SlideShare uma empresa Scribd logo
r e p o rtag e m

Juventude no alvo

Pesquisa aponta aumento na taxa de homicídio de adolescentes
brasileiros e mostra que a violência chegou ao interior do País
Por Isabela Morais

A

ntônio Francisco de Paula Filho estava há poucos meses na
direção da Ernani Silva Bruno
na Vila Brasilândia, zona norte de São Paulo, quando ouviu
de dentro da escola os tiros que vitimaram
um ex-aluno, em agosto de 2003. “Foi a única morte que aconteceu tão perto de nós, mas
de vez em quando a gente fica sabendo de um
caso ou outro”, ele conta. A região, na periferia da cidade, carrega os mais pesados índices de assassinato de jovens. Fora da capital
paulista, o número de homicídios de crianças e adolescentes também ameaça os direitos humanos dessa população.
Segundo o Mapa da Violência 2012 –
Crianças e Adolescentes do Brasil, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), entre 1981 e 2010, foram registradas 180 mil vítimas, o que coloca
o Brasil na quarta posição no ranking mundial de assassinatos de pessoas de zero a 19
anos. Entre 92 nações, a situação só é pior em
El Salvador, Venezuela e Trinidad e Tobago.
Chama a atenção o cenário da última década. De 2000 a 2010, as taxas, já elevadas, cresceram de 11,9 para 13,8 assassinatos para cada 100 mil crianças e adolescentes. Além do aumento no número de vítimas, uma característica histórica voltou a
ser confirmada, a vitimização masculina:
os garotos somam 90% dos casos. Outro dado relevante mostra que a violência contra
os jovens tem aumentado fora dos grandes
centros urbanos e da Região Sudeste.
Cerca de 70% de todos os assassinatos co-

Entre 1990
e 2000 o número
de assassinatos
passou de 11,9
para 13,8 para
cada 100 mil
crianças
e adolescentes

metidos no País são causados por armas de
fogo. Apesar da falta de pesquisas, Bruno
Langeani, coordenador da área de controle de armas do Instituto Sou da Paz, considera que a tendência deve ser a mesma nos
homicídios de crianças e adolescentes.
Para Miriam Abramovay, coordenadora
da área de Juventude e Políticas Públicas da
Flacso, o acesso a armas de fogo, a glamourização da violência, as medidas repressivas
e a falta de ações para os jovens ajudam a explicar os números. Em uma sociedade exibicionista, onde a demonstração de força é tida como um bem, a aquisição de armamento se torna uma questão delicada. “Como faço pesquisa na área, já ouvi vários depoimentos de garotos que dizem ser mais fácil comprar uma arma do que um pão na padaria.”
Outra motivação para os números, de acordo com a pesquisadora, está na dificuldade
do poder público em atender às reivindicações básicas da juventude e na prioridade dada a medidas de caráter repressivo. O trato
com jovens pede políticas preventivas. “Não
conseguimos garantir um verdadeiro estado
de proteção para esses meninos e meninas,
porque não prevenimos.” Quanto às políticas
públicas, Miriam lamenta que hoje “falta tudo” para o jovem brasileiro. “Faltam trabalho, possibilidade de permanecer na escola,
acesso à cultura e ao lazer. Faltam políticas
de segurança efetivas e medidas de proteção.”
Consolidando a tendência observada em
estudos anteriores, o Mapa da Violência 2012
mostra duas mudanças na distribuição dos
homicídios pelo País. O primeiro fenômeno

58 carta fundamental

••CFReportagemViolencia41.indd 58

28/08/12 19:03
marlen e b ergam o/folhapre s s

é o da interiorização. Até 1996, o crescimento
de homicídios acontecia nas capitais e nas regiões metropolitanas, mas, a partir de 2003,
as taxas desses locais declinaram, enquanto
os números de cidades do interior cresceram.
A disseminação fez com que diversos estados que apresentavam taxas moderadas,
durante 1990 a 2000, vivenciassem um
boom em seus níveis de violência na década
posterior. Movimentos diferentes, mas que
integram um mesmo fenômeno. De acordo
com a pesquisadora, essas migrações são
resultado do aumento da repressão nas cidades maiores. “Quando houve um pouco mais de controle, inclusive, sobre o tráfico de drogas, a violência foi para o interior.” Hoje, o Brasil conta com diversos focos de violência espalhados pelo território e

Tiro certo
Os garotos somam
90% dos casos
de violência

não mais com grandes áreas problemáticas.
Das dez cidades com maiores taxas, cinco
são do estado da Bahia, duas do Espírito Santo, uma do Pará, uma de Alagoas e uma da
Paraíba. Líder do ranking, o município de Simões Filho (BA) chega a registrar a taxa de
134,4, seguido de Lauro de Freiras (BA) com
94,6 e Ananindeua (PA) com 88,6. André de
Albuquerque Garcia, secretário extraordinário de Ações Estratégias do Espírito Santo,
considera que os números revelam uma realidade histórica do estado, que possui duas
entre as dez cidades com piores índices.
“Sempre estivemos próximos ao dobro da
média nacional.” Desde 2011, o governo trabalha com o Programa Estado Presente, que
pretende reduzir a violência nas regiões mais
vulneráveis. “Estamos no segundo ano de redução de indicadores, mas como a quantidade de homicídios ainda é elevada, não temos
muito que comemorar.” O secretário afirma
que tem trabalhado com ações de prevenção
entre crianças e adolescentes com atividades
culturais, de lazer e ações educativas que
aproximam as escolas da comunidade.
De acordo com Miriam, a escola pode desempenhar um papel importante para não
naturalizar a violência na vida da criança e
do adolescente. Se uma cultura de paz permeia a vida do estudante, ele deixa de buscar respostas violentas para seus problemas.
Uma solução é colocar em discussão as pequenas agressões do cotidiano, como xingamentos e atitudes preconceituosas.
A escola Ernani Silva Bruno oferece oficinas de capoeira, música afro-brasileira, teatro e dança do ventre durante o período de
contraturno. Apesar de muitos desses projetos estarem “capengas”, o diretor Tico – como é conhecido na comunidade – tem conseguido manter alunos na escola além do
período de aulas. Ocupar o tempo das crianças e dos adolescentes, afirma Tico, pode
ajudar a mantê-los longe da criminalidade
da área mais violenta da cidade. Mas só isso não basta. “O governo tem jogado a função de criar políticas públicas para a escola. Nós ficamos saturados. Por que tudo tem
de acontecer na escola? Arrumem-se, também, outros espaços.”
carta fundamental

••CFReportagemViolencia41.indd 59

59

28/08/12 19:03

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Violência na adolescência aula 4
Violência na adolescência aula 4Violência na adolescência aula 4
Violência na adolescência aula 4
ariadnemonitoria
 
A D O L E S C E N T E, F A MÍ L I A, S O C I E D A D E
A D O L E S C E N T E,  F A MÍ L I A,  S O C I E D A D EA D O L E S C E N T E,  F A MÍ L I A,  S O C I E D A D E
A D O L E S C E N T E, F A MÍ L I A, S O C I E D A D E
christall
 
Campanha Não Matarás
Campanha Não MatarásCampanha Não Matarás
Campanha Não Matarás
Jamildo Melo
 
Especializacao painel medos urbanos e midia
Especializacao painel medos urbanos e midiaEspecializacao painel medos urbanos e midia
Especializacao painel medos urbanos e midia
Eliete Correia Santos
 

Mais procurados (19)

Causas para explicar a Violência Urbana
Causas para explicar a Violência UrbanaCausas para explicar a Violência Urbana
Causas para explicar a Violência Urbana
 
Medos urbanos e mídia
Medos urbanos e mídiaMedos urbanos e mídia
Medos urbanos e mídia
 
Juventude e Violência
Juventude e ViolênciaJuventude e Violência
Juventude e Violência
 
Teu g-1 criminalidade no brasil. índio e salvador
Teu   g-1 criminalidade no brasil. índio e salvadorTeu   g-1 criminalidade no brasil. índio e salvador
Teu g-1 criminalidade no brasil. índio e salvador
 
Imperatriz palestra lmp_40_min
Imperatriz palestra lmp_40_minImperatriz palestra lmp_40_min
Imperatriz palestra lmp_40_min
 
Violencia e exterminio de jovens
Violencia e exterminio de jovensViolencia e exterminio de jovens
Violencia e exterminio de jovens
 
Juventude Viva - Homicídios e Juventude no Brasil
Juventude Viva - Homicídios e Juventude no BrasilJuventude Viva - Homicídios e Juventude no Brasil
Juventude Viva - Homicídios e Juventude no Brasil
 
Violência na adolescência aula 4
Violência na adolescência aula 4Violência na adolescência aula 4
Violência na adolescência aula 4
 
Maioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanosMaioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanos
 
Vitimas da cor
Vitimas da corVitimas da cor
Vitimas da cor
 
Maioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanosMaioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanos
 
Artigo - Proteção aos direitos das crianças e adolescentes: obrigação social
Artigo - Proteção aos direitos das crianças e adolescentes: obrigação socialArtigo - Proteção aos direitos das crianças e adolescentes: obrigação social
Artigo - Proteção aos direitos das crianças e adolescentes: obrigação social
 
18 de maio dia nacional de combate ao abuso e exploracao sexual de criancas e...
18 de maio dia nacional de combate ao abuso e exploracao sexual de criancas e...18 de maio dia nacional de combate ao abuso e exploracao sexual de criancas e...
18 de maio dia nacional de combate ao abuso e exploracao sexual de criancas e...
 
A D O L E S C E N T E, F A MÍ L I A, S O C I E D A D E
A D O L E S C E N T E,  F A MÍ L I A,  S O C I E D A D EA D O L E S C E N T E,  F A MÍ L I A,  S O C I E D A D E
A D O L E S C E N T E, F A MÍ L I A, S O C I E D A D E
 
Campanha Não Matarás
Campanha Não MatarásCampanha Não Matarás
Campanha Não Matarás
 
Especializacao painel medos urbanos e midia
Especializacao painel medos urbanos e midiaEspecializacao painel medos urbanos e midia
Especializacao painel medos urbanos e midia
 
Gabriel Fernando - Maio Laranja - 8º Ano Bartolomeu
Gabriel Fernando - Maio Laranja - 8º Ano BartolomeuGabriel Fernando - Maio Laranja - 8º Ano Bartolomeu
Gabriel Fernando - Maio Laranja - 8º Ano Bartolomeu
 
7º ano reda cem - 7.31
7º ano   reda cem - 7.317º ano   reda cem - 7.31
7º ano reda cem - 7.31
 
Dia internacional contra a homofobia interdisciplinar er portugues sociologia...
Dia internacional contra a homofobia interdisciplinar er portugues sociologia...Dia internacional contra a homofobia interdisciplinar er portugues sociologia...
Dia internacional contra a homofobia interdisciplinar er portugues sociologia...
 

Destaque (7)

Procore Certification
Procore CertificationProcore Certification
Procore Certification
 
Apresentação1
Apresentação1Apresentação1
Apresentação1
 
Boletim Consumo e Finanças - Pacotes e Serviços Bancários
Boletim Consumo e Finanças - Pacotes e Serviços BancáriosBoletim Consumo e Finanças - Pacotes e Serviços Bancários
Boletim Consumo e Finanças - Pacotes e Serviços Bancários
 
Ecdl Modulo 1.3
Ecdl Modulo 1.3Ecdl Modulo 1.3
Ecdl Modulo 1.3
 
Comunicado
ComunicadoComunicado
Comunicado
 
Alimentos para iluminar
Alimentos para iluminarAlimentos para iluminar
Alimentos para iluminar
 
NQF 6 CERTIFICATE
NQF 6 CERTIFICATENQF 6 CERTIFICATE
NQF 6 CERTIFICATE
 

Semelhante a Juventude no alvo

Violência e exploração sexual de crianças e adolescentes
Violência e exploração sexual de crianças e adolescentesViolência e exploração sexual de crianças e adolescentes
Violência e exploração sexual de crianças e adolescentes
Gleisi Hoffmann
 
Maioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanosMaioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanos
aa. Rubens Lima
 
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
guestd8f8e66
 
Os Homicídios no Nordeste Brasileiro
Os Homicídios no Nordeste BrasileiroOs Homicídios no Nordeste Brasileiro
Os Homicídios no Nordeste Brasileiro
Jamildo Melo
 

Semelhante a Juventude no alvo (20)

nuzzi.pptx
nuzzi.pptxnuzzi.pptx
nuzzi.pptx
 
Violência e exploração sexual de crianças e adolescentes
Violência e exploração sexual de crianças e adolescentesViolência e exploração sexual de crianças e adolescentes
Violência e exploração sexual de crianças e adolescentes
 
Mapa da violencia da juventude 2011
Mapa da violencia da juventude 2011Mapa da violencia da juventude 2011
Mapa da violencia da juventude 2011
 
Maioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanosMaioridade penal e direitos humanos
Maioridade penal e direitos humanos
 
ADOLESCENTE
ADOLESCENTEADOLESCENTE
ADOLESCENTE
 
Violência contra crianças e adolescentes
Violência contra crianças e adolescentesViolência contra crianças e adolescentes
Violência contra crianças e adolescentes
 
Artigo physis
Artigo physisArtigo physis
Artigo physis
 
Violência Urbana 2019.pptx
Violência Urbana 2019.pptxViolência Urbana 2019.pptx
Violência Urbana 2019.pptx
 
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
Trabalho De Filosofia Marcelly E Hellielton.
 
Os Homicídios no Nordeste Brasileiro
Os Homicídios no Nordeste BrasileiroOs Homicídios no Nordeste Brasileiro
Os Homicídios no Nordeste Brasileiro
 
IVJ-Violência
IVJ-ViolênciaIVJ-Violência
IVJ-Violência
 
Anexo 2 ata comtur 2017 05 04 ___2016 08 25 pt_diagnóstico de paraty final_pu...
Anexo 2 ata comtur 2017 05 04 ___2016 08 25 pt_diagnóstico de paraty final_pu...Anexo 2 ata comtur 2017 05 04 ___2016 08 25 pt_diagnóstico de paraty final_pu...
Anexo 2 ata comtur 2017 05 04 ___2016 08 25 pt_diagnóstico de paraty final_pu...
 
Adolescente
AdolescenteAdolescente
Adolescente
 
Segurança em Itabuna
Segurança em ItabunaSegurança em Itabuna
Segurança em Itabuna
 
Violencia domestica infantil
Violencia domestica infantilViolencia domestica infantil
Violencia domestica infantil
 
9º ano B (Grupo 2) - Racismo
9º ano B (Grupo 2) - Racismo9º ano B (Grupo 2) - Racismo
9º ano B (Grupo 2) - Racismo
 
Feminicidio.pptx
Feminicidio.pptxFeminicidio.pptx
Feminicidio.pptx
 
Pesquisa Impacto Econômico e Violência Infantil
Pesquisa Impacto Econômico e Violência InfantilPesquisa Impacto Econômico e Violência Infantil
Pesquisa Impacto Econômico e Violência Infantil
 
8º ano
8º ano8º ano
8º ano
 
Nota do MPF
Nota do MPFNota do MPF
Nota do MPF
 

Último

Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdfHans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
rarakey779
 
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
ESCRIBA DE CRISTO
 
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
edjailmax
 
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdfOFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
AndriaNascimento27
 

Último (20)

Slides Lição 9, CPAD, Resistindo à Tentação no Caminho, 2Tr24.pptx
Slides Lição 9, CPAD, Resistindo à Tentação no Caminho, 2Tr24.pptxSlides Lição 9, CPAD, Resistindo à Tentação no Caminho, 2Tr24.pptx
Slides Lição 9, CPAD, Resistindo à Tentação no Caminho, 2Tr24.pptx
 
Slides Lição 9, Betel, Ordenança para uma vida de santificação, 2Tr24.pptx
Slides Lição 9, Betel, Ordenança para uma vida de santificação, 2Tr24.pptxSlides Lição 9, Betel, Ordenança para uma vida de santificação, 2Tr24.pptx
Slides Lição 9, Betel, Ordenança para uma vida de santificação, 2Tr24.pptx
 
Manual de Direito do Trabalho - Adriana Calvo - 2020.pdf
Manual de Direito do Trabalho - Adriana Calvo - 2020.pdfManual de Direito do Trabalho - Adriana Calvo - 2020.pdf
Manual de Direito do Trabalho - Adriana Calvo - 2020.pdf
 
Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdfHans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
Hans Kelsen - Teoria Pura do Direito - Obra completa.pdf
 
América Latina: Da Independência à Consolidação dos Estados Nacionais
América Latina: Da Independência à Consolidação dos Estados NacionaisAmérica Latina: Da Independência à Consolidação dos Estados Nacionais
América Latina: Da Independência à Consolidação dos Estados Nacionais
 
FUNBIO 1-AÇÃO & EFEITO HORMONAL NO METABOLISMO-ALUNOS.pptx
FUNBIO 1-AÇÃO & EFEITO HORMONAL NO METABOLISMO-ALUNOS.pptxFUNBIO 1-AÇÃO & EFEITO HORMONAL NO METABOLISMO-ALUNOS.pptx
FUNBIO 1-AÇÃO & EFEITO HORMONAL NO METABOLISMO-ALUNOS.pptx
 
DeClara n.º 76 MAIO 2024, o jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara de...
DeClara n.º 76 MAIO 2024, o jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara de...DeClara n.º 76 MAIO 2024, o jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara de...
DeClara n.º 76 MAIO 2024, o jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara de...
 
ATPCG 27.05 - Recomposição de aprendizagem.pptx
ATPCG 27.05 - Recomposição de aprendizagem.pptxATPCG 27.05 - Recomposição de aprendizagem.pptx
ATPCG 27.05 - Recomposição de aprendizagem.pptx
 
"Está o lascivo e doce passarinho " de Luís Vaz de Camões
"Está o lascivo e   doce passarinho " de Luís Vaz de Camões"Está o lascivo e   doce passarinho " de Luís Vaz de Camões
"Está o lascivo e doce passarinho " de Luís Vaz de Camões
 
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
INTRODUÇÃO A ARQUEOLOGIA BÍBLICA [BIBLIOLOGIA]]
 
Curso de Direito do Trabalho - Maurício Godinho Delgado - 2019.pdf
Curso de Direito do Trabalho - Maurício Godinho Delgado - 2019.pdfCurso de Direito do Trabalho - Maurício Godinho Delgado - 2019.pdf
Curso de Direito do Trabalho - Maurício Godinho Delgado - 2019.pdf
 
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
5ca0e9_ea0307e5baa1478490e87a15cb4ee530.pdf
 
Exercícios de Clima no brasil e no mundo.pdf
Exercícios de Clima no brasil e no mundo.pdfExercícios de Clima no brasil e no mundo.pdf
Exercícios de Clima no brasil e no mundo.pdf
 
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdfOFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
OFICINA - CAFETERIA DAS HABILIDADES.pdf_20240516_002101_0000.pdf
 
Caderno de Estudo Orientado para Ensino Médio
Caderno de Estudo Orientado para Ensino MédioCaderno de Estudo Orientado para Ensino Médio
Caderno de Estudo Orientado para Ensino Médio
 
Atividades-Sobre-o-Conto-Venha-Ver-o-Por-Do-Sol.docx
Atividades-Sobre-o-Conto-Venha-Ver-o-Por-Do-Sol.docxAtividades-Sobre-o-Conto-Venha-Ver-o-Por-Do-Sol.docx
Atividades-Sobre-o-Conto-Venha-Ver-o-Por-Do-Sol.docx
 
Slides Lição 9, Central Gospel, As Bodas Do Cordeiro, 1Tr24.pptx
Slides Lição 9, Central Gospel, As Bodas Do Cordeiro, 1Tr24.pptxSlides Lição 9, Central Gospel, As Bodas Do Cordeiro, 1Tr24.pptx
Slides Lição 9, Central Gospel, As Bodas Do Cordeiro, 1Tr24.pptx
 
Aproveitando as ferramentas do Tableau para criatividade e produtividade
Aproveitando as ferramentas do Tableau para criatividade e produtividadeAproveitando as ferramentas do Tableau para criatividade e produtividade
Aproveitando as ferramentas do Tableau para criatividade e produtividade
 
Atividade - Letra da música Xote da Alegria - Falamansa
Atividade  - Letra da  música Xote  da  Alegria    -   FalamansaAtividade  - Letra da  música Xote  da  Alegria    -   Falamansa
Atividade - Letra da música Xote da Alegria - Falamansa
 
Correção do 1º Simulado Enem 2024 - Mês de Abril.pdf
Correção do 1º Simulado Enem 2024 - Mês de Abril.pdfCorreção do 1º Simulado Enem 2024 - Mês de Abril.pdf
Correção do 1º Simulado Enem 2024 - Mês de Abril.pdf
 

Juventude no alvo

  • 1. r e p o rtag e m Juventude no alvo Pesquisa aponta aumento na taxa de homicídio de adolescentes brasileiros e mostra que a violência chegou ao interior do País Por Isabela Morais A ntônio Francisco de Paula Filho estava há poucos meses na direção da Ernani Silva Bruno na Vila Brasilândia, zona norte de São Paulo, quando ouviu de dentro da escola os tiros que vitimaram um ex-aluno, em agosto de 2003. “Foi a única morte que aconteceu tão perto de nós, mas de vez em quando a gente fica sabendo de um caso ou outro”, ele conta. A região, na periferia da cidade, carrega os mais pesados índices de assassinato de jovens. Fora da capital paulista, o número de homicídios de crianças e adolescentes também ameaça os direitos humanos dessa população. Segundo o Mapa da Violência 2012 – Crianças e Adolescentes do Brasil, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), entre 1981 e 2010, foram registradas 180 mil vítimas, o que coloca o Brasil na quarta posição no ranking mundial de assassinatos de pessoas de zero a 19 anos. Entre 92 nações, a situação só é pior em El Salvador, Venezuela e Trinidad e Tobago. Chama a atenção o cenário da última década. De 2000 a 2010, as taxas, já elevadas, cresceram de 11,9 para 13,8 assassinatos para cada 100 mil crianças e adolescentes. Além do aumento no número de vítimas, uma característica histórica voltou a ser confirmada, a vitimização masculina: os garotos somam 90% dos casos. Outro dado relevante mostra que a violência contra os jovens tem aumentado fora dos grandes centros urbanos e da Região Sudeste. Cerca de 70% de todos os assassinatos co- Entre 1990 e 2000 o número de assassinatos passou de 11,9 para 13,8 para cada 100 mil crianças e adolescentes metidos no País são causados por armas de fogo. Apesar da falta de pesquisas, Bruno Langeani, coordenador da área de controle de armas do Instituto Sou da Paz, considera que a tendência deve ser a mesma nos homicídios de crianças e adolescentes. Para Miriam Abramovay, coordenadora da área de Juventude e Políticas Públicas da Flacso, o acesso a armas de fogo, a glamourização da violência, as medidas repressivas e a falta de ações para os jovens ajudam a explicar os números. Em uma sociedade exibicionista, onde a demonstração de força é tida como um bem, a aquisição de armamento se torna uma questão delicada. “Como faço pesquisa na área, já ouvi vários depoimentos de garotos que dizem ser mais fácil comprar uma arma do que um pão na padaria.” Outra motivação para os números, de acordo com a pesquisadora, está na dificuldade do poder público em atender às reivindicações básicas da juventude e na prioridade dada a medidas de caráter repressivo. O trato com jovens pede políticas preventivas. “Não conseguimos garantir um verdadeiro estado de proteção para esses meninos e meninas, porque não prevenimos.” Quanto às políticas públicas, Miriam lamenta que hoje “falta tudo” para o jovem brasileiro. “Faltam trabalho, possibilidade de permanecer na escola, acesso à cultura e ao lazer. Faltam políticas de segurança efetivas e medidas de proteção.” Consolidando a tendência observada em estudos anteriores, o Mapa da Violência 2012 mostra duas mudanças na distribuição dos homicídios pelo País. O primeiro fenômeno 58 carta fundamental ••CFReportagemViolencia41.indd 58 28/08/12 19:03
  • 2. marlen e b ergam o/folhapre s s é o da interiorização. Até 1996, o crescimento de homicídios acontecia nas capitais e nas regiões metropolitanas, mas, a partir de 2003, as taxas desses locais declinaram, enquanto os números de cidades do interior cresceram. A disseminação fez com que diversos estados que apresentavam taxas moderadas, durante 1990 a 2000, vivenciassem um boom em seus níveis de violência na década posterior. Movimentos diferentes, mas que integram um mesmo fenômeno. De acordo com a pesquisadora, essas migrações são resultado do aumento da repressão nas cidades maiores. “Quando houve um pouco mais de controle, inclusive, sobre o tráfico de drogas, a violência foi para o interior.” Hoje, o Brasil conta com diversos focos de violência espalhados pelo território e Tiro certo Os garotos somam 90% dos casos de violência não mais com grandes áreas problemáticas. Das dez cidades com maiores taxas, cinco são do estado da Bahia, duas do Espírito Santo, uma do Pará, uma de Alagoas e uma da Paraíba. Líder do ranking, o município de Simões Filho (BA) chega a registrar a taxa de 134,4, seguido de Lauro de Freiras (BA) com 94,6 e Ananindeua (PA) com 88,6. André de Albuquerque Garcia, secretário extraordinário de Ações Estratégias do Espírito Santo, considera que os números revelam uma realidade histórica do estado, que possui duas entre as dez cidades com piores índices. “Sempre estivemos próximos ao dobro da média nacional.” Desde 2011, o governo trabalha com o Programa Estado Presente, que pretende reduzir a violência nas regiões mais vulneráveis. “Estamos no segundo ano de redução de indicadores, mas como a quantidade de homicídios ainda é elevada, não temos muito que comemorar.” O secretário afirma que tem trabalhado com ações de prevenção entre crianças e adolescentes com atividades culturais, de lazer e ações educativas que aproximam as escolas da comunidade. De acordo com Miriam, a escola pode desempenhar um papel importante para não naturalizar a violência na vida da criança e do adolescente. Se uma cultura de paz permeia a vida do estudante, ele deixa de buscar respostas violentas para seus problemas. Uma solução é colocar em discussão as pequenas agressões do cotidiano, como xingamentos e atitudes preconceituosas. A escola Ernani Silva Bruno oferece oficinas de capoeira, música afro-brasileira, teatro e dança do ventre durante o período de contraturno. Apesar de muitos desses projetos estarem “capengas”, o diretor Tico – como é conhecido na comunidade – tem conseguido manter alunos na escola além do período de aulas. Ocupar o tempo das crianças e dos adolescentes, afirma Tico, pode ajudar a mantê-los longe da criminalidade da área mais violenta da cidade. Mas só isso não basta. “O governo tem jogado a função de criar políticas públicas para a escola. Nós ficamos saturados. Por que tudo tem de acontecer na escola? Arrumem-se, também, outros espaços.” carta fundamental ••CFReportagemViolencia41.indd 59 59 28/08/12 19:03