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Título: Prelúdio de amor
Autor: Arlene James
Título original: A bride to honor
Dados da Edição: Editora Nova Cultural 1999
Publicação original: 1998
Gênero: Romance contemporâneo
Digitalização e correção: Nina
Estado da Obra: Corrigida
O que era mais importante para aquele homem?
Ele era um homem possuidor de uma fortuna e prestígio invejáveis, mas não havia quantia de * dinheiro capaz
de dispensar Paul Spencer de um iminente casamento de conveniência. Seu avô lhe deixara pouca escolha:
desposar uma mulher que ele desprezava ou perder os negócios da família. E, com Paul, a família sempre vinha
em primeiro lugar. Até ele pôr os olhos na bela e inocente Cassidy.
A partir daquele momento, ele já não sabia o que vinha primeiro: seu desejo de agradar à família ou de ter
Cassidy nos braços!
CAPITULO I
— Eu sei que é importante — disse Cassidy, endireitando a peruca vermelha —, mas estamos
perto do Haloween, e você sabe que esta é a época do ano mais movimentada para mim.
William, incomodado com a teimosia da irmã, respirou fundo, pensou e, enquanto ajeitava sua
gravata de seda, disse:
— Vou lhe contar por que preciso tanto desse favor.
Vendo-o tão aflito, Cassidy pensou que, se continuasse levando tudo tão a sério, William acabaria
tendo um ataque cardíaco antes dos quarenta anos.
— Que tal esta? E bem baratinha.
Nada o irritava mais que encontrar sua irmã vestida com uma das fantasias da loja. Era quase
impossível conversar com ela vestida de boneca. Puxando-a pelo braço, William insistiu:
— E o meu chefe, Cass! Ele está desesperado. E recomendei você, pessoalmente. Por
piedade, não me deixe encrencado!
Pobre William, sempre em sobressalto, com medo de que a própria família o deixasse embaraçado...
Tudo bem, talvez seus parentes fossem um tanto excêntricos, mas sempre se comportavam bem. Ou quase
sempre.
Ela sorriu, conciliadora, esquecendo-se completamente do rosto pintado de branco, dos cílios
imensos e da boca com formato de coração.
— Prometo, querido irmão, que o sr. Paul Barclay Spencer receberá um tratamento de rei. E
prometo que encontrarei para ele um traje que impressionará Betty. Palavra de honra de irmã.
William ficou apenas um pouco mais tranquilo.
— O nome correto é Bettina — frisou. — Bettina Lincoln. E, se tudo correr bem, ela será a sra.
Paul Spencer até a primavera.
— E o sr. Spencer terá salvo os negócios da família — Cassidy disse, para provar que tinha prestado
atenção nas palavras do irmão. — E dará esse crédito a você.
— Sim, se você não arruinar tudo. Agora, seria pedir demais que você tirasse essa roupa ridícula antes
que ele chegue?
Cassidy fez que sim. Arrancou a enorme peruca e, contrita, jurou:
— Vou abandonar meu traje de Raggedy Ann e trocá-lo por roupas adequadas para receber seu
patrão. Mais: encontrarei algo para ele usar e conquistar o coração, e tudo o mais, da glamourosa, fantástica srta.
Lincoln. Satisfeito?
William empertigou-se, alisou as dobras do terno italiano impecável e, assentindo, recomendou:
— Só para lembrar: estou contando com você.
O sorriso de Cassidy foi bastante encorajador. Ele lançou-lhe um olhar de aprovação. Mas a alegria de Cass
se foi quando percebeu que, ao sair, William contemplou com desprezo tudo à sua volta.
Sinceramente, ela não sabia qual o problema em ser figurinista. Figurinistas, por definição, desenham,
costuram e, se tiverem sorte, montam suas próprias lojas e fazem tudo dentro delas, o que inclui usar as próprias
criações. Mesmo que sejam fantasias. Quem usaria roupas que nem o próprio figurinista usa?
Mas William não era capaz de entender isso. Aliás, não percebia nada a não ser o próprio mundinho.
Ainda assim, reíletiu Cass, a família Penno era uma cruz para o pobre William carregar, e ela não queria
aumentar esse peso.
O irmão não entendera nada quando, um ano antes, os pais resolveram pedir divórcio. Alvin e Anna
Penno eram incompatíveis, e depois de trinta e cinco anos isso ficou ainda pior. Cassidy sempre percebera
esse detalhe, mas William não. Era impossível, para ele, admitir que os pais, depois de separados, haviam
conhecido a felicidade... e que nada disso tinha a ver com os filhos.
Cass supunha que a aproximação dele com o clã Barclay Spencer era parte do problema. Naquela
família, os negócios vinham em primeiro lugar. Como seria fazer parte de um grupo assim?
Para William, que os admirava e invejava, devia ser maravilhoso. E certamente fora isso que Paul
Spencer, presidente e principal responsável pelo sucesso das Panificadoras Barclay, pensara ao ficar
noivo de sua sobrinha de criação. Principalmente depois que ela recebera algumas cotas da companhia,
herdadas de Chester Barclay, avô de Paul. O casamento manteria os negócios na família.
Ela não conseguia entender por que a "adorável e sofisticada" Bettina, como dizia William, estava
tão relutante em se casar com o primo, Paul. Especialmente considerando que ele havia rompido um tórrido
caso por causa do testamento, poucos meses antes.
Cassidy imaginara que Bettina apostaria tudo naquele casamento. Mas talvez estivesse errada.
Pondo os problemas dos Barclay de lado, chamou Tony, que estava do outro lado do novo
mostruário, o 'Noites na Arábia". Ele saiu do que agora era o picadeiro de um circo, um dos quatro show-
room de que a loja dispunha.
— Chamou, chériel — perguntou com sotaque fran
cês carregado.
Era seu dia de Maurice Chevalier. Um dia antes, fora Clark Gable. Ele tinha convicção de que em
breve, terminando a faculdade, seria um astro. Deixaria Dai-las e iria para Los Angeles ou Nova York. Não
decidira ainda se preferia o cinema ou o teatro.
Aos vinte e cinco anos, os sonhos com o estrelato de Cassy tinham sido trocados por uma carreira
satisfatória como figurinista. Sentia-se décadas mais velha que seu assistente, Tony Abatto, de vinte
anos.
— Vou me trocar. Tome conta da loja. Estou esperando um cliente.
— Oui, mademoiselle. Com minha vida guardarei todos os seus sonhos, amour...
— Melhor expressar seu amour de outra maneira ou perderá o emprego — disse ela,
olhando para a confusão que havia no chão.
— Raggedy Ann, essa linda boneca não está agradando mais? — Tony perguntou.
— E a meu irmão que não agrada — respondeu ela, imaginando as caretas que Tony faria às
suas costas.
Para ele, William não passava de um "filisteu". E, mesmo que essa também fosse a opinião dela, não
suportava que ninguém falasse nada sobre o irmão. Antes de fechar a cortina do provador, gritou:
— Comece a separar as araras!
— De que vai precisar?
— Oh, nada além do usual para homens. O tipo másculo de sempre.
— Um Drácula-lutador-piloto-pirata saindo...
Cassidy suspirou, resignada. Tinha uma fantasia de Peter Cabeça de Abóbora perfeita para ser usada
numa festa antes do Dia das Bruxas. Mas certamente o chefe
de William não seria capaz de vestir algo tão original. Por outro lado, todos os Dráculas, soldados ou
piratas disponíveis já haviam sido reservados. O que quer que Paul Barclay escolhesse para fantasia, o
resultado seria o mesmo: ela teria de sentar na máquina novamente e costurar. Logo agora, que pensava
estar livre do atropelo... Bem, podia dormir na última semana de novembro, se vivesse até lá.
Deu uma última olhadela no traje de boneca de pano, que chamara de Raggedy Ann. Era quase um
símbolo, com suas tranças vermelhas e a roupa azul e branca. Começou tirando o avental e o vestido,
depois as meias coloridas e o sapato.
Uma calça jeans e o suéter cor de mostarda sobre a camiseta, os cabelos castanho-dourados presos
num elástico, e lá estava Cassidy ao natural, mas com o rosto ainda maquiado. A fantasia de boneca
Raggedy Ann foi devolvida à arara a contragosto, e só depois Cass voltou à loja.
Para ela, a sessão de maquiagem era sua hora favorita. Isso porque lá estavam muitos dos objetos
que pertenceram à barbearia de seu avô. A começar pela esponja grande de talco.
Sentada na imensa cadeira de couro verde, onde tantas vezes vira o avô trabalhar, começou a
tirar a pintura. Com a ponta dos dedos espalhou o creme de limpeza, e seu rosto se transformou numa
massa cinza-avermelhada.
Um leve movimento pelo espelho e Cassidy percebeu que não estava só na sala.
— Maurice! — esbravejou.
— Um cliente quer vê-la, chérie.
Era ele, o patrão de William. Sem dúvida, bastante atraente. Os cabelos eram escuros e o corte,
clássico. Os olhos azuis eram emoldurados por cílios longos e castanhos, e ela podia apostar que
tinha a barba escura, pela sombra que percebia naquela região do rosto. Tinha uma covinha no queixo e
duas no rosto, quando sorria.
Estendeu a mão longa e bem-feita para Cassy.
— Cassidy Penno, presumo.
Num gesto mecânico, ela correspondeu ao cumprimento.
— Sim.
— Paul Spencer.
Embaraçada, Cass pegou a toalha e tentou limpar o rosto.
— Desculpe-me, sr. Spencer. Estava vestida de Raggedy Ann quando meu irmão avisou-me que
viria. Achei que teria tempo de tirar a maquiagem, mas Tony provavelmente quis me envergonhar. Ele não
suporta William, e... William não entende por que não o despeço.
— E? — Tirando a toalha das mãos de Cassy, Paul passou a esfregar-lhe o rosto,
energicamente. —Estava me explicando por que não despede o rapaz.
— É preciso ter certas habilidades para trabalhar num lugar como este.
— Mesmo? — A limpeza estava quase completa.
Compenetrado, Paul Spencer usava lenços umedecidos para finalizar a tarefa de devolver à jovem suas
próprias feições. — Que tipo de habilidades são essas?
Incomodada com o olhar fixo em seu rosto, Cassidy virou-se para o espelho e, de posse de um
tónico adstrígente, fez menção de dispensar o auxílio de Paul Spencer.
— Alguém que ame o teatro — respondeu. — Geralmente atores. Alguém que goste de se
fantasiar. Alguém que trabalhe por pouco dinheiro.
Pelo espelho, podia ver o rosto de Paul, e aquele jeito meio irónico a punha nervosa. William a
mataria se soubesse o que tinha acontecido ali. Mais uma vez o coitado fora traído pela própria família...
Com as faces limpas mas com a dignidade arranhada, Cassidy soltou os cabelos, que caíram em
ondas sobre seus ombros. Virando-se, encarou o sr. Spencer.
— Ficaria muito grata se o senhor não mencionasse este episódio para William. Ele é um
irmão maravilhoso, mas...
— Empertigado — emendou Paul Spencer. — Sem senso de humor. Pernóstico.
A reação de Cassidy foi de puro terror aos adjetivos usados por Paul para descrever seu irmão. Não
esperava nem em sonhos ouvir isso. Spencer caiu na risada com o olhar horrorizado da jovem.
— Relaxe, srta. Penno. Tenho seu irmão na mais alta conta. Ele não só é um brilhante
executivo como também um dos mais proeminentes membros da sociedade. Só que leva a vida e a si
mesmo muito a sério. — E, fazendo um gesto como se fechasse a própria boca a zíper, concluiu: —
William não ouvirá uma palavra sobre você me receber fantasiada de monstro.
— Não fiz isso!
— Claro que não — concordou ele, rindo. — Estava brincando.
— Oh!
O riso deixava à mostra dentes lindos e brancos. Num passe de mágica, Cassy foi contaminada pelo
bom humor daquele homem, e soube que não apenas podia confiar nele como que essa confiança era mútua.
Mais descontraída, riu.
— Desculpe-me. Eu devia estar medonha.
— Digamos que eu jamais iria imaginar que havia um rosto tão bonito debaixo daquela tinta
toda — gracejou ele.
Antes de ficar feliz com o elogio, Cassy lembrou-se de que podia ser mais uma das gozações de
Paul.
— Você, hein? Na minha profissão, é bom ter um rosto comum como o meu. Funciona como
uma tela em branco para um pintor: aceita tudo.
— Quem disse que seu rosto é comum? William?
— Não, claro que não.
— Você tem uma beleza clássica, de traços finos e delicados — insistiu Paul, deslizando o
dedo sobre sua testa, descendo pela curva do nariz, atravessando a curva dos lábios até encontrar o
queixo.
Cassidy estava hipnotizada. Nunca ouvira de ninguém que era bonita. Estava quase acreditando
no que ele dizia quando a realidade a chamou de volta.
Saindo do transe, Cass balançou a cabeça e indicou a saída para a outra sala. O momento mágico
se fqra.
— Vamos ver as roupas? — A arara estava ali perto, e ela rezou para que Tony tivesse tido
bom senso na escolha dos trajes. Puxou um banquinho e, com ar solene, começou: — Se quiser se
sentar, sr. Spencer, eu lhe mostrarei alguns dos nossos trajes masculinos mais populares.
— Paul. Eu prefiro que me chame assim.
"Isso não vai dar certo", pensou Cassidy.
Limitou-se a sorrir e avançou para a primeira fantasia.
— Esta é a mais requisitada nessa época do ano. Conde Drácula.
Paul ergueu uma das sobrancelhas. , — Muito dramático.
Num floreio, Cassy devolveu-a ao cabide e trouxe outra:
— Que tal um pirata? Corsários são românticos e agradam às moças. Completa, com
papagaio, espada e até um brinco.
— Não tenho orelha furada.
— Talvez um piloto de guerra... O general Patton? — Negativas sucessivas a fizeram
enumerar: — Nem mesmo um soldado da Guerra Civil? Rebeldes? Ianques?
— Sinto. Não faço o género militar. Especialmente da Guerra Civil. Quero expandir nossos
negócios para o Sul.
— Nem índios ou ciganos, suponho. Hum... Rodolfo Valentino? O imperador da China? —
brincou ela.
— Nem Fidel Castro ou Stalin, caso tenha-os em mente.
Uma ideia iluminou o rosto de Cassy. De repente, era como se tivesse achado a inspiração.
— Stalin, Rússia... Céus! Lembra-se de um filme antigo, em que Tony Curtis fazia o papel de
um cossaco? Yul Brynner era o pai dele, e havia cavalos e mais cavalos...
— Taras Bulhai — exclamou Paul, entusiasmado.
— Claro que me lembro! O personagem de Tony Curtis não morre no final?
— E a mocinha fica a seu lado.
— É isso! — Pela primeira vez algo o animava. — Deixe-me ver a roupa.
Cassidy se deu conta que só na sua imaginação havia algo assim.
— Na verdade, não a tenho. Mas posso fazer para você.
— Seria então um traje exclusivo, só para mim?
Ela relaxou e sorriu, mesmo sabendo que não teria tempo para mais nada, pois era preciso desenhar,
procurar os materiais adequados e costurar. Suspirando, lembrou-se de que faria aquilo por William
e resignou-se.
— Exatamente.
— Fantástico! — Paul parecia ter achado o que que ria. — Como começamos?
— Pesquisando.
— Pesquisa? Otimo! Onde procuro? Quero dizer, qual é a época?
Ela piscou duas vezes, sem entender o que ele queria dizer.
—Esse é o meu trabalho. Não é necessário que faça nada.
— Bem, e quem me garante que você não vai errar?
Num muxoxo, Cassy concordou.
— Bem lembrado.
Paul caiu na risada.
— Confio em você, mas sou muito purista, sabe? E quero saber do que estarei vestido, caso me
perguntem.
Cassy estava antevendo como seria a tarefa, cheia de palpites e de interferências... Teria o dobro
do trabalho. Mas a essa altura não havia muita escolha.
— Já entendi. Quando quer ver os desenhos? No final da semana?
— Quinta-feira? Sexta é péssimo para mim.
— Certo. Fim da tarde?
Pensando um pouco, Paul respondeu:
— Não quero prendê-la até tarde. Venho na hora do almoço. A que horas Tony almoça?
— Uma hora está ótimo.
— Trago algo para comermos aqui. Ainda bem que você não tem problemas com excesso de
peso... — E, olhando para o relógio: — Tenho de ir. Quinta, à uma. Adorei conversar com você.
E correu porta afora, deixando-a sozinha, com o coração disparado. Cassy tinha um almoço marcado
com Paul Spencer Barclay. E estava deslumbrada.
Só quando se acomodou atrás do volante de seu Jaguar preto foi que Paul Spencer se deu conta de
que devia estar fora de si ao insistir tanto em almoçar com Cassidy Penno.
Era linda, solteira, adorável. Uma companhia divertida e inteligente. Não que essas qualidades
pudessem mudar o fato de que ele estava praticamente noivo de Bettina. Praticamente, e isso não era muito
agradável.
Estava resolvido que ela seria sua esposa. Era a única coisa a fazer, considerando que seu avô
havia deixado trinta por cento das ações das empresas Barclay para Bettina, a mesma porcentagem que
coubera a ele. Paul possuía, porém, outros dez por cento das cotas. O restante estava dividido entre os
outros membros da família.
Seu tio Cari, e a mãe de Bettina, Jewel, possuíam dez por cento. Seu tio John, solteirão convicto,
outros dez por cento. Mais dez por cento estavam com a viúva de um tio falecido, Mary, e sua filha, Joyce,
agora chamada sra. Joyce Spencer Thomas.
Ninguém de fora da família jamais pusera as mãos no património desde que seu bisavô fundara as
Empresas Panificadoras Barclay. Costumeiramente, os parentes dividiam os bens entre seus filhos, ao
atingir certa idade. No entanto, isso não acontecera com os Barclay. O bisavô e o avô de Paul haviam
reservado para si a maioria das ações.
Quase todos os membros da família abriam mão de um envolvimento mais direto com os negócios.
Sentiam-se gratos por não precisar preocupar-se com detalhes como de onde vinha o dinheiro que lhes
enchia os bolsos regiamente.
Paul fora uma exceção. Possuía um talento especial para os negócios e vontade de exercer essa
vocação. Aos poucos foi galgando os degraus da diretoria e assumiu a presidência quando o avô se
aposentou. Chegou a cogitar a possibilidade de herdar a maior parte das ações, e assim ser o único acionista
capaz de dirigir as empresas. Não apenas ele, como a família esperava que isso viesse a acontecer, uma vez
que todos confiavam nele para continuar a encher seus bolsos com altas quantias.
Fora então que seu velho avô lhe pregara uma peça.
Na verdade, parte da culpa cabia ao próprio Paul. Sempre soubera que seu estado civil não
agradava ao
avô. Aos trinta e nove anos, a maioria dos homens já se casara ao menos uma vez. Mas não ele.
Ainda não encontrara a mulher certa. Talvez ela nem existisse. Não que soubesse descrevê-la, mas tinha
certeza de que nenhuma das conhecidas preenchia os requisitos. Nenhuma lhe despertara interesse. Não até
encontrar Bettina.
Jamais deveria ter se deixado seduzir por ela. Por outro lado, que homem são poderia resistir a uma
belíssima mulher, que invade um escritório vestida apenas com uma capa de chuva, meias de seda, ligas e
saltos altos?
Não, não era tão grave sucumbir a essa tentação, mesmo sabendo que muito daquilo fora obra de
cirurgiões plásticos. Seu grande erro fora declarar que fizera tudo por pura distração, e que era perda de
tempo esperar algo além disso.
Em pouco tempo, o que era diversão virou um pesadelo. Quando percebeu que Bettina poria as
coisas em outra perspectiva para a família, Paul tentou terminar com aquilo.
Na frente dele, Bettina encarou o rompimento com naturalidade. Mas a versão que apresentou à
família foi outra. No papel de vítima abandonada pelo primo, chorou meses e conseguiu que todos virassem
as costas a Paul.
Além disso, a família começou a considerar que um enlace entre ambos seria perfeito, ideal. Bettina
tinha doze anos quando tio Cari se casara com sua mãe. Dezesseis anos depois, tornara-se querida, parte
da família, até porque Cari não tivera filhos biológicos. O casamento entre eles faria de Bettina uma
legítima Spencer Barclay.
Na superfície, uma mulher perfeita, adorável, sofisticada, companheira, divertida... Porém, só
superficialmente. Sob aquele verniz se escondia um poço de ambicão, de inteligência fria e calculista. Era
dissimulada a ponto de enganar a todos, àté, e principalmente, os mais próximos. Só a prima Joyce enxergava um
pouco da verdade. Mas de que isso adiantaria? Bem casada com o responsável pela produção da fábrica, a padaria pro-
priamente dita, Joyce só pensava em ter o primeiro filho.
Se, em vez de ter bancado o cavalheiro, Paul tivesse contado ao avô, em detalhes, tudo o que acontecera
entre ele e Bettina, certamente não estaria naquela situação. Não havia escolha. A família dependia dele. E
Bettina usaria as ações que herdara da pior forma possível.
Paul passara meses procurando uma saída legal para que os negócios não fossem afetados por ela, mas
finalmente se rendera às evidências. Nada poderia fazer, a não ser casar-se com a prima.
Em especial porque aquele era um momento delicado. Os pães Barclay iriam ser distribuídos em todo o
país, e o sucesso dessa estratégia dependia de uma posição sólida e confiável da empresa. Isso faria a diferença
entre a fortuna ou a bancarrota.
Como acionista, Bettina começara a fazer uma série de exigências ridículas, e exorbitantemente caras. Fora
então que ele a pedira em casamento.
O momento da vingança chegara. E não bastava isso. Ela queria a revanche por tudo o que passara. Daria
uma chance a Paul, desde que ele se humilhasse perante toda a família e a sociedade.
Esse baile a fantasia era para isso. Se algo a desagradasse, no dia seguinte sua reputação estaria
arrasada. A própria Bettina teria o maior prazer em fazer isso.
Bem, se era esse o jogo, ele, Paul, também tinha seus truques. E aí entrava Cassidy Penno.
Mas não ia estragar, com essas considerações sobre negócios, um encontro com Cassidy. Tinha de parar de
olhar para ela com tanto interesse. Essa era a pior hora para se interessar por uma mulher.
Teria o cuidado de explicar a situação para Cassidy, em detalhes. Tinham potencial para transformar
aquele trabalho no começo de uma amizade agradável. Se fosse o caso, poderiam usufruir da companhia
um do outro, sem que isso afetasse a intimidade de ambos. Ou seja, sem envolvimento sentimental.
Poderiam ser amigos. Por que não? Almoçar com ela seria apenas um divertimento, nada além
disso. E ele poderia providenciar um cardápio que traduzisse essa intenção.
Planejar esse almoço o deixou animado. Homens prestes a se comprometer merecem um pouco de
diversão. Até homens casados fazem isso. Especialmente se a esposa for Bettina Lincoln.
Uma coisa, porém, preocupava-o, e cada vez mais. Temia não conseguir separar a obrigação da
diversão. Ou o possível do desejável.
CAPITULO II
Cassidy bufava enquanto os garçons iam e vinham dentro da loja. Sua mesa de trabalho estava
coberta de linho adamascado. Preocupada, mas também excitada, ela assistia a tudo.
Almoço, Paul dissera. Mas aquilo era um banquete: salada de frutas, pães crocantes, queijo brie,
carne à Borgonha e, para acompanhar, um saborosíssimo vinho francês. Na sobremesa, chocolate e creme.
E tudo servido por um garçom vestido de maneira impecável.
Cassidy sorria de prazer ao ver os pratos dispostos em fila sobre um aparador improvisado. Os
rechauds, que mantinham a comida quente, eram de prata.
Por que Paul Spencer agia assim?
Ela não passava da irmã de um de seus funcionários, mas recebia tratamento de rainha. O
comportamento de Paul era o de quem corteja uma mulher.
Sua primeira preocupação foi com William. O que o irmão diria?
Esqueceu o assunto quando Paul Spencer entrou na sala. Ele falava ao telefone celular, mas sorriu,
desculpando-se pela indelicadeza. Fez questão de que Cassy ouvisse o teor da conversa com sua
secretária.
— Certo, Gladys. Entendi. Vou desligar. Não, não voltarei à tarde. Anote os recados.
Guardou o telefone no bolso do paletó e observou Cassy. Ao vê-la ali, em meio a toda aquela
pompa, seu rosto se iluminou. Deu-se conta de que também ela sentia um imenso prazer por estarem
juntos de novo. Mas sua parte racional insistia em lembrá-lo de que era um empresário poderoso, que
contratara os serviços de uma profissional. E que ela o atendia por causa do pedido de William.
— Você não devia ter tido todo esse incómodo.
— Incómodo nenhum. — Ele inspecionou as travessas de comida. — Hum... Parece ótimo!
O garçom sorriu, satisfeito, enquanto afastava a cadeira para Cassy. Sem perceber, ao sentar, ela
bateu no pé da mesa, fazendo voar para longe os talheres da salada. Morrendo de vergonha, assistiu ao
garçom recolhê-los. Paul conteve o riso.
— Achei que fosse encontrá-ía fantasiada de salada, ou algo assim...
Cassy ficou ainda mais vermelha.
— Oh, eu não faria isso. — Ouvindo-o rir, sentiu-se mais à vontade para dizer: — Na verdade,
nunca ouvi falar de uma fantasia própria para almoços.
— Pode ser uma boa ideia para sua próxima coleção. — O jeito cómico e sério de Paul ao dizer
esse tipo de coisa era hilariante. Cassy logo começou a rir. — Agora está melhor. — Com os cotovelos sobre
a mesa, ele se aproximou de Cass.
O garçom os servia com elegância. E uma súbita timidez tomou conta de Cassidy. Sentia que Paul a
cortejava. Mesmo que repetisse para si mesma um sem-número de vezes que aquilo era apenas produto de sua
imaginação, que ele estava noivo, não conseguia relaxar.
— Quer ver meus esboços?
— Estou faminto. No momento, só quero comer. E olhar para você.
— Ah...
Completamente sem jeito, Cassy não sabia onde pôr as mãos, ou para onde olhar. Levou alguns
segundos até conseguir se concentrar na salada de frutas, que continuava intocada.
— Está tendo dificuldades com os esboços? — Paul perguntou entre uma garfada e outra.
Esse assunto a fascinava. Abandonando de novo os talheres, Cassy sorriu:
— Não, de jeito nenhum. E muito fácil imaginar você fantasiado.
— E isso é bom?
Como explicar-lhe como era fácil fitá-lo e vê-lo usando roupas de cossaco? Durante a pesquisa, ela
fechara os olhos e soubera exatamente o que desenhar.
— Sim, é muito bom. Quando crio uma roupa, penso num personagem para dar vida à fantasia.
Na maioria das vezes não há nada em comum entre o que eu imaginei e a realidade de quem vai usar o
traje. No seu caso, isso não acontece. Você é o personagem.
— Então acha que serei capaz de dar vida a seu talento?
— De certa maneira, sim.
O que ela queria dizer era que, ultimamente, Paul Spencer era sua única fonte de inspiração.
— Se você diz, eu acredito. — Paul estava grato a William por ter lhe falado de Cassidy, e
gostaria de poder estar à altura do talento da moça. Tudo o que emanava de Cass era tão doce e suave
que ele não sabia mais o que dizer para expressar seus sentimentos. — Por que você me faz tão bem à
alma?
— Eu?
Os olhos e sorrisos eram mais eloquentes do que qualquer palavra. Cassy nunca tivera um almoço
tão maravilhoso. Disse isso a Paul.
— Eu quis que fosse especial — confessou ele, olhando-a no fundo dos olhos.
E, se Tony não tivesse interrompido o enlevo, entrando estabanado com sua caracterização de
Charlie Chaplin, Paul a teria beijado. Foi isso que Cassy pensou, muito embora uma mesa os separasse.
Uma mesa pequena, bem dito. O garçom já tinha sumido com os pratos do almoço, e tudo estaria
perfeito se Tony não fosse tão irritantemente inoportuno.
— Telefone para o sr. Spencer.
A doçura dos olhos de Paul desapareceu imediatamente, dando lugar à irritação e ao
desapontamento. Por fim, resignado, perguntou:
— Quem é?
— Não perguntei. Mas a voz é de mulher.
A tensão ficou evidente na expressão carregada de Paul. Com gentileza, dirigiu-se a Cassy, já em
pé:
— Sinto muito, mas é melhor ver de que se trata.
— Fique à vontade. Tony lhe mostrará o caminho.
Paul seguiu o assistente com evidente mau humor. Fazer o quê? Cassy sabia que os problemas dele não
lhe diziam respeito. Estava ali apenas para fazer uma fantasia. Tendo isso em mente, dirigiu-se ao ateliê e
juntou os esboços que fizera. Para sua surpresa, em curto espaço de tempo Paul reapareceu.
Durante os minutos em que esteve com os croquis nas mãos, pouco ou nada se ouviu dele. Alguns
murmúrios, mas nada que indicasse sua opinião. Por fim, colocou-os na mesa e perguntou:
— Tem algum favorito?
Cassidy estranhou a pergunta, mas foi sincera:
— Este. — Apontou.
Paul olhou de novo, deu alguns passos para trás, olhou melhor e assentiu.
— Quando começamos?
— Começamos?
— Sim. Tenho de tirar as medidas, não é?
— Tem, mas...
Antes que ela pudesse ficar mais surpresa, Paul se adiantou:
—Se pudermos trabalhar sábado, seria ótimo.
Cassy costumava trabalhar só meio período aos sábados, mas sugeriu:
— Sábado à tarde?
— Excelente. Almoçamos de novo?
— Oh, não! —• exclamou ela com veemência, assustada com os gastos daquela refeição. —
Quero dizer, não é necessário. No máximo tomaremos um café.
Ele sorriu de novo.
— Certo. Vou providenciar.
— Deixe-me fazê-lo, por favor.
— Se insiste, tudo bem. Às três horas?
— Ótimo. Quando chegar, terá de apertar, a campainha, pois fecho a loja ao meio-dia, no
sábado.
— Vamos estar a sós então?
— Com certeza.
Alívio e cumplicidade estamparam-se no rosto de Paul quando disse:
— Até sábado, então.
Cassidy se pegou sorrindo sozinha ao voltar para o ateliê. Fosse o que fosse, era mútuo o que
sentiam. Então lhe ocorreu que deveria ter algo pronto quando ele voltasse, no sábado, e nem tinha se
lembrado de tirar as medidas. Talvez não conseguisse fazer tudo em tão pouco tempo. Mas confiava em
seu instinto. Mesmo com a agenda lotada, daria cabo da tarefa, e no fundo sabia que, quanto mais
depressa terminasse o trabalho, mais depressa teria Paul Spencer fora de sua vida.
O tempo frio, cinzento e chuvoso seria motivo mais que suficiente para fazer Paul ficar em casa e
cancelar todos os compromissos, mas não aquele. Argumentou consigo mesmo que o encontro era
profissionalmente importante, e que não iria à loja apenas para ver Cas-sidy. Mas não podia negar o desejo
de ver aquela figurinista interessante, dona de um excelente senso de humor, gentil e... tímida. Era bonita
de forma natural, sem artifícios, o que não deixava de ser engraçado para alguém com aquela profissão.
Só mesmo isso para tirá-lo de casa num dia como aquele, pensou enquanto tocava a campainha.
Flagrou-se, no reflexo da vitrine, a arrumar os cabelos em desalinho, preocupado com a aparência.
"Negócios", pois sim... Rindo de si mesmo, ele balançou a cabeça, imaginando o que teria Cassidy Penno
para fazer com que se comportasse como um adolescente apaixonado.
Tocou a campainha novamente, e pareceu-lhe uma eternidade até ouvir a fechadura ranger e estar
frente ao sorriso de Cassy.
— Olá — disse ela enquanto fechava a porta e apanhava-lhe o casaco.
— Oi.
A loja estava às escuras, e somente os reflexos da luz vinda de fora iluminavam o lugar. O suéter
amarelo de Cass tinha os punhos e o decote debruados em preto, realçando a pele clara do colo e o dourado
dos cabelos. O jeans justo modelava-lhe as pernas. Os lábios realçados pelo batom de cor suave e o
perfume, mistura de banho recém-tomado e um antigo Dior, magnetizaram Paul.
Perturbado, ele acordou do transe ao ouvi-la perguntar com voz preocupada:
— Algo errado?
— Não. — Forçando um sorriso, Paul percebeu que suas mãos tremiam. — Acho que uma
bebida quente me faria bem.
Num volteio galante, Cassy sorriu e ofereceu-lhe o braço.
— Por aqui, cavalheiro...
Paul riu e obedeceu. A seu lado percorreu a loja deserta, rindo das peças que via no caminho até o
ateliê. Um pouco daquela mulher estava em cada um dos ob-jetos. Ela dava um pouco de fantasia à
realidade coti-diana, e Paul se deu conta de que a invejava por isso.
Cassy havia posto a mesa do chá num dos cantos da sala. A toalha, linda, parecia um xale
antigo de seda colorida. Além disso, havia guardanapos de linho rendados e colheres de prata antigas. As
xícaras eram de fina porcelana chinesa. Um bule de cerâmica fumegava sobre um pequeno fogareiro de
bronze. Para completar, leite, creme, açúcar e um lindo prato de cristal cheio de guloseimas.
Era óbvio que ela tivera muito trabalho para fazer tudo aquilo, e só para agradá-lo. Muito mais
bonito e valioso do que o almoço encomendado por ele. E sem dúvida, muito, muito mais comovente, por ter
o carinho das mãos e do coração em cada detalhe.
— Está maravilhoso.
Cass ficou ruborizada.
— Obrigada.
Sorveram o café, saboreando os bolos e as tortinhas diminutas, cheias de cremes e frutas. Tão cheias
que Paul lambuzou-se ao provar uma delas. E, quanto mais ria, mais o creme escorria. Cassy tentou socorrê-
lo com um guardanapo, mas as gargalhadas impediram-na de ser eficiente.
— Isso, srta. Penno, é uma demonstração de como os meninos brincam... — disse ele,
espalhando creme no nariz de Cassy e colocando-lhe na boca um pedacinho de doce.
Ela ria tanto que nem percebeu quando Paul enlaçou-lhe a cintura. Só foi perceber o que estava
acontecendo quando se viu abraçada por ele.
Foi como se uma descarga elétrica os atingisse. Nesse instante, ao admirar os sensuais lábios
femininos, Paul soube quanto a desejava. A boca entreaberta e o hálito doce eram convites a um beijo.
O beijo que ele ansiava desde que a vira pela primeira vez.
Esqueceu tudo para deslizar a ponta dos dedos naqueles lábios antes de tê-los nos seus, no mais
doce beijo da sua vida.
Cassy se rendeu à urgência da carícia, entregue ao momento. Mas aos poucos foi se afastando, e,
com gestos precisos, limpou o rosto, evitando encará-lo. Ambos sabiam que era tolice começar algo sem
futuro, e aquele beijo fora um erro. Para ambos. Isso estava escrito no olhar verde, intenso, de Cassidy.
Paul sentiu-se péssimo.
— Desculpe-me.
— Tudo bem.
— Não, não está tudo bem. Costumo ter mais bom senso.
— Você deve ser se sentido acuado, só isso...
— William contou-lhe algo?
Cassy fez que sim.
— Ele me disse que, se você não desposar uma certa moça, o testamento de seu avô o
deixará sem muita coisa.
— William se referia a Bettina — contou ele com amargura.
— Bettina, a da festa a fantasia de Halloween — frisou Cassy.
Apesar de tudo, Paul sorriu. O jeito como ela falava era suave e gentil, como um raio de sol no meio
do temporal que viria a ser seu futuro com Bettina. No deserto que estava vivendo, Cassy era um oásis
bem-vindo. Como virar as costas para a única coisa boa que lhe ocorria?
Riram juntos, pelo puro prazer de rir. Paul esperou que ela terminasse seu café para dizer:
— Vamos ao trabalho? — Ficou impressionado com a eficiência com que Cassy lhe tirou as
medidas. — Você é mesmo boa nisso!
— Faz parte do meu trabalho.
Quando foi tirar as medidas do peito largo, Cassy soltou sem querer a fita métrica, e acabou
encostando o corpo no dele. Petrificada, deixou a fita no chão e ficou imóvel. Paul não sabia o que estava
acontecendo, mas resolveu confiar nela. Então Cass, como que acordando de um sonho, pegou a tira de
plástico e pôs-se a medir, de joelhos, a altura da calça.
Tomando-lhe as mãos, Paul abaixou-se, abraçando-a carinhosamente. Cassy abandonou a cabeça no
colo protetor e deixou-se ficar assim por longo tempo. De olhos cerrados, ambos permaneceram quietos,
num silêncio cheio de melancolia. Por fim, Paul beijou-a de leve na testa e disse:
— Não tenho esse direito. Não há nada que eu possa fazer. Os negócios dependem desse
casamento, e a minha família inteira depende disso.
— Eu sei — assentiu Cassy num murmúrio quase inaudível.
As mãos de Paul deslizaram pelas costas femininas. Apertados contra seu peito, os seios eram uma
tentação. Fechando os olhos mais uma vez, Paul imaginou o corpo nu a seu lado.
— Gostaria de tê-la conhecido há muito mais tempo.
— Antes de Bettina, você quer dizer.
— Ainda bem que você sabe de tudo — ele comentou, rindo com ar malandro. — Não sei se
aguentaria a tentação de mentir para tê-la comigo.
Um brilho de felicidade tornou ainda mais verdes os olhos de Cassidy. Brincando com a fita
métrica, ela baixou a cabeça, meio tímida, ao dizer:
— Talvez você nem me notasse.
— Não diga isso.
— Verdade. Sou do tipo de mulher que passa despercebida.
Acariciando-lhe o pescoço e os ombros, Paul sentiu a pulsação acelerada.
— Até mesmo para nosso amigo "Charlie Chaplin"?
Ela fez uma careta e explicou:
— Tony nunca se interessou por mim. Ele pensa que as virgens, como eu, são frustradas. Não
se arrisca a chegar perto.
Virgem! Paul quase teve um colapso. Nem se lembrava qual fora a última vez que ouvira falar nisso.
Acostumado com a sofisticação das mulheres manipuladoras, quase fora cruel com a mais doce das criaturas.
Talvez merecesse alguém como Bettina. Cassidy Penno merecia, com certeza, alguém livre para amá-la e
cuidar dela como um tesouro. Com voz embargada, disse-lhe:
— Prometa que vai se guardar para alguém melhor do que aquele impostorzinho.
— Tony Abatto? Prefiro entrar para um convento.
— Oh, não exagere.
Com ar solene, Cassy levantou a mão.
— Eu nem poderia. Não sou católica.
Riram mais uma vez. Então Paul se levantou, pegou a fita métrica e, com ar sério, pediu:
— Deixe que eu mesmo meço a calça.
Cassy concordou. Limitou-se a anotar as medidas.
— Não é preciso que venha aqui até o momento da prova. Não quero causar problemas
desnecessários.
— Esqueça. Quero vir.
— Então, vou cortar o tecido na segunda-feira. E agora, fora daqui. Ambos temos mais o
que fazer — brincou ela.
— Segunda-feira, às seis, estarei aqui. E depois jantaremos. Já estou ansioso por isso.
— Eu também. Bem, vou acompanhá-lo até a saída.
— Está bem.
A chuva cessara e um vento frio fazia a respiração sair em lufadas. Depois de fechar a porta, Cassidy
disse um simples:
— Obrigada.
E saiu caminhando.
Paul viu-a desaparecer na esquina e, respirando fundo o ar gelado, saboreou aqueles poucos instantes de
liberdade.
CAPITULO III
Ansioso por rever Cassy, Paul foi pontualíssimo na segunda-feira. Antes de cortar a fantasia,
Cassidy fez questão de que ele escolhesse os tecidos. Espalhados pelo ateliê, havia quatro combinações de
cores e tramas com detalhadas explicações sobre como e onde seriam usados e davam uma ideia do
resultado final.
Paul olhou-os de relance e perguntou:
— Qual você prefere?
Cassy apontou para uma combinação de tons de terra, azul e vermelho queimado. Por poucos
segundos Paul estudou a escolha antes de dizer:
— Perfeito! Agora vamos jantar, estou faminto.
— Você está sempre faminto?
— Ultimamente, sim. — Todo o seu apetite fora despertado na última semana. — Vamos,
pegue seu casaco.
Foram a um lugar que mais parecia uma casa no-turna. Passava das seis e meia e já se ouvia uma
banda de jazz animadíssima. Havia uma fila considerável para entrar.
Segurando Cassy pela mão, Paul deu a volta no prédio, em direção à porta dos fundos, local reservado
aos caminhões de bebidas. Um vozeirão os fez parar.
— Spencer! Por que não avisou que vinha? — Um negro, de braços abertos e sorriso idem, os
recebeu.
— Achei que podia arriscar, mas pelo visto não adianta chegar cedo... Nunca vi tanta gente a essa
hora.
— Deixe comigo. Quem é a bela senhorita?
Passando o braço pelos ombros de Cassy, Paul ficou feliz em apresentá-los:
— Esta é minha amiga Cassidy Penno. Cass, este velho malandro é Hoot.
— Amiga, hein? — Hoot comentou enquanto olhava para Cassidy. — Belo casaco. Gostei.
— Obrigada.
Ela sorriu, divertida com a figura grande e simpática. A roupa branca era de mestre-cuca, e nele
fazia bela figura.
— Bebem o quê? É por conta da casa — ofereceu Hoot.
— Estou dirigindo. Nada para mim.
— Não bebo muito, sr. Hoot — agradeceu Cassy.
— Só Hoot, sem o "senhor". Menina, gostei de você. Vai tomar um drinque especial, com pouco
álcool. Não aceito recusa.
— Fico lisonjeada.
— Vamos, sigam-me.
Por cima do ombro, Hoot lançou um olhar de aprovação para Paul, sem que Cassy percebesse. O corredor
levou-os à cozinha e a outros pequenos cómodos, até alcançar a porta do escritório de Hoot. Pequeno e confuso,
o aposento tinha uma escrivaninha e um balcão como móveis principais. Um sofá de couro surrado e banquetas
completavam o mobiliário. Nas paredes, fotos autografadas de grandes nomes do jazz. Cassy reconheceu a
maior e mais bonita delas, Billie Holiday, a cantora negra que sua mãe lhe ensinara a amar desde pequena.
— Cá estamos. Agora me contem... Como se conheceram?
— Meu irmão trabalha para Paul.
— Cassidy é minha figurinista.
Caíram os três na risada, em alto e bom som. Hoot mostrou que sua curiosidade não tinha sido
satisfeita com nenhuma das respostas. Paul pigarreou, mas Hoot foi mais rápido e sua língua afiada não
poupou ninguém ao dizer:
— Figurinista... Quer dizer que agora fantasia se chama figurino? Então Bettina pegou você
com essa história de baile à fantasia...
— Tenho saída?
Hoot juntou as mãos em sinal de contrição, e com deboche comentou:
— Coitadinho dele!
— Acho que vi seu nome na lista de convidados, se não me falha a memória... — revidou
Paul.
— Já tem fantasia, Hoot? — indagou Cassy.
— Claro, não está vendo? Vou de mestre-cuca.
— Espertinho...
— Já tem o chapéu? E seria bom uma grande panela ou frigideira para dar um toque extra.
— Grande ideia! Quanto ao chapéu, não tenho, mas posso comprar.
— Por que não aluga? Terei prazer em fornecer tudo por cinco dólares: chapéu, frigideira e
maquiagem.
— Otimo negócio. Fechado, senhorita. — E, olhando para Paul: — Essa moça é um doce. Bem
melhor do que a enjoada Bettina.
— Acho que não vamos ficar para o jantar — disse Paul, com azedume.
— Deixe de besteira, meu amigo. Terão a melhor mesa da casa, ou não me chamo Hoot.
Olhe, garota, a família desse rapaz é formada por um bando de sanguessugas, se quer saber.
— Hoot...
Mas o protesto de Paul não adiantou de nada.
Hoot estava disposto a tornar pública sua opinião sobre os Barclay.
— Há muito tempo houve uma luta entre eles para decidir quais seriam os novos rumos dos
negócios da família. Como nenhum deles parecesse capaz de tocar a empresa, pegaram nosso amigo aqui
para o sacrifício.
— Sacrifício?
— Não é bem essa a verdade. O que aconteceu foi que decidi tomar a frente dos
negócios para defender meus interesses. Ninguém me obrigou a nada. Ao contrário.
— Sacrifício, sim, foi o que eu quis dizer — afirmou Hoot. — Os negócios vão bem porque você
se mata de trabalhar. Enquanto isso, os outros membros da família vivem como nababos, à custa do seu
esforço. Para Paul ficam as dores de cabeça, e para eles vão os cheques polpudos.
— Mas tenho liberdade total na empresa.
— É assim que vê as coisas? Para mim você está de mãos atadas. — E olhando para Cassidy:
— Abandonaram-no sozinho e fazem de conta que não percebem o que está acontecendo. Esse casamento
é pior, para meu amigo aqui, do que o cadafalso.
— Hoot! — censurou Paul.
— Está bem, a moça em questão é uma dama... — irónico, Hoot corrigiu.
— Chega de sermão. Estou faminto e não pretendo arruinar minha noite com essa conversa.
Posso jantar aqui ou não?
— Por favor... E não se esqueça de meu chapéu, senhorita. Mande-o por Paul. E pode cobrar dele
também.
Cassidy riu, divertida, enquanto era conduzida para o salão. No meio do caminho, Paul tomou uma
atitude inesperada: empurrou-a contra a parede e tomou seu rosto nas mãos. Foi tudo muito rápido, mas
mesmo assim Cassy sabia o que ia acontecer.
Não ofereceu resistência ao longo e ardente beijo. Um sorriso bailava no semblante feminino.
Trazendo-a para mais perto, num abraço doce, Paul sussurrou em seu ouvido:
— Por que me deixou fazer isso?
— Não pude evitar.
"Eu também não", Paul pensou, fechando os olhos.
Era injusto de sua parte. Era injusto para ambos. Mas ao abrir os olhos e ver um sorriso brilhante
naquele rosto lindo, sua respiração ficou suspensa. Uma sensação incomparável de perda, desespero e
impotência o dominou.
Em silêncio, tomou-a pela mão, e juntos entraram no salão cheio de gente. Risadas se
misturavam ao som de um piano. Por entre as muitas mesas, Paul se esgueirava, levando Cassy. Num
canto privilegiado havia três mesas vazias. Ele pendurou os casacos e a bolsa de Cassy e puxou a cadeira
para que ela se sentasse. Flores e velas deixavam o ambiente ainda mais agradável.
— E então, gostou?
— Muito. Este lugar é incrível. Seu amigo também.
— Esta mesa é reservada para os convidados.
Quem senta aqui come o que ele mandar. É autoritário até nisso.
Cassy batia os pés no chão, ao compasso da música, deslumbrada com tudo. Nem percebeu que a
garçonete se aproximara e falava com Paul. Mas teve que prestar atenção no copo colorido que foi colocado
à sua frente.
— O sr. Hoot já fez os pedidos para vocês. O drinque é uma das criações dele. Espero que goste.
— E, olhando para Paul: — Faça-nos um favor: assuma o piano enquanto o jantar não vem. Ninguém
aguenta mais esse moço.
Paul riu alto e disse:
— Por mim, tudo bem. — Mal a moça saiu, e Paul já estava de pé, puxando Cassidy. — Já que
não posso escolher meu jantar, pelo menos escolherei a música.
Cassy o seguiu até o piano. Ele a acomodou numa banqueta e, sem cerimónia, tocou uma versão de
"Old Man River". Maravilhada com o talento musical de Paul, ela levou alguns minutos para perceber
que todo o salão estava ouvindo em silêncio. Para deleite geral, outras três canções foram executadas.
Mas o jantar os esperava e a audição terminou. Sob aplausos, Paul deixou o piano. Só tinha olhos para
Cassidy, que batia palmas.
Por alguns instantes ele conheceu a felicidade. Naquele segundo, sua vida pareceu perfeita.
Cassidy entrou em casa em estado de graça. Fora uma noite inesquecível, e ela queria prolongar a
sensação de felicidade. Pegou no colo um enorme gato amarelo que ronronava, enroscado em suas pernas.
— Olá, Sunshine. Vovó Anna deu-lhe o jantar?
Brincandt) com o bichinho, Cassy foi até a cozinha, onde "vovó Anna" tinha deixado um bilhete e
uma fita em torno da geladeira. Uma das manias da mãe de Cassidy era a filosofia oriental, e segundo ela a
casa precisava ser "purificada". Professora de Tai-chi-chuan, versada nos rituais chineses, vegetariana
radical e tendo sua própria visão das coisas, ela não poupava críticas aos filhos, e especialmente ao ex-ma-
rido, Alvin, que aos sessenta anos se juntara a um grupo de motociclistas e deixara crescer os cabelos,
usando sempre rabo-de-cavalo.
Rindo de si mesma e da família pouco convencional que tinha, Cass pensou que talvez não fosse má
ideia agradar sua mãe e tentar a tal "purificação" da casa.
O som estridente da campainha a tirou desses devaneios. O relógio do microondas marcava dez
horas, tarde demais para qualquer visita. Na ponta dos pés, ela atravessou a sala e pelo olho mágico
verificou quem a procurava tão fora de hora. Com o coração aos pulos, abriu a porta para Paul.
— Oi! Quer entrar?
Ele balançou a cabeça, sério.
— Nós não combinamos quando nos encontraremos de novo.
— A primeira prova, claro! Deixe-me ver... quinta-feira não... Que tal sexta?
— Não. Falta muito tempo para sexta.
— Oh...
Cassy sentiu um arrepio. Por um lado era ótimo ouvi-lo dizer isso, mas por outro era impossível
aprontar antes disso a roupa.
— Tome café da manhã comigo na quarta-feira, e provarei a roupa na sexta.
— Café da manhã?
— Só a convidei para o café, não para passar a noite comigo. Por que está tão surpreso? Já
almoçamos, jantamos e tomamos chá juntos. Só falta mesmo o desjejum.
— Que seja — assentiu Cassy com visível alegria.
— Mas eu preparo tudo. Sete horas é muito cedo?
— Perfeito.
Antes de partir, Paul tomou-lhe o rosto nas mãos e fitou-a por algum tempo, silenciosamente.
Beijou-lhe a testa com suavidade e saiu.
Pela segunda vez naquela noite, Cassy trancou a porta e ficou pairando nas nuvens.
Anna apareceu na porta da cozinha, atraída pelo cheiro de bacon e ovos que se espalhava pelo
ambiente. Tinha as mãos na cintura e olhar de poucos amigos. A cabeleira grisalha presa numa longa
trança e o longo vestido de algodão azul davam-lhe uma aparência exótica, reforçada pelos brincos indianos
de prata.
— O que está tentando fazer? Envenenar a si mesma ou enfumaçar a casa toda?
— Digamos que estou tentando preparar um desjejum decente para um amigo — respondeu
Cassy.
— Envenenando seu amigo com carne de animais mortos?
— Mamãe, não posso comê-los vivos.
Anna estranhou a filha dizer aquilo. Afinal, sempre guardava para si os comentários jocosos. Uma
energia diferente emanava dela.
— Seria um amigo... do sexo masculino?
— Seria. Mamãe, por favor, tenho vários amigos. E café da manhã não quer dizer que dormi
com ele.
— Sei disso. Não sou tão preconceituosa como imagina. — E, mudando de assunto: — Deixei
um bilhete para você ontem.
— Pode purificar a casa quando quiser, desde que não seja agora.
— Obrigada. Farei isso, mas é melhor que não esteja por perto. Seu ceticismo atrapalha o fluxo
energético.
Não tiveram tempo para dar prosseguimento à conversa. A campainha soou, anunciando que o
convidado chegara. Atrapalhada entre a frigideira, o forno e a cafeteira, Cassidy tropeçou em duas
cadeiras e quem atendeu a porta foi Anna.
— Como vai, meu jovem? Sou Anna, mãe de Cassidy.
Paul estendeu-lhe a mão num gesto cortês, porém no rosto estava estampada sua surpresa. E sua decepção.
— Paul Spencer, muito prazer. Devo concluir que é mãe de William também. Eu e seu filho
trabalhamos juntos.
— Estranho, muito estranho... Em que dia o senhor nasceu?
— Dezessete de janeiro.
— 17--- Vou verificar. — Com o olhar perdido, Anna dirigiu-se à cozinha. — Vai comer coisas
mortas, sabia?
Cassidy acompanhou-a até a porta e assim que a viu desaparecer na rua, olhou para Paul.
— Desculpe-me, mamãe é um pouco excêntrica. Aliás, muito excêntrica.
— O que ela quis dizer com comer coisas mortas?
— Esqueça. Minha mãe é naturalista radical.
Paul caminhava pela cozinha, observando tudo com evidente ar de satisfação.
— Ovos, bacon, biscoitos caseiros... Não acredito que tenha feito geléia de amora! Eu adoro!
Cass não conseguiu esconder seu orgulho com o elogio.
— Minha avó me ensinou.
Eleja estava se servindo das guloseimas, com apetite de glutão. Entre uma garfada e outra, falou:
— Você não costuma comer isso sempre, não é?
— Quase nunca.
— Foi o que imaginei. Ninguém pode ter um corpo como o seu sem fazer sacrifícios.
— Como assim? — Corando até a raiz dos cabelos, Cassy não sabia onde pôr as mãos.
— Seu corpo é maravilhoso. Não só o corpo, tudo em você é lindo.
— Obrigada.
Ela não estava acostumada a ouvir elogios. Principalmente vindos de um homem como Paul.
Natural que reagisse com timidez.
— William nunca fala muito da família. Sempre estranhei isso, e agora muito mais.
Conhecendo você e sua mãe, não entendo mesmo!
— Minha mãe é "esquisita" demais para os padrões do meu irmão. Confesso que papai
também não se encaixa na "normalidade". Vive para se divertir. Ah, e William não suportou o divórcio
deles.
— Acho que vou gostar de seu pai.
— Com certeza. Mas minha mãe é o oposto disso. Para ela há coisas mais importantes que
diversão.
— Acho que pode haver um meio termo.
— O que não o impediu de se sacrificar pelo trabalho.
— Às vezes é preciso.
— Fale-me sobre Bettina.
Mesmo surpreso com o pedido, Paul relatou toda a história e terminou dizendo:
— Chego a pensar que tudo, para ela, baseia-se na vaidade. Se não fosse seu orgulho ferido,
nada disso estaria acontecendo. Mas agora é uma questão de honra casar comigo.
— Eu jamais conseguiria aguentar uma situação dessas.
— O que estamos vivendo é muito pior. Escute-me: se quiser que eu suma da sua vida, peça e o
farei. Só não quero magoar você.
— Não quero que você suma.
— Que bom! Preciso da sua amizade.
— Não somos amigos. Nenhum amigo me beijou como você.
— Sei. Vamos parar com isso.
— Não, não vamos. — E, para provar o que dizia, Cassidy uniu os lábios aos dele, num beijo
apaixonado.
CAPITULO IV
Entre sedas, cetins, cristais reluzentes, flores e champanha circulavam os convidados do baile à fantasia
de Bettina Lincoln. Pierrôs, colombinas, zorros e outros personagens se misturavam no cenário luxuoso criado pela
imaginação e pela riqueza da anfitriã.
Paul Spencer Barclay podia não ter o glamour de Tony Curtis, mas estava mais do que convincente nos trajes
de cossaco. Viril e charmoso, parecia vindo das estepes russas. A habilidade de Cassidy em dosar criatividade e bom
senso ficara provada nos detalhes, como as botas com aparência gasta ou o sabre autêntico que pendia do cinturão de
couro envelhecido.
Com um sorriso no rosto, Paul saboreava o champanha quando Bettina fez sinal para que se juntasse a
ela. Paul olhava ao redor, e convenceu-se de que Cassy estava certa ao afirmar que, no fundo, somos muito
semelhantes à fantasia escolhida. No caso de Bettina, isso estava evidente. Vestida de princesa encantada, agia
como se o mundo fosse seu conto de fadas. Bem, só uma varinha de condão faria o carpete branco ficar limpo
depois daquela festa.
Bettina tomou-o pelo braço. Dirigindo-se a um senhor vestido de George Washington e a um casal com
trajes pré-históricos, apresentou-o:
— Macie e Marc Gladsden, este é Paul Barclay Spencer, do pastifício Barclay.
— Para Bettina, ele seria sempre Paul Barclay Spencer, do pastifício Barclay. Se fosse apenas Paul
Spencer não estaria ali, servindo como seu bichinho de estimação...
— Como vão?
O casal o via como um objeto, e como tal ele se portou. Enquanto Bettina fingia não perceber que Macie
não tirava os olhos de Paul, ele se divertia com a situação. Conhecendo bem a alta sociedade, sabia que os
Gladsden não faziam parte dela. Ouvira muitas histórias sobre as "festinhas de embalo" organizadas pelos
dois.
Não eram os únicos amigos de Bettina a fazer parte desse universo um tanto ou quanto ousado para
os padrões normais. Ela mesma tinha uma certa tendência para se juntar ao lado escandaloso da sociedade.
Mas Paul nunca imaginou que pudesse se misturar à gentalha. Essa espécie de atitude era inaceitável
para qualquer membro da família, mas ele não tinha o direito de interferir na vida de ninguém. Mesmo
que naquele momento estivesse muito incomodado.
Aquilo se estenderia por muito mais tempo. Bettina não parecia disposta a deixá-lo. Tanto que,
passados alguns minutos, tomou-o pelo braço e, com uma desculpa qualquer, despediu-se do casal.
De braços dados com Paul, ela fez questão de desfilar por toda a festa, sorrindo, chamando
atenção dos convidados.
Mais alguns metros e Paul teria desistido, mas, para sua alegria, William Penno, seu fiel assessor,
surgiu, elegante numa versão de Daniel Boone. Bettina abandonou-o para voltar ao amigos.
— Cuide bem de seu chefe, William. Confio em você.
— Senhorita, ordene e eu farei — respondeu ele num tom de voz obsequioso.
Paul não suportava o jeito como o irmão de Cassy tratava Bettina. O servilismo dos gestos o
incomodava tanto quanto o esnobismo. Com ele, era diferente. Exigira ser chamado pelo primeiro nome
depois de oito meses de convivência diária, mas nunca soube que isso não significara, para William, que
tinham se tornado amigos.
Pobre rapaz, jamais entenderia que uma amizade verdadeira e leal podia ser muito mais valiosa
que sua postura servil e subserviente... Portava-se como um subalterno, e isso nunca mudaria.
Como dois irmãos podiam ser tão diferentes? Cassy era espontânea, autêntica...
Ele ponderava a respeito quando ouviu William dizer:
— Se me permite, devo confessar que está muito bem com essa roupa.
Sorrindo, com genuína gratidão no olhar, Paul apertou a mão do funcionário.
— Agradeço muito por ter me indicado sua irmã.
Obrigado mesmo.
— Oh, por favor... Nós é que agradecemos pela oportunidade de servi-lo.
Paul olhou-o de alto a baixo e perguntou-lhe:
— Ela escolheu sua roupa?
— Não. Veio de lá, mas eu escolhi.
Era o que Paul imaginava. Na certa Cassidy teria optado por um pajem medieval. Ela também era
da opinião que nada pior do que um homem servil e sem amor-próprio.
Bettina interrompeu o diálogo, chamando o noivo novamente, dessa vez para apresentá-lo a um
casal idoso e simpático. O marido confessou que viera quase por dever social, esperando se aborrecer, e
para seu espanto estava se divertindo muito.
Submetendo-o a tais provações, Bettina esperava vê-lo prostrado a seus pés. Naquele momento,
por exemplo, ela insistia em contar a ideia "brilhante" que acabara de ter.
—Um baile à fantasia muito maior, patrocinado pela empresa! — exclamou, animada. — Será
uma grande festa. Convidaremos os clientes e poderemos atrair a atenção dos distribuidores nacionais.
Faremos o lançamento oficial da campanha publicitária.
Essas palavras atingiram-no como torpedos. Conhecia a prima o suficiente para saber que ela
tramava algo. E, pior, com os negócios da família. Cauteloso, argumentou:
— Uma festa desse porte custa muito caro.
— Temos a verba da publicidade. Não seria um gasto inútil. Sem mencionar o que podemos
lucrar com o contato direto com clientes antigos, bancos, fornecedores... Você me diz sempre isso.
Nesse ponto ela estava certa. Paul sempre reclamava que faltava, à empresa, um toque pessoal, e
essa era uma excelente chance. Tinha que admitir que estava tentado pelo plano. Só não concordava com o
baile à fantasia. Por que não uma bela festa?
Mesmo animado, não demonstrou interesse imediato. Bettina não teria esse prazer. Foi então que
teve uma ideia:
— Se William nos auxiliar nisso, será muito mais fácil.
Sim, Paul decidira concordar com o baile à fantasia. Mas por um único motivo: Cassidy Penno. Que
se danassem os motivos reais de Bettina.
— Eu? — indagou William, surpreso.
— Precisamos fornecer as fantasias para os convidados de fora. Ou espera que cruzem o país
com esse tipo de traje na mala? E, para nossa sorte, sua família tem a melhor loja do género.
— Na verdade, o negócio é de minha irmã...
— Um lugar ótimo! — interveio Paul, enfatizando seu interesse na loja e não em Cassy. —
Fazem tudo, da criação ao acabamento. E possuem um estoque enorme. Só não sei se dispõem de uma lista
de tamanhos e modelos oferecidos.
— Tenho certeza de que sim. Eu mesmo ajudei a informatizar a loja — disse William.
— Pronto. Achamos o homem para providenciar esse detalhe da festa! — E, tentando parecer
casual: — Procure saber se sua irmã pode falar conosco na segunda-feira de manhã.
— Garanto que sim.
Bettina estava surpresa, mas entendeu como mais uma vitória sobre Paul e, exultante, lançou-lhe
um sorriso magnânimo antes de dizer:
— Bem, fico contente ao constatar que desta vez não iremos brigar. Como vê, tenho boas
ideias também.
Paul assentiu, sorrindo, e percebeu que até aquele momento o velho casal ficara abandonado à
própria sorte. Bettina já abandonara a roda para alardear sua conquista. Então coube a William fazer o
papel de anfitrião. Ele era ótimo nisso, e Paul tinha pressa em comunicar a Cassy sobre seu plano.
Já se despedira de todos quando William o segurou pelo braço e sussurrou-lhe ao ouvido:
— Será que não devemos procurar uma loja maior?
— Nem pense nisso. Nenhuma loja grande nos atenderia tão prontamente. Faltam dois
meses para o ano-novo.
Mortificado, William gemeu e ousou dizer:
— Dois meses! Eu conheço minha irmã e...
— Preciso dela.
"Preciso mesmo", pensou.
Sem perceber, Bettina lhe dera a chance ideal para continuar a ver Cassidy. O resto poderia ser
resolvido.
Passava muito da meia-noite quando o telefone tocou. Cass, embora acordada, não atendeu
imediatamente. Estava imaginando como fora a festa e se Paul formalizara o noivado com Bettina Lincoln.
Tolice pensar assim, mas sentia que isso daria fim a seu idílio. Quando atendeu, não podia imaginar
que ouviria justamente a voz dele.
— É você mesmo?
— Sei que é tarde, mas o que tenho a dizer não pode esperar.
— Tudo bem. — Com o coração apertado, Cassy se preparou para ouvi-lo falar que não
poderiam mais se ver.
— Preciso que me ajude, e muito.
Abrindo os olhos, sentindo o sangue latejar, ela disse a primeira coisa que lhe veio à mente:
— Sabe que farei qualquer coisa.
— Otimo. Eu contava com isso.
Agarrando o telefone com ambas as mãos, Cassy mal controlava o entusiasmo.
— Só me diga o que preciso fazer.
— Não sei exatamente, mas é muita coisa. E teremos que nos ver sempre.
Confusa, Cassy pôs-se de pé. Pelo que conhecia de Paul, tudo era possível.
— Espere! De que estamos falando?
— Do baile de ano-novo das empresas Barclay, um evento publicitário que meus sócios
inventaram e com o qual concordei. Um baile à fantasia. Outros detalhes William poderá fornecer amanhã.
— Quer dizer... este ano-novo?
— Achei que deveria ser informada desse pequeno detalhe.
— Acho que não será possível.
— Esse problema é de Bettina. Meu único problema é arrumar as fantasias dos convidados de
fora.
— Agora ficou claro. — Cassy não sabia se ficava feliz ou preocupada com a atitude de Paul.
Então foi direta: — Vocês ficaram noivos hoje?
— Claro que não!
Livre do peso, e achando-se um pouco tola, ela tentou se desculpar:
— Achei que... Bem, William me disse que era esse o motivo do baile e... quer dizer...
— Não há nenhum romance com Bettina. Nenhum de nós ama o outro. E uma questão de
orgulho ferido para ela, só isso.
— É que eu pensei que ela o amasse e... Bem, ela já tem dinheiro e poder com a herança. Por
que tanto empenho no casamento?
— Bettina quer ser um membro da família, uma Barclay legítima. E também restaurar seu
amor-próprio ferido.
— E, ao obrigar você a casar-se, conseguirá tudo isso?
— Ela conseguiu me encurralar. No momento, tudo o que Bettina quer é me mostrar que
venceu. Deseja que eu... hum... aceite meu destino.
Cassidy entendeu.
— Essa é a coisa mais triste que já ouvi.
— Não, Cass. A coisa mais triste é amar alguém que nunca será seu.
Algumas palavras não precisam ser ditas. Cassy já sabia de quem Paul estava falando. E ele tinha
razão.
— A melhor coisa a fazer agora é dormir.
— Certo. Boa noite.
— Boa noite, Paul.
— Vejo você logo?
— Logo, logo.
Ao desligar o telefone, Cassy sentiu que o deixara mais calmo. Surpreendentemente, em poucos
minutos dormia profundamente. Sentia-se em paz. Por algum tempo, teria Paul a seu lado, e seriam
mais do que "bons amigos". E isso era além do que podia almejar.
William conseguiu marcar a reunião com Cassidy, como prometera a Paul. Esquecido de que, antes de
ser funcionário da Barclay, era irmão de Cassy, continuava agindo com a prepotência costumeira. Celular em
punho, confirmava os números e dirigia-se para Paul:
— Bettina calculou cerca de trezentos convidados.
Gladys terá os nomes até a tarde, assim que elaborarem a lista oficial. Em um dia ou dois teremos a
listagem de idades, sexo, cor e tamanho aproximado de todos eles. Bendita seja a informática!
Paul forçou um sorriso.
— Vamos ao que interessa. — Virou-se para Cassidy.
— Você acha que terá dificuldade em conseguir roupas para toda essa gente?
Consultando o computador, ela respondeu:
— Não. Temos muita coisa em estoque e pouca procura para o reveillon. Se fizer a reserva
agora, terá tudo o que deseja. Mas seria melhor inventar um tema para a festa, algo como "velho Oeste" ou
"império Romano". Pela minha experiência, facilitaria a escolha das pessoas, evitaria rivalidades e
tornaria mais fácil a decoração.
— Faz sentido. Mas onde arranjaríamos local e cenários em tão pouco tempo?
— Um único tema me dá chance de negociar com todas as lojas.
William não quis ficar atrás da irmã, e sugeriu:
— Temos a velha fábrica. E grande, tem estilo e está vazia. Quer lugar melhor?
O olhar de Paul buscou socorro no de Cassy. Não fazia a menor ideia do que era razoável ou não.
Mesmo assim, deu seu palpite:
— E velho, antigo mesmo. Está sujo e de bom só tem a solidez das paredes. Ah, e o
tamanho.
— Parece muito bom. A srta. Bettina não precisa ser consultada?
— Antes quero ter algo concreto para mostrar. Alguma ideia de tema?
— Quem fundou o pastifício Barclay, e quando? — indagou Cass.
— Meu bisavô, em 1902. Por quê?
— Porque William tem fascinação pela saga da empresa, e muitos outros devem ter também.
Estamos no fim do século. Que tal voltar ao começo de tudo?
— Justamente agora que estamos mirando o futuro?
— bradou William. — É um contra-senso. Nosso alvo é atingir proporções nacionais. Essa estrutura
familiar está ultrapassada.
— Will está certo — assentiu Paul. — A Barclay está a um passo da nova era.
— Quer coisa melhor do que voltar ao início antes de olhar para o futuro? Dálias, 1902. O
começo de uma civilização, a nossa. "Quem não teve passado, não terá futuro." — A voz de Cassidy era
puro entusiasmo.
Paul estava inebriado com a ideia, com Cassidy, com tudo à sua volta. E o olhar denunciava seus
sentimentos. Queria ser feliz e esquecer o resto.
As ideias pululavam. William queria fazer um histórico da empresa com fotos no saguão da fábrica.
Cassidy sugeriu que Paul representasse o papel do patriarca Barclay. No auge da animação, ele não
resistiu e, juntando os dedos, jogou um beijo na direção dela.
— Brilhante! — Cassidy foi rápida ao notar a reação de William. O olhar do irmão ficou frio, e
a desaprovação era patente mesmo quando Paul abraçou os dois, repetindo: — Os brilhantes irmãos Penno!
O riso espontâneo de Paul não impediu Cassidy de notar em seu irmão traços de preocupação. Algo
o incomodava. Ela, porém, não se abalou. Tinha coisa mais séria em mente.
Não foi preciso esperar muito para obter as respostas. Na noite seguinte, William apareceu de
surpresa na casa de Cassidy, agitado e cruel, disparou suas farpas logo na entrada:
— E tudo culpa sua. Vai acabar com a minha carreira!
— Posso saber do que está falando?
— O plano era aproximar Bettina e Paul, não o contrário.
Cass respirou fundo e contou até dez. Levou o irmão à sala íntima, esperando que ele se acomodasse.
Acendeu o abajur, abriu um vinho do Porto e só depois de servi-lo, em copos de cristal belga, falou:
— Agora, com calma, pode me dizer o que houve?
—E Paul. Só pensa no baile. Esqueceu Bettina e, para se vingar, ela o atormenta com a
decoração a cada minuto.
—E o que eu tenho a ver com isso?
—Não se faça de sonsa, Cassidy Jane Penno. Não sei como, mas parece que você andou
virando a cabeça dele.
—Sou paga para dar ideias. Se isso afeta a cabeça
de seu chefe, não é problema meu.
— Que tipo de ideias? A meus olhos está claro que ele... Bem, gosta de você.
— E daí? Para seu governo, não é o único. Ou sua irmã parece um monstro? Se veio para
me dizer isso, ti, pode ir para casa.
Por um longo momento, William ficou sem ação e encarou sua irmã.
—Sabe que não existe chance. Ele está comprometido com outra.
Atónita, Cass sentiu mais que censura naquele comentário. Havia a preocupação legítima de
irmão mais velho.
— Ainda não está.
— Não acredito que você pensa que pode competir com Bettina Lincoln! Ela é sofisticada,
interessante, alta, loura... o tipo de mulher que faz um homem enlouquecer. E, mais que isso, é
poderosa. Nunca vai deixar que você ou qualquer outra mulher roube-lhe Paul.
Cassidy queria dizer que ele estava errado, e que Bettina ainda não possuía Paul. Mas no íntimo
concordava com William. Tinha quase certeza de que algo mais do que os negócios da família uniam os
dois.
— Sou sua irmã! Será que isso não conta nada? Deixe um pouco de lado a "magnífica"
Bettina e pense em mim. Ou em você.
— Está certo. Não posso ficar amarrado desse jeito a Paul.
— Exato. Pense neles como uma fonte de rendimentos para nós, e temporário. — E, com ar
inocente: — De mais a mais, foi por sua causa que eu o atendi.
— Só lhe peço uma coisa: não podemos deixar Bettina à margem dos acontecimentos. Ela
precisa ser a estrela dessa festa. Faça com que isso aconteça. Sei que vai armar uma pequena peça de
teatro para contar a história da empresa, e que Paul será o velho Barclay. Pois use a criatividade para
colocar Bettina como a mulher que fez o grande homem. Dê um jeito. Escreva, crie, dinheiro não é
problema. Não saio daqui sem um texto para Bettina ler amanhã. Chame seus amigos de teatro, faça o
que quiser. Mas faça.
Dois telefonemas e Tony e um amigo redator estavam lá, com pizzas e disposição. Como se fosse um
desafio para seu talento e caráter, Cassidy produziu naquela noite um texto completo, com tudo: marcação,
iluminação, trilha sonora. Como figura central, a esposa fiel e incansável, abnegada e brilhante: o papel de
Bettina,
Quando terminou, soube que fizera aquilo por Paul. Por causa do amor cada vez mais intenso que
nutria por aquele homem. Se isso o ajudasse em algo, teria valido a pena.
CAPITULO V
— Achei as fotos! — disse William, tirando da pasta um velho álbum.
Cassidy, Tony e os outros três rapazes do curso de teatro levantaram os olhos para ver do que se tratava.
— Há uma foto da casa do bisavô de Paul, em que ele aparece com a esposa.
Cassidy juntou as mãos, agradecida.
— Graças aos céus!
— Não vão acreditar, mas o velho Barclay fazia propaganda do pão já nos anos vinte. Aqui, eles
estão inaugurando a terceira loja.
Aquele era o material de que Cassidy precisava para a ambientação do baile e, especialmente, para sua pe-
quena peça de teatro sobre o patriarca Barclay. Entusiasmada, revirava o material que lhe daria subsídios para o
trabalho.
Estavam empenhadíssimos na produção da peça. Havia quatro dias que não faziam outra coisa.
Paul chegou nesse instante, furioso. Acabara de falar com alguém no celular.
— Essa foi a coisa mais estúpida que já ouvi em toda a minha vida! — Olhando para todos,
explodiu:
— Alguém precisa tomar, conta desta loja. Há clientes esperando!
Tony saiu correndo antes que a fúria de Paul desabasse nele. Os outros três jovens seguiram-no.
— E então? Bettina gostou da peça? — indagou William.
O coração de Cassidy ficou apertado. Trabalhara muito naquele roteiro. Conseguira contar a
história do patriarca Barclay, colocando Bettina no papel da bisavó de Paul. E, se fosse preciso reescrever
algo, estariam perdidos. Não haveria tempo.
— Bettina se recusou a fazer a peça. Alegou que isso arruinaria sua imagem — vociferou
Paul.
— Mas como? É o papel principal! Sua bisavó foi a responsável pelo desenvolvimento da
empresa!
Paul levantou o dedo em riste em direção a William, irritado.
— Exato! Ela morreu aos noventa e quatro anos, ativa e lúcida. Trabalhou para que
tivéssemos uma fábrica, ao invés de muitas padarias. Enfim, construiu tudo o que temos.
William balançou a cabeça, desalentado.
— Não entendo. A srta. Lincoln devia estar orgulhosa pór representar esse papel.
Mãos na cintura, Paul disse em tom sarcástico:
— A srta. Lincoln não tem muita coisa na cabeça. O que a incomodou foi a parte em que é
uma senhora idosa. Usando as palavras dela, uma velha.
— Só no final. Começamos com a personagem aos vinte anos, e recém-casada! — argumentou
Cass.
— Isso não faz diferença! — Paul continuava inconformado. — Bettina teme que a maquiagem
estrague sua pele, e não quer parecer velha. Ponto final.
Cassidy parou por alguns minutos, para pensar naquilo tudo. Nenhuma mulher do mundo seria
vaidosa a esse ponto. Havia algum outro motivo. William mostrava-se tão estarrecido quanto ela, mas, como
sempre, tinha um ponto de vista conciliador:
— Talvez a srta. Lincoln não tenha a dimensão exata do papel. Enquanto você sai depois da
segunda cena, ela continua até o fim da peça.
— Esqueça. Bettina se recusa e pronto! Essa mulher me tira a vontade de viver! — confessou
Paul.
— E agora? O que vamos fazer? — William perguntou.
Era a deixa que Paul esperava. Um brilho maquiavélico surgiu em seu olhar quando fixou-se em Cassy.
— Vamos achar alguém para substituir Bettina. E sei exatamente quem.
William Penno rebelou-se instantaneamente.
— Você não está sugerindo que...
— Oh, eu não ousaria — argumentou Cassy, entendendo que o papel sobraria para ela.
O charme e a postura de Paul Spencer Barclay eram imbatíveis nos negócios, diziam todos. Valendo-
se desse talento, ele se aproximou de Cassidy, tomou sua mão e foi direto ao dizer:
— Sei que estou pedindo demais da nossa amizade, mas preciso de você. Saberei recompensar
seu trabalho, prometo.
— Não é uma questão de dinheiro.
— Tenho certeza de que não. — Sua voz tornou-se suave. — Mas não tenho outro modo de
expressar minha gratidão por tudo o que tem feito, por seu apoio e generosidade... — E beijou-lhe a
mão.
Cassidy não resistiu ao gesto galante, capitulando.
— Oh, não! Por favor! — William estava inconformado. — Pense no que está fazendo!
Paul fuzilou-o com o olhar. Cansara-se de ouvir objeções e conselhos do assessor.
— Que sugere, então?
— Pense na srta. Lincoln...
— A srta. Lincoln sabe perfeitamente que alguém terá que fazer o papel que ela recusou.
Agora diga à sua irmã para aceitar minha proposta. Já!
— Eu?
— Você não é meu assessor? Pois então, resolva esse problema.
O poder que Paul se recusava a usar nas relações pessoais estava sendo útil, finalmente. Agir dessa
forma com William Penno era uma forma de fazê-lo perceber quanto podia ser desagradável a arrogância
alheia.
No fundo, Cass estava saboreando esse momento. Não deixou de ter uma certa graça ver o
prepotente William se render.
— Bem, apesar de tudo, pensando melhor... Nós não podemos abandonar Paul agora.
Cassidy se perguntou até que ponto era importante para Paul tê-la a seu lado. Mas a pergunta era
irrelevante. Seu coração sabia o que importava de verdade. Voltando o rosto para ele, respondeu com
sinceridade:
— Claro que terei prazer em fazer a peça, se é o que quer.
— Obrigado. Muito obrigado.
A essa altura, William já recuperara o autocontrole e, infelizmente, também a prepotência. Queria
que Bet-tina brilhasse, não Cass. Portanto, não permitiria que sua irmã se valesse dos mesmos trunfos
destinados à srta. Lincoln.
— Precisamos fazer modificações no texto, já que Cassidy será a matriarca, e não Bettina.
— Ninguém põe a mão no que está escrito. — Paul estava disposto a tudo para ser obedecido.
Seu olhar não deixava dúvidas sobre isso.
Engolindo em seco, William guardou para si as objeções. Cassy retomou o assunto do álbum de
fotografias:
— Agora vamos ver que fotos podemos usar.
A pesquisa foi produtiva. O bisavô de Paul fora um dos primeiros, em Dálias, a fazer uso constante da
fotografia como forma de registrar flagrantes cotidianos, quando a maioria das pessoas apenas posava para a
máquina.
Em menos de uma hora Cassidy já sabia o que precisava adquirir nos antiquários da cidade, e saiu
em busca das primeiras peças. Paul deu-lhe seu cartão de crédito e o celular.
A tarde voou. Quando ela finalmente pôs os pés na loja, tinha a sensação agradável de haver
conseguido avançar léguas no trabalho. Excitadíssima, tinha pronta, na cabeça, a decoração da festa, e em
detalhes.
Paul precisava ser informado de seu projeto. As ideias fervilhavam em seu cérebro e a loja já
estava deserta. Tony saiu correndo ao vê-la chegar, atrasado para a aula.
Como o telefone de Paul ficara com ela, não sabia onde procurá-lo. Nesse momento, ouviu a porta
bater.
— Oh, Paul! Você leu meu pensamento. Tenho de contar minha ideia...
— Que bom! Falaremos durante o jantar.
Como uma criança, Cass não se conteve e disparou a falar:
— Sabe a foto de sua bisavó na cozinha? E o jeito do restaurante de Hoot? Pense! Podemos
conseguir um ambiente mágico se reproduzirmos a cozinha dela em todo o salão! E é simples: basta usar as
toalhas certas, alguns objetos e pronto. Teremos a mesma atmosfera.
— Genial!
Seguindo-a pela loja, Paul ouvia, atento, os detalhes que Cassidy dava enquanto apagava luzes e ia
fechando a loja. Só quando estava na rua, com o vento frio despenteando seus cabelos, Cass parou de
tagarelar. E isso porque Paul segurava-lhe o queixo.
— O que foi?
— Isto. — Ele a beijou.
Era o primeiro beijo depois do baile à fantasia. Ambos ansiavam por esse momento, mas nenhum
tomara a iniciativa. Tinham medo. Não sabiam bem do quê, mas tinham. Foi Cassidy quem definiu as
coisas. Assim que seus lábios se separaram, ela disse:
— Não a peça em casamento até o ano-novo. Por favor, nos dê esse tempo.
— Certo. Prometo.
Abraçados, sentindo o vento gelado tocando seus corpos, estavam quase felizes. Ao menos poderiam
ficar juntos até janeiro.
O caos imperava quando começaram a mexer na fábrica. Sujeira e entulho misturavam-se aos
problemas técnicos para a produção da peça.
Tudo parecia se complicar, e William não tornava mais fácil a tarefa, implicando com Cassidy e
seus métodos.
Tony e seus colegas de faculdade estavam encarregados da faxina. Esse foi um motivo a mais para o
desentendimento dos irmãos Penno.
Paul chegara à fábrica justamente num desses momentos. Fora até lá para ensaiar e escolher
os atores coadjuvantes, todos estudantes da escola de arte dramática.
Essa fora uma das razões pelas quais Cassidy pedira que Tony levasse seus colegas de
faculdade. Mas William não entendia esse raciocínio e brigava por colocar, na limpeza, uma empresa
especializada. Paul interveio em favor de Cass. Queria que todos entendessem que faziam parte de
um projeto comum, e que juntos deveriam alcançar o resultado desejado.
Cassidy, com um assobio estridente, conseguiu a atenção de todos. Com voz firme, ela passou a
exercer o comando.
— Primeiro eu gostaria de agradecer a todos que estão dispostos a trabalhar conosco.
Quanto antes a limpeza acabar, mais cedo iremos para casa. — E, olhando para Paul, anunciou: — Acho
que o sr. Barclay tem algo a nos dizer.
— Em primeiro lugar, gostaria de lhes pedir que anotem seus telefones para contato,
horários de trabalho desejados e tarefas que têm facilidade em desempenhar. Isso nos garantirá um
aproveitamento me lhor das qualidades de todos — disse Paul.
Em pouco mais de vinte minutos já haviam chegado a um consenso sobre o trabalho da equipe, o
salário e os contratos temporários.
— Todos sabem que a festa está centrada num único ponto: a pequena peça que estamos
produzindo e que dará sentido ao evento. Já foram distribuídas cópias para todos. Eu farei Theo
Barclay, e a srta. Penno...
— Cassidy — corrigiu ela.
— Obrigado. Cassidy concordou em representar a esposa de Theo, minha bisavó. Inteligente
e criativa, a srta. Penno é a responsável por tudo aqui. O que ela disser ou fizer tem meu aval. O
poder é dela.
Tony e William reagiram às palavras de Paul com o mesmo sentimento de insatisfação. Porém,
foram os únicos a se sentir assim.
A palavra voltou para Cassidy, que começou a narrar suas escolhas para o elenco, o que incluía muitos
membros da família Barclay. Faltava um rapaz para representar Theo quando moço, e William sugeriu
que procurassem entre os filhos do pessoal da diretoria da empresa.
— Mais uma vez os irmãos Penno nos socorrem com suas ideias geniais. Obrigado, Will.
Pode providenciar isso?
William encheu-se de orgulho.
— Claro.
— Seria bom contar com uma ou duas meninas também — lembrou Cassidy.
— Verei isso — prometeu William.
Tudo encaminhado, a reunião foi encerrada. Paul, Cassy e William se isolaram para a leitura do
script. Cass explicou o motivo pelo qual discutia com William quando Paul aparecera na fábrica.
— Meu irmão se esquece de que estamos organizando um baile, não somente uma peça de
teatro. Não podemos deixar de ter claro que essa peça é só um detalhe dentro da festa. As pessoas não
estarão aqui para assistir a uma representação, mas sim para dançar, beber e se divertir na
passagem do ano. Portanto, não tem cabimento colocar um palco enorme no meio do salão.
Sem falar no detalhe de que Bettina não ficaria muito feliz com tamanho destaque para algo que não
lhe dizia respeito, pensou Paul. E, para a orquestra que ela escolhera, seria necessário muito espaço,
tornando inviável a colocação de outro palco só para a peça.
A ideia de Cassy foi aceita. Fariam um pequeno cenário, no lado oposto ao da orquestra. Ele
passaria despercebido em meio à decoração, e usariam o salão como cenário durante grande parte do
tempo.
Bettina sugerira que cortinas brancas de seda forrassem todo o interior, para desespero de Paul.
Irónico, ele observou que dificilmente isso se pareceria com uma cozinha rústica do começo do século.
William, por sua vez, se pôs a defender com ferocidade o ponto de vista de Bettina, mas Cassidy
concordou com Paul. Seria mais apropriado usar cortinas listradas e coloridas. Mas William insistiu no
assunto, o que o obrigou a ouvir palavras ásperas.
— Que uma coisa fique clara: sou obrigado a casar com Bettina, não a concordar com suas
idiotices.
Paul surpreendeu o assessor, que, chocado, não hesitou em culpar a irmã, fulminando-a com o
olhar. Cassidy sentiu-se desconfortável e injustamente acusada. Afinal, se Paul detestava Bettina, ela não
tinha nada a ver com isso.
Tentando desanuviar o ambiente, Cass sugeriu que repassassem as falas com Will, para que ele
pudesse julgar o desempenho de ambos, e do narrador, Andy, um ator profissional.
O começo foi realmente hilário. As falas não se encaixavam com a ação, e as mãos de Paul se
moviam como num filme mudo. Ensaiaram a cena em que o casal Barclay decide largar os empregos
para abrir seu próprio negócio.
As falas podiam não convencer muito, mas a intimidade demonstrada pelo casal era muito
convincente. Real demais para o gosto de William.
A cena terminava com o casal abraçado, olhando com esperança o futuro. E foi esse abraço que
mais incomodou o jovem Penno. Tony agiu rápido, distraindo os demais para que não vissem o que estava
acontecendo entre os protagonistas.
Paul não conseguia disfarçar seu interesse por Cass. Queria levá-la para um lanche, a fim de
ficar a sós com ela. Disse-lhe ao ouvido que sairia primeiro e que voltaria para buscá-la em alguns
minutos.
Tudo isso por causa de William, sempre perto, vigiando. Para espanto de Cassidy, que nunca se
colocara na posição de viver um romance clandestino, a censura dos olhos do irmão era dolorosa. Ele se
preocupou até mesmo em certificar-se de que Cass iria sozinha, e direto, para casa.
Essas e outras pressões foram fortes o bastante para que ela sentisse necessidade de
redefinir, ou repensar, a relação com Paul. Mas, com William em seu encalço, isso se tornou
impraticável. O irmão levou-a para casa, e, a pretexto de tomar um café, demorou tempo suficiente
para ter certeza de que nada aconteceria.
Agoniada, Cass viu as horas passando sem que Paul desse notícias ou atendesse o celular. Às dez
horas da noite ele apareceu, com aparência de quem saíra do chuveiro, cabelos molhados e revoltos.
Vestindo uma calça jeans larga, ténis e um blusão esportivo, parecia mais jovem, não fosse o cenho
cerrado.
Avançando em direção ao sofá, foi logo dizendo:
— Temos de conversar. — Antes que pudesse dizer qualquer coisa, Cass foi bombardeada pelas
palavras:
— Sinto muito, mas não sou hipócrita o bastante para fingir que não estou louco por você. Ainda sou
um homem livre, e enquanto isso não mudar quero ficar a seu lado.
Mesmo atordoada com a declaração, Cass teve presença de espírito para contra-argumentar:
— Será isso possível? E Bettina? Já pensou que talvez ela se incomode?
Enterrando a cabeça nas mãos, Paul respondeu com desalento:
— Não sei. Realmente, não me importo mais.
Sem saber como agir ou o qie dizer, ela simples mente fez a pergunta-chave:
— Você tem mesmo de se casar com ela?
Respirando fundo, Paul ficou em silêncio por alguns instantes.
— Tenho.
— Oh, entendo...
A decepção foi maior do que ela esperara. Muito maior. Desviou o olhar, para esconder as
lágrimas. E mesmo as palavras seguintes dele não faziam sentido.
— Não vejo outra saída. Bettina está obcecada, não mudará de ideia. Queria tê-la conhecido
antes, Cass, muito antes.
— Antes de ter um caso com ela, quer dizer. — E, recuperando a calma: — Não vejo
alternativa senão continuar assim, escondidos, no pouco tempo que ainda nos resta.
— Não consigo vê-la feliz com isso.
— Por causa de William. Ele não compreende e me faz sentir culpada.
— Se estou causando embaraço, vergonha, diga-me e...
— Claro que não! Não há nada de que eu me envergonhe. Nada!
As mãos de Paul tocaram-lhe com delicadeza o rosto, deslizando numa carícia apaixonada. Seus olhos
a miravam, embevecidos.
— E aonde isso vai nos levar?
— Onde já estamos.
Beijando-a de leve muitas e muitas vezes, Paul pediu perdão, emocionado.
— Não pude conter meus sentimentos. Não me controlei, Cass.
— Não me peça perdão.
O beijo que ele lhe deu na mão percorreu-a como corrente elétrica. Fechando os olhos, entregou-se,
aninhando-se nos braços masculinos. Depois, inverteram as posições, e Cassy o aconchegou no regaço.
Olhando para o menino que ele parecia, ela o acariciou. Paul enterrou o rosto em seus seios. Aos
poucos, foi levando as mãos até eles, sentindo-os. Eram tão desejáveis que ele não se conteve. Excitado,
deslizou a outra mão para a coxa roliça.
A reação de Cassidy foi cerrar os olhos e deixar que aquela sensação deliciosa reverberasse em cada
centímetro de seu corpo. Paralisada, temendo interromper a magia, ficou imóvel. Uma onda de desejo
violento a dominou, enfraquecendo seus sentidos, aquecendo-a como nunca.
Mas ele se deteve de repente. Pôs-se de pé e, controlado, disse:
—Melhor eu ir para casa.
Dadas as circunstâncias, Cassy assentiu. Se continuassem ali, não poderia responder pelo que
aconteceria. Ao acompanhá-lo até a porta, percebeu quanto o desejava, e sofreu por vê-lo partir. Suas
pernas ainda estavam trémulas. Fechou os olhos. Seu coração e seu corpo ainda o sentiam intensamente.
Mesmo na cama, tempos depois, seu ser vibrava com a lembrança de Paul.
CAPITULO VI
Esbaforida, Cassidy entrou na fábrica. Todos respiraram aliviados. Especialmente Paul,
que não disfarçou sua alegria.
— Graças aos céus! Estava preocupado. Você não costuma se atrasar.
— Deixou todo mundo esperando — repreendeu William, incomodado com o gesto
afetuoso de Paul.
Afastando-se do abraço, Cassidy se desculpou pelo atraso, constrangida.
— Desculpem, tive uma reunião com o fornecedor de perucas, e demorou mais tempo
do eu supunha. Depois, houve um acidente na avenida central.
— Você deveria saber disso antes de escolher esse caminho — rebateu William,
irritado.
Paul respondeu com rapidez, intrigado com tanta hostilidade:
—O que o incomoda, Penno? Cuide de sua vida.
Cassidy interveio para serenar os ânimos. Segurando Paul pelo ombro, sugeriu:
— Estamos perdendo um tempo precioso. Ao trabalho!
A hostilidade de Paul arrefeceu, e William não disse nada. Limitou-se a olhar para ambos com
indignação. Cassidy já perdera o sono tentando achar um modo de tranquilizar o irmão e fazê-
lo aceitar sua relação com Paul. Mas nem ela mesma estava convencida de que agia corretamente.
A verdade era que vinha se encontrando com um homem que se casaria com outra, em breve. Já se
cons-cientizara de que o melhor seria romper, mas não tinha força para levar adiante essa resolução.
Enquanto houvesse chance, continuaria ao lado do homem que amava. E William sofreria por achar que
sua irmãzinha era amante do chefe.
Ao imaginar o futuro sem Paul, Cassy estremecia. Aos poucos, preparava-se para ocupar o lugar
que lhe caberia quando ele se casasse. No fundo, continuaria a ser a outra, pois não enxergava a vida
sem aquele homem. Nesses momentos, dava graças por ter coisas mais urgentes com que se preocupar.
O que deveria ser apenas uma pequena apresentação transformara-se numa produção teatral
completa. E o baile assumia proporções maiores a cada reunião.
Ensaiaram e ensaiaram. William fizera um ótimo trabalho com os cenários, conseguindo um meio
termo entre o projeto inicial e a parcimônia de Cassidy. Tinham um iluminador competente, e os resultados
eram gratificantes.
No intervalo de mais um ensaio, Tony chamou Cassidy para discutir alguns adereços. Era tarde e a
conversa parecia interminável. Paul estava faminto e nada disposto a esperar pela companhia de Cass.
Então, chamou-a. A reação de Tony foi violenta e imediata.
— Se o seu dinheiro pode comprar todos, isso não se aplica a mim. Pode nos dar licença,
"patrão"?
— Vamos acabar a conversa mais tarde, Tony? Por favor...
— Mas Cass...
— Mais tarde. Você ouviu a senhorita — reforçou Paul, vitorioso. E, virando-se para ela: — O que
você tem?
— Dor de cabeça, mais nada.
— Cass sempre tem isso quando não come — interveio Tony. — É comum acontecer.
Basta uma maçã e o mal-estar passa.
Era verdade, reconheceu ela. Esquecera de almoçar. Somente um café e meia torrada, que
ingerira depois que acordara, mantinham-na em pé. Assentiu, com a têmpora latejando.
— Vamos comer. Eu a levarei — resolveu Paul.
— No máximo um iogurte. Só uma aspirina e um quarto escuro resolvem — provocou
Tony.
— Providenciarei tudo isso. Vamos, querida.
Cassidy estava pálida, e quase desfalecida, quando William interveio:
— Se minha irmã está doente, eu a levarei para casa. — O tom autoritário
impressionou.
Esgotada, estourando de dor de cabeça, Cassidy não teve forças para discutir e, relutante,
cedeu às pressões de William. Dividida, falou:
— Acho que não estou disposta. Não vou sair com ninguém.
— É claro que não, mas precisa de quem cuide de você. Minha intenção é fazer isso.
— Paul pôs-se na frente de William, interceptando-lhe a passagem.
Foi o bastante para deflagrar a onda de revolta que Will vinha alimentando há algum
tempo. Esquecido de quem era Paul, insurgiu-se contra ele.
— Sinto muito, mas isso já foi longe demais. Não posso tolerar! — vociferou.
— Tolerar? Somos adultos, Will. Não creio que haja algo para ser "tolerado", por você
ou por quem quer que seja.
— Cassidy é minha irmã.
— E é adulta. Esta não é a hora, nem o lugar para discutir. Aliás, não há nada aqui que
lhe diga respeito.
William mudou o tom da conversa. A ira deu lugar ao apelo comovido, e foi assim que se dirigiu ao
chefe:
— Por favor, pense no que está fazendo. Cass não merece ser enganada. Pare de se comportar
como se ela significasse algo para você.
— E significa muito. Muito! Talvez não valha nada para o irmão, mas, para mim, ela é
importantíssima.
William fez de conta que não ouvira a provocação.
— Já pensou no que Bettina vai pensar se...
— Bettina não tem nada a ver com isso!
Cassidy, dividida e magoada, sentia as lágrimas ensopando o rosto delicado. Quando Paul a puxou
para si, afastando-a de William, seu coração doeu.
— Pense no que está em jogo — disse Will. E, cínico, completou: — Ela não vale tanto, Paul.
— Não sei se você é um canalha, William, ou só mais um imbecil, como tantos por aí.
Atónita, Cass ainda não captara a extensão do que seu irmão acabara de dizer. Sentia o desdém
dele como um punhal cravado em seu peito. Uma pequena parte dela dava razão a William, mas isso não
diminuía em nada seu sofrimento. Só uma coisa no mundo poderia lhe oferecer conforto naquele instan-
te: o abraço de Paul.
Gemendo, permitiu que ele a tomasse nos braços e a levasse para longe dali. Foi um bálsamo
sentir o vento frio no rosto, ao sair da. fábrica. Ainda zonza, respondia às perguntas de Paul com
monossílabos. Só se recordaria, depois, de ouvi-lo dizer que alguém precisava dar uma lição a William.
Ao sentir-se de volta ao lar, acomodada no sofá da sala, recuperou um pouco a energia habitual. Paul
se desdobrou em cuidados. Aspirina, sopa de legumes, bolachas e um pedaço de maçã ajudaram a
convalescença.
Enternecida, assistiu ao vaivém dele pela cozinha, atarefado com o preparo da refeição. Chá e
bolinhos também foram servidos, com tanta desenvoltura que Cass se surpreendeu. Solícito, ajoelhou-se
ao seu lado.
— Melhorou, querida?
— Muito.
— Então fique quietinha enquanto lavo os pratos. Não saia daí.
— Não seja tolo. Já estou boa.
— E espero que continue assim.
Fechando os olhos, Cassy não pôde evitar que um sorriso bailasse em seus lábios. Não se lembrava
da última vez em que alguém cuidara dela. Estava quase feliz, apesar de tudo. Os ruídos na cozinha, a
televisão ligada, o gato que se aninhara em seu colo... Essas pequenas coisas davam-lhe uma sensação
inebriante e única.
Cochilou alguns minutos, e quando Paul a acordou, para se despedir, as palavras saíram
naturalmente. Segurando-o pela manga, pediu:
— Por favor, fique comigo.
— Só um pouquinho...
Depois disso, ela adormeceu profundamente. Vagamente se lembrou de ter sido carregada para a
cama. Mas, sabendo que Paul estava ali, pôde descansar tranquila. O homem que amava tomava conta de seu
sono, e tudo daria certo...
Cassidy acordou com o nascer do sol. Teria continuado a dormir, mas o contato da mão quente e
pesada sobre sua pele nua a despertou. Ainda sonolenta, aos poucos foi se dando conta do que estava
acontecendo. O braço que envolvia sua cintura e o corpo musculoso que amparava o seu eram masculinos.
De Paul.
Um sorriso veio-lhe aos lábios ao se recordar da noite anterior. Lânguida, respondeu pouco a
pouco ao contato sensual.
Adormecido, ele nem notou que a enlaçava. O braço escorregou pelo corpo feminino e fez com que
Cassidy perdesse o fôlego ao iniciar carinhos muito atrevidos... Sentir o toque daqueles dedos
provocou-lhe prazer e medo.
Tensa, sem saber o que fazer, ela se deixou levar pelo instinto. Só então percebeu que Paul não
estava mais dormindo. Virou-a para si, escorregou as mãos pelo corpo bem feito e beijou-a na testa.
— Bom dia! Como se sente?
— Melhor, impossível.
— Preciso me certificar disso. — E, maroto, acariciou todo o corpo de Cassidy. — Você acorda
linda!
— Digo o mesmo...
— Dessa vez vou acreditar. — Paul ergueu-se um pouco da cama e, apoiado nos cotovelos,
fitou-a, embevecido. Nada, senão os lençóis, cobria a nudez de seus corpos. Por isso, quando Paul a
puxou, Cassidy sentiu-o por completo. A boca de Paul procurava, sedenta, pela dela, e num frémito os
lábios se juntaram. Cass queimava de desejo.
Nada parecia saciá-la. Ao arquear as costas, os seios exuberantes uniram-se ao peito de Paul, num
apelo mudo. A sensação que a dominava era de urgência. Urgência de tocar e ser tocada por Paul, juntar
seu corpo ao dele, buscando um contato cada vez maior, mais intenso. Cassy queria mais e mais, e tinha
a impressão de que nunca alcançaria o que buscava.
Por um segundo hesitou, mas só por uma fração de segundo, ao notar seu corpo ardendo pelo que
estava por vir. Os lábios de Paul deslizaram, suaves, até a orelha feminina, mordiscando-a. As carícias
continuaram pelo pescoço e desceram pelo colo, arrancando arrepios de prazer.
Fechando os olhos, Cassidy submergiu na onda de desejo que a envolvia.
Por isso, ao abrir as pálpebras e olhar o despertador, só conseguiu dizer:
— Céus!!!
— Eu diria que é o paraíso...
— Paul!
— Hum?
— São quase nove horas da manhã!
— O quê?
— Eu falei que...
Desperto dos devaneios, Paul parecia ter saído de uma ducha fria.
— Nove? Droga! Eu tinha de estar no escritório às oito e meia.
— Minha loja abre às dez. Ou abria...
Ela riu, e o fez rir junto. Linda e desejável, como nenhuma outra mulher jamais seria.
— Adoro quando você ri. Quero desesperadamente fazer amor com você.
— Eu sei, mas...
— Acho melhor avisar a fábrica que vou demorar. E me faça um favor, não levante até que
eu tenha saído. — Beijando-lhe a testa, ele s~e levantou enrolado no cobertor.
— Por quê?
— Para que eu possa me lembrar de você o dia todo, deitada entre lençóis. E, sinceramente,
não sei se resistiria a sua pele macia...
Cass tremeu da cabeça aos pés. Encolheu-se mais debaixo dos lençóis.
— Tudo bem.
Ele a beijou na boca longamente e depois, com os sapatos nas mãos, saiu do quarto. Minutos depois,
Cass ouviu a porta da rua bater, e um enorme vazio a tomou de assalto. Pela primeira vez passara uma
noite ao lado de um homem. E por ironia, ainda que ele fosse o homem de sua vida, continuava virgem.
Suspirou, sem saber se de alívio ou desapontamento. Ou ambos.
Cassidy não teria aceito o convite do pai, para almoçar, se soubesse que William também iria. Havia dias
que procurava evitar-lhe a companhia.
O semblante carregado do irmão evidenciava qual a opinião dele a seu respeito. Não que fizesse alguma
diferença para Cass, mas preferia evitar aborrecimentos para ambos.
O pai morava num apartamento dúplex, que, para desespero de William, estava em péssimo estado. Che-
gando lá, Cassidy logo adivinhou que fora dele a ideia daquela reunião familiar. Mal cumprimentara o pai, pôde
ver, da janela da sala, o belo carro de William estacionando.
Pegou a bolsa e, irritada, dirigiu-se ao velho Penno:
— Então é isso, hein? Saiba que estou indo embora.
AlvinPennoolhou-ae,comseujeitoúnico,argumentou:
— Deixe disso, filha. — E, virando os hambúrgueres na chapa do fogão, disse: — Reconheço que William
é um pouco rígido, mas é seu irmão e só quer seu bem.
Cassidy balançou a cabeça com veemência.
— Sinceramente, não dou a mínima para o que ele tem a me dizer.
— Querida, Will está firmemente decidido. Além disso, como vai manobrar o seu carro com o
dele parado atrás?
A porta da cozinha se abriu, e William entrou, com o ar arrogante de sempre.
— Bem — dirigiu-se para Cassidy —, finalmente estamos frente a frente. E você vai ter que me
ouvir.
— Engano seu. Você não tem nada a ver com minha vida.
A guerra estava declarada. William despejou sobre Cassy toda sorte de argumentos contra Paul e,
para culminar, responsabilizou-a caso fosse demitido da Barclay.
Cass não estava disposta a ceder. Se sua relação com Paul o incomodava tanto, certamente o
motivo nada tinha a ver com amor fraterno.
A hostilidade com que Will a vinha tratando desde o início assumiu contornos violentos.
— Ele é praticamente noivo!
— Praticamente. Você mesmo está dizendo.
— Todos sabem que Paul tem de se casar com Bettina.
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Entre tanta coisa desagradável, finalmente uma frase enchia Cass de alegria.
— Mesmo que seja verdade, nada impede que eles se casem.
— Exatamente.
— Então qual é a sua aflição? Evidente que não tem nada a ver com a minha tristeza. —
Melancólica e amarga, ironizou: — Relaxe, irmãòzinho. Seu plano vai dar certo. Paul e Bettina ficarão
juntos. — Viu que a palidez tomou conta do rosto de William. Era como se ele tivesse visto um
fantasma. A expressão aterrorizada despertou em Cassidy uma suspeita terrível: — Céus! Você está
atolado nisso até o pescoço,
não está? Você e Bettina... juntos!!!
A culpa de William estava expressa nas mãos que se contorciam, no canto da boca trémula, nos olhos.
Tudo nele o denunciava. Vacilante, mal conseguiu dizer:
— Não... não sei do que está falando... Tudo o que fiz foi... para o bem de todos.
Cassidy ficou imóvel, estarrecida, como se não o conhecesse. A figura patética à sua frente não podia
ser seu irmão, mas era. Apavorado, covarde, à espera da catástrofe iminente, William sempre vivera
assim, acuado pela própria existência.
Já não era raiva, mas um profundo pesar que a dominava. Soou estranho ouvir a própria voz,
muito mais fria que o habitual, dizer:
— Se o que o preocupa é perder o emprego por minha causa, sossegue, não importa quanto esteja
metido nas armações de Bettina.
William Penno, que havia poucos minutos rugia feito um leão, ameaçador e prepotente, agora decaíra.
Tornara-se servil e medroso. Seus olhos azuis pareciam de vidro, opacos e vazios.
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  • 1. Título: Prelúdio de amor Autor: Arlene James Título original: A bride to honor Dados da Edição: Editora Nova Cultural 1999 Publicação original: 1998 Gênero: Romance contemporâneo Digitalização e correção: Nina Estado da Obra: Corrigida O que era mais importante para aquele homem? Ele era um homem possuidor de uma fortuna e prestígio invejáveis, mas não havia quantia de * dinheiro capaz de dispensar Paul Spencer de um iminente casamento de conveniência. Seu avô lhe deixara pouca escolha: desposar uma mulher que ele desprezava ou perder os negócios da família. E, com Paul, a família sempre vinha em primeiro lugar. Até ele pôr os olhos na bela e inocente Cassidy. A partir daquele momento, ele já não sabia o que vinha primeiro: seu desejo de agradar à família ou de ter Cassidy nos braços!
  • 2. CAPITULO I — Eu sei que é importante — disse Cassidy, endireitando a peruca vermelha —, mas estamos perto do Haloween, e você sabe que esta é a época do ano mais movimentada para mim. William, incomodado com a teimosia da irmã, respirou fundo, pensou e, enquanto ajeitava sua gravata de seda, disse: — Vou lhe contar por que preciso tanto desse favor. Vendo-o tão aflito, Cassidy pensou que, se continuasse levando tudo tão a sério, William acabaria tendo um ataque cardíaco antes dos quarenta anos. — Que tal esta? E bem baratinha. Nada o irritava mais que encontrar sua irmã vestida com uma das fantasias da loja. Era quase impossível conversar com ela vestida de boneca. Puxando-a pelo braço, William insistiu: — E o meu chefe, Cass! Ele está desesperado. E recomendei você, pessoalmente. Por piedade, não me deixe encrencado! Pobre William, sempre em sobressalto, com medo de que a própria família o deixasse embaraçado... Tudo bem, talvez seus parentes fossem um tanto excêntricos, mas sempre se comportavam bem. Ou quase sempre. Ela sorriu, conciliadora, esquecendo-se completamente do rosto pintado de branco, dos cílios imensos e da boca com formato de coração. — Prometo, querido irmão, que o sr. Paul Barclay Spencer receberá um tratamento de rei. E prometo que encontrarei para ele um traje que impressionará Betty. Palavra de honra de irmã. William ficou apenas um pouco mais tranquilo. — O nome correto é Bettina — frisou. — Bettina Lincoln. E, se tudo correr bem, ela será a sra. Paul Spencer até a primavera. — E o sr. Spencer terá salvo os negócios da família — Cassidy disse, para provar que tinha prestado atenção nas palavras do irmão. — E dará esse crédito a você. — Sim, se você não arruinar tudo. Agora, seria pedir demais que você tirasse essa roupa ridícula antes que ele chegue? Cassidy fez que sim. Arrancou a enorme peruca e, contrita, jurou: — Vou abandonar meu traje de Raggedy Ann e trocá-lo por roupas adequadas para receber seu patrão. Mais: encontrarei algo para ele usar e conquistar o coração, e tudo o mais, da glamourosa, fantástica srta. Lincoln. Satisfeito? William empertigou-se, alisou as dobras do terno italiano impecável e, assentindo, recomendou: — Só para lembrar: estou contando com você. O sorriso de Cassidy foi bastante encorajador. Ele lançou-lhe um olhar de aprovação. Mas a alegria de Cass se foi quando percebeu que, ao sair, William contemplou com desprezo tudo à sua volta. Sinceramente, ela não sabia qual o problema em ser figurinista. Figurinistas, por definição, desenham, costuram e, se tiverem sorte, montam suas próprias lojas e fazem tudo dentro delas, o que inclui usar as próprias criações. Mesmo que sejam fantasias. Quem usaria roupas que nem o próprio figurinista usa? Mas William não era capaz de entender isso. Aliás, não percebia nada a não ser o próprio mundinho. Ainda assim, reíletiu Cass, a família Penno era uma cruz para o pobre William carregar, e ela não queria aumentar esse peso. O irmão não entendera nada quando, um ano antes, os pais resolveram pedir divórcio. Alvin e Anna Penno eram incompatíveis, e depois de trinta e cinco anos isso ficou ainda pior. Cassidy sempre percebera esse detalhe, mas William não. Era impossível, para ele, admitir que os pais, depois de separados, haviam conhecido a felicidade... e que nada disso tinha a ver com os filhos. Cass supunha que a aproximação dele com o clã Barclay Spencer era parte do problema. Naquela família, os negócios vinham em primeiro lugar. Como seria fazer parte de um grupo assim? Para William, que os admirava e invejava, devia ser maravilhoso. E certamente fora isso que Paul Spencer, presidente e principal responsável pelo sucesso das Panificadoras Barclay, pensara ao ficar noivo de sua sobrinha de criação. Principalmente depois que ela recebera algumas cotas da companhia, herdadas de Chester Barclay, avô de Paul. O casamento manteria os negócios na família. Ela não conseguia entender por que a "adorável e sofisticada" Bettina, como dizia William, estava tão relutante em se casar com o primo, Paul. Especialmente considerando que ele havia rompido um tórrido caso por causa do testamento, poucos meses antes. Cassidy imaginara que Bettina apostaria tudo naquele casamento. Mas talvez estivesse errada.
  • 3. Pondo os problemas dos Barclay de lado, chamou Tony, que estava do outro lado do novo mostruário, o 'Noites na Arábia". Ele saiu do que agora era o picadeiro de um circo, um dos quatro show- room de que a loja dispunha. — Chamou, chériel — perguntou com sotaque fran cês carregado. Era seu dia de Maurice Chevalier. Um dia antes, fora Clark Gable. Ele tinha convicção de que em breve, terminando a faculdade, seria um astro. Deixaria Dai-las e iria para Los Angeles ou Nova York. Não decidira ainda se preferia o cinema ou o teatro. Aos vinte e cinco anos, os sonhos com o estrelato de Cassy tinham sido trocados por uma carreira satisfatória como figurinista. Sentia-se décadas mais velha que seu assistente, Tony Abatto, de vinte anos. — Vou me trocar. Tome conta da loja. Estou esperando um cliente. — Oui, mademoiselle. Com minha vida guardarei todos os seus sonhos, amour... — Melhor expressar seu amour de outra maneira ou perderá o emprego — disse ela, olhando para a confusão que havia no chão. — Raggedy Ann, essa linda boneca não está agradando mais? — Tony perguntou. — E a meu irmão que não agrada — respondeu ela, imaginando as caretas que Tony faria às suas costas. Para ele, William não passava de um "filisteu". E, mesmo que essa também fosse a opinião dela, não suportava que ninguém falasse nada sobre o irmão. Antes de fechar a cortina do provador, gritou: — Comece a separar as araras! — De que vai precisar? — Oh, nada além do usual para homens. O tipo másculo de sempre. — Um Drácula-lutador-piloto-pirata saindo... Cassidy suspirou, resignada. Tinha uma fantasia de Peter Cabeça de Abóbora perfeita para ser usada numa festa antes do Dia das Bruxas. Mas certamente o chefe de William não seria capaz de vestir algo tão original. Por outro lado, todos os Dráculas, soldados ou piratas disponíveis já haviam sido reservados. O que quer que Paul Barclay escolhesse para fantasia, o resultado seria o mesmo: ela teria de sentar na máquina novamente e costurar. Logo agora, que pensava estar livre do atropelo... Bem, podia dormir na última semana de novembro, se vivesse até lá. Deu uma última olhadela no traje de boneca de pano, que chamara de Raggedy Ann. Era quase um símbolo, com suas tranças vermelhas e a roupa azul e branca. Começou tirando o avental e o vestido, depois as meias coloridas e o sapato. Uma calça jeans e o suéter cor de mostarda sobre a camiseta, os cabelos castanho-dourados presos num elástico, e lá estava Cassidy ao natural, mas com o rosto ainda maquiado. A fantasia de boneca Raggedy Ann foi devolvida à arara a contragosto, e só depois Cass voltou à loja. Para ela, a sessão de maquiagem era sua hora favorita. Isso porque lá estavam muitos dos objetos que pertenceram à barbearia de seu avô. A começar pela esponja grande de talco. Sentada na imensa cadeira de couro verde, onde tantas vezes vira o avô trabalhar, começou a tirar a pintura. Com a ponta dos dedos espalhou o creme de limpeza, e seu rosto se transformou numa massa cinza-avermelhada. Um leve movimento pelo espelho e Cassidy percebeu que não estava só na sala. — Maurice! — esbravejou. — Um cliente quer vê-la, chérie. Era ele, o patrão de William. Sem dúvida, bastante atraente. Os cabelos eram escuros e o corte, clássico. Os olhos azuis eram emoldurados por cílios longos e castanhos, e ela podia apostar que tinha a barba escura, pela sombra que percebia naquela região do rosto. Tinha uma covinha no queixo e duas no rosto, quando sorria. Estendeu a mão longa e bem-feita para Cassy. — Cassidy Penno, presumo. Num gesto mecânico, ela correspondeu ao cumprimento. — Sim. — Paul Spencer. Embaraçada, Cass pegou a toalha e tentou limpar o rosto. — Desculpe-me, sr. Spencer. Estava vestida de Raggedy Ann quando meu irmão avisou-me que viria. Achei que teria tempo de tirar a maquiagem, mas Tony provavelmente quis me envergonhar. Ele não
  • 4. suporta William, e... William não entende por que não o despeço. — E? — Tirando a toalha das mãos de Cassy, Paul passou a esfregar-lhe o rosto, energicamente. —Estava me explicando por que não despede o rapaz. — É preciso ter certas habilidades para trabalhar num lugar como este. — Mesmo? — A limpeza estava quase completa. Compenetrado, Paul Spencer usava lenços umedecidos para finalizar a tarefa de devolver à jovem suas próprias feições. — Que tipo de habilidades são essas? Incomodada com o olhar fixo em seu rosto, Cassidy virou-se para o espelho e, de posse de um tónico adstrígente, fez menção de dispensar o auxílio de Paul Spencer. — Alguém que ame o teatro — respondeu. — Geralmente atores. Alguém que goste de se fantasiar. Alguém que trabalhe por pouco dinheiro. Pelo espelho, podia ver o rosto de Paul, e aquele jeito meio irónico a punha nervosa. William a mataria se soubesse o que tinha acontecido ali. Mais uma vez o coitado fora traído pela própria família... Com as faces limpas mas com a dignidade arranhada, Cassidy soltou os cabelos, que caíram em ondas sobre seus ombros. Virando-se, encarou o sr. Spencer. — Ficaria muito grata se o senhor não mencionasse este episódio para William. Ele é um irmão maravilhoso, mas... — Empertigado — emendou Paul Spencer. — Sem senso de humor. Pernóstico. A reação de Cassidy foi de puro terror aos adjetivos usados por Paul para descrever seu irmão. Não esperava nem em sonhos ouvir isso. Spencer caiu na risada com o olhar horrorizado da jovem. — Relaxe, srta. Penno. Tenho seu irmão na mais alta conta. Ele não só é um brilhante executivo como também um dos mais proeminentes membros da sociedade. Só que leva a vida e a si mesmo muito a sério. — E, fazendo um gesto como se fechasse a própria boca a zíper, concluiu: — William não ouvirá uma palavra sobre você me receber fantasiada de monstro. — Não fiz isso! — Claro que não — concordou ele, rindo. — Estava brincando. — Oh! O riso deixava à mostra dentes lindos e brancos. Num passe de mágica, Cassy foi contaminada pelo bom humor daquele homem, e soube que não apenas podia confiar nele como que essa confiança era mútua. Mais descontraída, riu. — Desculpe-me. Eu devia estar medonha. — Digamos que eu jamais iria imaginar que havia um rosto tão bonito debaixo daquela tinta toda — gracejou ele. Antes de ficar feliz com o elogio, Cassy lembrou-se de que podia ser mais uma das gozações de Paul. — Você, hein? Na minha profissão, é bom ter um rosto comum como o meu. Funciona como uma tela em branco para um pintor: aceita tudo. — Quem disse que seu rosto é comum? William? — Não, claro que não. — Você tem uma beleza clássica, de traços finos e delicados — insistiu Paul, deslizando o dedo sobre sua testa, descendo pela curva do nariz, atravessando a curva dos lábios até encontrar o queixo. Cassidy estava hipnotizada. Nunca ouvira de ninguém que era bonita. Estava quase acreditando no que ele dizia quando a realidade a chamou de volta. Saindo do transe, Cass balançou a cabeça e indicou a saída para a outra sala. O momento mágico se fqra. — Vamos ver as roupas? — A arara estava ali perto, e ela rezou para que Tony tivesse tido bom senso na escolha dos trajes. Puxou um banquinho e, com ar solene, começou: — Se quiser se sentar, sr. Spencer, eu lhe mostrarei alguns dos nossos trajes masculinos mais populares. — Paul. Eu prefiro que me chame assim. "Isso não vai dar certo", pensou Cassidy. Limitou-se a sorrir e avançou para a primeira fantasia. — Esta é a mais requisitada nessa época do ano. Conde Drácula. Paul ergueu uma das sobrancelhas. , — Muito dramático. Num floreio, Cassy devolveu-a ao cabide e trouxe outra: — Que tal um pirata? Corsários são românticos e agradam às moças. Completa, com
  • 5. papagaio, espada e até um brinco. — Não tenho orelha furada. — Talvez um piloto de guerra... O general Patton? — Negativas sucessivas a fizeram enumerar: — Nem mesmo um soldado da Guerra Civil? Rebeldes? Ianques? — Sinto. Não faço o género militar. Especialmente da Guerra Civil. Quero expandir nossos negócios para o Sul. — Nem índios ou ciganos, suponho. Hum... Rodolfo Valentino? O imperador da China? — brincou ela. — Nem Fidel Castro ou Stalin, caso tenha-os em mente. Uma ideia iluminou o rosto de Cassy. De repente, era como se tivesse achado a inspiração. — Stalin, Rússia... Céus! Lembra-se de um filme antigo, em que Tony Curtis fazia o papel de um cossaco? Yul Brynner era o pai dele, e havia cavalos e mais cavalos... — Taras Bulhai — exclamou Paul, entusiasmado. — Claro que me lembro! O personagem de Tony Curtis não morre no final? — E a mocinha fica a seu lado. — É isso! — Pela primeira vez algo o animava. — Deixe-me ver a roupa. Cassidy se deu conta que só na sua imaginação havia algo assim. — Na verdade, não a tenho. Mas posso fazer para você. — Seria então um traje exclusivo, só para mim? Ela relaxou e sorriu, mesmo sabendo que não teria tempo para mais nada, pois era preciso desenhar, procurar os materiais adequados e costurar. Suspirando, lembrou-se de que faria aquilo por William e resignou-se. — Exatamente. — Fantástico! — Paul parecia ter achado o que que ria. — Como começamos? — Pesquisando. — Pesquisa? Otimo! Onde procuro? Quero dizer, qual é a época? Ela piscou duas vezes, sem entender o que ele queria dizer. —Esse é o meu trabalho. Não é necessário que faça nada. — Bem, e quem me garante que você não vai errar? Num muxoxo, Cassy concordou. — Bem lembrado. Paul caiu na risada. — Confio em você, mas sou muito purista, sabe? E quero saber do que estarei vestido, caso me perguntem. Cassy estava antevendo como seria a tarefa, cheia de palpites e de interferências... Teria o dobro do trabalho. Mas a essa altura não havia muita escolha. — Já entendi. Quando quer ver os desenhos? No final da semana? — Quinta-feira? Sexta é péssimo para mim. — Certo. Fim da tarde? Pensando um pouco, Paul respondeu: — Não quero prendê-la até tarde. Venho na hora do almoço. A que horas Tony almoça? — Uma hora está ótimo. — Trago algo para comermos aqui. Ainda bem que você não tem problemas com excesso de peso... — E, olhando para o relógio: — Tenho de ir. Quinta, à uma. Adorei conversar com você. E correu porta afora, deixando-a sozinha, com o coração disparado. Cassy tinha um almoço marcado com Paul Spencer Barclay. E estava deslumbrada. Só quando se acomodou atrás do volante de seu Jaguar preto foi que Paul Spencer se deu conta de que devia estar fora de si ao insistir tanto em almoçar com Cassidy Penno. Era linda, solteira, adorável. Uma companhia divertida e inteligente. Não que essas qualidades pudessem mudar o fato de que ele estava praticamente noivo de Bettina. Praticamente, e isso não era muito agradável. Estava resolvido que ela seria sua esposa. Era a única coisa a fazer, considerando que seu avô havia deixado trinta por cento das ações das empresas Barclay para Bettina, a mesma porcentagem que coubera a ele. Paul possuía, porém, outros dez por cento das cotas. O restante estava dividido entre os outros membros da família. Seu tio Cari, e a mãe de Bettina, Jewel, possuíam dez por cento. Seu tio John, solteirão convicto,
  • 6. outros dez por cento. Mais dez por cento estavam com a viúva de um tio falecido, Mary, e sua filha, Joyce, agora chamada sra. Joyce Spencer Thomas. Ninguém de fora da família jamais pusera as mãos no património desde que seu bisavô fundara as Empresas Panificadoras Barclay. Costumeiramente, os parentes dividiam os bens entre seus filhos, ao atingir certa idade. No entanto, isso não acontecera com os Barclay. O bisavô e o avô de Paul haviam reservado para si a maioria das ações. Quase todos os membros da família abriam mão de um envolvimento mais direto com os negócios. Sentiam-se gratos por não precisar preocupar-se com detalhes como de onde vinha o dinheiro que lhes enchia os bolsos regiamente. Paul fora uma exceção. Possuía um talento especial para os negócios e vontade de exercer essa vocação. Aos poucos foi galgando os degraus da diretoria e assumiu a presidência quando o avô se aposentou. Chegou a cogitar a possibilidade de herdar a maior parte das ações, e assim ser o único acionista capaz de dirigir as empresas. Não apenas ele, como a família esperava que isso viesse a acontecer, uma vez que todos confiavam nele para continuar a encher seus bolsos com altas quantias. Fora então que seu velho avô lhe pregara uma peça. Na verdade, parte da culpa cabia ao próprio Paul. Sempre soubera que seu estado civil não agradava ao avô. Aos trinta e nove anos, a maioria dos homens já se casara ao menos uma vez. Mas não ele. Ainda não encontrara a mulher certa. Talvez ela nem existisse. Não que soubesse descrevê-la, mas tinha certeza de que nenhuma das conhecidas preenchia os requisitos. Nenhuma lhe despertara interesse. Não até encontrar Bettina. Jamais deveria ter se deixado seduzir por ela. Por outro lado, que homem são poderia resistir a uma belíssima mulher, que invade um escritório vestida apenas com uma capa de chuva, meias de seda, ligas e saltos altos? Não, não era tão grave sucumbir a essa tentação, mesmo sabendo que muito daquilo fora obra de cirurgiões plásticos. Seu grande erro fora declarar que fizera tudo por pura distração, e que era perda de tempo esperar algo além disso. Em pouco tempo, o que era diversão virou um pesadelo. Quando percebeu que Bettina poria as coisas em outra perspectiva para a família, Paul tentou terminar com aquilo. Na frente dele, Bettina encarou o rompimento com naturalidade. Mas a versão que apresentou à família foi outra. No papel de vítima abandonada pelo primo, chorou meses e conseguiu que todos virassem as costas a Paul. Além disso, a família começou a considerar que um enlace entre ambos seria perfeito, ideal. Bettina tinha doze anos quando tio Cari se casara com sua mãe. Dezesseis anos depois, tornara-se querida, parte da família, até porque Cari não tivera filhos biológicos. O casamento entre eles faria de Bettina uma legítima Spencer Barclay. Na superfície, uma mulher perfeita, adorável, sofisticada, companheira, divertida... Porém, só superficialmente. Sob aquele verniz se escondia um poço de ambicão, de inteligência fria e calculista. Era dissimulada a ponto de enganar a todos, àté, e principalmente, os mais próximos. Só a prima Joyce enxergava um pouco da verdade. Mas de que isso adiantaria? Bem casada com o responsável pela produção da fábrica, a padaria pro- priamente dita, Joyce só pensava em ter o primeiro filho. Se, em vez de ter bancado o cavalheiro, Paul tivesse contado ao avô, em detalhes, tudo o que acontecera entre ele e Bettina, certamente não estaria naquela situação. Não havia escolha. A família dependia dele. E Bettina usaria as ações que herdara da pior forma possível. Paul passara meses procurando uma saída legal para que os negócios não fossem afetados por ela, mas finalmente se rendera às evidências. Nada poderia fazer, a não ser casar-se com a prima. Em especial porque aquele era um momento delicado. Os pães Barclay iriam ser distribuídos em todo o país, e o sucesso dessa estratégia dependia de uma posição sólida e confiável da empresa. Isso faria a diferença entre a fortuna ou a bancarrota. Como acionista, Bettina começara a fazer uma série de exigências ridículas, e exorbitantemente caras. Fora então que ele a pedira em casamento. O momento da vingança chegara. E não bastava isso. Ela queria a revanche por tudo o que passara. Daria uma chance a Paul, desde que ele se humilhasse perante toda a família e a sociedade. Esse baile a fantasia era para isso. Se algo a desagradasse, no dia seguinte sua reputação estaria arrasada. A própria Bettina teria o maior prazer em fazer isso.
  • 7. Bem, se era esse o jogo, ele, Paul, também tinha seus truques. E aí entrava Cassidy Penno. Mas não ia estragar, com essas considerações sobre negócios, um encontro com Cassidy. Tinha de parar de olhar para ela com tanto interesse. Essa era a pior hora para se interessar por uma mulher. Teria o cuidado de explicar a situação para Cassidy, em detalhes. Tinham potencial para transformar aquele trabalho no começo de uma amizade agradável. Se fosse o caso, poderiam usufruir da companhia um do outro, sem que isso afetasse a intimidade de ambos. Ou seja, sem envolvimento sentimental. Poderiam ser amigos. Por que não? Almoçar com ela seria apenas um divertimento, nada além disso. E ele poderia providenciar um cardápio que traduzisse essa intenção. Planejar esse almoço o deixou animado. Homens prestes a se comprometer merecem um pouco de diversão. Até homens casados fazem isso. Especialmente se a esposa for Bettina Lincoln. Uma coisa, porém, preocupava-o, e cada vez mais. Temia não conseguir separar a obrigação da diversão. Ou o possível do desejável. CAPITULO II Cassidy bufava enquanto os garçons iam e vinham dentro da loja. Sua mesa de trabalho estava coberta de linho adamascado. Preocupada, mas também excitada, ela assistia a tudo. Almoço, Paul dissera. Mas aquilo era um banquete: salada de frutas, pães crocantes, queijo brie, carne à Borgonha e, para acompanhar, um saborosíssimo vinho francês. Na sobremesa, chocolate e creme. E tudo servido por um garçom vestido de maneira impecável. Cassidy sorria de prazer ao ver os pratos dispostos em fila sobre um aparador improvisado. Os rechauds, que mantinham a comida quente, eram de prata. Por que Paul Spencer agia assim? Ela não passava da irmã de um de seus funcionários, mas recebia tratamento de rainha. O comportamento de Paul era o de quem corteja uma mulher. Sua primeira preocupação foi com William. O que o irmão diria? Esqueceu o assunto quando Paul Spencer entrou na sala. Ele falava ao telefone celular, mas sorriu, desculpando-se pela indelicadeza. Fez questão de que Cassy ouvisse o teor da conversa com sua secretária. — Certo, Gladys. Entendi. Vou desligar. Não, não voltarei à tarde. Anote os recados. Guardou o telefone no bolso do paletó e observou Cassy. Ao vê-la ali, em meio a toda aquela pompa, seu rosto se iluminou. Deu-se conta de que também ela sentia um imenso prazer por estarem juntos de novo. Mas sua parte racional insistia em lembrá-lo de que era um empresário poderoso, que contratara os serviços de uma profissional. E que ela o atendia por causa do pedido de William. — Você não devia ter tido todo esse incómodo. — Incómodo nenhum. — Ele inspecionou as travessas de comida. — Hum... Parece ótimo! O garçom sorriu, satisfeito, enquanto afastava a cadeira para Cassy. Sem perceber, ao sentar, ela bateu no pé da mesa, fazendo voar para longe os talheres da salada. Morrendo de vergonha, assistiu ao garçom recolhê-los. Paul conteve o riso. — Achei que fosse encontrá-ía fantasiada de salada, ou algo assim... Cassy ficou ainda mais vermelha. — Oh, eu não faria isso. — Ouvindo-o rir, sentiu-se mais à vontade para dizer: — Na verdade, nunca ouvi falar de uma fantasia própria para almoços. — Pode ser uma boa ideia para sua próxima coleção. — O jeito cómico e sério de Paul ao dizer esse tipo de coisa era hilariante. Cassy logo começou a rir. — Agora está melhor. — Com os cotovelos sobre a mesa, ele se aproximou de Cass. O garçom os servia com elegância. E uma súbita timidez tomou conta de Cassidy. Sentia que Paul a cortejava. Mesmo que repetisse para si mesma um sem-número de vezes que aquilo era apenas produto de sua imaginação, que ele estava noivo, não conseguia relaxar. — Quer ver meus esboços? — Estou faminto. No momento, só quero comer. E olhar para você. — Ah... Completamente sem jeito, Cassy não sabia onde pôr as mãos, ou para onde olhar. Levou alguns segundos até conseguir se concentrar na salada de frutas, que continuava intocada. — Está tendo dificuldades com os esboços? — Paul perguntou entre uma garfada e outra. Esse assunto a fascinava. Abandonando de novo os talheres, Cassy sorriu:
  • 8. — Não, de jeito nenhum. E muito fácil imaginar você fantasiado. — E isso é bom? Como explicar-lhe como era fácil fitá-lo e vê-lo usando roupas de cossaco? Durante a pesquisa, ela fechara os olhos e soubera exatamente o que desenhar. — Sim, é muito bom. Quando crio uma roupa, penso num personagem para dar vida à fantasia. Na maioria das vezes não há nada em comum entre o que eu imaginei e a realidade de quem vai usar o traje. No seu caso, isso não acontece. Você é o personagem. — Então acha que serei capaz de dar vida a seu talento? — De certa maneira, sim. O que ela queria dizer era que, ultimamente, Paul Spencer era sua única fonte de inspiração. — Se você diz, eu acredito. — Paul estava grato a William por ter lhe falado de Cassidy, e gostaria de poder estar à altura do talento da moça. Tudo o que emanava de Cass era tão doce e suave que ele não sabia mais o que dizer para expressar seus sentimentos. — Por que você me faz tão bem à alma? — Eu? Os olhos e sorrisos eram mais eloquentes do que qualquer palavra. Cassy nunca tivera um almoço tão maravilhoso. Disse isso a Paul. — Eu quis que fosse especial — confessou ele, olhando-a no fundo dos olhos. E, se Tony não tivesse interrompido o enlevo, entrando estabanado com sua caracterização de Charlie Chaplin, Paul a teria beijado. Foi isso que Cassy pensou, muito embora uma mesa os separasse. Uma mesa pequena, bem dito. O garçom já tinha sumido com os pratos do almoço, e tudo estaria perfeito se Tony não fosse tão irritantemente inoportuno. — Telefone para o sr. Spencer. A doçura dos olhos de Paul desapareceu imediatamente, dando lugar à irritação e ao desapontamento. Por fim, resignado, perguntou: — Quem é? — Não perguntei. Mas a voz é de mulher. A tensão ficou evidente na expressão carregada de Paul. Com gentileza, dirigiu-se a Cassy, já em pé: — Sinto muito, mas é melhor ver de que se trata. — Fique à vontade. Tony lhe mostrará o caminho. Paul seguiu o assistente com evidente mau humor. Fazer o quê? Cassy sabia que os problemas dele não lhe diziam respeito. Estava ali apenas para fazer uma fantasia. Tendo isso em mente, dirigiu-se ao ateliê e juntou os esboços que fizera. Para sua surpresa, em curto espaço de tempo Paul reapareceu. Durante os minutos em que esteve com os croquis nas mãos, pouco ou nada se ouviu dele. Alguns murmúrios, mas nada que indicasse sua opinião. Por fim, colocou-os na mesa e perguntou: — Tem algum favorito? Cassidy estranhou a pergunta, mas foi sincera: — Este. — Apontou. Paul olhou de novo, deu alguns passos para trás, olhou melhor e assentiu. — Quando começamos? — Começamos? — Sim. Tenho de tirar as medidas, não é? — Tem, mas... Antes que ela pudesse ficar mais surpresa, Paul se adiantou: —Se pudermos trabalhar sábado, seria ótimo. Cassy costumava trabalhar só meio período aos sábados, mas sugeriu: — Sábado à tarde? — Excelente. Almoçamos de novo? — Oh, não! —• exclamou ela com veemência, assustada com os gastos daquela refeição. — Quero dizer, não é necessário. No máximo tomaremos um café. Ele sorriu de novo. — Certo. Vou providenciar. — Deixe-me fazê-lo, por favor. — Se insiste, tudo bem. Às três horas? — Ótimo. Quando chegar, terá de apertar, a campainha, pois fecho a loja ao meio-dia, no
  • 9. sábado. — Vamos estar a sós então? — Com certeza. Alívio e cumplicidade estamparam-se no rosto de Paul quando disse: — Até sábado, então. Cassidy se pegou sorrindo sozinha ao voltar para o ateliê. Fosse o que fosse, era mútuo o que sentiam. Então lhe ocorreu que deveria ter algo pronto quando ele voltasse, no sábado, e nem tinha se lembrado de tirar as medidas. Talvez não conseguisse fazer tudo em tão pouco tempo. Mas confiava em seu instinto. Mesmo com a agenda lotada, daria cabo da tarefa, e no fundo sabia que, quanto mais depressa terminasse o trabalho, mais depressa teria Paul Spencer fora de sua vida. O tempo frio, cinzento e chuvoso seria motivo mais que suficiente para fazer Paul ficar em casa e cancelar todos os compromissos, mas não aquele. Argumentou consigo mesmo que o encontro era profissionalmente importante, e que não iria à loja apenas para ver Cas-sidy. Mas não podia negar o desejo de ver aquela figurinista interessante, dona de um excelente senso de humor, gentil e... tímida. Era bonita de forma natural, sem artifícios, o que não deixava de ser engraçado para alguém com aquela profissão. Só mesmo isso para tirá-lo de casa num dia como aquele, pensou enquanto tocava a campainha. Flagrou-se, no reflexo da vitrine, a arrumar os cabelos em desalinho, preocupado com a aparência. "Negócios", pois sim... Rindo de si mesmo, ele balançou a cabeça, imaginando o que teria Cassidy Penno para fazer com que se comportasse como um adolescente apaixonado. Tocou a campainha novamente, e pareceu-lhe uma eternidade até ouvir a fechadura ranger e estar frente ao sorriso de Cassy. — Olá — disse ela enquanto fechava a porta e apanhava-lhe o casaco. — Oi. A loja estava às escuras, e somente os reflexos da luz vinda de fora iluminavam o lugar. O suéter amarelo de Cass tinha os punhos e o decote debruados em preto, realçando a pele clara do colo e o dourado dos cabelos. O jeans justo modelava-lhe as pernas. Os lábios realçados pelo batom de cor suave e o perfume, mistura de banho recém-tomado e um antigo Dior, magnetizaram Paul. Perturbado, ele acordou do transe ao ouvi-la perguntar com voz preocupada: — Algo errado? — Não. — Forçando um sorriso, Paul percebeu que suas mãos tremiam. — Acho que uma bebida quente me faria bem. Num volteio galante, Cassy sorriu e ofereceu-lhe o braço. — Por aqui, cavalheiro... Paul riu e obedeceu. A seu lado percorreu a loja deserta, rindo das peças que via no caminho até o ateliê. Um pouco daquela mulher estava em cada um dos ob-jetos. Ela dava um pouco de fantasia à realidade coti-diana, e Paul se deu conta de que a invejava por isso. Cassy havia posto a mesa do chá num dos cantos da sala. A toalha, linda, parecia um xale antigo de seda colorida. Além disso, havia guardanapos de linho rendados e colheres de prata antigas. As xícaras eram de fina porcelana chinesa. Um bule de cerâmica fumegava sobre um pequeno fogareiro de bronze. Para completar, leite, creme, açúcar e um lindo prato de cristal cheio de guloseimas. Era óbvio que ela tivera muito trabalho para fazer tudo aquilo, e só para agradá-lo. Muito mais bonito e valioso do que o almoço encomendado por ele. E sem dúvida, muito, muito mais comovente, por ter o carinho das mãos e do coração em cada detalhe. — Está maravilhoso. Cass ficou ruborizada. — Obrigada. Sorveram o café, saboreando os bolos e as tortinhas diminutas, cheias de cremes e frutas. Tão cheias que Paul lambuzou-se ao provar uma delas. E, quanto mais ria, mais o creme escorria. Cassy tentou socorrê- lo com um guardanapo, mas as gargalhadas impediram-na de ser eficiente. — Isso, srta. Penno, é uma demonstração de como os meninos brincam... — disse ele, espalhando creme no nariz de Cassy e colocando-lhe na boca um pedacinho de doce. Ela ria tanto que nem percebeu quando Paul enlaçou-lhe a cintura. Só foi perceber o que estava acontecendo quando se viu abraçada por ele. Foi como se uma descarga elétrica os atingisse. Nesse instante, ao admirar os sensuais lábios femininos, Paul soube quanto a desejava. A boca entreaberta e o hálito doce eram convites a um beijo. O beijo que ele ansiava desde que a vira pela primeira vez.
  • 10. Esqueceu tudo para deslizar a ponta dos dedos naqueles lábios antes de tê-los nos seus, no mais doce beijo da sua vida. Cassy se rendeu à urgência da carícia, entregue ao momento. Mas aos poucos foi se afastando, e, com gestos precisos, limpou o rosto, evitando encará-lo. Ambos sabiam que era tolice começar algo sem futuro, e aquele beijo fora um erro. Para ambos. Isso estava escrito no olhar verde, intenso, de Cassidy. Paul sentiu-se péssimo. — Desculpe-me. — Tudo bem. — Não, não está tudo bem. Costumo ter mais bom senso. — Você deve ser se sentido acuado, só isso... — William contou-lhe algo? Cassy fez que sim. — Ele me disse que, se você não desposar uma certa moça, o testamento de seu avô o deixará sem muita coisa. — William se referia a Bettina — contou ele com amargura. — Bettina, a da festa a fantasia de Halloween — frisou Cassy. Apesar de tudo, Paul sorriu. O jeito como ela falava era suave e gentil, como um raio de sol no meio do temporal que viria a ser seu futuro com Bettina. No deserto que estava vivendo, Cassy era um oásis bem-vindo. Como virar as costas para a única coisa boa que lhe ocorria? Riram juntos, pelo puro prazer de rir. Paul esperou que ela terminasse seu café para dizer: — Vamos ao trabalho? — Ficou impressionado com a eficiência com que Cassy lhe tirou as medidas. — Você é mesmo boa nisso! — Faz parte do meu trabalho. Quando foi tirar as medidas do peito largo, Cassy soltou sem querer a fita métrica, e acabou encostando o corpo no dele. Petrificada, deixou a fita no chão e ficou imóvel. Paul não sabia o que estava acontecendo, mas resolveu confiar nela. Então Cass, como que acordando de um sonho, pegou a tira de plástico e pôs-se a medir, de joelhos, a altura da calça. Tomando-lhe as mãos, Paul abaixou-se, abraçando-a carinhosamente. Cassy abandonou a cabeça no colo protetor e deixou-se ficar assim por longo tempo. De olhos cerrados, ambos permaneceram quietos, num silêncio cheio de melancolia. Por fim, Paul beijou-a de leve na testa e disse: — Não tenho esse direito. Não há nada que eu possa fazer. Os negócios dependem desse casamento, e a minha família inteira depende disso. — Eu sei — assentiu Cassy num murmúrio quase inaudível. As mãos de Paul deslizaram pelas costas femininas. Apertados contra seu peito, os seios eram uma tentação. Fechando os olhos mais uma vez, Paul imaginou o corpo nu a seu lado. — Gostaria de tê-la conhecido há muito mais tempo. — Antes de Bettina, você quer dizer. — Ainda bem que você sabe de tudo — ele comentou, rindo com ar malandro. — Não sei se aguentaria a tentação de mentir para tê-la comigo. Um brilho de felicidade tornou ainda mais verdes os olhos de Cassidy. Brincando com a fita métrica, ela baixou a cabeça, meio tímida, ao dizer: — Talvez você nem me notasse. — Não diga isso. — Verdade. Sou do tipo de mulher que passa despercebida. Acariciando-lhe o pescoço e os ombros, Paul sentiu a pulsação acelerada. — Até mesmo para nosso amigo "Charlie Chaplin"? Ela fez uma careta e explicou: — Tony nunca se interessou por mim. Ele pensa que as virgens, como eu, são frustradas. Não se arrisca a chegar perto. Virgem! Paul quase teve um colapso. Nem se lembrava qual fora a última vez que ouvira falar nisso. Acostumado com a sofisticação das mulheres manipuladoras, quase fora cruel com a mais doce das criaturas. Talvez merecesse alguém como Bettina. Cassidy Penno merecia, com certeza, alguém livre para amá-la e cuidar dela como um tesouro. Com voz embargada, disse-lhe: — Prometa que vai se guardar para alguém melhor do que aquele impostorzinho. — Tony Abatto? Prefiro entrar para um convento. — Oh, não exagere.
  • 11. Com ar solene, Cassy levantou a mão. — Eu nem poderia. Não sou católica. Riram mais uma vez. Então Paul se levantou, pegou a fita métrica e, com ar sério, pediu: — Deixe que eu mesmo meço a calça. Cassy concordou. Limitou-se a anotar as medidas. — Não é preciso que venha aqui até o momento da prova. Não quero causar problemas desnecessários. — Esqueça. Quero vir. — Então, vou cortar o tecido na segunda-feira. E agora, fora daqui. Ambos temos mais o que fazer — brincou ela. — Segunda-feira, às seis, estarei aqui. E depois jantaremos. Já estou ansioso por isso. — Eu também. Bem, vou acompanhá-lo até a saída. — Está bem. A chuva cessara e um vento frio fazia a respiração sair em lufadas. Depois de fechar a porta, Cassidy disse um simples: — Obrigada. E saiu caminhando. Paul viu-a desaparecer na esquina e, respirando fundo o ar gelado, saboreou aqueles poucos instantes de liberdade. CAPITULO III Ansioso por rever Cassy, Paul foi pontualíssimo na segunda-feira. Antes de cortar a fantasia, Cassidy fez questão de que ele escolhesse os tecidos. Espalhados pelo ateliê, havia quatro combinações de cores e tramas com detalhadas explicações sobre como e onde seriam usados e davam uma ideia do resultado final. Paul olhou-os de relance e perguntou: — Qual você prefere? Cassy apontou para uma combinação de tons de terra, azul e vermelho queimado. Por poucos segundos Paul estudou a escolha antes de dizer: — Perfeito! Agora vamos jantar, estou faminto. — Você está sempre faminto? — Ultimamente, sim. — Todo o seu apetite fora despertado na última semana. — Vamos, pegue seu casaco. Foram a um lugar que mais parecia uma casa no-turna. Passava das seis e meia e já se ouvia uma banda de jazz animadíssima. Havia uma fila considerável para entrar. Segurando Cassy pela mão, Paul deu a volta no prédio, em direção à porta dos fundos, local reservado aos caminhões de bebidas. Um vozeirão os fez parar. — Spencer! Por que não avisou que vinha? — Um negro, de braços abertos e sorriso idem, os recebeu. — Achei que podia arriscar, mas pelo visto não adianta chegar cedo... Nunca vi tanta gente a essa hora. — Deixe comigo. Quem é a bela senhorita? Passando o braço pelos ombros de Cassy, Paul ficou feliz em apresentá-los: — Esta é minha amiga Cassidy Penno. Cass, este velho malandro é Hoot. — Amiga, hein? — Hoot comentou enquanto olhava para Cassidy. — Belo casaco. Gostei. — Obrigada. Ela sorriu, divertida com a figura grande e simpática. A roupa branca era de mestre-cuca, e nele fazia bela figura. — Bebem o quê? É por conta da casa — ofereceu Hoot. — Estou dirigindo. Nada para mim. — Não bebo muito, sr. Hoot — agradeceu Cassy. — Só Hoot, sem o "senhor". Menina, gostei de você. Vai tomar um drinque especial, com pouco álcool. Não aceito recusa. — Fico lisonjeada. — Vamos, sigam-me. Por cima do ombro, Hoot lançou um olhar de aprovação para Paul, sem que Cassy percebesse. O corredor
  • 12. levou-os à cozinha e a outros pequenos cómodos, até alcançar a porta do escritório de Hoot. Pequeno e confuso, o aposento tinha uma escrivaninha e um balcão como móveis principais. Um sofá de couro surrado e banquetas completavam o mobiliário. Nas paredes, fotos autografadas de grandes nomes do jazz. Cassy reconheceu a maior e mais bonita delas, Billie Holiday, a cantora negra que sua mãe lhe ensinara a amar desde pequena. — Cá estamos. Agora me contem... Como se conheceram? — Meu irmão trabalha para Paul. — Cassidy é minha figurinista. Caíram os três na risada, em alto e bom som. Hoot mostrou que sua curiosidade não tinha sido satisfeita com nenhuma das respostas. Paul pigarreou, mas Hoot foi mais rápido e sua língua afiada não poupou ninguém ao dizer: — Figurinista... Quer dizer que agora fantasia se chama figurino? Então Bettina pegou você com essa história de baile à fantasia... — Tenho saída? Hoot juntou as mãos em sinal de contrição, e com deboche comentou: — Coitadinho dele! — Acho que vi seu nome na lista de convidados, se não me falha a memória... — revidou Paul. — Já tem fantasia, Hoot? — indagou Cassy. — Claro, não está vendo? Vou de mestre-cuca. — Espertinho... — Já tem o chapéu? E seria bom uma grande panela ou frigideira para dar um toque extra. — Grande ideia! Quanto ao chapéu, não tenho, mas posso comprar. — Por que não aluga? Terei prazer em fornecer tudo por cinco dólares: chapéu, frigideira e maquiagem. — Otimo negócio. Fechado, senhorita. — E, olhando para Paul: — Essa moça é um doce. Bem melhor do que a enjoada Bettina. — Acho que não vamos ficar para o jantar — disse Paul, com azedume. — Deixe de besteira, meu amigo. Terão a melhor mesa da casa, ou não me chamo Hoot. Olhe, garota, a família desse rapaz é formada por um bando de sanguessugas, se quer saber. — Hoot... Mas o protesto de Paul não adiantou de nada. Hoot estava disposto a tornar pública sua opinião sobre os Barclay. — Há muito tempo houve uma luta entre eles para decidir quais seriam os novos rumos dos negócios da família. Como nenhum deles parecesse capaz de tocar a empresa, pegaram nosso amigo aqui para o sacrifício. — Sacrifício? — Não é bem essa a verdade. O que aconteceu foi que decidi tomar a frente dos negócios para defender meus interesses. Ninguém me obrigou a nada. Ao contrário. — Sacrifício, sim, foi o que eu quis dizer — afirmou Hoot. — Os negócios vão bem porque você se mata de trabalhar. Enquanto isso, os outros membros da família vivem como nababos, à custa do seu esforço. Para Paul ficam as dores de cabeça, e para eles vão os cheques polpudos. — Mas tenho liberdade total na empresa. — É assim que vê as coisas? Para mim você está de mãos atadas. — E olhando para Cassidy: — Abandonaram-no sozinho e fazem de conta que não percebem o que está acontecendo. Esse casamento é pior, para meu amigo aqui, do que o cadafalso. — Hoot! — censurou Paul. — Está bem, a moça em questão é uma dama... — irónico, Hoot corrigiu. — Chega de sermão. Estou faminto e não pretendo arruinar minha noite com essa conversa. Posso jantar aqui ou não? — Por favor... E não se esqueça de meu chapéu, senhorita. Mande-o por Paul. E pode cobrar dele também. Cassidy riu, divertida, enquanto era conduzida para o salão. No meio do caminho, Paul tomou uma atitude inesperada: empurrou-a contra a parede e tomou seu rosto nas mãos. Foi tudo muito rápido, mas mesmo assim Cassy sabia o que ia acontecer. Não ofereceu resistência ao longo e ardente beijo. Um sorriso bailava no semblante feminino. Trazendo-a para mais perto, num abraço doce, Paul sussurrou em seu ouvido:
  • 13. — Por que me deixou fazer isso? — Não pude evitar. "Eu também não", Paul pensou, fechando os olhos. Era injusto de sua parte. Era injusto para ambos. Mas ao abrir os olhos e ver um sorriso brilhante naquele rosto lindo, sua respiração ficou suspensa. Uma sensação incomparável de perda, desespero e impotência o dominou. Em silêncio, tomou-a pela mão, e juntos entraram no salão cheio de gente. Risadas se misturavam ao som de um piano. Por entre as muitas mesas, Paul se esgueirava, levando Cassy. Num canto privilegiado havia três mesas vazias. Ele pendurou os casacos e a bolsa de Cassy e puxou a cadeira para que ela se sentasse. Flores e velas deixavam o ambiente ainda mais agradável. — E então, gostou? — Muito. Este lugar é incrível. Seu amigo também. — Esta mesa é reservada para os convidados. Quem senta aqui come o que ele mandar. É autoritário até nisso. Cassy batia os pés no chão, ao compasso da música, deslumbrada com tudo. Nem percebeu que a garçonete se aproximara e falava com Paul. Mas teve que prestar atenção no copo colorido que foi colocado à sua frente. — O sr. Hoot já fez os pedidos para vocês. O drinque é uma das criações dele. Espero que goste. — E, olhando para Paul: — Faça-nos um favor: assuma o piano enquanto o jantar não vem. Ninguém aguenta mais esse moço. Paul riu alto e disse: — Por mim, tudo bem. — Mal a moça saiu, e Paul já estava de pé, puxando Cassidy. — Já que não posso escolher meu jantar, pelo menos escolherei a música. Cassy o seguiu até o piano. Ele a acomodou numa banqueta e, sem cerimónia, tocou uma versão de "Old Man River". Maravilhada com o talento musical de Paul, ela levou alguns minutos para perceber que todo o salão estava ouvindo em silêncio. Para deleite geral, outras três canções foram executadas. Mas o jantar os esperava e a audição terminou. Sob aplausos, Paul deixou o piano. Só tinha olhos para Cassidy, que batia palmas. Por alguns instantes ele conheceu a felicidade. Naquele segundo, sua vida pareceu perfeita. Cassidy entrou em casa em estado de graça. Fora uma noite inesquecível, e ela queria prolongar a sensação de felicidade. Pegou no colo um enorme gato amarelo que ronronava, enroscado em suas pernas. — Olá, Sunshine. Vovó Anna deu-lhe o jantar? Brincandt) com o bichinho, Cassy foi até a cozinha, onde "vovó Anna" tinha deixado um bilhete e uma fita em torno da geladeira. Uma das manias da mãe de Cassidy era a filosofia oriental, e segundo ela a casa precisava ser "purificada". Professora de Tai-chi-chuan, versada nos rituais chineses, vegetariana radical e tendo sua própria visão das coisas, ela não poupava críticas aos filhos, e especialmente ao ex-ma- rido, Alvin, que aos sessenta anos se juntara a um grupo de motociclistas e deixara crescer os cabelos, usando sempre rabo-de-cavalo. Rindo de si mesma e da família pouco convencional que tinha, Cass pensou que talvez não fosse má ideia agradar sua mãe e tentar a tal "purificação" da casa. O som estridente da campainha a tirou desses devaneios. O relógio do microondas marcava dez horas, tarde demais para qualquer visita. Na ponta dos pés, ela atravessou a sala e pelo olho mágico verificou quem a procurava tão fora de hora. Com o coração aos pulos, abriu a porta para Paul. — Oi! Quer entrar? Ele balançou a cabeça, sério. — Nós não combinamos quando nos encontraremos de novo. — A primeira prova, claro! Deixe-me ver... quinta-feira não... Que tal sexta? — Não. Falta muito tempo para sexta. — Oh... Cassy sentiu um arrepio. Por um lado era ótimo ouvi-lo dizer isso, mas por outro era impossível aprontar antes disso a roupa. — Tome café da manhã comigo na quarta-feira, e provarei a roupa na sexta. — Café da manhã? — Só a convidei para o café, não para passar a noite comigo. Por que está tão surpreso? Já almoçamos, jantamos e tomamos chá juntos. Só falta mesmo o desjejum. — Que seja — assentiu Cassy com visível alegria.
  • 14. — Mas eu preparo tudo. Sete horas é muito cedo? — Perfeito. Antes de partir, Paul tomou-lhe o rosto nas mãos e fitou-a por algum tempo, silenciosamente. Beijou-lhe a testa com suavidade e saiu. Pela segunda vez naquela noite, Cassy trancou a porta e ficou pairando nas nuvens. Anna apareceu na porta da cozinha, atraída pelo cheiro de bacon e ovos que se espalhava pelo ambiente. Tinha as mãos na cintura e olhar de poucos amigos. A cabeleira grisalha presa numa longa trança e o longo vestido de algodão azul davam-lhe uma aparência exótica, reforçada pelos brincos indianos de prata. — O que está tentando fazer? Envenenar a si mesma ou enfumaçar a casa toda? — Digamos que estou tentando preparar um desjejum decente para um amigo — respondeu Cassy. — Envenenando seu amigo com carne de animais mortos? — Mamãe, não posso comê-los vivos. Anna estranhou a filha dizer aquilo. Afinal, sempre guardava para si os comentários jocosos. Uma energia diferente emanava dela. — Seria um amigo... do sexo masculino? — Seria. Mamãe, por favor, tenho vários amigos. E café da manhã não quer dizer que dormi com ele. — Sei disso. Não sou tão preconceituosa como imagina. — E, mudando de assunto: — Deixei um bilhete para você ontem. — Pode purificar a casa quando quiser, desde que não seja agora. — Obrigada. Farei isso, mas é melhor que não esteja por perto. Seu ceticismo atrapalha o fluxo energético. Não tiveram tempo para dar prosseguimento à conversa. A campainha soou, anunciando que o convidado chegara. Atrapalhada entre a frigideira, o forno e a cafeteira, Cassidy tropeçou em duas cadeiras e quem atendeu a porta foi Anna. — Como vai, meu jovem? Sou Anna, mãe de Cassidy. Paul estendeu-lhe a mão num gesto cortês, porém no rosto estava estampada sua surpresa. E sua decepção. — Paul Spencer, muito prazer. Devo concluir que é mãe de William também. Eu e seu filho trabalhamos juntos. — Estranho, muito estranho... Em que dia o senhor nasceu? — Dezessete de janeiro. — 17--- Vou verificar. — Com o olhar perdido, Anna dirigiu-se à cozinha. — Vai comer coisas mortas, sabia? Cassidy acompanhou-a até a porta e assim que a viu desaparecer na rua, olhou para Paul. — Desculpe-me, mamãe é um pouco excêntrica. Aliás, muito excêntrica. — O que ela quis dizer com comer coisas mortas? — Esqueça. Minha mãe é naturalista radical. Paul caminhava pela cozinha, observando tudo com evidente ar de satisfação. — Ovos, bacon, biscoitos caseiros... Não acredito que tenha feito geléia de amora! Eu adoro! Cass não conseguiu esconder seu orgulho com o elogio. — Minha avó me ensinou. Eleja estava se servindo das guloseimas, com apetite de glutão. Entre uma garfada e outra, falou: — Você não costuma comer isso sempre, não é? — Quase nunca. — Foi o que imaginei. Ninguém pode ter um corpo como o seu sem fazer sacrifícios. — Como assim? — Corando até a raiz dos cabelos, Cassy não sabia onde pôr as mãos. — Seu corpo é maravilhoso. Não só o corpo, tudo em você é lindo. — Obrigada. Ela não estava acostumada a ouvir elogios. Principalmente vindos de um homem como Paul. Natural que reagisse com timidez. — William nunca fala muito da família. Sempre estranhei isso, e agora muito mais. Conhecendo você e sua mãe, não entendo mesmo! — Minha mãe é "esquisita" demais para os padrões do meu irmão. Confesso que papai também não se encaixa na "normalidade". Vive para se divertir. Ah, e William não suportou o divórcio
  • 15. deles. — Acho que vou gostar de seu pai. — Com certeza. Mas minha mãe é o oposto disso. Para ela há coisas mais importantes que diversão. — Acho que pode haver um meio termo. — O que não o impediu de se sacrificar pelo trabalho. — Às vezes é preciso. — Fale-me sobre Bettina. Mesmo surpreso com o pedido, Paul relatou toda a história e terminou dizendo: — Chego a pensar que tudo, para ela, baseia-se na vaidade. Se não fosse seu orgulho ferido, nada disso estaria acontecendo. Mas agora é uma questão de honra casar comigo. — Eu jamais conseguiria aguentar uma situação dessas. — O que estamos vivendo é muito pior. Escute-me: se quiser que eu suma da sua vida, peça e o farei. Só não quero magoar você. — Não quero que você suma. — Que bom! Preciso da sua amizade. — Não somos amigos. Nenhum amigo me beijou como você. — Sei. Vamos parar com isso. — Não, não vamos. — E, para provar o que dizia, Cassidy uniu os lábios aos dele, num beijo apaixonado. CAPITULO IV Entre sedas, cetins, cristais reluzentes, flores e champanha circulavam os convidados do baile à fantasia de Bettina Lincoln. Pierrôs, colombinas, zorros e outros personagens se misturavam no cenário luxuoso criado pela imaginação e pela riqueza da anfitriã. Paul Spencer Barclay podia não ter o glamour de Tony Curtis, mas estava mais do que convincente nos trajes de cossaco. Viril e charmoso, parecia vindo das estepes russas. A habilidade de Cassidy em dosar criatividade e bom senso ficara provada nos detalhes, como as botas com aparência gasta ou o sabre autêntico que pendia do cinturão de couro envelhecido. Com um sorriso no rosto, Paul saboreava o champanha quando Bettina fez sinal para que se juntasse a ela. Paul olhava ao redor, e convenceu-se de que Cassy estava certa ao afirmar que, no fundo, somos muito semelhantes à fantasia escolhida. No caso de Bettina, isso estava evidente. Vestida de princesa encantada, agia como se o mundo fosse seu conto de fadas. Bem, só uma varinha de condão faria o carpete branco ficar limpo depois daquela festa. Bettina tomou-o pelo braço. Dirigindo-se a um senhor vestido de George Washington e a um casal com trajes pré-históricos, apresentou-o: — Macie e Marc Gladsden, este é Paul Barclay Spencer, do pastifício Barclay. — Para Bettina, ele seria sempre Paul Barclay Spencer, do pastifício Barclay. Se fosse apenas Paul Spencer não estaria ali, servindo como seu bichinho de estimação... — Como vão? O casal o via como um objeto, e como tal ele se portou. Enquanto Bettina fingia não perceber que Macie não tirava os olhos de Paul, ele se divertia com a situação. Conhecendo bem a alta sociedade, sabia que os Gladsden não faziam parte dela. Ouvira muitas histórias sobre as "festinhas de embalo" organizadas pelos dois. Não eram os únicos amigos de Bettina a fazer parte desse universo um tanto ou quanto ousado para os padrões normais. Ela mesma tinha uma certa tendência para se juntar ao lado escandaloso da sociedade. Mas Paul nunca imaginou que pudesse se misturar à gentalha. Essa espécie de atitude era inaceitável para qualquer membro da família, mas ele não tinha o direito de interferir na vida de ninguém. Mesmo que naquele momento estivesse muito incomodado. Aquilo se estenderia por muito mais tempo. Bettina não parecia disposta a deixá-lo. Tanto que, passados alguns minutos, tomou-o pelo braço e, com uma desculpa qualquer, despediu-se do casal. De braços dados com Paul, ela fez questão de desfilar por toda a festa, sorrindo, chamando atenção dos convidados. Mais alguns metros e Paul teria desistido, mas, para sua alegria, William Penno, seu fiel assessor, surgiu, elegante numa versão de Daniel Boone. Bettina abandonou-o para voltar ao amigos. — Cuide bem de seu chefe, William. Confio em você.
  • 16. — Senhorita, ordene e eu farei — respondeu ele num tom de voz obsequioso. Paul não suportava o jeito como o irmão de Cassy tratava Bettina. O servilismo dos gestos o incomodava tanto quanto o esnobismo. Com ele, era diferente. Exigira ser chamado pelo primeiro nome depois de oito meses de convivência diária, mas nunca soube que isso não significara, para William, que tinham se tornado amigos. Pobre rapaz, jamais entenderia que uma amizade verdadeira e leal podia ser muito mais valiosa que sua postura servil e subserviente... Portava-se como um subalterno, e isso nunca mudaria. Como dois irmãos podiam ser tão diferentes? Cassy era espontânea, autêntica... Ele ponderava a respeito quando ouviu William dizer: — Se me permite, devo confessar que está muito bem com essa roupa. Sorrindo, com genuína gratidão no olhar, Paul apertou a mão do funcionário. — Agradeço muito por ter me indicado sua irmã. Obrigado mesmo. — Oh, por favor... Nós é que agradecemos pela oportunidade de servi-lo. Paul olhou-o de alto a baixo e perguntou-lhe: — Ela escolheu sua roupa? — Não. Veio de lá, mas eu escolhi. Era o que Paul imaginava. Na certa Cassidy teria optado por um pajem medieval. Ela também era da opinião que nada pior do que um homem servil e sem amor-próprio. Bettina interrompeu o diálogo, chamando o noivo novamente, dessa vez para apresentá-lo a um casal idoso e simpático. O marido confessou que viera quase por dever social, esperando se aborrecer, e para seu espanto estava se divertindo muito. Submetendo-o a tais provações, Bettina esperava vê-lo prostrado a seus pés. Naquele momento, por exemplo, ela insistia em contar a ideia "brilhante" que acabara de ter. —Um baile à fantasia muito maior, patrocinado pela empresa! — exclamou, animada. — Será uma grande festa. Convidaremos os clientes e poderemos atrair a atenção dos distribuidores nacionais. Faremos o lançamento oficial da campanha publicitária. Essas palavras atingiram-no como torpedos. Conhecia a prima o suficiente para saber que ela tramava algo. E, pior, com os negócios da família. Cauteloso, argumentou: — Uma festa desse porte custa muito caro. — Temos a verba da publicidade. Não seria um gasto inútil. Sem mencionar o que podemos lucrar com o contato direto com clientes antigos, bancos, fornecedores... Você me diz sempre isso. Nesse ponto ela estava certa. Paul sempre reclamava que faltava, à empresa, um toque pessoal, e essa era uma excelente chance. Tinha que admitir que estava tentado pelo plano. Só não concordava com o baile à fantasia. Por que não uma bela festa? Mesmo animado, não demonstrou interesse imediato. Bettina não teria esse prazer. Foi então que teve uma ideia: — Se William nos auxiliar nisso, será muito mais fácil. Sim, Paul decidira concordar com o baile à fantasia. Mas por um único motivo: Cassidy Penno. Que se danassem os motivos reais de Bettina. — Eu? — indagou William, surpreso. — Precisamos fornecer as fantasias para os convidados de fora. Ou espera que cruzem o país com esse tipo de traje na mala? E, para nossa sorte, sua família tem a melhor loja do género. — Na verdade, o negócio é de minha irmã... — Um lugar ótimo! — interveio Paul, enfatizando seu interesse na loja e não em Cassy. — Fazem tudo, da criação ao acabamento. E possuem um estoque enorme. Só não sei se dispõem de uma lista de tamanhos e modelos oferecidos. — Tenho certeza de que sim. Eu mesmo ajudei a informatizar a loja — disse William. — Pronto. Achamos o homem para providenciar esse detalhe da festa! — E, tentando parecer casual: — Procure saber se sua irmã pode falar conosco na segunda-feira de manhã. — Garanto que sim. Bettina estava surpresa, mas entendeu como mais uma vitória sobre Paul e, exultante, lançou-lhe um sorriso magnânimo antes de dizer: — Bem, fico contente ao constatar que desta vez não iremos brigar. Como vê, tenho boas ideias também. Paul assentiu, sorrindo, e percebeu que até aquele momento o velho casal ficara abandonado à
  • 17. própria sorte. Bettina já abandonara a roda para alardear sua conquista. Então coube a William fazer o papel de anfitrião. Ele era ótimo nisso, e Paul tinha pressa em comunicar a Cassy sobre seu plano. Já se despedira de todos quando William o segurou pelo braço e sussurrou-lhe ao ouvido: — Será que não devemos procurar uma loja maior? — Nem pense nisso. Nenhuma loja grande nos atenderia tão prontamente. Faltam dois meses para o ano-novo. Mortificado, William gemeu e ousou dizer: — Dois meses! Eu conheço minha irmã e... — Preciso dela. "Preciso mesmo", pensou. Sem perceber, Bettina lhe dera a chance ideal para continuar a ver Cassidy. O resto poderia ser resolvido. Passava muito da meia-noite quando o telefone tocou. Cass, embora acordada, não atendeu imediatamente. Estava imaginando como fora a festa e se Paul formalizara o noivado com Bettina Lincoln. Tolice pensar assim, mas sentia que isso daria fim a seu idílio. Quando atendeu, não podia imaginar que ouviria justamente a voz dele. — É você mesmo? — Sei que é tarde, mas o que tenho a dizer não pode esperar. — Tudo bem. — Com o coração apertado, Cassy se preparou para ouvi-lo falar que não poderiam mais se ver. — Preciso que me ajude, e muito. Abrindo os olhos, sentindo o sangue latejar, ela disse a primeira coisa que lhe veio à mente: — Sabe que farei qualquer coisa. — Otimo. Eu contava com isso. Agarrando o telefone com ambas as mãos, Cassy mal controlava o entusiasmo. — Só me diga o que preciso fazer. — Não sei exatamente, mas é muita coisa. E teremos que nos ver sempre. Confusa, Cassy pôs-se de pé. Pelo que conhecia de Paul, tudo era possível. — Espere! De que estamos falando? — Do baile de ano-novo das empresas Barclay, um evento publicitário que meus sócios inventaram e com o qual concordei. Um baile à fantasia. Outros detalhes William poderá fornecer amanhã. — Quer dizer... este ano-novo? — Achei que deveria ser informada desse pequeno detalhe. — Acho que não será possível. — Esse problema é de Bettina. Meu único problema é arrumar as fantasias dos convidados de fora. — Agora ficou claro. — Cassy não sabia se ficava feliz ou preocupada com a atitude de Paul. Então foi direta: — Vocês ficaram noivos hoje? — Claro que não! Livre do peso, e achando-se um pouco tola, ela tentou se desculpar: — Achei que... Bem, William me disse que era esse o motivo do baile e... quer dizer... — Não há nenhum romance com Bettina. Nenhum de nós ama o outro. E uma questão de orgulho ferido para ela, só isso. — É que eu pensei que ela o amasse e... Bem, ela já tem dinheiro e poder com a herança. Por que tanto empenho no casamento? — Bettina quer ser um membro da família, uma Barclay legítima. E também restaurar seu amor-próprio ferido. — E, ao obrigar você a casar-se, conseguirá tudo isso? — Ela conseguiu me encurralar. No momento, tudo o que Bettina quer é me mostrar que venceu. Deseja que eu... hum... aceite meu destino. Cassidy entendeu. — Essa é a coisa mais triste que já ouvi. — Não, Cass. A coisa mais triste é amar alguém que nunca será seu. Algumas palavras não precisam ser ditas. Cassy já sabia de quem Paul estava falando. E ele tinha razão. — A melhor coisa a fazer agora é dormir.
  • 18. — Certo. Boa noite. — Boa noite, Paul. — Vejo você logo? — Logo, logo. Ao desligar o telefone, Cassy sentiu que o deixara mais calmo. Surpreendentemente, em poucos minutos dormia profundamente. Sentia-se em paz. Por algum tempo, teria Paul a seu lado, e seriam mais do que "bons amigos". E isso era além do que podia almejar. William conseguiu marcar a reunião com Cassidy, como prometera a Paul. Esquecido de que, antes de ser funcionário da Barclay, era irmão de Cassy, continuava agindo com a prepotência costumeira. Celular em punho, confirmava os números e dirigia-se para Paul: — Bettina calculou cerca de trezentos convidados. Gladys terá os nomes até a tarde, assim que elaborarem a lista oficial. Em um dia ou dois teremos a listagem de idades, sexo, cor e tamanho aproximado de todos eles. Bendita seja a informática! Paul forçou um sorriso. — Vamos ao que interessa. — Virou-se para Cassidy. — Você acha que terá dificuldade em conseguir roupas para toda essa gente? Consultando o computador, ela respondeu: — Não. Temos muita coisa em estoque e pouca procura para o reveillon. Se fizer a reserva agora, terá tudo o que deseja. Mas seria melhor inventar um tema para a festa, algo como "velho Oeste" ou "império Romano". Pela minha experiência, facilitaria a escolha das pessoas, evitaria rivalidades e tornaria mais fácil a decoração. — Faz sentido. Mas onde arranjaríamos local e cenários em tão pouco tempo? — Um único tema me dá chance de negociar com todas as lojas. William não quis ficar atrás da irmã, e sugeriu: — Temos a velha fábrica. E grande, tem estilo e está vazia. Quer lugar melhor? O olhar de Paul buscou socorro no de Cassy. Não fazia a menor ideia do que era razoável ou não. Mesmo assim, deu seu palpite: — E velho, antigo mesmo. Está sujo e de bom só tem a solidez das paredes. Ah, e o tamanho. — Parece muito bom. A srta. Bettina não precisa ser consultada? — Antes quero ter algo concreto para mostrar. Alguma ideia de tema? — Quem fundou o pastifício Barclay, e quando? — indagou Cass. — Meu bisavô, em 1902. Por quê? — Porque William tem fascinação pela saga da empresa, e muitos outros devem ter também. Estamos no fim do século. Que tal voltar ao começo de tudo? — Justamente agora que estamos mirando o futuro? — bradou William. — É um contra-senso. Nosso alvo é atingir proporções nacionais. Essa estrutura familiar está ultrapassada. — Will está certo — assentiu Paul. — A Barclay está a um passo da nova era. — Quer coisa melhor do que voltar ao início antes de olhar para o futuro? Dálias, 1902. O começo de uma civilização, a nossa. "Quem não teve passado, não terá futuro." — A voz de Cassidy era puro entusiasmo. Paul estava inebriado com a ideia, com Cassidy, com tudo à sua volta. E o olhar denunciava seus sentimentos. Queria ser feliz e esquecer o resto. As ideias pululavam. William queria fazer um histórico da empresa com fotos no saguão da fábrica. Cassidy sugeriu que Paul representasse o papel do patriarca Barclay. No auge da animação, ele não resistiu e, juntando os dedos, jogou um beijo na direção dela. — Brilhante! — Cassidy foi rápida ao notar a reação de William. O olhar do irmão ficou frio, e a desaprovação era patente mesmo quando Paul abraçou os dois, repetindo: — Os brilhantes irmãos Penno! O riso espontâneo de Paul não impediu Cassidy de notar em seu irmão traços de preocupação. Algo o incomodava. Ela, porém, não se abalou. Tinha coisa mais séria em mente. Não foi preciso esperar muito para obter as respostas. Na noite seguinte, William apareceu de surpresa na casa de Cassidy, agitado e cruel, disparou suas farpas logo na entrada: — E tudo culpa sua. Vai acabar com a minha carreira! — Posso saber do que está falando? — O plano era aproximar Bettina e Paul, não o contrário.
  • 19. Cass respirou fundo e contou até dez. Levou o irmão à sala íntima, esperando que ele se acomodasse. Acendeu o abajur, abriu um vinho do Porto e só depois de servi-lo, em copos de cristal belga, falou: — Agora, com calma, pode me dizer o que houve? —E Paul. Só pensa no baile. Esqueceu Bettina e, para se vingar, ela o atormenta com a decoração a cada minuto. —E o que eu tenho a ver com isso? —Não se faça de sonsa, Cassidy Jane Penno. Não sei como, mas parece que você andou virando a cabeça dele. —Sou paga para dar ideias. Se isso afeta a cabeça de seu chefe, não é problema meu. — Que tipo de ideias? A meus olhos está claro que ele... Bem, gosta de você. — E daí? Para seu governo, não é o único. Ou sua irmã parece um monstro? Se veio para me dizer isso, ti, pode ir para casa. Por um longo momento, William ficou sem ação e encarou sua irmã. —Sabe que não existe chance. Ele está comprometido com outra. Atónita, Cass sentiu mais que censura naquele comentário. Havia a preocupação legítima de irmão mais velho. — Ainda não está. — Não acredito que você pensa que pode competir com Bettina Lincoln! Ela é sofisticada, interessante, alta, loura... o tipo de mulher que faz um homem enlouquecer. E, mais que isso, é poderosa. Nunca vai deixar que você ou qualquer outra mulher roube-lhe Paul. Cassidy queria dizer que ele estava errado, e que Bettina ainda não possuía Paul. Mas no íntimo concordava com William. Tinha quase certeza de que algo mais do que os negócios da família uniam os dois. — Sou sua irmã! Será que isso não conta nada? Deixe um pouco de lado a "magnífica" Bettina e pense em mim. Ou em você. — Está certo. Não posso ficar amarrado desse jeito a Paul. — Exato. Pense neles como uma fonte de rendimentos para nós, e temporário. — E, com ar inocente: — De mais a mais, foi por sua causa que eu o atendi. — Só lhe peço uma coisa: não podemos deixar Bettina à margem dos acontecimentos. Ela precisa ser a estrela dessa festa. Faça com que isso aconteça. Sei que vai armar uma pequena peça de teatro para contar a história da empresa, e que Paul será o velho Barclay. Pois use a criatividade para colocar Bettina como a mulher que fez o grande homem. Dê um jeito. Escreva, crie, dinheiro não é problema. Não saio daqui sem um texto para Bettina ler amanhã. Chame seus amigos de teatro, faça o que quiser. Mas faça. Dois telefonemas e Tony e um amigo redator estavam lá, com pizzas e disposição. Como se fosse um desafio para seu talento e caráter, Cassidy produziu naquela noite um texto completo, com tudo: marcação, iluminação, trilha sonora. Como figura central, a esposa fiel e incansável, abnegada e brilhante: o papel de Bettina, Quando terminou, soube que fizera aquilo por Paul. Por causa do amor cada vez mais intenso que nutria por aquele homem. Se isso o ajudasse em algo, teria valido a pena. CAPITULO V — Achei as fotos! — disse William, tirando da pasta um velho álbum. Cassidy, Tony e os outros três rapazes do curso de teatro levantaram os olhos para ver do que se tratava. — Há uma foto da casa do bisavô de Paul, em que ele aparece com a esposa. Cassidy juntou as mãos, agradecida. — Graças aos céus! — Não vão acreditar, mas o velho Barclay fazia propaganda do pão já nos anos vinte. Aqui, eles estão inaugurando a terceira loja. Aquele era o material de que Cassidy precisava para a ambientação do baile e, especialmente, para sua pe- quena peça de teatro sobre o patriarca Barclay. Entusiasmada, revirava o material que lhe daria subsídios para o trabalho. Estavam empenhadíssimos na produção da peça. Havia quatro dias que não faziam outra coisa. Paul chegou nesse instante, furioso. Acabara de falar com alguém no celular.
  • 20. — Essa foi a coisa mais estúpida que já ouvi em toda a minha vida! — Olhando para todos, explodiu: — Alguém precisa tomar, conta desta loja. Há clientes esperando! Tony saiu correndo antes que a fúria de Paul desabasse nele. Os outros três jovens seguiram-no. — E então? Bettina gostou da peça? — indagou William. O coração de Cassidy ficou apertado. Trabalhara muito naquele roteiro. Conseguira contar a história do patriarca Barclay, colocando Bettina no papel da bisavó de Paul. E, se fosse preciso reescrever algo, estariam perdidos. Não haveria tempo. — Bettina se recusou a fazer a peça. Alegou que isso arruinaria sua imagem — vociferou Paul. — Mas como? É o papel principal! Sua bisavó foi a responsável pelo desenvolvimento da empresa! Paul levantou o dedo em riste em direção a William, irritado. — Exato! Ela morreu aos noventa e quatro anos, ativa e lúcida. Trabalhou para que tivéssemos uma fábrica, ao invés de muitas padarias. Enfim, construiu tudo o que temos. William balançou a cabeça, desalentado. — Não entendo. A srta. Lincoln devia estar orgulhosa pór representar esse papel. Mãos na cintura, Paul disse em tom sarcástico: — A srta. Lincoln não tem muita coisa na cabeça. O que a incomodou foi a parte em que é uma senhora idosa. Usando as palavras dela, uma velha. — Só no final. Começamos com a personagem aos vinte anos, e recém-casada! — argumentou Cass. — Isso não faz diferença! — Paul continuava inconformado. — Bettina teme que a maquiagem estrague sua pele, e não quer parecer velha. Ponto final. Cassidy parou por alguns minutos, para pensar naquilo tudo. Nenhuma mulher do mundo seria vaidosa a esse ponto. Havia algum outro motivo. William mostrava-se tão estarrecido quanto ela, mas, como sempre, tinha um ponto de vista conciliador: — Talvez a srta. Lincoln não tenha a dimensão exata do papel. Enquanto você sai depois da segunda cena, ela continua até o fim da peça. — Esqueça. Bettina se recusa e pronto! Essa mulher me tira a vontade de viver! — confessou Paul. — E agora? O que vamos fazer? — William perguntou. Era a deixa que Paul esperava. Um brilho maquiavélico surgiu em seu olhar quando fixou-se em Cassy. — Vamos achar alguém para substituir Bettina. E sei exatamente quem. William Penno rebelou-se instantaneamente. — Você não está sugerindo que... — Oh, eu não ousaria — argumentou Cassy, entendendo que o papel sobraria para ela. O charme e a postura de Paul Spencer Barclay eram imbatíveis nos negócios, diziam todos. Valendo- se desse talento, ele se aproximou de Cassidy, tomou sua mão e foi direto ao dizer: — Sei que estou pedindo demais da nossa amizade, mas preciso de você. Saberei recompensar seu trabalho, prometo. — Não é uma questão de dinheiro. — Tenho certeza de que não. — Sua voz tornou-se suave. — Mas não tenho outro modo de expressar minha gratidão por tudo o que tem feito, por seu apoio e generosidade... — E beijou-lhe a mão. Cassidy não resistiu ao gesto galante, capitulando. — Oh, não! Por favor! — William estava inconformado. — Pense no que está fazendo! Paul fuzilou-o com o olhar. Cansara-se de ouvir objeções e conselhos do assessor. — Que sugere, então? — Pense na srta. Lincoln... — A srta. Lincoln sabe perfeitamente que alguém terá que fazer o papel que ela recusou. Agora diga à sua irmã para aceitar minha proposta. Já! — Eu? — Você não é meu assessor? Pois então, resolva esse problema. O poder que Paul se recusava a usar nas relações pessoais estava sendo útil, finalmente. Agir dessa forma com William Penno era uma forma de fazê-lo perceber quanto podia ser desagradável a arrogância
  • 21. alheia. No fundo, Cass estava saboreando esse momento. Não deixou de ter uma certa graça ver o prepotente William se render. — Bem, apesar de tudo, pensando melhor... Nós não podemos abandonar Paul agora. Cassidy se perguntou até que ponto era importante para Paul tê-la a seu lado. Mas a pergunta era irrelevante. Seu coração sabia o que importava de verdade. Voltando o rosto para ele, respondeu com sinceridade: — Claro que terei prazer em fazer a peça, se é o que quer. — Obrigado. Muito obrigado. A essa altura, William já recuperara o autocontrole e, infelizmente, também a prepotência. Queria que Bet-tina brilhasse, não Cass. Portanto, não permitiria que sua irmã se valesse dos mesmos trunfos destinados à srta. Lincoln. — Precisamos fazer modificações no texto, já que Cassidy será a matriarca, e não Bettina. — Ninguém põe a mão no que está escrito. — Paul estava disposto a tudo para ser obedecido. Seu olhar não deixava dúvidas sobre isso. Engolindo em seco, William guardou para si as objeções. Cassy retomou o assunto do álbum de fotografias: — Agora vamos ver que fotos podemos usar. A pesquisa foi produtiva. O bisavô de Paul fora um dos primeiros, em Dálias, a fazer uso constante da fotografia como forma de registrar flagrantes cotidianos, quando a maioria das pessoas apenas posava para a máquina. Em menos de uma hora Cassidy já sabia o que precisava adquirir nos antiquários da cidade, e saiu em busca das primeiras peças. Paul deu-lhe seu cartão de crédito e o celular. A tarde voou. Quando ela finalmente pôs os pés na loja, tinha a sensação agradável de haver conseguido avançar léguas no trabalho. Excitadíssima, tinha pronta, na cabeça, a decoração da festa, e em detalhes. Paul precisava ser informado de seu projeto. As ideias fervilhavam em seu cérebro e a loja já estava deserta. Tony saiu correndo ao vê-la chegar, atrasado para a aula. Como o telefone de Paul ficara com ela, não sabia onde procurá-lo. Nesse momento, ouviu a porta bater. — Oh, Paul! Você leu meu pensamento. Tenho de contar minha ideia... — Que bom! Falaremos durante o jantar. Como uma criança, Cass não se conteve e disparou a falar: — Sabe a foto de sua bisavó na cozinha? E o jeito do restaurante de Hoot? Pense! Podemos conseguir um ambiente mágico se reproduzirmos a cozinha dela em todo o salão! E é simples: basta usar as toalhas certas, alguns objetos e pronto. Teremos a mesma atmosfera. — Genial! Seguindo-a pela loja, Paul ouvia, atento, os detalhes que Cassidy dava enquanto apagava luzes e ia fechando a loja. Só quando estava na rua, com o vento frio despenteando seus cabelos, Cass parou de tagarelar. E isso porque Paul segurava-lhe o queixo. — O que foi? — Isto. — Ele a beijou. Era o primeiro beijo depois do baile à fantasia. Ambos ansiavam por esse momento, mas nenhum tomara a iniciativa. Tinham medo. Não sabiam bem do quê, mas tinham. Foi Cassidy quem definiu as coisas. Assim que seus lábios se separaram, ela disse: — Não a peça em casamento até o ano-novo. Por favor, nos dê esse tempo. — Certo. Prometo. Abraçados, sentindo o vento gelado tocando seus corpos, estavam quase felizes. Ao menos poderiam ficar juntos até janeiro. O caos imperava quando começaram a mexer na fábrica. Sujeira e entulho misturavam-se aos problemas técnicos para a produção da peça. Tudo parecia se complicar, e William não tornava mais fácil a tarefa, implicando com Cassidy e seus métodos. Tony e seus colegas de faculdade estavam encarregados da faxina. Esse foi um motivo a mais para o desentendimento dos irmãos Penno. Paul chegara à fábrica justamente num desses momentos. Fora até lá para ensaiar e escolher
  • 22. os atores coadjuvantes, todos estudantes da escola de arte dramática. Essa fora uma das razões pelas quais Cassidy pedira que Tony levasse seus colegas de faculdade. Mas William não entendia esse raciocínio e brigava por colocar, na limpeza, uma empresa especializada. Paul interveio em favor de Cass. Queria que todos entendessem que faziam parte de um projeto comum, e que juntos deveriam alcançar o resultado desejado. Cassidy, com um assobio estridente, conseguiu a atenção de todos. Com voz firme, ela passou a exercer o comando. — Primeiro eu gostaria de agradecer a todos que estão dispostos a trabalhar conosco. Quanto antes a limpeza acabar, mais cedo iremos para casa. — E, olhando para Paul, anunciou: — Acho que o sr. Barclay tem algo a nos dizer. — Em primeiro lugar, gostaria de lhes pedir que anotem seus telefones para contato, horários de trabalho desejados e tarefas que têm facilidade em desempenhar. Isso nos garantirá um aproveitamento me lhor das qualidades de todos — disse Paul. Em pouco mais de vinte minutos já haviam chegado a um consenso sobre o trabalho da equipe, o salário e os contratos temporários. — Todos sabem que a festa está centrada num único ponto: a pequena peça que estamos produzindo e que dará sentido ao evento. Já foram distribuídas cópias para todos. Eu farei Theo Barclay, e a srta. Penno... — Cassidy — corrigiu ela. — Obrigado. Cassidy concordou em representar a esposa de Theo, minha bisavó. Inteligente e criativa, a srta. Penno é a responsável por tudo aqui. O que ela disser ou fizer tem meu aval. O poder é dela. Tony e William reagiram às palavras de Paul com o mesmo sentimento de insatisfação. Porém, foram os únicos a se sentir assim. A palavra voltou para Cassidy, que começou a narrar suas escolhas para o elenco, o que incluía muitos membros da família Barclay. Faltava um rapaz para representar Theo quando moço, e William sugeriu que procurassem entre os filhos do pessoal da diretoria da empresa. — Mais uma vez os irmãos Penno nos socorrem com suas ideias geniais. Obrigado, Will. Pode providenciar isso? William encheu-se de orgulho. — Claro. — Seria bom contar com uma ou duas meninas também — lembrou Cassidy. — Verei isso — prometeu William. Tudo encaminhado, a reunião foi encerrada. Paul, Cassy e William se isolaram para a leitura do script. Cass explicou o motivo pelo qual discutia com William quando Paul aparecera na fábrica. — Meu irmão se esquece de que estamos organizando um baile, não somente uma peça de teatro. Não podemos deixar de ter claro que essa peça é só um detalhe dentro da festa. As pessoas não estarão aqui para assistir a uma representação, mas sim para dançar, beber e se divertir na passagem do ano. Portanto, não tem cabimento colocar um palco enorme no meio do salão. Sem falar no detalhe de que Bettina não ficaria muito feliz com tamanho destaque para algo que não lhe dizia respeito, pensou Paul. E, para a orquestra que ela escolhera, seria necessário muito espaço, tornando inviável a colocação de outro palco só para a peça. A ideia de Cassy foi aceita. Fariam um pequeno cenário, no lado oposto ao da orquestra. Ele passaria despercebido em meio à decoração, e usariam o salão como cenário durante grande parte do tempo. Bettina sugerira que cortinas brancas de seda forrassem todo o interior, para desespero de Paul. Irónico, ele observou que dificilmente isso se pareceria com uma cozinha rústica do começo do século. William, por sua vez, se pôs a defender com ferocidade o ponto de vista de Bettina, mas Cassidy concordou com Paul. Seria mais apropriado usar cortinas listradas e coloridas. Mas William insistiu no assunto, o que o obrigou a ouvir palavras ásperas. — Que uma coisa fique clara: sou obrigado a casar com Bettina, não a concordar com suas idiotices. Paul surpreendeu o assessor, que, chocado, não hesitou em culpar a irmã, fulminando-a com o olhar. Cassidy sentiu-se desconfortável e injustamente acusada. Afinal, se Paul detestava Bettina, ela não tinha nada a ver com isso. Tentando desanuviar o ambiente, Cass sugeriu que repassassem as falas com Will, para que ele
  • 23. pudesse julgar o desempenho de ambos, e do narrador, Andy, um ator profissional. O começo foi realmente hilário. As falas não se encaixavam com a ação, e as mãos de Paul se moviam como num filme mudo. Ensaiaram a cena em que o casal Barclay decide largar os empregos para abrir seu próprio negócio. As falas podiam não convencer muito, mas a intimidade demonstrada pelo casal era muito convincente. Real demais para o gosto de William. A cena terminava com o casal abraçado, olhando com esperança o futuro. E foi esse abraço que mais incomodou o jovem Penno. Tony agiu rápido, distraindo os demais para que não vissem o que estava acontecendo entre os protagonistas. Paul não conseguia disfarçar seu interesse por Cass. Queria levá-la para um lanche, a fim de ficar a sós com ela. Disse-lhe ao ouvido que sairia primeiro e que voltaria para buscá-la em alguns minutos. Tudo isso por causa de William, sempre perto, vigiando. Para espanto de Cassidy, que nunca se colocara na posição de viver um romance clandestino, a censura dos olhos do irmão era dolorosa. Ele se preocupou até mesmo em certificar-se de que Cass iria sozinha, e direto, para casa. Essas e outras pressões foram fortes o bastante para que ela sentisse necessidade de redefinir, ou repensar, a relação com Paul. Mas, com William em seu encalço, isso se tornou impraticável. O irmão levou-a para casa, e, a pretexto de tomar um café, demorou tempo suficiente para ter certeza de que nada aconteceria. Agoniada, Cass viu as horas passando sem que Paul desse notícias ou atendesse o celular. Às dez horas da noite ele apareceu, com aparência de quem saíra do chuveiro, cabelos molhados e revoltos. Vestindo uma calça jeans larga, ténis e um blusão esportivo, parecia mais jovem, não fosse o cenho cerrado. Avançando em direção ao sofá, foi logo dizendo: — Temos de conversar. — Antes que pudesse dizer qualquer coisa, Cass foi bombardeada pelas palavras: — Sinto muito, mas não sou hipócrita o bastante para fingir que não estou louco por você. Ainda sou um homem livre, e enquanto isso não mudar quero ficar a seu lado. Mesmo atordoada com a declaração, Cass teve presença de espírito para contra-argumentar: — Será isso possível? E Bettina? Já pensou que talvez ela se incomode? Enterrando a cabeça nas mãos, Paul respondeu com desalento: — Não sei. Realmente, não me importo mais. Sem saber como agir ou o qie dizer, ela simples mente fez a pergunta-chave: — Você tem mesmo de se casar com ela? Respirando fundo, Paul ficou em silêncio por alguns instantes. — Tenho. — Oh, entendo... A decepção foi maior do que ela esperara. Muito maior. Desviou o olhar, para esconder as lágrimas. E mesmo as palavras seguintes dele não faziam sentido. — Não vejo outra saída. Bettina está obcecada, não mudará de ideia. Queria tê-la conhecido antes, Cass, muito antes. — Antes de ter um caso com ela, quer dizer. — E, recuperando a calma: — Não vejo alternativa senão continuar assim, escondidos, no pouco tempo que ainda nos resta. — Não consigo vê-la feliz com isso. — Por causa de William. Ele não compreende e me faz sentir culpada. — Se estou causando embaraço, vergonha, diga-me e... — Claro que não! Não há nada de que eu me envergonhe. Nada! As mãos de Paul tocaram-lhe com delicadeza o rosto, deslizando numa carícia apaixonada. Seus olhos a miravam, embevecidos. — E aonde isso vai nos levar? — Onde já estamos. Beijando-a de leve muitas e muitas vezes, Paul pediu perdão, emocionado. — Não pude conter meus sentimentos. Não me controlei, Cass. — Não me peça perdão. O beijo que ele lhe deu na mão percorreu-a como corrente elétrica. Fechando os olhos, entregou-se, aninhando-se nos braços masculinos. Depois, inverteram as posições, e Cassy o aconchegou no regaço.
  • 24. Olhando para o menino que ele parecia, ela o acariciou. Paul enterrou o rosto em seus seios. Aos poucos, foi levando as mãos até eles, sentindo-os. Eram tão desejáveis que ele não se conteve. Excitado, deslizou a outra mão para a coxa roliça. A reação de Cassidy foi cerrar os olhos e deixar que aquela sensação deliciosa reverberasse em cada centímetro de seu corpo. Paralisada, temendo interromper a magia, ficou imóvel. Uma onda de desejo violento a dominou, enfraquecendo seus sentidos, aquecendo-a como nunca. Mas ele se deteve de repente. Pôs-se de pé e, controlado, disse: —Melhor eu ir para casa. Dadas as circunstâncias, Cassy assentiu. Se continuassem ali, não poderia responder pelo que aconteceria. Ao acompanhá-lo até a porta, percebeu quanto o desejava, e sofreu por vê-lo partir. Suas pernas ainda estavam trémulas. Fechou os olhos. Seu coração e seu corpo ainda o sentiam intensamente. Mesmo na cama, tempos depois, seu ser vibrava com a lembrança de Paul. CAPITULO VI Esbaforida, Cassidy entrou na fábrica. Todos respiraram aliviados. Especialmente Paul, que não disfarçou sua alegria. — Graças aos céus! Estava preocupado. Você não costuma se atrasar. — Deixou todo mundo esperando — repreendeu William, incomodado com o gesto afetuoso de Paul. Afastando-se do abraço, Cassidy se desculpou pelo atraso, constrangida. — Desculpem, tive uma reunião com o fornecedor de perucas, e demorou mais tempo do eu supunha. Depois, houve um acidente na avenida central. — Você deveria saber disso antes de escolher esse caminho — rebateu William, irritado. Paul respondeu com rapidez, intrigado com tanta hostilidade: —O que o incomoda, Penno? Cuide de sua vida. Cassidy interveio para serenar os ânimos. Segurando Paul pelo ombro, sugeriu: — Estamos perdendo um tempo precioso. Ao trabalho! A hostilidade de Paul arrefeceu, e William não disse nada. Limitou-se a olhar para ambos com indignação. Cassidy já perdera o sono tentando achar um modo de tranquilizar o irmão e fazê- lo aceitar sua relação com Paul. Mas nem ela mesma estava convencida de que agia corretamente. A verdade era que vinha se encontrando com um homem que se casaria com outra, em breve. Já se cons-cientizara de que o melhor seria romper, mas não tinha força para levar adiante essa resolução. Enquanto houvesse chance, continuaria ao lado do homem que amava. E William sofreria por achar que sua irmãzinha era amante do chefe. Ao imaginar o futuro sem Paul, Cassy estremecia. Aos poucos, preparava-se para ocupar o lugar que lhe caberia quando ele se casasse. No fundo, continuaria a ser a outra, pois não enxergava a vida sem aquele homem. Nesses momentos, dava graças por ter coisas mais urgentes com que se preocupar. O que deveria ser apenas uma pequena apresentação transformara-se numa produção teatral completa. E o baile assumia proporções maiores a cada reunião. Ensaiaram e ensaiaram. William fizera um ótimo trabalho com os cenários, conseguindo um meio termo entre o projeto inicial e a parcimônia de Cassidy. Tinham um iluminador competente, e os resultados eram gratificantes. No intervalo de mais um ensaio, Tony chamou Cassidy para discutir alguns adereços. Era tarde e a conversa parecia interminável. Paul estava faminto e nada disposto a esperar pela companhia de Cass. Então, chamou-a. A reação de Tony foi violenta e imediata. — Se o seu dinheiro pode comprar todos, isso não se aplica a mim. Pode nos dar licença, "patrão"? — Vamos acabar a conversa mais tarde, Tony? Por favor... — Mas Cass... — Mais tarde. Você ouviu a senhorita — reforçou Paul, vitorioso. E, virando-se para ela: — O que você tem? — Dor de cabeça, mais nada. — Cass sempre tem isso quando não come — interveio Tony. — É comum acontecer. Basta uma maçã e o mal-estar passa.
  • 25. Era verdade, reconheceu ela. Esquecera de almoçar. Somente um café e meia torrada, que ingerira depois que acordara, mantinham-na em pé. Assentiu, com a têmpora latejando. — Vamos comer. Eu a levarei — resolveu Paul. — No máximo um iogurte. Só uma aspirina e um quarto escuro resolvem — provocou Tony. — Providenciarei tudo isso. Vamos, querida. Cassidy estava pálida, e quase desfalecida, quando William interveio: — Se minha irmã está doente, eu a levarei para casa. — O tom autoritário impressionou. Esgotada, estourando de dor de cabeça, Cassidy não teve forças para discutir e, relutante, cedeu às pressões de William. Dividida, falou: — Acho que não estou disposta. Não vou sair com ninguém. — É claro que não, mas precisa de quem cuide de você. Minha intenção é fazer isso. — Paul pôs-se na frente de William, interceptando-lhe a passagem. Foi o bastante para deflagrar a onda de revolta que Will vinha alimentando há algum tempo. Esquecido de quem era Paul, insurgiu-se contra ele. — Sinto muito, mas isso já foi longe demais. Não posso tolerar! — vociferou. — Tolerar? Somos adultos, Will. Não creio que haja algo para ser "tolerado", por você ou por quem quer que seja. — Cassidy é minha irmã. — E é adulta. Esta não é a hora, nem o lugar para discutir. Aliás, não há nada aqui que lhe diga respeito. William mudou o tom da conversa. A ira deu lugar ao apelo comovido, e foi assim que se dirigiu ao chefe: — Por favor, pense no que está fazendo. Cass não merece ser enganada. Pare de se comportar como se ela significasse algo para você. — E significa muito. Muito! Talvez não valha nada para o irmão, mas, para mim, ela é importantíssima. William fez de conta que não ouvira a provocação. — Já pensou no que Bettina vai pensar se... — Bettina não tem nada a ver com isso! Cassidy, dividida e magoada, sentia as lágrimas ensopando o rosto delicado. Quando Paul a puxou para si, afastando-a de William, seu coração doeu. — Pense no que está em jogo — disse Will. E, cínico, completou: — Ela não vale tanto, Paul. — Não sei se você é um canalha, William, ou só mais um imbecil, como tantos por aí. Atónita, Cass ainda não captara a extensão do que seu irmão acabara de dizer. Sentia o desdém dele como um punhal cravado em seu peito. Uma pequena parte dela dava razão a William, mas isso não diminuía em nada seu sofrimento. Só uma coisa no mundo poderia lhe oferecer conforto naquele instan- te: o abraço de Paul. Gemendo, permitiu que ele a tomasse nos braços e a levasse para longe dali. Foi um bálsamo sentir o vento frio no rosto, ao sair da. fábrica. Ainda zonza, respondia às perguntas de Paul com monossílabos. Só se recordaria, depois, de ouvi-lo dizer que alguém precisava dar uma lição a William. Ao sentir-se de volta ao lar, acomodada no sofá da sala, recuperou um pouco a energia habitual. Paul se desdobrou em cuidados. Aspirina, sopa de legumes, bolachas e um pedaço de maçã ajudaram a convalescença. Enternecida, assistiu ao vaivém dele pela cozinha, atarefado com o preparo da refeição. Chá e bolinhos também foram servidos, com tanta desenvoltura que Cass se surpreendeu. Solícito, ajoelhou-se ao seu lado. — Melhorou, querida? — Muito. — Então fique quietinha enquanto lavo os pratos. Não saia daí. — Não seja tolo. Já estou boa. — E espero que continue assim. Fechando os olhos, Cassy não pôde evitar que um sorriso bailasse em seus lábios. Não se lembrava da última vez em que alguém cuidara dela. Estava quase feliz, apesar de tudo. Os ruídos na cozinha, a televisão ligada, o gato que se aninhara em seu colo... Essas pequenas coisas davam-lhe uma sensação
  • 26. inebriante e única. Cochilou alguns minutos, e quando Paul a acordou, para se despedir, as palavras saíram naturalmente. Segurando-o pela manga, pediu: — Por favor, fique comigo. — Só um pouquinho... Depois disso, ela adormeceu profundamente. Vagamente se lembrou de ter sido carregada para a cama. Mas, sabendo que Paul estava ali, pôde descansar tranquila. O homem que amava tomava conta de seu sono, e tudo daria certo... Cassidy acordou com o nascer do sol. Teria continuado a dormir, mas o contato da mão quente e pesada sobre sua pele nua a despertou. Ainda sonolenta, aos poucos foi se dando conta do que estava acontecendo. O braço que envolvia sua cintura e o corpo musculoso que amparava o seu eram masculinos. De Paul. Um sorriso veio-lhe aos lábios ao se recordar da noite anterior. Lânguida, respondeu pouco a pouco ao contato sensual. Adormecido, ele nem notou que a enlaçava. O braço escorregou pelo corpo feminino e fez com que Cassidy perdesse o fôlego ao iniciar carinhos muito atrevidos... Sentir o toque daqueles dedos provocou-lhe prazer e medo. Tensa, sem saber o que fazer, ela se deixou levar pelo instinto. Só então percebeu que Paul não estava mais dormindo. Virou-a para si, escorregou as mãos pelo corpo bem feito e beijou-a na testa. — Bom dia! Como se sente? — Melhor, impossível. — Preciso me certificar disso. — E, maroto, acariciou todo o corpo de Cassidy. — Você acorda linda! — Digo o mesmo... — Dessa vez vou acreditar. — Paul ergueu-se um pouco da cama e, apoiado nos cotovelos, fitou-a, embevecido. Nada, senão os lençóis, cobria a nudez de seus corpos. Por isso, quando Paul a puxou, Cassidy sentiu-o por completo. A boca de Paul procurava, sedenta, pela dela, e num frémito os lábios se juntaram. Cass queimava de desejo. Nada parecia saciá-la. Ao arquear as costas, os seios exuberantes uniram-se ao peito de Paul, num apelo mudo. A sensação que a dominava era de urgência. Urgência de tocar e ser tocada por Paul, juntar seu corpo ao dele, buscando um contato cada vez maior, mais intenso. Cassy queria mais e mais, e tinha a impressão de que nunca alcançaria o que buscava. Por um segundo hesitou, mas só por uma fração de segundo, ao notar seu corpo ardendo pelo que estava por vir. Os lábios de Paul deslizaram, suaves, até a orelha feminina, mordiscando-a. As carícias continuaram pelo pescoço e desceram pelo colo, arrancando arrepios de prazer. Fechando os olhos, Cassidy submergiu na onda de desejo que a envolvia. Por isso, ao abrir as pálpebras e olhar o despertador, só conseguiu dizer: — Céus!!! — Eu diria que é o paraíso... — Paul! — Hum? — São quase nove horas da manhã! — O quê? — Eu falei que... Desperto dos devaneios, Paul parecia ter saído de uma ducha fria. — Nove? Droga! Eu tinha de estar no escritório às oito e meia. — Minha loja abre às dez. Ou abria... Ela riu, e o fez rir junto. Linda e desejável, como nenhuma outra mulher jamais seria. — Adoro quando você ri. Quero desesperadamente fazer amor com você. — Eu sei, mas... — Acho melhor avisar a fábrica que vou demorar. E me faça um favor, não levante até que eu tenha saído. — Beijando-lhe a testa, ele s~e levantou enrolado no cobertor. — Por quê? — Para que eu possa me lembrar de você o dia todo, deitada entre lençóis. E, sinceramente, não sei se resistiria a sua pele macia... Cass tremeu da cabeça aos pés. Encolheu-se mais debaixo dos lençóis.
  • 27. — Tudo bem. Ele a beijou na boca longamente e depois, com os sapatos nas mãos, saiu do quarto. Minutos depois, Cass ouviu a porta da rua bater, e um enorme vazio a tomou de assalto. Pela primeira vez passara uma noite ao lado de um homem. E por ironia, ainda que ele fosse o homem de sua vida, continuava virgem. Suspirou, sem saber se de alívio ou desapontamento. Ou ambos. Cassidy não teria aceito o convite do pai, para almoçar, se soubesse que William também iria. Havia dias que procurava evitar-lhe a companhia. O semblante carregado do irmão evidenciava qual a opinião dele a seu respeito. Não que fizesse alguma diferença para Cass, mas preferia evitar aborrecimentos para ambos. O pai morava num apartamento dúplex, que, para desespero de William, estava em péssimo estado. Che- gando lá, Cassidy logo adivinhou que fora dele a ideia daquela reunião familiar. Mal cumprimentara o pai, pôde ver, da janela da sala, o belo carro de William estacionando. Pegou a bolsa e, irritada, dirigiu-se ao velho Penno: — Então é isso, hein? Saiba que estou indo embora. AlvinPennoolhou-ae,comseujeitoúnico,argumentou: — Deixe disso, filha. — E, virando os hambúrgueres na chapa do fogão, disse: — Reconheço que William é um pouco rígido, mas é seu irmão e só quer seu bem. Cassidy balançou a cabeça com veemência. — Sinceramente, não dou a mínima para o que ele tem a me dizer. — Querida, Will está firmemente decidido. Além disso, como vai manobrar o seu carro com o dele parado atrás? A porta da cozinha se abriu, e William entrou, com o ar arrogante de sempre. — Bem — dirigiu-se para Cassidy —, finalmente estamos frente a frente. E você vai ter que me ouvir. — Engano seu. Você não tem nada a ver com minha vida. A guerra estava declarada. William despejou sobre Cassy toda sorte de argumentos contra Paul e, para culminar, responsabilizou-a caso fosse demitido da Barclay. Cass não estava disposta a ceder. Se sua relação com Paul o incomodava tanto, certamente o motivo nada tinha a ver com amor fraterno. A hostilidade com que Will a vinha tratando desde o início assumiu contornos violentos. — Ele é praticamente noivo! — Praticamente. Você mesmo está dizendo. — Todos sabem que Paul tem de se casar com Bettina. — E daí? Enquanto isso, posso ser amiga dele. — Amiga não é o termo exato. Chego a pensar que Paul a ama! Entre tanta coisa desagradável, finalmente uma frase enchia Cass de alegria. — Mesmo que seja verdade, nada impede que eles se casem. — Exatamente. — Então qual é a sua aflição? Evidente que não tem nada a ver com a minha tristeza. — Melancólica e amarga, ironizou: — Relaxe, irmãòzinho. Seu plano vai dar certo. Paul e Bettina ficarão juntos. — Viu que a palidez tomou conta do rosto de William. Era como se ele tivesse visto um fantasma. A expressão aterrorizada despertou em Cassidy uma suspeita terrível: — Céus! Você está atolado nisso até o pescoço, não está? Você e Bettina... juntos!!! A culpa de William estava expressa nas mãos que se contorciam, no canto da boca trémula, nos olhos. Tudo nele o denunciava. Vacilante, mal conseguiu dizer: — Não... não sei do que está falando... Tudo o que fiz foi... para o bem de todos. Cassidy ficou imóvel, estarrecida, como se não o conhecesse. A figura patética à sua frente não podia ser seu irmão, mas era. Apavorado, covarde, à espera da catástrofe iminente, William sempre vivera assim, acuado pela própria existência. Já não era raiva, mas um profundo pesar que a dominava. Soou estranho ouvir a própria voz, muito mais fria que o habitual, dizer: — Se o que o preocupa é perder o emprego por minha causa, sossegue, não importa quanto esteja metido nas armações de Bettina. William Penno, que havia poucos minutos rugia feito um leão, ameaçador e prepotente, agora decaíra. Tornara-se servil e medroso. Seus olhos azuis pareciam de vidro, opacos e vazios.