.  Os princípios e procedimentos usados na análise química e a caracterização dos compostos químicos.  As características dos diferentes estados da matéria e as teorias usadas para descrevê-los. (...)  A relação entre as propriedades do solo e as propriedades dos átomos e moléculas individuais, inclusive macromoléculas. 19 GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, pp 113-114. Grifos originais do texto, tradução do autor 29
  • 30. Resultados: competências e habilidades Em um nível de bacharelado europeu, é esperado que os estudantes desenvolvam um largo leque de competências e habilidades. Elas podem ser divididas em três amplas categorias: a) Química relacionada a habilidades cognitivas e de competências, ou seja, relacionadas com as tarefas intelectuais, incluindo a resolução de problemas; b) Química relacionada a habilidades práticas, por exemplo, habilidades relativas à condução dos trabalhos de laboratório; (...) Por serem mais específicas do campo da química, detalho aqui de forma mais aprofundada algo do exposto dentre as competências e habilidades dos itens A e B supra citados. a. Competências e habilidades cognitivas relacionadas à Química. o Habilidade para demonstrar conhecimento e compreensão de fatos essenciais, conceitos, princípios e teorias relacionados às áreas abaixo. o Habilidade para aplicar o conhecimento e a compreensão à solução de problemas qualitativos e quantitativos de natureza familiar. o Conhecimentos em avaliação, interpretação e síntese de dados e informações químicas. (...) o Competências em apresentação e argumentação de material científico de forma escrita e oral para uma platéia esclarecida. o Habilidades em processamento de dados computacionais relativos à informação e ao conhecimento químico. b. Química relacionada a habilidades práticas. o Conhecimentos em manipulação segura de elementos químicos tendo em conta as propriedades físicas e químicas, incluindo perigos específicos associados ao uso dos mesmos. (...) o Conhecimentos em monitoramento, pela observação e manipulação, de propriedades químicas, eventos e mudanças, e o sistema adequado para armazenamento das informações coletadas. o Habilidade para interpretar dados derivados de observação laboratorial e manipulação nos termos relevantes e relacioná- los às teorias apropriadas. (...) A área de História O campo da História é apresentado no relatório de forma distinta da Química: “definir pontos de referência europeus comuns para a História é uma tarefa extremamente delicada” (GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 147). Considera-se que as formas de desenvolvimento e transmissão do pensamento da História são bastante distintos de um para outro país europeu. Portanto, o trabalho teve início ao identificarum “núcleo curricular” para a História, questionando a própria adoção do termo devido à pluralidade política e cultural dos contextos locais. Assim, foram pensados elementos da formação para que um estudante de história pudesse, por sua 30
  • 31. conta, continuar estudando a disciplina para complementar a formação recebida. Chegou-se então à idéia de que não se pode falar de um currículo simplificado, mas sim de “currículos básicos, no plural”. Também concluiu-se que “cada sistema nacional deve ser visto como um todo coerente, em que a ordem, o conteúdo, o processo de ensino-aprendizagem e os métodos de avaliação estão relacionados uns aos outros”. Notou-se ainda a importância de “ressaltar as vantagens que o estudo de História oferece à sociedade”, intencionando inserir a área entre os conteúdos transversais dos cursos de graduação. Entretanto, ainda os debates tenham considerado a amplitude do campo do conhecimento, notou-se que alguns elementos já existentes no cursos deveriam “aparecer em qualquer proposta de currículo: isto não seria apenas o mínimo denominador comum, mas sim ratificar um acordo quanto aos conteúdos básicos necessários”. Constatou-se ainda que outras disciplinas e competências são “essenciais ou convenientes” para a formação de um historiador, em especial para a formação de uma mentalidade crítica: a língua materna, língua estrangeira, Filologia, Arqueologia e Ciências Sociais são dadas como exemplos. Além disso, foi considerado como essencial o “uso de métodos de ensino que estimulem as capacidades”, como “a habilidade de trabalho em equipe e a capacidade de organizar projetos”, e outras competências transversais do estudo da História, como escrever e falar bem e precisão e honestidade intelectual. Por subjetivos que possam ser, são citados aqui alguns dos elementos listados como de conhecimentos e habilidades específicas para a área de História20. 1. Consciência crítica da relação entre os eventos e processos atuais e do passado. 2. Consciência das diferenças nas perspectivas historiográficas de diferentes períodos e contextos. 3. Consciência e respeito dos pontos de vista resultantes de outras origens nacionais ou culturais. (...) 7. O conhecimento detalhado de um ou mais períodos específicos do passado humano. (...) 11. Capacidade para ler textos historiográficos ou documentos originais em outras línguas, para resumir e transcrever textos em catálogos informativos, conforme apropriado. (...) 15. Conhecimento e capacidade de usar ferramentas específicas necessárias para o estudo dos documentos de períodos específicos (por exemplo, epigrafia e paleografia). (...) 17. Conhecimento de línguas antigas. (...) 19. Conhecimento da própria história nacional. 20. Conhecimento da história européia, numa perspectiva comparativa. 20 A relação completa encontra-se em GONZALEZ e WAGENAAR, 2003, p. 158-159 31
  • 32. 21. Conhecimento da história da integração européia. (...) 23. Consciência e capacidade de usar ferramentas de outras ciências humanas (por exemplo, literatura crítica, história da linguagem, história da arte, arqueologia, antropologia, direito, filosofia, etc). (...) 25. Capacidade para definir temas de pesquisa adequados para contribuir para o conhecimento e o debat historiográficos. (...) 29. Habilidade para comentar, fazer anotações ou editar textos e documentos corretamente, de acordo com os cânones críticos da disciplina. 30. Conhecimentos de didática da história. Uma Lei de Diretrizes e Bases para o Espaço Superior Europeu Nota-se, pelos exemplos das áreas de História e Química, claramente a intenção de encontrar denominadores comuns para os diversos campos do ensino superior. Uma leitura mais atenta aponta para princípios presentes na Lei 9.394/96, também conhecida no Brasil como Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Em seu artigo 26, a LDB estabelece normas basilares para a formação nos níveis fundamental e médio, por exemplo no parágrafo 4º quando define que “o ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia”.21 O capítulo IV da LDB (“Da Educação Superior) resume para o Brasil aquilo que Bolonha pensou para o espaço europeu no que tange à definição dos conteúdos abordados nos cursos. Exemplo é o inciso IV, que define que o ensino superior brasileiro deva “estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade”22. Ainda que não tivesse força de lei européia, deduz-se que o projeto Tuning tenha sido uma forma de gerar doutrina acadêmica para os campos de formação superior, balisando os debates nacionais. 21 BRASIL, Lei 9394/96 22 Idem 32
  • 33. 4) Conclusões a) Balanço preliminar de Bolonha em Portugal Ainda que o processo de Bolonha ainda esteja em curso, já podemos traçar algumas tendências. O processo ainda não está concluído e, como educação, provável que siga com divergências para que possa evoluir. Portanto, continua sendo alterado e permanentemente avaliado, buscando a melhoria na qualidade do ensino superior europeu. É o que Estela Pereira ressalta quando afirma que “progressivamente, o espírito de Bolonha tende a ser cada vez mais integrado na universidade” 23. Pereira entende que o processo também segue a educação ao longo da vida, cujo conceito é reafirmado ao considerar que Bolonha segue em constante aprendizado. Ao falar da experiência da Universidade do Minho (assim como Aveiro, situada na região norte de Portugal, com campi em Braga e Guimarães), Montenegro (2009) levanta algumas das principais atividades inseridas para a modernização do ensino superior com o Processo de Bolonha, tais como introdução da aprendizagem à distância com módulos tutoriais, aprendizagem cooperativa, baseada na resolução de problemas. Montenegro ainda fala da inserção de módulos extracurriculares nos cursos para o desenvolvimento de competências transversais. Montenegro, entretanto, considera alguns aspectos negativos na implementação de Bolonha24: • Dificuldade de mudar as pessoas e as instituições. • “Objetivos associados ao processo de Bolonha não se constroem por decreto”, mas sim por experiência. • A meta de Bolonha para 2010 é um “horizonte temporal demasiado curto para se implementar e amadurecer as mudanças”. • Orçamento escasso. O caso da Universidade do Minho também é interessante pelo destaque dado ao envolvimento de estudantes de graduação em projetos de pesquisa. Ressalta-se que, diferente do Brasil, que tem por princípio constitucional a “indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão” 25 no ensino superior, a educação superior européia 23 PEREIRA, 2009 24 MONTENEGRO, 2009 25 BRASIL, 1988, art. 207 33
  • 34. considera apenas o ensino como parte relevante de um curso de graduação, deixando a pesquisa como parte integrante somente da pós-graduação. Já Ferrão Filipe (2009) apresenta inovações inseridas no IPAM – Instituto Português de Administração de Marketing. Valendo-se da flexibilidade que uma instituição direcionada a uma área de atuação permite, foi criada a figura do “educational trainer”, dedicado a “acompanhar e monitorizar a performance acadêmica de cada um dos alunos, ao longo da permanência na escola”. Filipe apresenta melhoras advindas do modelo Bolonha: interdisciplinariedade, construção individual da aprendizagem, melhor preparação para o mundo do trabalho e exigência maior da responsabilidade discente. Entretanto, considera como pontos negativos o pouco tempo livre e a dificuldade da gestão do tempo entre curso, profissão e família e, assim como Montenegro, afirma que o método Bolonha nem sempre é interiorizado pelos docentes de forma igual. Ferrari26, por sua vez, destaca que o tempo de avaliação ainda é curto para ter conhecimento adequado dos diplomados em cursos estruturados com Bolonha. Entretanto, tece que o maior receio é a respeito da maturidade dos diplomados no primeiro ciclo em relação ao mercado de trabalho, posto que a formação em dois ciclos pode ser impeditiva para que alguém tenha boas bases acadêmicas e de experiência para exercer uma profissão. Por isso considera como fundamental a idéia de aprendizagem ao longo da vida, que deve estar inserida nos cursos superiores para que os alunos sempre procurem qualificação. Ferrari ainda realça algumas habilidades importantes inseridas ou postas em evidência com Bolonha: a importância do trabalho em grupo, a capacidade de comunicação e a liderança. De acordo com ele, as universidades têm procurado responder à altura a essas necessidades crescentes. b) Balanço em Aveiro Seguindo o raciocínio de Ferrari, Estela Pereira apresenta uma preocupação em abrir a universidade para a educação ao longo da vida. Para ela, Universidade não deve dar formação contínua, mas deve ser ela própria uma universidade que integra todos os públicos na sua formação. Deve abrir formação inicial para pessoas das mais diversas origens27. Pereira apresenta a abertura da universidade como um dos grandes desafios da próxima década, contextualizando que cada vez menos jovens e mais adultos devem adentrar estar inseridos no ensino superior. Com os novos públicos que buscam manter- 26 FERRARI, 2009 27 PEREIRA, 2009 34
  • 35. se atualizados, a universidade também recicla seus conhecimentos, complementando a formação também dos docentes. Para tanto, a Universidade de Aveiro já oferece módulos independentes nos cursos e qualquer pessoa que reúna as pré-qualificações pode freqüentar esses módulos. A certificação dos módulos, por disciplina cursada, pode ser utilizada como equivalência de créditos para compor um curso mais longo. Quando questionada sobre uma possível criação de cursos noturnos – a exemplo do que já ocorre no Brasil, para inserir pessoas que precisam trabalhar durante o curso universitário –, ressalta a dificuldade de fazer com que os professores aceitem lecionar à noite. Entretanto, afirma que os cursos são flexíveis e que essa inovação ainda é passível de ser adotada. c) Possíveis questionamentos Colocam-se, visando reflexões futuras a respeito de Bolonha alguns questionamentos que vieram à tona quando da realização deste trabalho, mas que não puderam ser resolvidos, alguns por motivo de necessidade de estudos quantitativos mais aprofundados e outros que demandam base teórica mais elaborada: • Qual a real capacidade de inserção profissional dos formados no primeiro ciclo? A formação de três anos é suficiente para garantir a empregabilidade? • Como se dá o financiamento da universidade no âmbito do Tratado de Lisboa? • Houve melhoras reais relativas à taxa de evasão nos cursos? • Considerando a autonomia relativa dos departamentos universitários, a adoção de Bolonha acontece de forma equilibrada dentro das universidades? • Pode-se de fato afirmar que os objetivos basilares que justificaram a criação do Processo de Bolonha estejam sendo cumpridos? d) Bolonha hoje Criado inicialmente por quatro ministros da educação da União Européia, o Processo de Bolonha segue recebendo adesões de outros países interessados. Quando da realização do estágio aqui relatado eram 47 os países signatários do acordo, ainda que nem todos participantes da íntegra do processo (lembrando que cada país define internamente regulamentação a respeito). Assim, não se pode mais dizer que é somente 35
  • 36. um tratado europeu: diversas nações asiáticas também já aderiram, fazendo dele um acordo euro-asiático. A tabela 3 apresenta a lista de todos os países que aderiram a Bolonha até a realização da conferência de Lovaina (2009). Tabela 3 - Países signatários em 2009 Países signatários do Processo de Bolonha Albânia Dinamarca Itália Portugal Alemanha Eslováquia Letônia Reino Unido República Andorra Eslovênia Liechtenstein Checa Armênia Espanha Lituânia Romênia Áustria Estônia Luxemburgo Rússia Azerbaijão Finlândia Macedônia Sérvia Bélgica França Malta Suécia Bósnia- Geórgia Moldávia Suiça Herzegovina Bulgária Grécia Montenegro Turquia Cazaquistão Hungria Noruega Ucrânia Países Chipre Irlanda Vaticano Baixos Croácia Islândia Polônia A expansão do espaço europeu de ensino superior para a Ásia é uma demonstração do poderio europeu para influenciar a cultura e a educação para além das fronteiras da União Européia, o que segue de acordo com os princípios da Estratégia de Lisboa, que colocou como objetivo fazer da Europa “a economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo”, aumentando assim o grau de influência sobre os outros países. Exemplo disso é uma potência política e militar como a Rússia adotando um sistema europeu, colocando-se como parceira da União Europeia. Outras nações do antigo bloco socialista também encontraram em Bolonha uma forma de inserção na sociedade européia. É o caso de Azerbaijão, Cazaquistão, Geórgia e Ucrânia, dentre outros. Nota-se uma adoção de Bolonha em níveis bastante distintos de acordo com o país envolvido: mais avançado nos Países Baixos e com mais demora em países como o Reino Unido. Assim, a tendência é de postergar o prazo para cumprimento das metas propostas, visando melhor nivelamento das estruturas curriculares. Entretanto, os maiores gargalos não se dão exatamente em adotar ou não adotar Bolonha, mas sim nas diferentes experiências do processo em curso. Para Hortale e Mora (2004), “as universidades européias ainda são muito dependentes dos docentes e dos estudantes para a tomada de decisões (...) sem eles é impossível empreender alguma 36
  • 37. reforma”. O argumento é utilizado para afirmar que ainda é necessária maior participação docente e estudantil para que as mudanças institucionais sejam assimiladas, pois a comunidade acadêmica européia, habituada à participação no processo decisório, segue distante dos objetivos de Bolonha. Consequência disso é a morosidade para alterar as estruturas universitárias, que carecem de reformas basilares para a inserção qualificada de novos métodos de aprendizagem e no desenvolvimento de cursos multidisciplanares. Parte disso também se deve à tradição das universidades, onde o processo de criação de uma nova área do conhecimento frequentemente é combatido pelas áreas mais tradicionais. Quando da realização do estágio que serve de base para este relatório, a crise financeira que desvalorizou o Euro e levou diversas instituições empresariais à falência ainda estava em seu início e não era possível um diagnóstico de como a situação alteraria os acordos europeus. Todavia, o debate do financiamento da educação superior européia já estava em pauta, e ainda é uma incógnita saber como um processo da dimensão de Bolonha será influenciado pelo contexto político-econômico dos países signatários. Mas um indicador relevante e que merece mais atenção é a necessidade de aumentar os recursos financeiros das universidades, o que pode ser feito tanto pela via pública quanto pela iniciativa privada. Hortale e Mora destacam que não é possível que com o mesmo nível de gasto atual da educação superior européia, que é a metade daquele dos EUA, possa-se alcançar um nível de qualidade semelhante ao desse país. No entanto, a insistência dos estudantes europeus em considerar a educação superior um bem público (quando tecnicamente é um bem semipúblico) não facilita o aporte financeiro de fontes privadas. O processo de Bolonha ainda não está totalmente implementado, fazendo das conclusões deste trabalho mais suposições que prognósticos. Ainda é cedo para que as reformas feitas como consequência do Processo de Bolonha sejam avaliadas pois o momento ainda é de correção dos rumos. Contudo, as entrevistas feitas com estudantes europeus intercambistas na Universidade de Aveiro fazem crer que a mudança na duração dos cursos não foi útil para melhorar a empregabilidade, pois dificilmente um formado em curso de 3 anos é capaz de desenvolver as mesmas atividades profissionais de alguém que tenha estudado por 5 anos. Uma possível consequência disso é o abandono sistemático da universidade tão logo o primeiro ciclo seja concluído, fazendo com que poucos estudantes concluam a formação em dois ciclos. Um estudo mais aprofundado que avalie a média de anos de escolaridade antes e depois de Bolonha pode 37
  • 38. chegar à conclusão de que a divisão por ciclos tirou estudantes dos cursos, o que seria um indicador de fracasso do processo. Outra dificuldade é fazer com que as disciplinas cursadas em um país sejam tidas como equivalentes de formação no país de origem do estudante. A adoção dos créditos ECTS facilitou a creditação dos cursos pelo critério formal de carga horária. Porém a divergência de cada universidade no nível de cobrança para aprovação nas diversas disciplinas ainda gera confusão nos estudantes, que se sujeitam a dupla avaliação dos conhecimentos adquiridos: uma enquanto cursa a disciplina e outra para que a disciplina tenha equivalência na universidade de origem. Apesar das dificuldades enfrentadas, alguns sucessos são evidentes no que tange à integração de universidades por meio de redes de pesquisas. Diversas instituições européias estão abarcadas em projetos de mestrado europeu, o chamado Erasmus Mundus. Tais programas são formados por consórcios de universidades, de modo que cada semestre do curso é feito em uma instituição. Essa é uma estratégia exitosa para demonstrar como as universidades podem crescer de forma cooperativa, ampliando o intercâmbio de pesquisadores e também de publicações em revistas indexadas. Experiências como as redes de pesquisa, intercâmbio estudantil e a formação de um currículo básico adaptável às particularidades locais são pontos elementares para se considerar a sociedade do conhecimento que se desenha e que pretende se desenvolver por meio da tecnologia. São também formas de adaptar experiências milenares de algumas das instituições envolvidas, mesclando seus ideais acadêmicos com os de universidades mais recentes. Assim, Bolonha segue delineando um padrão de sistema internacional de identidade de ensino superior voltado para o mercado de trabalho, ainda que atualmente seus projetos ainda estejam muito atrelados aos países europeus. Mas é certo, contudo, que o Processo de Bolonha ainda está em seu início e que seu curso ainda carece de maturidade para ser absorvido pelos governos, pelas instituições mais principalmente pelas pessoas que constituem a sociedade contemporânea. 38
  • 39. 5) Bibliografia ALLEGRE, BERLINGUER, BLACKSTONE e RÜTTGERS Sorbonne Declaration. Sorbonne, Paris, 1998. AZEVEDO, M. N. A. A integração dos sistemas de educação superior na Europa: de Roma a Bolonha ou da integração econômica à integração acadêmica. In Educação Temática Digital, v. 9, n. Esp., p. 133-149. Campinas, 2007 Bergen Communique. The European Higher Education Area - Achieving the Goals. Communique of the Conference of European Ministers Responsible for Higher Education. Bergen, 2005. Berlin Communique. Realising The European Higher Education Area. Communique of the Conference of European Ministers Responsible for Higher Education. Berlin, 2003. Bologna Declaration. Joint Declaration of the European Ministers of Education. Bologna, 2003. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1988. BRASIL. Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996. Comissão das Comunidades Européias. O papel das universidades na Europa do conhecimento. Bruxelas, 2003, Disponível em http://devel.mctes.pt/archive/doc/Papel_Universidades.pdf (acesso em 25/06/2009). Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior - CNAVES A Declaração de Bolonha e o sistema de graus do Ensino Superior - Bases para uma discussão - Outubro 2001. Disponível em http://www.cnaves.pt/DOCS/Diversos/declaracaodebolonha.pdf (acesso em 25/06/2009). CORREIA, António Dourado. Processo de Bolonha – um breve panorama do actual ensino superior na Europa (contributo para a discussão do caso português). Coimbra, Portugal: Associação de Docentes de Coimbra, 2004. CORREIA, António Dourado. Processo de Bolonha: por um ensino de engenharia de 5 anos num ensino superior unificado. Coimbra, 2009. DIOGO, Sara. The Bologna heritage in the portuguese higher education binary system: different profiles for univesities and polytechnics. Tese (Mestrado em Ensino Superior pelo programa Erasmus Mundus) defendida na Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídicas e Políticas. Aveiro, 2009. EDWARDS, Ken. European higher education and the Bologna Process. Pp. 29-32 in FUKAC J., KAZELLE, J., MIZEROVA, A. Universities and the Bologna Declaration. Brno University of Technology, Czech Republic, Vitium Press, 2001 European Higher Education Area. Conclusão da Convenção de Salamanca. Salamanca, 2001. Disponível em http://www.uc.pt/ge3s/pasta_docs/outros_docs/conv_salamanca. (acesso em 29/06/2009) Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (FCL/UNESP). Portaria nº 025. Araraquara, 2008. FERRARI, António B. Aprofundar Bolonha – conclusões do ciclo de seminários e propostas de linhas de actuação prioritárias. Apresentação feita em O Processo de Bolonha em Portugal – Presente e Futuro. Aveiro, 2009 FERRÃO FILIPE, António. Relatório de concretização do Processo de Bolonha: apresentação do caso do IPAM. Apresentação feita em O Processo de Bolonha em Portugal – Presente e Futuro. Aveiro, 2009 39
  • 40. GONZÁLEZ, Julia; WAGENAAR, Robert. Tuning Educational Structures in Europe – Final Report – Phase One. Univerity of Deusto, University of Groningen, 2003. HORTALE, Virginia Alonso; MORA, José-Ginés. Tendências das reformas da educação superior na Europa no contexto do processo de Bolonha. Educ. Soc., Campinas, v. 25, n. 88, out. 2004 . Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101- 73302004000300014&lng=pt&nrm=iso (acesso em 22 de abril de 2009) MONTENEGRO, Irene. Relatório de concretização do Processo de Bolonha: apresentação do caso da Universidade do Minho. Apresentação feita em O Processo de Bolonha em Portugal – Presente e Futuro. Aveiro, 2009 MORAES, Maria Célia Marcondes de. O processo de Bolonha vis a vis a globalização de um modelo de Ensino Superior. In PERSPECTIVA, Florianópolis, v. 24, n. 1, p. 187-203, jan/jun. 2006 PEREIRA, Estela. Entrevista concedida a Arie Storch. Aveiro, 2009. PEREIRA, Estela. Interview by Sara Diogo conducted for the Master Thesis. Aveiro, 2009 . PESSOA, Inês Costa. Programa Erasmus: intercâmbio crescente no espaço europeu. In: Janus online. Observatório de Relações Exteriores da Universidade Autónoma de Lisboa. Lisboa, 2003. Disponível em http://www.janusonline.pt/2003/2003_1_4_11.html (acesso em 25/06/2009). Prague Communique. Towards the European Higher Education Area. Communique of the meeting of European Ministers in charge of Higher Education. Prague. May 19. STORCH, Arie. Quer fazer mestrado? Já conhece o Erasmus Mundus? Disponível em http://ariestorch.multiply.com/journal/item/8/8 (acesso em 25/06/2009). The National Unions of Students in Europe. Student Göteborg Declaration. Gotemburgo, 2001. Disponível em http://www.esib.org/index.php/documents/statements/396-student- goeteborg-declaration (acesso em 28/06/2009). 40