Apresentação por alunos da Universidade Federal de São Carlos à disciplina de Fundamentos da Pesquisa em Psicanálise. Resumo apresentado de dois artigos acerca da construção do caso clínico e a pesquisa em Psicanálise
Uso de Células-Tronco Mesenquimais e Oxigenoterapia Hiperbárica
A construção do caso clínico: uma contribuição da psicanálise à psicopatologia e à saúde mental.pdf
1. Grupo 01: Clara Saciloto, Fernando, Gabrielle Sabino, Letícia, Marcos e Maria Freire
Fundamentos para Pesquisa IV
O método da construção do caso psicanalítico
2. ARTIGO I
A pesquisa em psicanálise: o método de construção do caso
psicanalítico
Denise Quaresma da Silva
3. Neste artigo foi possível encontrar um aporte para as pesquisas
qualitativas e construção de caso nas ciências humanas e psicanálise.
Foi usada a tese de doutoramento “Mães-menininhas: a gravidez na
adolescência escutada pela psicanálise e educação (Quaresma Da
Silva, 2007)
4. A psicanálise é aquilo que o psicanalista pode aprender através
da investigação da cultura humana e das atividades humanas
(Nogueira, 2004)
5. A entrevista e a investigação narrativa: os contadores de histórias
calei
6. Na pesquisa psicanalítica, o(a) pesquisador(a) se utiliza
metaforicamente de um caleidoscópio para pensar na questão que
é objeto de investigação, iluminando ângulos até então pouco
percebidos ou ignorados, através de ferramentas múltiplas —
nesta pesquisa, as entrevistas semiabertas.
7. A pesquisa psicanalítica, por levar em consideração o
subconsciente, propõe a não busca de uma verdade absoluta, mas a
investigação de verdades contextuais, relativas e individualizadas.
Tomo a entrevista na pesquisa psicanalítica como uma ferramenta
também produtora de subjetividades, pois aquele que ocupa o lugar de
entrevistador fala de um lugar de saber e poder, produzindo efeitos
sobre o (a) entrevistado (a).
Com o uso da pesquisa semiestruturada pode-se usar a técnica de
observação livre com registro em diário de campo, no intuito de
complementar e validar as informações construídas.
8. NO DIÁRIO
Nele registramos as impressões subjetivas, os aspectos informais, os
gestos, os comportamentos, as expressões emocionais que percebemos
no decorrer da pesquisa, e as percepções que tivemos ao longo das
entrevistas e que não couberam nas narrativas, por serem importantes
expressões não verbais que “falaram”. Essas percepções, por vezes
pouco consideradas ou não validadas pelas ciências exatas, encontram,
no campo das pesquisas em psicologia e psicanálise, sua valia, pois os
silêncios, os suspiros, o tom de voz revelam a emoção e a afetividade
que permeiam o sujeito na temática que narra, muitas vezes
denunciando o sujeito.
9. NO DIÁRIO
De uma forma simplificada, é importante dar atenção aos
atos falhos, porque são valiosas pistas de como
psiquicamente o sujeito lida com a temática que está
narrando.
10. A entrevista pode fazer com que surja efeitos sobre o entrevistador
que desestabilize suas “convicções” ou própositos que são
apresentados de maneira diferente da esperada. Quando isso
acontecer, é preciso reavaliar e reconstruir o que é necessário de
acordo com as realidades que são encontradas
Não dá para iniciar a fazer pesquisas acadêmicas e pensar que as
informações irão aparecer de modo puro e expressem a verdade
sobre as questões procuradas. É preciso se posicionar de maneira
atenta e mostrando que não é possível manter ideias como
atemporalidade, exatidão, fidedignidade, imparcialidade.
11. TRANSCRICÃO
As entrevistas são gravadas e transcritas posteriormente, para
poderem ser analisadas em toda sua extensão. No momento da
transcrição, os nomes verdadeiros dos(as) entrevistados(as) são
preservados garantindo, assim, o sigilo e o tratamento ético.
Impossibilidade de transparência na reconstrução ou reintegração
da narrativa de modo idêntico como foi enunciada: se veio
acompanhada ou não de choro, dúvida, de um sussurro, de um
silêncio, de um sorriso.
12. No lugar de quem investiga e analisa, é importante compreender a entrevista no
seu aspecto polifônico, ou seja, trazer para a análise justamente as “outras
vozes”, a pluralidade discursiva que atravessa a narrativa da entrevistada; sem
deixar de mencionar que a própria presença de quem investiga é parte dessa
pluralidade discursiva, ou seja, sempre há uma interferência, mesmo que mínima
e não intencionada. É importante então compreender, durante a entrevista e na
análise, que o indivíduo é sujeito de uma série de discursos (ditos e não ditos) e
que o mesmo indivíduo pode ocupar diferentes posições de sujeito: quem fala
em mim?
TRANSCRICÃO
Para esses autores, estudar as narrativas é olhar para
as formas pelas quais os seres humanos experimentam
o mundo
13. ANÁLISE DE DADOS
Para a análise dos dados colhidos nessas múltiplas vozes que constituirão o caso
psicanalítico, conforme relata Iribarry (2003), a experiência do(a) pesquisador(a)
psicanalítico(a) diante das entrevistas e questionários respondidos é tomada no
sentido de uma aprendizagem que se transformou em saber, ou seja, uma
Erfahrung, uma experiência decorrente do contato do(a) pesquisador(a) com
os(as) participantes de sua investigação e com os dados coletados. O(A)
pesquisador(a) psicanalítico(a) faz parte da experiência de aprendizagem
extraída da pesquisa e, com base no estudo de caso, constrói o caso psicanalítico
15. Do que se trata?
"A construção do caso deve ser entendida como um processo contínuo.
Assim, é o efeito capaz de ser produzido que dará o caráter de bem fundado a
um conceito psicanalítico, uma vez que, antes da formulação teórica, o
psicanalista dá testemunho de sua escuta. A ideia de que um caso clínico seja
uma ficção nasce do fato de que o relato de um tratamento psicanalítico jamais
consegue reproduzir o acontecimento concreto, mas sua história reformulada, a
partir de uma reconstituição fictícia" (BARTH, 2006, p. 40).
16. Preocupações iniciais
Assim como na clínica, não se inicia uma investigação com
respostas ou teorias pré-estabelecidas
A análise aparece tão somente quando elementos
possibilitadores desta surgem
Não devem ser produzidas interpretações a serem comunicadas
para o participante
Não se deve interferir com as escolhas íntimas do participante, o
pesquisador não deve sugerir.
17. Viabilidade
Uma ciência se define por seu objeto de estudo e pelo modo de
investigação desse objeto
Abertura
Construção Participação
18.
19. Por que psicanálise?
Possibilitar a comunicação de experiências subjetivas para a
comunidade científica
"Os elementos de minha própria formação como psicanalista e como educadora possibilitaram
minha entrega ao estudo proposto como tese de doutorado e anunciado no início deste texto: um
objeto de pesquisa que me fazia questão — as significações da gravidez para as adolescentes —,
além de minha formação teórica constante, das trocas realizadas em supervisão com a orientadora
acadêmica, da condição de escuta do outro a partir da escuta de mim mesma e da elaboração de
minhas próprias questões, analiticamente.
Ou seja, a iluminação, a clareagem, a escuta e a leitura das vozes e dos silêncios foram propostas
por um sujeito ativo, participante, não neutro: o(a) pesquisador(a) na pesquisa psicanalítica não é
alguém distante, “esterilizado”, à parte da questão. Pelo contrário, sente em seu íntimo os ecos da
pesquisa e por ela é atravessado(a)."
20. ARTIGO II
A construção do caso clínico: uma contribuição da psicanálise à
psicopatologia e à saúde mental
Ana Cristina Figueiredo
21. Saúde mental, psiquiatria e psicanálise
Saúde Mental
Assistência na saúde
mental
Programas comunitários, como por exemplo o PSF
(Programa de Saúde da Família), os ambulatórios,
os CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) e os
hospitais psiquiátricos, onde se encontra a
psiquiatria em seu território por excelência.
22. Psiquatria
É o campo no qual historicamente se desenvolveram os conceitos
psicopatológicos, onde temos diferentes disciplinas convergindo na
direção do diagnóstico, da localização do pathos do sujeito, como
balizador do tratamento, formando um novo campo para a
psicopatologia.
Psicanálise
É herdeira da psiquiatria, tem como sua herança a própria psicopatologia.
Freud, ao tomar seu rumo na direção do inconsciente,
lança a psicanálise numa nova referência que redimensiona o alcance do
diagnóstico, indo da descrição à dinâmica; do fenômeno à estrutura.
23. Assim, a psicanálise se delineia por oposição ao campo fenomênico-
descritivo da psiquiatria e da psicopatologia geral, e se estabelece
como o campo do inconsciente e de suas formações (Freud) ou o
campo do Outro (Lacan).
Essa concepção rompe com as concepções anteriores de diagnóstico
e tratamento da psiquiatria criando novas exigências para ambos e
abrindo uma nova porta para a psicopatologia.
24. "O sintoma não vai sem o sujeito, nem o sujeito pode ser
pensado sem o seu sintoma."
Um se constitui no outro, o sujeito através do sintoma e vice-versa. Nesse
sentido, diagnóstico e tratamento seriam indissociáveis.
Na psiquiatria atual, não há um diagnóstico do sujeito e sim de uma coleção
de fenômenos que nada dizem a respeito dele. Exemplo: de acordo com os manuais diagnósticos
em psiquiatria (CID 9 e 10, DSM III e IV), a histeria não existe mais. Assim, a histeria só existe se
atrelada à concepção de inconsciente e, portanto, à própria psicanálise. A psicanálise faz a histeria
existir.
25. Se não evocarmos o sujeito com sua palavra e sua responsabilidade desde o
primeiro momento, se só o tutelarmos, estaremos decretando o fracasso da
clínica e de qualquer transformação na psiquiatria.
Um estudo de caso não pode ser um relato compilado de acontecimentos e
procedimentos dispostos em uma sequência com critérios pré-estabelecidos a serem
preenchidos. Este é o caso da anamnese, que está presente na psicopatológica e nas
sessões clínicas da psiquiatria. Todo o esforço diagnóstico deve, pela via do discurso,
orientar-se para trazer à cena o sujeito e suas produções e, assim, trona-se possível
localizar seu sintoma ou seu delírio.
Algumas considerações:
26. A Construção do Caso
A CONSTRUÇÃO É UM
ARRANJO DOS ELEMENTOS DO DISCURSO VISANDO A UMA CONDUTA
INTERPRETAÇÃO
CONSTRUÇÃO
A INTERPRETAÇÃO É
PONTUAL VISANDO A UM
SENTIDO
27. Resumo
etiológico
A “construção do caso
clínico” em psicanálise é o
(re)arranjo dos elementos do
discurso do sujeito que
“caem”, se depositam com
base em nossa inclinação
para colhê-los, não ao pé do
leito, mas ao pé da letra
28. CASO E SUJEITO
(INCONSCIENTE)
O CASO NÃO É O SUJEITO
SUJEITO
CASO
CASO É UMA CONSTRUÇÃO BASEADA NOS
ELEMENTOS DO SUJEITO, UM FRAGMENTO
29. MÉTODO
Desenvolvimento de um método que permite
recolher da experiência clínica seus elementos de
base para poder reter dessa experiência algo
transmissível e avaliável de cada caso.
RECORTOU-SE O QUE CHAMAMOS DE BINÔMIOS DA
CONSTRUÇÃO DO CASO, ISTO É, BALIZADORES PARA NOS INDICAR O CAMINHO
31. História Caso
HISTÓRIA: Relato rico em detalhes, cenas e conteúdos
CASO: Produto do que se extrai das intervenções do
analista na condução do tratamento e do que é
decantado de seu relato
32. História Caso
Colocar em jogo os significantes do sujeito, suas
produções com base na elaboração em análise
Resposta do Analista ---> Interpretação ---> Novos Significantes
Visando decantar a história e traçar o caso a
partir do discurso
Composição Esquemática
33. História Caso
Só assim será possível recolher dos infindáveis detalhes de
uma história a direção de um caso.
Uma história deve se fazer caso para que se possa trabalhar
em psicanálise.
34. Decisões absolutas sobre a verdade do caso
Supervisão Construção
Discussões em equipe ---> sustentam o funcionamento do
método
Caráter multiprofissional do acompanhamento psicoterapêutico
(Psiquiatras, Terapeutas Ocupacionais p.ex)
Geralmente há uma hierarquia de responsabilidade e supervisão
35. Supervisão Construção
Retorno ao pesquisador em sua condição de sujeito durante a supervisão
Com ajuda do supervisor: Reapropriação do saber pelo analista na
condição de pesquisador
Produto da supervisão - Principal ferramenta do Pesquisador
O entrelaçamento das funções de sujeito,
pesquisador, analista rompe qualquer fixidez de posição diante do saber
36. Conceitos Distinções
Conceitos fundamentais da Psicanálise ---> Desnecessário definir exatamente
Fundamental estabelecer DISTINÇÕES
“Eu não a
quero mais, quero
outra”
“Eu a quero
mais que as
outras”
37. Conceitos Distinções
“Eu não a
quero mais,
quero outra”
“Eu a quero
mais que as
outras”
Conteúdo latente
do Sujeito
tentando se
manifestar
Resistência do Eu,
habitualmente
cordial e submisso à
esposa
ROMPIMENTO
Importante Distinguir
38. Conceitos Distinções
A psicanálise não é o efeito de um saber do Outro sobre uma história e,
sim, o feliz encontro entre as ferramentas conceituais do analista –
pulsão e objeto, por exemplo – e as contingências de uma história,
produzindo um caso e, no melhor dos casos, um novo sujeito.
39. A construção do caso clínico em saúde mental
No campo da saúde mental, há tendência de negar e desqualificar a
clínica, colocando-a no caminho contrário à reabilitação.
Palavras de ordem como o direito à cidadania, à autonomia, à
ampliação dos vínculos sociais parecem dispensar a clínica
Contudo é apenas pelo discurso do sujeito encontrado na clínica que se
pode escapar de duas grandes armadilhas: a “pedagogia
interpretativa”,e a “terapêutica da restauração” que busca retornar ao
estado anterior à doença
40. O projeto terapêutico não é sobre os saberes e funções do que é
necessário ou do que é melhor para o paciente e sim ir em busca das
boas perguntas,
A pergunta deixa de ser "o que podemos
fazer por ele" para ser "o que ele pode
fazer para sair de tal situação com nosso
suporte"
O que não significa que não devemos dar suporte, mas sim que deve-se
trazer a responsabilidade para o sujeito.
41. São questões fundamentais que aparecem do esforço conjunto do
trabalho em equipe de não se deixar levar pelo furor sanandi
(fanatismo pela cura) como já dizia Freud, e nem pelo furor de
educar.
Se reabilitar rejeita a clinica caímos na armadilha da reeducação
Responsabilidade
O melhor antídoto é a
Levar o sujeito se perguntar "o que faço aqui?"
"O que torna minha vida tão insuportável e o que posso
fazer para encontrar uma solução?"
Freud dizia que a
psicanálise é uma
reeducação ao mesmo
tempo nos avisou que as
pulsões são indomáveis
Paradoxo
42. O trabalho em equipe na clínica é complexo e a modalidade na qual se estruturam é
decisivo para o destino da clinica sendo elas a formação hierárquica e formação
igualitária
Formação Hierárquica: funções e saberes tendem a burocratizar a clínica e a
verticalizar o poder e o saber, cristalizar a clinica.
Formação Igualitária: horizontalizam o poder misturam as funções escapando
das especialidades, mas caindo na falta de especificidade e confundindo as
funções a ponto de perder a referência da clínica e imobilizar o trabalho
conjunto
Termo descrito por Lacan para definir as relações nos cartéis, que
permite que se dissolvam os efeitos narcísicos imaginários como
a confusão de papéis que ocorre no modelo igualitário ou na
fixação de papéis no modelo hierárquico o que auxiliaria a equipe
de saúde mental.
Transferência de
Trabalho
43. Função terapêutica ter um limite
Quanto ao sujeito, o importante é seguir seu estilo para a partir daí lhe indagar o
que é pertinente a seu sintoma, e fazê-lo tomar sua responsabilidade como tal,
por seus atos, no mínimo que seja, mesmo que não tenha responsabilidade plena,
no sentido jurídico.
É preciso separar esse campo de responsabilidades porque, na maioria das vezes,
os sujeitos se apresentam tutelados, desresponsabilizados, mas nem por isso
sentindo-se menos culpados, ainda que se percebam como vítimas. Isso os leva à
imobilidade, à falta de solução, à confirmação da doença.
44. Uma posição para a equipe na clínica seria a de
"aprendizes da clínica" o que quer dizer: formular boas
questões, verificar os efeitos das intervenções, tomar
novas decisões ou dar um novo rumo a cada caso a partir
das indicações do sujeito que são dadas de algum modo
atraves do seu sintoma e nas diversas suas manifestações.
Aprendizes da clínica
45. O trabalho em equipe nas instituições de saúde mental tem a mesma
proposta: recolher da experiência do sujeito, de seu discurso, os
elementos com os quais se fará a construção do caso, entendendo que
ela é sempre parcial visando as direções para as intervenções e podendo
ser revisada
A construção do caso pode conter elementos discursivos de familiares e
de outros envolvidos, mas nunca perdendo de referencia o sujeito em
questão
Voltando ao objeto central do nosso trabalho:
a construção do caso clínico
46. O que caracteriza a construção do caso na equipe de saúde mental, e diverge do
trabalho mais específico do psicanalista, é exatamente o fato da equipe ser
heterogênea em sua composição.
É justamente por meio desse trabalho “coletivo” que a discussão do caso deve ir na
direção do “aprendiz da clínica”, ou seja, colher das produções do sujeito os
indicadores para seu tratamento, e não, ao contrário, impor o modelo da reabilitação
em sua dimensão pedagógica e moral, como acontece com frequência.
A presença de um psicanalista poderia ajudar bastante, desde que este não se apresente
como o portador da “boa nova” e sim como mais um “aprendiz” convocando os demais a
fazerem o mesmo
47. Descrição do caso
Paciente adulta, 30 anos, com diagnóstico de hebefrenia, e com
suspeita de retardo mental, casada, tutelada pelo marido que a vigiava,
alegando sua condição.
No CAPS: comportamento “regredido”. Quase não falava, pouco
“cooperativa”, e comportamento bizarro de andar pelos corredores de
olhos fechados, como se não pudesse enxergar.
De vez em quando, participava de algumas atividades na oficina de
culinária e bordado. Alegava-se que era a medicação que estava
funcionando.
Sabia-se, no entanto, que ela vivia fugindo do marido para ir ao
encontro de um “amante”, e parece que este não era o primeiro.
48. Quando ela estava aparentemente um pouco melhor, mais “cooperativa”, saía de casa bem
nos horários em que o marido trabalhava e não poderia vigiá-la, ia até o “amante” e voltava
antes da hora dele chegar, que não aguenta o marido, aquele jeito de tratar dela como se
ela fosse uma boba.
Somente na reunião da equipe é que foi possível discutir abertamente esses contrastes em
seu comportamento, e colher esses elementos de sua fala que apontavam o sujeito,
localizavam sua estratégia. Esse foi o passo preliminar para a construção do caso. O passo
seguinte seria o de acolher sua fala mais sistematicamente, trazê-la à responsabilidade
sobre suas ações sem culpabilizá-la ou dizer o que é melhor para ela. E então fazê-la
construir sua história, para a partir daí construir o caso ainda que parcialmente, e dar uma
direção para a conduta da equipe que, até então, se limitava a “guardá-la” e ocupá-la para
que o marido pudesse trabalhar.
49. Esse caso não chegou a uma formulação próxima de uma construção. Por isso mesmo,
não se sabia o que fazer diante do modo como esse sujeito se apresentava, e à equipe só
restava atender à demanda do marido, acolhendo, cuidando, sem dúvida, medicando o
sintoma, trazendo até mesmo um certo alívio por vezes, mas nunca trazendo à tona algo
da verdade desse sujeito como produção sua. Algo pelo que pudesse se responsabilizar
em vez de se portar como uma espécie de pária social.
A construção do caso toca a verdade do sujeito e pode provocar situações de difícil
manejo, mas não há como fugir disso, pois se o fizermos, estaremos abrindo mão de
nosso mandato clínico e mantendo a cronificação que tanto condenamos pela conivência
com a inércia da doença que leva à desresponsabilização, e com a inércia da instituição
que leva ao imobilismo.
50. REFERÊNCIAS:
Silva, Denise Quaresma da. (2013). A pesquisa em psicanálise: o método de construção do caso
psicanalítico. Estudos de Psicanálise, (39), 37-45. Recuperado em 25 de janeiro de 2023, de
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-
34372013000100004&lng=pt&tlng=pt.
Figueiredo, Ana Cristina. (2004). A construção do caso clínico: uma contribuição da psicanálise à psicopatologia
e à saúde mental. Rev. latinoam. psicopatol. fundam, VII, 1, 75-86 (1) • Jan-Mar 2004 •
https://doi.org/10.1590/1415-47142004001006