O documento discute como tornar Porto Alegre uma cidade mais humana através de projetos de revitalização, mobilidade, sustentabilidade e convívio social. Jaime Lerner, arquiteto e ex-prefeito de Curitiba, é entrevistado e elogia a identidade dos porto-alegrenses com sua cidade. Ele destaca a importância de integrar moradia, trabalho e lazer, usar menos carros, e promover a mistura social. Vários projetos comunitários em Porto Alegre são apresentados, visando estimular a sociabilidade e o uso dos
Porto Alegre mais humana com projetos de revitalização e iniciativas cidadãs
1. ZERO HORA, SÁBADO,
20 DE JULHO DE 2013
FOTOS OMAR FREITAS
INOVAÇÕES EM PORTO ALEGRE
PROJETO VIZINHANÇA
EM COMUM,
AS CIDADES
MAIS
HUMANAS
SÃO DOTADAS
DE PARQUES
E ÁREAS DE
CONVIVÊNCIA,
CICLOVIAS,
BOAS
CALÇADAS,
TRANSPORTE
PÚBLICO
INTEGRADO E
DE QUALIDADE
E UMA
SENSAÇÃO DE
BEM-ESTAR
SOCIAL
ENTREVISTA Jaime Lerner
arquiteto, ex-prefeito de Curitiba
“O PORTO-ALEGRENSE
TEM MUITA IDENTIDADE
COM SUA CIDADE”
Consultor da ONU para assuntos de urbanismo,o
curitibano Jaime Lerner é um dos responsáveis pelo projeto
de revitalização do cais do PortoAlegre e da orla do
Guaíba.Foi na sua gestão que Curitiba ganhou o caráter
sustentável,virando referência quando se fala em cidades
mais humanas.Nesta entrevista,Lerner elogia a relação
dos porto-alegrenses com sua cidade.
Vida – Como PortoAlegre pode se
tornar uma cidade mais humana?
Jaime Lerner – Além das prioridades
naturais,que deveriam ser educação,saúde,
segurança,há três pontos fundamentais
para garantir qualidade de vida para os
moradores de qualquer cidade: mobilidade,
sustentabilidade e sociodiversidade
(coexistência).A mobilidade deve ser
pensada com a cidade,não dá mais para
pensar moradia,trabalho e lazer de forma
solta.Você não pode morar em um lugar
e trabalhar a dezenas de quilômetros dele.
Na questão da sustentabilidade,75% das
emissões estão nas cidades,e a maior parte
vem do carro.Portanto,deve-se usar menos o
carro e morar perto do trabalho.Em relação
à coexistência: se há mais mistura de renda e
funções,você tem colaboração na vizinhança,
um prestando serviço para o outro,há mais
trocas e mais relação de parceria.
JAIME LERNER
Levar atividades lúdicas, como tomar chimarrão, jogar
conversa fora ou até entregar mudas de plantas no espaço
que normalmente apenas se estacionam automóveis é a
proposta do movimento Vaga Viva. A sugestão é levar cadeiras,
almofadas e tapetes para promover momentos de convívio
cultural para quem estiver por ali.
SERENATA ILUMINADA
Centenas de pessoas articuladas pelas redes sociais levaram
velas, lanternas, holofotes e instrumentos musicais para a
Redenção, pedindo melhores condições de iluminação e
segurança no parque. O resultado foi um belo protesto festivo
que, a cada ano, reúne mais gente.
BAMBU – CICLO – TECA
LARGO VIVO
O Largo Vivo pode ser convocado por qualquer um que
deseje ver os espaços públicos da cidade utilizados como áreas
de convívio público e popular. Atividades como piqueniques,
música, malabares e teatro acontecem e são realizadas entre
amigos. Começou no Largo Glênio Peres, no Centro Histórico
de Porto Alegre, e acontece a cada quinzena.
MASSA CRÍTICA
Centenas de ciclistas se reúnem para pedalar e criar
um contraponto à cultura do carro. A bicicleta serve como
um símbolo nesta celebração que ocorre em mais de 300
cidades ao redor do mundo. Organizado pelas redes sociais
e sem líderes formais, o encontro ocorre nas últimas sextasfeiras de cada mês.
Vida – E como PortoAlegre está em
relação às demais cidades do mundo?
Lerner – Qualidade de vida é identidade.
Nesse sentido,o porto-alegrense tem uma
identidade muito forte com sua cidade.
Isso é um caminho importante.Quando
você assume a sua identidade e respeita a
identidade alheia,acontece a solidariedade.
SEPARAR AS FUNÇÕES
DA CIDADE TEM SIDO
TRÁGICO PARA O BRASIL
VAGA VIVA
O músico Klaus Volkmann é um exemplo ambulante de
como a cidade pode ser mais humana. Ele acaba de colocar
em prática a ideia da biblioteca itinerante sobre duas rodas,
que funciona somente mediante trocas. Em sua magrela de
bambu, ele pedala pela cidade espalhando bons exemplos
de cultura e sustentabilidade. Saiba mais sobre o projeto em
http://receitasparasalvaromundo.com.
Vida – Em que o Brasil precisa avançar?
Lerner – Na mobilidade,saindo desse
falso dilema se o melhor é carro ou metrô.A
solução não é nenhum dos dois.Temos que
entender que hoje 60% a 80% das pessoas se
deslocam na superfície.É na superfície que
podemos avançar muito,transformando o
ônibus em metrô.É possível com canaletas
exclusivas,embarque rápido e frequência.
As pessoas não podem esperar mais do
que um ou dois minutos pelo ônibus.Teria
que melhorar a operação,hoje muito falha.
Esperamos 20 anos por meia linha de
metrô,enquanto em três anos pode-se fazer
a rede expressa com metade do custo.O
movimento das ruas indicou que não é só
a tarifa o problema,mas a qualidade dos
transportes.Temos tecnologia,know-how,o
que falta é ação rápida do governo.
Vida – O senhor é responsável por dois
projetos aqui (da orla e do cais do porto).
O que mudará a partir deles?
Lerner – Eles vão garantir maior
identidade para a população com a sua
cidade.Os projetos foram entregues e daqui
a pouco acredito que as obras entrem em
concorrência.Mas deve mudar essa noção de
que a cidade está de costas para o seu rio.O
projeto foi feito para favorecer a convivência
do cidadão com a natureza.
Para resgatar a proximidade afetiva entre as pessoas, o
projeto Vizinhança promove oficinas e intervenções artísticas
em bairros. Lá, se compartilha de tudo: de receitas de bolo a
shows musicais, passando por pinturas de muro e contação de
histórias infantis. Leia mais em projetovizinhanca.wordpress.com.
SHOOT THE SHIT
Um coletivo que realiza intervenções urbanas inusitadas com
objetivo de alertar para problemas de Porto Alegre e despertar
um senso de cidadania e de cuidado com a cidade. Um dos
projetos que mais chamou a atenção foi a colagem de adesivos
brancos nas paradas de ônibus com a pergunta “Que ônibus
passa aqui?”, no qual a população preenche as respostas,
substituindo a ação do governo.
JAIME LERNER
diz que os políticos
pecam porque não
tomam decisões e
deixam a burocracia
tomar conta.
– Parte da desilusão
dos brasileiros está
em relação aos
políticos, devido
às condições de
educação, saúde,
mobilidade. As
pessoas reclamam
porque os
governantes estão
paralisados. Nas
cidades onde os
prefeitos assumem
a decisão para si,
conseguem fazer
mudanças.
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