O documento discute o potencial da gamificação para promover mudanças comportamentais em saúde de forma eficaz. Apesar de a gamificação ser vista como uma abordagem promissora, seu desenho nem sempre leva em conta os princípios da psicologia, especialmente no que se refere à mudança de comportamento e motivação. É necessário integrar melhor esses conhecimentos para que a tecnologia possa auxiliar de forma verdadeiramente eficaz a promoção da saúde.
1. Resumo
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Será a Gamification - utilização de elementos de jogo em contexto de
não jogo - uma forma eficiente de promoção da mudança
comportamental em saúde? Porque tem falhado em tantas situações
em várias áreas de aplicação? Os problemas de saúde devido a causas
comportamentais estão nas prioridades da Organização Mundial de
Saúde. As tecnologias de comunicação móveis e a Internet têm
oferecido um campo privilegiado para respostas a alguns destes
problemas.
A Gamification, por ser percebida como próxima do jogo, é uma via
privilegiada para a promoção de comportamentos saudáveis. Todavia,
nem sempre o desenho destas soluções tecnológicas tem tido em conta
o contributo da Psicologia. É para a resolução deste problema que
vamos tentar dar contributos, de modo a fazer da tecnologia um
verdadeiro e eficiente meio auxiliar para a promoção da saúde e de
hábitos e comportamentos saudáveis.
Referências
Vamos Jogar e Ser mais Saudáveis!
Gamification na saúde para a promoção de hábitos saudáveis
Francisco Miranda Rodrigues e Telmo Mourinho Baptista;
Universidade de Lisboa, Faculdade de Psicologia
Autorregulação
Francisco Miranda Rodrigues e Telmo Mourinho Baptista
Universidade de Lisboa, Faculdade de Psicologia
franciscojmrodrigues@campus.ul.pt; telmob@campus.ul.pt
http://www.psicologia.ulisboa.pt/
Gamification
Como definido por Ahola et al., (2013), gamification é o processo de
aumentar o compromisso e a participação integrando mecânicas de jogo.
De forma geral define-se gamification como uma metodologia criada a
partir dos contributos do design de jogos e da Psicologia,
nomeadamente da Psicologia da Motivação e Comportamental. Assenta
na introdução de mecânicas de jogo e de pensamento de jogo em
situações de não jogo (como no trabalho, no lazer, na promoção da saúde,
entre outras).
A utilização de aplicações com gamification aumenta a motivação
intrínseca dos seus utilizadores. Este efeito acontece pelo aumento da
satisfação, pela percepção visualizada de progresso e feedback imediato
sobre o desempenho relativamente ao objectivos personalizados de modo
a que o utilizador sinta uma elevada performance individual (McGonigal,
2011). Para além disso, segundo a mesma autora, esta utilização de
aplicações com gamification promove o optimismo, pois permite
experimentar sensações de realização ou de esperança de sucesso. Este
mecanismos facilitam a percepção de controlo, autonomia e divertimento
que são centrais nas experiências de flow (Csikszentmihalyi, 2002). Assim,
os incentivos como badges (um badge é um emblema, um símbolo de
uma conquista que a reconhece perante os outros, funcionando como um
incentivo ou reforço), não estão de acordo apenas com a motivação
intrínseca de os coleccionar mas também com a motivação extrínseca de
reconhecimento social.
Aplicações em Saúde
Conclusões e Investigação Futura
Os resultados da utilização destas aplicações e de gamification
demonstram que não basta a sensibilidade ou experiência na construção
destas soluções tecnológicas, sendo necessário um conhecimento
aprofundado dos desenvolvimentos mais importantes da psicologia,
nomeadamente no que concerne aos estudos sobre mudança de
comportamento em saúde, motivação e cognição.
Uma meta-análise recente apresenta resultados promissores e que
apontam para o que poderá ser a melhor combinação de estratégias para
a mudança comportamental: o fornecimento de informação sobre as
consequências do comportamento, tendo em conta a ligação entre esse
comportamento e a saúde com a utilização posterior de pistas que
permitem o desencadear do comportamento. A utilização individualizada
de algumas destas estratégias, como vemos frequentemente em muita
gamification não demonstrou ligação significativa a mudanças
comportamentais (Dusseldorp, van Genugten, van Buuren, Verheijden, &
van Empelen, 2013).
A tecnologia já existe e não é um problema. O problema é desenhá-la de
acordo com as melhores práticas adaptadas à forma como os seres
humanos funcionam, tendo em conta diferenças culturais, demográficas e
educacionais (Alcañiz, Botella, Baños, Zaragoza, & Guixeres, 2009). Os
novos sistemas de informação e plataformas tecnológicas na saúde
poderão ser uma enorme mais valia para a população e potenciar a
mudança de comportamentos. A psicologia fornece o conhecimento e as
ferramentas necessárias para a eficácia destes sistemas na mudanças de
comportamentos conducentes a hábitos mais saudáveis. Com o trabalho
em curso os autores pretendem dar respostas a estas questões.
Introdução
As mudanças comportamentais na área da saúde são elementos
centrais numa política de saúde preventiva. A Organização Mundial de
Saúde, (OMS 2013), recomenda a utilização de técnicas de mudança
comportamental e de desenvolvimento de competências de tomada de
decisão, autoestima e resistência à pressão dos pares como promotoras
de saúde mental. A OMS defende ainda neste plano de acção a
promoção do autocuidado através da utilização de tecnologias
electrónicas e móveis da saúde.
As estratégias utilizadas em gamification são muito semelhantes às
estratégias derivadas da teoria da autorregulação (Cugelman, 2013).
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A motivação e as competências de autorregulação são fundamentais
para a mudança dos hábitos de saúde. Como parte essencial da
autorregulação necessitamos de auto-monitorização de
comportamentos de saúde e das condições sociais e cognitivas para
estes comportamentos se manifestarem. O estabelecimento de
objectivos para orientar as estratégias e os incentivos para auto-motivação
dão suporte a estas práticas saudáveis (Bandura, 2005).
As mais recentes atualizações tecnológicas propiciam um contexto
positivo e muitas oportunidades para potenciar alterações
comportamentais com impacto na saúde. Neste contexto a
gamification permite uma aplicação das estratégias de autorregulação.
Em estudo recente, em que foram analisadas 12 aplicações, mais de 50%
dos participantes afirmaram que descarregariam e usariam as 3 aplicações
melhor classificadas. Estas aplicações foram vistas como comunicando
facilmente com os potenciais utilizadores, providenciando uma assistência
útil com quantidade apropriada de dados monitorizados. Isto contrastou
com outras 5 aplicações que apenas seriam usadas por 30% e uma por
apenas 19%. Defendem os seus autores que isto parece reflectir a situação
corrente no mercado de aplicações, onde um grande número está
disponível mas poucas são utilizadas devido à não utilização de soluções
baseadas no atual conhecimento das ciências do comportamento (Chang,
Kaasinen, & Kaipainen, 2012). Nas figuras 1 a 5 poderemos ver exemplos
de aplicações tecnológicas assentes em mudança de comportamentos em
saúde. A aplicação da figura 5 é na área do controlo da diabetes. As
restantes aplicações estão ligadas aos hábitos de exercício físico.
Algumas doenças de causas comportamentais
Diabetes na população adulta
Crianças com excesso de peso na Europa
Mortes anuais devido ao consumo excessivo de álcool
Mortes por acidente rodoviário
Mortes por SIDA
10%
12,5%
2.5 milhões
1.24 milhões
1.7 milhões
Tabela 1.WHO (2013)
• Ahola, R., Pyky, R., Jämsä, T., Mäntysaari, M., Koskimäki, H., Ikäheimo, T. M., … Korpelainen, R. (2013). Gamified physical
activation of young men--a Multidisciplinary Population-Based Randomized Controlled Trial (MOPO study). BMC Public
Health, 13, 32. doi:10.1186/1471-2458-13-32
• Alcañiz, M., Botella, C., Baños, R. M., Zaragoza, I., & Guixeres, J. (2009). The Intelligent e-Therapy system: a new paradigm
for telepsychology and cybertherapy. British Journal of Guidance & Counselling, 37(3), 287–296.
doi:10.1080/03069880902957015
• Bandura, A. (2005). The Primacy of Self-Regulation in Health Promotion. Applied Psychology, 54(2), 245–254.
doi:10.1111/j.1464-0597.2005.00208.x
• Chang, T., Kaasinen, E., & Kaipainen, K. (2012). What Influences Users ’ Decisions to Take Apps into Use ? A Framework for
Evaluating Persuasive and Engaging Design in Mobile Apps for Well-Being. 11th International Conference on Mobile and
Ubiquitous Multimedia.
• Csikszentmihalyi, M. (2002). Flow: The Classic Work on how to Achieve Happiness. Rider.
• Cugelman, B. (2013). Gamification: What It Is and Why It Matters to Digital Health Behavior Change Developers. JMIR
Serious Games, 1(1), e3. doi:10.2196/games.3139
• Dusseldorp, E., van Genugten, L., van Buuren, S., Verheijden, M. W., & van Empelen, P. (2013). Combinations of
Techniques That Effectively Change Health Behavior: Evidence From Meta-CART Analysis. Health Psychology : Official
Journal of the Division of Health Psychology, American Psychological Association. doi:10.1037/hea0000018
• McGonigal, J. (2011). Reality Is Broken: Why Games Make Us Better and How They Can Change the World. New York (Vol.
22, p. 400). New York: Penguin Books.
• WHO. (2013). Mental Health Action Plan 2013-2020.
• WHO. (2012). Health and Health Behaviour among Young People hb.
• WHO. (2013). World Health Statistics 2013.
Fig.1 Fitbit
Fig.2 RunKeeper
Fig.3 RunKeeper:
Exemplo de feedback
sobre desempenho
Fig.4
RunKeeper:
Exemplo de 3
Badges
associados a
objectivo
alcançado
Fig.5 MySugr
Junior: Exemplo
de monitorização
e aviso para
acção