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Literatura e sociedade no Facebook:
Um projeto didático-pedagógico de agenciamento
do saber literário no Ensino Médio
da palavra alheia dos outros a minha palavra
DIEGO PEREIRA
DIEGO PEREIRA
Literatura e sociedade no Facebook:
dapalavraalheiadosoutrosaminhapalavra
Um projeto didático-pedagógico de agenciamento
do saber literário no Ensino Médio
PUBLICAÇÃO AUTÔNOMA
PEREIRA, Diego
Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros a mi-
nha palavra: projeto didático-pedagógico de agenciamento do saber literá-
rio no Ensino Médio: manual do professor. Belo Horizonte, 2017. Obra
originalmente apresentada como parte do trabalho de conclusão de curso
de especialização, Universidade Federal de Minas Gerais, 2017.
Capa: Diego Pereira
(Imagem: Gustav Klimt, The tree of life, 1905)
DIREITOS RESERVADOS:
 Diego Pereira
Caixa Postal 6549
13084-970 – Campinas, SP
E-mail: prof.diegopereira@hotmail.com
JUNHO 2017
Sertão Central e de Crateús
Que a poesia seja
a arte de dar nome
a todos os bois:
aos pesados novilhos
de fazendeiro-prefeito
e às duas cabrinhas
do morador submisso
e por isso chamado
de morador perfeito;
que a poesia seja
a arte de dar fome
de justiça
a todos os homens.
Alberto da Cunha Melo
SUMÁRIO
CARTA AO PROFESSOR ............................................................................ 07
PARTE PRIMEIRA: O PROJETO .............................................................. 09
CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM ............................................................................. 09
CONCEPÇÃO DE LITERATURA ............................................................................. 10
CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM .................................................................... 12
O Facebook (e seus recursos) enquanto ambiente e/ou ferramenta digital de apren-
dizagem ............................................................................................................................... 13
A imprescindibilidade das tecnologias digitais de informação e comunicação ......... 14
CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO ............................................................................... 15
PARTE SEGUNDA: A CASA ....................................................................... 19
PROJETO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE AGENCIAMENTO DO SABER
LITERÁRIO COMENTADO ....................................................................................... 19
REFERÊNCIAS ........................................................................................... 29
ANEXOS ....................................................................................................... 33
ANEXO A – De Marisa Lajolo, “Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se
outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é
literatura?” .......................................................................................................................... 33
ANEXO B – De Marisa Lajolo, “Afinal, para que serve a literatura?” ..................... 36
ANEXO C – de Lima Barreto, “Providências governamentais” (1921); de Atila Ro-
que, “Direitos humanos são inegociáveis” (2016); de Graciliano Ramos, “Cadeia”
(fragmento) (1938); de Alexandre Beck, uma das tiras “Armandinho” (2016) – todos
eles não por acaso reunidos sob o título “O que pode a (nossa) palavra, ao longo de
34.935 dias?” ...................................................................................................................... 37
ANEXO D – De Monteiro Lobato, “Vidinha ociosa” e “Um homem de consciên-
cia” ...................................................................................................................................... 42
ANEXO E – De Lima Barreto, “Os bruzundangas” (fragmento) ............................ 44
7
CARTA AO PROFESSOR
Professor (a);
Este manual, suplementar ao projeto didático-pedagógico denominado “Literatura e sociedade no
Facebook: da palavra alheia dos outros a minha palavra”, orienta a sua execução e/ou aperfeiçoamento,
sempre condicionando essa tarefa à autonomia docente.
De modo que o seu maior objetivo é o de indicar, interpretar, propor a formação do leitor literário
no Ensino Médio, sob uma determinada perspectiva teórico-metodológica, sem, com isso, engessar percur-
sos, esterilizar processos.
Alguns princípios, no entanto, são inegociáveis: é preciso acreditar na leitura literária e, por que não,
na escrita, como ferramentas, apetrechos, úteis à interpretação crítica de si e do mundo, à sua eventual
transformação, essa arte ou ofício fundamentalmente humano; e, não resistir ao próprio tempo, em que as
tecnologias digitais de informação e comunicação já apontam para um novo paradigma de (re) construção
do conhecimento, um novo éthos.
Daí a importância em se dedicar atenção especial à parte primeira, que trata da fundação e laje desse
empreendimento. Compreender qual base o legitima, autoriza; serve-lhe de causa, fundo, motivo, razão. A
parte segunda constitui as demais etapas da obra, reconfiguráveis, porque, assim, uma família constrói o seu
lar: dando-lhe forma, feitio; desenhando-o, esculpindo-o; sem nunca o terminar – veja só.
O autor.
8
9
PARTE PRIMEIRA: O PROJETO
CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM
A postura educacional assumida por um professor de língua materna é definida, em
grande parte, pela concepção de linguagem e, portanto, corrente de estudos linguísticos, das
quais se aproximam suas aulas. E precisa por ele ser claramente assimilada, por interferir na
configuração do percurso educativo dos alunos, garantindo-lhes, ou não, determinados direitos
de aprendizagem. Geraldi (2006 [1981]), além de permitir essa constatação, afirma serem três
as principais concepções (linguagem enquanto expressão do pensamento, instrumento de co-
municação e forma de interação), às quais corresponderiam, de igual modo, três correntes dos
estudos linguísticos (respectivamente, gramática tradicional; estruturalismo e transformaciona-
lismo; e, linguística da enunciação).
Conforme já apontava Bakhtin (2011 [1978]), trata-se de reconhecer a linguagem a par-
tir das funções que a linguística do século XIX lhe atribuía (linguagem para formação ou ex-
pressão do pensamento independentemente da comunicação discursiva) ou rompê-las (lingua-
gem para comunicação discursiva, em virtude da qual forma-se, expressa-se, o pensamento).
Uma escolha que, analisada sob a perspectiva de Geraldi (Ibid., p. 41, 45) a respeito do lugar
das relações sociais e a construção dos sujeitos nessa ou naquela concepção de linguagem, pode
representar um retrocesso ou um avanço para o ensino de língua portuguesa, que já não requer
“uma mudança nas técnicas e nos métodos empregados em sala de aula”, mas, um “‘novo
conteúdo’ de ensino”. Pois, como adverte:
“A linguagem é a expressão do pensamento:
[...]. Se concebemos a linguagem como
tal, somos levados a afirmações – cor-
rentes – de que pessoas que não con-
seguem se expressar não pensam.
A linguagem é instrumento de comunicação:
essa concepção [...] vê a língua como
código [...] capaz de transmitir ao re-
ceptor certa mensagem. [...].
A linguagem é uma forma de interação: mais
do que possibilitar uma transmissão de
informações de um emissor a um re-
ceptor, a linguagem é vista como um
lugar de interação humana. Por meio
dela, [...] o falante age sobre o ouvinte,
constituindo compromissos e vínculos
que não preexistiam à fala” (GE-
RALDI, 2006 [1981], p. 41).
“Propunham-se e ainda se propõem
variações um tanto diferentes das fun-
ções da linguagem, mas permanece ca-
racterístico, senão o pleno desconheci-
mento, ao menos a subestimação da
função comunicativa da linguagem; a
linguagem é considerada do ponto de
vista do falante, como que de um fa-
lante sem a relação necessária com outros
participantes da comunicação discur-
siva. Se era levado em conta o papel do
outro, era apenas como papel de ou-
vinte que apenas compreende passiva-
mente o falante” (BAKHTIN, 2011
[1978], p. 270).
10
[...] uma coisa é saber a língua, isto é, dominar as habilidades de uso da língua em situações concretas de interação,
entendendo e produzindo enunciados, percebendo as diferenças entre uma forma de expressão e outra. Outra, é saber
analisar uma língua dominando conceitos e metalinguagens a partir dos quais se fala sobre a língua, se apresentam suas
características estruturais e de uso.
Entre esses dois tipos de atividades, é preciso optar pelo predomínio de um sobre o outro. [...]. (Ibid., p. 45-46).
Aqui, é importante ressalvar, a concepção de linguagem explorada reconhece a língua como forma de interação hu-
mana, sem limitá-la, portanto, às funções de expressão do pensamento e instrumento de comunicação; ao que se filia à
linguística da enunciação, enquanto corrente dos estudos linguísticos (GERALDI, 2006 [1981], p. 41). Razão pela qual, dentre
os postulados de Bakhtin sobre o enunciado como unidade de comunicação discursiva, estes servirão diretamente ao propó-
sito do trabalho ora defendido: a) o do enunciado, na qualidade de unidade real (não convencional) de comunicação discur-
siva viva (forma típica das enunciações individuais); b) o do discurso, processo complexo e amplamente ativo da comunica-
ção; c) e, o da percepção / compreensão plena real do enunciado / discurso, comportamento ativamente responsivo do
sujeito ouvinte / falante ou leitor / escritor (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 271).
CONCEPÇÃO DE LITERATURA
O texto literário, cujo processo de produção e recepção se deseja investigar síncrona e diacronicamente nas redes
sociais virtuais, é aqui tomado como um discurso que reflete seus actantes e o ambiente sócio-histórico-cultural de sua
inscrição e, por isto, deve, diante destes, ser tensionado, sob o propósito de vivificação da literatura, em um projeto de
amadurecimento sensível dos sujeitos, posteriormente conscientes da importância de sua dedicação ao exercício leitor /
escritor afim. Note que não se trata de levar os alunos ao reconhecimento dos gêneros literários, quaisquer que sejam, a
partir, tão só, de seus aspectos estilísticos, temáticos e composicionais, relativamente estáveis; mas, à compreensão de seu
“[...] [Chama-se] de literatura, da ma-
neira mais ampla possível, todas as cri-
ações de toque poético, ficcional ou
dramático em todos os níveis de uma
sociedade, em todos os tipos de cul-
tura, desde o que chamamos de fol-
clore, lenda, chiste, até as formas mais
complexas e difíceis da produção es-
crita das grandes civilizações” (CAN-
DIDO, 2011 [1988], p. 176).
11
processo de produção, em virtude da função, ou funções, e das condições de comunicação discursiva incorporadas por este
ou aquele gênero neste ou naquele campo da atividade humana.
Até mesmo porque, conforme salienta Bakhtin (2011 [1978], p. 268, 269, 272), são eles, os gêneros literários (de
complexa comunicação cultural), os que melhor transmitem a história da sociedade e da linguagem, em sua complexidade;
permitindo a superação das concepções simplificadas do fluxo discursivo, porque precisamente concebidos para a compre-
ensão ativamente responsiva, ou portadores de “poderes imateriais, não avaliáveis a peso, mas que de alguma forma pesam”
(ECO, 2003 [2000], p. 9), admitindo, sempre, diferentes funções na preparação dos sujeitos para uma transformação final e
de caráter universal (BLOOM, 2011 [2000], p. 17).
Não por acaso, todas as atividades inicialmente planejadas para o desdobramento deste projeto requerem o exercício
metalinguístico por parte do seu público-alvo sobre o fluxo conversacional do qual participem / venham a participar no
Facebook, quando alimentado pela experiência de produção / recepção literária. Elas pretendem, por analogia à índole indi-
vidual-contextual do emprego das palavras na comunicação discursiva estabelecida por Bakhtin (2011 [1978]), favorecer ao
aluno, em seu processo de formação enquanto leitor / escritor literário, o reconhecimento da literatura, sob os três aspectos
a partir dos quais ela existe para ele, correspondendo o terceiro ao estágio de leitura aqui pretendido:
como palavra da língua neutra e não pertencente a ninguém; como palavra alheia dos outros, cheia de ecos de outros
enunciados; e, por último, como a minha palavra, porque, um vez que eu opero com ela em uma situação determinada,
com uma intenção discursiva determinada, ela já está compenetrada da minha expressão. (BAKHTIN, 2011 [1978], p.
294).
Assim, se por ocasião da inferência, em um dado texto literário, dos objetivos de seu produtor e a delimitação do
público alvo; do estabelecimento das relações entre o mesmo e o momento de sua produção, em contraste com outros textos;
“[...] eu [não] seria idealista a ponto de
pensar que às imensas multidões, às
quais faltam pão e remédios, a litera-
tura poderia trazer alívio. Mas [...] [as
pessoas] se transformam no que são
[...] porque [...] [incluídas / excluídas
no /do] universo do livro e dos lugares
onde, através da educação e da discus-
são, poderiam chegar até [...] [elas] os
ecos de um mundo de valores que
chega e remete a livros” (ECO, 2003
[2000], p. 11-12).
“[...]. O mundo da literatura é um uni-
verso no qual é possível fazer testes
para estabelecer se um leitor tem o sen-
tido da realidade ou é presa de suas
próprias alucinações” (ECO, 2003
[2000], p. 15).
12
e/ou, de sua análise, endógena e exógena, face ao éthos inaugurado pelas Tecnologias Digitais da Informação e da Comuni-
cação (habilidades cujo desenvolvimento é recomendado pela Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e suas Tecnolo-
gias para o ENEM [2009]), as atividades assumidas neste projeto ensejam a experiência discursiva individual, que:
se forma e se desenvolve em uma interação constante e contínua com os enunciados individuais dos outros. [...]. Essas
palavras dos outros trazem consigo a sua expressão, o seu tom valorativo que assimilamos, reelaboramos, e reacentua-
mos. (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 294).
CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM
Todo o projeto didático-pedagógico está fundado em uma perspectiva dialógica da aprendizagem, cuja suplementa-
ção pela colaborativa, de matriz vygotskyana, faz-se necessária, mas, sob a reinterpretação de ambas, para sua combinação.
Já que o ensino focado na experiência humana, de onde se depreende a língua e a literatura, tem-la como processo e/ou
produto discursivo/dialógico, cuja apropriação é dinâmica/evolutiva e dá-se na realização de atividades socialmente signifi-
cativas, através das quais os agentes, em relação com a realidade, constroem suas funções psicológicas superiores (AIRES,
2003, p. 24-25). O que significa, por exemplo, vincular o desenvolvimento do homem “às interações entre o sujeito e a
sociedade, à cultura e à sua história de vida, além das oportunidades e situações de aprendizagem” (DAMASCENO; FER-
NANDES; VERONEZ, 2005, p. 538).
Da primeira à última atividade realizada, os alunos, e as suas identidades socioculturais, estarão em um processo de
interação dialógico-colaborativo, mediado pelos sistemas de significação por eles manipulados na rede, sob uma proposta de
aprendizagem não mais ancorada em modelos de comunicação unilateral (PALLOFF; PRATT, 2003 apud AIRES, 2003, p.
28). O professor facilitará esse empreendimento, procurando dinamizar a realização de tais tarefas, sem tolher o caráter
coletivo da construção do significado que reveste a referida proposta de aprendizagem.
“[...] há no estudo da obra literária um
momento analítico [...] que precisa dei-
xar em suspenso problemas relativos
ao autor, ao valor, à atuação psíquica e
social, a fim de reforçar uma concen-
tração necessária na obra como objeto
de conhecimento; e há um momento
crítico, que indaga sobre a validade da
obra e sua função como síntese e pro-
jeção da experiência humana” (CAN-
DIDO, 1972, p. 804).
13
Daí a adoção do Facebook (página inicial, perfil, grupos e páginas) enquanto ambiente digital de ensino e aprendiza-
gem e, inevitavelmente, a de alguns de seus recursos e/ou ferramentas (documentos, bate-papo, tarefas, eventos, discussões,
comentários / avaliação, mensagens, vídeos e outros). A qual também se justifica em virtude de uma das constatações de
Malini (2014) em sua pesquisa sobre a contribuição dos fluxos conversacionais das redes sociais à construção de laços e
debate público entre os autores de literatura brasileira e o seu público; neste caso, a de que os seus usuários, em especial os
jovens, têm reputado, com frequência, em atividades de participação e engajamento social, autores e obras literárias (fenô-
meno de hipermidiatização da literatura, responsável pela demarcação de novos públicos, espaços de circulação e mediado-
res).
O Facebook (e seus recursos) enquanto
ambiente e/ou ferramenta digital de aprendizagem
Anunciado pela companhia correspondente como um site a partir do qual as pessoas, após cadastradas, conectam-se
umas às outras para a publicação, fornecimento ou compartilhamento daquilo que desejam (conteúdo de natureza e formato
diversos), o Facebook constitui uma rede social virtual que abrange recursos e serviços variados úteis à personalização de tal
uso, dentre os quais estes são fundamentais a sua assimilação, de acordo com Baird, Foog e Phillips (2011):
• Página inicial: exclusivamente do usuário, apresenta um fluxo contínuo de atualizações de seus amigos, páginas
por ele curtidas ou grupos aos quais pertence; espécie de painel de inicialização;
• Perfil: diferente da página inicial, reúne as informações pessoais do usuário declaradas no ato de sua inscrição e
atualizadas posteriormente, além dos conteúdos por ele compartilhados, de acesso irrestrito, ou não, aos demais;
• Grupos: espaço de interação e compartilhamento de conteúdo criado por um grupo de usuários, de acesso e
utilização condicionados à configuração de privacidade; e,
14
• Páginas: espaço público de interação com um grupo específico de usuários, para o compartilhamento de conte-
údo, por parte do administrador, dos demais membros elevados à categoria de editores e/ou dos eventuais visi-
tantes, cujas atualizações são automaticamente comunicadas àqueles que o curtem.
No guia que fornecem aos professores para a transformação dos desafios do Facebook em oportunidades de ensino
e de aprendizagem, a propósito, Baird, Foog e Phillips (2011) indicam estratégias subsidiárias da criação de uma política de
mídia social útil aos objetivos educacionais das instituições de ensino, ao estabelecimento do manuseio crítico-reflexivo da
plataforma (diretrizes de segurança e privacidade) e à promoção da cidadania digital; sugerindo a adoção dos estilos de apren-
dizagem móvel (interativa, centrada no aluno, autêntica, colaborativa e sob demanda), com a adequação de seus recursos a
esse contexto.
O que, em um empreendimento didático-pedagógico, significa, por exemplo, inscrever a interação entre professor e
aluno em atividades como a criação de grupos para o ensino e a aprendizagem colaborativos (professor/alunos, alunos/alu-
nos, alunos/professor), ou qualquer outra demanda educativa, com a formulação e a resposta de questões de estudo; e, a de
páginas, para a ampliação do ensino e da aprendizagem além da sala de aula, através do compartilhamento de conteúdo
complementar. De modo que a consulta a outros tutoriais, quanto ao uso genérico da referida rede social, justificar-se-ia, ao
professor e ao aluno, em caso de introdução ou aperfeiçoamento
A imprescindibilidade das tecnologias digitais
de informação e comunicação
A despeito do que já se afirmou sobre as potencialidades educativas do Facebook, especificamente em um projeto
didático-pedagógico como esse, há de se reconhecer a imprescindibilidade da utilização do computador e da internet en-
quanto tecnologias digitais de informação e comunicação, que, por representarem o paradigma sócio-econômico-tecnológico
Tutoriais recomendados quanto
ao uso genérico do Facebook*
Autoria Título
CASTRO
(2011)
Como funci-
ona o Face-
book?
UOL (2012)
Manual do Fa-
cebook: o que
você precisa
saber para usar
a rede social
*Nesse sentido, destaca-se, também,
o “Guia essencial: Facebook”, que,
publicado em 2015 pela editora bra-
sileira On Line, promote “198 dicas
para dominar a rede social”, ao longo
de suas 145 páginas, subdividas nas
seções: “Seu perfil”, “Fazendo ami-
gos”, “Grupos & eventos”, “Uso co-
mercial”, “Apps do Facebook”, “Fa-
cebook móvel”, “Mais apps”. Atual-
mente, ele é comercializado sob o
formato de e-book, na Loja Kindle e
no Google Livros.
15
da pós-modernidade, no qual um novo éthos, não necessariamente próximo de uma cultura participativa, surge, precisam
contribuir à problematização deste em suas diferentes configurações. (KNOBEL; LANKSHEAR, 2012).
Ainda no que se refere a esse paradigma, Lipovetsky (2004 apud BARBOSA; ROJO, 2015, p. 116) propõe tomá-lo
como de radicalização da modernidade, alcunhando o conceito de hipermodernidade, pois, como justificam Barbosa e Rojo
(Ibid., p. 117-120), os princípios da modernidade, a exemplo da “racionalidade técnica ou desenvolvimento tecnológico-
científico, economia de mercado, valorização da democracia e extensão da lógica individualista”, agora se renovam/desdo-
bram continuamente, desencadeando fenômenos como o da hipercomplexidade (lógica paradoxal), hiperconsumo (lógica
hedonista) e hiperindividualismo (lógica narcisista) que, associados ao das TDICs, naturalmente implementam a cultura da
convergência, mas, não a cultura participativa. Razão pela qual, “no contexto da hipermodernidade, está em jogo a dimensão
de uma formação pautada pela ética da responsabilidade (pelo outro)” (Ibid., p. 131).
Desse modo, além de contemplar os multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2009), por tencionar o reconheci-
mento das múltiplas culturas e das múltiplas linguagens coexistentes no Facebook, ainda que sob o recorte do discurso
literário; este projeto abrange os novos letramentos (KNOBEL; LANKSHEAR, 2012), por incitar uma reflexão sobre a
importância de uma cultura mais responsiva às necessidades e satisfações humanas, favorecendo sua instauração.
CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO
A avaliação que se pretende instaurar nas / das situações de ensino e de aprendizagem propostas no presente projeto
didático-pedagógico, em virtude de seu objetivo geral, distancia-se daquela comum às escolas nos anos 70 e 80 do século
XX. Compromete-se, antes, com o desenvolvimento de habilidades e competências por parte dos alunos, sob uma perspec-
tiva formativa e não classificatória, já disseminada, inclusive, entre os professores, sobretudo pelo modo como se realiza,
Entende-se por éthos a tendência
para se pensar, agir e organizar a pró-
pria vida a partir dos modos acentu-
ados pelo paradigma ao qual se vin-
cula. Em se tratando do paradigma
sócio-econômico-tecnológico da
pós-modernidade, o éthos a ele cor-
respondente é marcado pelos aspec-
tos da multiplicidade, descentraliza-
ção, dispersão / modulação, aber-
tura / ilimitabilidade, dinamismo /
fluidez / flexibilidade, não-lineari-
dade, colaboração / coletividade.
16
neste caso, contínua e formalmente. Mas, para a incorporação e reconfiguração das relações estabelecidas entre o conheci-
mento e a realidade; para a aproximação real dos sujeitos com a vida social, em que pese a existência humana digna. Sua
concepção é a de prática social e escolar: supõe a adoção de instrumentos elaborados sob os princípios da complexificação
e da heterogeneidade da realidade, menos quantificável do que qualificável (CATANI; GALLEGO, 2009).
Na perspectiva de Luckesi (1994[2009]), trata-se de inscrevê-la nas aspirações socializantes da humanidade, que, in-
dependentemente de serem traduzidas em um modelo social e em uma concepção teórico-prática de educação autoritários
ou democráticos, devem servir, por contradição ou congruidade a sua própria natureza, à transformação social, operada na
formação e capacitação do aluno para a autonomia intelectual, mas, eticamente regulada. De resgatar o seu caráter diagnós-
tico, sem a abdicação do rigor técnico e científico necessário à elaboração de instrumentos mais objetivos na tomada de
decisão que espera possibilitar ao professor e ao aluno, quanto ao (re) encaminhamento do processo de ensino e de apren-
dizagem. De utilizá-la na compreensão da “dinâmica da assimilação ativa dos conteúdos socioculturais e do desenvolvimento
das capacidades cognoscitivas do educando”, cujos aspectos constitutivos são três:
1 Assimilação receptiva (recepção atenta e inteligível) de conhecimentos (saber já elaborado, interpretações já produzidas
sobre a realidade), metodologias (concepção segundo a qual a realidade é abordada) visões de mundo (visões valorativas);
2 Exercitação (internalização reprodutiva) dos conhecimentos e metodologias, construção das capacidades;
3 Inventividade (ação criativa, que soma a assimilação dos conteúdos socioculturais e a intuição, o insight, a espontanei-
dade, o risco). (Ibid., p.136-142).
De certo modo, alude-se à concepção de avaliação qualitativa tal como a concebe Demo (1987 [1991], p. 24), para
quem, nela, “não vale o maior, mas o melhor; não o extenso, mas o intenso; não o violento, mas o envolvente; não a pressão,
mas a impregnação”; razão pela qual justifica-se o seu “estilo cultural, mais que tecnológico; artístico, mais que produtivo;
Por que uma autonomia etica-
mente regulada?
Quando impelido à (re) construção
da realidade, através de sua (re) apro-
priação (o que a escola, inclusive,
busca, a ele, oportunizar, embora,
com um certo alcance, é claro); o su-
jeito não deve, para tal, basear-se,
apenas, em suas determinações indi-
viduais, singulares, mas, de igual
modo, nas determinações mais uni-
versais, macroestruturais, articu-
lando-as, todas, porque, a despeito
de sua moral, às vezes, controversa,
é preciso agir eticamente, conforme
adverte Casali (2001, p. 118-123),
para quem, enquanto “a moral [...]
seria um fenômeno de ordem parcial
[,] [...] a ética [...] [,] uma reflexão crí-
tica sobre a moralidade [...] [,] um
conjunto de princípios e disposições
[...] para [...] balizar as ações huma-
nas”.
17
lúdico, mais que eficiente; sábio, mais que científico”, sem a exclusão, é claro, dos aspectos secundarizados nessa configura-
ção, se considerada a utilidade relativa dos mesmos à compreensão da realidade nos moldes da avaliação quantitativa, não
dispensada de todo. Neste caso,
O que está em jogo [...] é principalmente a qualidade política, ou seja, a arte da comunidade de se autogerir, a criatividade
cultural que demonstra em sua história e espera para o futuro, a capacidade de inventar seu espaço próprio, forjando
sua autodefinição, sua autodeterminação, sua autopromoção, dentro dos condicionamentos objetivos. (Ibid., p. 28).
Trata-se da avaliação enquanto iniciativa interna, factível, em profundidade, porque desenvolvida sob a forma de
auto-expressão ou de autodiagnóstico da comunidade, na análise do fenômeno participativo (DEMO, 1987 [1991], p. 30);
podendo, a escola, dela se apropriar, para a sistematização e/ou o monitoramento da ação pedagógica, embora esse desloca-
mento teórico imponha, como quaisquer outros, restrições de ordem metodológica. A este projeto didático, ela serve, espe-
cialmente, pela proposição dos três níveis de procedimentos avaliativos da participação qualitativa:
a) conversar, bater papo, estar juntos – coincide com a necessidade de convivência;
b) participar da vida comunitária – coincide com a necessidade de vivência;
c) assumir o projeto político da comunidade – coincide com a necessidade de identificação ideológica. (Ibid., p. 32).
Assim, sob uma perspectiva dialógica, colaborativa e mediadora de avaliação, recomenda-se a adoção de uma varie-
dade de instrumentos e critérios, capaz de contemplar as dimensões conceitual, procedimental e atitudinal através dos quais
os conteúdos não por acaso se (re) constroem; e que, a exemplo dos sugeridos abaixo, os quais, a propósito, somente no
projeto serão pormenorizados, mostrem-se reconfiguráveis, na seleção, ordenação e articulação de seus aspectos constituti-
vos, até mesmo em virtude da eventual escolha, por parte do professor, de outros princípios teóricos, de expressão pedagó-
gica, psicológicas e/ou linguística:
18
Conteúdo Avaliação*
Dimensão Item Instrumento Critério
Atitudinal,procedimentale/ouconceitual
Participação
qualitativa
Enquete
Variedade do tipo de necessidade participativa experienciado: de convivên-
cia, de vivência e/ou de identificação ideológica (DEMO, 1987 [1991], p.
32).
Cooperação Observação
Grau de interação e participação em discussões e diálogos, analisado pela
quantidade e qualidade das mensagens trocadas [nível da comunicação];
contribuição, analisado pela quantidade e pela qualidade de contribuições na
construção de um produto coletivo e pela construção / inferência sobre as
contribuições de outros membros do grupo [nível da construção coletiva];
concentração e organização, analisado pela presença da liderança, pelo en-
volvimento com a definição do processo e pelo cumprimento das tarefas
[nível da coordenação]; e, do entendimento do processo, analisado pelo
entendimento da tarefa e suas relações [nível da percepção] (BORGES;
SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p. 260).
(Re) cons-
trução do
conheci-
mento em
face dos
conteúdos
conceituais
elencados
Pesquisa
No âmbito do conteúdo: atendimento à proposta, significância da contribui-
ção, profundidade na abordagem, relevância das referências selecionadas
etc.; e, no âmbito da estrutura, organicidade, clareza da linguagem, configu-
ração estética etc. (ALMEIDA; OKADA, 2006, p. 278).
Debate
Tipos de mensagem – em uma escala, da de menor à de maior valor: men-
sagens de administração (tratam de assuntos de administração do curso e/ou
de problemas pessoais), vazias (mensagens sem conteúdo), com pouca con-
tribuição (apresentam ponto de vista relevante, mas sobre assunto correlato
ao tema em debate e que não geram respostas e/ou complementações), com
muita contribuição (discutem o tema em debate, apresentam pontos de vista
relevantes e incentivam o debate, gerando outras mensagens como resposta
ou como complementação) e de coordenação (mensagens de membro do
grupo que espontaneamente, ou indicado pelos demais membros, toma o
encargo de ajudar na divisão de tarefas, no cumprimento dos prazos e, em
alguns casos, na conclusão da tarefa) (BORGES; SANTORO; SANTOS,
2004 apud SANTOS, 2006, p. 261).
Relatório
analítico e
outras ativi-
dades escritas
Realização, pertinência ou adequação aos objetivos educacionais estabeleci-
dos; além de consistência, clareza e concisão.
*Realização preferencialmente no ambiente virtual de aprendizagem selecionado
19
PARTE SEGUNDA: A CASA
PROJETO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE AGENCIAMENTO DO SABER LITERÁRIO
Tema:
• Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros a minha palavra.
Público-alvo:
• Alunos do Ensino Médio optantes por sua matrícula no Ensino Médio Inovador, especificamente em algum com-
ponente curricular que, oferecido sob o formato de oficina, ou qualquer outro tão flexível quanto, permita a articu-
lação de atividades de leitura e letramento literário às de comunicação, cultura digital, uso de mídias e tecnologias.
Esses dois tipos de atividades, de leitura e letramento literário e de comunicação, cultura
digital, uso de mídias e tecnologias correspondem a dois macrocampos apontados pelo Pro-
grama Ensino Médio Inovador (ProEMI) enquanto eixos de integração curricular, ou seja,
campos de “ação pedagógico-curricular no qual se desenvolvem atividades interativas, inte-
gradas e integradoras dos conhecimentos e saberes, dos tempos, dos espaços e dos sujeitos
envolvidos com a ação educacional” (BRASIL, 2014, p. 8): “Leitura e Letramento” (de
oferta obrigatória) e “Comunicação, Cultura Digital e Uso de Mídias” (de oferta opcional).
Por isso, devem integrar o Projeto de Redesenho Curricular (PRC), cuja elaboração, anual e
sob responsabilidade das escolas aderentes ao ProEMI, equivale à proposição de ações di-
dático-pedagógicas, nessa perspectiva dos macrocampos, devidamente descritas / detalha-
das, com a indicação das áreas de conhecimento e dos componentes curriculares envolvidos.
Entretanto, este projeto, sobretudo pelos conteúdos e objetivos estabelecidos, pode ser
adaptado para execução em outros formatos de ações didático-pedagógicas, como “discipli-
nas optativas, [...] clubes de interesse, seminários integrados, grupos de pesquisa, trabalhos
de campo e demais ações interdisciplinares” (Ibid., p. 6); e, inclusive, vale a ressalva, em
disciplinas obrigatórias, como a de “Língua Portuguesa e Literatura Brasileira”, comum às
três séries do curso. Neste último caso, o professor, de uma escola não necessariamente
aderente ao ProEMI, optaria por sua execução no momento que lhe aprouvesse, redefi-
nindo, é claro, algumas de suas circunstâncias.
20
Período e carga horária (semanal / total):
• Ao longo de um bimestre ou uma unidade didática, em atividades curriculares de, aproximadamente, 5 h/a semanais,
perfazendo, ao final, 50 h/a.
Objetivo geral:
• Favorecer a investigação do discurso literário hoje (re) produzido nas redes sociais virtuais, a exemplo do Facebook,
bem como a dos sistemas de ideias e das relações sociais a ele coexistentes, em um trabalho que, de detecção das
influências mútuas entre texto literário e o ambiente sócio-histórico-cultural de sua inscrição, não se limite a um
estudo da história da literatura, mas, agencie o amadurecimento sensível dos leitores ora destacados, proporcionando-
lhes o hábito da leitura literária significada e, eventualmente, o da produção.
Objetivo (s) específico (s):
• Subsidiar o desenvolvimento e/ou no aperfeiçoamento de cinco habilidades, vinculadas a algumas das competências
estabelecidas na Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias para o ENEM (2009):
a) inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedi-
mentos argumentativos utilizados;
b) estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico,
social e político;
c) analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e precon-
ceitos;
d) relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento
que elas produzem; e,
21
e) reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e
informação.
Conteúdos:
• Literatura, internet (redes sociais virtuais) e a formação do homem;
• A atualidade e o passado imediato do texto literário, quanto aos sentidos culturais de sua inscrição nas atividades
produtora e/ou receptora;
• O necessário diálogo entre textos literários de uma mesma época ou de épocas diferentes, ou entre os sentidos cul-
turais que lhes atribuem as atividades produtora e/ou receptora, para a superação do seu fechamento, de sua unila-
teralidade;
• O debate público da literatura brasileira em redes sociais virtuais como o Facebook;
• Literatura e engajamento.
Recursos:
• Facebook (página inicial, perfil, grupos e páginas) enquanto ambiente digital de ensino e aprendizagem; alguns de
seus recursos e/ou ferramentas (documentos, bate-papo, tarefas, eventos, discussões, comentários / avaliação, men-
sagens, vídeos e outros); e, fundamentalmente, ambientes equipados com computadores (laboratório de informática,
por exemplo), para o desenvolvimento presencial das atividades didático-pedagógicas propostas.
Implementação:
Espera-se que os actantes não en-
frentem maiores dificuldades em re-
alizar no Facebook as atividades pro-
postas, quanto à manipulação do
ambiente e das ferramentas arrola-
dos, por já comporem as estatísticas
do uso massivo dessa rede social vir-
tual, estando familiarizados com as
tecnologias digitais de informação e
comunicação, além de atraídos pela
oficina subsidiário do presente pro-
jeto didático-pedagógico; ou que, di-
ante do oposto, em relação ao pri-
meiro argumento, explorem os tuto-
riais anteriormente recomendados
para o acesso e a potencialização do
uso do Facebook.
22
Etapa 1/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas)
Conteúdo Literatura, internet (redes sociais virtuais) e a formação do homem
Atividade
Problematização da própria prática de leitura e escrita literária ambientada na Internet, em uma atividade
(auto) avaliativa dos efeitos dessa experimentação em seu processo formativo
Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante
Grupo fechado (Facebook)
Publicação de arquivos de
texto, imagem e/ou de ví-
deo
Motivação à problematiza-
ção
Professor
Comentário e enquete Problematização Alunos e professor
Etapa 2/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas)
Conteúdo
A atualidade e o passado imediato do texto literário, quanto aos sentidos culturais de sua inscrição nas ativi-
dades produtora e/ou receptora
Atividade
Busca de textos literários (re) produzidos no próprio perfil do Facebook e/ou nos perfis / páginas de autores
da literatura brasileira; e, inferência das circunstâncias de (re) produção dos mesmos, através da análise dos
procedimentos argumentativos supostos (objetivos do produtor, público alvo)
Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante
Grupo fechado (Facebook)
Publicação de postagem
Instrução à atividade de
pesquisa
Professor
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Resposta à atividade de pes-
quisa
Alunos
Comentário
Análise do produto de pes-
quisa
Alunos e professor
Perfil dos alunos e/u perfis
e páginas de autores da lite-
ratura brasileira (Facebook)
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Extração das informações
úteis à realização da pes-
quisa anteriormente descrita
Alunos
Talvez seja oportuno problematizar
antes a própria concepção de litera-
tura formulada até então por ambos,
aluno e professor; com a leitura de
algum texto que viabilize essa discus-
são, a exemplo de “Onde se põem
algumas cartas na mesa, tiram-se ou-
tras da manga, funda-se o Clube dos
Leitores Anônimos, e se pergunta: o
que é literatura?” (LAJOLO, 2001),
ou, quem sabe, um livro, “Desco-
brindo a literatura” (LAJOLO,
2005). Sobre a utilidade da literatura,
outra problematização necessária, a
leitura de “Afinal, para que serve a li-
teratura?” (LAJOLO, 2005) é parti-
cularmente recomendada. Já no que
diz respeito à da própria prática de
leitura e escrita literária ambientada
na Internet, ou a sua ausência, “Lite-
ratura, Twitter e Facebook: a econo-
mia dos likes e dos rts dos usuários-
fãs de literatura brasileira nas redes
sociais” (MALINI, 2014).
Os outros dois textos, não o livro,
encontram-se na seção dos anexos.
Importa, aqui, precaver-se, quanto à
busca de textos literários (re) produ-
zidos, no Facebook, em perfis / pá-
ginas de autores da literatura brasi-
leira, elaborando previamente uma
lista de links com exemplos.
23
Etapa 3/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas)
Conteúdo
O necessário diálogo entre textos literários de uma mesma época ou de épocas diferentes, ou entre os sen-
tidos culturais que lhes atribuem as atividades produtora e/ou receptora, para a superação do seu fecha-
mento, de sua unilateralidade
Atividade
Localização, nos textos literários anteriormente reunidos, de aspectos do contexto sócio-histórico-cultural
de sua (re) produção e recepção; e, sua discussão
Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante
Grupo fechado (Facebook)
Publicação de postagem Instrução à atividade Professor
Publicação de postagem ou
comentário
Resposta à atividade Alunos e professor
Etapa 4/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas)
Conteúdo O debate público da literatura brasileira em redes sociais virtuais como o Facebook
Atividade
Análise da contribuição do fluxo conversacional do Facebook (postagem  comentário e/ou compartilha-
mento  postagem), materializado na (re) produção e na recepção dos referidos textos literários, à constru-
ção do debate público dos sistemas de ideias por eles suportados
Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante
Grupo fechado (Facebook)
Publicação de postagem
Instrução à atividade de
pesquisa
Professor
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Resposta à atividade de pes-
quisa
Alunos
Comentário
Análise do produto de pes-
quisa
Alunos e professor
Perfil dos alunos e/u perfis
e páginas de autores da lite-
ratura brasileira (Facebook)
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Extração das informações
úteis à realização da pes-
quisa anteriormente descrita
Alunos
Antes, provocar os alunos quanto ao
reconhecimento do diálogo entre de-
terminados textos, literários e não li-
terários, escritos em épocas diferen-
tes; a saber: de Lima Barreto, “Pro-
vidências governamentais” (1921);
de Atila Roque, “Direitos humanos
são inegociáveis” (2016); de Gracili-
ano Ramos, “Cadeia” (fragmento)
(1938); de Alexandre Beck, uma das
tiras “Armandinho” (2016) – todos
eles não por acaso reunidos sob o tí-
tulo “O que pode a (nossa) palavra,
ao longo de 34.935 dias?” (vide ane-
xos).
Outra proposta de provocação inte-
ressante: identificar a temporalidade
destes contos de Monteiro Lobato:
“Vidinha ociosa” e “Um homem de
consciência”. Ou, ainda, de um dos
trechos de Lima Barreto, em “Os
bruzundangas”, no qual se descreve
uma determinada sociedade (vide
anexos).
24
Etapa 5/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas)
Conteúdo Literatura e engajamento
Atividade
Pesquisa / debate de notícias e/ou reportagens de ampla repercussão nos cenários mundial e/ou brasileiro,
em páginas mantidas no Facebook por jornais e revistas nacionais; e, produção literária motivada por esse
processo
Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante
Grupo fechado (Facebook)
Publicação de postagem
Instrução à atividade de
pesquisa
Professor
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Resposta à atividade de pes-
quisa
Alunos
Comentário
Análise do produto de pes-
quisa
Alunos e professor
Páginas de jornais ou revis-
tas nacionais (Facebook)
Compartilhamento de pos-
tagem e/ou páginas
Extração das informações
úteis à realização da pes-
quisa anteriormente descrita
Alunos
Página do projeto (Face-
book)
Publicação de postagem
Descrição do projeto Professor
Exposição do produto fina,
o texto literário de autoria
discente
Alunos
Avaliação:
A avaliação, tanto da implementação do projeto, quanto à da aprendizagem discente, é proposta sob instrumentos e
critérios variados, ao longo das etapas, a fim de suscitar, entre os alunos e o professor, a autoavaliação colaborativa para a
revisitação dos próprios percursos e processos formativos, possibilitando, ao segundo, o incentivo, o favorecimento e o
acompanhamento do amadurecimento sensível daqueles, supostamente agenciado pelas atividades de leitura e de escrita
literária empreendidas, tal como planejadas:
25
• Comuns a todas as etapas, sempre por ocasião de seu encerramento:
o Uma enquete realizada, no Facebook (grupo fechado), pelos alunos, a respeito de sua participação quali-
tativa (DEMO, 1987 [1991], p. 32):
A realização do objetivo estabelecido para essa etapa, [descrever o objetivo], exigiu-lhe que
tipo de necessidade participativa? Se preferir, comente suas impressões a esse respeito, logo
abaixo.
( ) Necessidade de convivência.
( ) Necessidade de vivência.
( ) Necessidade de identificação ideológica.
o Uma análise realizada, em sala de aula, pelo professor, no início da etapa subsequente à avaliada, sobre o
nível de cooperação entre os alunos (BORGES; SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p.
260), em reposta à enquete já descrita:
Nível de
cooperação
Critério
Comunica-
ção
Grau de interação e participação em discussões e diálogos, analisado pela quantidade e
qualidade das mensagens trocadas.
Construção
coletiva
Grau de contribuição, analisado pela quantidade e pela qualidade de contribuições na
construção de um produto coletivo e pela construção / inferência sobre as contribuições
de outros membros do grupo.
Coordena-
ção
Grau de concentração e organização, analisado pela presença da liderança, pelo envol-
vimento com a definição do processo e pelo cumprimento das tarefas.
Percepção
Grau do entendimento do processo, analisado pelo entendimento da tarefa e suas rela-
ções.
• Em determinadas etapas:
26
o Feedback crítico, por parte do professor, ou dos alunos, na eventualidade de uns avaliarem os outros,
com critérios estabelecidos em função do tipo de atividade:
▪ Pesquisa (no compartilhamento de páginas ou publicações próprias da rede social ou de outros
sites, bem como na criação de documento) (ALMEIDA; OKADA, 2006, p. 278):
Feedback crítico 1 2 3 4 5
Conteúdo
Proposta atendida?
Tema relevante?
Assunto interessante?
Contribuições significativas?
Profundidade da abordagem?
Ideias bem articuladas?
Referências bem selecionadas?
Estrutura
Organização do trabalho?
Linguagem clara?
Apresentação objetiva?
Rigor técnico?
Configuração estética?
1 = insuficiente, 2 = razoável, 3 = bom, 4 = ótimo, 5 = excelente
▪ Debate (em comentário relacionado à postagem disparadora) (BORGES; SANTORO; SANTOS,
2004 apud SANTOS, 2006, p. 261):
Tipo de mensa-
gem*
Descrição Valor**
Mensagens de
administração
Tratam de assuntos de administração do curso e/ou de proble-
mas pessoais.
0%
Mensagens va-
zias
Mensagens sem conteúdo.
0%
27
Mensagens com
pouca contri-
buição
Apresentam ponto de vista relevante, mas sobre assunto corre-
lato ao tema em debate e que não geram respostas e/ou com-
plementações.
25% a
50%
Mensagens com
muita contribui-
ção
Discutem o tema em debate, apresentam pontos de vista rele-
vantes e incentivam o debate, gerando outras mensagens como
resposta ou como complementação.
50% a
100%
Mensagens de
coordenação
Mensagens de membro do grupo que espontaneamente, ou in-
dicado pelos demais membros, toma o encargo de ajudar na di-
visão de tarefas, no cumprimento dos prazos e, em alguns casos,
na conclusão da tarefa.
50% a
100%
* Mensagem postada no fórum, aqui em uma proposta de substituição pelo comentário relacio-
nado à postagem disparadora de debate.
**Os autores propõem um intervalo de 0 a 2 pontos, aqui adaptado à escala percentual.
▪ Relato analítico e outras atividades escritas (na criação de documento e/ou em comentário rela-
cionado à postagem disparadora):
• Realização, pertinência ou adequação aos objetivos educacionais estabelecidos; além de
consistência, clareza e concisão.
28
29
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33
ANEXOS
ANEXO A – De Marisa Lajolo, “Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o
Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é literatura?”
Cuidado, leitor!
Ao dobrar esta página,
Nada tema: o poeta
É só um sonho de poema1
Benvindos todos, leitoras e leitores, a estas mal traçadas linhas!
Fico encantada de estarmos juntos nesta discussão, no rnomento em que tanta gente anda dizendo que a literatura
morreu. Você, eu, seu amigo, minha colega, e todos os outros sócios do Clube de Leitores Anônimos sabemos que é mentira,
que a literatura vai bem, obrigada, está vivinha da silva, e até manda lembranças...
Mass ela mudou.
Mudou muito.
Mudou de cara, de endereço e até de família.
E tem quem não a reconheça no novo endereço, tem quem desfaça da parentela que veio de longe. Tem uma voz ali
atrás, resmungando: então música popular é poesia? Telenovela tem tanto valor quanto romance? Folheto de cordel tem a
mesma importância estética que a epopéia... ? São vozes rabugentas, mas paciência, que nesta conversa volta e meia vamos
ter de dialogar com estes e com outros resmungos semelhantes.
São resmungos de alto coturno: os donos dessas vozes dão aulas, escrevem livros imensos, dão entrevista aos jornais.
Quando Já não vestem, pretendem vestir o fardão da academia, e nem se incomodarn que do traje engalanado se desprenda
um leve cheiro de mofo...
Na semana passada, um jornal de grande tiragem publicou um artigo que dizia muito do que essas vozes dizem:
[...]. Viciada na televisão e em histórias em quadrinhos, e já agora também em videogames,
a juventude de hoje á pouco amiga dos livros e dá as costas à leitura. Dona de um vocabu-
lário muito parco, sua fala é ainda corrompida pela gíria das ruas e pelos estrangeirismos
que ameaçam a soberania da língua nacional. Mesmo nos cursos de letras, não poucas vezes
1 Vogt, Carlos. "Advertência". In: Geração. São Paulo, Brasiliense, 1985, p. 9.
34
os clássicos da literatura são substituídos por autores menores, esteticamente inexpressi-
vos, que nada têm em comum com a estirpe de um Machado de Assis ou de um Graciliano
Ramos.
Mas que ninguém se assuste. Esse pessimismo todo não tem nada de novo. Salvo raras exceções, intelectuais e pro-
fessores foram sempre do contra quando se trata de novidades culturais.
E a literatura hoje ganhou cara nova.
A literatura hoje não é mais artesanal nem é produzida por umas poucas indústrias ou escrita por uns poucos escri-
tores que têm o monopólio do mercado e da opinião. Hoje a literatura é produzida por uma indústria tão sofisticada quanto
a indústria de alimentos, que oferece molho de tomate para todos os gostos, com coentro ou sem cebolinha, com pedaços
grandes de tomate ou como creme homogeneizado.
Macarronada per tutti!
Quando Castro Alves (1847-1871)2
, grande poeta brasileiro, descrevia — há bem mais de um século — seu sonho
de um mundo onde houvesse livros, livros a mancheias, estava profetizando o nosso hoje. Pois os livros, a partir de meados
do século XX, rnultiplicaram-se vertiginosamente, inclusive no Brasil.
Livros de todo feitio, para todo feitio de leitores.
Romances de amor para quem curte histórias cheias de beijos intermináveis e quentes, e romances sem amor para
quem se amarra em histórias de tráfico, bandidagem e armamento pesado. Histórias com que se gargalha, e histórias com
que se sorri de lado. A literatura fala de vários mundos: alguns parecidíssimos com o nosso, onde, por exemplo, tem gente
que morre de fome nas ruas, e de mundos muito diferentes, onde vivem espíritos, anjos, energias e demónios. A literatura
hoje traz para o nosso lado mundos prometidos pela ciência, com seres artificiais sofisticados e com seres naturais manipu-
lados em laboratório. Há histórias com palavras e com imagens e histórias só com imagens. Poemas que são imagens e
Imagens que são poemas, poemas curtinhos empilhando palavras, poemas compridos espaçando palavras, poemas com rima,
poemas sem rima...
Ou seja, arrombou-se a festa, querido leitor.
A literatura, hoje, parece estádio de futebol em dia de final de campeonato: sempre cabe mais um, e tem até cambista
vendendo ingresso para quem chega tarde. Mas há também, é claro, o setor das numeradas e das cadeiras cativas: pois a
literatura de que falam os que resmungam continua viva, vai bem, obrigada, e até manda lembranças. Apenas não está mais
sozinha em cena. Está acompanhada e muito bem acompanhada! Ao lado dos romances esotéricos, da poesia de auto-ajuda,
2 Datas de nascimento e morte de escritores brasileiros falecidos, bem como data de publicação de suas obras, são indicadas a partir do Pequeno
dicionário de literatura brasileira crítico e bibliográfico), de Massaud Moisés e José Paulo Paes (São Paulo, Cultrix. 1980, 2. ed.). De autores e obras
estrangeiros, as informações aqui fornecidas vêm da obra La nuova enciclopedia della letteratura Garzanti, Garzanti Editorial, 1987.
35
da ficção científica e do romance policial, continuam a ser lidos e apreciados os romances de antigamente, as novelas de
cavalaria, os chamados clássicos, a poesia. Talvez venham dessas múltiplas faces da literatura os resmungos mal-humorados
que zumbem em nossos ouvidos.
O que quer dizer que Homero (séc. IX a.C.), Dante Alighieri (1265-1321), Eça de Queirós (1845-1900) e Guimarães
Rosa (1908-1967) escreveram, mesmo, coisas excelentes. Excelentes e distintas do que escrevem hoje os Titãs, Paulo Coelho,
Rodolfo Cavalcanti e J. Grisham.
Mas diferente não quer dizer pior.
Só quer dizer diferente.
Mas, geralmente, as vozes donas da verdade usam óculos que vêem o diferente como pior e estão habituadas a terem
sempre razão. Por mais divergentes e contraditórios que sejam seus pontos de vista sobre a literatura, eles acabam recaindo
sempre no mesmo universo. Universo imenso, mas com fronteiras: limitado por Marcel Proust (1871-1922) ao Norte, Jorge
Luís Borges (1899-1986) ao Sul, Clarice Lispector (1926-1977) a Leste e... quem mesmo a Oeste? Edgard Allan Poe (1809-
1849)? T. S. Eliot (1888-1965)? Poe e Eliot a Oeste, certo! Além de terem cacife alto, os resmungões não resmungam por
mal, coitados. Aprenderam só de um jeito, o deles!
Ou seja, embora uns prefiram Oswald de Andrade (1890-1954) e outros Drummond de Andrade (1902-1987), há
algo em comum entre eles, além da coincidência de sobrenome dos poetas que preferem. Todos eles assumem as posições
que assumem a partir e em nome de uma tradição cultural que vem se construindo há séculos. A questão o que é literatura?
para qualquer um deles — como para qualquer intelectual de sua classe e quilate — exige respostas que retomem e atualizem
tudo o que até hoje já foi escrito sobre o assunto.
Mas essa tradição cultural que os apoia, se tem o respaldo de muitos séculos, tem também a civilização burguesa por
horizonte. A civilização burguesa é branca, masculina e bem alfabetizada, não é mesmo, leitores proletários, e leitoras negras?
Aquém e além dos que resmungam, uma multidão de gente, você, eu, todos nós, sócios entusiasmados do Clube dos
Leitores Anônimos, eventualmente já nos perguntamos e já nos respondemos o que é literatura? Perguntas permanentes, res-
postas provisórias. Tão permanentes umas e provisórias outras quanto o são as perguntas e respostas com que lidam os
intelectuais do time dos que reclamam e resmungam. Só que sem o reflexo do espelho, das citações, dos interlocutores.
Então, em igualdade de condições, é arregaçar as mangas e pagar pra ver.
LAJOLO, Marisa. Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores
Anônimos, e se pergunta: o que é literatura? In: ______. Literatura: leitores & leitura. São Paulo: Moderna, 2001, p.
7-11.
ANEXO B – De Marisa Lajolo, “Afinal, para que serve a literatura?”
36
Você consegue imaginar um mundo sem histórias contadas, sem poemas, sem canções, sem contos,
sem filmes? Na verdade, tudo isso é literatura. Ela não é somente uma matéria que a gente estuda
na escola.
Como todas as artes, a literatura abre portas, cutuca, alimenta ou nos permite “dar asas à imaginação” (essa frase é
uma metáfora: imaginação não tem asas...). Ao ler, criamos uma “cara” para os personagens; imaginamos sua voz, seu modo
de andar... nos identificamos com uns e antipatizamos com outros, no divertimos e sofremos com eles.
Para sentir, para saber...
Mas a literatura é também uma importantíssima fonte de conhecimentos, porque através dos livros aprendemos
muito sobre o mundo que nos rodeia. É sempre mais fácil aprender quando nos divertimos, e a literatura pode fazer estas
duas coisas: divertir e ensinar. Outra função da literatura é a de expressar a cultura, os valores, as tradições dos povos. É isso
o que transmitem muitos textos literários, entre eles os chamados “clássico”.
“Clássico”, às vezes, se refere apenas ao que tem relação com a Antiguidade grega e latina. Mas significa também
“aquilo que é sempre bom”, independentemente da época. Assim, um livro ou um autor, ou uma partida de futebol, um
terno do costureiro francês Yves Saint Laurent, um samba do Cartola, podem ser “clássicos”.
Também se costuma dizer que a obra clássica, mesmo que pertença a uma época longínqua, reflete valores universais
e atemporais, ou seja, que continuam válidos para as pessoas de qualquer época e lugar. Por exemplo, veja o seguinte trecho
de um poema de Camões, um “clássico” da literatura portuguesa:
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói e não se sente,
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
Agora, pense: será que essa maneira de imaginar e definir o amor vale somente para a época do poeta (século XVI)
ou essas contradições do amor ainda são sentidas nos dias de hoje?
Uma arma muito poderosa
37
A literatura pode cumprir também um importante papel de denúncia social. Um escritor comprometido com seu
tempo aponta os defeitos e as injustiças da sociedade em que vive. No século XIX, quando os trabalhadores das cidades ou
do campo, ou mesmo os escravos, viviam em condições duríssimas de exploração, houve escritores (Charles Dickens na
Inglaterra, Émile Zola na França, Aluísio Azevedo e Castro Alves no Brasil...) que refletiram em seus escritos a vida miserável
dessas pessoas, contribuindo assim para criar na sociedade a exigência de melhorar as condições de vida.
Para terminar, a literatura nos ajuda a pensar, colocando em palavras pensamentos e sentimentos; também pode
funcionar como campo de experimentação de linguagens, pois é sempre bom, como diria nosso poeta Manoel de Barros,
“usar algumas palavras que ainda não tenham idioma”.
LAJOLO, Marisa. Afinal, para que serve a literatura? In: ______. Descobrindo a literatura. São Paulo: Ática, 2005.
p. 62-63.
ANEXO C – de Lima Barreto, “Providências governamentais” (1921); de Atila Roque, “Direitos humanos são
inegociáveis” (2016); de Graciliano Ramos, “Cadeia” (fragmento) (1938); de Alexandre Beck, uma das tiras “Ar-
mandinho” (2016) – todos eles não por acaso reunidos sob o título “O que pode a (nossa) palavra, ao longo de
34.935 dias?”
PROVIDÊNCIAS GOVERNAMENTAIS3
Por Lima Barreto (29/01/1921)
A reunião do ministério foi naquele dia secreta, isto é, não foi anunciada nos jornais. Especialmente convidados,
compareceram também, com o informante, o prefeito de polícia e o inspetor dos detetives (aguazil-mor).
El-Rey Pechisbeque abriu a sessão fazendo um gesto de quem ia colher o manto de arminho, crivado de abelhas
merovíngias4
, e depositou em cima da mesa uma magnífica “Santa Luzia” de cinco olhos5
, todos eles com incrustações de
marfim e ouro. Era o seu cetro característico de Carlos Magno com que figurava os seus retratos pululantes.
3 Assinado por Jonathan. Publicado em Careta, n. 658, 29 jan. 1921.
4 Símbolo da imortalidade e ressurreição, as abelhas merovíngias foram escolhidas por Napoleão Bonaparte para compor o brasão de armas da França
quando foi proclamado imperador, em 1804, rompendo assim com o símbolo da flor-de-lis usada a partir do reinado de Hugo Capeto, no século X.
5 Referência à palmatória de madeira formada por um círculo e haste, conhecida também por férula ou “menina dos cinco olhos”. Algumas palmatórias
continham cinco furos no círculo para vencer a resistência do ar e aumentar a velocidade do golpe. Foi muito usada por professores para castigar
alunos.
38
Dirigiu-se, em primeiro lugar, ao ministro das Tropas Militares.
Ao contrário das outras sessões ministeriais, Pechisbeque, o grande rei da Pacóvia6
, não estava de bom humor e muito
menos gaiato. Falou gravemente:
— Sr. dr. Karagafulos: o que vossa excelência sabe de anormal da tropa?
— As praças andam muito contentes com o novo uniforme sudanês que lhes impingi; mas os oficiais não estão
contentes. Tenho tomado as providências; mas…
— Bem. Era de esperar. Mas não há nada como um dia atrás do outro.
— O poderoso rei da Nova Zembla7
não os elogiou tanto?
— Não os cumulou de distinções e condecorações? Quem foi que promoveu a visita do rei Savoff a nossa terra e,
portanto, os elogios que eles receberam, e os “crachás”?
— Fui eu? Ingratos! Mil vezes ingratos! Contudo…
— Eles se queixam, acudiu o ministro dos Buquês de Recreios Reais; eles se queixam da carestia da vida.
— Ora, bolas! Soldado é soldado! Deve estar afeito a tudo. Os de vossa excelência, sr. ministro dos meus Buquês,
também se queixam?
— Também, majestade; mas a marinhagem, nas horas de recreio, pesca de caniço, crocorocas, micholas, canhanhus,
cação-viola; e assim melhoram o rancho ou vendem o pescado, para aumentar o soldo. Encontraram um derivativo…
— E os oficiais?
— Também se entregam à pescaria.
— Sábia gente!
— Assim mesmo, majestade, não andam contentes; murmuram, observa o ministro de Vistas Escuras.
— Como?! — admirou-se Pechisbeque. — Se eles, para pescar, não pagam imposto, não empatam capital em canoas
e botes? Qual! Como é que vossa excelência sabe disso?
— Por informações aqui do excelentíssimo juiz de fora Jemi.
— Sr. Jemi — indagou o rei —, como é que o senhor tem notícia desse fato?
— É, majestade sereníssima, é o que me informa o aguazil-mor que aqui está, a meu lado.
— Seu Manchique — fez arrebatadamente o rei —, como é isso?
— Trago-lhe aqui um relatório completo do que se diz na cidade.
— Dê-mo, Manchique.
6 Pacóvia significa aquilo que é considera ignorante, pouco inteligente ou se deixa facilmente enganar.
7 Nova Zembla (ou Nova Zemlia) é um arquipélago localizado próximo ao continente ao norte da Rússia. Em russo, significa “terra nova”.
39
O chefe dos aguazis passa ao poderoso imperante um calhamaço grande como todos os diabos, Pechisbeque folheia-
o, põe-se a lê-lo aqui e ali; e, afinal, vira-se para o ministro das Vistas Escuras e diz:
— Sr. ministro: vossa excelência precisa combinar com meu mano, o condestável do Reino e prefeito do Pretório,
diversas providências de urgência. Não há que contar com este povo. Dou-lhe festanças e… sr. ministro das Vistas Escuras,
tome as suas providências?
— Quais, majestade?
— É preciso adquirir mais “tanks”, e dos mais poderosos; requisitar imediatamente canhões do Ministério da Tropa,
que neste momento recebe ordem para entregá-los; comprar modernos e poderosos aviões de guerra. Tudo isto deve ser
entregue à “Guarda do Pretório”, que está sob o comando do mano, no mais breve espaço de tempo. A “guarda” será desde
já aumentada no dobro do atual efetivo. Res, non verba8
, sr. ministro.
E, tímido e obediente, o ministro do Tesouro, até ali calado, resolveu então falar:
— Majestade, e a crise? E o câmbio? E a carestia? E a miséria que vai pelo povo?
— Mas — falou o rei amigavelmente —, Homero, você não está vendo que tomei agora mesmo as necessárias
providências, para solucionar todas as dificuldades que o país atravessa. Você não ouviu o que eu disse ao “Vistas Escuras”.
Está tudo resolvido. Agora temos que tratar dos festejos comemorativos ao aniversário do príncipe herdeiro da Birmânia.
Mãos à obra!
BARRETO, Lima. Providências governamentais. In: ______. Sátiras e outras subversões. São Paulo: Penguin Classics Companhia das
Letras, 2016. p. 86-88, 485.
DIREITOS HUMANOS SÃO INEGOCIÁVEIS
A atual crise política e o déficit de legitimidade nos partidos e governo proporcionaram o avanço de
propostas que representam um enorme risco de retrocesso nos direitos humanos
Por Atila Roque (14/06/2016),
Diretor Executivo da Anistia Internacional no Brasil
Com muita frequência, me vejo diante da pergunta, quase sempre em tom provocação: a quem se destinam os direitos
humanos? Com isso muitos querem sugerir que os “bandidos” são os maiores beneficiários. Outros, no entanto, reconhecem
8
Expressão em latim que, em tradução livre, significa que as ações falem mais alto que as palavras.
40
a importância de garantir a dignidade humana a todas as pessoas, sem exceções. Os princípios fundamentais dos direitos
humanos, conquistados e consagrados internacionalmente após muito sofrimento ao longo das últimas décadas e, no caso
do Brasil, expressos amplamente na Constituição de 1988, constituem os pilares que sustentam o estado de direito moderno.
O novo momento político, entretanto, nos coloca um questionamento ainda mais primordial: para que servem os
direitos humanos em momentos de crise como o que vivemos?
Estou convencido que é justamente em momentos críticos, quando as circunstâncias políticas e econômicas colocam
a sociedade diante de escolhas muitas vezes difíceis, é que os direitos humanos devem servir como o ponto de referência do
qual não devemos nos afastar. Nesse sentido, certamente, algumas medidas concretas e declarações iniciais de altas autorida-
des no governo provisório agravam a preocupação com os avanços que logramos ao longo da transição da ditadura para a
democracia no Brasil.
A extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e Direitos Humanos, por exemplo, constitui indícios dos
riscos de fragilização do marco institucional responsável pela garantia de direitos fundamentais para a promoção da igualdade
e da justiça social no Brasil. A composição do ministério do governo provisório integralmente de homens brancos também
revelou uma baixa preocupação com a diversidade que deve sempre estar expressa no modo como o Estado compõe as mais
altas posições de poder da administração pública.
No entanto, é preciso reconhecer que muitos dos desafios e riscos com os quais nos deparamos nesse momento se
tratam do acirramento de problemas que já vínhamos alertando, inclusive nos relatórios anuais de balanço do estado dos
direitos humanos no mundo da Anistia Internacional, em particular no capítulo brasileiro, disponíveis no site da entidade.
O relatório de 2015, por exemplo, chamava a atenção para o avanço no legislativo de um conjunto de propostas que,
se aprovadas, significariam retrocessos graves nos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, das populações indígenas e
quilombolas em relação aos seus territórios e de desmonte da legislação que controla o acesso a armas de fogo no país, apenas
para citar alguns temas. A crise política e o déficit de liderança e legitimidade existente atualmente nos partidos políticos e
governo – que já vem sendo objeto de debate desde as grandes manifestações de 2013 – proporcionaram o avanço de uma
pauta de propostas que busca rever conquistas essenciais consagradas, inclusive, na Constituição brasileira.
A agenda legislativa apresenta sérias ameaças, como a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos – diminuindo
a idade com que jovens se tornariam adultos, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que retira do Executivo a
exclusividade de demarcar terras indígenas, e a Proposta de Lei (PL) 5069/2013, que dificulta o atendimento de saúde a
mulheres vítimas de estupro. Esses projetos encontram-se atualmente em discussão na Câmara dos Deputados ou no Senado,
juntamente com a proposta de revogação do Estatuto do Desarmamento (PL 3722/12), que flexibiliza o porte de armas; o
novo código de mineração (PL5807/13), que ignora o impacto da atividade ao meio ambiente; e o Estatuto da Família (PL
6583/13), que define família apenas a partir de casais heterossexuais. Sem contar a tipificação do terrorismo aprovada em
março, que pode ser usada para criminalizar movimentos sociais e protestos pacíficos por conter linguagem sumamente vaga.
41
Todos esses projetos representam um enorme risco de retrocesso à medida que andam na contramão dos direitos humanos.
Estas propostas comprometem conquistas alcançadas a duras penas no passado recente.
O momento é de atenção e cuidado. Mais do que nunca, temos que buscar na nossa história recente a inspiração para
evitar aventuras e aprender com os acertos do processo de transição democrática. Para isso, é essencial o fortalecimento de
uma sociedade civil autônoma e independente capaz de, em momentos históricos de transição ou crise como o que vivemos
atualmente, fazer a diferença na balança do processo de mudança sociopolítico brasileiro.
Esse delicado equilíbrio, infelizmente, pende atualmente para o lado da regressão dos direitos humanos e retrocessos
na nossa jovem democracia. Mais do que nunca a mobilização social e a defesa dos direitos à livre manifestação são centrais
para que possamos fazer o debate amplo que precisamos sobre as escolhas e reformas que o Brasil não pode mais adiar,
inclusive aquele do sistema político, de maneira que as nossas instituições possam recuperar o mínimo de legitimidade ne-
cessária a garantia da democracia e do Estado de direito.
A afirmação e defesa dos direitos humanos fundamentais a todas as pessoas é parte essencial dessa luta, seja qual for
o desdobramento da atual crise política e o resultado do julgamento do impeachment atualmente em curso no Senado. O
Brasil, não devemos nos enganar, segue sendo um país de raízes autoritárias, onde a desigualdade, a violência, o machismo e
o racismo continuam a estruturar o poder. Esses são os monstros que se apresentam de maneira cada vez mais aberta e
desavergonhada nas redes sociais e nas ruas.
Momentos de incerteza e instabilidade requerem lucidez das lideranças responsáveis de todas as esferas para que
formem uma verdadeira frente política suprapartidária na defesa da democracia e dos direitos humanos. Às autoridades cabe
o dever de reafirmar seu compromisso de defesa das conquistas consagradas na Constituição de 1988 e a cumprirem plena-
mente com suas obrigações internacionais adquiridas em virtude dos tratados de direitos humanos dos quais o Brasil faz
parte.
ROQUE, Atila. Direitos humanos são inegociáveis. Politike, 14 jun. 2016. Disponível em: <goo.gl/9RGorW>. Acesso em: 22 set. 2016.
CADEIA (fragmento)
Por Graciliano Ramos (1938), em Vidas Secas
[...]. Era bruto, sim senhor, nunca havia aprendido, não sabia explicar-se. Estava preso por isso? Como era? [...] Que
mal fazia a brutalidade dele? [...]. Tudo em ordem, podiam ver. Tinha culpa de ser bruto? Quem tinha culpa?
[...] Difícil pensar. [...]. Nunca vira uma escola. Por isso não conseguia defender-se, botar as coisas nos seus lugares.
[...].
42
[...].
O que desejava... An! Esquecia-se. [...].
RAMOS, Graciliano. (1938). Vidas secas. 120. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2013.
ARMANDINHO
Por Alexandre Beck (22/09/2016)
BECK, Alexandre. Tira “Armandinho”. Armandinho, [S.l.]: 22 set. 2016. Disponível em: <goo.gl/CjMgaM>. Acesso em: 22 set. 2016.
ANEXO D – De Monteiro Lobato, “Vidinha ociosa” e “Um homem de consciência”
VIDINHA OCIOSA
APÓLOGO
O VELHO TORQUATO DÁ RELEVO ao que conta à força de imagens engraçadas ou apólogos. Ontem explicava
o mal da nossa raça: preguiça de pensar. E restringindo o asserto à classe agrícola:
– Se o Governo agarrasse um cento de fazendeiros dos mais ilustres e os trancasse nesta sala, com cem machados
naquele canto e uma floresta virgem ali adiante; e se naquele quarto pusesse uma mesa com papel, pena e tinta, e lhes dissesse:
43
"Ou vocês pensam meia hora naquele papel ou botam abaixo aquela mata", daí a cinco minutos cento e um machados
pipocavam nas perobas!...
A MESMICE
Um coronel inglês suicidou-se "tired of buttoning and unbuttoning" – cansado de abotoar e desabotoar a farda.
A vida em Oblivion é um perpétuo "buttoning and unbuttoning" que não desfecha no suicídio.
Salvam-na a botica e o jogo. A botica, porque nela há uma sessão permanente de mexerico, e o mexerico é a ambrosia
dos lugarejos pobres. E o jogo, porque quem perdeu não pode suicidar-se antes da desforra, e quem ganhou vai alegre, a
cantarolar que afinal de contas a vida é boa. Dessa forma escapam todos ao cansaço da mesmice.
[...].
LOBATO, Monteiro. Cidades mortas: vidinha ociosa. In: ______. Contos completos. São Paulo: Biblioteca Azul, 2014. p. 202-209.
UM HOMEM DE CONSCIÊNCIA
CHAMAVA-SE JOÃO TEODORO, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um
defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João
Teodoro.
Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer
o que todos ali queriam mudar-se para terra melhor.
Mas João Teodoro acompanhava com aperto de coração o deperecimento visível de sua Itaoca.
"Isto já foi muito melhor", dizia consigo. "Já teve três médicos bem bons – agora só um e bem ruinzote. Já teve seis
advogados e hoje mal dá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A
gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente, a minha Itaoca está se acabando...”
João Teodoro entrou a incubar a ideia de também mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o
convencesse de maneira absoluta de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível.
"É isso", deliberou lá por dentro. "Quando eu verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada
de nada, então arrumo a trouxa e boto-me fora daqui."
44
Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notícia
como se fosse uma porretada no crânio. Delegado, ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não queria ser nada, não se
julgava capaz de nada...
Ser delegado numa cidadinha daquelas é coisa seriíssima. Não há cargo mais importante. É o homem que prende os
outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o Governo. Uma coisa colossal ser delegado – e estava
ele, João Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!...
João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada
botou-as num burro, montou no seu cavalinho magro e partiu.
Antes de deixar a cidade foi visto por um amigo madrugador.
– Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens?
– Vou-me embora – respondeu o retirante. – Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim.
– Mas, como? Agora que você está delegado?
– Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado não moro. Adeus.
E sumiu.
LOBATO, Monteiro. Cidades mortas: um homem de consciência. In: ______. Contos completos. São Paulo: Bi-
blioteca Azul, 2014. p. 322-323.
ANEXO E – De Lima Barreto, “Os bruzundangas” (fragmento)
SOCIEDADE
É deveras difícil dizer qualquer coisa sobre a sociedade da Bruzundanga. É difícil porque lá não há verdadeiramente
sociedade estável. [...].
[...].
Uma tão vulgar preocupação pauta toda a vida intelectual da sociedade bruzundanguense, de modo que [...] o tema
geral dos comensais é a política [...].
A política não é aí uma grande cogitação de guiar os nossos destinos [...].
Sendo assim, todas as manifestações de cultura dessa sociedade são inferiores. [...].
[...]. As obras mais notáveis que lá têm aparecido são escritas por homens que vivem arredados da sociedade bruzun-
danguense.
45
Em uma sala desse país, quando não se trata de intrigas políticas ou coisas frívolas de todos os dias, surge logo um
tédio inconcebível. Ele sepulta o pensamento, antes de matá-lo: enterra-o vivo. Mereceria detalhes, mas só fazendo romance
ou comédia.
[...].
Incapaz [, a gente da Bruzundanga, ] de fazer aparecer no seu seio razoáveis manifestações intelectuais, ela é ainda
mais incapaz de apoiar as que nascem fora dela.
[...].
Tudo lá é conforme a moda. [...].
[...].
BARRETO, Lima. Os bruzundangas: a sociedade [fragmento]. 4. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 81 a 84.
46
Projeto didático-
pedagógico
Manual do
professor
Eslaides de
apresentação
Referências
reunidas
QR Code
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47
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Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros à minha palavra: projeto didático-pedagógico de agenciamento do saber literário no Ensino Médio: manual do professor

  • 1. Literatura e sociedade no Facebook: Um projeto didático-pedagógico de agenciamento do saber literário no Ensino Médio da palavra alheia dos outros a minha palavra DIEGO PEREIRA
  • 2.
  • 3. DIEGO PEREIRA Literatura e sociedade no Facebook: dapalavraalheiadosoutrosaminhapalavra Um projeto didático-pedagógico de agenciamento do saber literário no Ensino Médio PUBLICAÇÃO AUTÔNOMA
  • 4. PEREIRA, Diego Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros a mi- nha palavra: projeto didático-pedagógico de agenciamento do saber literá- rio no Ensino Médio: manual do professor. Belo Horizonte, 2017. Obra originalmente apresentada como parte do trabalho de conclusão de curso de especialização, Universidade Federal de Minas Gerais, 2017. Capa: Diego Pereira (Imagem: Gustav Klimt, The tree of life, 1905) DIREITOS RESERVADOS:  Diego Pereira Caixa Postal 6549 13084-970 – Campinas, SP E-mail: prof.diegopereira@hotmail.com JUNHO 2017
  • 5. Sertão Central e de Crateús Que a poesia seja a arte de dar nome a todos os bois: aos pesados novilhos de fazendeiro-prefeito e às duas cabrinhas do morador submisso e por isso chamado de morador perfeito; que a poesia seja a arte de dar fome de justiça a todos os homens. Alberto da Cunha Melo
  • 6.
  • 7. SUMÁRIO CARTA AO PROFESSOR ............................................................................ 07 PARTE PRIMEIRA: O PROJETO .............................................................. 09 CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM ............................................................................. 09 CONCEPÇÃO DE LITERATURA ............................................................................. 10 CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM .................................................................... 12 O Facebook (e seus recursos) enquanto ambiente e/ou ferramenta digital de apren- dizagem ............................................................................................................................... 13 A imprescindibilidade das tecnologias digitais de informação e comunicação ......... 14 CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO ............................................................................... 15 PARTE SEGUNDA: A CASA ....................................................................... 19 PROJETO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE AGENCIAMENTO DO SABER LITERÁRIO COMENTADO ....................................................................................... 19 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 29 ANEXOS ....................................................................................................... 33
  • 8. ANEXO A – De Marisa Lajolo, “Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é literatura?” .......................................................................................................................... 33 ANEXO B – De Marisa Lajolo, “Afinal, para que serve a literatura?” ..................... 36 ANEXO C – de Lima Barreto, “Providências governamentais” (1921); de Atila Ro- que, “Direitos humanos são inegociáveis” (2016); de Graciliano Ramos, “Cadeia” (fragmento) (1938); de Alexandre Beck, uma das tiras “Armandinho” (2016) – todos eles não por acaso reunidos sob o título “O que pode a (nossa) palavra, ao longo de 34.935 dias?” ...................................................................................................................... 37 ANEXO D – De Monteiro Lobato, “Vidinha ociosa” e “Um homem de consciên- cia” ...................................................................................................................................... 42 ANEXO E – De Lima Barreto, “Os bruzundangas” (fragmento) ............................ 44
  • 9. 7 CARTA AO PROFESSOR Professor (a); Este manual, suplementar ao projeto didático-pedagógico denominado “Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros a minha palavra”, orienta a sua execução e/ou aperfeiçoamento, sempre condicionando essa tarefa à autonomia docente. De modo que o seu maior objetivo é o de indicar, interpretar, propor a formação do leitor literário no Ensino Médio, sob uma determinada perspectiva teórico-metodológica, sem, com isso, engessar percur- sos, esterilizar processos. Alguns princípios, no entanto, são inegociáveis: é preciso acreditar na leitura literária e, por que não, na escrita, como ferramentas, apetrechos, úteis à interpretação crítica de si e do mundo, à sua eventual transformação, essa arte ou ofício fundamentalmente humano; e, não resistir ao próprio tempo, em que as tecnologias digitais de informação e comunicação já apontam para um novo paradigma de (re) construção do conhecimento, um novo éthos. Daí a importância em se dedicar atenção especial à parte primeira, que trata da fundação e laje desse empreendimento. Compreender qual base o legitima, autoriza; serve-lhe de causa, fundo, motivo, razão. A parte segunda constitui as demais etapas da obra, reconfiguráveis, porque, assim, uma família constrói o seu lar: dando-lhe forma, feitio; desenhando-o, esculpindo-o; sem nunca o terminar – veja só. O autor.
  • 10. 8
  • 11. 9 PARTE PRIMEIRA: O PROJETO CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM A postura educacional assumida por um professor de língua materna é definida, em grande parte, pela concepção de linguagem e, portanto, corrente de estudos linguísticos, das quais se aproximam suas aulas. E precisa por ele ser claramente assimilada, por interferir na configuração do percurso educativo dos alunos, garantindo-lhes, ou não, determinados direitos de aprendizagem. Geraldi (2006 [1981]), além de permitir essa constatação, afirma serem três as principais concepções (linguagem enquanto expressão do pensamento, instrumento de co- municação e forma de interação), às quais corresponderiam, de igual modo, três correntes dos estudos linguísticos (respectivamente, gramática tradicional; estruturalismo e transformaciona- lismo; e, linguística da enunciação). Conforme já apontava Bakhtin (2011 [1978]), trata-se de reconhecer a linguagem a par- tir das funções que a linguística do século XIX lhe atribuía (linguagem para formação ou ex- pressão do pensamento independentemente da comunicação discursiva) ou rompê-las (lingua- gem para comunicação discursiva, em virtude da qual forma-se, expressa-se, o pensamento). Uma escolha que, analisada sob a perspectiva de Geraldi (Ibid., p. 41, 45) a respeito do lugar das relações sociais e a construção dos sujeitos nessa ou naquela concepção de linguagem, pode representar um retrocesso ou um avanço para o ensino de língua portuguesa, que já não requer “uma mudança nas técnicas e nos métodos empregados em sala de aula”, mas, um “‘novo conteúdo’ de ensino”. Pois, como adverte: “A linguagem é a expressão do pensamento: [...]. Se concebemos a linguagem como tal, somos levados a afirmações – cor- rentes – de que pessoas que não con- seguem se expressar não pensam. A linguagem é instrumento de comunicação: essa concepção [...] vê a língua como código [...] capaz de transmitir ao re- ceptor certa mensagem. [...]. A linguagem é uma forma de interação: mais do que possibilitar uma transmissão de informações de um emissor a um re- ceptor, a linguagem é vista como um lugar de interação humana. Por meio dela, [...] o falante age sobre o ouvinte, constituindo compromissos e vínculos que não preexistiam à fala” (GE- RALDI, 2006 [1981], p. 41). “Propunham-se e ainda se propõem variações um tanto diferentes das fun- ções da linguagem, mas permanece ca- racterístico, senão o pleno desconheci- mento, ao menos a subestimação da função comunicativa da linguagem; a linguagem é considerada do ponto de vista do falante, como que de um fa- lante sem a relação necessária com outros participantes da comunicação discur- siva. Se era levado em conta o papel do outro, era apenas como papel de ou- vinte que apenas compreende passiva- mente o falante” (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 270).
  • 12. 10 [...] uma coisa é saber a língua, isto é, dominar as habilidades de uso da língua em situações concretas de interação, entendendo e produzindo enunciados, percebendo as diferenças entre uma forma de expressão e outra. Outra, é saber analisar uma língua dominando conceitos e metalinguagens a partir dos quais se fala sobre a língua, se apresentam suas características estruturais e de uso. Entre esses dois tipos de atividades, é preciso optar pelo predomínio de um sobre o outro. [...]. (Ibid., p. 45-46). Aqui, é importante ressalvar, a concepção de linguagem explorada reconhece a língua como forma de interação hu- mana, sem limitá-la, portanto, às funções de expressão do pensamento e instrumento de comunicação; ao que se filia à linguística da enunciação, enquanto corrente dos estudos linguísticos (GERALDI, 2006 [1981], p. 41). Razão pela qual, dentre os postulados de Bakhtin sobre o enunciado como unidade de comunicação discursiva, estes servirão diretamente ao propó- sito do trabalho ora defendido: a) o do enunciado, na qualidade de unidade real (não convencional) de comunicação discur- siva viva (forma típica das enunciações individuais); b) o do discurso, processo complexo e amplamente ativo da comunica- ção; c) e, o da percepção / compreensão plena real do enunciado / discurso, comportamento ativamente responsivo do sujeito ouvinte / falante ou leitor / escritor (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 271). CONCEPÇÃO DE LITERATURA O texto literário, cujo processo de produção e recepção se deseja investigar síncrona e diacronicamente nas redes sociais virtuais, é aqui tomado como um discurso que reflete seus actantes e o ambiente sócio-histórico-cultural de sua inscrição e, por isto, deve, diante destes, ser tensionado, sob o propósito de vivificação da literatura, em um projeto de amadurecimento sensível dos sujeitos, posteriormente conscientes da importância de sua dedicação ao exercício leitor / escritor afim. Note que não se trata de levar os alunos ao reconhecimento dos gêneros literários, quaisquer que sejam, a partir, tão só, de seus aspectos estilísticos, temáticos e composicionais, relativamente estáveis; mas, à compreensão de seu “[...] [Chama-se] de literatura, da ma- neira mais ampla possível, todas as cri- ações de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cul- tura, desde o que chamamos de fol- clore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção es- crita das grandes civilizações” (CAN- DIDO, 2011 [1988], p. 176).
  • 13. 11 processo de produção, em virtude da função, ou funções, e das condições de comunicação discursiva incorporadas por este ou aquele gênero neste ou naquele campo da atividade humana. Até mesmo porque, conforme salienta Bakhtin (2011 [1978], p. 268, 269, 272), são eles, os gêneros literários (de complexa comunicação cultural), os que melhor transmitem a história da sociedade e da linguagem, em sua complexidade; permitindo a superação das concepções simplificadas do fluxo discursivo, porque precisamente concebidos para a compre- ensão ativamente responsiva, ou portadores de “poderes imateriais, não avaliáveis a peso, mas que de alguma forma pesam” (ECO, 2003 [2000], p. 9), admitindo, sempre, diferentes funções na preparação dos sujeitos para uma transformação final e de caráter universal (BLOOM, 2011 [2000], p. 17). Não por acaso, todas as atividades inicialmente planejadas para o desdobramento deste projeto requerem o exercício metalinguístico por parte do seu público-alvo sobre o fluxo conversacional do qual participem / venham a participar no Facebook, quando alimentado pela experiência de produção / recepção literária. Elas pretendem, por analogia à índole indi- vidual-contextual do emprego das palavras na comunicação discursiva estabelecida por Bakhtin (2011 [1978]), favorecer ao aluno, em seu processo de formação enquanto leitor / escritor literário, o reconhecimento da literatura, sob os três aspectos a partir dos quais ela existe para ele, correspondendo o terceiro ao estágio de leitura aqui pretendido: como palavra da língua neutra e não pertencente a ninguém; como palavra alheia dos outros, cheia de ecos de outros enunciados; e, por último, como a minha palavra, porque, um vez que eu opero com ela em uma situação determinada, com uma intenção discursiva determinada, ela já está compenetrada da minha expressão. (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 294). Assim, se por ocasião da inferência, em um dado texto literário, dos objetivos de seu produtor e a delimitação do público alvo; do estabelecimento das relações entre o mesmo e o momento de sua produção, em contraste com outros textos; “[...] eu [não] seria idealista a ponto de pensar que às imensas multidões, às quais faltam pão e remédios, a litera- tura poderia trazer alívio. Mas [...] [as pessoas] se transformam no que são [...] porque [...] [incluídas / excluídas no /do] universo do livro e dos lugares onde, através da educação e da discus- são, poderiam chegar até [...] [elas] os ecos de um mundo de valores que chega e remete a livros” (ECO, 2003 [2000], p. 11-12). “[...]. O mundo da literatura é um uni- verso no qual é possível fazer testes para estabelecer se um leitor tem o sen- tido da realidade ou é presa de suas próprias alucinações” (ECO, 2003 [2000], p. 15).
  • 14. 12 e/ou, de sua análise, endógena e exógena, face ao éthos inaugurado pelas Tecnologias Digitais da Informação e da Comuni- cação (habilidades cujo desenvolvimento é recomendado pela Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e suas Tecnolo- gias para o ENEM [2009]), as atividades assumidas neste projeto ensejam a experiência discursiva individual, que: se forma e se desenvolve em uma interação constante e contínua com os enunciados individuais dos outros. [...]. Essas palavras dos outros trazem consigo a sua expressão, o seu tom valorativo que assimilamos, reelaboramos, e reacentua- mos. (BAKHTIN, 2011 [1978], p. 294). CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM Todo o projeto didático-pedagógico está fundado em uma perspectiva dialógica da aprendizagem, cuja suplementa- ção pela colaborativa, de matriz vygotskyana, faz-se necessária, mas, sob a reinterpretação de ambas, para sua combinação. Já que o ensino focado na experiência humana, de onde se depreende a língua e a literatura, tem-la como processo e/ou produto discursivo/dialógico, cuja apropriação é dinâmica/evolutiva e dá-se na realização de atividades socialmente signifi- cativas, através das quais os agentes, em relação com a realidade, constroem suas funções psicológicas superiores (AIRES, 2003, p. 24-25). O que significa, por exemplo, vincular o desenvolvimento do homem “às interações entre o sujeito e a sociedade, à cultura e à sua história de vida, além das oportunidades e situações de aprendizagem” (DAMASCENO; FER- NANDES; VERONEZ, 2005, p. 538). Da primeira à última atividade realizada, os alunos, e as suas identidades socioculturais, estarão em um processo de interação dialógico-colaborativo, mediado pelos sistemas de significação por eles manipulados na rede, sob uma proposta de aprendizagem não mais ancorada em modelos de comunicação unilateral (PALLOFF; PRATT, 2003 apud AIRES, 2003, p. 28). O professor facilitará esse empreendimento, procurando dinamizar a realização de tais tarefas, sem tolher o caráter coletivo da construção do significado que reveste a referida proposta de aprendizagem. “[...] há no estudo da obra literária um momento analítico [...] que precisa dei- xar em suspenso problemas relativos ao autor, ao valor, à atuação psíquica e social, a fim de reforçar uma concen- tração necessária na obra como objeto de conhecimento; e há um momento crítico, que indaga sobre a validade da obra e sua função como síntese e pro- jeção da experiência humana” (CAN- DIDO, 1972, p. 804).
  • 15. 13 Daí a adoção do Facebook (página inicial, perfil, grupos e páginas) enquanto ambiente digital de ensino e aprendiza- gem e, inevitavelmente, a de alguns de seus recursos e/ou ferramentas (documentos, bate-papo, tarefas, eventos, discussões, comentários / avaliação, mensagens, vídeos e outros). A qual também se justifica em virtude de uma das constatações de Malini (2014) em sua pesquisa sobre a contribuição dos fluxos conversacionais das redes sociais à construção de laços e debate público entre os autores de literatura brasileira e o seu público; neste caso, a de que os seus usuários, em especial os jovens, têm reputado, com frequência, em atividades de participação e engajamento social, autores e obras literárias (fenô- meno de hipermidiatização da literatura, responsável pela demarcação de novos públicos, espaços de circulação e mediado- res). O Facebook (e seus recursos) enquanto ambiente e/ou ferramenta digital de aprendizagem Anunciado pela companhia correspondente como um site a partir do qual as pessoas, após cadastradas, conectam-se umas às outras para a publicação, fornecimento ou compartilhamento daquilo que desejam (conteúdo de natureza e formato diversos), o Facebook constitui uma rede social virtual que abrange recursos e serviços variados úteis à personalização de tal uso, dentre os quais estes são fundamentais a sua assimilação, de acordo com Baird, Foog e Phillips (2011): • Página inicial: exclusivamente do usuário, apresenta um fluxo contínuo de atualizações de seus amigos, páginas por ele curtidas ou grupos aos quais pertence; espécie de painel de inicialização; • Perfil: diferente da página inicial, reúne as informações pessoais do usuário declaradas no ato de sua inscrição e atualizadas posteriormente, além dos conteúdos por ele compartilhados, de acesso irrestrito, ou não, aos demais; • Grupos: espaço de interação e compartilhamento de conteúdo criado por um grupo de usuários, de acesso e utilização condicionados à configuração de privacidade; e,
  • 16. 14 • Páginas: espaço público de interação com um grupo específico de usuários, para o compartilhamento de conte- údo, por parte do administrador, dos demais membros elevados à categoria de editores e/ou dos eventuais visi- tantes, cujas atualizações são automaticamente comunicadas àqueles que o curtem. No guia que fornecem aos professores para a transformação dos desafios do Facebook em oportunidades de ensino e de aprendizagem, a propósito, Baird, Foog e Phillips (2011) indicam estratégias subsidiárias da criação de uma política de mídia social útil aos objetivos educacionais das instituições de ensino, ao estabelecimento do manuseio crítico-reflexivo da plataforma (diretrizes de segurança e privacidade) e à promoção da cidadania digital; sugerindo a adoção dos estilos de apren- dizagem móvel (interativa, centrada no aluno, autêntica, colaborativa e sob demanda), com a adequação de seus recursos a esse contexto. O que, em um empreendimento didático-pedagógico, significa, por exemplo, inscrever a interação entre professor e aluno em atividades como a criação de grupos para o ensino e a aprendizagem colaborativos (professor/alunos, alunos/alu- nos, alunos/professor), ou qualquer outra demanda educativa, com a formulação e a resposta de questões de estudo; e, a de páginas, para a ampliação do ensino e da aprendizagem além da sala de aula, através do compartilhamento de conteúdo complementar. De modo que a consulta a outros tutoriais, quanto ao uso genérico da referida rede social, justificar-se-ia, ao professor e ao aluno, em caso de introdução ou aperfeiçoamento A imprescindibilidade das tecnologias digitais de informação e comunicação A despeito do que já se afirmou sobre as potencialidades educativas do Facebook, especificamente em um projeto didático-pedagógico como esse, há de se reconhecer a imprescindibilidade da utilização do computador e da internet en- quanto tecnologias digitais de informação e comunicação, que, por representarem o paradigma sócio-econômico-tecnológico Tutoriais recomendados quanto ao uso genérico do Facebook* Autoria Título CASTRO (2011) Como funci- ona o Face- book? UOL (2012) Manual do Fa- cebook: o que você precisa saber para usar a rede social *Nesse sentido, destaca-se, também, o “Guia essencial: Facebook”, que, publicado em 2015 pela editora bra- sileira On Line, promote “198 dicas para dominar a rede social”, ao longo de suas 145 páginas, subdividas nas seções: “Seu perfil”, “Fazendo ami- gos”, “Grupos & eventos”, “Uso co- mercial”, “Apps do Facebook”, “Fa- cebook móvel”, “Mais apps”. Atual- mente, ele é comercializado sob o formato de e-book, na Loja Kindle e no Google Livros.
  • 17. 15 da pós-modernidade, no qual um novo éthos, não necessariamente próximo de uma cultura participativa, surge, precisam contribuir à problematização deste em suas diferentes configurações. (KNOBEL; LANKSHEAR, 2012). Ainda no que se refere a esse paradigma, Lipovetsky (2004 apud BARBOSA; ROJO, 2015, p. 116) propõe tomá-lo como de radicalização da modernidade, alcunhando o conceito de hipermodernidade, pois, como justificam Barbosa e Rojo (Ibid., p. 117-120), os princípios da modernidade, a exemplo da “racionalidade técnica ou desenvolvimento tecnológico- científico, economia de mercado, valorização da democracia e extensão da lógica individualista”, agora se renovam/desdo- bram continuamente, desencadeando fenômenos como o da hipercomplexidade (lógica paradoxal), hiperconsumo (lógica hedonista) e hiperindividualismo (lógica narcisista) que, associados ao das TDICs, naturalmente implementam a cultura da convergência, mas, não a cultura participativa. Razão pela qual, “no contexto da hipermodernidade, está em jogo a dimensão de uma formação pautada pela ética da responsabilidade (pelo outro)” (Ibid., p. 131). Desse modo, além de contemplar os multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2009), por tencionar o reconheci- mento das múltiplas culturas e das múltiplas linguagens coexistentes no Facebook, ainda que sob o recorte do discurso literário; este projeto abrange os novos letramentos (KNOBEL; LANKSHEAR, 2012), por incitar uma reflexão sobre a importância de uma cultura mais responsiva às necessidades e satisfações humanas, favorecendo sua instauração. CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO A avaliação que se pretende instaurar nas / das situações de ensino e de aprendizagem propostas no presente projeto didático-pedagógico, em virtude de seu objetivo geral, distancia-se daquela comum às escolas nos anos 70 e 80 do século XX. Compromete-se, antes, com o desenvolvimento de habilidades e competências por parte dos alunos, sob uma perspec- tiva formativa e não classificatória, já disseminada, inclusive, entre os professores, sobretudo pelo modo como se realiza, Entende-se por éthos a tendência para se pensar, agir e organizar a pró- pria vida a partir dos modos acentu- ados pelo paradigma ao qual se vin- cula. Em se tratando do paradigma sócio-econômico-tecnológico da pós-modernidade, o éthos a ele cor- respondente é marcado pelos aspec- tos da multiplicidade, descentraliza- ção, dispersão / modulação, aber- tura / ilimitabilidade, dinamismo / fluidez / flexibilidade, não-lineari- dade, colaboração / coletividade.
  • 18. 16 neste caso, contínua e formalmente. Mas, para a incorporação e reconfiguração das relações estabelecidas entre o conheci- mento e a realidade; para a aproximação real dos sujeitos com a vida social, em que pese a existência humana digna. Sua concepção é a de prática social e escolar: supõe a adoção de instrumentos elaborados sob os princípios da complexificação e da heterogeneidade da realidade, menos quantificável do que qualificável (CATANI; GALLEGO, 2009). Na perspectiva de Luckesi (1994[2009]), trata-se de inscrevê-la nas aspirações socializantes da humanidade, que, in- dependentemente de serem traduzidas em um modelo social e em uma concepção teórico-prática de educação autoritários ou democráticos, devem servir, por contradição ou congruidade a sua própria natureza, à transformação social, operada na formação e capacitação do aluno para a autonomia intelectual, mas, eticamente regulada. De resgatar o seu caráter diagnós- tico, sem a abdicação do rigor técnico e científico necessário à elaboração de instrumentos mais objetivos na tomada de decisão que espera possibilitar ao professor e ao aluno, quanto ao (re) encaminhamento do processo de ensino e de apren- dizagem. De utilizá-la na compreensão da “dinâmica da assimilação ativa dos conteúdos socioculturais e do desenvolvimento das capacidades cognoscitivas do educando”, cujos aspectos constitutivos são três: 1 Assimilação receptiva (recepção atenta e inteligível) de conhecimentos (saber já elaborado, interpretações já produzidas sobre a realidade), metodologias (concepção segundo a qual a realidade é abordada) visões de mundo (visões valorativas); 2 Exercitação (internalização reprodutiva) dos conhecimentos e metodologias, construção das capacidades; 3 Inventividade (ação criativa, que soma a assimilação dos conteúdos socioculturais e a intuição, o insight, a espontanei- dade, o risco). (Ibid., p.136-142). De certo modo, alude-se à concepção de avaliação qualitativa tal como a concebe Demo (1987 [1991], p. 24), para quem, nela, “não vale o maior, mas o melhor; não o extenso, mas o intenso; não o violento, mas o envolvente; não a pressão, mas a impregnação”; razão pela qual justifica-se o seu “estilo cultural, mais que tecnológico; artístico, mais que produtivo; Por que uma autonomia etica- mente regulada? Quando impelido à (re) construção da realidade, através de sua (re) apro- priação (o que a escola, inclusive, busca, a ele, oportunizar, embora, com um certo alcance, é claro); o su- jeito não deve, para tal, basear-se, apenas, em suas determinações indi- viduais, singulares, mas, de igual modo, nas determinações mais uni- versais, macroestruturais, articu- lando-as, todas, porque, a despeito de sua moral, às vezes, controversa, é preciso agir eticamente, conforme adverte Casali (2001, p. 118-123), para quem, enquanto “a moral [...] seria um fenômeno de ordem parcial [,] [...] a ética [...] [,] uma reflexão crí- tica sobre a moralidade [...] [,] um conjunto de princípios e disposições [...] para [...] balizar as ações huma- nas”.
  • 19. 17 lúdico, mais que eficiente; sábio, mais que científico”, sem a exclusão, é claro, dos aspectos secundarizados nessa configura- ção, se considerada a utilidade relativa dos mesmos à compreensão da realidade nos moldes da avaliação quantitativa, não dispensada de todo. Neste caso, O que está em jogo [...] é principalmente a qualidade política, ou seja, a arte da comunidade de se autogerir, a criatividade cultural que demonstra em sua história e espera para o futuro, a capacidade de inventar seu espaço próprio, forjando sua autodefinição, sua autodeterminação, sua autopromoção, dentro dos condicionamentos objetivos. (Ibid., p. 28). Trata-se da avaliação enquanto iniciativa interna, factível, em profundidade, porque desenvolvida sob a forma de auto-expressão ou de autodiagnóstico da comunidade, na análise do fenômeno participativo (DEMO, 1987 [1991], p. 30); podendo, a escola, dela se apropriar, para a sistematização e/ou o monitoramento da ação pedagógica, embora esse desloca- mento teórico imponha, como quaisquer outros, restrições de ordem metodológica. A este projeto didático, ela serve, espe- cialmente, pela proposição dos três níveis de procedimentos avaliativos da participação qualitativa: a) conversar, bater papo, estar juntos – coincide com a necessidade de convivência; b) participar da vida comunitária – coincide com a necessidade de vivência; c) assumir o projeto político da comunidade – coincide com a necessidade de identificação ideológica. (Ibid., p. 32). Assim, sob uma perspectiva dialógica, colaborativa e mediadora de avaliação, recomenda-se a adoção de uma varie- dade de instrumentos e critérios, capaz de contemplar as dimensões conceitual, procedimental e atitudinal através dos quais os conteúdos não por acaso se (re) constroem; e que, a exemplo dos sugeridos abaixo, os quais, a propósito, somente no projeto serão pormenorizados, mostrem-se reconfiguráveis, na seleção, ordenação e articulação de seus aspectos constituti- vos, até mesmo em virtude da eventual escolha, por parte do professor, de outros princípios teóricos, de expressão pedagó- gica, psicológicas e/ou linguística:
  • 20. 18 Conteúdo Avaliação* Dimensão Item Instrumento Critério Atitudinal,procedimentale/ouconceitual Participação qualitativa Enquete Variedade do tipo de necessidade participativa experienciado: de convivên- cia, de vivência e/ou de identificação ideológica (DEMO, 1987 [1991], p. 32). Cooperação Observação Grau de interação e participação em discussões e diálogos, analisado pela quantidade e qualidade das mensagens trocadas [nível da comunicação]; contribuição, analisado pela quantidade e pela qualidade de contribuições na construção de um produto coletivo e pela construção / inferência sobre as contribuições de outros membros do grupo [nível da construção coletiva]; concentração e organização, analisado pela presença da liderança, pelo en- volvimento com a definição do processo e pelo cumprimento das tarefas [nível da coordenação]; e, do entendimento do processo, analisado pelo entendimento da tarefa e suas relações [nível da percepção] (BORGES; SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p. 260). (Re) cons- trução do conheci- mento em face dos conteúdos conceituais elencados Pesquisa No âmbito do conteúdo: atendimento à proposta, significância da contribui- ção, profundidade na abordagem, relevância das referências selecionadas etc.; e, no âmbito da estrutura, organicidade, clareza da linguagem, configu- ração estética etc. (ALMEIDA; OKADA, 2006, p. 278). Debate Tipos de mensagem – em uma escala, da de menor à de maior valor: men- sagens de administração (tratam de assuntos de administração do curso e/ou de problemas pessoais), vazias (mensagens sem conteúdo), com pouca con- tribuição (apresentam ponto de vista relevante, mas sobre assunto correlato ao tema em debate e que não geram respostas e/ou complementações), com muita contribuição (discutem o tema em debate, apresentam pontos de vista relevantes e incentivam o debate, gerando outras mensagens como resposta ou como complementação) e de coordenação (mensagens de membro do grupo que espontaneamente, ou indicado pelos demais membros, toma o encargo de ajudar na divisão de tarefas, no cumprimento dos prazos e, em alguns casos, na conclusão da tarefa) (BORGES; SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p. 261). Relatório analítico e outras ativi- dades escritas Realização, pertinência ou adequação aos objetivos educacionais estabeleci- dos; além de consistência, clareza e concisão. *Realização preferencialmente no ambiente virtual de aprendizagem selecionado
  • 21. 19 PARTE SEGUNDA: A CASA PROJETO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO DE AGENCIAMENTO DO SABER LITERÁRIO Tema: • Literatura e sociedade no Facebook: da palavra alheia dos outros a minha palavra. Público-alvo: • Alunos do Ensino Médio optantes por sua matrícula no Ensino Médio Inovador, especificamente em algum com- ponente curricular que, oferecido sob o formato de oficina, ou qualquer outro tão flexível quanto, permita a articu- lação de atividades de leitura e letramento literário às de comunicação, cultura digital, uso de mídias e tecnologias. Esses dois tipos de atividades, de leitura e letramento literário e de comunicação, cultura digital, uso de mídias e tecnologias correspondem a dois macrocampos apontados pelo Pro- grama Ensino Médio Inovador (ProEMI) enquanto eixos de integração curricular, ou seja, campos de “ação pedagógico-curricular no qual se desenvolvem atividades interativas, inte- gradas e integradoras dos conhecimentos e saberes, dos tempos, dos espaços e dos sujeitos envolvidos com a ação educacional” (BRASIL, 2014, p. 8): “Leitura e Letramento” (de oferta obrigatória) e “Comunicação, Cultura Digital e Uso de Mídias” (de oferta opcional). Por isso, devem integrar o Projeto de Redesenho Curricular (PRC), cuja elaboração, anual e sob responsabilidade das escolas aderentes ao ProEMI, equivale à proposição de ações di- dático-pedagógicas, nessa perspectiva dos macrocampos, devidamente descritas / detalha- das, com a indicação das áreas de conhecimento e dos componentes curriculares envolvidos. Entretanto, este projeto, sobretudo pelos conteúdos e objetivos estabelecidos, pode ser adaptado para execução em outros formatos de ações didático-pedagógicas, como “discipli- nas optativas, [...] clubes de interesse, seminários integrados, grupos de pesquisa, trabalhos de campo e demais ações interdisciplinares” (Ibid., p. 6); e, inclusive, vale a ressalva, em disciplinas obrigatórias, como a de “Língua Portuguesa e Literatura Brasileira”, comum às três séries do curso. Neste último caso, o professor, de uma escola não necessariamente aderente ao ProEMI, optaria por sua execução no momento que lhe aprouvesse, redefi- nindo, é claro, algumas de suas circunstâncias.
  • 22. 20 Período e carga horária (semanal / total): • Ao longo de um bimestre ou uma unidade didática, em atividades curriculares de, aproximadamente, 5 h/a semanais, perfazendo, ao final, 50 h/a. Objetivo geral: • Favorecer a investigação do discurso literário hoje (re) produzido nas redes sociais virtuais, a exemplo do Facebook, bem como a dos sistemas de ideias e das relações sociais a ele coexistentes, em um trabalho que, de detecção das influências mútuas entre texto literário e o ambiente sócio-histórico-cultural de sua inscrição, não se limite a um estudo da história da literatura, mas, agencie o amadurecimento sensível dos leitores ora destacados, proporcionando- lhes o hábito da leitura literária significada e, eventualmente, o da produção. Objetivo (s) específico (s): • Subsidiar o desenvolvimento e/ou no aperfeiçoamento de cinco habilidades, vinculadas a algumas das competências estabelecidas na Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias para o ENEM (2009): a) inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedi- mentos argumentativos utilizados; b) estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político; c) analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e precon- ceitos; d) relacionar as tecnologias de comunicação e informação ao desenvolvimento das sociedades e ao conhecimento que elas produzem; e,
  • 23. 21 e) reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação. Conteúdos: • Literatura, internet (redes sociais virtuais) e a formação do homem; • A atualidade e o passado imediato do texto literário, quanto aos sentidos culturais de sua inscrição nas atividades produtora e/ou receptora; • O necessário diálogo entre textos literários de uma mesma época ou de épocas diferentes, ou entre os sentidos cul- turais que lhes atribuem as atividades produtora e/ou receptora, para a superação do seu fechamento, de sua unila- teralidade; • O debate público da literatura brasileira em redes sociais virtuais como o Facebook; • Literatura e engajamento. Recursos: • Facebook (página inicial, perfil, grupos e páginas) enquanto ambiente digital de ensino e aprendizagem; alguns de seus recursos e/ou ferramentas (documentos, bate-papo, tarefas, eventos, discussões, comentários / avaliação, men- sagens, vídeos e outros); e, fundamentalmente, ambientes equipados com computadores (laboratório de informática, por exemplo), para o desenvolvimento presencial das atividades didático-pedagógicas propostas. Implementação: Espera-se que os actantes não en- frentem maiores dificuldades em re- alizar no Facebook as atividades pro- postas, quanto à manipulação do ambiente e das ferramentas arrola- dos, por já comporem as estatísticas do uso massivo dessa rede social vir- tual, estando familiarizados com as tecnologias digitais de informação e comunicação, além de atraídos pela oficina subsidiário do presente pro- jeto didático-pedagógico; ou que, di- ante do oposto, em relação ao pri- meiro argumento, explorem os tuto- riais anteriormente recomendados para o acesso e a potencialização do uso do Facebook.
  • 24. 22 Etapa 1/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas) Conteúdo Literatura, internet (redes sociais virtuais) e a formação do homem Atividade Problematização da própria prática de leitura e escrita literária ambientada na Internet, em uma atividade (auto) avaliativa dos efeitos dessa experimentação em seu processo formativo Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante Grupo fechado (Facebook) Publicação de arquivos de texto, imagem e/ou de ví- deo Motivação à problematiza- ção Professor Comentário e enquete Problematização Alunos e professor Etapa 2/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas) Conteúdo A atualidade e o passado imediato do texto literário, quanto aos sentidos culturais de sua inscrição nas ativi- dades produtora e/ou receptora Atividade Busca de textos literários (re) produzidos no próprio perfil do Facebook e/ou nos perfis / páginas de autores da literatura brasileira; e, inferência das circunstâncias de (re) produção dos mesmos, através da análise dos procedimentos argumentativos supostos (objetivos do produtor, público alvo) Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante Grupo fechado (Facebook) Publicação de postagem Instrução à atividade de pesquisa Professor Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Resposta à atividade de pes- quisa Alunos Comentário Análise do produto de pes- quisa Alunos e professor Perfil dos alunos e/u perfis e páginas de autores da lite- ratura brasileira (Facebook) Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Extração das informações úteis à realização da pes- quisa anteriormente descrita Alunos Talvez seja oportuno problematizar antes a própria concepção de litera- tura formulada até então por ambos, aluno e professor; com a leitura de algum texto que viabilize essa discus- são, a exemplo de “Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se ou- tras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é literatura?” (LAJOLO, 2001), ou, quem sabe, um livro, “Desco- brindo a literatura” (LAJOLO, 2005). Sobre a utilidade da literatura, outra problematização necessária, a leitura de “Afinal, para que serve a li- teratura?” (LAJOLO, 2005) é parti- cularmente recomendada. Já no que diz respeito à da própria prática de leitura e escrita literária ambientada na Internet, ou a sua ausência, “Lite- ratura, Twitter e Facebook: a econo- mia dos likes e dos rts dos usuários- fãs de literatura brasileira nas redes sociais” (MALINI, 2014). Os outros dois textos, não o livro, encontram-se na seção dos anexos. Importa, aqui, precaver-se, quanto à busca de textos literários (re) produ- zidos, no Facebook, em perfis / pá- ginas de autores da literatura brasi- leira, elaborando previamente uma lista de links com exemplos.
  • 25. 23 Etapa 3/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas) Conteúdo O necessário diálogo entre textos literários de uma mesma época ou de épocas diferentes, ou entre os sen- tidos culturais que lhes atribuem as atividades produtora e/ou receptora, para a superação do seu fecha- mento, de sua unilateralidade Atividade Localização, nos textos literários anteriormente reunidos, de aspectos do contexto sócio-histórico-cultural de sua (re) produção e recepção; e, sua discussão Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante Grupo fechado (Facebook) Publicação de postagem Instrução à atividade Professor Publicação de postagem ou comentário Resposta à atividade Alunos e professor Etapa 4/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas) Conteúdo O debate público da literatura brasileira em redes sociais virtuais como o Facebook Atividade Análise da contribuição do fluxo conversacional do Facebook (postagem  comentário e/ou compartilha- mento  postagem), materializado na (re) produção e na recepção dos referidos textos literários, à constru- ção do debate público dos sistemas de ideias por eles suportados Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante Grupo fechado (Facebook) Publicação de postagem Instrução à atividade de pesquisa Professor Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Resposta à atividade de pes- quisa Alunos Comentário Análise do produto de pes- quisa Alunos e professor Perfil dos alunos e/u perfis e páginas de autores da lite- ratura brasileira (Facebook) Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Extração das informações úteis à realização da pes- quisa anteriormente descrita Alunos Antes, provocar os alunos quanto ao reconhecimento do diálogo entre de- terminados textos, literários e não li- terários, escritos em épocas diferen- tes; a saber: de Lima Barreto, “Pro- vidências governamentais” (1921); de Atila Roque, “Direitos humanos são inegociáveis” (2016); de Gracili- ano Ramos, “Cadeia” (fragmento) (1938); de Alexandre Beck, uma das tiras “Armandinho” (2016) – todos eles não por acaso reunidos sob o tí- tulo “O que pode a (nossa) palavra, ao longo de 34.935 dias?” (vide ane- xos). Outra proposta de provocação inte- ressante: identificar a temporalidade destes contos de Monteiro Lobato: “Vidinha ociosa” e “Um homem de consciência”. Ou, ainda, de um dos trechos de Lima Barreto, em “Os bruzundangas”, no qual se descreve uma determinada sociedade (vide anexos).
  • 26. 24 Etapa 5/5 Extensão sugerida (carga horária) 10h (duas oficinas) Conteúdo Literatura e engajamento Atividade Pesquisa / debate de notícias e/ou reportagens de ampla repercussão nos cenários mundial e/ou brasileiro, em páginas mantidas no Facebook por jornais e revistas nacionais; e, produção literária motivada por esse processo Ambiente Ferramenta digital Perspectiva de uso Actante Grupo fechado (Facebook) Publicação de postagem Instrução à atividade de pesquisa Professor Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Resposta à atividade de pes- quisa Alunos Comentário Análise do produto de pes- quisa Alunos e professor Páginas de jornais ou revis- tas nacionais (Facebook) Compartilhamento de pos- tagem e/ou páginas Extração das informações úteis à realização da pes- quisa anteriormente descrita Alunos Página do projeto (Face- book) Publicação de postagem Descrição do projeto Professor Exposição do produto fina, o texto literário de autoria discente Alunos Avaliação: A avaliação, tanto da implementação do projeto, quanto à da aprendizagem discente, é proposta sob instrumentos e critérios variados, ao longo das etapas, a fim de suscitar, entre os alunos e o professor, a autoavaliação colaborativa para a revisitação dos próprios percursos e processos formativos, possibilitando, ao segundo, o incentivo, o favorecimento e o acompanhamento do amadurecimento sensível daqueles, supostamente agenciado pelas atividades de leitura e de escrita literária empreendidas, tal como planejadas:
  • 27. 25 • Comuns a todas as etapas, sempre por ocasião de seu encerramento: o Uma enquete realizada, no Facebook (grupo fechado), pelos alunos, a respeito de sua participação quali- tativa (DEMO, 1987 [1991], p. 32): A realização do objetivo estabelecido para essa etapa, [descrever o objetivo], exigiu-lhe que tipo de necessidade participativa? Se preferir, comente suas impressões a esse respeito, logo abaixo. ( ) Necessidade de convivência. ( ) Necessidade de vivência. ( ) Necessidade de identificação ideológica. o Uma análise realizada, em sala de aula, pelo professor, no início da etapa subsequente à avaliada, sobre o nível de cooperação entre os alunos (BORGES; SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p. 260), em reposta à enquete já descrita: Nível de cooperação Critério Comunica- ção Grau de interação e participação em discussões e diálogos, analisado pela quantidade e qualidade das mensagens trocadas. Construção coletiva Grau de contribuição, analisado pela quantidade e pela qualidade de contribuições na construção de um produto coletivo e pela construção / inferência sobre as contribuições de outros membros do grupo. Coordena- ção Grau de concentração e organização, analisado pela presença da liderança, pelo envol- vimento com a definição do processo e pelo cumprimento das tarefas. Percepção Grau do entendimento do processo, analisado pelo entendimento da tarefa e suas rela- ções. • Em determinadas etapas:
  • 28. 26 o Feedback crítico, por parte do professor, ou dos alunos, na eventualidade de uns avaliarem os outros, com critérios estabelecidos em função do tipo de atividade: ▪ Pesquisa (no compartilhamento de páginas ou publicações próprias da rede social ou de outros sites, bem como na criação de documento) (ALMEIDA; OKADA, 2006, p. 278): Feedback crítico 1 2 3 4 5 Conteúdo Proposta atendida? Tema relevante? Assunto interessante? Contribuições significativas? Profundidade da abordagem? Ideias bem articuladas? Referências bem selecionadas? Estrutura Organização do trabalho? Linguagem clara? Apresentação objetiva? Rigor técnico? Configuração estética? 1 = insuficiente, 2 = razoável, 3 = bom, 4 = ótimo, 5 = excelente ▪ Debate (em comentário relacionado à postagem disparadora) (BORGES; SANTORO; SANTOS, 2004 apud SANTOS, 2006, p. 261): Tipo de mensa- gem* Descrição Valor** Mensagens de administração Tratam de assuntos de administração do curso e/ou de proble- mas pessoais. 0% Mensagens va- zias Mensagens sem conteúdo. 0%
  • 29. 27 Mensagens com pouca contri- buição Apresentam ponto de vista relevante, mas sobre assunto corre- lato ao tema em debate e que não geram respostas e/ou com- plementações. 25% a 50% Mensagens com muita contribui- ção Discutem o tema em debate, apresentam pontos de vista rele- vantes e incentivam o debate, gerando outras mensagens como resposta ou como complementação. 50% a 100% Mensagens de coordenação Mensagens de membro do grupo que espontaneamente, ou in- dicado pelos demais membros, toma o encargo de ajudar na di- visão de tarefas, no cumprimento dos prazos e, em alguns casos, na conclusão da tarefa. 50% a 100% * Mensagem postada no fórum, aqui em uma proposta de substituição pelo comentário relacio- nado à postagem disparadora de debate. **Os autores propõem um intervalo de 0 a 2 pontos, aqui adaptado à escala percentual. ▪ Relato analítico e outras atividades escritas (na criação de documento e/ou em comentário rela- cionado à postagem disparadora): • Realização, pertinência ou adequação aos objetivos educacionais estabelecidos; além de consistência, clareza e concisão.
  • 30. 28
  • 31. 29 REFERÊNCIAS ABOS, Márcia. Consumo da literatura é mediado pelas redes sociais. O Globo, Rio de Janeiro, 30 jul. 2014. Disponível em: <goo.gl/jYFrU6>. Acesso em: 14 jun. 2017. AIRES, Luísa. (2003). Do silêncio à polifonia: contributos da teoria sociocultural para a educação online. Disponível em: <goo.gl/R5jpAj>. Acesso em: 14 jun. 2017. ALMEIDA, Fernando José de; OKADA, Alexandra Lilaváti P. Avaliar é bom, avaliar faz bem. In: SANTOS, Edméa; SILVA, Marco (Org.s). Avaliação da aprendizagem em educação online: fundamentos, interfaces e dispositivos, relatos de ex- periências. São Paulo: Edições Loyola, 2006. p. 267-287. BAIRD, Derek E.; FOGG, BJ.; PHILLIPS, Linda Fogg. Guia Facebook para educadores. Facebook for educators, [S.l.], jun. 2011. Disponível em: <goo.gl/dYRKzG>. Acesso em: 14 jun. 2017. BAKHTIN, Mikhail. (1978). Os gêneros do discurso. In: ______. Estética da criação verbal. Tradução: Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011. p. 261-306. BARBOSA, Jacqueline Peixoto; ROJO, Roxane Helena Rodrigues. Gêneros do discurso, multiletramentos e hipermoderni- dade. In: _____. Hipermodernidade, multiletramentos e gêneros discursivos. São Paulo: Parábola Editorial, 2015. p. 115-145. BARRETO, Lima. Os bruzundangas: a sociedade [fragmento]. 4. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 81 a 84. ______. Providências governamentais. In: ______. Sátiras e outras subversões. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2016. p. 86-88, 485. BECK, Alexandre. Tira “Armandinho”. Armandinho, [S.l.]: 22 set. 2016. Disponível em: <goo.gl/CjMgaM>. Acesso em: 14 jun. 2017.
  • 32. 30 BLOOM, Harold. (2000). Por que ler? In: ______. Como e por que ler. Tradução: José Roberto O’Shea. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. p. 17-25. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Orientações curriculares para o ensino médio: lingua- gens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC, SEB, 2006. Disponível em: <goo.gl/8JJDgz>. Acesso em: 14 jun. 2017. ______. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Matrizes de referência para o Enem: matriz de referência de linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC, INEP, 2009. Dis- ponível em: <goo.gl/z3xIAb>. Acesso em: 14 jun. 2017. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Programa Ensino Médio Inovador: documento orienta- dor. Brasília: MEC, SEB, 2014. Disponível em: <goo.gl/NCGgBG>. Acesso em: 14 jun. 2017. CANDIDO, Antonio. A literatura e a formação do homem. Ciência e Cultura, São Paulo, v. 24, n. 9, p. 803-809, set. 1972. ______. (1988). O direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 5. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2011. p. 171-193. CASALI, Alipio. Saberes e procederes escolares: o singular, o parcial, o universal. In: FAZENDA, Ivani Catarina Arantes; SEVERINO, Antônio Joaquim (Orgs.). Conhecimento, pesquisa e educação. Campinas, SP: Papirus, 2001. p. 109-124. CASTRO, Janaina. Como funciona o Facebook? Nova Escola, São Paulo, abr. 2011. Disponível em: <goo.gl/uyUNWC>. Acesso em: 14 jun. 2017. CATANI, Denice Barbara; GALLEGO, Rita de Cassia. Avaliação. São Paulo: Editora UNESP, 2009. COPE, Bill; KALANTZIS, Mary. “Multiliteracies”: new literacies, new learning. Pedagogies: As International Journal, v. 4, n. 3, p. 164-195, jul. 2009. Disponível em: <goo.gl/3oqAzu>. Acesso em: 14 jun. 2017. CORRÊA, Barbara Raquel do Prado Gimenez; FERREIA, Jacques de Lima; TORRES, Patrícia Lupion. O uso pedagógico da rede social Facebook. Colabor@, Porto Alegre, v. 7, n. 28, 2012. Disponível em: <goo.gl/49yrFz>. Acesso em: 14 jun. 2017.
  • 33. 31 DAMASCENO, Benedito Pereira; FERNANDES, Yvens Barbosa; VERONEZI, Rafaela Júlia Batista. Funções psicológicas superiores: origem social e natureza mediada. Rev. Ciênc. Méd., Campinas, 14(6), p. 537-541, nov./dez., 2005. Disponível em: <goo.gl/5CV9ef>. Acesso em: 14 jun. 2017. DEMO, Pedro. (1987). Avaliação qualitativa. 3. ed. São Paulo: Cortez; Autores Associados, 1991. ECO, Umberto. (2000). Sobre algumas funções da literatura. In: ______. Sobre a literatura. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2003. p. 9-21. FERNANDES, Luís. Redes sociais online e educação: contributo do Facebook no contexto das comunidades virtuais de aprendentes, Lisboa, 2011. Disponível em: <goo.gl/hdHzht>. Acesso em: 14 jun. 2017. GERALDI, João Wanderley. (1981). Concepções de linguagem e ensino de português. In: ______ (Org.). O texto na sala de aula. 4. ed. São Paulo: Ática, 2006. p. 39-46. KNOBEL, Michele; LANKSHEAR, Colin. “New” literacies: technologies and values. Teknokultura, v. 9, n. 1, p. 45-69, jun. 2012. Disponível em: <goo.gl/5FesJW>. Acesso em: 14 jun. 2017. LAJOLO, Marisa. Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anôni- mos, e se pergunta: o que é literatura? In: ______. Literatura: leitores & leitura. São Paulo: Moderna, 2001, p. 7-11. ______. Afinal, para que serve a literatura? In: ______. Descobrindo a literatura. São Paulo: Ática, 2005. p. 62-63. LOBATO, Monteiro. Cidades mortas: vidinha ociosa. In: ______. Contos completos. São Paulo: Biblioteca Azul, 2014. p. 202-209. ______. Cidades mortas: um homem de consciência. In: ______. Contos completos. São Paulo: Biblioteca Azul, 2014. p. 322-323. LUCKESI, Cipriano. (1994). Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 20. ed. São Paulo: Cortez, 2009.
  • 34. 32 MALINI, Fabio. Literatura, Twitter e Facebook: a economia dos likes e dos rts dos usuários-fãs de literatura brasileira nas redes sociais. Revista Observatório Itaú Cultural, São Paulo, n. 17, p. 204-233, ago. / dez. 2014. Disponível em: <goo.gl/W1pzeV>. Acesso em: 14 jun. 2017. MORAES, Alexandra; KAZ, Roberto. Pequenas epifanias: frases do ex-maldito Caio Fernando Abreu viram febre nas redes sociais, onde antes reinava Clarice Lispector. Folha de S. Paulo, São Paulo, 30 out. 2011. Disponível em: <goo.gl/M6J2Kj>. Acesso em: 14 jun. 2017. RAMOS, Graciliano. (1938). Vidas secas. 120. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2013. ROJO, Roxane Helena Rodrigues. Pedagogia dos multiletramentos: diversidade cultural e de linguagens na escola. In: MOURA, Eduardo; ROJO, Roxane Helena Rodrigues (Orgs.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012. p. 11-31. ROQUE, Atila. Direitos humanos são inegociáveis. Politike, 14 jun. 2016. Disponível em: <goo.gl/9RGorW>. Acesso em: 14 jun. 2017. SANTOS, Neide. Desafios da web: como avaliar alunos online. In: SANTOS, Edméa; SILVA, Marco (Org.s). Avaliação da aprendizagem em educação online: fundamentos, interfaces e dispositivos, relatos de experiências. São Paulo: Edições Loyola, 2006. p. 245-265. UOL. Manual do Facebook: o que você precisa saber para usar a rede social. UOL, São Paulo, ago. 2012. Disponível em: <goo.gl/NNJtND>. Acesso em: 14 jun. 2017.
  • 35. 33 ANEXOS ANEXO A – De Marisa Lajolo, “Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é literatura?” Cuidado, leitor! Ao dobrar esta página, Nada tema: o poeta É só um sonho de poema1 Benvindos todos, leitoras e leitores, a estas mal traçadas linhas! Fico encantada de estarmos juntos nesta discussão, no rnomento em que tanta gente anda dizendo que a literatura morreu. Você, eu, seu amigo, minha colega, e todos os outros sócios do Clube de Leitores Anônimos sabemos que é mentira, que a literatura vai bem, obrigada, está vivinha da silva, e até manda lembranças... Mass ela mudou. Mudou muito. Mudou de cara, de endereço e até de família. E tem quem não a reconheça no novo endereço, tem quem desfaça da parentela que veio de longe. Tem uma voz ali atrás, resmungando: então música popular é poesia? Telenovela tem tanto valor quanto romance? Folheto de cordel tem a mesma importância estética que a epopéia... ? São vozes rabugentas, mas paciência, que nesta conversa volta e meia vamos ter de dialogar com estes e com outros resmungos semelhantes. São resmungos de alto coturno: os donos dessas vozes dão aulas, escrevem livros imensos, dão entrevista aos jornais. Quando Já não vestem, pretendem vestir o fardão da academia, e nem se incomodarn que do traje engalanado se desprenda um leve cheiro de mofo... Na semana passada, um jornal de grande tiragem publicou um artigo que dizia muito do que essas vozes dizem: [...]. Viciada na televisão e em histórias em quadrinhos, e já agora também em videogames, a juventude de hoje á pouco amiga dos livros e dá as costas à leitura. Dona de um vocabu- lário muito parco, sua fala é ainda corrompida pela gíria das ruas e pelos estrangeirismos que ameaçam a soberania da língua nacional. Mesmo nos cursos de letras, não poucas vezes 1 Vogt, Carlos. "Advertência". In: Geração. São Paulo, Brasiliense, 1985, p. 9.
  • 36. 34 os clássicos da literatura são substituídos por autores menores, esteticamente inexpressi- vos, que nada têm em comum com a estirpe de um Machado de Assis ou de um Graciliano Ramos. Mas que ninguém se assuste. Esse pessimismo todo não tem nada de novo. Salvo raras exceções, intelectuais e pro- fessores foram sempre do contra quando se trata de novidades culturais. E a literatura hoje ganhou cara nova. A literatura hoje não é mais artesanal nem é produzida por umas poucas indústrias ou escrita por uns poucos escri- tores que têm o monopólio do mercado e da opinião. Hoje a literatura é produzida por uma indústria tão sofisticada quanto a indústria de alimentos, que oferece molho de tomate para todos os gostos, com coentro ou sem cebolinha, com pedaços grandes de tomate ou como creme homogeneizado. Macarronada per tutti! Quando Castro Alves (1847-1871)2 , grande poeta brasileiro, descrevia — há bem mais de um século — seu sonho de um mundo onde houvesse livros, livros a mancheias, estava profetizando o nosso hoje. Pois os livros, a partir de meados do século XX, rnultiplicaram-se vertiginosamente, inclusive no Brasil. Livros de todo feitio, para todo feitio de leitores. Romances de amor para quem curte histórias cheias de beijos intermináveis e quentes, e romances sem amor para quem se amarra em histórias de tráfico, bandidagem e armamento pesado. Histórias com que se gargalha, e histórias com que se sorri de lado. A literatura fala de vários mundos: alguns parecidíssimos com o nosso, onde, por exemplo, tem gente que morre de fome nas ruas, e de mundos muito diferentes, onde vivem espíritos, anjos, energias e demónios. A literatura hoje traz para o nosso lado mundos prometidos pela ciência, com seres artificiais sofisticados e com seres naturais manipu- lados em laboratório. Há histórias com palavras e com imagens e histórias só com imagens. Poemas que são imagens e Imagens que são poemas, poemas curtinhos empilhando palavras, poemas compridos espaçando palavras, poemas com rima, poemas sem rima... Ou seja, arrombou-se a festa, querido leitor. A literatura, hoje, parece estádio de futebol em dia de final de campeonato: sempre cabe mais um, e tem até cambista vendendo ingresso para quem chega tarde. Mas há também, é claro, o setor das numeradas e das cadeiras cativas: pois a literatura de que falam os que resmungam continua viva, vai bem, obrigada, e até manda lembranças. Apenas não está mais sozinha em cena. Está acompanhada e muito bem acompanhada! Ao lado dos romances esotéricos, da poesia de auto-ajuda, 2 Datas de nascimento e morte de escritores brasileiros falecidos, bem como data de publicação de suas obras, são indicadas a partir do Pequeno dicionário de literatura brasileira crítico e bibliográfico), de Massaud Moisés e José Paulo Paes (São Paulo, Cultrix. 1980, 2. ed.). De autores e obras estrangeiros, as informações aqui fornecidas vêm da obra La nuova enciclopedia della letteratura Garzanti, Garzanti Editorial, 1987.
  • 37. 35 da ficção científica e do romance policial, continuam a ser lidos e apreciados os romances de antigamente, as novelas de cavalaria, os chamados clássicos, a poesia. Talvez venham dessas múltiplas faces da literatura os resmungos mal-humorados que zumbem em nossos ouvidos. O que quer dizer que Homero (séc. IX a.C.), Dante Alighieri (1265-1321), Eça de Queirós (1845-1900) e Guimarães Rosa (1908-1967) escreveram, mesmo, coisas excelentes. Excelentes e distintas do que escrevem hoje os Titãs, Paulo Coelho, Rodolfo Cavalcanti e J. Grisham. Mas diferente não quer dizer pior. Só quer dizer diferente. Mas, geralmente, as vozes donas da verdade usam óculos que vêem o diferente como pior e estão habituadas a terem sempre razão. Por mais divergentes e contraditórios que sejam seus pontos de vista sobre a literatura, eles acabam recaindo sempre no mesmo universo. Universo imenso, mas com fronteiras: limitado por Marcel Proust (1871-1922) ao Norte, Jorge Luís Borges (1899-1986) ao Sul, Clarice Lispector (1926-1977) a Leste e... quem mesmo a Oeste? Edgard Allan Poe (1809- 1849)? T. S. Eliot (1888-1965)? Poe e Eliot a Oeste, certo! Além de terem cacife alto, os resmungões não resmungam por mal, coitados. Aprenderam só de um jeito, o deles! Ou seja, embora uns prefiram Oswald de Andrade (1890-1954) e outros Drummond de Andrade (1902-1987), há algo em comum entre eles, além da coincidência de sobrenome dos poetas que preferem. Todos eles assumem as posições que assumem a partir e em nome de uma tradição cultural que vem se construindo há séculos. A questão o que é literatura? para qualquer um deles — como para qualquer intelectual de sua classe e quilate — exige respostas que retomem e atualizem tudo o que até hoje já foi escrito sobre o assunto. Mas essa tradição cultural que os apoia, se tem o respaldo de muitos séculos, tem também a civilização burguesa por horizonte. A civilização burguesa é branca, masculina e bem alfabetizada, não é mesmo, leitores proletários, e leitoras negras? Aquém e além dos que resmungam, uma multidão de gente, você, eu, todos nós, sócios entusiasmados do Clube dos Leitores Anônimos, eventualmente já nos perguntamos e já nos respondemos o que é literatura? Perguntas permanentes, res- postas provisórias. Tão permanentes umas e provisórias outras quanto o são as perguntas e respostas com que lidam os intelectuais do time dos que reclamam e resmungam. Só que sem o reflexo do espelho, das citações, dos interlocutores. Então, em igualdade de condições, é arregaçar as mangas e pagar pra ver. LAJOLO, Marisa. Onde se põem algumas cartas na mesa, tiram-se outras da manga, funda-se o Clube dos Leitores Anônimos, e se pergunta: o que é literatura? In: ______. Literatura: leitores & leitura. São Paulo: Moderna, 2001, p. 7-11. ANEXO B – De Marisa Lajolo, “Afinal, para que serve a literatura?”
  • 38. 36 Você consegue imaginar um mundo sem histórias contadas, sem poemas, sem canções, sem contos, sem filmes? Na verdade, tudo isso é literatura. Ela não é somente uma matéria que a gente estuda na escola. Como todas as artes, a literatura abre portas, cutuca, alimenta ou nos permite “dar asas à imaginação” (essa frase é uma metáfora: imaginação não tem asas...). Ao ler, criamos uma “cara” para os personagens; imaginamos sua voz, seu modo de andar... nos identificamos com uns e antipatizamos com outros, no divertimos e sofremos com eles. Para sentir, para saber... Mas a literatura é também uma importantíssima fonte de conhecimentos, porque através dos livros aprendemos muito sobre o mundo que nos rodeia. É sempre mais fácil aprender quando nos divertimos, e a literatura pode fazer estas duas coisas: divertir e ensinar. Outra função da literatura é a de expressar a cultura, os valores, as tradições dos povos. É isso o que transmitem muitos textos literários, entre eles os chamados “clássico”. “Clássico”, às vezes, se refere apenas ao que tem relação com a Antiguidade grega e latina. Mas significa também “aquilo que é sempre bom”, independentemente da época. Assim, um livro ou um autor, ou uma partida de futebol, um terno do costureiro francês Yves Saint Laurent, um samba do Cartola, podem ser “clássicos”. Também se costuma dizer que a obra clássica, mesmo que pertença a uma época longínqua, reflete valores universais e atemporais, ou seja, que continuam válidos para as pessoas de qualquer época e lugar. Por exemplo, veja o seguinte trecho de um poema de Camões, um “clássico” da literatura portuguesa: Amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente, é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer. Agora, pense: será que essa maneira de imaginar e definir o amor vale somente para a época do poeta (século XVI) ou essas contradições do amor ainda são sentidas nos dias de hoje? Uma arma muito poderosa
  • 39. 37 A literatura pode cumprir também um importante papel de denúncia social. Um escritor comprometido com seu tempo aponta os defeitos e as injustiças da sociedade em que vive. No século XIX, quando os trabalhadores das cidades ou do campo, ou mesmo os escravos, viviam em condições duríssimas de exploração, houve escritores (Charles Dickens na Inglaterra, Émile Zola na França, Aluísio Azevedo e Castro Alves no Brasil...) que refletiram em seus escritos a vida miserável dessas pessoas, contribuindo assim para criar na sociedade a exigência de melhorar as condições de vida. Para terminar, a literatura nos ajuda a pensar, colocando em palavras pensamentos e sentimentos; também pode funcionar como campo de experimentação de linguagens, pois é sempre bom, como diria nosso poeta Manoel de Barros, “usar algumas palavras que ainda não tenham idioma”. LAJOLO, Marisa. Afinal, para que serve a literatura? In: ______. Descobrindo a literatura. São Paulo: Ática, 2005. p. 62-63. ANEXO C – de Lima Barreto, “Providências governamentais” (1921); de Atila Roque, “Direitos humanos são inegociáveis” (2016); de Graciliano Ramos, “Cadeia” (fragmento) (1938); de Alexandre Beck, uma das tiras “Ar- mandinho” (2016) – todos eles não por acaso reunidos sob o título “O que pode a (nossa) palavra, ao longo de 34.935 dias?” PROVIDÊNCIAS GOVERNAMENTAIS3 Por Lima Barreto (29/01/1921) A reunião do ministério foi naquele dia secreta, isto é, não foi anunciada nos jornais. Especialmente convidados, compareceram também, com o informante, o prefeito de polícia e o inspetor dos detetives (aguazil-mor). El-Rey Pechisbeque abriu a sessão fazendo um gesto de quem ia colher o manto de arminho, crivado de abelhas merovíngias4 , e depositou em cima da mesa uma magnífica “Santa Luzia” de cinco olhos5 , todos eles com incrustações de marfim e ouro. Era o seu cetro característico de Carlos Magno com que figurava os seus retratos pululantes. 3 Assinado por Jonathan. Publicado em Careta, n. 658, 29 jan. 1921. 4 Símbolo da imortalidade e ressurreição, as abelhas merovíngias foram escolhidas por Napoleão Bonaparte para compor o brasão de armas da França quando foi proclamado imperador, em 1804, rompendo assim com o símbolo da flor-de-lis usada a partir do reinado de Hugo Capeto, no século X. 5 Referência à palmatória de madeira formada por um círculo e haste, conhecida também por férula ou “menina dos cinco olhos”. Algumas palmatórias continham cinco furos no círculo para vencer a resistência do ar e aumentar a velocidade do golpe. Foi muito usada por professores para castigar alunos.
  • 40. 38 Dirigiu-se, em primeiro lugar, ao ministro das Tropas Militares. Ao contrário das outras sessões ministeriais, Pechisbeque, o grande rei da Pacóvia6 , não estava de bom humor e muito menos gaiato. Falou gravemente: — Sr. dr. Karagafulos: o que vossa excelência sabe de anormal da tropa? — As praças andam muito contentes com o novo uniforme sudanês que lhes impingi; mas os oficiais não estão contentes. Tenho tomado as providências; mas… — Bem. Era de esperar. Mas não há nada como um dia atrás do outro. — O poderoso rei da Nova Zembla7 não os elogiou tanto? — Não os cumulou de distinções e condecorações? Quem foi que promoveu a visita do rei Savoff a nossa terra e, portanto, os elogios que eles receberam, e os “crachás”? — Fui eu? Ingratos! Mil vezes ingratos! Contudo… — Eles se queixam, acudiu o ministro dos Buquês de Recreios Reais; eles se queixam da carestia da vida. — Ora, bolas! Soldado é soldado! Deve estar afeito a tudo. Os de vossa excelência, sr. ministro dos meus Buquês, também se queixam? — Também, majestade; mas a marinhagem, nas horas de recreio, pesca de caniço, crocorocas, micholas, canhanhus, cação-viola; e assim melhoram o rancho ou vendem o pescado, para aumentar o soldo. Encontraram um derivativo… — E os oficiais? — Também se entregam à pescaria. — Sábia gente! — Assim mesmo, majestade, não andam contentes; murmuram, observa o ministro de Vistas Escuras. — Como?! — admirou-se Pechisbeque. — Se eles, para pescar, não pagam imposto, não empatam capital em canoas e botes? Qual! Como é que vossa excelência sabe disso? — Por informações aqui do excelentíssimo juiz de fora Jemi. — Sr. Jemi — indagou o rei —, como é que o senhor tem notícia desse fato? — É, majestade sereníssima, é o que me informa o aguazil-mor que aqui está, a meu lado. — Seu Manchique — fez arrebatadamente o rei —, como é isso? — Trago-lhe aqui um relatório completo do que se diz na cidade. — Dê-mo, Manchique. 6 Pacóvia significa aquilo que é considera ignorante, pouco inteligente ou se deixa facilmente enganar. 7 Nova Zembla (ou Nova Zemlia) é um arquipélago localizado próximo ao continente ao norte da Rússia. Em russo, significa “terra nova”.
  • 41. 39 O chefe dos aguazis passa ao poderoso imperante um calhamaço grande como todos os diabos, Pechisbeque folheia- o, põe-se a lê-lo aqui e ali; e, afinal, vira-se para o ministro das Vistas Escuras e diz: — Sr. ministro: vossa excelência precisa combinar com meu mano, o condestável do Reino e prefeito do Pretório, diversas providências de urgência. Não há que contar com este povo. Dou-lhe festanças e… sr. ministro das Vistas Escuras, tome as suas providências? — Quais, majestade? — É preciso adquirir mais “tanks”, e dos mais poderosos; requisitar imediatamente canhões do Ministério da Tropa, que neste momento recebe ordem para entregá-los; comprar modernos e poderosos aviões de guerra. Tudo isto deve ser entregue à “Guarda do Pretório”, que está sob o comando do mano, no mais breve espaço de tempo. A “guarda” será desde já aumentada no dobro do atual efetivo. Res, non verba8 , sr. ministro. E, tímido e obediente, o ministro do Tesouro, até ali calado, resolveu então falar: — Majestade, e a crise? E o câmbio? E a carestia? E a miséria que vai pelo povo? — Mas — falou o rei amigavelmente —, Homero, você não está vendo que tomei agora mesmo as necessárias providências, para solucionar todas as dificuldades que o país atravessa. Você não ouviu o que eu disse ao “Vistas Escuras”. Está tudo resolvido. Agora temos que tratar dos festejos comemorativos ao aniversário do príncipe herdeiro da Birmânia. Mãos à obra! BARRETO, Lima. Providências governamentais. In: ______. Sátiras e outras subversões. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2016. p. 86-88, 485. DIREITOS HUMANOS SÃO INEGOCIÁVEIS A atual crise política e o déficit de legitimidade nos partidos e governo proporcionaram o avanço de propostas que representam um enorme risco de retrocesso nos direitos humanos Por Atila Roque (14/06/2016), Diretor Executivo da Anistia Internacional no Brasil Com muita frequência, me vejo diante da pergunta, quase sempre em tom provocação: a quem se destinam os direitos humanos? Com isso muitos querem sugerir que os “bandidos” são os maiores beneficiários. Outros, no entanto, reconhecem 8 Expressão em latim que, em tradução livre, significa que as ações falem mais alto que as palavras.
  • 42. 40 a importância de garantir a dignidade humana a todas as pessoas, sem exceções. Os princípios fundamentais dos direitos humanos, conquistados e consagrados internacionalmente após muito sofrimento ao longo das últimas décadas e, no caso do Brasil, expressos amplamente na Constituição de 1988, constituem os pilares que sustentam o estado de direito moderno. O novo momento político, entretanto, nos coloca um questionamento ainda mais primordial: para que servem os direitos humanos em momentos de crise como o que vivemos? Estou convencido que é justamente em momentos críticos, quando as circunstâncias políticas e econômicas colocam a sociedade diante de escolhas muitas vezes difíceis, é que os direitos humanos devem servir como o ponto de referência do qual não devemos nos afastar. Nesse sentido, certamente, algumas medidas concretas e declarações iniciais de altas autorida- des no governo provisório agravam a preocupação com os avanços que logramos ao longo da transição da ditadura para a democracia no Brasil. A extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e Direitos Humanos, por exemplo, constitui indícios dos riscos de fragilização do marco institucional responsável pela garantia de direitos fundamentais para a promoção da igualdade e da justiça social no Brasil. A composição do ministério do governo provisório integralmente de homens brancos também revelou uma baixa preocupação com a diversidade que deve sempre estar expressa no modo como o Estado compõe as mais altas posições de poder da administração pública. No entanto, é preciso reconhecer que muitos dos desafios e riscos com os quais nos deparamos nesse momento se tratam do acirramento de problemas que já vínhamos alertando, inclusive nos relatórios anuais de balanço do estado dos direitos humanos no mundo da Anistia Internacional, em particular no capítulo brasileiro, disponíveis no site da entidade. O relatório de 2015, por exemplo, chamava a atenção para o avanço no legislativo de um conjunto de propostas que, se aprovadas, significariam retrocessos graves nos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, das populações indígenas e quilombolas em relação aos seus territórios e de desmonte da legislação que controla o acesso a armas de fogo no país, apenas para citar alguns temas. A crise política e o déficit de liderança e legitimidade existente atualmente nos partidos políticos e governo – que já vem sendo objeto de debate desde as grandes manifestações de 2013 – proporcionaram o avanço de uma pauta de propostas que busca rever conquistas essenciais consagradas, inclusive, na Constituição brasileira. A agenda legislativa apresenta sérias ameaças, como a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos – diminuindo a idade com que jovens se tornariam adultos, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que retira do Executivo a exclusividade de demarcar terras indígenas, e a Proposta de Lei (PL) 5069/2013, que dificulta o atendimento de saúde a mulheres vítimas de estupro. Esses projetos encontram-se atualmente em discussão na Câmara dos Deputados ou no Senado, juntamente com a proposta de revogação do Estatuto do Desarmamento (PL 3722/12), que flexibiliza o porte de armas; o novo código de mineração (PL5807/13), que ignora o impacto da atividade ao meio ambiente; e o Estatuto da Família (PL 6583/13), que define família apenas a partir de casais heterossexuais. Sem contar a tipificação do terrorismo aprovada em março, que pode ser usada para criminalizar movimentos sociais e protestos pacíficos por conter linguagem sumamente vaga.
  • 43. 41 Todos esses projetos representam um enorme risco de retrocesso à medida que andam na contramão dos direitos humanos. Estas propostas comprometem conquistas alcançadas a duras penas no passado recente. O momento é de atenção e cuidado. Mais do que nunca, temos que buscar na nossa história recente a inspiração para evitar aventuras e aprender com os acertos do processo de transição democrática. Para isso, é essencial o fortalecimento de uma sociedade civil autônoma e independente capaz de, em momentos históricos de transição ou crise como o que vivemos atualmente, fazer a diferença na balança do processo de mudança sociopolítico brasileiro. Esse delicado equilíbrio, infelizmente, pende atualmente para o lado da regressão dos direitos humanos e retrocessos na nossa jovem democracia. Mais do que nunca a mobilização social e a defesa dos direitos à livre manifestação são centrais para que possamos fazer o debate amplo que precisamos sobre as escolhas e reformas que o Brasil não pode mais adiar, inclusive aquele do sistema político, de maneira que as nossas instituições possam recuperar o mínimo de legitimidade ne- cessária a garantia da democracia e do Estado de direito. A afirmação e defesa dos direitos humanos fundamentais a todas as pessoas é parte essencial dessa luta, seja qual for o desdobramento da atual crise política e o resultado do julgamento do impeachment atualmente em curso no Senado. O Brasil, não devemos nos enganar, segue sendo um país de raízes autoritárias, onde a desigualdade, a violência, o machismo e o racismo continuam a estruturar o poder. Esses são os monstros que se apresentam de maneira cada vez mais aberta e desavergonhada nas redes sociais e nas ruas. Momentos de incerteza e instabilidade requerem lucidez das lideranças responsáveis de todas as esferas para que formem uma verdadeira frente política suprapartidária na defesa da democracia e dos direitos humanos. Às autoridades cabe o dever de reafirmar seu compromisso de defesa das conquistas consagradas na Constituição de 1988 e a cumprirem plena- mente com suas obrigações internacionais adquiridas em virtude dos tratados de direitos humanos dos quais o Brasil faz parte. ROQUE, Atila. Direitos humanos são inegociáveis. Politike, 14 jun. 2016. Disponível em: <goo.gl/9RGorW>. Acesso em: 22 set. 2016. CADEIA (fragmento) Por Graciliano Ramos (1938), em Vidas Secas [...]. Era bruto, sim senhor, nunca havia aprendido, não sabia explicar-se. Estava preso por isso? Como era? [...] Que mal fazia a brutalidade dele? [...]. Tudo em ordem, podiam ver. Tinha culpa de ser bruto? Quem tinha culpa? [...] Difícil pensar. [...]. Nunca vira uma escola. Por isso não conseguia defender-se, botar as coisas nos seus lugares. [...].
  • 44. 42 [...]. O que desejava... An! Esquecia-se. [...]. RAMOS, Graciliano. (1938). Vidas secas. 120. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2013. ARMANDINHO Por Alexandre Beck (22/09/2016) BECK, Alexandre. Tira “Armandinho”. Armandinho, [S.l.]: 22 set. 2016. Disponível em: <goo.gl/CjMgaM>. Acesso em: 22 set. 2016. ANEXO D – De Monteiro Lobato, “Vidinha ociosa” e “Um homem de consciência” VIDINHA OCIOSA APÓLOGO O VELHO TORQUATO DÁ RELEVO ao que conta à força de imagens engraçadas ou apólogos. Ontem explicava o mal da nossa raça: preguiça de pensar. E restringindo o asserto à classe agrícola: – Se o Governo agarrasse um cento de fazendeiros dos mais ilustres e os trancasse nesta sala, com cem machados naquele canto e uma floresta virgem ali adiante; e se naquele quarto pusesse uma mesa com papel, pena e tinta, e lhes dissesse:
  • 45. 43 "Ou vocês pensam meia hora naquele papel ou botam abaixo aquela mata", daí a cinco minutos cento e um machados pipocavam nas perobas!... A MESMICE Um coronel inglês suicidou-se "tired of buttoning and unbuttoning" – cansado de abotoar e desabotoar a farda. A vida em Oblivion é um perpétuo "buttoning and unbuttoning" que não desfecha no suicídio. Salvam-na a botica e o jogo. A botica, porque nela há uma sessão permanente de mexerico, e o mexerico é a ambrosia dos lugarejos pobres. E o jogo, porque quem perdeu não pode suicidar-se antes da desforra, e quem ganhou vai alegre, a cantarolar que afinal de contas a vida é boa. Dessa forma escapam todos ao cansaço da mesmice. [...]. LOBATO, Monteiro. Cidades mortas: vidinha ociosa. In: ______. Contos completos. São Paulo: Biblioteca Azul, 2014. p. 202-209. UM HOMEM DE CONSCIÊNCIA CHAMAVA-SE JOÃO TEODORO, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro. Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer o que todos ali queriam mudar-se para terra melhor. Mas João Teodoro acompanhava com aperto de coração o deperecimento visível de sua Itaoca. "Isto já foi muito melhor", dizia consigo. "Já teve três médicos bem bons – agora só um e bem ruinzote. Já teve seis advogados e hoje mal dá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente, a minha Itaoca está se acabando...” João Teodoro entrou a incubar a ideia de também mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível. "É isso", deliberou lá por dentro. "Quando eu verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada de nada, então arrumo a trouxa e boto-me fora daqui."
  • 46. 44 Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notícia como se fosse uma porretada no crânio. Delegado, ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não queria ser nada, não se julgava capaz de nada... Ser delegado numa cidadinha daquelas é coisa seriíssima. Não há cargo mais importante. É o homem que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o Governo. Uma coisa colossal ser delegado – e estava ele, João Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!... João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou-as num burro, montou no seu cavalinho magro e partiu. Antes de deixar a cidade foi visto por um amigo madrugador. – Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens? – Vou-me embora – respondeu o retirante. – Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim. – Mas, como? Agora que você está delegado? – Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado não moro. Adeus. E sumiu. LOBATO, Monteiro. Cidades mortas: um homem de consciência. In: ______. Contos completos. São Paulo: Bi- blioteca Azul, 2014. p. 322-323. ANEXO E – De Lima Barreto, “Os bruzundangas” (fragmento) SOCIEDADE É deveras difícil dizer qualquer coisa sobre a sociedade da Bruzundanga. É difícil porque lá não há verdadeiramente sociedade estável. [...]. [...]. Uma tão vulgar preocupação pauta toda a vida intelectual da sociedade bruzundanguense, de modo que [...] o tema geral dos comensais é a política [...]. A política não é aí uma grande cogitação de guiar os nossos destinos [...]. Sendo assim, todas as manifestações de cultura dessa sociedade são inferiores. [...]. [...]. As obras mais notáveis que lá têm aparecido são escritas por homens que vivem arredados da sociedade bruzun- danguense.
  • 47. 45 Em uma sala desse país, quando não se trata de intrigas políticas ou coisas frívolas de todos os dias, surge logo um tédio inconcebível. Ele sepulta o pensamento, antes de matá-lo: enterra-o vivo. Mereceria detalhes, mas só fazendo romance ou comédia. [...]. Incapaz [, a gente da Bruzundanga, ] de fazer aparecer no seu seio razoáveis manifestações intelectuais, ela é ainda mais incapaz de apoiar as que nascem fora dela. [...]. Tudo lá é conforme a moda. [...]. [...]. BARRETO, Lima. Os bruzundangas: a sociedade [fragmento]. 4. ed. São Paulo: Ática, 2011. p. 81 a 84.
  • 48. 46 Projeto didático- pedagógico Manual do professor Eslaides de apresentação Referências reunidas QR Code URL goo.gl/7ZTHDp goo.gl/hwhdex goo.gl/bCCF5E goo.gl/ugSCzi
  • 49. 47
  • 50. 48