2. O DESDOBRAMENTO DA REPRESENTAÇÃO NAS ARTES
DA ÁSIA E DA AMÉRICA
Etnólogos diferem sobre alguns conceitos em relação a semelhança da arte
primitiva em certos lugares ao redor do mundo. E, quando encontra-se algo, é
procurado um ponto em comum -ignorando distância geográfica e afastamento
histórico, gerando assim analogias a "qualquer preço".
3.
4. 1. Estilização acentuada
2. Simbolismo (ênfase nos traços característicos)
3. Representação do corpo através da split
representation
4. Remoção dos detalhes isolados quando em
conjunto
5. Indivíduo representado por dois perfis
6. Simetria elaborada, possuindo assimetria nos
detalhes
7. Transformação ilógica de detalhes em novos
elementos. Exemplo: pata vira bico
8.Representação intelectual, esqueleto ou órgãos
internos se sobrepõem ao corpo.
5. • A arte chinesa arcaica e da costa noroeste foram aproximadas (individualmente) da
dos Maori da Nova Zelândia. Além disso -segundo alguns autores- a arte primitiva do
rio Amur apresenta:
"Uma surpreendentemente rica ornamentação curvilínea semelhante à dos Ainu e
Maori, de um lado, e às culturas neolíticas da China (Yangshao) e do Japão
(Jomon), do outro; que consiste particularmente no tipo de faixa decorativa
caracterizada por motivos complexos, tais como serpentinas, espirais e
meandros, que se contrapõem à ornamentação geométrica retangular da cultura
do Baikal." (Field & Prostov 1942: 396).
• Essas artes de regiões e épocas distintas apresentam semelhanças, porém são
incompatíveis em relação à geografia e história.
Estaríamos presos num dilema, que nos condena a negar a história ou a fechar
os olhos para essas semelhanças tantas vezes verificadas?
Difusionistas: determinada inovação foi iniciada em um cultura para que,
posteriormente, seja difundida de diversas maneiras.
Os difusionistas utilizam a história para explicar, mais quando a mesma não traz um
retorno, recorre-se a outras áreas com a psicologia ou a analise estrutural da forma
para achar respostas as semelhanças da arte.
6. “
”
O animal é imaginado cortado da cabeça à cauda [...] há uma
depressão entre os olhos, que se prolonga para baixo pelo nariz.
Isso mostra que a cabeça em si não é vista de frente, mas como
que formada por dois perfis que se tocam na boca e no nariz, e não
entram em contato no mesmo nível com os olhos e a testa [...] ou
o animal ou é representado como cortado ao meio, de modo que os
perfis se juntam no meio, ou uma vista frontal da cabeça é
apresentada com dois perfis do corpo adjacentes
Boas, 1927: 223-4
FRANZ BOAS (1858-1942)
7. "[...] A enorme abertura da boca que se observa é produzida pela junção de dois perfis que formam a
cabeça. O corte da cabeça aparece mais claramente na fig. 20, que também representa o urso. [...] O
animal é fendido ao longo do corpo, de modo que apenas a parte frontal da cabeça combina. As duas
metades da mandíbula inferior não se tocam. O lombo é representado pelas linhas externas pretas, nas
quais o pêlo é indicado por linhas finas. Os Tsimshian chamam esse desenho de 'encontro de ursos' [...]."
8. "Uma das características mais distintivas da arte decorativa shang
é um método peculiar de representar os animais em superfícies
planas ou arredondadas. É como se pegasse o animal e se o
fendesse longitudinalmente, começando pela ponta do rabo e
prosseguindo a operação até quase, mas não completamente, a
ponta do focinho; então, as duas metades são afastadas e o
animal bisseccionado é colocado estendido sobre a superfície,
com as duas metades unidas apenas pela ponta do focinho."
"Estudando os desenhos shang, tenho constantemente
tido a sensação de que essa arte é muito semelhante,
certamente no espírito e possivelmente nos detalhes,
à dos [...] índios da costa noroeste."
- Herlee Glessner Creel (1905-1994), 1935:64.
9. Além de ser encontrada na China arcaica, entre os primitivos da Sibéria e
na Nova Zelândia, essa técnica aparece também entre os índios Kadiwéu.
10. KADIWÉUS
• Pequena tribo do sul do Brasil, um dos últimos vestígios da nação dos Guaicuru.
• Essas pinturas são conhecidas desde o primeiro contato com os Guaicuru (no
século XVII) e não evoluíram desde então.
• As pinturas precisam ser renovadas após alguns dias e são executadas com uma
espátula de madeira mergulhada em caldos de frutas e folhas selvagens.
• As mulheres não trabalham a partir de um modelo, mas improvisam dentro dos
limites de uma temática tradicional complexa.
• Não existem desenhos perfeitamente iguais, as diferenças estão na disposição
variada dos elementos fundamentais (espirais, tracejados, cruzes, ondulações,
etc.)
• É descartada a possibilidade de influência espanhola - dada a antigüidade da
data em que esta arte foi descrita pela primeira vez.
13. COSTA NOROESTE KADIWÉU
• Escultura apresenta caráter realista enquanto o desenho é
simbólico e decorativo.
• A arte masculina é centrada na escultura representativa e a
feminina, na tecelagem e o desenho não representativos.
• O caráter primitivo das pinturas faciais guaicuru é desconhecido,
porém, é possível que seus temas tenham tido um sentido realista
ou pelo menos simbólico.
• Ambas artes praticam a decoração por meio de padrões e estão
fortemente ligadas à organização social: serviam para traduzir e
reafirmar os graus da hierarquia.
14. Fig. 26. Pintura facial Kadiwéu executado por uma mulher indígena numa folha de
papel.
Fig. 27. Mulher Kadiwéu, 1892.
15. KADIWÉU MAORI
• Em nenhum lugar fora essas duas regiões (Guaicuru-Nova Zelândia) a
ornamentação facial e corporal atingiu um desenvolvimento comparado
ou tamanho refinamento.
• Contraste entre a simetria das tatuagens maori, em relação a assimetria
de alguns desenhos kadiwéu.
• As ornamentações de ambas são feitas em uma atmosfera semi-religiosa.
• Além de representarem emblemas, marcas de beleza e hierarquia,
também são mensagem com função espiritual e lições.
• A tatuagem Maori marca na pele as tradições e a filosofia da raça,
espírito.
16. Fig. 28. Desenho de um chefe maori, séc. XIX.
Fig. 29. Modelos indígenas de tatuagem, escultura em madeira, final do século XIX. Em
cima, dois rostos de homem. Em baixo, um rosto de mulher.
18. Em que momento os elementos plásticos e
gráficos se ligam?
• Conectados por uma relação funcional de modo que o modelo de um muda o do
outro e vice-e-versa.
• Comparando a arte maori e guaicuru, temos a resposta. O plástico é o rosto e
corpo e o gráfico a pintura ou tatuagem que se aplica neles.
19. MÁSCARAS
Todas são consideradas culturas de máscaras.
• Guaicuru e maori: tatuagem
• Costa noroeste: a máscara na vida social
• China Arcaica: as máscaras tinham a função de espantar maus espíritos, assim como no Alasca.
• As máscaras estão mais ligadas ao panteão do que a ancestralidade. Nesse caso o ator só faz o
deus de tempos e tempos nas festas e cerimônias.
• Elementos gráficos e plásticos estão ligados entre a ordem social e a ordem sobrenatural, do
mesmo modo que a representação explica a junção do ator a seu papel, status sociais e os mitos e
culto e pedigrees.
20. LINHAGEM
• Mesmo não sabendo nada da China Arcaica, o estudo de sua arte
nos leva a perceber a disputa por autoridade, a concorrência
entre hierarquias e os privilégios econômicos e sociais. Tudo isso a
partir das máscaras e adoração das linhagens.
• Perceval Yetts: “A intenção parece ter sido quase que
invariavelmente a de auto glorificação, mesmo quando o que se
exibe é o consolo dos ancestrais ou o incremento do prestígio da
família”.(1939:75)
• Nas tumbas de Anyang encontraram bronzes que festejavam as
pessoas de uma mesma linhagem.
21. • Creel explica que “(objetos) requintados e toscos eram produzidos
concomitantemente em Anyang, para pessoas de diferentes status
econômicos de prestígio”.
• Nos resta saber ainda se essas sociedades hierarquizadas e
fundadas em prestígios, apareceram de forma independente pelo
mundo ou tiveram uma origem em comum em algum momento.
• Ainda que houvesse esse contato, não poderia ser por detalhes,
dos traços a viajar por conta própria, indo à vontade de uma cultura
para chegar a outra, mas pelas partes orgânicas do estilo, estéticas,
vida social e espiritual estão unidas de forma estrutural.
22. A SERPENTE DO CORPO REPLETO DE PEIXES
• O texto foi publicado originialmente nos Anais do XVIII Congresso
de Americanistas, em 1948.
• Alfred Métraux (1902-1963) coletou um mito esclarecedor sobre
duas ilustrações pré-colombianas: a lenda da serpente Lik.
"Lik é um animal sobrenatural, uma enorme serpente que leva os peixes
dentro de seu rabo. Pessoas especialmente favorecidas pelo destino podem
encontrar Lik encalhado na terra firme [...]. Lik lhes pede que para levá-lo
para uma lagoa cheia de água. Os que não se apavoram [...] geralmente
respondem que ele é pesado demais para ser carregado, porém, graças à
sua magia, Lik sempre se faz de leve. Quando volta a nadar em águas
profundas, promete dar aos que o ajudaram todo o peixe que desejarem,
sempre que pedirem com a condição de jamais revelarem como o peixe foi
obtido."
23.
24. “
”
Às vezes, Lik engole as pessoas. Se elas ainda
tiverem uma faca quando chegarem dentro da
serpente, podem rasgar-lhe o coração e fazer
uma saída; ao mesmo tempo, pegam todos os
peixes que estão em seu rabo.
- Alfred Métraux
• Representa um animal sobrenatural:
corpo humano, cabeça coberta por
tentáculos;
• É possível ver um homem sendo
devorado.
25. “
”
O tio de Kidos'k disse-me que realmente viu Lik
certa vez. Um dia, quando ele estava pescando de
barco, de repente ouviu um grande barulho e
reconheceu que era produzido por Lik.
Imediatamente, ele remou com toda
a força para a margem.
É possível ver a mesma criatura (Lik) sumergida no rio (sugerido pela
faixa decorada com ondas); rio em cuja superfície está um homem
navegando em seu barco.