O documento resume o livro "Cenas da vida pós-moderna: intelectuais, artes e videocultura" da autora Beatriz Sarlo. No livro, Sarlo analisa como a cultura de massa e o consumismo influenciam a sociedade latino-americana na era da globalização, discutindo tópicos como a transformação das cidades, shoppings centers, jovens e videogames. Ela argumenta que os objetos de consumo se tornaram ícones que constroem identidades transitórias e que a história foi substituída pela ló
1. SARLO, Beatriz. Cenas da vida pós-Moderna: intelectuais,
artes e videocultura. 3ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ,
2004. P.13-98
QUEM É BEATRIZ SARLO:
Beatriz Sarlo nasceu em Buenos Aires e é professora de literatura argentina na Universidade
de Buenos Aires, tendo já trabalhado sobre literatura popular, história da imprensa, cinema,
cultura de massas e o papel dos intelectuais.
SOBRE O LIVRO:
Sarlo em Cenas da vida pós-moderna: intelectuais, arte e videocultura na Argentina apresenta
uma série de textos que discutem a transformação da cidade, os shoppings centers, o lugar do
mercado, a juventude atual, os videogames, além da arte e do papel dos intelectuais neste
começo de século XXI na América Latina.
Sarlo propõe um debate sobre o papel da cultura de massa e de consumo nos países latino-americanos
mergulhados na lógica da globalização e funcionando sob forte influência das leis
do mercado. Sua perspectiva de oposição ao neoliberalismo é fruto de uma análise
extremamente complexa e atual. Ela não tem medo de dizer o que pensa e tem uma profunda
sensibilidade para o "modus vivendi" urbano e pós moderno.
Seu livro é uma coletânea de artigos, divididos em cinco capítulos intitulados: "Abundância e
pobreza", "O sonho acordado", "Culturas populares, velhas e novas", "O lugar da arte" e
"Intelectuais". Em cada um deles trata de assuntos distintos sempre a partir da experiência
argentina. Entretanto, suas reflexões servem para um mapa geográfico bem mais amplo.
CAPÍTULO I - "ABUNDÂNCIA E POBREZA"
O capítulo está subdividido em 4 subtítulos: cidade, mercado, jovens e videogames.
No primeiro subtítulo – Cidade - discute a atual padronização das cidades sem "centro",
distintas dos modelos clássicos europeus, onde o coração da cidade era o espaço geográfico e
simbólico mais importante, local onde se encontravam os monumentos, a vida comercial, os
cinemas, os restaurantes, além de luzes, cores e ruídos. Hoje isso mudou com a transferência
para o shopping center deste papel de aglutinador de pessoas e serviços dentro de um
ambiente artificial e impregnado pela "estética do mercado".
p.18
“...os shoppings podem ser vistos como os monumentos de um novo civismo... nos shoppings
os cidadãos desempenham papéis diferentes: uns compram, outros simplesmente olham e
admiram... Tem a atmosfera irreal de uma cidade em miniatura, porque foi construído muito
rápido e não conheceu vacilações, marchas e contramarchas, correções, destruição,
influências de projetos mais amplos. A história está ausente, e quando existe ... é usada para
desempenhar um papel servil, convertendo-se em decoração banal.” “... a história é tratada
como souvenir...” “...o shopping sofre de uma amnésia necessária ao bom andamento de seus
negócios, porque se os traços da história forem evidentes demais, superando a função
decorativa, o shopping viveria um choque de funções e sentidos: p/ o shopping a única
máquina semiótica e a de seu próprio projeto.”
2. E para a autora, os shoppings se definem como espaços desterrritorializados, espaços de
não pertencimento. Todos os shopping centers se parecem e são lugares sem orientação e
onde o tempo é suspenso. Não se distingue dia e noite e geralmente não há relógios à mostra.
Diferentemente do flâneur que se perdia pelas ruas e galerias de Paris, como chama a atenção
Walter Benjamin, o freqüentador dos shoppings atuais encontra nele uma vertente da cidade
que não vê lá fora: limpa, segura, com serviços e acesso a qualquer hora. Mas para Sarlo este
não deve ser pensado como o espaço público, ao contrário, ele representa "o espelho de uma
crise do espaço público" (p.22).
No segundo subtítulo – Mercado
p. 25
“... E quem sonha esses sonhos? A cultura sonha, somos sonhados por ícones da cultura.
Somos sonhados por ícones da cultura. Somos livremente sonhados pelas capas de revistas,
pelos cartazes, pela publicidade, pela moda... a instabilidade da sociedade moderna se
compensa no lar dos sonhos, onde com os retalhos de todos os lados conseguimos operar a
“linguagem da nossa identidade social”.
p.26
“...As identidades, dizem, quebraram. Em seu lugar não ficou o vazio, mas o mercado...
Sonhamos com as coisas que estão no mercado. ... O desejo do novo é, por definição,
inextinguível. ... o novo se impõe com seu moto-perpétuo.
Sujeito – colecionador às avessas. Em vez de colecionar objetos, coleciona atos de aquisição
de objetos.
p.27
... o colecionador às avessas sabe que os objetos que adquire desvalorizam-se assim que ele
os agarra. ... Ele coleciona atos de compra-e-venda, momentos plenamente ardentes e
gloriosos...
p.28
...No polo oposto ao colecionador às avessas estão os excluídos do mercado: desde os excluídos
que, de qualquer mode, ainda podem sonhar consumos imaginários, até aqueles cuja pobreza os
restringe ao curral das fantasias mínimas. ...
A identidade transitória afeta tanto os colecionadores às avessas quanto os menos favorecidos
colecionadores imaginários: ambos pensam que o objeto lhes dá (ou daria) algo de que precisam,
não no nível da posse, mas no da identidade.
Os objetos são os nossos ícones, quando os outros ícones, que representavam alguma divindade,
demonstram sua impotência simbólica; são os nossos ícones porque podem criar uma comunidade
imaginária ( a dos consumidores, cujo livro sagrado é o advertising, e cujo ritual é o shopping spree,
e cujo templo é o shopping, sendo a moda seu código civil).
p.29
Entretanto, os objetos escapam... Aquilo que os torna desejáveis também faz com que sejam
voláteis. A instabilidade dos objetos se origina justamente em seu livro sagrado e nos saberes que a
enciclopédia da moda codifica a cada temporada. São valiosos porque mudam constantemente,
mas paradoxal que pareça, também perdem seu valor porque constantemente mudam...
...os objetos de projeto perfeito vão parar nos museus e nas coleções; os objetos de projeto
“ordinário” (geralmente, os objetos marcados pela moda) só são preservados enquanto não se
puder substituí-los por outros mais novos e melhores.
3. O tempo foi abolido para os objetos comuns do mercado. Não que eles sejam eternos, e sim por
serem inteiramenrte transitórios. Duram enquanto não se gastar de todo seu valor simbólico, porque,
além de mercadorias, são objetos hipersignificantes.
p.30
Hoje, o mercado pode tanto quanto a religião ou o poder: acrescenta aos objetos um “algo mais”
simbólico fugaz, porém tão poderoso quanto qualquer outro símbolo. ...
Os objetos continuam escapando de nós. Tornaram-se tão valiosos para a construção de uma
identidade, são tão centrais no discurso da fantasia, despejam tamanha infâmia sobre quem não os
possui, que parecem feitos da matéria resistente e inacessível dos sonhos.
Os objetos são uma âncora, porém uma âncora paradoxal, pois ela mesma deve mudar o tempo
todo, oxidar-se e destruir-se, entrar em obsolescência no próprio dia de sua estreia. Com tais
paradoxos constrói-se o poder dos objetos: a liberdade daqueles que os consomem surge da férrea
necessidade do mercado de converter-nos em consumidores permanentes.
P.31
O tempo dos objetos só pesa para quem não pode substituí-los por outros mais novos.
... precisamos perguntar o que esta sociedade está buscando em tais avatares da engenharia
corporal ou do design de mercado.
No terceiro subtítulo – Jovens
Ainda neste capítulo, a intelectual reflete sobre a juventude e os videogames. Sempre lançando
um olhar crítico e muitas vezes impiedoso, Sarlo afirma que "a juventude não é uma idade e
sim uma estética da vida cotidiana" (p. 36).
p.32
... Essa garota pintou o rosto e distribuiu sobre o corpo uma série de signos que já não
significam o que outrora significaram...
Ela veste uma fantasia de discoteca na qual o humor disputa o terreno com o erotismo.
É uma moda que se propõe a desnudar, opondo-se à sua função tradicional de oscilar entre o
visto e o não visto
A fantasia da discoteca – realiza quase completamente o ideal de visibilidade total
A garota está vestida em dois tempos: há um contraponto entre o corpo e sua fantasia. A roupa
não foi escolhida para favorecer o corpo...
p.34
Desde os anos 60, a cultura do rock, por sua vez, fez do traje uma marca central de seu estilo.
...moveu-se desde o início com o impulso de uma contracultura que se espalhou pela vida
cotidiana.
... a cultura rock definiu os limites de um território onde houve mobilização, resistência e
experimentação.
4. p.35 ... a ideia do traje como diferenciação p.36 entre tribo culturais se desenvolve em todas as
suas peripécias.
... Pura forma, sua fantasia se diferencia da forma da moda “legítima” por não aspirar à
universalidade e sim a uma fração particular: marca sua idade, sua condição de jovem, e não
sua condição social ou seu dinheiro.
A juventude não é uma idade e sim uma estética da vida cotidiana.
p.38
...Quando falaram de uma “nova geração”, esses termos foram usados como marca de
diferença ideológica que, para completar-se, dispensava qualquer recurso a uma reivindicação
de juventude.
p. 39
As modelos de publicidade imitavam as atrizes ou a classe alta; hoje, imitam as modelos mais
jovens. As atrizes é que imitam as modelos.
Hoje a juventude é mais prestigiosa do que nunca...
A categoria de “jovem”, por sua vez, garante um outro set de ilusões com a vantagem de poder
trazer à cena a sexualidade e, ao mesmo tempo, desvencilhar-se mais livremente de suas
obrigações adultas, entre elas a de uma definição taxativa do sexo.
p.40
Se é quase imposível definir o permitido e o proibido, a moral deixa de ser um território de
conflitos significativos para converter-se num elenco de enunciados banais: a autoridade
perdeu seu aspecto terrível e intimidatório... e só é autoridade quando exerce a força
repressiva... Onde antes se podia enfrentar a proibição discursiva, hoje parece restar só a
polícia.
... O mercado ganha relevo e corteja a juventude, depois de instituí-la como protagonista da
maioria de seus mitos.
p.41
...Nunca as necessidades do mercado estiveram afinadas tão precisamente ao imaginário de
seus consumidores.
O impulso igualitário que às vezes se crê encontrar na cultura dos jovens, tem seu limites nos
preconceitos sociais e racistas, sexuais e morais.
No quarto subtítulo – Videogames
E os videogames são um espaço predominantemente jovem e masculino. Faz uma descrição
sensível das casas de videogames e das relações que se estabelecem no isolamento daquele
espaço, um misto de discoteca e bar. Os olhares estão voltados para a tela e dela não se
desviam. As máquinas são um conjunto de "temporalidades diversas" no qual as tecnologias de
imagem e som se misturam em ritmo frenético e onde as performances são valorizadas.
Performances que se definem como boas pela maneira como o jogador lida com o tempo, ou
melhor, dribla o tempo. E aqui se pode apontar para uma das ausências na análise da
pesquisadora. Sua reflexão é fruto de uma observação sensível, com insights instigantes sobre
5. este universo. Entretanto, faz falta a voz do "outro", do "jogador" de videogame, de seu
sentimento e pensamento sobre aquela atividade e aquele espaço. Essa ausência ofusca o
brilho de suas percepções tão ricas.
p.47
efeito espelunca – tbm tem a ver com a presença minoritária de mulheres.
CAPÍTULO II- "O SONHO ACORDADO"
No capítulo dois "O sonho acordado" ela ainda aborda a questão da imagem desde o zapping,
a televisão interativa, os programas "ao vivo" até a dimensão politica presente no veículo. Sarlo
não é uma adorniana, mas sua crítica da televisão é feroz. A idéia de uma televisão de
mercado está na base de sua análise. Televisão que possui uma lógica própria na qual a
repetição (em relação ao comercial) e a velocidade constróem uma forma de ver o mundo. A
autora afirma inclusive que o zapping é um discurso televisivo que subentende a presença do
telespectador, assim como os programas participativos e os reality shows são a maior
expressão da chamada "nova televisão". Nela também os programas ao vivo proporcionam aos
telespectadores, não a idéia de verossimilhança, mas de que a vida está ali. E no dia a dia da
vida moderna, as piadas, as frases, os personagens da televisão asseguram a quem os
conhece um pertencimento. Mas Sarlo não se ilude com a idéia de que a partilha de aparelhos
de televisão implica no estabelecimento de novos laços entre os indivíduos. Para ela, esta
imagem da família não tem veracidade, pois se sabe do enfraquecimento das relações
familiares na atualidade. E isso não é por acaso, porque, a seu ver, a televisão precisa de uma
sociedade com laços fracos para que ocorra a mimese entre televisão e público. Assim neste
contexto uma crítica mais profunda da televisão é banida ou acusada de, entre outras coisas,
ultrapassada. Entretanto, ela ressalta que só há um jeito de aprender a ver televi televisão:
vendo-a. E não se pode negar que esse aprendizado é barato, antielitista e nivelador, enfatiza
ela.
O capítulo está subdividido em 4 subtítulos: Zapping, Gravação ao vivo, Política e Citação.
No primeiro subtítulo – Zapping –
p.57
O controle remoto é uma máquina sintática, uma moviola caseira de resultados imprevisíveis e
instantâneos, uma base de poder simbólico que é exercido segundo leis que a televisão
ensinou a seus espectadores.
Primeira lei: produzir a maior acumulação possível de imagens de alto impacto por unidade de
tempo e baixa quantidade de informação por unidade de tempo indiferenciada
Segunda lei: extrair todas as consequências do fato de que a retroleitura dos discursos visuais
ou sonoros, que se sucedem no tempo, é impossível ...
A velocidade do meio é superior à nossa capacidade de reter seus conteúdos.
p.58
Terceira lei: a variada repetição do mesmo
Quarta lei: montagem ideal ... para evitar a mudança de canal.
O switcher é a arma dos diretores de câmara. O controle remoto é uma arma dos espectadores que
apertam botões.
p.59
O switcher ancora os diretores de câmera nu certo ambiente.
O controle remoto não ancora ninguém em parte aluma: é a sintaxe irreverente e irresponsável do
sonho produzido por um inconsciente pós-moderno que embaralha imagens planetárias.
O zapping suscita uma série de questões interessantes. Entre elas, evidentemente, a Liberdade do
espectador...
6. No segundo subtítulo – Gravação ao vivo
p.70
nova televisão – ou televisão interativa
1º. Gravação ao vivo
2º apresentar uma faixa de vida
3º estúdio de TV parece mais seguro, mais acessível e à altura do protagonista do que as
instituições
4º somo, potencialmente, objetos e sujeitos que podem entrar no ar.
p.74
... De todas as instituições, a televisão ao vivo foi a que lhe pareceu a mais digna de confiança:
ninguém poderá distorcer nem seus gestos nem suas afirmações e, mais ainda, nenhum policial
poderá força-lo a dizer mais do que deseja, nem deixá-lo incomunicável por horas. A televisão se
converteu em guarda de seu habeas corpus.
O Happening – modo de apresentação que amplia e aperfeiçoa o realismo
p.75
Investida da autoridade que as igrejas, os partidos e as escolas perderam, a televisão faz soar a voz
de uma verdade que todo mundo pode compreender rapidamente. A epistemologia televisiva é,
neste sentido, tão realista quanto populista, e submeteu a uma demolidora crítica prática todos os
paradigmas de transmissão do saber conhecidos pela cultura letrada.
p.77
cultura espelho
televisão como espaço mítico
Essa comunidade de sentidos reforça um imaginário igualitarista e, ao mesmo tempo, paternalista.
O público recorre à televisão para alcançar aquelas coisas que as instituições não garantem: justiça,
indenizações, atenção.
O cenário televisivo vive do impulso, enquanto o cenário institucional cumpre adequadamente suas
funções, se processar comeficácia os impulsos coletivos.
p.78
A televisão reconhece seu público, entre outras coisas, porque necessita desse reconhecimento
para que seu público seja, efetivamente, seu.
O têrmo caudilho, do espanhol ¨caudillo¨, refere-se à um
lider político-militar no comando de uma força autoritária.
Este têrmo está, normalmente, associado à América La-tina,
do século XIX e início do século XX , ou relacionado
à época Franquista, na Espanha. O caudilhismo susten-ta-
se por causa do culto à personalidade. Os caudilhos
são capazes de comandar grande número de pessoas
e prender a atenção de vastas multidões entusiasmadas.
Exemplos de personalidades consideradas caudilhos famo-sos
: Peron; Franco; Trujillo; Pancho Villa; etc.
7. p.79
Há quem pense que um aparelho de TV une com laços aqueles que estão sentados diante do
mesmo vídeo. Videofamílias, às quais o enfraquecimento das relações de autoridade, paternidade e
filiação tradicionais teria lançado ao limite da dissolução, voltariam a unir-se no calor da luz
cromática.
p.80
se a televisão fala como nós, nós tbm falamos como a televisão.
p.82
a televisão é acessível – reflete seu público e nele se reflete
a televisão é laica e democrática, mas não deixa de ter fortes elementos de fundamento mítico.
p.83
Mimética e ultra-realista, a televisão constrói seu público a fim de poder refleti-lo, e o reflete para
poder construí-lo.
Para produzir-se como televisão, basta ler o livro do público; para produzir-se como público, basta
ler o livro da televisão.
No terceiro subtítulo – Política
p. 83
A televisão faz circular tudo o que pode ser convertido em assunto: desde os costumes sexuais
até a política. E tbm reduz à poeira do esquecimento os assuntos de que não trata: desde os
costumes sexuais até a política.
p.84
Hoje a política existe, na medida em que exista televisão. ... Tudo que se pode fazer é a crítica
mais radical da videopolítica realmente existente.
p. 87
Se algumas questões importantes para amplas maiorias se convertem em objeto
exclusivamente midiático, o sentido da política e dos políticos não parecerá evidente para
ninguém.
No quarto subtítulo – Citação
p.89
Porém, o que é ainda mais excitante é que os espectadores se dão conta do que está
acontecendo, porque esse programa e muitos outros nos ensinaram não só sua comicidade
mas tbm suas leis de produção.
A auto-reflexividade – recurso que oferece uma garantia de transparência
p. 91
Talvez esteja aí um dos milagres da retórica televisiva do últimos anos: um “realismo” que
assegura a presença da “vida” chegou até ali; e providências discursivas para que a “vida” seja
atraente e não simplesmente sórdida ou banal.
A auto-reflexividade, que na literatura é uma marca de distância, opera na televisão como uma
marca de proximidade que torna possível o jogo de cumplicidades entre a televisão e o público.
De todos os discrsos que circulam na sociedade, o da televisão produz o efeito de maior
familiaridade: a aura televisiva não vive da distância e sim de mitos cotidianos. Só existe um
8. jeito de aprender televisão: vendo-a. E é preciso convir que esse aprendizado é barato,
antielitista e nivelador.Por isso a TV não enfrenta obstáculos culturais para realizar suas
operações auto-reflexivas. Tbm por isso,
p.92
a citação (que na literatura ou na pintura sempre implica uma dificuldade de reconhecimento)
pode ser utilizada pela TV sem problemas: todos os espectadores habituados à televisão estão,
em teoria, aptos a reconhecer as citações que ela apresenta.
... o saber dos espectadores é indispensável para completar o sentido...
A culminância da citação é a paródia, hj usada como recurso fundamental da comicidade
televisiva.
No outro extremo do arco está a cópia, que funciona como estratégia das emissoras invejosas
do sucesso dos programas concorrentes.
p.93
A TV vive da citção mais por preguiça intelectual do que por qualquer outra coisa.
A hiperparódia é um falta de imaginação para produzir outras formas de humor, sátira, de
estilização ou de grotesco, mais do que uma demonstração de audácia criativa ou crítica.
p. 94
A TV que conhecemos trabalha com o nível mais baixo de transformação, para não impedir
indevidamente o reconhecimento do discurso citado e, assim, arriscar o efeito cômico ou
crítico.
...descarta-se, geralmente, a estilização, a ironia, a homenagem.
p.95
admitamos que a TV fez justiça ao folhetim, desprezado pelas elites intelectuais por
preconceitos estéticos e sociais.
p.98
Como o imperialismo branco no século passado, a televisão não reconhece fronteiras: daí sua
força.