O documento discute como as cidades podem se tornar mais humanas através do desenvolvimento voltado para as pessoas, com foco em áreas de convivência, transporte público de qualidade e limitar o uso de carros. Algumas cidades como Amsterdã, Barcelona e Curitiba são referências neste movimento. Promover calçadas amplas, transporte público integrado e dar prioridade aos pedestres são passos para tornar as cidades mais acolhedoras.
1. 4 ZERO HORA, SÁBADO,
20 DE JULHO DE 2013
CIDADES + HUMANAS
O DESENVOLVIMENTO VOLTADO PARA AS
PESSOAS É UM CAMINHO SEM VOLTA
PARA OS GRANDES CENTROS URBANOS
Lara Ely
lara.ely@zerohora.com.br
O
s vizinhos não se conhecem
mais.O trânsito está caótico.Os
alimentos vêm de longe.
O intenso e acelerado processo de
urbanização pelo qual a humanidade tem
passado não mudou apenas a paisagem
das cidades. Mudou, essencialmente, o
estilo de vida das pessoas.
Responsável por gerar isolamento
e solidão,a competição que torna os
centros urbanos mais violentos está sendo
combatida por um movimento mundial
em prol de cidades mais“humanas”.
Parece fácil,mas uma mudança como essa
depende de muita vontade política.
Metrópoles como Amsterdã,Barcelona,
Copenhagen,Curitiba,Londres,Nova
York, San Francisco e Paris são referências
deste movimento.Em comum,todas são
dotadas de parques e áreas de convivência,
ciclovias,boas calçadas,transporte público
integrado e de qualidade e uma sensação
de bem-estar social que extrapola a
presença da polícia na rua.
Não há receita pronta para chegar lá.
Mas alguns passos estudados por gente
como o diretor-presidente da rede Embarq
Brasil,Luis Antonio Lindau,ajudam a
encurtar o caminho.
Segundo Lindau,a formatação de cidades
mais humanas passa pela promoção de
áreas de convívio,pois a própria ocupação
dos espaços públicos traz mais segurança.
O segundo ponto seria restringir o uso do
carro,pois deixam os sujeitos isolados e
blindados de sua conexão com a cidade.
O desenvolvimento voltado para as
pessoas é caminho sem volta para as
grandes cidades. Lindau explica que
atrair bons negócios, boas empresas e
boas cabeças para gerar riqueza é um dos
motivos pelos quais o cenário está em
transformação.
No livro New City Life, os urbanistas
Jan Gehl, Lars Gemzoe, Sia Karnaes
e Britt Sternhagen Sondergaard
estabelecem 12 critérios para determinar
como seria o espaço público ideal. Lá
estão pontos como a prioridade para os
A CIVILIDADE
FAZ A DIFERENÇA
Estimular alunos
e ex-alunos em
atividades voltadas
ao cuidado com
o próximo.
JÁ
PENSOU?
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5 BILHÕES
de pessoas – cerca de 60% da
população mundial – deverão
viver em grandes centros urbanos
do planeta até 2030.
pedestres e a preservação de espaços onde os
cidadãos possam caminhar, sentar, conversar
e simplesmente observar a cidade. Parece
simples, não?
Mas não é. Quando se fala em melhores
condições urbanas, um dos primeiros temas
que surgem – e que, inclusive, vem sendo
alvo preferencial dos protestos no Brasil – é o
transporte público.
Para o urbanista e ex-prefeito de Curitiba
Jaime Lerner, a solução seria “metronizar”os
ônibus, investindo em sistemas como os BRTs
integrados aos demais modais.
Nesse contexto, a disputa entre carros,
ônibus, motos e bicicletas é tão grande que o
último a ser lembrado é o pedestre.
Acostumado a conviver com essa exclusão,o
artista espanhol Gonzalo Durán,radicado em
Porto Alegre desde 2007,diz que está cansado de
ser ignorado como parte do trânsito.Ele defende
a ideia de que as leis priorizem o pedestre,
mas observa que não se desenvolvem políticas
públicas para que essa prioridade seja efetiva.
– As inaugurações quase nunca são
de passarelas, sinaleiras de pedestres ou
faixas de segurança. A questão é sempre
fazer caber mais carros nas ruas, mesmo
cortando árvores centenárias – afirma.
Calçadas amplas e preservadas,academias
e piscinas públicas,inclusão dos cadeirantes
e idosos,valorização do comércio de bairro e
informação nas paradas de ônibus são alguns
exemplos que Gonzalo traz de Barcelona e que
gostaria de ver na cidade que escolheu para viver.
ESFORÇOS PARA
MUDAR O CENÁRIO
Se hoje as capitais estão infladas,
imagine em 2030,quando mais de 60%
da população mundial (cerca de 5 bilhões
de pessoas) deverão morar em áreas
urbanas.Por isso,grupos organizados
e pessoas têm atuado para recuperar
a camaradagem entre a vizinhança.
O objetivo é restaurar a proximidade
perdida,reconstruir novas formas de afeto
e reencontrar-se com a própria cidade.
É o que faz a pintora suíça Mona
Caron,que mora na Califórnia (EUA) e
esteve em Porto Alegre em fevereiro,para
o 2º Fórum Mundial das Bicicletas.Ela
colabora para diminuir o tom cinzento
das cidades pintando enormes murais
em espaços públicos.
A arte,aliás,costuma ser boa estratégia
para atrair e unir as pessoas.Um concerto
ao ar livre,um domingo de sol e um bom
chimarrão é a tríade perfeita para levar o
gaúcho aos parques,por exemplo.Quando
as apresentações da Orquestra Sinfônica
de Porto Alegre ocorrem a céu aberto,a
receptividade costuma ser imensa,diz o
diretor artístico da Ospa,Thiago Flores.O
último concerto na Redenção,no final de
abril,reuniu cerca de 20 mil pessoas.
Mais tempo para
os pedestres
Eleito vereador de Porto Alegre com
a bandeira da mobilidade em duas
rodas,Marcelo Sgarbossa (PT-RS) diz
que o crescimento urbano atrapalha
as relações humanas.Autor de projeto
Cidades Mais Humanas,que promove
causas como o respeito à distância de
1,5 metro entre bicicletas e automóveis,
a mudança do tempo de espera na
sinaleira de pedestres para 30 segundos,
ele defende até a redução do limite de
velocidade para carros,motos,ônibus
e caminhões.A intenção,diz,é fazer as
pessoas curtirem mais a viagem:
– A redução da velocidade ajudaria as
pessoas a observarem melhor a cidade.