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Contribuições da psicologia ao estudo e...




   Contribuições da psicologia ao
estudo e à intervenção no campo da
               velhice
             Contributions of psychology to research and
                  intervention in the field of aging

                                                                               Anita Liberalesso Néri*


   Resumo                                                                Introdução
       Frente ao crescimento da popula-                   Durante o século XX, o envelheci-
   ção idosa e às mudanças ideológicas                 mento populacional ocorrido na Euro-
   em curso, a atuação do psicólogo
   com os idosos constitui-se a partir da              pa ocidental e nos Estados Unidos, re-
   interação da psicologia com outros                  giões onde a ciência do comportamen-
   campos da saúde e do atendimento so-                to primeiro se estabeleceu, foi forte ra-
   cial. Boa formação científica e huma-               zão social para a emergência do interes-
   nística e cultivo do trabalho multipro-
   fissional permitem bem atuar nos cam-               se da psicologia pelo estudo da velhice
   pos trabalho, saúde, planejamento                   e pelo atendimento a idosos. O progres-
   ambiental, lazer, educação, sociabilida-            so social desfrutado por vários países
   de, família, comunidade, reabilitação e
                                                       deu origem ao aumento no número de
   tratamento, construção de instrumen-
   tos e técnicas de avaliação, pesquisa               idosos ativos, saudáveis e envolvidos
   e ensino de psicologia do envelheci-                socialmente, em lugar de idosos doen-
   mento, criando soluções apropriadas                 tes, apáticos, incapacitados e que mor-
   às várias realidades de velhice normal
                                                       riam cedo, até então predominantes. Os
   e patológica no Brasil.
                                                       princípios científicos vigentes não ex-
   Palavras-chave: velhice, psicologia,                plicavam mais o fenômeno que se obser-
   campo de atuação profissional.                      vava nas ruas, nas instituições sociais,


                                                       * Psicóloga. Professora Titular na Faculdade de Educação
                                                          da Unicamp, onde pesquisa e ensina sobre psicologia
                                                          da vida adulta e da velhice.



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nas universidades e entre os próprios                     Após realizar estudos isolados sobre
psicólogos mais velhos. Paralelamente,                 temas tais como atitudes em relação à
o crescimento do contingente de idosos                 velhice e sobre o papel de eventos de
com maior poder político criou condições               transição na adaptação de adultos e de
para que pesquisadores e praticantes de                idosos, os cientistas começaram a per-
várias profissões, entre as quais a psicolo-           seguir as características e os determi-
gia, passassem a investir mais na pesqui-              nantes do envelhecimento bem-sucedi-
sa e na intervenção com esse segmento.                 do. Com isso, a partir da década de 1960,
   A psicologia estava preparada para                  a psicologia foi aprimorando a descrição
mudar seus pressupostos, uma vez que                   e a explicação dos fenômenos do enve-
as teorias de estágio, que não contempla-              lhecimento (processo), da velhice (fase
vam a velhice, já estavam sendo vistas                 da vida) e dos idosos (indivíduos desig-
como superadas, em parte porque não                    nados como tal, a partir dos critérios da
tinham explicação satisfatória para as                 sociedade). Consulta à base de dados
fases do desenvolvimento ulteriores à                  Psychoinfo mostra 160 registros em
adolescência. Surgiam novos paradig-                   1966, 9 609 em 2001 e 3 651 no primei-
mas, que abriam espaço à consideração                  ro semestre de 2002, bem como uma
da influência conjunta, interativa e his-              produção acumulada de 151 151 títulos.
tórica do contexto social e cultural e das                A subárea mais desenvolvida é a da
condições genético-biológicas e psicoló-               cognição, totalizando mais de 60% dos
gicas sobre o desenvolvimento de indi-                 trabalhos publicados na literatura inter-
víduos e de grupos etários. Neles, come-               nacional, em parte por causa da impor-
çou-se a considerar que desenvolvimen-                 tância dos processos intelectuais para o
to e envelhecimento são processos                      bem-estar e a autonomia dos idosos, em
multidimensionais e multidirecionais                   parte para atender a demandas sociais,
que englobam um delicado equilíbrio                    visto que são altos os custos sociais da
entre vantagens e limitações.                          velhice disfuncional. Estudos longitu-
   A psicologia beneficiou-se da intera-               dinais e de corte transversal trouxeram
ção com as ciências sociais, que avança-               dados robustos sobre a importância da
vam na compreensão dos processos so-                   integridade dos processos intelectuais e
ciais subjacentes à construção das socie-              da continuidade dos mecanismos de
dades, dos grupos e das mentalidades. A                auto-regulação da personalidade na de-
tradição já estabelecida de realizar estu-             terminação da longevidade e da boa qua-
dos longitudinais sobre inteligência con-              lidade de vida na velhice. Atividade,
feria à psicologia boas condições para cri-            envolvimento social e estilo de vida sau-
ar estratégias e técnicas de investigação              dável (ROWE e KAHN, 1998), além de
e de intervenção sobre os processos evo-               ter metas na vida, acreditar na capacida-
lutivos na vida adulta e na velhice.                   de de controlar a própria vida e ser ca-

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paz de investir no aperfeiçoamento da                  disciplina à solução de problemas emer-
saúde, da capacidade cognitiva e das re-               gentes. Eles se tornam mais evidentes à
lações sociais (BALTES e MAYER,                        medida que está aumentando a popula-
1999), são importantes antecedentes de                 ção idosa e em que o campo profissional
uma boa velhice.                                       da gerontologia vai se delineando de for-
   Hoje em dia, a tendência a estudar                  ma mais clara no país, abrindo novos es-
como e por que se envelhece bem soma-                  paços para os profissionais da psicologia.
se à de estabelecer as razões e os padrões                Este texto tem como objetivo oferecer
de envelhecimento disfuncional, assu-                  informações e sugestões sobre as possibi-
mido como uma das possibilidades do                    lidades de estudo e de atuação para a psi-
envelhecer. Estudos com pessoas mui-                   cologia e para os psicólogos brasileiros,
to idosas (acima de 75 anos) e centená-                com relação à velhice e aos idosos. Tem
rias tornaram-se tendência comum na                    por base a literatura internacional e a
literatura, assim como se fortaleceu a                 observação da autora sobre as iniciativas
inclinação para realizar estudos inter-                que já estão ocorrendo nesse campo, as
disciplinares, num reconhecimento de                   quais representam o esforço pioneiro de
que o tema é complexo. Esses conheci-                  profissionais brasileiros para resolver pro-
mentos marcaram o início de uma nova                   blemas críticos da população, por meio do
era na psicologia, na qual a disciplina                estudo e da intervenção nas várias áreas da
passou a descrever e explicar sistemati-               psicologia.
camente as condições que presidem a
mudança e a continuidade do desenvol-                  O aumento da duração da vida
vimento na velhice, as que contribuem
para evitar ou adiar alterações patológi-
                                                       humana e do número de idosos
cas e as que permitem reabilitar proces-                na população: contexto para a
sos e desempenhos prejudicados.                           realização de estudos e de
   A psicologia brasileira não apresen-                  intervenções em psicologia
ta produção volumosa, de longo prazo,
contínua, sistemática e característica                    No Brasil, nos últimos sessenta anos,
sobre a velhice. A difusão da informa-                 houve expressiva evolução da expecta-
ção científica e profissional ainda dei-               tiva de vida por ocasião do nascimento:
xa a desejar, em parte porque ainda não                em 1900, girava em torno de 34 anos; em
ensinamos a disciplina sistematicamen-                 1940, era de 39; em 1960, 41; em 1970,
te na universidade. Parte dos profissio-               59; em 1980 e 1990, 61. Estima-se que
nais acompanha a literatura internacio-                será de 71 anos em 2010 e de 75 em 2020.
nal de pesquisa e de intervenção; parte                Em 1980, aos sessenta anos, os homens
trabalha de forma intuitiva, procuran-                 podiam esperar viver mais 14,2 anos e
do adaptar conhecimentos básicos da                    as mulheres, 17,6; em 1991, essas taxas


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atingiram 15,3 para os homens e 18,1                   e na geração de programas de promoção
para as mulheres (Camarano et al.,                     de qualidade de vida e de mudança de
1999); em 2000 foi de 16 anos para os                  atitudes.
homens e de 19,5 para as mulheres.                        Com o envelhecimento populacio-
Nesse ano, a esperança de vida do brasi-               nal, em todas as camadas sociais deverá
leiro aos sessenta anos era de 17,8 anos;              aumentar a necessidade de oferta de ser-
aos 65, de 14,3; aos 70, de 11,1; aos 75,              viços de reabilitação cognitiva e de apoio
de 8,4 e, aos 80, de 6,1 (IBGE, 2000).                 psicológico a idosos, já que o avanço da
   O envelhecimento populacional é                     velhice está associado a um risco au-
caracterizado por declínio da mortalida-               mentado de vulnerabilidade e disfuncio-
de infantil, por diminuição de mortes                  nalidade. Familiares e profissionais
de adultos por doenças infecciosas e                   encarregados de cuidar deverão buscar
pelo declínio das taxas de natalidade.                 mais serviços psicológicos no âmbito da
Vem ocorrendo de forma relativamente                   informação, do desenvolvimento de ha-
rápida no Brasil, tanto que nossa popu-                bilidades e do restabelecimento do bem-
lação de pessoas de 65 anos e mais cres-               estar psicológico e físico. Instituições
ceu de 2,8% em 1960 para 3,1% em                       prestadoras de serviços sociais, de saú-
1970; 4,0% em 1980; 4,8 em 1991 e para                 de, bem-estar, beleza, entretenimento,
5,1% em 2000. Prevê-se uma taxa de                     propaganda, lazer e educação necessita-
5,9% em 2010 e de 7,7% em 2020.                        rão de serviços psicológicos de promo-
   Embora o crescimento do número de                   ção à saúde, educação, reabilitação e
idosos na população total e o aumento                  planejamento ambiental. A diminuição
da expectativa de vida sejam indícios de               da natalidade deverá contribuir para
progresso social, sua ocorrência provo-                deslocar, em parte, a atenção exclusiva
ca o aparecimento de novas demandas e                  dada à infância e à adolescência para os
de novos problemas. Em países onde                     mais velhos. Com isso, deveremos ter
impera forte desigualdade social e onde                alterações no mercado de trabalho do
não há políticas de atendimento das                    psicólogo, com repercussões sobre a sua
necessidades evolutivas para cidadãos de               formação.
todas as idades, caso do Brasil, as neces-
sidades decorrentes do envelhecimento                     A psicologia e o estudo da
individual e social costumam acarretar
ônus econômico, conflitos de interesses
                                                             velhice dos idosos
e carências de todo tipo entre os cidadãos                A psicologia do envelhecimento foca-
e as instituições. Esse é um campo pri-                liza as mudanças nos desempenhos
vilegiado para a ação do psicólogo, que                cognitivos, afetivos e sociais, bem como as
pode atuar na orientação e no acompa-                  alterações em motivações, interesses, ati-
nhamento a indivíduos e a instituições                 tudes e valores que são característicos dos

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Contribuições da psicologia ao estudo e...


anos mais avançados da vida adulta e dos               sos, à avaliação comportamental e à rea-
anos da velhice. Enfoca as diferenças                  bilitação. No campo do tratamento e da
intra-individuais e interindividuais que               reabilitação, é comum hoje pensar em
caracterizam os diferentes processos psi-              ações multiprofissionais. A fisioterapia,
cológicos na velhice, levando em conta os              a terapia ocupacional, a fonoaudiologia
desempenhos de diferentes grupos de ida-               e a enfermagem são exemplos dessas
de e sexo e de grupos portadores de dife-              profissões, que, junto com a psicologia
rentes bagagens educacionais e sociocul-               clínica, podem oferecer ajuda e cuida-
turais. Estuda também os processos e as                do aos idosos em casos de dependência
condições problemáticas que caracteri-                 física e cognitiva. As mesmas profissões
zam e que afetam o funcionamento psi-                  e, além delas, a psicologia educacional
cológico dos indivíduos mais velhos. Nes-              e a psicologia comunitária podem ofe-
se aspecto particular, o estudo da velhice             recer alternativas de ajuda aos familia-
beneficia-se da contribuição concorrente               res de idosos acometidos de doenças que
de várias disciplinas. Dentre essas se des-            causam incapacidade física e cognitiva,
tacam a neurologia, a psiquiatria e a bio-             organizando grupos de apoio emocional,
química, quando a questão é o declínio                 de informação e de auto-ajuda.
em capacidades cognitivas, por causa de                    A psicologia interessa-se, igualmen-
síndromes neurológicas típicas da velhi-               te, por descrever e explicar as condições
ce ou de acidentes vasculares cerebrais,               sob as quais é possível ocorrer a preser-
cuja probabilidade de ocorrência aumen-                vação do potencial para o comportamen-
ta com a idade. Juntamente com a biolo-                to e o desenvolvimento. Já se sabe que
gia, a medicina e as ciências sociais for-             isso ocorre em alguns domínios do fun-
mam a base de conhecimentos da geron-                  cionamento intelectual, manifestos em
tologia (BIRREN e SCHROOTS, 1996).                     alta competência para a realização de
   O paradigma que presidiu a constitui-               atividades da vida prática e para lidar
ção da psicologia do envelhecimento é o                com complexos problemas existenciais,
do desenvolvimento ao longo de toda a                  ambos dependentes do acúmulo de ex-
vida (lifespan). Pressupõe que envelheci-              periência de vida (NERI, 2001; 2002).
mento e desenvolvimento são processos                      No Quadro 1, apresentamos os temas
correlatos e que, mesmo na presença das                correntes em psicologia do envelheci-
limitações de origem biológica, os proces-             mento, baseado no sumário da quarta e
sos psicológicos já estabelecidos se man-              da quinta edições do Handbook of
têm e, se o ambiente cultural for propí-               psychology of aging, editado por J. E.
cio, pode ocorrer desenvolvimento na                   Birren e K. W. Schaie, em 1996 e 2001.
velhice (BALTES, 1987, 1997).                          São reconhecidos como representativos
   A psicologia oferece contribuições                  do status da área no âmbito internacio-
importantes à compreensão dos proces-                  nal e contêm resenhas dos avanços nos

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assuntos mais importantes do campo nos                        tos e as sínteses de modo a dar uma vi-
últimos cinco anos. Especialistas são                         são orientadora aos estudiosos.
incumbidos de produzir os levantamen-


Quadro 1 - Principais tópicos na atual psicologia do envelhecimento

                        Influências biológicas e sociais sobre o comportamento na velhice

1. Genética comportamental*
2. A velhice e o sistema nervoso humano
3. Mudanças cognitivas associadas à idade e relações entre o cérebro e o comportamento
4. Saúde e comportamento;* Comportamentos de risco em saúde
5. Influências ambientais sobre o comportamento na velhice

                        Processos comportamentais, funções psicológicas e envelhecimento

6. Mudanças na visão e na audição
7. Atenção e envelhecimento cognitivo
8. Velocidade e ritmo dos processos comportamentais
9. Declínio em controle motor relacionado à idade
10. Processos biológicos e comportamentais em memória
11. Produção e compreensão de linguagem
12. Solução de problemas* e inteligência prática*
13. O curso do desenvolvimento intelectual*
14. Emoções
15. Relações sociais, redes de relações sociais e apoio social
16. Diferenças de gênero e papéis de gênero
17. Personalidade
18. Sabedoria
19. Criatividade
20. Fragilidade, dependência e declínio*
21. Terminalidade, morte e luto*
22. A qualidade de vida e o fim da vida: questões tecnológicas e éticas
23. Atividade e exercício e comportamento*
24. Religião e espiritualidade*
25. Cognição social e atitudes*
26. Violência, abuso e vitimização
27. Desempenho no trabalho e desenvolvimento da carreira*
28. As mudanças tecnológicas e o trabalhador idoso
29. Saúde mental e psicopatologia



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Contribuições da psicologia ao estudo e...



  Contribuições da psicologia à                            ou restrita, saudável ou patológica, na co-
                                                           munidade ou em instituições. Esse elenco
  promoção e à recuperação do
                                                           de procedimentos pode ser aplicado em
     bem-estar dos idosos                                  várias áreas, entre as quais se incluem saú-
                                                           de, relações sociais, família, instituições de
   Existe um conjunto de técnicas de diag-                 atendimento a idosos, educação, lazer e so-
nóstico, de avaliação e de intervenção vol-                ciabilidade, trabalho, ambiente físico e
tadas ao tratamento dos problemas compor-                  ambiente social; pode envolver construção
tamentais e psicológicos que afetam o fun-                 de instrumentos de medida, ensino e pes-
cionamento e o bem-estar subjetivo dos                     quisa. No Quadro 2 são apresentados exem-
idosos; visam à manutenção, ao aperfeiçoa-                 plos de atividades que os psicólogos podem
mento ou à recuperação do bem-estar dos                    desenvolver nessas áreas.
idosos que vivem de forma independente
Quadro 2 - Campos em que a psicologia pode contribuir para o bem-estar objetivo e subjetivo dos idosos

            Campos em que a pscicologia pode contribuir para o bem-estar objetivo e subjetivo dos idosos

   1. Saúde. Ênfase em promoção em saúde; reabilitação cognitiva e psicomotora; aconselhamento, orientação e
   psicoterapia e cuidados paliativos; avaliação de capacidades funcionais; apoio psicológico em situação de
   reabilitação física e de cuidados paliativos; treino de memória; psicoterapias em desordens emocionais; treino de
   relaxamento; terapias expressivas e arte-terapia em demência.

   2. Relações sociais. Por exemplo, envolver treino de habilidades sociais para programas de ação gerontológica
   em saúde e em defesa dos direitos sociais.

   3. Família. Importante oferecer informação e apoio à promoção de boas relações e de relações de
   interdependência entre as gerações, atuar em situações de crise e oferecer apoio psicológico.

   4.Instituições públicas e privadas de assistência social e à saúde dos idosos. Oferecer treinamento de
   habilidades profissionais e apoio psicológico a profissionais que trabalham com idosos, assessoria ao
   planejamento e à avaliação de serviços.

   5. Educação, lazer e sociabilidade. Os psicólogos podem oferecer informação psicológica e atividades grupais
   visando ao aprimoramento de habilidades sociais, atuar no planejamento do currículo e fazer pesquisa, tendo
   em mente que a educação é um processo permanente e que os idosos devem ser tratados como participantes
   ativos com uma história de vida e conhecimentos a serem respeitados. Na educação não formal, as
   possibilidades se ampliam em programas veiculados pela mídia impressa e televisiva, pela internet, sobre
   qualidade de vida, saúde, relações sociais, cidadania, alfabetização. Também, pela organização e orientação de
   centros de memória, grupos de avós, de contadores de história e de voluntários, clubes recreativos, centros de
   convivência e programas de autogestão por idosos, no trabalho, no lazer ou na ação social.

   6. Trabalho. Muitos idosos trabalham para sobreviver ou para ajudar os membros mais jovens da família. Outros
   o fazem por opção. O psicólogo pode ajudar com programas de capacitação e reciclagem para o trabalho,
   treino de atitudes e motivação. No contexto organizacional, ele pode operar em favor dos mais velhos,
   desenvolvendo instrumentos e técnicas de seleção, acompanhando providências no campo da ergonomia,
   trabalhando na prevenção de riscos e promovendo alterações na cultura organizacional de modo a favorecer o
   aproveitamento das competências dos idosos. Pode trabalhar atitudes e procedimentos de pessoal de recursos
   humanos para lidar com os trabalhadores mais velhos; pode ajudá-los a flexibilizar a carreira, a desenvolver
   papéis profissionais adequados aos ganhos da maturidade, a planejar uma segunda carreira ou a preparar-se
   para a aposentadoria. Os idosos podem desenvolver atividades profissionais e de prestação de serviços
   assumindo papéis de consultores, auditores e assessores especializados, transformando a experiência acumulada
   em serviços.                                        75
   7. Ambiente ecológico. Os focos são a segurança, o conforto e a satisfação nas cidades, nos lares e nas
   RBCEH - Revista Brasileira de Ciênciasado Envelhecimentovida objetiva e subjetiva dos idosos.
   instituições, fatores que contribuem para boa qualidade de Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004

   8. Situações de vulnerabilidade social. Os psicólogos têm muito a oferecer em programas de prevenção e de
aproveitamento das competências dos idosos. Pode trabalhar atitudes e procedimentos de pessoal de recursos
humanos para lidar com os trabalhadores mais velhos; pode ajudá-los a flexibilizar a carreira, a desenvolver
papéis profissionais adequados aos ganhos da maturidade, a planejar uma segunda carreira ou a preparar-se
para a aposentadoria. Os idosos podem desenvolver atividades profissionais e de prestação de serviços
assumindo papéis de consultores, auditores e assessores especializados, transformando a experiência acumulada
em serviços. Quadro 2
Continução
7. Ambiente ecológico. Os focos são a segurança, o conforto e a satisfação nas cidades, nos lares e nas
instituições, fatores que contribuem para a boa qualidade de vida objetiva e subjetiva dos idosos.

8. Situações de vulnerabilidade social. Os psicólogos têm muito a oferecer em programas de prevenção e de
atendimento à pobreza; à violência, ao abandono e aos maus-tratos; à deficiência física, mental e sensorial; a
idosos migrantes e sem-teto, trabalhos que podem desenvolver-se em instituições públicas, privadas e não
governamentais.

9. Redação de material informativo, utilizando os mais variados suportes (livros, folhetos, artigos ou entrevistas
em jornais, TV, rádio, CD-ROM, videocassete) e dirigidos às mais variadas audiências (idosos, crianças,
comunidade, políticos, professores, estudantes de psicologia).

10. Desenvolvimento ou validação de instrumentos de medida psicológica apropriados à realidade brasileira,
por exemplo, nos campos da personalidade, da cognição, das capacidades funcionais e das atitudes.

11. Pesquisa, visando à geração de conhecimento relevante do ponto de vista teórico e social, o que significa
pesquisar tendo em vista os progressos acumulados da ciência, bem como os problemas da vida real dos
brasileiros.

12. Ensino de psicologia do envelhecimento em cursos de psicologia, educação e medicina, quebrando velhos
tabus sobre a velhice como período de declínio, sobre a impossibilidade de educar idosos e da velhice como
problema de saúde. Melhor será se esse ensino for teórica e empiricamente fundamentado, não baseado em
teorias do senso comum sobre a velhice.

   Em todos esses contextos de atuação,                        tadas pela profissão, como podemos ver
o psicólogo pode desempenhar um am-                            no Quadro 3, inspirado em Carstensen,
plo leque de funções que lhe são facul-                        Edelstein e Dornbrand (1996).

Quadro 3 - Principais funções dos psicólogos especializados em oferta de serviços a idosos

1. Avaliação psicológica
2. Planejamento e execução de intervenção psicológica
3. Orientação e aconselhamento
4. Informação e mudança de atitudes em relação à velhice
5. Psicoterapias individuais e grupais com idosos, voltadas para problemas de ordem emocional e psicossocia
6. Tratamento de déficits e de distúrbios cognitivos e psicomotores, ou reabilitação cognitiva dos idosos
7. Orientação, aconselhamento e psicoterapia, individuais e grupais, a familiares de idosos dependentes e
fragilizados
8. Intervenções individuais e grupais em situações de crise
9. Assessoria a instituições públicas, a organizações públicas e privadas que amparam e cuidam de idosos e a
famílias de idosos
10. Assessoria, planejamento e execução de programas de promoção em saúde na comunidade
11. Assessoria, planejamento e execução de programas de promoção social para idosos
12. Assessoria e planejamento de providências ecológicas e de programas de mudança de atitudes visando ao
bem-estar dos idosos, nas cidades, nas instituições e nas organizações
13. Apoio psicológico a profissionais que cuidam de idosos
14. Participação em equipes multiprofissionais




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   Embora não esgote o leque de opções                       de. No Quadro 4, vemos uma relação de
da profissão, o campo central de formação                    campos de intervenção clínica específicos
e de identificação do psicólogo é o da saú-                  ao campo da velhice (Birren et al., 1992).

Quadro 4 - Principais campos de intervenção clínica para os psicólogos que lidam com idosos

  1. Fatores comportamentais e psicológicos de risco para a ocorrência de velhice patológica
  2. Fragilidade e dependência: questões éticas e práticas que se propõem aos idosos e aos seus cuidadores
  profissionais e familiares
  3. Avaliação e intervenção em distúrbios psicológicos e do comportamento, déficits comportamentais e
  problemas em
       3.1. Capacidades funcionais
       3.2. Emoção e afeto
       3.3. Cognição
       3.4. Motivação
  4. Saúde física, como, por exemplo, distúrbios do sono, dor crônica, enxaqueca, osteoporose, problemas
  cardiovasculares e cerebrovasculares, vulnerabilidade ao estresse, depressão, incontinência, instabilidade e
  quedas
  5. Doenças neuropsicológicas (por exemplo, doenças de Parkinson e mal de Alzheimer)
  6. Intervenções baseadas em apoio social, com vistas a amortecer o impacto de situações de crise (ex.: morte ou
  doença grave do cônjuge)
  7. Intervenções comportamentais (ex.: as que visam à adesão ao tratamentoa, ao enfrentamento de estresse,
  desamparo e ansiedade
  8. Intervenções comportamentais em serviços de saúde e sociais (ex.: as que visam a melhorar o estilo de vida, a
  nutrição, a saúde bucal, a adesão a tratamentos médicos, o tratamento e a prevenção de hipertensão, da
  osteoporose e da catarata
  9. Reabilitação cognitiva em síndromes neurológicas (ex.: treino de memória, de orientação temporal e espacial e
  de compreensão verbal)
  10. Apoio psicológico (ex.: lidar com a fragilidade, a dependência e a morte) e treinamento (ex.: ensino, empatia)
  a profissionais de saúde que participam do sistema de cuidado formal a idosos fragilizados e dependentes (ex.:
  em asilos e hospitais)
  11. Apoio e treinamento ao sistema de cuidado informal (familiares e voluntários) que apóiam idosos frágeis e
  dependentes (ex.: informações sobre as doenças e seu manejo em casa; habilidades práticas de cuidar; manejo
  de sentimentos e do estresse, cuidados com a própria saúde, atenção às relações familiares, como acionar
  recursos da comunidade, o que fazer em caso de episódio agudo ou morte do idoso)



 Contribuições da psicologia ao                              funcionalmente incapacitados. Progra-
                                                             mar o ambiente residencial, o ambien-
  planejamento de ambientes
                                                             te de trabalho, os asilos e casas de repou-
   físicos adequados a idosos                                so, o bairro e a cidade, os hospitais,
   A psicologia pode oferecer contribui-                     ambulatórios, centros-dia e centros de
ções ao planejamento e à reprogramação                       saúde e os locais de lazer e de convivên-
ambiental para idosos independentes ou                       cia é vital para a prevenção da incompe-


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tência comportamental, da dependên-                         motivação e atitudes. Pode atuar direta-
cia, da depressão, da insegurança, do                       mente no planejamento e assessoramento
isolamento, do abandono, da negligên-                       empresas, profissionais, familiares e o
cia e dos maus-tratos (LAWTON, 1991).                       próprio idoso, para proporcionar condi-
   O psicólogo pode atuar sobre o am-                       ções para que o idoso possa viver bem no
biente do idoso com base em conheci-                        seu ambiente (SCHAIE e SCHOOLER,
mentos oferecidos pela psicologia da per-                   1998; NERI, 2000) (Quadro 5).
cepção e por estudos sobre satisfação,
Quadro 5 - Tópicos de interesse em psicologia ambiental e envelhecimento

1. A avaliação dos contextos gerontológicos, como, por exemplo, o lar e os asilos, com base em teorias
psicológicas e sociológicas
2. O controle ambiental como base para a segurança e a competência física e psicossocial dos idosos
3. Características psicossociais dos ambientes gerontológicos. O papel da organização, da beleza, do conforto e
da novidade
4. Os ambientes de lazer, educação e sociabilidade como contextos de desenvolvimento
5. Fatores ambientais de risco para o abandono, maus-tratos e violência em relação aos idosos, na cidade, nas
instituições e em casa

          Considerações finais
   Os psicólogos que hoje estão traba-                      hoje poucas possibilidades de atuação
lhando com idosos valem-se de informa-                      para os psicólogos uma vez que: a) ain-
ções advindas de várias áreas da psico-                     da não existe opinião formada na clien-
logia, estando afiliados especialmente a                    tela em relação à validade ou à possibi-
serviços de saúde existentes em hospi-                      lidade de realizar intervenções psicote-
tais e em centros de saúde. As iniciati-                    rapêuticas com idosos; b) os cursos de
vas em medicina da família, recente pro-                    psicologia não investem nessa faixa
grama do Ministério da Saúde que en-                        etária nem estimulam os futuros psicó-
volve parceria entre prefeituras e hospi-                   logos a melhor compreendê-la; c) preva-
tais de referência, deverão abrir um                        lecem preconceitos a respeito da flexi-
campo novo para o profissional de psi-                      bilidade dos idosos para a mudança, o
cologia. Instituições asilares, casas de                    que tradicionalmente tem sido um en-
repouso particulares, instituições públi-                   trave para o desenvolvimento de trata-
cas, universidades abertas à terceira ida-                  mentos apropriados aos mais velhos; d)
de, cursos de especialização e centros de                   a clínica exercida em moldes individuais
convivência para idosos estão abrindo                       e privados é cara para uma população
outros espaços para atuação.                                pobre, caso da maioria dos idosos; e) o
   No campo da psicologia clínica                           serviço público de saúde não presta aten-
exercida nos moldes tradicionais, há                        dimento psicológico universal à popu-

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Contribuições da psicologia ao estudo e...


lação em geral e, muito menos, a idosos.               poder aquisitivo é geralmente baixo e
Isso significa que os psicólogos precisa-              têm pouco acesso à informação sobre os
rão adaptar-se criativamente e aprender                recursos da psicologia e sobre seu direi-
a usar os conhecimentos clínicos em                    to a atendimento nessa modalidade de
outros contextos de cuidado à saúde,                   ajuda. Esse cenário dispõe condições
além de aprenderem a trabalhar em gru-                 que prenunciam a construção gradual
pos e em modalidades de intervenção                    do campo, que se constituirá com base
focais e breves.                                       no diálogo constante entre a psicologia
   Do campo de conhecimentos sobre                     como ciência e a psicologia como pro-
avaliação psicológica, cognição, trata-                fissão, os profissionais brasileiros que
mento individual e grupal a problemas                  atuam com idosos, a população idosa e
afetivos e cognitivos de idosos, os psicó-             as instituições sociais.
logos brasileiros tirarão mais informa-
ções úteis à atuação e à construção do                 Recebido para publicação em maio de 2003.
campo de atendimento à saúde física e
mental dos idosos. Também poderão                                       Abstract
buscar apoio teórico e tecnológico no
campo da psicologia, da psicologia social                 The increasing of aged population
e da psicologia da personalidade, para                 and the current ideological changes
melhor atuarem junto a pequenos gru-                   toward aging constitutes the scenery to
pos, famílias e comunidades. A psicolo-                the building of psychology as scientific
gia educacional poderá valer-lhes em                   and professional field. The interaction
situações em que o imperativo é reali-                 between psychology and other careers in
zar intervenções de educação e de ensi-                the social and health fields promotes
no não formal, educação permanente e                   their mutual development. Good
educação em saúde.                                     scienific and humanistic education, and
   Cada vez mais a psicologia e os psi-                multiprofessional work will allow to
cólogos brasileiros serão solicitados a                Brazilian psychologists to perform their
dar respostas à população idosa, a qual                job in the fields of work, health,
está crescendo de forma rápida. Num                    environment, leisure, education, family
país de dimensões continentais, são vá-                support, group management, community,
rias as realidades econômicas, sociais,                rehabilitation, treatment, building of
culturais, psicológicas e de saúde dos                 instruments and methods of assessment,
idosos. Também são variadas as condi-                  researching and teaching of psychology of
ções profissionais e as relativas à base de            aging.
informação dos psicólogos para o exer-
cício da profissão frente a idosos, cujo               Key words: aging, old persons, psychology,
                                                       professional field, Brazil.


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                                                              Avenida Bertrand Russell, 801
CAMARANO, A. A. et al. Como vive o idoso
                                                              Campinas - SP
brasileiro? In: CAMARANO, A. A. (Org.). Muito
além dos 60. Os novos idosos brasileiros. Rio de              CEP: 13083-970
Janeiro: Ipea, 1999.                                          Fone (19) 3788 5670/5595/5555.
CARSTENSEN, L. L.; EDELSTON, B. A;                            E-mail: anitalbn@lexxa.com.br
DORNBRANB, L. (Ed.). The practical handbook
of clinical gerontology. Thousand Oaks, Cal.: Sage.




                                                      80

   RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004

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Contribuições da Psicologia ao Estudo e Intervenção sobre a Velhice

  • 1. Contribuições da psicologia ao estudo e... Contribuições da psicologia ao estudo e à intervenção no campo da velhice Contributions of psychology to research and intervention in the field of aging Anita Liberalesso Néri* Resumo Introdução Frente ao crescimento da popula- Durante o século XX, o envelheci- ção idosa e às mudanças ideológicas mento populacional ocorrido na Euro- em curso, a atuação do psicólogo com os idosos constitui-se a partir da pa ocidental e nos Estados Unidos, re- interação da psicologia com outros giões onde a ciência do comportamen- campos da saúde e do atendimento so- to primeiro se estabeleceu, foi forte ra- cial. Boa formação científica e huma- zão social para a emergência do interes- nística e cultivo do trabalho multipro- fissional permitem bem atuar nos cam- se da psicologia pelo estudo da velhice pos trabalho, saúde, planejamento e pelo atendimento a idosos. O progres- ambiental, lazer, educação, sociabilida- so social desfrutado por vários países de, família, comunidade, reabilitação e deu origem ao aumento no número de tratamento, construção de instrumen- tos e técnicas de avaliação, pesquisa idosos ativos, saudáveis e envolvidos e ensino de psicologia do envelheci- socialmente, em lugar de idosos doen- mento, criando soluções apropriadas tes, apáticos, incapacitados e que mor- às várias realidades de velhice normal riam cedo, até então predominantes. Os e patológica no Brasil. princípios científicos vigentes não ex- Palavras-chave: velhice, psicologia, plicavam mais o fenômeno que se obser- campo de atuação profissional. vava nas ruas, nas instituições sociais, * Psicóloga. Professora Titular na Faculdade de Educação da Unicamp, onde pesquisa e ensina sobre psicologia da vida adulta e da velhice. 69 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 2. nas universidades e entre os próprios Após realizar estudos isolados sobre psicólogos mais velhos. Paralelamente, temas tais como atitudes em relação à o crescimento do contingente de idosos velhice e sobre o papel de eventos de com maior poder político criou condições transição na adaptação de adultos e de para que pesquisadores e praticantes de idosos, os cientistas começaram a per- várias profissões, entre as quais a psicolo- seguir as características e os determi- gia, passassem a investir mais na pesqui- nantes do envelhecimento bem-sucedi- sa e na intervenção com esse segmento. do. Com isso, a partir da década de 1960, A psicologia estava preparada para a psicologia foi aprimorando a descrição mudar seus pressupostos, uma vez que e a explicação dos fenômenos do enve- as teorias de estágio, que não contempla- lhecimento (processo), da velhice (fase vam a velhice, já estavam sendo vistas da vida) e dos idosos (indivíduos desig- como superadas, em parte porque não nados como tal, a partir dos critérios da tinham explicação satisfatória para as sociedade). Consulta à base de dados fases do desenvolvimento ulteriores à Psychoinfo mostra 160 registros em adolescência. Surgiam novos paradig- 1966, 9 609 em 2001 e 3 651 no primei- mas, que abriam espaço à consideração ro semestre de 2002, bem como uma da influência conjunta, interativa e his- produção acumulada de 151 151 títulos. tórica do contexto social e cultural e das A subárea mais desenvolvida é a da condições genético-biológicas e psicoló- cognição, totalizando mais de 60% dos gicas sobre o desenvolvimento de indi- trabalhos publicados na literatura inter- víduos e de grupos etários. Neles, come- nacional, em parte por causa da impor- çou-se a considerar que desenvolvimen- tância dos processos intelectuais para o to e envelhecimento são processos bem-estar e a autonomia dos idosos, em multidimensionais e multidirecionais parte para atender a demandas sociais, que englobam um delicado equilíbrio visto que são altos os custos sociais da entre vantagens e limitações. velhice disfuncional. Estudos longitu- A psicologia beneficiou-se da intera- dinais e de corte transversal trouxeram ção com as ciências sociais, que avança- dados robustos sobre a importância da vam na compreensão dos processos so- integridade dos processos intelectuais e ciais subjacentes à construção das socie- da continuidade dos mecanismos de dades, dos grupos e das mentalidades. A auto-regulação da personalidade na de- tradição já estabelecida de realizar estu- terminação da longevidade e da boa qua- dos longitudinais sobre inteligência con- lidade de vida na velhice. Atividade, feria à psicologia boas condições para cri- envolvimento social e estilo de vida sau- ar estratégias e técnicas de investigação dável (ROWE e KAHN, 1998), além de e de intervenção sobre os processos evo- ter metas na vida, acreditar na capacida- lutivos na vida adulta e na velhice. de de controlar a própria vida e ser ca- 70 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 3. Contribuições da psicologia ao estudo e... paz de investir no aperfeiçoamento da disciplina à solução de problemas emer- saúde, da capacidade cognitiva e das re- gentes. Eles se tornam mais evidentes à lações sociais (BALTES e MAYER, medida que está aumentando a popula- 1999), são importantes antecedentes de ção idosa e em que o campo profissional uma boa velhice. da gerontologia vai se delineando de for- Hoje em dia, a tendência a estudar ma mais clara no país, abrindo novos es- como e por que se envelhece bem soma- paços para os profissionais da psicologia. se à de estabelecer as razões e os padrões Este texto tem como objetivo oferecer de envelhecimento disfuncional, assu- informações e sugestões sobre as possibi- mido como uma das possibilidades do lidades de estudo e de atuação para a psi- envelhecer. Estudos com pessoas mui- cologia e para os psicólogos brasileiros, to idosas (acima de 75 anos) e centená- com relação à velhice e aos idosos. Tem rias tornaram-se tendência comum na por base a literatura internacional e a literatura, assim como se fortaleceu a observação da autora sobre as iniciativas inclinação para realizar estudos inter- que já estão ocorrendo nesse campo, as disciplinares, num reconhecimento de quais representam o esforço pioneiro de que o tema é complexo. Esses conheci- profissionais brasileiros para resolver pro- mentos marcaram o início de uma nova blemas críticos da população, por meio do era na psicologia, na qual a disciplina estudo e da intervenção nas várias áreas da passou a descrever e explicar sistemati- psicologia. camente as condições que presidem a mudança e a continuidade do desenvol- O aumento da duração da vida vimento na velhice, as que contribuem para evitar ou adiar alterações patológi- humana e do número de idosos cas e as que permitem reabilitar proces- na população: contexto para a sos e desempenhos prejudicados. realização de estudos e de A psicologia brasileira não apresen- intervenções em psicologia ta produção volumosa, de longo prazo, contínua, sistemática e característica No Brasil, nos últimos sessenta anos, sobre a velhice. A difusão da informa- houve expressiva evolução da expecta- ção científica e profissional ainda dei- tiva de vida por ocasião do nascimento: xa a desejar, em parte porque ainda não em 1900, girava em torno de 34 anos; em ensinamos a disciplina sistematicamen- 1940, era de 39; em 1960, 41; em 1970, te na universidade. Parte dos profissio- 59; em 1980 e 1990, 61. Estima-se que nais acompanha a literatura internacio- será de 71 anos em 2010 e de 75 em 2020. nal de pesquisa e de intervenção; parte Em 1980, aos sessenta anos, os homens trabalha de forma intuitiva, procuran- podiam esperar viver mais 14,2 anos e do adaptar conhecimentos básicos da as mulheres, 17,6; em 1991, essas taxas 71 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 4. atingiram 15,3 para os homens e 18,1 e na geração de programas de promoção para as mulheres (Camarano et al., de qualidade de vida e de mudança de 1999); em 2000 foi de 16 anos para os atitudes. homens e de 19,5 para as mulheres. Com o envelhecimento populacio- Nesse ano, a esperança de vida do brasi- nal, em todas as camadas sociais deverá leiro aos sessenta anos era de 17,8 anos; aumentar a necessidade de oferta de ser- aos 65, de 14,3; aos 70, de 11,1; aos 75, viços de reabilitação cognitiva e de apoio de 8,4 e, aos 80, de 6,1 (IBGE, 2000). psicológico a idosos, já que o avanço da O envelhecimento populacional é velhice está associado a um risco au- caracterizado por declínio da mortalida- mentado de vulnerabilidade e disfuncio- de infantil, por diminuição de mortes nalidade. Familiares e profissionais de adultos por doenças infecciosas e encarregados de cuidar deverão buscar pelo declínio das taxas de natalidade. mais serviços psicológicos no âmbito da Vem ocorrendo de forma relativamente informação, do desenvolvimento de ha- rápida no Brasil, tanto que nossa popu- bilidades e do restabelecimento do bem- lação de pessoas de 65 anos e mais cres- estar psicológico e físico. Instituições ceu de 2,8% em 1960 para 3,1% em prestadoras de serviços sociais, de saú- 1970; 4,0% em 1980; 4,8 em 1991 e para de, bem-estar, beleza, entretenimento, 5,1% em 2000. Prevê-se uma taxa de propaganda, lazer e educação necessita- 5,9% em 2010 e de 7,7% em 2020. rão de serviços psicológicos de promo- Embora o crescimento do número de ção à saúde, educação, reabilitação e idosos na população total e o aumento planejamento ambiental. A diminuição da expectativa de vida sejam indícios de da natalidade deverá contribuir para progresso social, sua ocorrência provo- deslocar, em parte, a atenção exclusiva ca o aparecimento de novas demandas e dada à infância e à adolescência para os de novos problemas. Em países onde mais velhos. Com isso, deveremos ter impera forte desigualdade social e onde alterações no mercado de trabalho do não há políticas de atendimento das psicólogo, com repercussões sobre a sua necessidades evolutivas para cidadãos de formação. todas as idades, caso do Brasil, as neces- sidades decorrentes do envelhecimento A psicologia e o estudo da individual e social costumam acarretar ônus econômico, conflitos de interesses velhice dos idosos e carências de todo tipo entre os cidadãos A psicologia do envelhecimento foca- e as instituições. Esse é um campo pri- liza as mudanças nos desempenhos vilegiado para a ação do psicólogo, que cognitivos, afetivos e sociais, bem como as pode atuar na orientação e no acompa- alterações em motivações, interesses, ati- nhamento a indivíduos e a instituições tudes e valores que são característicos dos 72 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 5. Contribuições da psicologia ao estudo e... anos mais avançados da vida adulta e dos sos, à avaliação comportamental e à rea- anos da velhice. Enfoca as diferenças bilitação. No campo do tratamento e da intra-individuais e interindividuais que reabilitação, é comum hoje pensar em caracterizam os diferentes processos psi- ações multiprofissionais. A fisioterapia, cológicos na velhice, levando em conta os a terapia ocupacional, a fonoaudiologia desempenhos de diferentes grupos de ida- e a enfermagem são exemplos dessas de e sexo e de grupos portadores de dife- profissões, que, junto com a psicologia rentes bagagens educacionais e sociocul- clínica, podem oferecer ajuda e cuida- turais. Estuda também os processos e as do aos idosos em casos de dependência condições problemáticas que caracteri- física e cognitiva. As mesmas profissões zam e que afetam o funcionamento psi- e, além delas, a psicologia educacional cológico dos indivíduos mais velhos. Nes- e a psicologia comunitária podem ofe- se aspecto particular, o estudo da velhice recer alternativas de ajuda aos familia- beneficia-se da contribuição concorrente res de idosos acometidos de doenças que de várias disciplinas. Dentre essas se des- causam incapacidade física e cognitiva, tacam a neurologia, a psiquiatria e a bio- organizando grupos de apoio emocional, química, quando a questão é o declínio de informação e de auto-ajuda. em capacidades cognitivas, por causa de A psicologia interessa-se, igualmen- síndromes neurológicas típicas da velhi- te, por descrever e explicar as condições ce ou de acidentes vasculares cerebrais, sob as quais é possível ocorrer a preser- cuja probabilidade de ocorrência aumen- vação do potencial para o comportamen- ta com a idade. Juntamente com a biolo- to e o desenvolvimento. Já se sabe que gia, a medicina e as ciências sociais for- isso ocorre em alguns domínios do fun- mam a base de conhecimentos da geron- cionamento intelectual, manifestos em tologia (BIRREN e SCHROOTS, 1996). alta competência para a realização de O paradigma que presidiu a constitui- atividades da vida prática e para lidar ção da psicologia do envelhecimento é o com complexos problemas existenciais, do desenvolvimento ao longo de toda a ambos dependentes do acúmulo de ex- vida (lifespan). Pressupõe que envelheci- periência de vida (NERI, 2001; 2002). mento e desenvolvimento são processos No Quadro 1, apresentamos os temas correlatos e que, mesmo na presença das correntes em psicologia do envelheci- limitações de origem biológica, os proces- mento, baseado no sumário da quarta e sos psicológicos já estabelecidos se man- da quinta edições do Handbook of têm e, se o ambiente cultural for propí- psychology of aging, editado por J. E. cio, pode ocorrer desenvolvimento na Birren e K. W. Schaie, em 1996 e 2001. velhice (BALTES, 1987, 1997). São reconhecidos como representativos A psicologia oferece contribuições do status da área no âmbito internacio- importantes à compreensão dos proces- nal e contêm resenhas dos avanços nos 73 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 6. assuntos mais importantes do campo nos tos e as sínteses de modo a dar uma vi- últimos cinco anos. Especialistas são são orientadora aos estudiosos. incumbidos de produzir os levantamen- Quadro 1 - Principais tópicos na atual psicologia do envelhecimento Influências biológicas e sociais sobre o comportamento na velhice 1. Genética comportamental* 2. A velhice e o sistema nervoso humano 3. Mudanças cognitivas associadas à idade e relações entre o cérebro e o comportamento 4. Saúde e comportamento;* Comportamentos de risco em saúde 5. Influências ambientais sobre o comportamento na velhice Processos comportamentais, funções psicológicas e envelhecimento 6. Mudanças na visão e na audição 7. Atenção e envelhecimento cognitivo 8. Velocidade e ritmo dos processos comportamentais 9. Declínio em controle motor relacionado à idade 10. Processos biológicos e comportamentais em memória 11. Produção e compreensão de linguagem 12. Solução de problemas* e inteligência prática* 13. O curso do desenvolvimento intelectual* 14. Emoções 15. Relações sociais, redes de relações sociais e apoio social 16. Diferenças de gênero e papéis de gênero 17. Personalidade 18. Sabedoria 19. Criatividade 20. Fragilidade, dependência e declínio* 21. Terminalidade, morte e luto* 22. A qualidade de vida e o fim da vida: questões tecnológicas e éticas 23. Atividade e exercício e comportamento* 24. Religião e espiritualidade* 25. Cognição social e atitudes* 26. Violência, abuso e vitimização 27. Desempenho no trabalho e desenvolvimento da carreira* 28. As mudanças tecnológicas e o trabalhador idoso 29. Saúde mental e psicopatologia 74 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 7. Contribuições da psicologia ao estudo e... Contribuições da psicologia à ou restrita, saudável ou patológica, na co- munidade ou em instituições. Esse elenco promoção e à recuperação do de procedimentos pode ser aplicado em bem-estar dos idosos várias áreas, entre as quais se incluem saú- de, relações sociais, família, instituições de Existe um conjunto de técnicas de diag- atendimento a idosos, educação, lazer e so- nóstico, de avaliação e de intervenção vol- ciabilidade, trabalho, ambiente físico e tadas ao tratamento dos problemas compor- ambiente social; pode envolver construção tamentais e psicológicos que afetam o fun- de instrumentos de medida, ensino e pes- cionamento e o bem-estar subjetivo dos quisa. No Quadro 2 são apresentados exem- idosos; visam à manutenção, ao aperfeiçoa- plos de atividades que os psicólogos podem mento ou à recuperação do bem-estar dos desenvolver nessas áreas. idosos que vivem de forma independente Quadro 2 - Campos em que a psicologia pode contribuir para o bem-estar objetivo e subjetivo dos idosos Campos em que a pscicologia pode contribuir para o bem-estar objetivo e subjetivo dos idosos 1. Saúde. Ênfase em promoção em saúde; reabilitação cognitiva e psicomotora; aconselhamento, orientação e psicoterapia e cuidados paliativos; avaliação de capacidades funcionais; apoio psicológico em situação de reabilitação física e de cuidados paliativos; treino de memória; psicoterapias em desordens emocionais; treino de relaxamento; terapias expressivas e arte-terapia em demência. 2. Relações sociais. Por exemplo, envolver treino de habilidades sociais para programas de ação gerontológica em saúde e em defesa dos direitos sociais. 3. Família. Importante oferecer informação e apoio à promoção de boas relações e de relações de interdependência entre as gerações, atuar em situações de crise e oferecer apoio psicológico. 4.Instituições públicas e privadas de assistência social e à saúde dos idosos. Oferecer treinamento de habilidades profissionais e apoio psicológico a profissionais que trabalham com idosos, assessoria ao planejamento e à avaliação de serviços. 5. Educação, lazer e sociabilidade. Os psicólogos podem oferecer informação psicológica e atividades grupais visando ao aprimoramento de habilidades sociais, atuar no planejamento do currículo e fazer pesquisa, tendo em mente que a educação é um processo permanente e que os idosos devem ser tratados como participantes ativos com uma história de vida e conhecimentos a serem respeitados. Na educação não formal, as possibilidades se ampliam em programas veiculados pela mídia impressa e televisiva, pela internet, sobre qualidade de vida, saúde, relações sociais, cidadania, alfabetização. Também, pela organização e orientação de centros de memória, grupos de avós, de contadores de história e de voluntários, clubes recreativos, centros de convivência e programas de autogestão por idosos, no trabalho, no lazer ou na ação social. 6. Trabalho. Muitos idosos trabalham para sobreviver ou para ajudar os membros mais jovens da família. Outros o fazem por opção. O psicólogo pode ajudar com programas de capacitação e reciclagem para o trabalho, treino de atitudes e motivação. No contexto organizacional, ele pode operar em favor dos mais velhos, desenvolvendo instrumentos e técnicas de seleção, acompanhando providências no campo da ergonomia, trabalhando na prevenção de riscos e promovendo alterações na cultura organizacional de modo a favorecer o aproveitamento das competências dos idosos. Pode trabalhar atitudes e procedimentos de pessoal de recursos humanos para lidar com os trabalhadores mais velhos; pode ajudá-los a flexibilizar a carreira, a desenvolver papéis profissionais adequados aos ganhos da maturidade, a planejar uma segunda carreira ou a preparar-se para a aposentadoria. Os idosos podem desenvolver atividades profissionais e de prestação de serviços assumindo papéis de consultores, auditores e assessores especializados, transformando a experiência acumulada em serviços. 75 7. Ambiente ecológico. Os focos são a segurança, o conforto e a satisfação nas cidades, nos lares e nas RBCEH - Revista Brasileira de Ciênciasado Envelhecimentovida objetiva e subjetiva dos idosos. instituições, fatores que contribuem para boa qualidade de Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004 8. Situações de vulnerabilidade social. Os psicólogos têm muito a oferecer em programas de prevenção e de
  • 8. aproveitamento das competências dos idosos. Pode trabalhar atitudes e procedimentos de pessoal de recursos humanos para lidar com os trabalhadores mais velhos; pode ajudá-los a flexibilizar a carreira, a desenvolver papéis profissionais adequados aos ganhos da maturidade, a planejar uma segunda carreira ou a preparar-se para a aposentadoria. Os idosos podem desenvolver atividades profissionais e de prestação de serviços assumindo papéis de consultores, auditores e assessores especializados, transformando a experiência acumulada em serviços. Quadro 2 Continução 7. Ambiente ecológico. Os focos são a segurança, o conforto e a satisfação nas cidades, nos lares e nas instituições, fatores que contribuem para a boa qualidade de vida objetiva e subjetiva dos idosos. 8. Situações de vulnerabilidade social. Os psicólogos têm muito a oferecer em programas de prevenção e de atendimento à pobreza; à violência, ao abandono e aos maus-tratos; à deficiência física, mental e sensorial; a idosos migrantes e sem-teto, trabalhos que podem desenvolver-se em instituições públicas, privadas e não governamentais. 9. Redação de material informativo, utilizando os mais variados suportes (livros, folhetos, artigos ou entrevistas em jornais, TV, rádio, CD-ROM, videocassete) e dirigidos às mais variadas audiências (idosos, crianças, comunidade, políticos, professores, estudantes de psicologia). 10. Desenvolvimento ou validação de instrumentos de medida psicológica apropriados à realidade brasileira, por exemplo, nos campos da personalidade, da cognição, das capacidades funcionais e das atitudes. 11. Pesquisa, visando à geração de conhecimento relevante do ponto de vista teórico e social, o que significa pesquisar tendo em vista os progressos acumulados da ciência, bem como os problemas da vida real dos brasileiros. 12. Ensino de psicologia do envelhecimento em cursos de psicologia, educação e medicina, quebrando velhos tabus sobre a velhice como período de declínio, sobre a impossibilidade de educar idosos e da velhice como problema de saúde. Melhor será se esse ensino for teórica e empiricamente fundamentado, não baseado em teorias do senso comum sobre a velhice. Em todos esses contextos de atuação, tadas pela profissão, como podemos ver o psicólogo pode desempenhar um am- no Quadro 3, inspirado em Carstensen, plo leque de funções que lhe são facul- Edelstein e Dornbrand (1996). Quadro 3 - Principais funções dos psicólogos especializados em oferta de serviços a idosos 1. Avaliação psicológica 2. Planejamento e execução de intervenção psicológica 3. Orientação e aconselhamento 4. Informação e mudança de atitudes em relação à velhice 5. Psicoterapias individuais e grupais com idosos, voltadas para problemas de ordem emocional e psicossocia 6. Tratamento de déficits e de distúrbios cognitivos e psicomotores, ou reabilitação cognitiva dos idosos 7. Orientação, aconselhamento e psicoterapia, individuais e grupais, a familiares de idosos dependentes e fragilizados 8. Intervenções individuais e grupais em situações de crise 9. Assessoria a instituições públicas, a organizações públicas e privadas que amparam e cuidam de idosos e a famílias de idosos 10. Assessoria, planejamento e execução de programas de promoção em saúde na comunidade 11. Assessoria, planejamento e execução de programas de promoção social para idosos 12. Assessoria e planejamento de providências ecológicas e de programas de mudança de atitudes visando ao bem-estar dos idosos, nas cidades, nas instituições e nas organizações 13. Apoio psicológico a profissionais que cuidam de idosos 14. Participação em equipes multiprofissionais 76 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 9. Contribuições da psicologia ao estudo e... Embora não esgote o leque de opções de. No Quadro 4, vemos uma relação de da profissão, o campo central de formação campos de intervenção clínica específicos e de identificação do psicólogo é o da saú- ao campo da velhice (Birren et al., 1992). Quadro 4 - Principais campos de intervenção clínica para os psicólogos que lidam com idosos 1. Fatores comportamentais e psicológicos de risco para a ocorrência de velhice patológica 2. Fragilidade e dependência: questões éticas e práticas que se propõem aos idosos e aos seus cuidadores profissionais e familiares 3. Avaliação e intervenção em distúrbios psicológicos e do comportamento, déficits comportamentais e problemas em 3.1. Capacidades funcionais 3.2. Emoção e afeto 3.3. Cognição 3.4. Motivação 4. Saúde física, como, por exemplo, distúrbios do sono, dor crônica, enxaqueca, osteoporose, problemas cardiovasculares e cerebrovasculares, vulnerabilidade ao estresse, depressão, incontinência, instabilidade e quedas 5. Doenças neuropsicológicas (por exemplo, doenças de Parkinson e mal de Alzheimer) 6. Intervenções baseadas em apoio social, com vistas a amortecer o impacto de situações de crise (ex.: morte ou doença grave do cônjuge) 7. Intervenções comportamentais (ex.: as que visam à adesão ao tratamentoa, ao enfrentamento de estresse, desamparo e ansiedade 8. Intervenções comportamentais em serviços de saúde e sociais (ex.: as que visam a melhorar o estilo de vida, a nutrição, a saúde bucal, a adesão a tratamentos médicos, o tratamento e a prevenção de hipertensão, da osteoporose e da catarata 9. Reabilitação cognitiva em síndromes neurológicas (ex.: treino de memória, de orientação temporal e espacial e de compreensão verbal) 10. Apoio psicológico (ex.: lidar com a fragilidade, a dependência e a morte) e treinamento (ex.: ensino, empatia) a profissionais de saúde que participam do sistema de cuidado formal a idosos fragilizados e dependentes (ex.: em asilos e hospitais) 11. Apoio e treinamento ao sistema de cuidado informal (familiares e voluntários) que apóiam idosos frágeis e dependentes (ex.: informações sobre as doenças e seu manejo em casa; habilidades práticas de cuidar; manejo de sentimentos e do estresse, cuidados com a própria saúde, atenção às relações familiares, como acionar recursos da comunidade, o que fazer em caso de episódio agudo ou morte do idoso) Contribuições da psicologia ao funcionalmente incapacitados. Progra- mar o ambiente residencial, o ambien- planejamento de ambientes te de trabalho, os asilos e casas de repou- físicos adequados a idosos so, o bairro e a cidade, os hospitais, A psicologia pode oferecer contribui- ambulatórios, centros-dia e centros de ções ao planejamento e à reprogramação saúde e os locais de lazer e de convivên- ambiental para idosos independentes ou cia é vital para a prevenção da incompe- 77 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 10. tência comportamental, da dependên- motivação e atitudes. Pode atuar direta- cia, da depressão, da insegurança, do mente no planejamento e assessoramento isolamento, do abandono, da negligên- empresas, profissionais, familiares e o cia e dos maus-tratos (LAWTON, 1991). próprio idoso, para proporcionar condi- O psicólogo pode atuar sobre o am- ções para que o idoso possa viver bem no biente do idoso com base em conheci- seu ambiente (SCHAIE e SCHOOLER, mentos oferecidos pela psicologia da per- 1998; NERI, 2000) (Quadro 5). cepção e por estudos sobre satisfação, Quadro 5 - Tópicos de interesse em psicologia ambiental e envelhecimento 1. A avaliação dos contextos gerontológicos, como, por exemplo, o lar e os asilos, com base em teorias psicológicas e sociológicas 2. O controle ambiental como base para a segurança e a competência física e psicossocial dos idosos 3. Características psicossociais dos ambientes gerontológicos. O papel da organização, da beleza, do conforto e da novidade 4. Os ambientes de lazer, educação e sociabilidade como contextos de desenvolvimento 5. Fatores ambientais de risco para o abandono, maus-tratos e violência em relação aos idosos, na cidade, nas instituições e em casa Considerações finais Os psicólogos que hoje estão traba- hoje poucas possibilidades de atuação lhando com idosos valem-se de informa- para os psicólogos uma vez que: a) ain- ções advindas de várias áreas da psico- da não existe opinião formada na clien- logia, estando afiliados especialmente a tela em relação à validade ou à possibi- serviços de saúde existentes em hospi- lidade de realizar intervenções psicote- tais e em centros de saúde. As iniciati- rapêuticas com idosos; b) os cursos de vas em medicina da família, recente pro- psicologia não investem nessa faixa grama do Ministério da Saúde que en- etária nem estimulam os futuros psicó- volve parceria entre prefeituras e hospi- logos a melhor compreendê-la; c) preva- tais de referência, deverão abrir um lecem preconceitos a respeito da flexi- campo novo para o profissional de psi- bilidade dos idosos para a mudança, o cologia. Instituições asilares, casas de que tradicionalmente tem sido um en- repouso particulares, instituições públi- trave para o desenvolvimento de trata- cas, universidades abertas à terceira ida- mentos apropriados aos mais velhos; d) de, cursos de especialização e centros de a clínica exercida em moldes individuais convivência para idosos estão abrindo e privados é cara para uma população outros espaços para atuação. pobre, caso da maioria dos idosos; e) o No campo da psicologia clínica serviço público de saúde não presta aten- exercida nos moldes tradicionais, há dimento psicológico universal à popu- 78 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 11. Contribuições da psicologia ao estudo e... lação em geral e, muito menos, a idosos. poder aquisitivo é geralmente baixo e Isso significa que os psicólogos precisa- têm pouco acesso à informação sobre os rão adaptar-se criativamente e aprender recursos da psicologia e sobre seu direi- a usar os conhecimentos clínicos em to a atendimento nessa modalidade de outros contextos de cuidado à saúde, ajuda. Esse cenário dispõe condições além de aprenderem a trabalhar em gru- que prenunciam a construção gradual pos e em modalidades de intervenção do campo, que se constituirá com base focais e breves. no diálogo constante entre a psicologia Do campo de conhecimentos sobre como ciência e a psicologia como pro- avaliação psicológica, cognição, trata- fissão, os profissionais brasileiros que mento individual e grupal a problemas atuam com idosos, a população idosa e afetivos e cognitivos de idosos, os psicó- as instituições sociais. logos brasileiros tirarão mais informa- ções úteis à atuação e à construção do Recebido para publicação em maio de 2003. campo de atendimento à saúde física e mental dos idosos. Também poderão Abstract buscar apoio teórico e tecnológico no campo da psicologia, da psicologia social The increasing of aged population e da psicologia da personalidade, para and the current ideological changes melhor atuarem junto a pequenos gru- toward aging constitutes the scenery to pos, famílias e comunidades. A psicolo- the building of psychology as scientific gia educacional poderá valer-lhes em and professional field. The interaction situações em que o imperativo é reali- between psychology and other careers in zar intervenções de educação e de ensi- the social and health fields promotes no não formal, educação permanente e their mutual development. Good educação em saúde. scienific and humanistic education, and Cada vez mais a psicologia e os psi- multiprofessional work will allow to cólogos brasileiros serão solicitados a Brazilian psychologists to perform their dar respostas à população idosa, a qual job in the fields of work, health, está crescendo de forma rápida. Num environment, leisure, education, family país de dimensões continentais, são vá- support, group management, community, rias as realidades econômicas, sociais, rehabilitation, treatment, building of culturais, psicológicas e de saúde dos instruments and methods of assessment, idosos. Também são variadas as condi- researching and teaching of psychology of ções profissionais e as relativas à base de aging. informação dos psicólogos para o exer- cício da profissão frente a idosos, cujo Key words: aging, old persons, psychology, professional field, Brazil. 79 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004
  • 12. Referências IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Es- tatística, 2000. Disponível em: http:// BALTES, P. B. Theoretical propositions of the www.ibge.gov.br/home/estatistica/populaçao/ life span developmental psychology: on the tabuadevida/textoambosossexos2000/shtm dynamics between growth and decline. LAWTON, M. P. A multidimensiol view of Developmental Psychology, v. 23, p. 611-696, quality of life in frail elders. In: BIRREN, J. E. 1987. et al. (Ed.). The concept and measure of quality of BALTES, P. B. On the incomplete architecture life in the frail elderly. San Diego, Cal.: Academic of human ontogeny. Selection, optimization, Press, 1991. p. 4-26. and compensation as foundation of NERI, A. L. Qualidade de vida na velhice e aten- developmental theory. American Psychologist, v. dimento domiciliar. In: DUARTE, Y. A. de O.; 4, n. 52, p. 366-380, 1997. DIOGO, M. J. D’Élboux (Org.). Atendimento BALTES, P. B.; MAYER, K. U. (Ed.). The Berlin domiciliar: um enfoque gerontológico. São aging study. Aging from 70 to 105. Cambridge: Paulo: Atheneu, 2000. cap. 5. Cambridge University Press, 1999. NERI, A. L. Paradigmas contemporâneos sobre BIRREN, J. E.; SCHAIE, K. W. (Ed.) Handbook o desenvolvimento e o envelhecimento. In: of psychology of aging. 4 th ed. San Diego: NERI, A. L. (Org.). Desenvolvimento e envelhe- Academic Press, 1996. cimento. Campinas: Papirus, 2001. cap. 1. BIRREN, J. E.; SCHAIE, K. W. (Ed.). Handbook NERI, A. L. Envelhecer bem no trabalho: pos- of psychology of aging. 5 th ed. San Diego: sibilidades individuais, organizacionais e so- Academic Press, 2001. ciais. A Terceira Idade/Sesc, São Paulo, v. 13, n. 24, p. 7-27, 2002. BIRREN, J. E.; SCHROOTS, J. J. F. Concepts, theory, and methods in the psychology of aging. ROWE, J. R.; KAHN, R. L. Successful aging. New In: BIRREN, J. E.; SCHAIE, K. W. (Ed.). York: Pantheon Books, 1998. Handbook of psychology of aging. 4th ed. San SCHAIE, K. W.; SCHOOLER, C. (Ed.). Impact Diego: Academic Press, 1996. cap. 1. of work on older adults. New York: Springer, 1999. BIRREN, J. E. et al. (Ed.). Handbook of mental health and aging. San Diego: Academic Press, Endereço 1992. Avenida Bertrand Russell, 801 CAMARANO, A. A. et al. Como vive o idoso Campinas - SP brasileiro? In: CAMARANO, A. A. (Org.). Muito além dos 60. Os novos idosos brasileiros. Rio de CEP: 13083-970 Janeiro: Ipea, 1999. Fone (19) 3788 5670/5595/5555. CARSTENSEN, L. L.; EDELSTON, B. A; E-mail: anitalbn@lexxa.com.br DORNBRANB, L. (Ed.). The practical handbook of clinical gerontology. Thousand Oaks, Cal.: Sage. 80 RBCEH - Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano, Passo Fundo, 69-80 - jan./jun. 2004