O diretor do Vox Populi discute:
1) O financiamento público de campanha poderia reduzir a influência de lobbies e doações;
2) Existe apoio no Senado, mas a proposta está travada na Câmara;
3) Uma mudança para financiamento público beneficiaria todos reduzindo a partidarização excessiva.
DocumentoEntrevista do Diretor do Vox Populi ao Rede Brasil Atual
1. Entrevista do Diretor do Vox Populi ao Rede Brasil Atual
Existe uma tentativa de discutir e aprovar a questão do financiamento público de
campanha. Isso implicaria mudança na relação política?
Eu tenho, como observador e como analista, um entendimento de que o financiamento
público seria muito positivo para o país e acredito que seria uma maneira em que se
poderiam considerar a interferência excessiva do poder econômico, como no processo
eleitoral, sendo diminuído e até eliminado. Evidente que se fizéssemos um sistema de
financiamento público, a força de interferência de lobbies empresariais, associativos e
corporativos seria muito menor.
O modelo que está em discussão na Câmara poderia logo ser posto em prática.
Curioso que no Senado todos os partidos aprovaram a ideia. Faltava definir um
modelo mais específico, mas houve acordo entre as principais lideranças políticas. Na
Câmara, o relator apresentou uma proposta, mas as coisas ficaram um pouco travadas.
Não sei qual andamento ela terá, mas de qualquer maneira já se decidiu que não havia
por que correr para aprovar ainda a tempo de aplicar para as eleições de 2012. Mas
provavelmente nós teremos tempo ao longo deste ano e do próximo, se houver a
chamada vontade política, para votar ainda a tempo de valer para 2014.
De que maneira todos sairiam ganhando com uma mudança na relação entre os
partidos políticos e entre o Legislativo e o Executivo?
Uma das razões que explicam a duração dos embates políticos no Brasil é a
partidarização excessiva de algumas questões. É totalmente natural que alguns temas
sejam tratados a partir da identificação partidária do parlamentar. Mas existem outros
em que o que está em jogo é uma coisa mais ampla, que é o interesse nacional, para
usar como uma palavra que serve em situações como essa. Não é incomum e diferente
em outros lugares do mundo, quando o sistema político está perante questões que não
são partidárias, são quase que consenso, em questões como essa eu acredito que o
mais correto seria o parlamentar votar contra o consenso. E na votação do Código
Florestal, nós vimos isso.
Quem de fato acabou tendo a vitória defende as teses que não vão ao encontro do
interesse nacional de longo prazo, pelo menos a mim me parece. Quem acabou
apoiando isso não foi o setor diretamente interessado, mas uma coalizão na qual
pessoas que no fundo não acreditam que essa é a melhor solução para o Brasil, e
votaram desse jeito apenas para derrotar o posicionamento do governo. Isso que eu
acho que era um mau ensinamento da época em que o próprio PT tinha um
comportamento muito negativo, mas que foi revisto quando o partido chegou ao
governo. O que é estranho é que as atuais oposições que foram governo e cobravam
do PT, agora fazem o mesmo jogo.
Dilma tem conseguido imprimir essa mudança de lógica política ou ainda é cedo?
Qual o limite dessa mudança?
Eu acho que ela está fazendo. Se ela consolidará como uma marca da administração
dela, talvez seja coisa para dizer. A Dilma, ao contrário dos políticos tradicionais, não
tem um projeto de ficar no poder. A Dilma tem um projeto de administração e ela
enxerga dificuldades para executar esse projeto de administração de uma maneira bem
1
2. diferente de um político mais tradicional, até que o Lula. O Lula tinha uma tolerância
que ela não tem. E isso é muito salutar para ficar na política brasileira. É muito
positivo. Agora, até que ponto ela irá é difícil dizer. Eu acho que ela vai tão longe
quanto ela conseguir e é desejável para todos que ela tenha apoio.
Você tem alguma expectativa de que a CPMI do Cachoeira resulte em revelações
efetivas ou se transformará em mais um palco para essa partidarização excessiva?
Ele é um exemplo 100% político. Em outros casos não vejo, pelo menos por
enquanto, que já esteja na hora de invocar o que seria, digamos, interesse nacional. Eu
acho, no entanto, que já está na hora de uma oportunidade para uma revisão do
relacionamento do sistema político com os grupos de interesse, nesse caso,
envolvendo uma organização com atividades ilegais ou criminosas. É o mais longe
que pode ir na privatização da política, fazendo não só parte do sucesso de um grupo
econômico e de um grupo de interesses, mas de um grupo econômico e de interesses
cujas raízes estão na ilegalidade. Se for colocada essa discussão, o assunto passa a ser
suprapartidário. Mas, por enquanto, não, por enquanto nós estamos vendo um
tensionamento político característico da vida parlamentar. Puxam para um lado,
puxam para o outro, partidariamente.
Discutir a relação entre veículos de imprensa, criminosos e políticos pode ser benéfico
à sociedade?
Para mim não tem dúvida. O que nós tivemos nos últimos anos e as revelações que até
agora foram feitas sugerem que houve uma deliberada concordância dos veículos de
imprensa em nada fazer para denunciar uma coisa que estava vendo. Denunciar como
imprensa e não como autoridade policial, que não é o caso. Em troca de uma
estratégia de tomada de posição política dos veículos. O que se fez foi a aplicação do
velho princípio de que os fins justificam os meios – para atacar o governo vale
qualquer coisa, inclusive fazer um papel muito discutível de colaboração duradoura,
digamos assim, com o grupo do Cachoeira. Dizer que quando alguém que questiona
isso está questionando a imprensa é usar o conceito de “liberdade de imprensa” para
se proteger, para proteger uma prática que é francamente condenável. Não se conhece
nos anais da imprensa política internacional um caso desse tipo. Em Watergate os
repórteres do Washington Post usaram de alguém que fazia confidências e que estava
diante do governo. É completamente diferente.
É cedo para falar sobre companhia nessa chapa do PT em 2014? O PMDB está hoje
mais desgastado do que estava naquele momento, em 2010, e o PSB está mais forte?
É difícil dizer. Talvez seja uma das coisas que a CPI pode fazer: levar esse processo
para um lado ou para o outro. A impressão que eu tenho é que a preferência do Lula é
manter a coligação com o PMDB voltando a apresentar um candidato a vice. Fala-se
muito que um candidato que o Lula tinha como muito provável seria o Sérgio Cabral.
Isso do jeito que é a coisa ficou agora, certamente mudou. Pode ser que o Sérgio
Cabral se recupere, mas nesse momento essa possibilidade ficou muito menor. Agora,
o PSB é parte importante da equação de 2014, pode ser um caminho para o Eduardo
Campos ser candidato a vice junto com a Dilma e, certamente, se Lula for o
candidato, com ele.
2