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147 revista ieb n48 março de 2009
A palavra cantada
Luciana Barongeno1
MATOS, Cláudia Neiva de; TRAVASSOS, Elizabeth e MEDEIROS,
Fernanda Teixeira de (Orgs.). Palavra cantada: ensaios sobre
poesia, música e voz. Rio de Janeiro: 7 letras, 2008. 346p.
O livro Palavra cantada: ensaios sobre poesia, música e voz re-
úne os trabalhos apresentados no II Encontro de Estudos da Palavra
Cantada, realizado em maio de 2006 no Fórum de Ciência e Cultura da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenado por Cláudia Nei-
va de Matos, Elizabeth Travassos e Fernanda Teixeira de Medeiros, o
evento deu seguimento ao I Encontro, conduzido pelas mesmas organi-
zadoras na Universidade Federal Fluminense, em setembro de 2000, e
cujos textos estão publicados no livro Ao encontro da palavra cantada:
poesia, música e voz (Rio de Janeiro: 7 Letras, 2001).
O II Encontro fomentou a integração de especialistas de diver-
sas áreas do conhecimento, provenientes de diferentes instituições
acadêmicas brasileiras e internacionais, na tentativa de refletir sobre
as dimensões verbal, musical e vocal da palavra cantada, considerada
em seus aspectos estéticos, semânticos e histórico-culturais. O livro
apresenta vinte ensaios de pesquisadores das áreas de Musicologia,
Etnomusicologia, Literatura, Lingüística, Semiótica, Antropologia,
História, Filosofia, Comunicação, Teatro e Artes Cênicas e conta com a
contribuição de um especialista em técnica vocal e dois compositores
e intérpretes da música popular.
O “Índice” anuncia a amplitude com que o tema é abordado e,
de algum modo, reflete a dificuldade habitual em se estabelecer limi-
tes precisos de investigação para os objetos abrangidos pela palavra
cantada. Não é raro observamos que, no discurso acadêmico, a canção
pode parecer um fenômeno completamente distinto quando analisada
segundo parâmetros específicos de uma ou outra área do conhecimen-
to. As interfaces entre texto, música e voz podem se localizar em dife-
rentes níveis de análise e variar conforme o objeto, no entanto, essa
1	 Doutoranda do Curso de Pós-Graduação em Musicologia da Escola de Comunica-
ções e Artes da Universidade de São Paulo. São Paulo, Brasil.
E-mail: lubarongeno@terra.com.br
148 revista ieb n48 março de 2009
heterogeneidade, que caracteriza a reflexão sobre a palavra cantada
e possibilita a especialização, pode, paradoxalmente, comprometer a
compreensão integrada do tema, na medida em que disciplinas dife-
rentes, inúmeras vezes, demonstram desacordos recíprocos. Este é um
traço evidente em alguns ensaios do livro.
A distribuição dos capítulos em ordem alfabética parece promo-
ver essa sobreposição de abordagens. Todavia, o texto de abertura de
Ruth Finnegan, que retomarei a seguir, destaca-se por ser ponto de
convergência para os demais ensaios, na medida em que ilumina ca-
minhos para uma compreensão integrada da canção. Na “Introdução”,
as organizadoras apresentam cinco categorias de análise. A primeira
discute aspectos teóricos e metodológicos que podem orientar o estu-
do da canção. Cláudia Neiva de Matos mapeia a história das relações
entre a linguagem poética e a linguagem musical segundo a análise
crítica da modernidade. Tomando como referência estudos literários,
filosóficos e musicais, entre outros, organiza o pensamento em torno
de dois eixos de reflexão: o que premia as analogias intrínsecas entre
música e poesia e o que prevê a interação de texto e música no canto.
Pedro Marques atrela poesia e música a partir da análise comparativa
entre o pensamento estético de Stéphane Mallarmé e o de Mário de
Andrade. Monclar Valverde associa o poder de comunicação da canção
à estrutura narrativa da tonalidade e à origem musical das línguas. Te-
reza Virgínia de Almeida reflete sobre os desafios impostos pela canção
popular como objeto de estudos literários.
A segunda categoria destaca a canção popular mediatizada, tra-
tada do ponto de vista histórico, analítico, composicional e performáti-
co. Heloísa de Araújo Duarte Valente parte do conceito de “movência”,
de Paul Zumthor, para estudar o tango brasileiro. Liv Sovik analisa a
“linha evolutiva” da canção brasileira, resgatando, na figura de Angela
Maria, aspectos da música popular perdidos com o advento da bossa
nova. Luiz Tatit e Ivã Carlos Lopes descrevem de que modo a orga-
nização dos planos da expressão e do conteúdo garantem o resultado
estético homogêneo da canção Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim
e Vinícius de Moraes. Henrique Cazes relata as dificuldades impostas
à colocação de letra no choro, gênero originalmente instrumental. O
depoimento de Adriana Calcanhoto, que nasce das perguntas formula-
das pelas organizadoras e pelo público, aborda questões relacionadas
à composição em parceria, musicalização de textos, técnica vocal e
canto. Felipe Abreu explica as possibilidades de atuação do preparador
vocal nas diferentes fases do processo de gravação de um disco em es-
túdio, na apresentação ao vivo e na interlocução com o artista.
149 revista ieb n48 março de 2009
A canção erudita aparece na análise de dois documentos musi-
cais. Carlos Alberto Figueiredo propõe um roteiro baseado em regras
prosódicas renascentistas para estabelecer o texto musical no Ofício
dos Defuntos a 8 vozes, de José Maurício Nunes Garcia. Gisele Pires de
Oliveira e Lúcia Barrenechea formulam uma abordagem multidiscipli-
nar para a análise de “Cantiga”, canção que abre o ciclo Quatro líricas
(1938) de Francisco Mignone com texto de Manuel Bandeira. Baseada
na relação entre texto e música, nos conceitos de persona e modo de di-
recionamento, a análise fornece ainda subsídios para a interpretação.
As reflexões da quarta categoria pertencem ao domínio da orali-
dade. Carlos Sandroni questiona em que medida os cantos levantados
no xangô do Recife são palavras ou sons vocalizados. Fernando José
Carvalhaes Duarte investiga analogias entre o aboio brasileiro e o jubi-
lus medieval, utilizando a noção de “antropologia do gesto” de Marcel
Jousse. Em jornais e partituras originais, José Geraldo Vinci de Mora-
es identifica peculiaridades das “modinhas paulistas” que revelam as-
pectos do cotidiano e da cultura urbana nas décadas de 20 e 30. Maria
Ignez Cruz Mello estuda os cantos femininos dos índios Wauja no ritual
de iamurikuma. Marcus Vinícius Carvalho Garcia e Elen Döppensch-
mitt comparam a performance do cantor e compositor Adão Xalebara-
dão no documentário Somos todos filhos da terra e no CD Escolástica
e discutem o papel da indústria cultural no registro de tradições orais
populares. Martha Tupinambá de Ulhôa analisa versões gravadas da
modinha Perdão Emília! e discute aspectos da transmissão oral e aural
na canção popular urbana. Paula Cristina Vilas descreve o processo de
criação da cena de abertura de Entrama: a história do beija-flor coroa-
do a partir de sua pesquisa de campo no quilombo de Pombal.
Finalmente, a voz aparece nas reflexões de Silvia Adriana Davi-
ni, que critica a “abordagem instrumental” corrente na formação de
atores, proclamando para a voz a definição de “produção do corpo”.
Tran Quang Hai discorre sobre aspectos que caracterizam a palavra
“falada” e “cantada” na língua vietnamita e Elizabeth Travassos, que
retomarei adiante, discute e elabora uma metodologia para o estudo
da voz.
O fato de os dois únicos artigos sobre a canção erudita versa-
rem sobre teoria e análise musical, em certa medida, flagra o desvio
que a Musicologia sofre a partir do ideal de totalidade que a origina. A
Musikwissenschaft do século XIX significa compreender a música em
todos os seus aspectos2
, como um fenômeno múltiplo, cujas dimensões
2	 KERMAN, Joseph. Contemplating music: challenges to musicology. Cambridge,
Massachusetts: Harvard University Press, 1985. p. 11-12.
150 revista ieb n48 março de 2009
não são alcançadas pela prática e teoria da música ocidental. A noção
de música como obra-de-arte autônoma, historicamente, é recente. Ao
contrário, a origem e desenvolvimento da música se deram através de
“obras abertas”, organizadas em bases biológicas, culturais e sociais3
.
Tomá-la apenas em sua “realidade escrita” (nas palavras de Finnegan)
significa recusá-la como experiência estética e humana.
Justamente os ensaios de Ruth Finnegan – O que vem primeiro:
o texto, a música ou a performance? — e de Elizabeth Travassos — Um
objeto fugidio: voz e “musicologias” — vêm ao encontro dessa ques-
tão na medida em que reclamam a necessidade de uma compreensão
ampla e integrada dos fenômenos envolvidos na canção. O pensamen-
to das antropólogas coincide em três aspectos: 1) assumem a canção
como atividade, 2) questionam as abordagens literárias e musicológi-
cas tradicionais e 3) redimensionam o papel da voz no estudo da pala-
vra cantada.
Para discutir de que modo interagem texto, música e voz, Fin-
negan desvia o foco de análise e interpretação que toma o modelo da
escrita como “realidade” central da canção. Formula sua proposição
sobre a “realidade da performance” apoiada em seus estudos, que de-
monstram que a arte de alguns gêneros verbais não se encontra no
texto, mas nos modos com que a voz o transforma. Desse modo, a an-
tropóloga inglesa redimensiona o papel e o significado do texto, deslo-
cando para a voz performática a função de atualizar os elementos que
constituem a canção. Na mesma direção, Elizabeth Travassos aponta
algumas dificuldades impostas pela própria musicologia ao estudo da
voz e do canto; entre elas, a dicotomia de abordagem que dissocia a
voz humana da voz cantada. Propõe, então, uma aproximação entre
a “cantométrica” de Alan Lomax e as etnografias da fala e da música
como instrumentos para compreender e analisar a voz como fenômeno
biopsicossocial.
No Brasil, o ideal de totalidade que originalmente conduz a Mu-
sicologia é retomado por Mário de Andrade, musicólogo e poeta que
deseja compreender o canto e a voz em todas as dimensões. O Primei-
ro Congresso da Língua Nacional Cantada, realizado em 1937 sob sua
tutela, tem, como proposta central, a organização da língua e da lin-
guagem artística dentro de um critério culto, nacional e estético4
. No
3	 CROSS, Ian. Music as biocultural phenomenon. In: AVANZINI, G. et alli (Eds.). The
neurosciences and music. Annals of the New York Academy of Sciences, v. 999, p. 109-
111, 2003. Disponível em: www.mus.cam.ac.uk/~ic108/PDF/IRMCNYAS2003.PDF.
4	 ANDRADE, Mário de. A língua padrão. Anais do Primeiro Congresso da Língua
Nacional Cantada, p. 9. “Estado de S. Paulo”, 1-6-1937. Revista do Arquivo Munici-
pal. Departamento de Cultura. São Paulo, v. XXXVI, p. 342, 1937.
151 revista ieb n48 março de 2009
entanto, um olhar cuidadoso sobre os textos do autor mostra que sua
preocupação com o canto e com a voz não se limita ao problema da
nacionalização da canção erudita, mas é precedida pelo desejo de com-
preender os mecanismos envolvidos em sua gênese.
Para organizar o pensamento e criar teorias próprias, Mário de
Andrade abre-se para a interdisciplinaridade, esboçada, precocemen-
te, nos artigos que compõem a série Mestres do passado5
, publicados no
“Jornal do Comércio” de São Paulo em 1921. Reportando-se às teorias
de Spencer, Darwin, Riemann, Ingenieros, Combarieu e Tolstoi, fun-
damenta o conceito que norteará os estudos sobre a canção até o ano
de sua morte: a palavra cantada e a palavra falada têm origem comum
no grito primitivo. Com raízes guardadas na leitura de Herbert Spen-
cer, este conceito servirá de mote para escrever Os compositores e a
língua nacional (1937)6
e Vida do cantador (1944)7
. Ao tomar o aboio
de Chico Antônio como o início de todos os cantos8
e como a manifes-
tação primitiva da canção erudita, Mário de Andrade apresenta um
aspecto que fundamenta o seu pensamento sobre a gênese da canção:
a organização estética é resultado do equilíbrio entre a realidade do
elemento sonoro e a realidade do elemento humano9
, organizadas em
bases biológicas, culturais e sociais.
Musicólogos como A. L. Lloyd, James Porter, R. Katsarova, Ian
Cross e Mário de Andrade, entre outros, chamam a atenção para a
importância da performance no estudo da canção. Concebidos em
condições que agregam som e movimento, interação social, contexto
cultural e modulação de estados afetivos, os acalantos, os aboios, os
lamentos, as baladas e as músicas de feitiçaria são formas de expres-
são que podem ajudar a desvendar muitos aspectos da natureza e do
propósito da arte.
5	 Idem. Mestres do passado. In: BRITO, Mário da Silva. História do modernismo:
antecedentes da Semana de Arte moderna. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1964, p. 252-309.
6	 Idem. Os compositores e a língua nacional, 1937. In: ______ Aspectos da música
brasileira. Belo Horizonte e Rio de Janeiro: Villa Rica, 1991, p. 32-94.
7	 Idem. Vida do cantador. Edição crítica de Raimunda de Brito Batista. Belo Hori-
zonte e Rio de Janeiro: Villa Rica, 1993.
8	 ALMEIDA, Renato. História da Música Brasileira. 2. ed. corr. e aum,. Rio de Janei-
ro: F. Briguiet, 1942. p. 55 apud ANDRADE, Mário de. Cantos de trabalho. In: TONI,
Flávia Camargo e ALVARENGA, Oneyda (Coord.) Dicionário musical brasileiro.
Belo Horizonte: Itatiaia; Brasília: Ministério da Cultura; São Paulo: Instituto de
Estudos Brasileiros, 1989. p. 108-109. “Chamar o gado, apregoar, bradar no campo,
eis provavelmente o início de todos os cantares – afirma A. Graves. As canções de
trabalho são, já, talvez, extensões dessas melodias primárias.”
9	 ANDRADE, Mário de. Pequena história da música. 6. ed. Belo Horizonte: Itatiaia,
p. 113-114.
152 revista ieb n48 março de 2009
Palavra cantada: ensaios sobre poesia, música e voz fornece um
panorama dos caminhos a serem trilhados para uma compreensão in-
tegrada da canção. Originalmente dirigidos à comunidade acadêmica,
os artigos equilibram erudição e rigor de escrita, adquirindo um cará-
ter didático para o aluno de graduação e pós-graduação. A publicação
do livro democratiza o conhecimento e convida a pensar sobre a mais
humana das expressões.
Recebido em 13 de fevereiro de 2009
Aprovado em 18 de fevereiro de 2009

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A palavra cantada em resumo

  • 1. 147 revista ieb n48 março de 2009 A palavra cantada Luciana Barongeno1 MATOS, Cláudia Neiva de; TRAVASSOS, Elizabeth e MEDEIROS, Fernanda Teixeira de (Orgs.). Palavra cantada: ensaios sobre poesia, música e voz. Rio de Janeiro: 7 letras, 2008. 346p. O livro Palavra cantada: ensaios sobre poesia, música e voz re- úne os trabalhos apresentados no II Encontro de Estudos da Palavra Cantada, realizado em maio de 2006 no Fórum de Ciência e Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenado por Cláudia Nei- va de Matos, Elizabeth Travassos e Fernanda Teixeira de Medeiros, o evento deu seguimento ao I Encontro, conduzido pelas mesmas organi- zadoras na Universidade Federal Fluminense, em setembro de 2000, e cujos textos estão publicados no livro Ao encontro da palavra cantada: poesia, música e voz (Rio de Janeiro: 7 Letras, 2001). O II Encontro fomentou a integração de especialistas de diver- sas áreas do conhecimento, provenientes de diferentes instituições acadêmicas brasileiras e internacionais, na tentativa de refletir sobre as dimensões verbal, musical e vocal da palavra cantada, considerada em seus aspectos estéticos, semânticos e histórico-culturais. O livro apresenta vinte ensaios de pesquisadores das áreas de Musicologia, Etnomusicologia, Literatura, Lingüística, Semiótica, Antropologia, História, Filosofia, Comunicação, Teatro e Artes Cênicas e conta com a contribuição de um especialista em técnica vocal e dois compositores e intérpretes da música popular. O “Índice” anuncia a amplitude com que o tema é abordado e, de algum modo, reflete a dificuldade habitual em se estabelecer limi- tes precisos de investigação para os objetos abrangidos pela palavra cantada. Não é raro observamos que, no discurso acadêmico, a canção pode parecer um fenômeno completamente distinto quando analisada segundo parâmetros específicos de uma ou outra área do conhecimen- to. As interfaces entre texto, música e voz podem se localizar em dife- rentes níveis de análise e variar conforme o objeto, no entanto, essa 1 Doutoranda do Curso de Pós-Graduação em Musicologia da Escola de Comunica- ções e Artes da Universidade de São Paulo. São Paulo, Brasil. E-mail: lubarongeno@terra.com.br
  • 2. 148 revista ieb n48 março de 2009 heterogeneidade, que caracteriza a reflexão sobre a palavra cantada e possibilita a especialização, pode, paradoxalmente, comprometer a compreensão integrada do tema, na medida em que disciplinas dife- rentes, inúmeras vezes, demonstram desacordos recíprocos. Este é um traço evidente em alguns ensaios do livro. A distribuição dos capítulos em ordem alfabética parece promo- ver essa sobreposição de abordagens. Todavia, o texto de abertura de Ruth Finnegan, que retomarei a seguir, destaca-se por ser ponto de convergência para os demais ensaios, na medida em que ilumina ca- minhos para uma compreensão integrada da canção. Na “Introdução”, as organizadoras apresentam cinco categorias de análise. A primeira discute aspectos teóricos e metodológicos que podem orientar o estu- do da canção. Cláudia Neiva de Matos mapeia a história das relações entre a linguagem poética e a linguagem musical segundo a análise crítica da modernidade. Tomando como referência estudos literários, filosóficos e musicais, entre outros, organiza o pensamento em torno de dois eixos de reflexão: o que premia as analogias intrínsecas entre música e poesia e o que prevê a interação de texto e música no canto. Pedro Marques atrela poesia e música a partir da análise comparativa entre o pensamento estético de Stéphane Mallarmé e o de Mário de Andrade. Monclar Valverde associa o poder de comunicação da canção à estrutura narrativa da tonalidade e à origem musical das línguas. Te- reza Virgínia de Almeida reflete sobre os desafios impostos pela canção popular como objeto de estudos literários. A segunda categoria destaca a canção popular mediatizada, tra- tada do ponto de vista histórico, analítico, composicional e performáti- co. Heloísa de Araújo Duarte Valente parte do conceito de “movência”, de Paul Zumthor, para estudar o tango brasileiro. Liv Sovik analisa a “linha evolutiva” da canção brasileira, resgatando, na figura de Angela Maria, aspectos da música popular perdidos com o advento da bossa nova. Luiz Tatit e Ivã Carlos Lopes descrevem de que modo a orga- nização dos planos da expressão e do conteúdo garantem o resultado estético homogêneo da canção Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes. Henrique Cazes relata as dificuldades impostas à colocação de letra no choro, gênero originalmente instrumental. O depoimento de Adriana Calcanhoto, que nasce das perguntas formula- das pelas organizadoras e pelo público, aborda questões relacionadas à composição em parceria, musicalização de textos, técnica vocal e canto. Felipe Abreu explica as possibilidades de atuação do preparador vocal nas diferentes fases do processo de gravação de um disco em es- túdio, na apresentação ao vivo e na interlocução com o artista.
  • 3. 149 revista ieb n48 março de 2009 A canção erudita aparece na análise de dois documentos musi- cais. Carlos Alberto Figueiredo propõe um roteiro baseado em regras prosódicas renascentistas para estabelecer o texto musical no Ofício dos Defuntos a 8 vozes, de José Maurício Nunes Garcia. Gisele Pires de Oliveira e Lúcia Barrenechea formulam uma abordagem multidiscipli- nar para a análise de “Cantiga”, canção que abre o ciclo Quatro líricas (1938) de Francisco Mignone com texto de Manuel Bandeira. Baseada na relação entre texto e música, nos conceitos de persona e modo de di- recionamento, a análise fornece ainda subsídios para a interpretação. As reflexões da quarta categoria pertencem ao domínio da orali- dade. Carlos Sandroni questiona em que medida os cantos levantados no xangô do Recife são palavras ou sons vocalizados. Fernando José Carvalhaes Duarte investiga analogias entre o aboio brasileiro e o jubi- lus medieval, utilizando a noção de “antropologia do gesto” de Marcel Jousse. Em jornais e partituras originais, José Geraldo Vinci de Mora- es identifica peculiaridades das “modinhas paulistas” que revelam as- pectos do cotidiano e da cultura urbana nas décadas de 20 e 30. Maria Ignez Cruz Mello estuda os cantos femininos dos índios Wauja no ritual de iamurikuma. Marcus Vinícius Carvalho Garcia e Elen Döppensch- mitt comparam a performance do cantor e compositor Adão Xalebara- dão no documentário Somos todos filhos da terra e no CD Escolástica e discutem o papel da indústria cultural no registro de tradições orais populares. Martha Tupinambá de Ulhôa analisa versões gravadas da modinha Perdão Emília! e discute aspectos da transmissão oral e aural na canção popular urbana. Paula Cristina Vilas descreve o processo de criação da cena de abertura de Entrama: a história do beija-flor coroa- do a partir de sua pesquisa de campo no quilombo de Pombal. Finalmente, a voz aparece nas reflexões de Silvia Adriana Davi- ni, que critica a “abordagem instrumental” corrente na formação de atores, proclamando para a voz a definição de “produção do corpo”. Tran Quang Hai discorre sobre aspectos que caracterizam a palavra “falada” e “cantada” na língua vietnamita e Elizabeth Travassos, que retomarei adiante, discute e elabora uma metodologia para o estudo da voz. O fato de os dois únicos artigos sobre a canção erudita versa- rem sobre teoria e análise musical, em certa medida, flagra o desvio que a Musicologia sofre a partir do ideal de totalidade que a origina. A Musikwissenschaft do século XIX significa compreender a música em todos os seus aspectos2 , como um fenômeno múltiplo, cujas dimensões 2 KERMAN, Joseph. Contemplating music: challenges to musicology. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press, 1985. p. 11-12.
  • 4. 150 revista ieb n48 março de 2009 não são alcançadas pela prática e teoria da música ocidental. A noção de música como obra-de-arte autônoma, historicamente, é recente. Ao contrário, a origem e desenvolvimento da música se deram através de “obras abertas”, organizadas em bases biológicas, culturais e sociais3 . Tomá-la apenas em sua “realidade escrita” (nas palavras de Finnegan) significa recusá-la como experiência estética e humana. Justamente os ensaios de Ruth Finnegan – O que vem primeiro: o texto, a música ou a performance? — e de Elizabeth Travassos — Um objeto fugidio: voz e “musicologias” — vêm ao encontro dessa ques- tão na medida em que reclamam a necessidade de uma compreensão ampla e integrada dos fenômenos envolvidos na canção. O pensamen- to das antropólogas coincide em três aspectos: 1) assumem a canção como atividade, 2) questionam as abordagens literárias e musicológi- cas tradicionais e 3) redimensionam o papel da voz no estudo da pala- vra cantada. Para discutir de que modo interagem texto, música e voz, Fin- negan desvia o foco de análise e interpretação que toma o modelo da escrita como “realidade” central da canção. Formula sua proposição sobre a “realidade da performance” apoiada em seus estudos, que de- monstram que a arte de alguns gêneros verbais não se encontra no texto, mas nos modos com que a voz o transforma. Desse modo, a an- tropóloga inglesa redimensiona o papel e o significado do texto, deslo- cando para a voz performática a função de atualizar os elementos que constituem a canção. Na mesma direção, Elizabeth Travassos aponta algumas dificuldades impostas pela própria musicologia ao estudo da voz e do canto; entre elas, a dicotomia de abordagem que dissocia a voz humana da voz cantada. Propõe, então, uma aproximação entre a “cantométrica” de Alan Lomax e as etnografias da fala e da música como instrumentos para compreender e analisar a voz como fenômeno biopsicossocial. No Brasil, o ideal de totalidade que originalmente conduz a Mu- sicologia é retomado por Mário de Andrade, musicólogo e poeta que deseja compreender o canto e a voz em todas as dimensões. O Primei- ro Congresso da Língua Nacional Cantada, realizado em 1937 sob sua tutela, tem, como proposta central, a organização da língua e da lin- guagem artística dentro de um critério culto, nacional e estético4 . No 3 CROSS, Ian. Music as biocultural phenomenon. In: AVANZINI, G. et alli (Eds.). The neurosciences and music. Annals of the New York Academy of Sciences, v. 999, p. 109- 111, 2003. Disponível em: www.mus.cam.ac.uk/~ic108/PDF/IRMCNYAS2003.PDF. 4 ANDRADE, Mário de. A língua padrão. Anais do Primeiro Congresso da Língua Nacional Cantada, p. 9. “Estado de S. Paulo”, 1-6-1937. Revista do Arquivo Munici- pal. Departamento de Cultura. São Paulo, v. XXXVI, p. 342, 1937.
  • 5. 151 revista ieb n48 março de 2009 entanto, um olhar cuidadoso sobre os textos do autor mostra que sua preocupação com o canto e com a voz não se limita ao problema da nacionalização da canção erudita, mas é precedida pelo desejo de com- preender os mecanismos envolvidos em sua gênese. Para organizar o pensamento e criar teorias próprias, Mário de Andrade abre-se para a interdisciplinaridade, esboçada, precocemen- te, nos artigos que compõem a série Mestres do passado5 , publicados no “Jornal do Comércio” de São Paulo em 1921. Reportando-se às teorias de Spencer, Darwin, Riemann, Ingenieros, Combarieu e Tolstoi, fun- damenta o conceito que norteará os estudos sobre a canção até o ano de sua morte: a palavra cantada e a palavra falada têm origem comum no grito primitivo. Com raízes guardadas na leitura de Herbert Spen- cer, este conceito servirá de mote para escrever Os compositores e a língua nacional (1937)6 e Vida do cantador (1944)7 . Ao tomar o aboio de Chico Antônio como o início de todos os cantos8 e como a manifes- tação primitiva da canção erudita, Mário de Andrade apresenta um aspecto que fundamenta o seu pensamento sobre a gênese da canção: a organização estética é resultado do equilíbrio entre a realidade do elemento sonoro e a realidade do elemento humano9 , organizadas em bases biológicas, culturais e sociais. Musicólogos como A. L. Lloyd, James Porter, R. Katsarova, Ian Cross e Mário de Andrade, entre outros, chamam a atenção para a importância da performance no estudo da canção. Concebidos em condições que agregam som e movimento, interação social, contexto cultural e modulação de estados afetivos, os acalantos, os aboios, os lamentos, as baladas e as músicas de feitiçaria são formas de expres- são que podem ajudar a desvendar muitos aspectos da natureza e do propósito da arte. 5 Idem. Mestres do passado. In: BRITO, Mário da Silva. História do modernismo: antecedentes da Semana de Arte moderna. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964, p. 252-309. 6 Idem. Os compositores e a língua nacional, 1937. In: ______ Aspectos da música brasileira. Belo Horizonte e Rio de Janeiro: Villa Rica, 1991, p. 32-94. 7 Idem. Vida do cantador. Edição crítica de Raimunda de Brito Batista. Belo Hori- zonte e Rio de Janeiro: Villa Rica, 1993. 8 ALMEIDA, Renato. História da Música Brasileira. 2. ed. corr. e aum,. Rio de Janei- ro: F. Briguiet, 1942. p. 55 apud ANDRADE, Mário de. Cantos de trabalho. In: TONI, Flávia Camargo e ALVARENGA, Oneyda (Coord.) Dicionário musical brasileiro. Belo Horizonte: Itatiaia; Brasília: Ministério da Cultura; São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros, 1989. p. 108-109. “Chamar o gado, apregoar, bradar no campo, eis provavelmente o início de todos os cantares – afirma A. Graves. As canções de trabalho são, já, talvez, extensões dessas melodias primárias.” 9 ANDRADE, Mário de. Pequena história da música. 6. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, p. 113-114.
  • 6. 152 revista ieb n48 março de 2009 Palavra cantada: ensaios sobre poesia, música e voz fornece um panorama dos caminhos a serem trilhados para uma compreensão in- tegrada da canção. Originalmente dirigidos à comunidade acadêmica, os artigos equilibram erudição e rigor de escrita, adquirindo um cará- ter didático para o aluno de graduação e pós-graduação. A publicação do livro democratiza o conhecimento e convida a pensar sobre a mais humana das expressões. Recebido em 13 de fevereiro de 2009 Aprovado em 18 de fevereiro de 2009