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A crônica, na maioria dos casos, é um texto curto e narrado em primeira pessoa, ou
seja, o próprio escritor está "dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica
apresente uma visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista.
Geralmente, as crônicas apresentam linguagem simples, espontânea, situada entre a
linguagem oral e a literária. Isso contribui também para que o leitor se identifique com o
cronista, que acaba se tornando o porta-voz daquele que lê.
AS FORMAS COMPOSICIONAIS DA CRÔNICA
O caráter episódico
Os episódios casuais do cotidiano vivido por seres comuns é que se
tornam os heróis do gênero.
 O lirismo
Modo como o cronista exprime seu jeito pessoal de ver as coisas.
O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e
silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar;
de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no
cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical,
depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das
mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de
solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços
luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos
de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às
vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres;
mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro
de casa o amor pode acabar; (...)
 
(trecho da crônica O amor acaba. Paulo Mendes Campos. In: O amor acaba. Editora
Civilização Brasileira – Rio de Janeiro, 1999, pág. 21)
O texto vira uma “prosa à toa”, “uma conversa fiada”. Há crônicas totalmente escritas em
forma de diálogo. Na verdade, a reprodução do diálogo é a forma mais fiel de representação de
uma situação presente. O diálogo faz a cena acontecer em nossa frente.
 
O diálogo
Ela: Você me ama mais do que tudo?
Ele: Amo.
Ela: Paixão, paixão?
Ele: Paixão, paixão mesmo.
Ela: Mais do que tudo no mundo todo?
Ele: No mundo todo e fora dele.
Ela: Não acredito.
Ele: Faz um teste.
Ela: Eu ou fios de ovos.
Ele: Você, fácil.
(...)
Ela: Fama e fortuna. A explicação do universo e do mercado de commodities, com
exclusividade. A vida eterna e um cartão de crédito que nunca expira.
Ele: Prefiro você.
Ela: Uma cerveja geladinha. A garrafa chega estalando. No copo, fica com um quarto de
espuma firme. O resto é ela, só ela, dizendo "Vem".
Ele: Hummm...
Ela: Como, hummm? Ela ou eu?
.... Silêncio de 5 segundos ...
 
Ele: Qual é a marca?
Ela: Seu cretino!
 
(trecho da crônica Amor, de Luís Fernando Veríssimo. Retirado do site:
http://www.gsdr.dc.ufscar.br/~wesley/verissimo_amor.html, capturado em 15/04/2005)
O poema –crônica
O cronista pode até construir suas frases como se fossem versos, sugerindo nele um flash da
situação. Lidos como poema, os versos descaracterizam o tom da poesia, que sempre foi
dominada pelo tom sério.
POEMA TIRADO DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL
João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no
morro da Babilônia num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
(In: Poesia Completa e Prosa. Nova Aguilar, Rio de Janeiro.1993)
 
 
A palavra liberada: do humor à sátira
 Um tipo de narrativa tão aberta à experimentação da linguagem não poderia de modo algum
reprimir as expressões da linguagem popular cotidiana como palavrões, gírias, xingamentos e
alguns tipos de expressões grosseiras.
(...)
E essa vem direto de Minas: "Justiça manda vigilante dividir o prêmio da Mega Sena com a
ex-mulher". Azar na sorte. Isso é o que eu chamo de ter azar na sorte! Diretas Já! Eu quero
votar pra papa. Se der um papa argentino, o Corinthians já tem estádio: o Vaticano! E, se der o
d. Claudio, ele é gaúcho! Papa gaúcho! Vai liberar o churrasco na Semana Santa! E, se der o papa
alemão, o Rubinho vai chegar em segundo. E eu já disse que papa argentino não dá certo porque
o cara já pensa que é Deus! E por que não o padre Marcelo pra papa? AGITA ROMA! Missa com
trio elétrico e aquele monte de cardeal velhinho dançando a "Aeróbica de Jesus". É mole? É
mole, mas sobe!
(...)
( trecho retirado do Caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo, de 15/04/2005. caputrado
do site: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1504200503.htm)
Leio no jornal a notícia de que um homem morreu de fome. Um homem de cor branca, 30 anos
presumíveis, pobremente vestido, morreu de fome, sem socorros, em pleno centro da cidade,
permanecendo deitado na calçada durante 72 horas, para finalmente morrer de fome.
     Morreu de fome. Depois de insistentes pedidos e comentários, uma ambulância do Pronto
Socorro e uma radiopatrulha foram ao local, mas regressaram sem prestar auxílio ao homem,
que acabou morrendo de fome.
     Um homem que morreu de fome. O comissário de plantão (um homem) afirmou que o caso
(morrer de fome) era da alçada da Delegacia de Mendicância, especialista em homens que
morrem de fome. E o homem morreu de fome.
     O corpo do homem que morreu de fome foi recolhido ao Instituto Anatômico sem ser
identificado. Nada se sabe dele, senão que morreu de fome.
     Um homem morre de fome em plena rua, entre centenas de passantes. Um homem caído na
rua. Um bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pária, um marginal, um
proscrito, um bicho, uma coisa - não é um homem. E os outros homens cumprem seu destino de
passantes, que é o de passar. Durante setenta e duas horas todos passam, ao lado do homem
que morre de fome, com um olhar de nojo, desdém, inquietação e até mesmo piedade, ou sem
olhar nenhum. Passam, e o homem continua morrendo de fome, sozinho, isolado, perdido entre
os homens, sem socorro e sem perdão.
Não é da alçada do comissário, nem do hospital, nem da rádiopatrulha, por que haveria de ser
da minha alçada? Que é que eu tenho com isso? Deixa o homem morrer de fome.
     E o homem morre de fome. De trinta anos presumíveis. Pobremente vestido. Morreu de
fome, diz o jornal. Louve-se a insistência dos comerciantes, que jamais morrerão de fome,
pedindo providências às autoridades. As autoridades nada mais puderam fazer senão remover
o corpo do homem. Deviam deixar que apodrecesse, para escarmento dos outros homens.
Nada mais puderam fazer senão esperar que morresse de fome.
     E ontem, depois de setenta e duas horas de inanição, tombado em plena rua, no centro mais
movimentado da cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, um homem morreu de fome.
Leio no jornal a notícia de uma mulher que pariu no corredor do Hospital Fêmina. Jovem, negra,
pobre, pariu no corredor do hospital, com poucos socorros, em pleno banco estofado, em meio a
enfermeiras, médicos e pacientes. Somente abriu as pernas e deu à luz.
     Pariu no corredor do hospital. Gritou por ajuda, clamou por assistência médica. No entanto,
o tempo não pôde esperar e acabou parindo em pleno corredor.
     Gestante pariu no corredor de hospital. A enfermeira disse que havia falta de quartos.
Fêmina apresentava super lotação de parturientes. E a pobre negra somente abriu as pernas e
deu à luz.
     Eis que de seu ventre surge um menino magro. De muito peso não é, mas tem peso de
homem, de obra de ventre de mulher. É uma criança pálida e franzina. Mas tem a marca de
homem, marca de humana oficina.
      Pariu no corredor do hospital. Entre diversas enfermeiras, médicos e pacientes. Mulher
pobre. Sozinha. Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra. Baixo nível. Ignorante. Um bicho,
uma coisa - não foi tratada como digna parturiente. E pariu no corredor do hospital. E eis que
de seu ventre salta uma criança pequena. É tão bela como um sim numa sala negativa.
     Não é responsabilidade dos profissionais, nem do hospital, nem das autoridades. O que têm
a ver com o fato? Deixa a mulher parir em pleno corredor.
     E ela, o que faz? Jovem e destemida dá à luz sobre um banco estofado, sem recursos e com
pouco auxílio. E eis que de seu ventre nasce o menino. Somente após o ocorrido, a jovem é
amparada. Nos braços, o rebento abençoado infecciona a miséria com vida nova e sadia.
Crônica de
Fernando Sabino
A repetição "morreu de fome"
(18 ocorrências)
Frases nominais: "Um homem caído na rua. Um
bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um
anormal, um tarado, um pária, um marginal, um
proscrito, um bicho, uma coisa - não é um um
homem."
Texo de
Renata Appel
A repetição "pariu no corredor do Hospital"
(7 ocorrências)
Frases nominais: "Mulher pobre. Sozinha.
Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra.
Baixo nível. Ignorante. Um bicho, uma coisa -
não foi tratada como digna parturiente."
Um texto cita outro com, basicamente, duas finalidades distintas:
A citação de um texto por outro, a esse diálogo entre textos dá-se o nome de
Intertextualidade
a) para reafirmar alguns dos sentidos do texto citado (paráfrase);
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a cronica cronica

  • 1.
  • 2. A crônica, na maioria dos casos, é um texto curto e narrado em primeira pessoa, ou seja, o próprio escritor está "dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica apresente uma visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista. Geralmente, as crônicas apresentam linguagem simples, espontânea, situada entre a linguagem oral e a literária. Isso contribui também para que o leitor se identifique com o cronista, que acaba se tornando o porta-voz daquele que lê.
  • 3. AS FORMAS COMPOSICIONAIS DA CRÔNICA O caráter episódico Os episódios casuais do cotidiano vivido por seres comuns é que se tornam os heróis do gênero.  O lirismo Modo como o cronista exprime seu jeito pessoal de ver as coisas.
  • 4. O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; (...)   (trecho da crônica O amor acaba. Paulo Mendes Campos. In: O amor acaba. Editora Civilização Brasileira – Rio de Janeiro, 1999, pág. 21)
  • 5. O texto vira uma “prosa à toa”, “uma conversa fiada”. Há crônicas totalmente escritas em forma de diálogo. Na verdade, a reprodução do diálogo é a forma mais fiel de representação de uma situação presente. O diálogo faz a cena acontecer em nossa frente.   O diálogo Ela: Você me ama mais do que tudo? Ele: Amo. Ela: Paixão, paixão? Ele: Paixão, paixão mesmo. Ela: Mais do que tudo no mundo todo? Ele: No mundo todo e fora dele. Ela: Não acredito. Ele: Faz um teste. Ela: Eu ou fios de ovos. Ele: Você, fácil. (...)
  • 6. Ela: Fama e fortuna. A explicação do universo e do mercado de commodities, com exclusividade. A vida eterna e um cartão de crédito que nunca expira. Ele: Prefiro você. Ela: Uma cerveja geladinha. A garrafa chega estalando. No copo, fica com um quarto de espuma firme. O resto é ela, só ela, dizendo "Vem". Ele: Hummm... Ela: Como, hummm? Ela ou eu? .... Silêncio de 5 segundos ...   Ele: Qual é a marca? Ela: Seu cretino!   (trecho da crônica Amor, de Luís Fernando Veríssimo. Retirado do site: http://www.gsdr.dc.ufscar.br/~wesley/verissimo_amor.html, capturado em 15/04/2005)
  • 7. O poema –crônica O cronista pode até construir suas frases como se fossem versos, sugerindo nele um flash da situação. Lidos como poema, os versos descaracterizam o tom da poesia, que sempre foi dominada pelo tom sério. POEMA TIRADO DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu Cantou Dançou Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado. (In: Poesia Completa e Prosa. Nova Aguilar, Rio de Janeiro.1993)  
  • 8.   A palavra liberada: do humor à sátira  Um tipo de narrativa tão aberta à experimentação da linguagem não poderia de modo algum reprimir as expressões da linguagem popular cotidiana como palavrões, gírias, xingamentos e alguns tipos de expressões grosseiras. (...) E essa vem direto de Minas: "Justiça manda vigilante dividir o prêmio da Mega Sena com a ex-mulher". Azar na sorte. Isso é o que eu chamo de ter azar na sorte! Diretas Já! Eu quero votar pra papa. Se der um papa argentino, o Corinthians já tem estádio: o Vaticano! E, se der o d. Claudio, ele é gaúcho! Papa gaúcho! Vai liberar o churrasco na Semana Santa! E, se der o papa alemão, o Rubinho vai chegar em segundo. E eu já disse que papa argentino não dá certo porque o cara já pensa que é Deus! E por que não o padre Marcelo pra papa? AGITA ROMA! Missa com trio elétrico e aquele monte de cardeal velhinho dançando a "Aeróbica de Jesus". É mole? É mole, mas sobe! (...) ( trecho retirado do Caderno Ilustrada da Folha de S. Paulo, de 15/04/2005. caputrado do site: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1504200503.htm)
  • 9. Leio no jornal a notícia de que um homem morreu de fome. Um homem de cor branca, 30 anos presumíveis, pobremente vestido, morreu de fome, sem socorros, em pleno centro da cidade, permanecendo deitado na calçada durante 72 horas, para finalmente morrer de fome.      Morreu de fome. Depois de insistentes pedidos e comentários, uma ambulância do Pronto Socorro e uma radiopatrulha foram ao local, mas regressaram sem prestar auxílio ao homem, que acabou morrendo de fome.      Um homem que morreu de fome. O comissário de plantão (um homem) afirmou que o caso (morrer de fome) era da alçada da Delegacia de Mendicância, especialista em homens que morrem de fome. E o homem morreu de fome.      O corpo do homem que morreu de fome foi recolhido ao Instituto Anatômico sem ser identificado. Nada se sabe dele, senão que morreu de fome.      Um homem morre de fome em plena rua, entre centenas de passantes. Um homem caído na rua. Um bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pária, um marginal, um proscrito, um bicho, uma coisa - não é um homem. E os outros homens cumprem seu destino de passantes, que é o de passar. Durante setenta e duas horas todos passam, ao lado do homem que morre de fome, com um olhar de nojo, desdém, inquietação e até mesmo piedade, ou sem olhar nenhum. Passam, e o homem continua morrendo de fome, sozinho, isolado, perdido entre os homens, sem socorro e sem perdão.
  • 10. Não é da alçada do comissário, nem do hospital, nem da rádiopatrulha, por que haveria de ser da minha alçada? Que é que eu tenho com isso? Deixa o homem morrer de fome.      E o homem morre de fome. De trinta anos presumíveis. Pobremente vestido. Morreu de fome, diz o jornal. Louve-se a insistência dos comerciantes, que jamais morrerão de fome, pedindo providências às autoridades. As autoridades nada mais puderam fazer senão remover o corpo do homem. Deviam deixar que apodrecesse, para escarmento dos outros homens. Nada mais puderam fazer senão esperar que morresse de fome.      E ontem, depois de setenta e duas horas de inanição, tombado em plena rua, no centro mais movimentado da cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, um homem morreu de fome.
  • 11. Leio no jornal a notícia de uma mulher que pariu no corredor do Hospital Fêmina. Jovem, negra, pobre, pariu no corredor do hospital, com poucos socorros, em pleno banco estofado, em meio a enfermeiras, médicos e pacientes. Somente abriu as pernas e deu à luz.      Pariu no corredor do hospital. Gritou por ajuda, clamou por assistência médica. No entanto, o tempo não pôde esperar e acabou parindo em pleno corredor.      Gestante pariu no corredor de hospital. A enfermeira disse que havia falta de quartos. Fêmina apresentava super lotação de parturientes. E a pobre negra somente abriu as pernas e deu à luz.      Eis que de seu ventre surge um menino magro. De muito peso não é, mas tem peso de homem, de obra de ventre de mulher. É uma criança pálida e franzina. Mas tem a marca de homem, marca de humana oficina.       Pariu no corredor do hospital. Entre diversas enfermeiras, médicos e pacientes. Mulher pobre. Sozinha. Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra. Baixo nível. Ignorante. Um bicho, uma coisa - não foi tratada como digna parturiente. E pariu no corredor do hospital. E eis que de seu ventre salta uma criança pequena. É tão bela como um sim numa sala negativa.      Não é responsabilidade dos profissionais, nem do hospital, nem das autoridades. O que têm a ver com o fato? Deixa a mulher parir em pleno corredor.      E ela, o que faz? Jovem e destemida dá à luz sobre um banco estofado, sem recursos e com pouco auxílio. E eis que de seu ventre nasce o menino. Somente após o ocorrido, a jovem é amparada. Nos braços, o rebento abençoado infecciona a miséria com vida nova e sadia.
  • 12. Crônica de Fernando Sabino A repetição "morreu de fome" (18 ocorrências) Frases nominais: "Um homem caído na rua. Um bêbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pária, um marginal, um proscrito, um bicho, uma coisa - não é um um homem." Texo de Renata Appel A repetição "pariu no corredor do Hospital" (7 ocorrências) Frases nominais: "Mulher pobre. Sozinha. Miserável. Gestante. Jovem demais. Negra. Baixo nível. Ignorante. Um bicho, uma coisa - não foi tratada como digna parturiente."
  • 13. Um texto cita outro com, basicamente, duas finalidades distintas: A citação de um texto por outro, a esse diálogo entre textos dá-se o nome de Intertextualidade a) para reafirmar alguns dos sentidos do texto citado (paráfrase); b) para inverter, contestar e deformar alguns dos sentidos do texto citado; para polemizar com ele (paródia).