2. ALTERNATIVIDADE
NA RESOLUÇÃO DE
CONFLITOS NA
AMERICA LATINA
Necessidade de se superar a “tradição inquisitorial”
vigente, especialmente no que diz respeito ao
abandono da noção de “delito” como mera violação à
norma estatal.
Tal concepção privilegiava o “conflito secundário”
associado ao crime, isto é, a relação de desobediência
do indivíduo em relação ao Estado, sufocando maiores
atenções aos interesses das pessoas concretamente
envolvidas na relação conflitiva.
3. No modelo inquisitório, em razão de
sua marca direcionada a isso que se
chamou de “sistema infracional”, a
vítima ocupou um lugar secundário na
persecução criminal, tanto em
relação ao seu reconhecimento
normativo, como na tutela de seus
direitos pelo sistema.
4. Nils CHRISTIE: isso representou um
“furto” dos conflitos em desfavor das
pessoas diretamente envolvidas, “de
modo tal que ou desapareceram, ou
estão se transformando em
pertencimento de outras pessoas”.
5. A questão foi tratada, também, por Julio MAIER, em um célebre
escrito publicado na década de 90, para quem a Inquisição, ao criar a persecução penal
pública, “expropriou” as faculdades processuais da vítima, que, por muito tempo,
figurou como o “convidado de pedra” do sistema penal.
La característica diferencial del poder punitivo es la confiscación del conflicto, o sea, la
usurpación del puesto del damnificado o víctima por parte del señor (poder
público), degradando a la persona lesionada o víctima a la condición de puro dato para la
criminalización. [...] Sólo cuando se extrae el conflicto de ese modelo y se lo resuelve conforme
a alguno de los otros modelos de decisión de conflictos se llega a una solución, pero en ese
supuestro el poder punitivo desaparece, porque por definición nos habremos salido de su
modelo. Lo cierto es que, desde el momento de la confiscación de la víctima, el poder público
adquirió enorme capacidad de decisión (no de solución) [...] para lo cual ejerce un constante
poder de vigilancia controladora sobre toda la sociedad y, en especial, sobre los que supone
real o potencialmente dañinos para su jerarquización. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl, 2009, p. 30-
31).
6. Assim, como resistência à concepção inquisitorial do fenômeno
criminal, verificou-se em diversos países latino-americanos a
inclusão da justiça restaurativa na pauta de gestão de
“conflitualidade”, na expressão utilizada por GONZÁLEZ
POSTIGO, tendo como pano de fundo a ascensão dos debates
sobre a valorização das vítimas e a adoção de saídas alternativas
no novo sistema de persecução criminal.
7. Com relação ao modelo restaurativo, em si, é possível dizer que se trata de uma ideia
desprovida de um conceito unívoco, o que levou autores a se referirem a um
movimento cujas linhas são escritas conforme a experiência.
Em meio às discussões teóricas acerca da justiça restaurativa, que
fluem desde escritos da segunda metade do século XX (especialmente a obra de
Howard ZEHR e John BRAITHWAITE), uma definição normalmente aceita do
modelo é aquela segundo a qual “a justiça restaurativa é um processo pelo qual as
partes envolvidas em um delito específico resolvem coletivamente como lidar com as
consequências por ele causadas e suas implicações para o futuro”.
Tal ideia, marcada por enfatizar apenas a participação dos envolvidos no “processo”
restaurativo (e não o seu resultado), teria sido criticada por alguns autores, que
entenderam ser necessário enfatizar a reparação do dano causado pelo
delito como a consequência ideal do encontro .
SILVEIRA; COUTO. PARA ALÉM DO PROCESSO: a implementação da justiça restaurativa no Brasil a partir do discurso político-criminal inerente à reforma
processual penal na América Latina. Disponível em: https://periodicos.pucminas.br/index.php/Direito/article/download/23529/17471/
8. JUSTIÇA RESTAURATIVA
Raffaella Pallamolla acentua que “a justiça restaurativa possui um
conceito não só aberto como, também, fluido, pois vem sendo
modificado, assim como suas práticas, desde os primeiros estudos e
experiências restaurativas” (2009, P. 54)
Quanto à relação vítima-agressor, se busca a reconciliação, estimulando
o perdão da vítima e o arrependimento do agressor. Contudo, em
ambos os casos, não pode, o Estado, coagir as partes da relação, uma
vez que tanto o perdão como o arrependimento são processos
emocionais e, muitas vezes, inatingíveis, a depender da materialidade
dos fatos e da gravidade da ofensa. Contudo, cabe, ao Estado, fornecer
oportunidades para tanto, tentando trazer vítima e agressor de uma
situação de hostilidade para uma relação positiva.
9. TROCANDO AS LENTES - ZEHR
• A Justiça Restaurativa Sua pressupõe uma mudança de paradigma ou,
como descreve Howard Zehr, a construção de uma nova lente, que seria
nas palavras do autor “visões alternativas fundamentadas em princípios e
experiências” que serviria como caminho para soluções à crise atual.
• A principal mudança refere-se à forma como enxergamos o crime,que
passa a ser entendido como uma violação de pessoas e relacionamentos.
• A justiça deverá se concentrar na reparação, em acertar o que não está
certo. Ocorrido o fato criminoso, a Justiça Restaurativa envolve a vítima, o
ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovam reconciliação
com vistas à restauração.
10. INDICAÇÕES DE VÍDEOS
• Kay Pranis e o círculos restaurativos:
https://www.youtube.com/watch?v=0sRLZ6XzYpI&t=90s&pp=ygUVanVzdG
nDp2EgcmVzdGF1cmF0aXZh
• Howard Zehr O que é Justiça Restaurativa?
https://www.youtube.com/watch?v=Nrd7uZ3p3NQ&pp=ygUhaG93YXJkIHp
laHIganVzdGnDp2EgcmVzdGF1cmF0aXZh
• Howard Zehr responde (curso da AJURIS para aprofundamento na
formação de facilitadores de círculos restaurativos)
https://youtube.com/playlist?list=PL3JvDncr1dN-
s8RREZKU4Gh329At2Frt8&si=TQXaO4vh9hjSH-HS
• Indicação de Podcast:
https://open.spotify.com/episode/2zqh04U13QYDpBuGH53tM5?si=_R2t0v
JdSgaTXMFZzx57rQ
11.
12. Princípios e Valores da Justiça Restaurativa
Conforme resolução 2002/12 do Conselho Econômico e Social da
Organização das Nações Unidas, são princípios que fundamentam a JR:
• Princípio do Voluntarismo: manifestação de vontade livre e espontânea;
• Princípio do Consensualismo: característica de pacto, de acordo firmado
entre as partes;
• Princípio da Complementaridade: não substitui o modelo tradicional de
justiça;
• Princípio da Confidencialidade: as partes devem se tratar com confiança e
honestidade, de forma oral, e justifica a não obrigatoriedade de que as
propostas feitas sejam reduzidas a termo;
• Princípio da Celeridade: traz eficiência e celeridade;
• Princípio da Disciplina: as partes devem ter respeito pelo processo.
13. PROPOSTA DE PESQUISA
• Escolher um tribunal que tenha implantado o programa de justiça
restaurativa e pesquisar o modelo utilizado, para quais casos tem sido
aplicado, quantas pessoas já foram atendidas, enfim, trazer dados
sobre a implantação e aplicação da Justiça Restaurativa.
• Indicação de leitura:
Mapeamento do CNJ sobre a implantação de justiça restaurativa nos
tribunais: https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/conteudo/arquivo/2019/06/8e6cf55c06c5593974bf
b8803a8697f3.pdf
Resolução Nº 225 de 31/05/2016 do CNJ:
https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2289