É nas cidades que as dimensões sociais, econômicas e ambientais do desenvolvimento sustentável convergem mais intensamente, fazendo com que se torne necessário que sejam pensadas, gerenciadas e planejadas de acordo com o modelo de desenvolvimento sustentável que tem por objetivo atender as necessidades atuais da população da Terra sem comprometer seus recursos naturais, legando-os às gerações futuras
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
Como tornar as cidades sustentáveis
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COMO TORNAR AS CIDADES SUSTENTÁVEIS
Fernando Alcoforado *
A cidade tornou-se o principal habitat da humanidade. Pela primeira vez na história
humana, mais da metade da população vive nas cidades. Este número, 3,3 bilhões de
pessoas, deverá ultrapassar a marca de 5 bilhões até 2030. No início do século XX, a
população urbana não excedeu 220 milhões de pessoas. O acesso a empregos, serviços,
instalações públicas e maior bem-estar econômico e social é o seu maior atrativo para
todos os que para ela se dirigem. Grande parte dos problemas ambientais globais tem
origem nas cidades o que faz com que dificilmente se possa atingir a sustentabilidade ao
nível global sem torná-las sustentáveis (BEAUJEU-GARNIER, J. Geografia Urbana.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980).
O processo de urbanização ocorreu de forma significativa primeiramente nos países do
continente europeu, com o surgimento e desenvolvimento das indústrias durante o
século XVIII. A partir de 1950, esse processo tomou grandes proporções em escala
global. O processo de industrialização se expandiu por vários países, atraindo cada vez
mais pessoas para as cidades. Porém, a urbanização sem um devido planejamento tem
como consequência vários problemas de ordem ambiental e social. O inchaço das
cidades, provocado pelo acúmulo de pessoas, e a falta de uma infraestrutura adequada
gera transtornos para a população urbana. A maioria das cidades ao redor do mundo
cresce de forma desordenada e caótica.
O crescimento descontrolado das cidades ao redor do mundo muitas vezes ressalta a
falta de planejamento urbano, gerando impactos irreversíveis nesses territórios,
refletidos em sua qualidade ambiental. Impactos significativos no meio ambiente
ocorrem devido aos modos de produção e consumo nos espaços urbanizados. Poluições,
engarrafamentos, violência, desemprego, etc., são comuns nas cidades. A poluição da
água é causada principalmente pela liberação de efluentes industriais e domésticos não
tratados. A poluição do ar é um grande problema detectado nas cidades que resulta da
liberação de gases tóxicos para a atmosfera. O fluxo intenso de carros e indústrias é o
principal responsável por esse tipo de poluição.
Outros problemas ambientais resultantes da urbanização são: impermeabilização do
solo, poluição visual, poluição sonora, mudança climática, chuva ácida, ausência de
saneamento ambiental, falta de adequada destinação e tratamento de resíduos sólidos,
efeito estufa, entre outros. A falta de planejamento urbano eficaz compromete a
qualidade de vida da população urbana. O crescimento desordenado das cidades gera a
ocupação de lugares impróprios para habitação de populações de baixa renda, como de
elevada declividade, fundos do vale, entre outras.
A acelerada urbanização e crescimento das cidades, especialmente a partir de meados
do século XX, promoveu mudanças fisionômicas no planeta, mais do que qualquer
outra atividade humana. A população do Brasil, por exemplo, apresenta a mesma
tendência global da ocupação ambiental, ou seja, opta pelo ecossistema urbano como
lar. A transformação do Brasil de rural para urbano ocorreu na década de 1960,
seguindo um processo predatório em essência, com marcada exclusão social de classes
menos privilegiadas que, por não terem condições de adquirir terrenos em áreas urbanas
estruturadas, ocupam principalmente terrenos que deveriam ser protegidos para a
preservação das águas, encostas, fundos de vale, entre outros.
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No Brasil, os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE, 2004) indicam que mais de 80% das pessoas são moradores urbanos e devem
atingir 85% nos próximos vinte anos. Este crescimento dos centros urbanos levou a uma
queda acentuada na qualidade de vida e ao crescimento de problemas sociais e
desequilíbrios ambientais, agravados pelas recentes mudanças estruturais na dinâmica
capitalista. Este fato torna obrigatório trabalhar com os princípios da sustentabilidade
incorporados à gestão urbana, com foco em questões como a redução dos níveis de
pobreza; criação de empregos; implementação de sistemas de saneamento, educação e
saúde; adequação do uso do solo urbano; controle de poluição; recuperação ambiental;
uso de fontes de energia limpa; combate à violência urbana; proteção do patrimônio
histórico e ambiental, entre outros.
É nas cidades que as dimensões sociais, econômicas e ambientais do desenvolvimento
sustentável convergem mais intensamente, fazendo com que se torne necessário que
sejam pensadas, gerenciadas e planejadas de acordo com o modelo de desenvolvimento
sustentável que tem por objetivo atender as necessidades atuais da população da Terra
sem comprometer seus recursos naturais, legando-os às gerações futuras. Significa dizer
que o modelo de desenvolvimento sustentável nas cidades deve ser adotado objetivando
a compatibilização dos fatores econômico e social com o meio ambiente. O que
caracteriza uma cidade sustentável? É o direito da população à terra urbana, à moradia,
ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos,
ao trabalho e ao lazer, para a atual e futuras gerações.
As cidades sustentáveis são cidades que têm uma política de desenvolvimento
econômico e social compatível com o ambiente natural e construído. As cidades
sustentáveis têm como orientação o planejamento e o controle do uso da terra, a fim de
evitar a degradação dos recursos naturais. Uma cidade sustentável deve ter políticas
claras e abrangentes para saneamento, coleta e tratamento de lixo; gestão da água, com
coleta, tratamento, economia e reuso; sistemas de transporte que privilegiem o transporte
de massas com qualidade e segurança; ações que preservem e ampliem áreas verdes e
uso de energias limpas e renováveis; e, sobretudo, administração pública transparente e
compartilhada com a sociedade civil organizada.
Na era contemporânea, quando os problemas do aquecimento global podem levar à
mudança climática catastrófica em escala planetária, cada cidade precisa ter um plano
de adaptação às mudanças climáticas, especialmente aquelas sujeitas a eventos
extremos. As cidades costeiras, por exemplo, devem ter planejamento contra o aumento
previsível do nível dos oceanos e se preocupar com deslizamentos de terra nas encostas,
inundações, etc., resultantes de chuvas inclementes. Em suma, elas devem ter
flexibilidade e adaptabilidade aos novos requisitos climáticos. É necessário redesenhar o
crescimento urbano das cidades para integrá-lo ao ambiente natural, para recuperar suas
praias e seus rios agora comprometidos com o lançamento de esgotos, para que as
cidades não recebam uma resposta hostil do meio ambiente natural.
A Arcadis, empresa holandesa de consultoria, engenharia e gerenciamento que surgiu
em Amsterdã em 1868, lançou o Índice de Cidades Sustentáveis 2015, que classifica as
50 cidades mais sustentáveis do mundo. O índice foi calculado pelo Centro de
Economia e Pesquisa Empresarial considerando os fatores sociais (people), ambientais
(planet) e econômicos (profit) que fazem uma cidade sustentável. Nas principais
posições do ranking estão as cidades européias bem desenvolvidas, como Frankfurt,
seguido por Londres, Copenhague, Amsterdã e Roterdã. As cidades de Seul, Hong
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Kong e Cingapura também aparecem de forma proeminente, fechando o Top 10 com
Berlim e Madrid (ARCADIS, As cidades mais sustentáveis do mundo. Disponível no
website <http://www.cidadessustentaveis.org.br/noticias/cidades-mais-sustentaveis-do-
mundo>).
Quanto aos fatores sociais (people), foi realizada uma análise profunda sobre a
qualidade de vida dos cidadãos, cujos indicadores alternam entre a saúde e a expectativa
de vida da população da cidade, bem como o nível de alfabetização das pessoas, o custo
de vida local, a renda média e as taxas de criminalidade e de desigualdade social.
Quanto aos fatores ambientais (planet), foi feita uma análise dos fatores verdes
(consumo de energia elétrica, quantidade e qualidade dos parques públicos, quantidade
de emissão de gases de efeito estufa na atmosfera, produção de energia a partir de fontes
renováveis, como a energia solar, a exposição às catástrofes naturais e qualidade da
água e do ar). Quanto aos fatores econômicos (profit), a análise da saúde econômica de
cada cidade foi realizada, avaliando o PIB de cada uma das cidades, sua taxa de
empregabilidade, infraestrutura geral e cuidados com transporte, turismo e negócios.
Estes são os indicadores com base nos quais se pode avaliar a sustentabilidade social,
ambiental e econômica das cidades.
*Fernando Alcoforado, 77, membro da Academia Baiana de Educação e da Academia Brasileira Rotária
de Letras – Seção da Bahia, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é
autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova
(Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São
Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado.
Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX
e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of
the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável-
Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do
Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social
(Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática
Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas,
Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016) e A Invenção de um novo
Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017).