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AS PRIMEIRAS TENTATIVAS DE CALCULO AGREGATIVO
OS TRABALHOS PIONEIROS
As primeiras tentativas de cálculo econômico agregativo, a nível daquilo que mais
tarde se convencionaria denominar Contabilidade Social, foram empreendidas na
Inglaterra, por WILLIAM PETTY e GREGORY KING, e, na França, por PIERRE
BOISGUILBERT, ainda durante o século XVII; Os estudos de PETTY datam de
1665; estão reunidos em Anual income and Expense of the Peopte. Os de KING
datam de 1696; estão reunidos em Natural and Political Observations and
Conclusions upon the State and Condition of England. Osde BOISGUILBERT
datam de 1697, estão reunidos em Détail de la France.
Esses trabalhos pioneiros limitaram-se a tentativas de definição e de cálculo dos
conceitos de renda nacional e de fortuna nacional. Como observa STUDENSKI,
“esses primeiros pesquisadores já demostravam entender os conceitos de renda e
de fortuna a partir de enfoques globais, abrangentes e agregativos”. Procurando
conceber e quantificar a atividade nacional em seu todo, eles procuraram definir a
renda nacional como o valor anual dos pagamentos à mão-de-obra, incluindo
ainda valores globais de outras transações, como arrendamentos, juros e lucros.
Trataram ainda de definir as bases de um sistema contábil de dupla entrada,
caracterizando as despesas anuais da população, privadas e coletivas, como um
fluxo de dispêndio. Os valores remanescentes das estimativas da renda, em
comparação com os dispêndios, eram caracterizados como acréscimo anual
à fortuna nacional. Este último conceito aparece bem nitidamente nas
contribuições de GREGORY KING.
Todos esses conceitos, bem como a caracterização do inter-relacionamento entre
à produção, a renda e o dispêndio nacionais, seriam objeto, já a partir das
contribuições da economia clássica nos séculos XVlll e XIX, de novos refinamen-
tos teóricos, que gradativamente conduziriam à futura esquematização dos Siste-
mas de Contabilidade Social. Entretanto, há autores que reconhecem nos tra-
balhos de PETTY e KING algo mais do que simples primeiras tentativas. KEN-
DRICK, por exemplo, chega a afirmar que “os enfoques das estimativas pioneiras
são quase similares aos conceitos atuais de renda nacional e de produto nacio-
nal ao custo dos fatores”,
Aos trabalhos pioneiros de PETTY e KING seguiram-se as contribuições dos
fisiocratas franceses, liderados por FRANÇOIS QUESNAY. O Tableau Économi-
gue de QUESNAY, de 1758, embora tenha conceituado a renda nacional de for-
ma mais restrita, iria constituir-se em uma das mais significativas contribuições do
século XVIII à compreensão dos fluxos em que se fundamentam as atividades
econômicas das nações.
Os fisiocratas identificavam a renda nacional como a renda originária das
atividades agrícolas. Entendiam que somente a agricultura gerava renda e
produto, argumentando que as demais atividades econômicas eram estéreis. Na
tentativa de demonstrar a validade desse entendimento, QUESNAY analisou as
inter-relações entre a agricultura e os demais setores da economia, procurando
demonstrar como se processavam as transferências de produção e de renda
daquele primeiro setor para os demais. A análise de QUESNAY, desenvolvida
com o apoio de admirável suporte quantitativo, seria assim a precursora dos atuais
modelos de inter-relações setoriais. Além dessas notáveis contribuições,
QUESNAY procurou evidenciar em seu Tableau Économique a importância dos
investimentos para aumento da produtividade. Além disso, cuidou ainda de
caracterizar o fenômeno da depreciação dos bens de capital, fundamental para a
diferenciação dos conceitos de investimento bruto e líguido.
1.3.2 AS CONTRIBUIÇÕES DOS CLÁSSICOS
As contribuições da economia clássica no campo específico da Contabilida- de
Social foram menos significativas do que em outros campos do conhecimento
econômico. Houve ligeiros avanços em relação às proposições dos fisiocratas,
mas não se registraram tentativas de cálculo econômico agregativo por nenhum
dos principais teóricos liberais do longo período compreendido entre a publicação
de Wealth of Nations, em 1776, de ADAM SMITH, até a revisão neoclássica
empreendida por ALFRED MARSHALL, no final do século XIX.
As raras estimativas realizadas no período clássico envolveram o discutível
conceito de fortuna nacional, muito mais em nível de recenseamento dos recursos
territoriais e de capital ocorrentes dentro do país, do que propriamente de
quantificação dos fluxos globais de produção e de renda, Entre essas raras
tentativas de levantamento censitário da fortuna nacional então empreendidas,
destacaram-se as de A. N. RADISHCHEV, na Rússia, em 1811, de GEORGE
TUCKER, nos Estados Unidos, em 1843, de BAXTER e GIFFEN, na Inglaterra,
respectivamente em 1867 e 1883, de LAVOISIER e LEVASSEUR, na França,
respectivamente em 1791 e 1877, de A. WAGENFUHR, G. RÚMELIN, A. SOE-
TBEER e R. E. MAY, na Alemanha, entre 1863 e 1899, e de T. COUGHLAN, na
Austrália, em 1886.
Quanto ao ponto de vista conceitual, as contribuições do pensamento econômico
clássico limitaram-se a dois aspectos.
O primeiro refere-se à revisão e à crítica do conceito fisiocrata sobre as atividades
consideradas economicamente estéreis.
O segundo refere-se à mais clara compreensão das inter-relações e da identidade
dos circuitos da produção, da renda e do dispêndio nacionais.
A revisão do conceito fisiocrata de atividades estéreis foi inicialmente desenvolvida
por ADAM SMITH. Este entendeu que não apenas as atividades agrícolas
deveriam ser consideradas como produtivas. Exercendo ampla influência nas
posições conceituais de seus seguidores, SMITH argumentou que as indústrias de
transformação adicionavam valor aos bens originários das atividades primárias.
Mais ainda: o fundador do pensamento econômico clássico argumentou que o
comércio também deveria ser entendido como produtivo, não só em decorrência
de sua indispensabilidade, como também pela sua integração na economia de
trocas e de divisão do trabalho que a Revolução Industrial vinha promovendo.
Todavia, apesar desses seus reparos aos conceitos fisiocratas, SMITH não se
libertou por completo dos influentes pontos de vista expostos no Tableau
Economique de QUESNAY. Isto porque, com exclusão do comércio, ele insistiu na
idéia de que todos os demais tipos de serviços não deveriam ser considerados
como produtivos. Sobre este aspecto, é bastante clara em Wealth of Nations a
idéia de que os dispêndios em serviços nada mais são do que uma espécie de
redistribuição de renda, uma transferência de rendimento líquido de classes
produtivas para classes improdutivas.
Neste sentido, ao conceituar a expansão da riqueza das nações e O crescimento
econômico, o pensamento clássico entendia que uma nação se torna cada vez
mais rica à medida que despende maior parcela de sua renda em bens duráveis e
menos em serviços e bens perecíveis, aumentando em consequência a sua
acumulação de capital. “O economista moderno — afirma KENDRICK — entende
que certos serviços intangíveis também elevam o potencial produtivo de uma
nação. Entretanto, os conceitos de renda e de produção de ADAM SMITH
perpetuaram-se por meio de DAVID RICARDO e STUART MILL, mantendo-se em
posição proeminente durante cerca de um século, no tronco do pensamento
econômico.
Já no domínio das inter-relações e da identidade dos circuitos da produção, da
renda e do dispêndio, as contribuições da economia clássica podem ser
consideradas ligeiramente mais expressivas. Essas contribuições encontram-se,
sobretudo no Traité d'É conomie Politique, de 1803, de JEAN BAPTISTE SAY, um
dos mais destacados continuadores da tradição clássica na França. SAY viu
claramente a interdependência, a simultaneidade e a identidade existentes entre a
produção, a renda e o dispêndio. Mostrou que a magnitude monetária da produção
nacional deveria ser necessariamente igual à da renda nacional, uma vez que a
geração da renda se realiza à medida que a produção se desenvolve. Evidenciou
ainda a continuidade do circuito econômico, ao mostrar que o montante global das
rendas geradas por meio do processo de produção se convertia em dispêndio,
assegurando-se assim a manutenção dos níveis globais de atividade econômica
alcançados pelas nações.
Essas revisões conceituais, entretanto, não deram origem, pelo menos durante
todo o século XIX, a tentativas de quantificação dos fluxos da produção, da renda
e do dispêndio nacionais. Os raros levantamentos censitários então realizados não
as reconheceram nem as adotaram como bases de trabalho. Elas se constituíram
mais propriamente em construções teóricas destinadas à compreensão dos
mecanismos sustentadores da atividade econômica das nações.
1.3.3 A REVISÃO DOS CONCEITOS CLÁSSICOS
As contribuições da economia clássica foram alvo de significativas revisões e de
consequentes refinamentos teóricos. As oposições formais ao pensamento
clássico procuraram rever os conceitos agregados de renda e de produção. No
Entwicklung der Gesetze der Menschlichen, de 1854, e no Das Kapital, de 1867,
de KARL MARX, e no Elements d'Économie Politique Pure, de 1903, de LÉON
WALRAS encontram-se contundentes críticas à interpretação clássica dos
componentes da renda nacional e dos elementos que deveriam ser considerados
para cálculo da produção global. Mas somente com os trabalhos de ALFRED
MARSHALL é que seriam definitivamente restabelecidos e elucidados, no
pensamento econômico ocidental, os principais conceitos de interesse para a
subsequente sistematização da Contabilidade Social.
Das críticas então formuladas, a de MARX talvez tenha sido a que mais
significativamente contribuiu para o enfraquecimento do conceito agregativo de
renda e de produção formulado pelos economistas clássicos. Como SAY, MARX
reconheceu a interdependência, a simultaneidade e a identidade dos valores
agregados da produção, da renda e do dispêndio. Mas esclareceu com mais
segurança os componentes da produção, compreendidos pelos bens de consumo
e pelo investimento líquido. Quanto à renda nacional, entendeu que deveria ser
constituída pelo total das remunerações pagas a todos os agentes envolvidos nas
atividades sociais de produção. Os salários e outras remunerações pagas à força
de trabalho compreendiam a base de seu conceito agregativo de renda;
adicionalmente, visualizou a mais valia, identificada como sendo “um valor gerado
pela força de trabalho, mas apropriado pelos proprietários do fator capital”. Assim,
embora MARX as tenha traçado um perfil completo dos componentes da renda
nacional, ainda incidiu no engano dg não reconhecer como socialmente produtivas
as funções desempenhadas pelos empresários e pelos proprietários do fator
capital. Esse entendi mento orientaria os posteriores Sistemas de Contabilidade
Social implementados pela URSS e por outros países de influência soviética.
No pensamento ocidental, todavia, como assinala STUDENSKI,“o golpe
misericordioso no conceito de produção e de renda dos economistas clássicos foi
dado por ALFRED MARSHALL, em Economic of Industry, de 1879, e
posteriormente em Principles of Economics, de 1890. Identificando a produção
com a criação de utilidades necessárias à satisfação de necessidades sociais,
MARSHALL abrangeu de forma bastante clara todos os bens e serviços finais
como componentes da produção nacional, decorrendo daí que todas as rendas
geradas durante o seu processamento deveriam integrar o conceito de renda
nacional.
“A mão-de-obra e o capital do pais — escreveu MARSHALL em seu Principles —,
atuando sobre os seus recursos naturais, produzem anualmente um certo
agregado líquido de utilidades, materiais e imateriais, incluindo bens e serviços de
todos os tipos. O adjetivo limitativo líquido é necessário para alertar sobre a
utilização de matérias-primas e bens semiacabados, bem como sobre o desgaste
e a depreciação dos bens de capital envolvidos na produção: naturalmente todos
os dispêndios com estes itens devem ser deduzidos do valor bruto da produção,
antes que a renda líquida seja definida, Os valores líquidos produzidos por
investimentos estrangeiros devem ser adicionados. Teremos, então, a renda e a
produção Iíquidas da nação, que podem ser estimadas anualmente ou com base
em qualquer outro período,”
Alguns anos após a publicação dos Principles de Marshall, IRVING FISHER, em
1906, com The Nature of Capital and income, estabeleceu um conjunto mais
articulado de definições, que posteriormente serviu de base para a formulação dos
primeiros Sistemas de Contabilidade Social.
Uma das mais importantes contribuições de FISHER foi a exata distinção dos
conceitos de capital e de renda. Além de diferenciar os vários tipos possíveis de
capital, mostrou que todos, quando contabilizados, deveriam ser considerados
como disponibilidade efetiva ou riqueza acumulada — numa única palavra,
estoque. Já o conceito de renda ligava-se à caracterização de valores gerados por
meio das atividades e transações econômicas, devendo assim os vários
componentes da renda agregada ser considerados como derivados da
mobilização dos recursos acumulados e do consequente fluxo de pagamentos.
FISHER acrescentou, assim, aos desenvolvimentos teóricos até então disponíveis
a importante distinção entre os conceitos de estoque e de fluxo. Além desta
contribuição que, como veremos mais tarde, desempenhou um papel vital na
construção dos Sistemas de Contabilidade Social, FISHER procurou ainda
distinguir os conceitos de fluxos reais e monetários, também de grande
importância para a concepção teórica das naturezas diferentes dos circuitos da
produção e da renda nacionais.

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  • 1. AS PRIMEIRAS TENTATIVAS DE CALCULO AGREGATIVO OS TRABALHOS PIONEIROS As primeiras tentativas de cálculo econômico agregativo, a nível daquilo que mais tarde se convencionaria denominar Contabilidade Social, foram empreendidas na Inglaterra, por WILLIAM PETTY e GREGORY KING, e, na França, por PIERRE BOISGUILBERT, ainda durante o século XVII; Os estudos de PETTY datam de 1665; estão reunidos em Anual income and Expense of the Peopte. Os de KING datam de 1696; estão reunidos em Natural and Political Observations and Conclusions upon the State and Condition of England. Osde BOISGUILBERT datam de 1697, estão reunidos em Détail de la France. Esses trabalhos pioneiros limitaram-se a tentativas de definição e de cálculo dos conceitos de renda nacional e de fortuna nacional. Como observa STUDENSKI, “esses primeiros pesquisadores já demostravam entender os conceitos de renda e de fortuna a partir de enfoques globais, abrangentes e agregativos”. Procurando conceber e quantificar a atividade nacional em seu todo, eles procuraram definir a renda nacional como o valor anual dos pagamentos à mão-de-obra, incluindo ainda valores globais de outras transações, como arrendamentos, juros e lucros. Trataram ainda de definir as bases de um sistema contábil de dupla entrada, caracterizando as despesas anuais da população, privadas e coletivas, como um fluxo de dispêndio. Os valores remanescentes das estimativas da renda, em comparação com os dispêndios, eram caracterizados como acréscimo anual à fortuna nacional. Este último conceito aparece bem nitidamente nas contribuições de GREGORY KING. Todos esses conceitos, bem como a caracterização do inter-relacionamento entre à produção, a renda e o dispêndio nacionais, seriam objeto, já a partir das contribuições da economia clássica nos séculos XVlll e XIX, de novos refinamen- tos teóricos, que gradativamente conduziriam à futura esquematização dos Siste- mas de Contabilidade Social. Entretanto, há autores que reconhecem nos tra- balhos de PETTY e KING algo mais do que simples primeiras tentativas. KEN- DRICK, por exemplo, chega a afirmar que “os enfoques das estimativas pioneiras são quase similares aos conceitos atuais de renda nacional e de produto nacio- nal ao custo dos fatores”, Aos trabalhos pioneiros de PETTY e KING seguiram-se as contribuições dos fisiocratas franceses, liderados por FRANÇOIS QUESNAY. O Tableau Économi- gue de QUESNAY, de 1758, embora tenha conceituado a renda nacional de for- ma mais restrita, iria constituir-se em uma das mais significativas contribuições do século XVIII à compreensão dos fluxos em que se fundamentam as atividades econômicas das nações. Os fisiocratas identificavam a renda nacional como a renda originária das atividades agrícolas. Entendiam que somente a agricultura gerava renda e produto, argumentando que as demais atividades econômicas eram estéreis. Na tentativa de demonstrar a validade desse entendimento, QUESNAY analisou as
  • 2. inter-relações entre a agricultura e os demais setores da economia, procurando demonstrar como se processavam as transferências de produção e de renda daquele primeiro setor para os demais. A análise de QUESNAY, desenvolvida com o apoio de admirável suporte quantitativo, seria assim a precursora dos atuais modelos de inter-relações setoriais. Além dessas notáveis contribuições, QUESNAY procurou evidenciar em seu Tableau Économique a importância dos investimentos para aumento da produtividade. Além disso, cuidou ainda de caracterizar o fenômeno da depreciação dos bens de capital, fundamental para a diferenciação dos conceitos de investimento bruto e líguido. 1.3.2 AS CONTRIBUIÇÕES DOS CLÁSSICOS As contribuições da economia clássica no campo específico da Contabilida- de Social foram menos significativas do que em outros campos do conhecimento econômico. Houve ligeiros avanços em relação às proposições dos fisiocratas, mas não se registraram tentativas de cálculo econômico agregativo por nenhum dos principais teóricos liberais do longo período compreendido entre a publicação de Wealth of Nations, em 1776, de ADAM SMITH, até a revisão neoclássica empreendida por ALFRED MARSHALL, no final do século XIX. As raras estimativas realizadas no período clássico envolveram o discutível conceito de fortuna nacional, muito mais em nível de recenseamento dos recursos territoriais e de capital ocorrentes dentro do país, do que propriamente de quantificação dos fluxos globais de produção e de renda, Entre essas raras tentativas de levantamento censitário da fortuna nacional então empreendidas, destacaram-se as de A. N. RADISHCHEV, na Rússia, em 1811, de GEORGE TUCKER, nos Estados Unidos, em 1843, de BAXTER e GIFFEN, na Inglaterra, respectivamente em 1867 e 1883, de LAVOISIER e LEVASSEUR, na França, respectivamente em 1791 e 1877, de A. WAGENFUHR, G. RÚMELIN, A. SOE- TBEER e R. E. MAY, na Alemanha, entre 1863 e 1899, e de T. COUGHLAN, na Austrália, em 1886. Quanto ao ponto de vista conceitual, as contribuições do pensamento econômico clássico limitaram-se a dois aspectos. O primeiro refere-se à revisão e à crítica do conceito fisiocrata sobre as atividades consideradas economicamente estéreis. O segundo refere-se à mais clara compreensão das inter-relações e da identidade dos circuitos da produção, da renda e do dispêndio nacionais. A revisão do conceito fisiocrata de atividades estéreis foi inicialmente desenvolvida por ADAM SMITH. Este entendeu que não apenas as atividades agrícolas deveriam ser consideradas como produtivas. Exercendo ampla influência nas posições conceituais de seus seguidores, SMITH argumentou que as indústrias de transformação adicionavam valor aos bens originários das atividades primárias. Mais ainda: o fundador do pensamento econômico clássico argumentou que o comércio também deveria ser entendido como produtivo, não só em decorrência de sua indispensabilidade, como também pela sua integração na economia de
  • 3. trocas e de divisão do trabalho que a Revolução Industrial vinha promovendo. Todavia, apesar desses seus reparos aos conceitos fisiocratas, SMITH não se libertou por completo dos influentes pontos de vista expostos no Tableau Economique de QUESNAY. Isto porque, com exclusão do comércio, ele insistiu na idéia de que todos os demais tipos de serviços não deveriam ser considerados como produtivos. Sobre este aspecto, é bastante clara em Wealth of Nations a idéia de que os dispêndios em serviços nada mais são do que uma espécie de redistribuição de renda, uma transferência de rendimento líquido de classes produtivas para classes improdutivas. Neste sentido, ao conceituar a expansão da riqueza das nações e O crescimento econômico, o pensamento clássico entendia que uma nação se torna cada vez mais rica à medida que despende maior parcela de sua renda em bens duráveis e menos em serviços e bens perecíveis, aumentando em consequência a sua acumulação de capital. “O economista moderno — afirma KENDRICK — entende que certos serviços intangíveis também elevam o potencial produtivo de uma nação. Entretanto, os conceitos de renda e de produção de ADAM SMITH perpetuaram-se por meio de DAVID RICARDO e STUART MILL, mantendo-se em posição proeminente durante cerca de um século, no tronco do pensamento econômico. Já no domínio das inter-relações e da identidade dos circuitos da produção, da renda e do dispêndio, as contribuições da economia clássica podem ser consideradas ligeiramente mais expressivas. Essas contribuições encontram-se, sobretudo no Traité d'É conomie Politique, de 1803, de JEAN BAPTISTE SAY, um dos mais destacados continuadores da tradição clássica na França. SAY viu claramente a interdependência, a simultaneidade e a identidade existentes entre a produção, a renda e o dispêndio. Mostrou que a magnitude monetária da produção nacional deveria ser necessariamente igual à da renda nacional, uma vez que a geração da renda se realiza à medida que a produção se desenvolve. Evidenciou ainda a continuidade do circuito econômico, ao mostrar que o montante global das rendas geradas por meio do processo de produção se convertia em dispêndio, assegurando-se assim a manutenção dos níveis globais de atividade econômica alcançados pelas nações. Essas revisões conceituais, entretanto, não deram origem, pelo menos durante todo o século XIX, a tentativas de quantificação dos fluxos da produção, da renda e do dispêndio nacionais. Os raros levantamentos censitários então realizados não as reconheceram nem as adotaram como bases de trabalho. Elas se constituíram mais propriamente em construções teóricas destinadas à compreensão dos mecanismos sustentadores da atividade econômica das nações. 1.3.3 A REVISÃO DOS CONCEITOS CLÁSSICOS As contribuições da economia clássica foram alvo de significativas revisões e de consequentes refinamentos teóricos. As oposições formais ao pensamento clássico procuraram rever os conceitos agregados de renda e de produção. No Entwicklung der Gesetze der Menschlichen, de 1854, e no Das Kapital, de 1867,
  • 4. de KARL MARX, e no Elements d'Économie Politique Pure, de 1903, de LÉON WALRAS encontram-se contundentes críticas à interpretação clássica dos componentes da renda nacional e dos elementos que deveriam ser considerados para cálculo da produção global. Mas somente com os trabalhos de ALFRED MARSHALL é que seriam definitivamente restabelecidos e elucidados, no pensamento econômico ocidental, os principais conceitos de interesse para a subsequente sistematização da Contabilidade Social. Das críticas então formuladas, a de MARX talvez tenha sido a que mais significativamente contribuiu para o enfraquecimento do conceito agregativo de renda e de produção formulado pelos economistas clássicos. Como SAY, MARX reconheceu a interdependência, a simultaneidade e a identidade dos valores agregados da produção, da renda e do dispêndio. Mas esclareceu com mais segurança os componentes da produção, compreendidos pelos bens de consumo e pelo investimento líquido. Quanto à renda nacional, entendeu que deveria ser constituída pelo total das remunerações pagas a todos os agentes envolvidos nas atividades sociais de produção. Os salários e outras remunerações pagas à força de trabalho compreendiam a base de seu conceito agregativo de renda; adicionalmente, visualizou a mais valia, identificada como sendo “um valor gerado pela força de trabalho, mas apropriado pelos proprietários do fator capital”. Assim, embora MARX as tenha traçado um perfil completo dos componentes da renda nacional, ainda incidiu no engano dg não reconhecer como socialmente produtivas as funções desempenhadas pelos empresários e pelos proprietários do fator capital. Esse entendi mento orientaria os posteriores Sistemas de Contabilidade Social implementados pela URSS e por outros países de influência soviética. No pensamento ocidental, todavia, como assinala STUDENSKI,“o golpe misericordioso no conceito de produção e de renda dos economistas clássicos foi dado por ALFRED MARSHALL, em Economic of Industry, de 1879, e posteriormente em Principles of Economics, de 1890. Identificando a produção com a criação de utilidades necessárias à satisfação de necessidades sociais, MARSHALL abrangeu de forma bastante clara todos os bens e serviços finais como componentes da produção nacional, decorrendo daí que todas as rendas geradas durante o seu processamento deveriam integrar o conceito de renda nacional. “A mão-de-obra e o capital do pais — escreveu MARSHALL em seu Principles —, atuando sobre os seus recursos naturais, produzem anualmente um certo agregado líquido de utilidades, materiais e imateriais, incluindo bens e serviços de todos os tipos. O adjetivo limitativo líquido é necessário para alertar sobre a utilização de matérias-primas e bens semiacabados, bem como sobre o desgaste e a depreciação dos bens de capital envolvidos na produção: naturalmente todos os dispêndios com estes itens devem ser deduzidos do valor bruto da produção, antes que a renda líquida seja definida, Os valores líquidos produzidos por investimentos estrangeiros devem ser adicionados. Teremos, então, a renda e a produção Iíquidas da nação, que podem ser estimadas anualmente ou com base em qualquer outro período,”
  • 5. Alguns anos após a publicação dos Principles de Marshall, IRVING FISHER, em 1906, com The Nature of Capital and income, estabeleceu um conjunto mais articulado de definições, que posteriormente serviu de base para a formulação dos primeiros Sistemas de Contabilidade Social. Uma das mais importantes contribuições de FISHER foi a exata distinção dos conceitos de capital e de renda. Além de diferenciar os vários tipos possíveis de capital, mostrou que todos, quando contabilizados, deveriam ser considerados como disponibilidade efetiva ou riqueza acumulada — numa única palavra, estoque. Já o conceito de renda ligava-se à caracterização de valores gerados por meio das atividades e transações econômicas, devendo assim os vários componentes da renda agregada ser considerados como derivados da mobilização dos recursos acumulados e do consequente fluxo de pagamentos. FISHER acrescentou, assim, aos desenvolvimentos teóricos até então disponíveis a importante distinção entre os conceitos de estoque e de fluxo. Além desta contribuição que, como veremos mais tarde, desempenhou um papel vital na construção dos Sistemas de Contabilidade Social, FISHER procurou ainda distinguir os conceitos de fluxos reais e monetários, também de grande importância para a concepção teórica das naturezas diferentes dos circuitos da produção e da renda nacionais.