1. Boletim Laboral
Jurisprudência
1. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 774/2019
No passado dia 28 de janeiro de 2020 foi publicado no diário da república n.º 18 o Acórdão do Tribunal
Constitucional n.º 774/2019. Este Acórdão declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória
geral, da norma constante do n.º 2 do artigo 398.º do Código das Sociedades Comerciais, na
parte em que determina a extinção do contrato de trabalho, celebrado há menos de um ano, de titular
que seja designado administrador da sociedade empregadora, por violação do disposto na alínea d)
do n.º 5 do artigo 54.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição da República Portuguesa.
O fundamento da norma objeto de fiscalização prende-se com a pretensão do legislador em assegurar
o princípio da incompatibilidade entre as funções de administrador e de trabalhador. A
justificação deste princípio assenta, usualmente, em três ordens de motivos:
1. Impossibilidade estrutural da acumulação das funções: incompatibilidade entre o estatuto de
subordinação inerente à condição de trabalhador e o cargo de administrador, que se identifica
com a posição do empregador;
2. Necessidade de proteger a independência dos administradores, prevenindo potenciais
conflitos de interesses.
3. Preservação do modelo legal de governação das sociedades anónimas, que atribui ao
Conselho de Administração (e não aos trabalhadores) a competência quanto às decisões
fulcrais da empresa, assentando num princípio de livre destituição dos administradores. A
confusão nas mesmas pessoas da posição administrador e de trabalhador (cujo
despedimento depende de justa causa) poria em causa tal finalidade.
Ora, neste acórdão procedeu-se à análise da constitucionalidade do preceito legal previsto no n.º 2
do artigo 398.º, nomeadamente na parte final, onde se prevê, em relação a trabalhadores que venham
a ser a ser designados como administradores, a extinção do contrato de trabalho, consoante este
tenha duração superior ou inferior a um ano.
A extinção do contrato, prevista nestes termos, trata-se, indiscutivelmente, de uma causa de
caducidade do contrato, especialmente prevista na lei.
O legislador presume que a celebração de um contrato de trabalho em data próxima da designação
como administrador constitui conduta fraudulenta com o objetivo de assegurar a posição futura do
titular.
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Coloca-se, portanto, a questão da qualificação da norma como integrante do conceito jurídico-
constitucional como legislação do trabalho e, consequentemente, o problema da sua sujeição, no
processo legislativo, à participação das associações sindicais e das comissões de trabalhadores.
O Tribunal Constitucional estabeleceu de forma reiterada e uniforme que o estabelecimento de uma
causa de caducidade do contrato de trabalho deve inserir se no âmbito de legislação laboral. Para
tal, considera que a previsão de uma causa de caducidade do contrato liga-se diretamente ao direito
à segurança no emprego, consagrado no artigo 53.º da Constituição.
A norma em análise introduz uma causa de extinção da relação jurídico-laboral o que é tido como uma
matéria de estatuto jurídico-laboral. Neste sentido, não pode deixar de se considerar como uma
matéria específica deste ramo do direito, nomeadamente para efeitos do direito de participação das
organizações representativas dos trabalhadores.
Ora, não existindo qualquer referência na norma objeto de apreciação à audição prévia das
organizações representativas dos trabalhadores, deve, pois, considerar-se preterida tal obrigação
constitucional, padecendo a norma de um vício de natureza formal.
Por razões de segurança e equidade, são ressalvados os efeitos produzidos até à data da
publicação da declaração de inconstitucionalidade, isto é, até 27 de janeiro de 2020.
2. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 16-1-2020 (Proc. n.º 8952/16)
A jurisprudência deste Tribunal considerou, no âmbito das Convenções Coletivas e para efeitos da
interpretação do artigo 502.º, n.º 6 do Código do Trabalho, relativamente à publicação do aviso de
caducidade, esta não produz efeitos constitutivos. Mais ainda, alerta para a circunstância destes
efeitos da caducidade da convenção coletiva, se a publicação não tiver ocorrido, apenas são oponíveis
aos trabalhadores que estejam por ela abrangidos mediante uma comunicação escrita por parte da
entidade empregadora, conforme aliás decorre do disposto no artigo 109.º, n.º 1 do Código do
Trabalho.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-12-2019 (Proc. n.º 14752/16)
Neste Acórdão o Supremo Tribunal de Justiça considerou que a publicação do aviso estipulado no
artigo 502.º, n.º 6 do Código do Trabalho não é condição necessária para a caducidade de um IRCT.
Em sentido oposto, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (11 de outubro de 2018) que
considerou que os efeitos da caducidade dependem da publicação.
Para sustentar esta posição, considera que o artigo 506.º, n.º 2 impõe apenas a publicação. Ora, se
não se prevê a obrigatoriedade de depósito, os serviços administrativos não exercer qualquer
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fiscalização relativamente à verificação da caducidade e, bem assim, dos deveres previstos no artigo
501.º, n.ºs 3 a 5 do Código do Trabalho.
Esta jurisprudência considera, não obstante, que sempre que tal aviso não seja publicado, “a
caducidade só será oponível aos trabalhadores quando o empregador os informar por escrito” da
mesma, nos termos estabelecidos no artigo 109º, n.º 1, do Código do Trabalho.
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29 de janeiro de 2020 (Proc. n.º
3323/19.1T8LSB.L1-4)
I– Para efeitos do disposto na Cláusula 14.ª do CCT APFS/FETESE, o gozo das férias não obsta a
que se considere que o trabalhador prestava serviço no novo local de trabalho há mais de 120 dias.
II– De acordo com o n.º 4 da Cláusula 14ª do referido CCT não se transmitem para o novo empregador
os créditos que nos termos do CCT e das leis em geral já deveriam ter sido pagos, ou seja, os créditos
que já se mostravam vencidos no momento em que se operou a mudança de empregador.
Legislação
- Portaria n.º 27/2020, de 31.01: procede à atualização anual do valor do indexante dos apoios sociais
(IAS) para 2020, que passar a ser 438,81€. Produz efeitos a partir de dia 1 de janeiro de 2020.
- Portaria n.º 28/2020, de 31.01: procede à atualização anual das pensões e de outras prestações
sociais atribuídas pelo sistema de segurança social, das pensões do regime de proteção social
convergente atribuídas pela CGA e das pensões por incapacidade permanente para o trabalho e por
morte decorrentes de doença profissional, para o ano de 2020.
- Portaria n.º 29/2020, de 31.01: estabelece a atualização dos valores do complemento extraordinário
das pensões de mínimos de invalidez e velhice do regime geral de segurança social, do regime
especial das atividades agrícolas, do regime não contributivo e regimes equiparados e dos regimes
transitórios dos trabalhadores agrícolas, bem como das pensões de mínimos de aposentação, reforma
e sobrevivência do regime de proteção social convergente, para 2020.
- Portaria n.º 30/2020, de 31.01: estabelece a idade normal de acesso à pensão de velhice em 2021,
que passa a ser 66 anos e 6 meses. O fator de sustentabilidade aplicado ao montante estatutário das
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pensões de velhice passa a 0,8480. Esta Portaria produz os seus efeitos a partir do dia 1 de janeiro
de 2020.
- Proposta de decreto-lei que procede à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 301/2000, de 18
de novembro
No ordenamento jurídico português, a proteção dos trabalhadores contra os riscos ligados à exposição
a agentes cancerígenos ou mutagénicos durante o trabalho é regulada pelo Decreto-Lei n.º 301/2000,
de 18 de novembro, que sofreu a primeira alteração pelo Decreto-Lei n.º 88/2015, de 28 de maio,
transpondo a Diretiva 2004/37/CE.
Com vista a garantir o avanço de medidas neste âmbito, a Diretiva 2004/37/CE foi alterada pela
Diretiva (UE) 2017/2398 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro, que vem
reforçar as práticas da vigilância médica, nomeadamente após o termo da exposição a agentes
cancerígenos ou mutagénicos no local de trabalho e atualizar o quadro de referência dos valores
limites para a exposição dos trabalhadores a estes agentes. Cumprindo as exigências da Diretiva,
altera-se Decreto-Lei no sentido de garantir a possibilidade de o médico ou a autoridade
responsável prolongarem a vigilância médica adequada, caso se verifique a existência de risco
para a saúde ou segurança do trabalhador.
Após o termo da exposição a agentes cancerígenos ou mutagénicos no local de trabalho e atualizar
o quadro de referência dos valores limites para a exposição dos trabalhadores a estes agentes.
Cumprindo as exigências da diretiva, altera-se o presente decreto-lei no sentido de garantir a
possibilidade de o médico ou a autoridade responsável prolongarem a vigilância médica adequada,
caso se verifique a existência de risco para a saúde ou segurança do trabalhador, nos resultados da
avaliação referida no número 2 do artigo 3.º da Diretiva 2004/37/ CE.
- Decreto Legislativo Regional n.º 2/2020/M
Aprova o valor da retribuição mínima mensal garantida para vigorar na Região Autónoma da Madeira,
que passa a 650,88 euros.
- Despacho n.º 2836-A/2020, de 2 de março (COVID-19)
Determina que os empregadores públicos que, à data, ainda não tenham elaborado um plano de
contingência, o façam no prazo de cinco dias úteis, contados da data de publicação do despacho (2
de março de 2020), alinhado com as orientações emanadas pela Direção-Geral da Saúde (DGS),
disponíveis em https://www.dgs.pt/corona-virus, nomeadamente a Orientação n.º 6/2020, de
26/02/2020, devendo remeter cópia do mesmo à Direção-Geral da Administração e do Emprego
Público (DGAEP), através do endereço eletrónico covid19@dgaep.gov.pt.
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- Despacho n.º 2875-A/2020, de 3 de março (COVID-19)
Determina que o impedimento temporário do exercício da atividade profissional dos beneficiários,
reconhecido por autoridade de saúde, no exercício das competências previstas no artigo 5.º do
Decreto-Lei n.º 82/2009, de 2 de abril, no contexto de perigo de contágio pelo COVID -19, seja
equiparado a doença com internamento hospitalar, para efeitos do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de
fevereiro, não ficando a atribuição do subsídio de doença sujeita a prazo de garantia, índice de
profissionalidade e período de espera, sendo o montante diário do subsídio de doença calculado pela
aplicação à remuneração de referência das seguintes percentagens:
a) 100 % nos 14 dias iniciais;
b) 55 % para o período de duração inferior ou igual a 30 dias;
c) 60 % para o período de duração superior a 30 e inferior ou igual a 90 dias;
d) 70 % para o período de duração superior a 90 e inferior ou igual a 365 dias;
e) 75 % para o período superior a 365 dias.
O disposto supra aplica-se a trabalhadores do Estado e do setor privado.
O disposto supra não se aplica aos trabalhadores aos quais seja possível assegurar o recurso a
mecanismos alternativos de prestação de trabalho, nomeadamente o teletrabalho ou programas de
formação à distância.
Quando os trabalhadores não possam comparecer ao trabalho, por motivos de doença ou por
assistência a filho, neto ou membro do agregado familiar, nos termos gerais, essas ausências seguem
o regime previsto na lei para essas eventualidades.
O despacho produz efeitos a partir do dia 03 de março de 2020.
Comentário
Pese embora Despacho n.º 2875-A/2020, de 3 de março – que determinou que os empregadores
públicos tenham de elaborar e enviar à Direção-Geral da Administração e do Emprego Público um
plano de contingência alinhado com as orientações emanadas pela Direção-Geral da Saúde (DGS) –
seja obrigatório apenas para empregadores públicos, os empregadores privados não são,
naturalmente, alheios às orientações emitidas pela DGS no que respeita a procedimento de
prevenção, controlo e vigilância do COVID-19 nas empresas.
O empregador é responsável por organizar os Serviços de Saúde e Segurança do Trabalho (SST) de
acordo com o Regime jurídico da promoção da segurança e saúde no Trabalho estabelecido pela Lei
6. 6
n.º 102/2009, de 10 de setembro, sendo sua obrigação assegurar os seus trabalhadores condições
de segurança e de saúde, de forma continuada e permanente, tendo em conta os princípios gerais de
prevenção.
Com efeito, as empresas do setor privado deverão seguir as Orientações da DGS, designadamente
a Orientação n.º 6/2020, de 26/02/2020, da DGS, na qual se refere expressamente que para efeitos
de aplicação da mesma, “empresas” e “organizações” integram todos os ramos de atividade nos
setores público, provado ou cooperativo social.
As empresas têm um papel fulcral a desempenhar na proteção da saúde e segurança dos seus
trabalhadores, assim como são cruciais na limitação do impacte negativo sobre a economia e a
sociedade. Assim, é importante que os Planos de Contingência sejam desenvolvidos e atualizados
com a informação disponibilizada pela DGS, de forma a que sejam cumpridas as recomendações no
âmbito da prevenção e controlo de infeção pelo Coronavírus SARS-CoV-2 (COVID-19).
O Plano de Contingência deverá ser específico para responder a um cenário de epidemia pelo
coronavírus e deve envolver os Serviços de SST da empresa, os trabalhadores e seus representantes,
devendo responder a três questões basilares: (i) quais os efeitos que a infeção de trabalhador(es) por
SARS-CoV-2 pode causar na empresa?; (ii) o que preparar para fazer face a um possível caso de
infeção por SARS-CoV-2 de trabalhador(es)?; e (iii) o que fazer numa situação em existe um
trabalhador(es) suspeito(s) de infeção por SARS-CoV2 na empresa?
Adicionalmente, é importante as empresas avaliarem as atividades que podem recorrer a formas
alternativas de trabalho ou de realização de tarefas, designadamente pelo recurso a teletrabalho,
reuniões por vídeo e teleconferências e o acesso remoto dos clientes. A Empresa deverá ponderar o
reforço das infraestruturas tecnológicas de comunicação e informação para este efeito.
A Orientação n.º 6/2020, de 26/02/2020 da DGE pode ser consultada aqui.
José Mota Soares
jose.soares@AndersenTaxLegal.pt