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PUBLICAÇÂO
MESSAGE
ÍNDICE
O PENSAMENTO ÚNICO				 4
DESINFORMAR					 6
SINAIS DO TEMPO					 8
IMPRENSA, PODERES E DEMOCRACIA			 10
RANKING MUNDIAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA 2011/12		 18
CABO VERDE AUTARQUICAS				 20
ANGOLA CAI NA LISTA					 22
HRW DENUNCIA DETENÇÕES				 24
ENTREVISTAS
JOSÉ MANUEL ROSENDO				 12
ALEXANDRE NETO					 24
JOSÉ MANUEL					 26
ARMANDO CHICOCA					 30
WILLIAM RONET					 32
RAFAEL MARQUES DE MORAIS				 34
BILL VIOLA						 INFORMATION
Nestas últimas décadas temos assistido a uma constante busca ao acesso
e rápida evolução dos multimedia. O computador acelerou todo o processo
e colocou cada vez
mais próximo o utilizador da realidade, independentemente dos limites do espaço.
A rede/internet e o computador pessoal, permitem actualmente que possamos ser
nós os criadores de informação, em qualquer lugar e a qualquer hora.
Vivemos numa sociedade de excessos e estes, como não podia deixar de ser,
atingem a informação, infelizmente na parte menos interessante ou seja na
que não traz desenvolvimento cultural ao receptor.
Faz sentido criar e desenvolver uma maior exigência, um mais profundo sentido
crítico dirigido ao conteúdo da informação; aceitar de imediato o que nos é
apresentado nos ecrãs e sem pesquisar até que ponto o conteúdo é verdadeiro
e a intenção com que nos é fornecido, é uma forma unilateral de adquirir
conhecimento: o receptor deve ter um comportamento mais crítico, exigente
e participativo.
Temos a possibilidade de filmar, fotografar, comunicar... podemos registar
qualquer acontecimento e colocá-lo online à disposição de todos os utilizadores
e difundir a mensagem a uma velocidade tal que, por vezes, ultrapassa as
barreiras dos grandes media como a televisão e a rádio.
A desvantagem desta evolução é que, por vezes, não conseguimos ter noção nem
controle sobre a veracidade da informação a que temos acesso; a facilidade com
que as noticias nos sao fornecidas atribuiu ao observador um papel passivo.
MESSAGE consiste numa pequena investigação que levanta questões sobre o
acesso à informação na actualidade. Esta evolução veio alterar, e muito, a forma
e atitudes dos agentes emissor e receptor: o receptor adopta a atitude de um
agente passivo, cada vez mais sujeito à manipulação. o emissor já não assume
um papel tão critico relativamente á matéria que publica. A Televisão, rádio e
imprensa disputam entre si em função de audiências e lucros: o sensacionalismo,
apodera-se cada vez mais do nosso quotidiano.
Enquanto cidadão, senti a necessidade de me envolver no seio deste ambiente
mediático para poder recolher algumas experiências de profissionais que lidam
com tal tipo de problemas diariamente: Os jornalistas, elementos intermediários,
é por eles que a informação é tratada e, à partida, é neles que nós confiamos a
veracidade e pertinência da notícia.
0	 						 1
JOHNATHAN BARNBROOK 					 RADIO SCOTLAND
2	 						 3
LE MONDE, JANEIRO DE 1995			 IGNACIO RAMONET O PENSAMENTO ÚNICO
1 Le Monde, 17 de Dezembro de 1994.
2 Cambio 16, Madrid, 5 de Dezembro de 1994.
3 Testemunho: a França do ano 2000 entrega ao seu primeiro ministro, as edições "Odile Jacob". Paris, 1994.
4 É conhecida a célebre resposta de M. Dominique Strauss-Kahn. The Wall Street Journal Europe, 18 de Março de 1993.
5 Será por isso que muitos intelectuais como Guy Debord se suicidaram nestas últimas semanas? WALTER CRONKITE
Aprisionados. Nas democracias actuais, cada vez mais cidadãos livres se sentem
aprisionados, presos por um tipo de doutrina envolvente que, insensivelmente
paralisa todos os espíritos rebeldes, inibindo-os, perturbando-os, paralisando-os
e acabando por suprimi-los.
Depois da queda do muro de Berlim, a derrocada dos regimes comunistas e a
desmoralização do socialismo, a arrogância, a soberba e a insolência deste novo
Evangelho atingiu um tal nível que pode-se, sem exagero, qualificar este furor
ideológico de moderno dogmatismo.
O que é o pensamento único? Tradução em termos ideológicos com pretensão
universal das vantagens de um conjunto de forças económicas, estas, em
particular, do capital internacional. Ela foi formulada e definida desde 1944,
por ocasião dos acordos de Bretton-Woods. Os seus arautos principais são as
grandes instituições económicas e monetárias - Banco Mundial, Fundo Monetário
Internacional, Organização de Cooperação do Desenvolvimento Económico, Acordo
Geral sobre Tarifas Alfandegárias e Comércio, Comissão Europeia, Banco da
França, etc. - que, através dos seus financiamentos, recrutam ao serviço das suas
ideias, através de todo o mundo, inúmeros centros de pesquisas, universidades,
fundações que, por sua vez, elaboram e divulgam os ensinamentos.
Este discurso anónimo é retomado e reproduzido pelos principais órgãos de
informação económica, e nomeadamente pelas "bíblias" dos investidores e dos
representantes das bolsas de valores - The Wall Street Journal, Financial Times,
The Economist, Far Eastern Economic Review, os Echos, Agência Reuter, etc.,
pertencentes, quase sempre, aos grandes grupos industriais e financeiros.
Em todos os lugares, faculdades de ciências económicas, jornalistas, ensaístas,
homens políticos, e outros, retomam os novos ensinamentos destas novas tábuas
da lei e, por intermédio dos veículos de comunicação de massa, os repetem até
a náusea. Sabendo de forma pertinente que, nas nossas sociedades de mídia,
a repetição vale pela demonstração.
O primeiro princípio do pensamento único é tão forte que um marxista distraído
não o recusaria: o económico prevalece sobre o político. Fundando-se em tal
princípio, por exemplo, um instrumento tão importante quanto o Banco da França
tornou-se, sem oposição, independente em 1994 e, de alguma maneira, "colocado
ao abrigo dos credos políticos". "O Banco da França é independente, apolítico e
imparcial" afirma o seu expoente máximo, M. Jean-Claude Trichet, que entretanto
acrescenta: "nós pregamos a redução dos déficits públicos" e nós perseguimos
uma estratégia de moeda estável 1
. Como se estes dois objectivos não fossem
essencialmente políticos! É em nome do "realismo" e do "pragmatismo" - que
M. Alain Minc se expressa da maneira seguinte: "O capitalismo não pode afundar,
pois ele é o estado natural da sociedade. A democracia não é o estado natural da
sociedade. O mercado sim 2
. A economia é alçada à posição de comando. Uma
economia desligada dos obstáculos do social, cujo peso por decorrência seria a
causa da recessão e da crise.
Os outros conceitos-chaves do pensamento único são conhecidos: o mercado,
ídolo onde "a mão invisível corrige as asperezas e as deseconomias do
capitalismo" e particularmente os mercados financeiros, onde "os sinais
orientam e determinam, o movimento geral da economia"; a concorrência e a
competitividade, que "estimulam e dinamizam as empresas levando-as a uma
permanente e benéfica modernização"; o livre-comércio sem barreiras, "factor
de desenvolvimento ininterrupto do comércio e das sociedades", também a
mundialização da produção manufactureira e os fluxos financeiros; a divisão
internacional do trabalho que "modera as reivindicações sindicais e baixam os
custos salariais"; a moeda forte, “factor de estabilidade”; a desregulamentação;
a privatização; a liberalização, etc. Sempre "menos Estado", uma arbitragem
constante a favor dos lucros do capital em detrimento dos custos do trabalho.
E uma indiferença no tocante ao custo ecológico.
A repetição constante, em todas as mídias, deste catecismo3
por quase todos os
homens políticos, tanto de direita quanto de esquerda4
, confere-lhe uma tal força
de intimidação que abafa qualquer tentativa de reflexão livre, e dificulta
a resistência contra esse novo obscurantismo5
.
Poder-se-ia quase considerar que os 17,4 milhões de desempregados europeus,
o desastre urbano, a precarização geral, a corrupção, as periferias violentas,
o desastre ecológico, o retorno dos racismos, os integralismos e os extremismos
religiosos, a massa de excluídos são apenas miragens, resultado de delírios,
fortemente discordantes do melhor dos mundos que se edifica para nossas
consciências anestesiadas, o pensamento único.
4	 	 			 	 5
TRADUZIDO POR JAERSON LUCAS BEZERRA
INFORMAÇÃO, MANIPULAÇÃO 				 ALAIN WOODROW DESINFORMAR
ELES SÃO 84% A CONSIDERAR QUE FORAM MANIPULADOS
DURANTE A GUERRA DO GOLFO. “ELES”? QUANDO SE SABE QUE
NÃO SÃO OS CONSUMIDORES DOS MEDIA (N.T: UTILIZO SEMPRE
O PLURAL LATIM MEDIA PARA O (S) MEIO(S) DE INFORMAÇÃO) QUE
ASSIM SE EXPRIMEM, MAS MAIS DE TREZENTOS JORNALISTAS,
QUESTIONADOS PELO L'EXPRESS E POR RÉPORTERS SANS
FRONTIERES, ATRAVÉS DO INSTITUTO DE SONDAGENS FRANCE
OPINIONS, DE 4 A 10 DE FEVEREIRO DE 1991, VERIFICA-SE QUE
O MAL-ESTAR É REAL.
UM MAL-ESTAR QUE, INCUBADO DESDE OS ACONTECIMENTOS DA
ROMÉNIA — E MESMO BEM ANTES — FOI CRUELMENTE REVELADO
POR UMA GUERRA ANUNCIADA COMO A MAIS MEDIÁTICA DA
HISTÓRIA, MAS QUE ACABOU POR SER A MAIS SECRETA. QUARENTA
E DOIS DIAS DE COMBATES QUASE CLANDESTINOS.
UMA GUERRA SEM IMAGENS E ONDE AS INFORMAÇÕES ERAM
CUIDADOSAMENTE FILTRADAS. ENORME NARIZ DE PALMO E MEIO
FEITO A UMA MÁQUINA DE COMUNICAÇÃO QUE SE JULGAVA
TODA-PODEROSA.
OS JORNALISTAS DESCOBRIRAM BRUSCAMENTE A FRAGILIDADE
DA PROFISSÃO E A JACTÂNCIA DAS SUAS PRETENSÕES. A SUA
AUTOCRÍTICA, NESTA SONDAGEM, E IMPIEDOSA: 75% PENSAM QUE
A COBERTURA DA GUERRA FEITA PELA TELEVISÃO FOI “JORNALISMO-
ESPECTÁCULO” E 53% RECEIAM QUE A CONFIANÇA DEPOSITADA PELA
OPINIÃO NOS MEDIA SAIA ENFRAQUECIDA DA GUERRA.
MAIS SURPREENDENTE É QUE 63% CONSIDERAM A CENSURA
MILITAR “NORMAL” EM TEMPO DE GUERRA E 78% QUE A AUTO-
CENSURA SE JUSTIFICA. MAIS INESPERADO AINDA, 81% ACREDITAM
QUE FORAM MANIPULADOS PELAS FONTES MILITARES ALIADAS E
APENAS 68% PELAS FONTES IRAQUIANAS! CURIOSA LIÇÃO PARA
A DEMOCRACIA.
HARRY GRUYAERT				 	 TV SHOTS
Se a primeira vítima da guerra, de acordo corn Rudyard Kipling, é a verdade, a
segunda poderiam muito bem ser os informadores. Eis os jornalistas, normalmente
tão susceptíveis quando a sua liberdade é posta em causa, a deitarem mão,
eles próprios, à tesoura de Anastásia. Como se não lhes bastasse, qual Fabrício
em Waterloo, haverem sido mantidos à distancia nos bastidores da guerra,
consideram normal que lhes ponham uma venda nos olhos.
Aproveitando o desnorte dos jornalistas, maioritariamente adeptos da censura,
apesar das vozes isoladas (Marcel Trillat na A2 — N.T: Antena 2, um dos canais
estatizados da televisão francesa) ou corporativistas (o sindicato SNJ-CGT de
jornalistas) que lavraram protestos, os poderes públicos queriam reforçá-la ainda
mais. Em Franca, o Conselho Superior do Audiovisual (N.T: CSA — o equivalente
da Alta Autoridade portuguesa) intervinha junto dos canais de televisão, o
primeiro-ministro multiplicava as admoestações e alguns parlamentares criaram
mesmo um observatório dos media para acautelar os interesses que, em sua
opinião, deveriam ser defendidos.
Felizmente que os media aceitaram dizer a verdade, mesmo que não fosse nada
mais do que a verdade e ainda menos toda a verdade...
Nesta sondagem deve notar-se também a clivagem entre a imprensa escrita e
o audiovisual. Menos de um terço (30%) dos profissionais da primeira dizem que
os media informaram os franceses de modo satisfatório sobre a guerra, enquanto
os seus colegas do audiovisual a pensar assim são duas vezes mais numerosos
(60%). O antagonismo é grave na medida em que ultrapassa os simples ciúmes
profissionais para mexer com a deontologia que lhes está subjacente.
Será que a informação pela imagem é também de natureza — e não apenas
de grau — diferente da informação escrita?
Redactor do suplemento Rádio-Televisão do Le Monde, tenho um pé, digamos
assim, em cada um dos dois campos. Escrevo, é verdade, mas a propósito da
televisão: formado na escrita, julgo o visual; fiel ao texto, sou também seduzido
pela imagem. Este posto de observação permite-me, como a Jano, espreitar
para os dois lados ao mesmo tempo. Permite-me, sobretudo, constatar que a
imagem está a matar a escrita. Imagem insolente e, além disso, pervertida pelo
dinheiro. É assim que todos os media, sob o jugo da imagem, se deixam pouco
a pouco desviar do seu objectivo — informar — para se tornarem, por sua vez,
manipuladores.
Perante este desvio funesto é imperioso gritar alto-lá! A credibilidade dos
jornalistas diminui ano após ano, de sondagem em sondagem. A falsa carnificina
de Timisoara, o processo encenado do casal Ceausescu e o blackout no Golfo:
os pés de barro do colosso “Comunicações” aparecem à luz do dia.
No entanto o colosso ainda está de pé e este quarto poder esmaga, com o seu
poderio tecnológico e o seu magistério usurpado, os outros três poderes. Ora,
apesar de tudo, ele tem um papa vital a desempenhar para garantir o equilíbrio
da nossa democracia.
É mais do que tempo para reflectir sobre a informação, designadamente no
audiovisual. Porque a sua fiabilidade não acompanha, nem de perto nem de longe,
os meios técnicos cada vez mais aperfeiçoados postos a sua disposição. Como
conciliar a instantaneidade e o rigor? Não é certamente adoptando o “modelo
CNN”, essa torneia de imagens contínuas, como imaginam alguns políticos de
base da profissão: verificação dos factos, rigor e honestidade. Ou, parafraseando
Peguy (N.T: escritor francês deste século): dizer totalmente as verdades tolas e
dificilmente as verdades difíceis.
33 - 37
6	 						 7
RTP, CANAL 2, LISBOA, 20 DE OUTUBRO DE 1988 	 JOSÉ MANEL BARATA-FEYO SINAIS DO TEMPO
NAQOYQATSI GODFREY REGGIO			 	 2002
Qualquer um de nós, cidadão contemporâneo, sabe menos, em relação àquilo que
deveria saber, do que os cidadãos dos séculos XVIII ou XIX.
Ou seja, a ignorância cresceu e aumentou à medida que cresceu e aumentou a
informação. É que o mundo tornou-se mil vezes mais complexo e, para saber tanto
quanto os nossos avós, teríamos que saber mil vezes mais. Tarefa impossível.
Acontece então que o cérebro do homem contemporâneo sofre como que uma
espécie de náusea que o leva a rejeitar parte da informação que lhe é oferecida.
O acontecimento da primeira página dos jornais ou de abertura dos noticiários
nas rádios e nas televisões, quase que por regra, desaparece no dia seguinte,
empurrado por outro acontecimento, ao qual está reservado o mesmo destino.
A notícia torna-se assim em algo sem princípio nem fim, afinal destinada ao
alçapão de um imediato esquecimento. Para contrariar esta tendência que,
levada ao extremo, faria com que, quanto mais informação recebêssemos mais
ignorantes seríamos, tornou-se necessário criar espaços de acalmia onde seja
possível ultrapassar a espuma da forma e do ritmo para ir mais fundo na reflexão.
Tal é o propósito deste seu programa a que chamámos Sinais do Tempo. [...]
8	 						 9
[...]
A TIRANIA DA COMUNICAÇÃO		 IGNACIO RAMONET IMPRENSA, PODERES E DEMOCRACIA
EM CAUSA ESTÁ UMA NOTÍCIA COM O TÍTULO «RECESSÃO:
PRIMEIRO-MINISTRO RESPONDE A SOARES DOS SANTOS QUE “NÃO
BASTA SER RICO PARA SER BEM-EDUCADO”», QUE FOI PARA A LINHA
DA LUSA NO DIA 18 DE FEVEREIRO, ÀS 22:54.
A REACÇÃO DO PRIMEIRO-MINISTRO A ANTERIORES DECLARAÇÕES
DE ALEXANDRE SOARES DOS SANTOS, QUE A LUSA TINHA
DIVULGADO ANTES, NÃO ME FOI TRANSMITIDA PELO PRÓPRIO
JOSÉ SÓCRATES, MAS POR UM ASSESSOR DE IMPRENSA, JOÃO
MORGADO FERNANDES, QUE NÃO QUERIA SER IDENTIFICADO. OU
SEJA, A DECLARAÇÃO DO PRIMEIRO-MINISTRO ERA PARA COLOCAR
NA BOCA DO PRÓPRIO SEM QUE ELE A TIVESSE DITO (POR TELEFONE)
OU ESCRITO (EM COMUNICADO), COMO EU PEDI QUE O FIZESSE. POR
SEU LADO, TAMBÉM NÃO A PODIA ATRIBUIR AO PRIMEIRO-MINISTRO,
ACRESCENTANDO “COMO DISSE À LUSA UM ASSESSOR”.
NESTE CASO, TRATANDO-SE, A MEU VER, DE UMA OPINIÃO/
COMENTÁRIO INSULTUOSO – “NÃO BASTA SER RICO PARA SE SER
BEM EDUCADO” –, NÃO TERIA ACEITADO IGUALMENTE QUE O
ASSESSOR DE IMPRENSA PUDESSE FALAR EM NOME DO PRIMEIRO-
MINISTRO. ESTÁ EXPRESSO NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS
JORNALISTAS QUE AS OPINIÕES DEVEM SER SEMPRE ATRIBUÍDAS
AOS PRÓPRIOS.
NÃO TENHO QUALQUER DÚVIDA DE TER TOMADO A DECISÃO MAIS
CORRECTA.
SOFIA BRANCO, AGOSTO DE 2012
PEDRO ROSA MENDES
Porque razão se desmoronou esta nobre concepção do jornalismo? Como é que se
passou de uma espécie de glorificação do jornalista, herói da sociedade moderna
em meados dos anos 70, para a situação actual em que, transformado em “novo
cão de fila”, ocupa o lugar cimeiro numa escala de descrédito?
Intervieram considerações de vária ordem, algumas tecnológicas, outras políticas,
económicas e também de linguagem.
Podemos considerar que a viragem na abordagem teórica da informação se situou
no ano de todos os acontecimentos que foi 1989. É possível que existissem, antes
dessa época, elementos prenunciadores, mas foi só então que o fenómeno se
tornou mediaticamente perceptível.
No nosso meio intelectual, a verdade que conta é a verdade mediática. Que
verdade é essa? Quando, a propósito de determinado acontecimento, a imprensa,
a rádio e a televisão dizem que é algo é verídico, é ponto assente que isso é
verídico. Mesmo que seja falso. De facto, actualmente a verdade é aquilo que
os media propagam como tal.
Ora o único meio que os cidadãos dispõem para confirmar se uma informação é
verídica é confrontar os discursos dos diferentes media. Então, se todos afirmam
a mesma coisa, não nos resta senão aceitar esse discurso único...
O discurso de propaganda é, falando com propriedade, um discurso de censura,
mas a censura, em contrapartida, não é necessariamente do tipo da propaganda.
Esta consiste em suprimir, em amputar, em proibir um certo número de aspectos
dos factos, ou até a totalidade dos factos, a oculta-los, a escondê-los. Se a
censura existe ainda sob esta forma nos regimes autocráticos e nas ditaduras,
ela funciona, sabemos isso, de outra maneira nos países desenvolvidos,
aparentemente democráticos, Encontramos aí pouquíssimos exemplos de
uma censura primária, que venha ocultar, cortar, suprimir, proibir factos.
A censura já não funciona desta maneira, o que não significa que não exista.
Ela assenta apenas noutros critérios, mais complexos, económicos, comerciais
ou inversos dos da censura autoritária.
Como se oculta hoje a informação? Através de um aumento de informações:
a informação é dissimulada ou truncada porque há demasiada para consumir.
E não chegamos mesmo a aperceber-nos da que falta.
Porquanto uma das grandes diferenças entre o universo em que vivemos há alguns
decénios e aquele que o precedeu, é que a informação já não é (mas foi-o, durante
séculos) uma matéria rara. Antes da época moderna, dizia-se que quem detinha a
informação detinha o poder, entendendo-se este como o controle da circulação da
comunicação. Hoje, a informação é superabundante, tal como os quatro elementos
(ar, água, terra, fogo ), e torna-se por isso, incontrolável.
Tudo isto cria uma espécie de tela, uma tela opaca, que oculta, que torna
eventualmente mais difícil do que nunca, para o cidadão, a procura da informação
justa. pelo menos, no sistema anterior, a pasmaceira que a proibição provocava
era visível, sabíamos que eram ocultadas imagens, informações.
Nos anos 60 e 70, na época do regime dos militares no Brasil, tal como em
França durante a guerra da Argélia, alguns jornais publicavam as suas páginas
em branco no lugar dos artigos que a censura tinha proibido. Não os publicavam,
mas mostravam a marca dos artigos, o que, paradoxalmente, tornava visível
essa censura. Agora que a situação já não é visível, precisamos de desenvolver
um esforço de reflexão ainda maior para conseguirmos compreender os novos
mecanismos em que ela assenta. Não podemos contentar-nos com a tese da
trama, em que uma comissão secreta puxaria todos os cordelinhos; a realidade
dos media é bem mais complexa.
O que ira acontecer no futuro? Certamente outro desvario, visto que o sistema de
informação está descontrolado, ninguém o orienta. Porquê? Exactamente porque
este tipo de informação, assegurada por um grande número jornalistas satisfeitos,
dá a impressão de informar um vasto público que recebe essa informação com
o mesmo contentamento como se se tratasse de um divertimento...
43 - 50
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ENTREVISTA DE RICARDO DIAS A JOSÉ MANUEL ROSENDO			 JULHO DE 2012
NASCEU NO PINHAL NOVO, HÁ 46 ANOS, FOI NA RÁDIO LOCAL DESTA
FREGUESIA DO CONCELHO DE PALMELA QUE INICIOU A CARREIRA NO
JORNALISMO. FREQUENTOU UM CURSO DE JORNALISMO NO CENJOR
E EM 1993 ENTROU PARA A RÁDIO PRESS. AINDA NESSE COMEÇOU
A TRABALHAR NA ANTENA 1.
É AUTOR DE UM LIVRO “DE ISTAMBUL A NASSÍRIA” - CRÓNICAS
DA GUERRA NO IRAQUE, QUE TEM POR BASE QUATRO REPORTAGENS
FEITAS, PELO JORNALISTA DURANTE TRÊS MESES DE TRABALHO NO
TERRENO, ENTRE MARÇO DE 2003 E ABRIL DE 2004.
GANHOU, RECENTEMENTE, O PRÉMIO GAZETA DE RÁDIO 2011.
O CLUBE DE JORNALISTAS DISTINGUIU A REPORTAGEM “TAHIA LÍBIA”
SOBRE OS PRIMEIROS DIAS DA REVOLTA EM BENGAZZI E O TRABALHO
“DESCOBRIR A LIBERDADE”.
Eu acho que é a grande questão, ou seja, nós vivemos a ilusão, até um
determinado momento em que o facto de termos acesso à informação, através
da internet, vivemos a ilusão de que podemos saber tudo e de que temos acesso
a tudo e até que todos podíamos ser jornalistas. Há aí uma coisa que se chama
o “cidadão jornalista”, que eu não sei bem o que é.
Sim, eu também te posso deitar numa marquesa, pôr um estetoscópio e ouvir
a tua batida do coração. Mas isso não faz de mim um médico, certo? Portanto,
colocar informação na internet não faz das pessoas jornalistas, porque fazer
jornalismo obedece a uma série de critérios que as pessoas têm que conhecer
e respeitar, para que possam ser considerados informação jornalística...
Não basta tirar uma fotografia de um acontecimento e colocá-la na net sem
a explicar, porque a própria fotografia pode deturpar a realidade.
Tiveste agora o exemplo daquela fotografia ou imagem que foi utilizada durante
o Euro 2012, de uma alemã a chorar. Ela até está a processar a UEFA por uma
razão muito simples: a imagem de uma cidadã alemã a chorar pela eliminação do
seu país foi, na verdade, obtida no momento em que tocava o hino da Alemanha,
antes do jogo. Portanto, cada vez mais é preciso ter muito cuidado com a internet;
é importantíssimo aprender a saber “peneirar” a informação.
Há informação de todo o lado sobre tudo e mais alguma coisa, muitas vezes
informação contraditória e depois as pessoas não têm forma de saber qual
é a verdadeira; sentem-se a nadar no meio de tanto excesso de informação.
É aí que entra a presença do jornalista no circuito para dar o carimbo de
credibilidade à informação: o papel do jornalista, nesse circuito de informação,
é cada vez mais essencial.
Diz-se que o jornalismo um dia destes vai desaparecer, porque as pessoas têm
acesso directo à informação e porque elas próprias produzem informação, mas
isso é uma falácia. É exactamente ao contrário: o excesso de informação faz com
que cada vez mais seja necessária a presença do jornalista no circuito, para dar
o carimbo de credibilidade à informação.
Na internet, há as páginas oficiais das organizações, não é!? É suposto que
a informação que essas páginas têm, seja correcta ou não, correspondam à versão
oficial das organizações em relação às mais variadas matérias, portanto isso pode
ser um ponto de partida. Um caso recente: o curriculum do Miguel Relvas, as
declarações que ele fez quando foi eleito deputado relativamente ao curriculum
dele e que fazem parte do arquivo da Assembleia da República é suposto ele ter
dito mesmo aquilo e, portanto, isso é um elemento que é um ponto de partida
e é válido. Tu tens agora, relativamente à situação na Síria. É preciso ter muito
cuidado com aquela informação que está a ser veiculada nos blogs, no Facebook,
porque é informação que tu tens que ter sempre o pé atrás porque, sobretudo em
situações de conflito, a guerra da informação é tremenda.
Eu recordo-me, por exemplo, em relação à Líbia havia um blog de uma
suposta blogger que mais tarde se veio a saber que era um homem) e que veio
pedir desculpas enfim... houve montes de gente a ir atrás daquilo. Portanto,
relativamente a isso, o meu conselho e só um: se eu quero falar com alguém e se
quero saber a sua opinião não vou à internet, vou falar com a pessoa. A internet é
uma coisa para nos entretermos. Eu não estou a dizer que não há coisas credíveis,
há coisas credíveis, há sites, sabemos quem é a pessoa, sabemos o que ela
escreve, conhecemos portanto, supostamente, que aquilo que está no seu blog
corresponde à verdade.
Por exemplo em relação às “primaveras árabes” até houve quem dissesse
que eram as revoluções Facebook, quer dizer isso é tudo muito bonito, dá para
a malta conversar no café, é giro, é uma frase bonita, faz um título engraçado
na imprensa, mas a revolução não foi feita pelo Facebook ele foi uma ferramenta,
só isso. Eu quando digo Facebook são todas essas plataformas online.
Foram essas ferramentas que ajudaram, mas da mesma forma que há cinquenta
anos o telefone ajudava. Há cem anos não havia fax, não havia televisão e,
portanto, a informação demorava muito mais tempo a circular, as coisas eram
mais difíceis e mais demoradas mas só nesse aspecto, quer dizer, não é o
instrumento que faz a revolução.
Sabendo nós que vivemos uma “guerra” de excesso de informação, como se lida
com uma situação destas? Como é que o jornalista acede, trata e confia no que se
pode chamar informação, hoje?
De facto, principalmente com o nascimento da internet, parece que cada cidadão
pode tomar o papel de jornalista e ele próprio fornecer informação aos outros
cidadãos.
Sabemos que a internet não é um meio muito fiável de informar, mas para si,
como jornalista, despreza essas informações ou serve-se delas?
12	 					 13
UM ASSUNTO
CONSPIRAÇÃO.
COM
ROBERT
CORRESPONDENTE
DIZ UMA COISA
OS CONFLITOS
TANTO NOS JORNAIS
TEMPO, POR EXEMPLO, ÀS NOTÍCIAS
AS
JORNALISMO
TÊM PARA ALCANÇAREM
DEVE
QUALIFICAÇÕES,
HÁ NOTÍCIAS PARA O “DONO”, QUE É O
JORNALISTAS QUE FIZERAM AS NOTÍCIAS;
VEM DA
DE QUE O CRISTIANO
NÃO
AVIÃO DESCOLAR TRANSPORTANDO A
VEREM A
ESCORREGOU
A CERTEZA DE QUALQUER INFORMAÇÃO
QUE
COISA QUE É HÁBITO NO JORNALISMO QUE
CONSTATAR QUE
E NÃO O JORNALISTA PORQUE AS
NOTÍCIAS
SÉRIE DE SITES,
Altera, em primeiro lugar conduz à superficialidade, ou seja, nós só tratamos um
assunto pela rama e saltamos logo para outro, para outro e para outro...
Isso é um pouco teoria da conspiração. Mas é possível, sim. Acho que isso
é tratado dessa forma com objectividade e com intenção.
Há um senhor que se chama Robert Fisk. Ele escreve para o “The Independent”.
É o mais antigo correspondente ocidental no Médio Oriente.
Ele deve estar no Líbano, foi para lá em 1976 portanto há quase quarenta anos
que lá permanece. Diz uma coisa muito simples quando fala para os jovens
repórteres que lá aparecem. Aconselha-os a que levem um livro de história em
vez da internet, para perceberem como é que tudo aquilo evoluiu e os conflitos
que hoje surgem, pois são conflitos muito antigos que não nasceram ontem.
Depois há outra coisa que é o ciclo de vida das notícias, que eram quase de
24 horas tanto nos jornais como nas televisões. Na rádio era de hora em hora,
actualmente é de segundo em segundo na internet.
Portando há aqui um momento em que nós temos de parar para pensar o que
fazer da informação: se continuamos nesta corrida louca ou se realmente fazemos
uma triagem e damos mais tempo, por exemplo, às notícias que de facto são
notícias importantes, aprofundando essa informação e deixando cair aquilo que
é superficial, quer dizer aquilo que é “ruído”. Mas isso é um trabalho que os
jornalistas têm de fazer.
O problema aqui é que as empresas de comunicação, actualmente, têm
muitos mais interesses para além do jornalismo e o jornalismo acaba por ser
um instrumento na mão delas e dos seus interesses económicos muito diferentes.
Acaba por ser a guerra da informação e a guerra económica em que as empresas
esgrimem a comunicação que têm para alcançarem outro tipo de objectivos que
não o de informar e, se calhar, estamos no tempo em que é necessário voltar
a equacionar a quem se deve atribuir uma empresa de informação.
Para se exercer determinadas profissões é preciso ter determinadas qualificações,
mas qualquer pessoa pode ter um órgão de comunicação social.
Não há incompatibilidades ou seja, por exemplo, no Público há notícias
desagradáveis para o Belmiro de Azevedo? Alguém consegue encontrar alguma?
Tenho dúvidas... No Expresso há notícias desagradáveis para o Balsemão? Tenho
dúvidas... Na Cofina há notícias desagradáveis para o Paulo Fernandes? Tenho
dúvidas... Curiosamente há um sítio onde há notícias para o “dono”, que é o
Estado. Curiosamente é o serviço público que é atacado por toda a gente Porque
será? É o espaço onde há mais liberdade, havendo condicionalismos... Eu não
estou a dizer que é totalmente livre, estou a dizer que é o espaço onde há mais
liberdade. Toda as pessoas atacam o serviço público, porquê?
Porque querem acabar com esse espaço de liberdade...
Enquanto que antigamente uma notícia tardava em chegar, hoje ela é visualizada
quase no momento em que acontece...
Acha que, devido a essa evolução, o facto de a informação chegar de uma forma
mais rápida tem danificado a pertinência da mesma? Até que ponto os órgãos de
comunicação não estarão a manipular os cidadãos dando-lhes notícias a um tal
ritmo que eles nem podem aprofundar o conteúdo?
Altera, em primeiro lugar conduz à superficialidade, ou seja, nós só tratamos um
Isso é um pouco teoria da conspiração.
é tratado dessa forma com
Há um senhor que se chama Robert
É o mais antigo correspondent
Ele deve estar no Líbano, foi para lá em 1976 portanto há quase quarenta anos que lá permanece. Diz uma
vez da internet, para perceberem como é que tudo aquilo evoluiu e os
Depois há outra coisa que é o ciclo de vida das notícias, que eram quase de 24 horas tanto nos
Portando há aqui um momento em que nós temos de parar para pensar o que fazer da informação: se continuamos nesta corrida louca ou se realmente fazemos uma triagem e damos mais tempo, por exemplo, à
O problema aqui é que as
muitos mais interesses para além do jo
um instrumento na mão delas e
Acaba por ser a guerra da informação e a guerra económica em que as empresas esgrimem a comunicação que têm para
a equacionar a quem se deve
Para se exercer determinadas profissões é preciso ter determinadas quali
Não há incompatibilidades ou seja, por exemplo, no Público há notícias desagradáveis para o Belmiro de Azevedo? Alguém consegue encontrar alguma? Tenho dúvidas... No Expresso há notícias desagradáveis para o Balsemão? Tenho dúvidas... Na Cofina há notícias desagradáveis para o Paulo Fernandes? Tenho dúvidas... Curiosamente há um sítio onde há no
Porque querem acabar com
Às agências, normalmente, nós atribuímos mais credibilidade porque é suposto que a notícia, quando chega à agência, tenha percorrido os trâmites que respeitam os critérios jornalísticos ou seja, foram os jornalistas que fize
Portanto eu tenho, à partida e teoricamente, confiança na notícia que vem
da banana da internet. No caso,
Foi a EFE, que é a agência de noticias espanhola; não sei se acompanhaste isso, mas às tantas, estava a dar a notícia de que o
Quer dizer, a agência embarcou nisto. Eu
se foi um jornalista maduro ou se foi um jornalista verde, mas um jornalista um pouco maduro perceberia que não era fácil um avião descolar transpo
A EFE embarcou nisto e houve vários órgãos de informação que, ao verem
fez isso e portanto escorre
Eu não consigo estabelecer essas hierarquias; acho que as agências são confiáveis. Dos meus colegas espero exactamente a mesma coisa. No mínimo, quando não têm a certeza
Eu acho que é assim que
As fontes, os protagonistas é assim: quando tu pedes a opinião ou a versão ao protagonista é a versão dele; é evidente que nós também temos a obrigação de a tentar confirmar, para saber se ele está a mentir ou não, porque há uma coisa que é hábito no
Não digo que consigamos fazer isso sempre, porque muitas vezes é possível constatar
ser desmontado. Hoje em dia isso não é feito com essa história de ouvir as partes para validar a notícia; é insuficiente e às vezes é sinal de jornalismo preguiçoso. É preguiçoso o jornalismo e não o jornalista
Os jornalistas, sobretudo jornalistas mais
em operários das notíc
É curioso! Às vezes faço, através da internet, uma pesquisa sobre determinado assunto e vejo uma série de
PELA RAMA
MAS
FISK.
MUITO SIMPLES QUANDO
QUE HOJE
COMO NAS TELEVISÕES.
QUE DE FACTO SÃO NOTÍCIAS
EMPRESAS
E
DOS
OUTRO TIPO DE
ATRIBUIR
MAS QUALQUER
ESTADO. CURIOSAMENTE É O SERVIÇO PÚBLICO QUE É ATACADO
ESSE
PORTANTO EU, À PARTIDA, ESPERO
AGÊNCIA;
PENSO
RONALDO, NO REGRESSO DO
SEI
SELECÇÃO NACIONAL E NINGUÉM
NOTÍCIA NA
QUE ME ESTÃO A
AS
É: ACONTECE QUALQUER COISA QUE ENVOLVE DUAS
ELES NÃO
PESSOAS TAMBÉM TÊM UMA SÉRIE
NOVOS,
BLOGS, AGÊNCIAS
Que fontes é que considera mais confiáveis: as agências, os colegas ou
os próprios protagonistas da notícia?
Às agências, normalmente, nós atribuímos mais credibilidade porque é suposto
que a notícia, quando chega à agência, tenha percorrido os trâmites que
respeitam os critérios jornalísticos ou seja, foram os jornalistas que fizeram
as notícias; portanto eu, à partida, espero que esses jornalistas tenham feito
o percurso como ele deve ser feito: que tenham confirmado as informações,
que tenham confrontado as diversas partes envolvidas na notícia...
Portanto eu tenho, à partida e teoricamente, confiança na notícia que vem da
agência; curiosa e recentemente houve uma agência que escorregou na casca
da banana da internet. No caso, penso que até aconteceu no Twitter.
Foi a EFE, que é a agência de noticias espanhola; não sei se acompanhaste isso,
mas às tantas, estava a dar a notícia de que o Cristiano Ronaldo, no regresso do
europeu tinha perdido o avião porque tinha ficado para trás a fim de comprar um
bolo, num bar do aeroporto.
Quer dizer, a agência embarcou nisto. Eu não sei quem fez a notícia, não sei
se foi um jornalista maduro ou se foi um jornalista verde, mas um jornalista um
pouco maduro perceberia que não era fácil um avião descolar transportando a
selecção nacional e ninguém dar pela falta do Ronaldo. No mínimo parava dois
minutos para pensar e confirmar se aquilo era assim ou não.
A EFE embarcou nisto e houve vários órgãos de informação que, ao verem a
notícia na agência, seguiram aquele raciocínio, mas a agência parece que não
fez isso e portanto escorregou na casca da banana.
Eu não consigo estabelecer essas hierarquias; acho que as agências são
confiáveis. Dos meus colegas espero exactamente a mesma coisa. No mínimo,
quando não têm a certeza de qualquer informação que me estão a dar podem
da-la e fazer essa ressalva que é “eu acho que é assim mas não tenho a certeza,
portanto tem cuidado”.
Eu acho que é assim que as coisas devem ser feitas.
As fontes, os protagonistas é assim: quando tu pedes a opinião ou a versão ao
protagonista é a versão dele; é evidente que nós também temos a obrigação de a
tentar confirmar, para saber se ele está a mentir ou não, porque há uma coisa que
é hábito no jornalismo que é: acontece qualquer coisa que envolve duas pessoas;
nós ouvimos uma , ouvimos outra e o nosso trabalho está feito; mentira, nós
temos a obrigação de verificar se o que um e outro dizem corresponde à verdade,
tentar aprofundar até onde for possível.
Não digo que consigamos fazer isso sempre, porque muitas vezes é possível
constatar que eles não estão a dizer a verdade e, portanto, isso depois tem de
ser desmontado. Hoje em dia isso não é feito com essa história de ouvir as partes
para validar a notícia; é insuficiente e às vezes é sinal de jornalismo preguiçoso.
É preguiçoso o jornalismo e não o jornalista porque as pessoas também têm uma
série de coisas para fazer. Isso também tem um pouco a ver com a gestão. Hoje
em dia uma das formas de também condicionar a informação é retirar-lhe os
meios económicos.
Os jornalistas, sobretudo jornalistas mais novos, estão a ser transformados
em operários das notícias e não jornalistas.
É curioso! Às vezes faço, através da internet, uma pesquisa sobre determinado
assunto e vejo uma série de sites, blogs, agências de clipping, com textos iguais
ou seja, “copy paste”, iguais nas mais diversas fontes...
14	 			 			 15
assunto pela rama e saltamos logo para outro, para outro e para outro...
Mas é possível, sim. Acho que isso
objectividade e com intenção.
Fisk. Ele escreve para o “The Independent”.
te ocidental no Médio Oriente.
coisa muito simples quando fala para os jovens repórteres que lá aparecem. Aconselha-os a que levem um livro de história em
conflitos que hoje surgem, pois são conflitos muito antigos que não nasceram ontem.
jornais como nas televisões. Na rádio era de hora em hora, actualmente é de segundo em segundo na internet.
às notícias que de facto são notícias importantes, aprofundando essa informação e deixando cair aquilo que é superficial, quer dizer aquilo que é “ruído”. Mas isso é um trabalho que os jornalistas têm de fazer.
empresas de comunicação, actualmente, têm
ornalismo e o jornalismo acaba por ser
dos seus interesses económicos muito diferentes.
alcançarem outro tipo de objectivos que não o de informar e, se calhar, estamos no tempo em que é necessário voltar
atribuir uma empresa de informação.
ificações, mas qualquer pessoa pode ter um órgão de comunicação social.
otícias para o “dono”, que é o Estado. Curiosamente é o serviço público que é atacado por toda a gente Porque será? É o espaço onde há mais liberdade, havendo condicionalismos... Eu não estou a dizer que é totalmente livre, estou a dizer que é o espaço onde há mais liberdade. Toda as pessoas atacam o serviço público, porquê?
esse espaço de liberdade...
eram as notícias; portanto eu, à partida, espero que esses jornalistas tenham feito o percurso como ele deve ser feito: que tenham confirmado as informações, que tenham confrontado as diversas partes envolvidas na notícia...
da agência; curiosa e recentemente houve uma agência que escorregou na casca
penso que até aconteceu no Twitter.
Cristiano Ronaldo, no regresso do europeu tinha perdido o avião porque tinha ficado para trás a fim de comprar um bolo, num bar do aeroporto.
não sei quem fez a notícia, não sei
ortando a selecção nacional e ninguém dar pela falta do Ronaldo. No mínimo parava dois minutos para pensar e confirmar se aquilo era assim ou não.
a notícia na agência, seguiram aquele raciocínio, mas a agência parece que não
egou na casca da banana.
de qualquer informação que me estão a dar podem da-la e fazer essa ressalva que é “eu acho que é assim mas não tenho a certeza, portanto tem cuidado”.
as coisas devem ser feitas.
jornalismo que é: acontece qualquer coisa que envolve duas pessoas; nós ouvimos uma , ouvimos outra e o nosso trabalho está feito; mentira, nós temos a obrigação de verificar se o que um e outro dizem corresponde à verdade, tentar aprofundar até onde for possível.
que eles não estão a dizer a verdade e, portanto, isso depois tem de
porque as pessoas também têm uma série de coisas para fazer. Isso também tem um pouco a ver com a gestão. Hoje em dia uma das formas de também condicionar a informação é retirar-lhe os meios económicos.
novos, estão a ser transformados
cias e não jornalistas.
sites, blogs, agências de clipping, com textos iguais ou seja, “copy paste”, iguais nas mais diversas fontes...
Eu acho que não. Prejudica se nós tivermos consciência disto que eu acabei de
dizer, ou seja, a mim não me prejudica nada chegar a uma banca de jornais e ter
lá cinquenta, nos quais eu não confio e, portanto, não compro.
Eu acho que a liberdade deve existir; não devemos também agora entrar numa
atitude censória, até porque quem publica coisas, quer seja na internet, quer seja
noutro sítio qualquer, que não correspondem à verdade e que possam, de algum
modo, estragar a vida a outras pessoas, pode ser chamado à justiça. Isso não está
colocado de parte. Agora as pessoas também devem ter algum trabalho.
Não sei se podes generalizar, mas as pessoas querem tudo na bandeja e não
se preocupam em saber, dá algum trabalho, não é!? A telenovela é mais fácil.
É frequente por exemplo, ouvirmos as pessoas dizerem: Onde é que viste, onde
é que leste? Na internet. Mas na internet onde? Isto tem a ver com o nível de cada
comunidade , tem a ver com a educação que as pessoas têm, com a sua formação,
com a sua cultura.
Temos mais meios, mais recursos, o conhecimento está a níveis que nunca esteve.
É normal, tem evoluído. Porque é que temos mais desemprego e mais fome?
Porquê? Se calhar alguém se está a apropriar dos recursos que deviam
ser melhor distribuídos, não?
Porque acham que têm o direito de se apropriar, porque trabalham muito e são
muito inteligentes. Eu não percebo como é que há gestores que ganham prémios
de milhões, não percebo! Será que produzem assim tanta riqueza? Eu estou a falar
de riqueza real, não é a “multiplicação dos pães”, eles multiplicam o dinheiro, eles
não produzem riqueza, quer dizer, há aqui coisas que são diferentes, e ganham
milhões; e a informação é a mesma coisa: informação é poder!
Quem tem a informação pode geri-la, e gere... Depois gere em função dos
interesses que podem ser bons, podem ser maus, tanto podem ser interesses
altruístas, como podem ser muito sacanas...
No terreno é muito melhor, mas é assim: para quem está na redacção, a notícia
tem de chegar de alguma forma; pode chegar por um telefonema, por um alerta
numa agência de notícias, pelas BREAKING NEWS mas, a partir daí, começa
a desenvolver-se um processo que deve ser independente.
Quem é que consegue ser independente? Vamos lá ver. Primeiro temos que definir
o que é a independência, não é? Nenhum de nós é independente ao ponto de não
precisar dos outros, porque vivemos em sociedade. Temos de viver uns com os
outros.
Para se dizer que alguém é ou não independente é preciso primeiro definir muito
bem a que tipo de independência é que nos estamos a referir, e eu acho que o
jornalista tem um código deontológico, tem um estatuto que lhe dá as ferramentas
para ele ser independente; independente na construção da notícia, em saber quem
é que quer ouvir e como é que vai investigar, o que é que para ele é notícia, o que
é que não é notícia, o que é que é verdade, o que é que não é verdade, o que é
que está confirmado, o que é que não está...
Tem as ferramentas para ter essa independência. Agora “não pode estar de bem
com Deus e com o Diabo”. Não pode querer ser completamente independente,
porque a independência tem um preço, e porque vivemos em sociedade e temos
essa estrutura de empresas que têm interesses, hierarquias que se manifestam
em influências. O jornalista tem de saber viver dentro disto. Enquanto jornalista,
se eu tiver como objectivo chegar ao topo da hierarquia, tenho uma atitude, se
eu tiver objectivo ser jornalista, tenho outra.
É assim: só é condicionável quem se deixa condicionar. Eu posso atender
a algumas razões de factos importantes para travar uma notícia, por exemplo
em vez de dar a notícia agora, dá-la daqui a duas ou três ou quatro.
Há questões que são atendíveis, mas não por razoes políticas, atenção,
não estou a falar em razões políticas.
Será que este excesso de informação prejudica a liberdade que nós pensamos
que temos, devido a esta evolução dos meios?
Mas se existem mais meios e mais facilidade no acesso, porque será que não
os usamos de uma forma mais consciente, mais inteligente?
É mais fácil agir de uma forma independente no terreno ou na redacção?
Um jornalista ainda consegue ser independente?
Acha que o poder político pode controlar a forma “livre” como acedemos
à informação?
Sim, tenho uma. Por exemplo, lembro-me bem. Estava no Iraque e os homens
da GNR foram alvo de uma emboscada. Três ou quatro deles ficaram feridos e
eu estava lá com eles. Não estava na emboscada, mas estava no Iraque e soube
imediatamente que aquilo tinha acontecido.
Isto foi em 2004 e nessa altura as comunicações no Iraque eram muito difíceis,
porque eram só por satélite, não havia telemóveis, era preciso ligar o satélite.
O comandante da GNR lá percebeu que eu tinha sabido e houve um contacto
qualquer com o comando da GNR em Portugal, que me ligou a pedir para eu não
dar a notícia pois queriam primeiro avisar as famílias. Essa é uma razão atendível,
ou seja, eu não iria deixar de dar a notícia. Mas em vez de dá-la no momento em
que tive a informação, dei-a uma hora ou duas depois. Eu acho que é humano,
quer dizer, ninguém ganha nada e às vezes é uma competição estúpida entre
órgãos de informação, só porque deram primeiro a notícia.
Se o nosso objectivo é informar o público, não se ganha nada em dar a notícia
uma hora mais ou meia hora mais cedo e não vamos criar problemas com as
pessoas que são apanhadas de surpresa. Supondo que alguém pede que não
se dê a notícia porque vai prejudicar a carreira política. Aí tenho muita pena,
mas não atendo o pedido... As coisas, por vezes, são dadas de uma forma um
pouco sensacionalista, não é? Pois, para dar mais dimensão à notícia do que
aquela que ela realmente tem.
Eu acho que não tem tanto a ver com conteúdos, com a força intrínseca da
informação .Tem mais a ver com a forma. Na televisão diz-se normalmente que
não há imagem, não há notícia, certo? Na rádio se não há som, não há notícia;
neste aspecto os jornais têm mais facilidade porque, mesmo que não tenham
imagem, mesmo que não tenham som, basta terem falado com alguém que
disponibilize a informação, podem construir a notícia.
Eu acho que isto não devia ser assim e às vezes não é, mas as regras são estas:
se não há som a rádio tem alguma dificuldade em dar a notícia. Eu acho que não,
se nós temos a informação, se a validámos através dos critérios que conhecemos,
se há uma notícia, havendo som ou não, havendo imagem ou não, nós devemos
dá-la. Agora, de facto há essa ideia que eu não digo que seja boa ou seja má,
apenas que não concordo muito com ela.
Há uma fronteira cada vez mais esbatida entre aquilo que é informação e aquilo
que é entretenimento. Há aqui dois tipos de culpa. Para mim é feito em nome
das audiências e lá está, é feito em nome daquilo que as pessoas querem ver,
não em nome do que é importante, do que é notícia, não em nome dos critérios
que definem o chamado valor notícia. Portanto é feito em função daquilo que
supostamente as pessoas querem ver.
Há aqui dois tipos de culpa no meio disto. Em primeiro lugar há culpa dos
jornalistas. Perante a notícia que o Ronaldo foi comer um bolo, um editor devia ter
a coragem de dizer: “Está bem, que faça bom proveito”. Põe para o lado. Mas ele
não tem coragem de fazer isso porque, depois perante as audiências, aparecendo
a peça do Ronaldo, elas disparam.
O Ronaldo ir comer um bolo não é notícia em parte nenhuma do mundo, mas é um
momento de entretenimento para quem vê televisão: “olha que giro o Ronaldo foi
comer um bolo, e até tinha o chapéu com a pala virada para trás e mudou o brinco
para a outra orelha”.
Eu também gosto de ver essas coisas, também gosto de entretenimento, acho
que qualquer jornalista gosta. Também vamos ao cinema, se calhar espreitamos
as telenovelas, ficamos a ver o futebol, não tem mal nenhum. Não há aqui nenhum
fundamentalismo. Agora aquilo que é preciso, é estabelecer a fronteira.
O segundo culpado são as pessoas do entretenimento, porque elas sabem que,
por enquanto, o jornalismo é sinónimo de credibilidade. As pessoas ouvem o
jornalista e acreditam nele ou pelo menos deviam acreditar e, portanto, atraem
o jornalista para a sua área, beneficiando assim, dessa credibilidade.
Por sua vez o jornalista, muitas vezes, deixa-se abraçar neste abraço envenenado,
porque tem sede de protagonismo, gosta de aparecer. Portanto, há aqui uma
fronteira informação/entretenimento que está cada vez mais esbatida,
precisamente porque há esta conjunção de interesses, que não tem em causa
o interesse público, mas apenas as audiências, o protagonismo, etc...
Tem alguma experiência que possa partilhar?
Como trata a notícia para os diferentes meios?
Considera que a informação, mais particularmente nos meios audiovisuais,
é vista como entretenimento?
16					 	 17
RANKING MUNDIAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA 2011/12
Publicado em 25 de janeiro de 2012, a décima edição do Ranking da Liberdade de
Imprensa conclui que as mudanças têm sido abundantes e as alterações refletem
a actualidade no mundo árabe.
Muitos meios de comunicação social pagaram caro a cobertura das aspirações
democráticas desses movimentos de poder e de sobrevivência para os regimes
repressivos e totalitários. 2011 reflecte o papel desempenhado pelos internautas
para a divulgação de informações.
Repressão é a palavra do ano. Nunca a liberdade de informação foi tão associada
à democracia, nunca um jornalista envergonhou tanto os inimigos da liberdade,
nunca os actos de censura e os danos à integridade física dos jornalistas parecem
ter sido tantos.O trio infernal é composto pela Eritreia, Turquemenistão e Coreia
do Norte, ditaduras onde não há liberdade pública, ocupando, sem surpresa,
o fim da lista. Este ano, a Síria, o Irão e a China parecem ter perdido o contacto
com a realidade, sugados por uma espiral louca de terror. Igualmente o Bahrain
e o Vietnam, por excelência regimes opressivos. Outros países como Uganda
e a Bielorussia são igualmente enfraquecidos pela vantagem da repressão.
A classificação dos Repórteres sem Fronteiras, no período 2011/2012, mostra
que a Finlândia, Noruega e Países Baixos continuam a respeitar as liberdades
fundamentais, lembrando-nos que a imprensa independente deve ser preservada
em democracias fortes e que a democracia vive da liberdade de imprensa.
De no tar a entrada de dois países africanos: Cabo Verde e Namíbia, nos vinte
mais bem classificados. Dois países africanos onde nenhuma interferferência
foi apontada ao trabalho dos jornalistas durante o ano de 2011.
OS MOVIMENTOS DE PROTESTO
O mundo árabe tem sido o motor da história em 2011, contrastada pelas
evoluções políticas. Destaques para a Tunísia e o Bahrain, em lugares opostos:
a Tunísia, no lugar 134, progrediu 30 lugares num regime democrático que ainda
não dá espaço pleno a uma imprensa independente.
O Bahrain, no lugar 173, perdeu 29 lugares, devido à repressão implacável dos
movimentos democráticos, processos em série aos defensores dos direitos
humanos e bloqueio à liberdade.
A Líbia no 154, virou a página da Era Kadafi. O Iemen estagnou na posição 171,
assolado pela violência entre oposição e apoiantes do presidante Ali Abdullah
Saleh. Ambos os países têm um futuro incerto. A questão de dar um lugar à
imprensa continua por resolver.
O Egipto perde 39 assentos; posiciona-se no lugar 166, com as esperanças
democráticas a ficarem decepcionadas, onde o Conselho Supremo das Forças
Armadas, no poder desde fevereiro de 2011, teima em não acabar com a prática
decorrente da ditadura de Hosni Mubarak.
A Síria, no lugar 176, já estava colocada, em 2010, numa má classificação e
afundou ainda mais com a censura absoluta, vigilância generalizada, violência
aleatória e manipulação do sistema que tornou impossível o trabalho dos
jornalistas.
Noutras partes do mundo, alguns movimentos democráticos t~em procurado imitar
o exemplo árabe, mas foram recebidos com repressão feroz. Caso do Vietnam,
no lugar 172, onde as prisões se têm intensificado. O regime chinês, em 174, tem
assistido a alguns movimentos regionais e locais da pessoas contra as injustiças
e escândalos, o que tem fortalecido o controlo da informação e o aumento das
detenções extrajudiciais; também uma censura apertada na internet.
Violência, ameaças e detenções têm explodido no Azerbeijão, no lugar 162,
onde o regime autocrático de Ilham Aliev não hesitou em lançar internautas na
prisão, sequestrar jornalistas de oposição e fechar meios de comunicação social
estrangeiros. Uganda, no lugar 139. O regime do presidente Yomen Museveni
lançou uma ofensiva, sem precedentes, contra os movimentos da oposição e
meios de comunicação independentes, após as eleições de fevereiro de 2011.
Da mesma forma o Chile, no lugar 80, perde 47 lugares, devido a numerosas
violações da liberdade de informação, muitas vezes cometidas por forças de
segurança, contra os movimentos estudantis. Os Estados Unidos, na posição 47,
também desceu 27 lugares, com adetenção de vários jornalistas que firezam a
cobertura do movimento “Ocupar Wall Street”.
MICHAEL NAJJAR			 		 NETROPOLIS
VÁRIOS PAÍSES EUROPEUS ABANDONAM O RESTO DO CONTINENTE.
O ranking destaca a tenda de alguns países com o resto do continente.
A repressão do protesto para a reeleição do presidente Lukashenko, em Belarus,
é perder 14 assentos (168). Num momento em que ele aparece como um modelo
regional. Túrquia (148, menos 10 lugares), opera um enorme retrocesso. Longe
das reformas prometidas, a justiça lançou ataques a jornalistas, numa escala sem
precedentes, desde o regime militar.
Dentro da EU, o ranking reflecte uma certa falta de progresso, sempre marcada
por uma clara divisão entre os países tradicional e altamente cotados (Finlândia,
Países Baixos) e aqueles, como A Bulgária (80), Grécia (70) e Itália (61) que não
resolvam os seus problemas com a liberdade de imprensa, principalmente pela
falta de vontade política sobre o assunto. França, ela cresceu ligeiramente,
passando de 44 para o lugar 38, tal como a Espanha (39) e Roménia (47).
Liberdade de Imprensa é mais do que nunca um desafio na Península Balcânica,
presa entre o desejo de integração europeia e os efeitos deletérios da crise
económica.
A PERPETUAÇÃO DA VIOLÊNCIA
Vários países são marcados por uma cultura de violência contra a imprensa, que
está definitivamente implantada. Vai ser difícil de reverter, sem uma luta eficaz
contra a impunidade. México e Honduras são, respectivamente, na posição 149
e 135. Paquistão (151) é, para o segundo ano consecutivo, o país mais letal para
os jornalistas. Somália (164), em guerra há vinte anos, que em nada sugere uma
situação de caos, onde os jornalistas pagaram um alto preço.
Irão (175), a repressão e humilhaão de jornalistas foram erguidas por muitos anos
na cultura política do poder. O sistema alimenta-see de repressão da Media.
Iraque (152) despencou 22 lugares e aproxima-se, perigosamente, de sua posição
em 2008 (158)
VARIAÇÕES SIGNIFICATIVAS
Sul do Sudão, jovem nação enfrenta vários desafios, fez a sua estreia no ranking
para a posição de honra (111), para este subconjunto de qualquer um dos países
mais bem classificados. Sudão (170), Birmânia (169). É avaliado ligeiramente
melhor do que em anos anteriores, seguindo as mudanças políticas nos últimos
meses e que tenham mostrado alguma promessa, no entanto a ser confirmada.
Níger (29) registou o maior aumento do ranking, com 75 assentos conquistados
por uma transição política bem sucedida.
É também o continente africano que representa as maiores quedas: Djibouti,
ditadura pouco discreta do corno de África, perdeu 49 assentos (159). Malawi
(146) perdeu 67 assentos por causa da deriva totalitária do seu presidente, Bingu
Wa Mutharika. Citado acima, Uganda (139) perdeu 43 lugares (139) perdeu 43
lugares. Finalemte entre So Campos de Laurent Gbagbo e Quattara Alassane, que
atingiu a imprensa.
Na América Latina, a queda mais sensível recaiu o Brasil, está no 99,
uma descida de 41 pontos, devido à grande insegurança que se reflectiu,
em particular, pela trágica morte de três jornalistas e blogueiros.
18						 	 19
Assomada, Cabo Verde, 19 jul (Lusa) - As equipas de reportagem da delegação
da Televisão de Cabo Verde (TCV) em Santa Catarina de Santiago estão a ser
acompanhadas por polícias à paisana no terreno, devido às sucessivas ameaças
à integridade física dos jornalistas.
Em causa está a inédita repetição, devido a fraudes eleitorais, da votação
autárquica, no domingo, em duas pequenas localidades - Boa Entrada e Cruz
Grande - de Santa Catarina de Santiago, na ilha de Santiago, de cujos resultados
depende a eleição do novo presidente da câmara, o que tem gerado um clima de
tensão política
num concelho com cerca de 60.000 habitantes.
Julieta Tavares, delegada e jornalista da TCV há sete anos na Assomada ("capital"
de Santa Catarina de Santiago), disse à Lusa serem recorrentes as ameaças à sua
integridade física por parte de vários atores políticos,
que não especificou, razão pela qual apresentou, desta
vez, uma queixa na polícia local.
"É muito difícil trabalhar aqui em Santa Catarina, porque é uma região de gente
simples, mas também complicada a nível político. Tudo é politizado e dificilmente
se consegue ficar à margem da política. Ou se é A ou B. Não se pode ser C", disse,
lembrando que já foi várias vezes perseguida até casa.
"Já me ameaçaram bater, perseguiram-me até casa e disseram que vão fazer tudo
para me tirar daqui. Como sou delegada da TCV, todos pensam que fui nomeada
pelo poder", desabafou, frisando a isenção, "por todos reconhecida", do seu
trabalho.
Lembrando que já durante a campanha das autárquicas de 01 deste mês se
viveram momentos de tensão, Julieta Tavares sublinhou "não ser normal" haver
um órgão de comunicação social "com segurança policial" para poder trabalhar.
À Lusa, o comandante regional de Santiago Norte da polícia cabo-verdiana,
Alcides da Luz, confirmou a presença da polícia junto à delegação da TCV para
acompanhar, por precaução, os jornalistas nas reportagens.
"Recebemos uma denúncia da delegada (da TCV) e tomámos as medidas que
devíamos tomar. Neste momento, temos um polícia colocado na delegação",
disse. Também à Lusa, Valdemar Pires, diretor da TCV, disse estar “preocupado
e apreensivo” com a violação aos direitos dos jornalistas, lembrando que Cabo
Verde surgiu em 9.º lugar no último “ranking” mundial sobre liberdade de
imprensa. “Onde estamos? Estamos a falar de Cabo Verde, que é considerado um
‘farol’ de democracia em África, o nono país do mundo em liberdade de imprensa?
É lamentável”, sublinhou, frisando que a situação obrigou a direção da televisão
pública cabo-verdiana a enviar para a Assomada uma equipa de trabalho da sede,
na Praia.
“Qual é a finalidade destas pessoas? Gostam de intimidar jornalistas?
Esta situação indigna a sociedade cabo-verdiana no seu todo”, frisou.
A presidente da Associação de Jornalistas Cabo-Verdianos (AJOC),
Carla Lima, responsabilizou também os partidos políticos pela atual situação.
Carla Lima salientou a importância da colaboração da polícia e considerou
intimidações e ameaças lamentáveis e pediu aos partidos políticos - Partido
Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) e Movimento para a
Democracia (MpD) - um “papel pedagógico” junto de dirigentes, militantes
e apoiantes.
DELEGADO DA ANGÊNCIA LUSA, EM CABO VERDE	 JOSÉ SOUSA DIAS CABO VERDE/AUTÁRQUICAS
NAQOYQATSI			 		 GODFREY REGGIO 2002
ANGOLA CAI NA LISTA DOS REPÓRTERES SEM FRONTEIRAS
Alguns regimes enfrentaram fortes reivindicações políticas e sociais”, referiu o
documento, acrescentando que a polícia tentou reprimir com violência em muitos
casos, isso foi o caso de Angola que os governantes tem que aprender que a
contestação a má governação não se resolve com violência mas sim com mais
reformas sociais.
Brasil e Angola caíram na lista dos Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que classifica
a liberdade de imprensa no mundo, e Cabo Verde está entre os dez países que
lideram o ranking, revela um relatório hoje divulgado.
Entre os países lusófonos, uma das quedas mais sensíveis no ranking foi a do
Brasil, que passou do 58.º lugar em 2010 para 99.º em 2011, em resultado da
morte de três jornalistas e bloguers.
“No norte e nordeste do país, como nas regiões de fronteira com o Paraguai, a
corrupção local, as atividades do crime organizado ou os atentados contra o meio
ambiente são temas perigosos para os jornalistas, mas também para os bloguers”,
sublinhou o relatório.
Embora os RFS tenham reconhecido avanços na luta contra a impunidade, detetou
também substanciais diferenças em função das regiões, com grandes pressões
dos poderes locais.
“Muito embora a primavera árabe não se tenha estendido à África subsaariana,
ao ponto de ter provocado a queda de governos, alguns regimes enfrentaram
fortes reivindicações políticas e sociais”, referiu o documento, acrescentando
que a polícia tentou reprimir com violência em muitos casos.
“Este foi o caso em Angola, que ficou em 132.º lugar (104.º em 2010), onde vários
jornalistas foram detidos durante as manifestações de setembro”, avançou o
documento.
Várias manifestações e marchas foram organizadas por grupos de jovens, tendo
sido muitos presos e enfrentado julgamentos em tribunais angolanos.
O primeiro Estado não europeu do ranking é Cabo Verde, que ocupa a 9.ª posição
(subiu na tabela, já que em 2010 ocupava o 26.º lugar).
O relatório diz que Cabo Verde é uma “democracia saudável, modelo de boa
governação, onde a alternância faz parte da vida política, como se constatou nas
eleições presidenciais do verão passado. Os jornalistas são completamente livres
e o acesso de todas as forças políticas aos meios de comunicação públicos está
assegurado”.
A Guiné-Bissau sofreu uma queda na lista, passando de 67.º lugar em 2010 para
75.º em 2011, num país em que a agitação política, os sucessivos assassínios e
golpes contra o governo são uma constante.
Portugal ascendeu na tabela, passando do 40.º lugar em 2010 para 33.º em 2011.
Timor-Leste e Moçambique também subiram no ranking, de 93.º lugar em 2010
para 86.º em 2011, e da 98.ª posição em 2010 para 66.ª em 2011, respetivamente.
A Guiné Equatorial, que pediu a adesão à Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP), passou de 167.º lugar em 2010 para 161.º em 2011.
Depois da Finlândia e da Noruega, que partilham o primeiro lugar na tabela,
surgem a Estónia e a Holanda, ambas no segundo lugar, seguindo-se a Áustria,
Islândia e Luxemburgo. Por oposição, no final da lista, estão a Eritreia, a Coreia
do Norte, o Turquemenistão, a Síria, o Irão, a China, o Bahrein, o Vietname,
o Iémen e o Sudão.
Para realizar este índice, que abrange 179 países, a RSF dirigiu um inquérito a 18
associações de defesa da liberdade de expressão nos cinco continentes, aos seus
150 correspondentes, bem como a jornalistas, investigadores, juristas e militantes
dos direitos humanos.
O documento refere-se a ataques diretos contra jornalistas e cibernautas (mortes,
detenções, agressões, ameaças) e a meios de comunicação social (censura,
apreensões, perseguições e pressões).
20						 	 21
CIRCULO ANGOLANO INTELECTUAL, JANEIRO 26, 2012
A HRW, DENUNCIA AS DETENÇÕES ARBITRÁRIAS DE OPOSITORES DO REGIME
À medida que se vão aproximando as eleições em Angola, marcadas para 31 de
agosto, aumenta a tensão no país e sucedem-se as denúncias de atropelos aos
direitos fundamentais e de repressão. Esta quinta-feira (05.07) foi a vez da Human
Rights Watch (HRW) fazer, num comunicado, severas acusações ao regime de
José Eduardo dos Santos.
Leslie Lefkow directora-adjunta da divisão africana da Human Rights Watch
(HRW) expressa a sua apreensão pela “vaga de abusos graves cometidos contra
manifestantes”. Segundo a HRW estes abusos são “um sinal alarmante de que
o governo angolano não aceita a dissidência pacífica”.
ESCALADA DE VIOLÊNCIA NA REPRESSÃO DAS MANIFESTAÇÕES EM ANGOLA
Desde 2011 que em Angola se têm realizado protestos públicos, sem precedentes,
encabeçados por movimentos juvenis e veteranos de guerra. Os jovens
reivindicam reformas económico-sociais e o afastamento do poder do presidente
José Eduardo dos Santos. Os veteranos de guerra exigem benefícios sociais há
muito devidos.
A HRW refere que ao longo do último ano, “agentes da polícia angolana, fardados
e à paisana, têm reagido às manifestações juvenis com repressões cada vez mais
violentas, apesar da pequena escala dos protestos, e detiveram vários líderes
juvenis, jornalistas e líderes da oposição”. Neste momento estarão detidos pelo
menos 28 veteranos de guerra.
JOVENS ATIVISTAS TAMBÉM FORAM ALVO DE AMEAÇAS
Os organizadores das manifestações de jovens tem sido igualmente visados e
ameaçados por causa das suas atividades, denuncia a HRW. Todos os líderes de
protestos juvenis que falaram recentemente com a Human Rights Watch disseram
sentir “que correm perigo de vida”.
A organização inumera vários casos. “ A 14 de junho, Gaspar Luamba, estudante
universitário e organizador do movimento de protestos juvenis, foi raptado ao
meio-dia por quatro homens vestidos à civil, numa universidade no bairro de
Viana, em Luanda”, pode ler-se no comunicado.
“Levaram-me para um estaleiro de construção da empresa brasileira Odebrecht
e interrogaram-me durante várias horas”, contou Luamba à HRW. “Exibiram facas
e alicates e ameaçaram usá-los. Perguntaram-me se os partidos da oposição nos
estavam a financiar e quanto é que queríamos. Ameaçaram-me a mim e aos meus
colegas com a adoção de medidas drásticas caso nos recusássemos a negociar.
Mas não me agrediram fisicamente.”
Outro organizador dos protestos juvenis, Adolfo Campos, foi atacado e ameaçado
de morte por dois homens vestidos à civil a 12 de junho. “Dois Land Cruisers
forçaram-me a parar o carro na estrada às 22:00 horas.
Saí do carro e dois indivíduos armados com uma pistola e uma metralhadora
automática bateram-me na cara com as armas. Caí no chão e um deles apontou-
me a sua arma.
O outro disse: ‘Não o mates já. Vamos’”. Disse que os agressores revistaram
o carro mas limitaram-se a levar o seu telefone, tendo deixado 3000 dólares
intactos. Um dia antes, a 11 de junho, o conhecido músico de rap e organizador
de protestos juvenis, Luaty Beirão, foi detido pelas autoridades portuguesas no
aeroporto de Lisboa, após a polícia ter detetado um pacote de cocaína numa roda
de bicicleta, a única bagagem que trazia no voo de Luanda, devido a receios de
que a bagagem pudesse ser adulterada.
De acordo com os meios de comunicação social, um tribunal de Lisboa ordenou
rapidamente que Beirão fosse libertado, com base em fortes indícios de que
agentes da polícia angolana haviam colocado a droga na sua bagagem para
o incriminarem.
HRW apela aos parceiros de Angola para que ergam a voz para acabar com a
violência “O uso crescente de violência, ameaças e outras represálias destinadas
a silenciar organizadores de protestos é alarmante”, afirma Leslie Lefkow.
“Os parceiros regionais e internacionais de Angola deveriam erguer as suas vozes
e urgir o governo a pôr termo à violência e a respeitar os direitos fundamentais.”
No próximo dia 31 de agosto terão lugar eleições em Angola , sufrágio que
definirá o futuro presidente do país. José Eduardo dos Santos, líder do MPLA,
que ocupa o poder há 33 anos, é candidato à sua própria sucessão.
O AMBIENTE PARA OS MEDIA SEMPRE FOI RESTRITO EM ANGOLA.
NOTAMOS, CLARAMENTE, A PREOCUPAÇÃO DOS PRÓPRIOS
JORNALISTAS, DE FAZER COBERTURA DESTE TIPO DE INCIDENTES
COMO AS MANIFESTAÇÕES CONTRA O GOVERNO QUE TÊM SOFRIDO
REPRESÁLIAS, VIOLÊNCIA, MAS TAMBÉM AMEAÇAS.
LISA RIMLI, ACTIVISTA DA HRW.
DEUTSCHE WELLE, 5 DE JULHO DE 2012		 HELENA FERRO DE GOUVEIA
BENTO BEMBE, DESMENTIU AS DENÚNCIAS DA HRW
Segundo Bento Bembe, a Secretária de Estado para os Direitos Humanos de
Angola é várias vezes consultada pela HWR para situações de violação de direitos
humanos que acontecem em Angola, mas os dados que divulgou na semana
passada “não são verídicos”.
Num comunicado divulgado na quinta-feira passada, a HRW denunciava que pelo
menos 50 veteranos de guerra foram detidos numa manifestação no passado dia
20 de junho e cerca de 30 permanecem na prisão.
“Essa informação não corresponde à verdade”, sintetizou Bento Bembe, instado
a reagir às denúncias da HRW.
No seu comunicado, a HRW, com sede em Nova Iorque, apelou às autoridades
angolanas para que libertem os detidos e garantam o seu acesso imediato à
assistência legal.
“As autoridades devem urgentemente investigar os alegados raptos de vários
organizadores de protestos” (contra o Governo de Angola), pedia a HRW na nota.
A organização de defesa dos direitos humanos denunciou igualmente supostos
sequestros, por parte das forças de segurança de Angola, de opositores e líderes
das manifestações, que foram detidos dias antes dos protestos e mantidos presos
durante dias para impedir que se manifestassem.
O secretário de Estado iniciou a conferência de imprensa com a leitura de
um relatório de 17 páginas sobre o “Estado dos Direitos Humanos em Angola”,
onde destacou que foram alcançados nos últimos anos “importantes progressos
e melhorias que concretizam o objetivo principal do Executivo de melhorar
constantemente a qualidade de vida do povo angolano”.
No relatório, Bento Bembe apontou a falta de cultura dos cidadãos para exigirem
o respeito dos seus direitos.
Bento Bembe repetiu várias vezes que o papel da sua Secretaria de Estado não é
resolver os problemas, mas apenas identificá-los e apontar soluções, para que as
autoridades competentes os resolvam.
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LUSA, 10 DE JULHO DE 2012
INDEPENDÊNCIA E SE DIRIGIAM PARA
COLHEITA EM
MATERIAL PRECIOSO. QUANDO
EU
NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL SÃO IMAGENS INÉDITAS
A SITUAÇÃO SE DESANUVIOU. Q
COM AS MESMAS
QUER FAZER;
PASSADO, ÉRAMOS
QUE NÃO
QU
TERRENO. O FACTO DE
SUBLINHO ISTO PORQUE
UM PANFLETO DESTES, SUBVERTIDO, ESTÁ-SE A LEGITIMAR A REACÇÃO
NATURAL DA PROVÍNCIA DO HUAMBO, TEM 45 ANOS.
TRABALHOU NA RÁDIO NACIONAL DE ANGOLA, NO JORNAL
DE ANGOLA E NA TELEVISÃO PÚBLICA REGIONAL DO HUAMBO.
É, ACTUALMENTE, CORRESPONDENTE DA VOZ DA AMÉRICA,
EM LUANDA
ENTREVISTA DE CRISTINA MAGALHÃES A ALEXANDRE NETO 		 JULHO DE 2012
No dia 3 de Setembro de 2011, eu acho que tive um dos momentos mais difíceis vividos na minha vida. Acompanhei o movimento dos jovens, que se manifestavam na Praça da Independência e se dirigiam para
Eu estava satisfeito porque tinha feito uma boa colheita em
Quando estava a preparar-me para retirar apercebi-me de indivíduos à paisana, à civil; percebi que estavam a olhar fixamente para mim... Eles perceberam que eu tinha um material precioso. Quando
por causa do ambiente que eu
Não conseguiram tirar o gravador nem a máquina fotográfica. Foi muito difícil, porque eu resisti e não me apercebi que um deles tinha dado a volta e atacou-me com paulada por trás... Mas eu estava determinado a não largar os meus meios materiais, eram preciosos, aliás as imagens que circulam hoje pela Internet e nos meios de comunicação social são imagens inéditas
A senhora percebeu que eu estava embaraçado, que não tinha dinheiro e disse que ia assumir a despesa. Fiquei ali resguardado, saindo daquele vulcão, só quando a situação se desanuviou.
Fiquei sem documentos durante muitos meses. Quando ia à polícia, porque eles queriam que eu participasse do caso, parecia-me que me cruzava com as mesmas pe
O que me motiva fazer a cobertura destes movimentos é o sentimento, a percepção de que ninguém quer fazer;
Eu noto que, quando nós começámos em Abril do ano passado, éramos
A minha preocupação é não querer ter sentimentos de culpa. Então um jornalista que não
Não é bom ambiente, normalmente, o qu
Como sabe, a profissão de jornalismo tem este inconveniente. É a probabilidade, muito grande, de nós nos contagiarmos emocionalmente com situações que se vivem no terreno. O facto de
A manipulação que se regista em Angola é da mais grosseira que existe no mundo, é da mais grosseira que existe no mundo. Eu sublinho isto porque os
Chegou a acontecer numa destas manifestações em que os jovens criaram um código de conduta; distribuíram esse código na perspectiva de amainar espíritos e, sobretudo, tornar a manifestação pacifica e eles pegaram no panfleto, (estou a falar da televisão publica) subverteram o conteúdo, no sentido contrário àquele de pacificação ou manifestação pacífica. Isto quer dizer o quê? Quando se cria um panfleto destes, subvertido, está-se a legitimar a
O PALÁCIO PRESIDENCIAL, ONDE QUERIAM
TERMOS
ME INTERPELARAM, AGARRARAM-ME NOS
QUERIA
MINHAS....E PORQUE EU SABIA O VALOR QUE TINHA
QUANDO VOLTEI A SAIR DO
PESSOAS QUE ESTAVAM À
MAS O QUE
UM NÚMERO
VAI COBRIR UM
UE
NÓS ESTARMOS EM CONTACTO
OS ÓRGÃOS PÚBLICOS DE
DE ÓRGÃOS DE SEGURANÇA, ESTÁ-SE A MOTIVAR OS ÓRGÃOS DE
No dia 3 de Setembro de 2011, eu acho que tive um dos momentos mais difíceis
vividos na minha vida. Acompanhei o movimento dos jovens, que se manifestavam
na Praça da Independência e se dirigiam para o palácio presidencial, onde
queriam chegar. A dada altura do percurso a segurança decidiu que tinham de
parar a marcha nas imediações da igreja da Sagrada Família. Então ali foi o ponto
mais difícil que tivemos...
Eu estava satisfeito porque tinha feito uma boa colheita em termos de
reportagem: tinha factos, tinha elementos, tinha dados...
Quando estava a preparar-me para retirar apercebi-me de indivíduos à paisana,
à civil; percebi que estavam a olhar fixamente para mim... Eles perceberam que
eu tinha um material precioso. Quando me interpelaram, agarraram-me nos dois
braços e nas duas mãos, perguntando porque é que eu estava a filmar. Eu tinha
numa mão uma câmera pequena, muito discreta e na mão direita um gravador,
por causa do ambiente que eu queria captar. Eles queriam este material.
Não conseguiram tirar o gravador nem a máquina fotográfica. Foi muito difícil,
porque eu resisti e não me apercebi que um deles tinha dado a volta e atacou-me
com paulada por trás... Mas eu estava determinado a não largar os meus meios
materiais, eram preciosos, aliás as imagens que circulam hoje pela Internet e nos
meios de comunicação social são imagens inéditas minhas....e porque eu sabia o
valor que tinha este material, havia sangue a correr, os manifestantes tinham sido
atacados, e eu não queria perder aquela documentação histórica. Bateram em
mim e eu, descontrolado, larguei as pastas e entrei para um restaurante ao lado.
Pedi uma água e, quando quis pagar, só ai me apercebi que não tinha dinheiro,
porque largara a pasta.
A senhora percebeu que eu estava embaraçado, que não tinha dinheiro e disse
que ia assumir a despesa. Fiquei ali resguardado, saindo daquele vulcão, só
quando a situação se desanuviou. Quando voltei a sair do restaurante lembro-me
de ver alguns colegas da Lusa e da RTP, que também estavam a reclamar pelo
controlo; queriam ter o seu material, que tinha sido confiscado...
Fiquei sem documentos durante muitos meses. Quando ia à polícia, porque eles
queriam que eu participasse do caso, parecia-me que me cruzava com as mesmas
pessoas que estavam à civil na manifestação. Achava isso contraproducente, ir
à policia reclamar junto de pessoas que, aparentemente, eram as mesmas que
tinham sido atacantes.
O que me motiva fazer a cobertura destes movimentos é o sentimento, a
percepção de que ninguém quer fazer; mas o que me motiva a ir é perceber que,
no decorrer dessas manifestações, normalmente não há cobertura jornalística.
Eu noto que, quando nós começámos em Abril do ano passado, éramos um
número de jornalistas, mas este número foi decrescendo, muita gente desistiu.
A minha preocupação é não querer ter sentimentos de culpa. Então um jornalista
que não vai cobrir um evento destes, penso que não dorme bem com a sua
própria consciência.
Não é bom ambiente, normalmente, o que se vive nas manifestações em Luanda.
Como sabe, a profissão de jornalismo tem este inconveniente. É a probabilidade,
muito grande, de nós nos contagiarmos emocionalmente com situações que se
vivem no terreno. O facto de nós estarmos em contacto com este ambiente de
tensão, de vermos sangue, quer se queira ou não, ficamos contagiados... eu,
pessoalmente, confesso que tenho sentido um pouco isso.
A manipulação que se regista em Angola é da mais grosseira que existe no
mundo, é da mais grosseira que existe no mundo. Eu sublinho isto porque os
órgãos públicos de comunicação são capazes de pegar num panfleto distribuído
pelos jovens, inverter o conteúdo do panfleto e publicar como se fosse original
dos jovens.
Chegou a acontecer numa destas manifestações em que os jovens criaram um
código de conduta; distribuíram esse código na perspectiva de amainar espíritos
e, sobretudo, tornar a manifestação pacifica e eles pegaram no panfleto, (estou
a falar da televisão publica) subverteram o conteúdo, no sentido contrário àquele
de pacificação ou manifestação pacífica. Isto quer dizer o quê? Quando se cria um
panfleto destes, subvertido, está-se a legitimar a reacção de órgãos de segurança,
está-se a motivar os órgãos de segurança para reprimir os manifestantes.
E é isso que nós temos aqui, é manipulação da grossa. Portanto nós temos uma
democracia em Angola, de fachada, é mesmo de fachada, para mostrar ao mundo
que em Angola há democracia; para fazer de conta que ela existe, para amainar as
pressões internacionais; portanto, uma democracia maquilhada mas, na prática,
ela não existe.
Entre os países africanos de expressão portuguesa, Angola é o que mais viola
a liberdade de imprensa, de acordo com o último relatório dos Repórteres sem
Fronteiras. Alexandre, sendo um jornalista angolano, vítima da repressão do
regime e que, segundo me disse, pode contar várias histórias, entre as quais
as últimas manifestações de Luanda, partilhe uma connosco.
Isto tudo porquê Alexandre? Porque quer fazer informação, que incomoda
o regime angolano...
O tema deste trabalho, para o qual está a colaborar, tem como titulo: « direito
ao livre acesso da informação/manipulação».Como é que classifica este tema aí,
em Angola?
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o palácio presidencial, onde queriam chegar. A dada altura do percurso a segurança decidiu que tinham de parar a marcha nas imediações da igreja da Sagrada Família. Então ali foi o ponto mais difícil que tivemos...
termos de reportagem: tinha factos, tinha elementos, tinha dados...
me interpelaram, agarraram-me nos dois braços e nas duas mãos, perguntando porque é que eu estava a filmar. Eu tinha numa mão uma câmera pequena, muito discreta e na mão direita um gravador,
queria captar. Eles queriam este material.
minhas....e porque eu sabia o valor que tinha este material, havia sangue a correr, os manifestantes tinham sido atacados, e eu não queria perder aquela documentação histórica. Bateram em mim e eu, descontrolado, larguei as pastas e entrei para um restaurante ao lado. Pedi uma água e, quando quis pagar, só ai me apercebi que não tinha dinheiro, porque largara a pasta.
Quando voltei a sair do restaurante lembro-me de ver alguns colegas da Lusa e da RTP, que também estavam a reclamar pelo controlo; queriam ter o seu material, que tinha sido confiscado...
essoas que estavam à civil na manifestação. Achava isso contraproducente, ir à policia reclamar junto de pessoas que, aparentemente, eram as mesmas que tinham sido atacantes.
mas o que me motiva a ir é perceber que, no decorrer dessas manifestações, normalmente não há cobertura jornalística.
um número de jornalistas, mas este número foi decrescendo, muita gente desistiu.
vai cobrir um evento destes, penso que não dorme bem com a sua própria consciência.
ue se vive nas manifestações em Luanda.
nós estarmos em contacto com este ambiente de tensão, de vermos sangue, quer se queira ou não, ficamos contagiados... eu, pessoalmente, confesso que tenho sentido um pouco isso.
órgãos públicos de comunicação são capazes de pegar num panfleto distribuído pelos jovens, inverter o conteúdo do panfleto e publicar como se fosse original dos jovens.
reacção de órgãos de segurança, está-se a motivar os órgãos de segurança para reprimir os manifestantes. E é isso que nós temos aqui, é manipulação da grossa. Portanto nós temos uma democracia em Angola, de fachada, é mesmo de fachada, para mostrar ao mundo que em Angola há democracia; para fazer de conta que ela existe, para amainar as pressões internacionais; portanto, uma democracia maquilhada mas, na prática, ela não existe.
ARTIGO “MAGISTRATURA FACA DE DOIS GUMES”, ONDE
UM
EU FUI PARA LÁ FAZER
INVERTEU OS TERMOS, EM
NAMIBE E, EVIDENTEMENTE, CONTRA UM JUIZ PRESI
NEGOU. PORTANTO
TRABALHO
RECORDO QUARENTA
QUE O JORNALIS
LIBERDADE D
QUE OS PRÓXIMOS
ALEXANDRE NETO. TENHO UMA ACTIVISTA
GOVERNANTES, TÊM DOIS
UIR; QUE, DAS DUAS UMA: OU
ABUSO DO
RA PORQUE, COMO PODEM VER, EM VÉSPERA DE ELEIÇÕES,
UM ÓRGÃO PRIVADO
NATURAL DA PROVÍNCIA DO NAMIBE, ONDE É CORRESPONDENTE
DA VOZ DA AMÉRICA.
ESTÁ SUSPENSO DA RÁDIO ECLÉSIA, PROPRIEDADE DA IGREJA
CATÓLICA EM ANGOLA, POR VÁRIAS REPORTAGENS QUE “FEREM O
BOM NOME” DE ALGUMAS PERSONALIDADES PROVINCIAIS, LIGADAS
AO REGIME. COLABOROU EM JORNAIS COMO O “FOLHA 8”,
O “AGORA” E O “ANGOLENSE”.
ENTREVISTA DE CRISTINA MAGALHÃES A ARMANDO CHICOCA		 JULHO DE 2012
Encontro-me suspenso ha três anos, infelizmente sem culpa formada, por pressão do regime. Durante esta fase toda já sofri três prisões: a primeira foi em 2001, quando publiquei um artigo “Magistratura Faca de dois gumes”, onde
se construir um
O povo, naquela altura, pagava os seus direitos à administração municipal. Um Buldozer passou por cima de uma pessoa. Eu fui para lá fazer a
E o mais grave: o julgamento, na altura, foi dirigido por um juiz chamado Pereira da Silva; o juíz inverteu os termos, em
Infelizmente é mais um caso da pouca vergonha da justiça angolana, em que um juiz, que julga um caso, é um juiz da mesma câmara do tribunal do Namibe e, evidentemente, contra um juiz presid
O meu advogado apresentou recurso e o juiz negou. Portanto
O objectivo é mesmo abafar o trabalho
eu desde há cinco ou dez anos para cá, recordo quarenta
Acho que precisamos romper o medo, precisamos dignificar a nossa imagem, fazer com que o jornali
A liberdade de imprensa, a liberdade d
É preciso lutar e, se necessário, ainda fazer alguns sacrifícios para que os próximos
Outro exemplo: eu tenho um colega em Luanda que já perdeu computadores, já perdeu tudo, mas continua a lutar. Refiro-me, portanto, ao Alexandre Neto. Tenho uma activista
Portanto, em Angola, não há liberdade de imprensa. Os dirigentes, os políticos, os governantes, têm dois
É verdade que, neste momento, a universidade vai-se expandindo um pouco pelas províncias; a sociedade civil está completamente activa; acredito que os abusos vão diminuir; que, das duas uma: ou
O que se passa em Angola é mesmo o abuso do
É completamente limitado. Ainda existe coacção. Mesmo os que governam, para falar de determinada matéria, têm de pedir autorização ao chefe máximo. Na minha província do Namibe, já estamos a ultrapassar isso. Na província Huíla a coisa é outra porque, como podem ver, em véspera
de um órgão do estado, vão para a rua; se forem de um órgão privado
a partir
É tudo isto...Em Angola precisamos de lutar um pouco mais, em termos de diplomacia,
OS CIDADÃOS SE QUEIXAVAM DE UM DETERMINADO
M
A COBERTURA DAS DEMOLIÇÕES E
VEZ DE ME TER
IDENTE NÃO HAVIA ALTERNATIVA. E O MAIS
SÃO
DO
A CINQUENTA
SMO EM ANGOLA
DE INFORMAÇÃO
VINDOUROS, OS COLEGAS
AMIGA, QUE É A LISA
DISCURSOS: UM DISCURSO
OS QUE GOVERNAM VÃO TER DE
PODER,
AINDA O GOVERNADOR PARTE A CASA DAS PESSOAS, ELE
INFELIZMENTE TAMBÉM
Encontro-me suspenso ha três anos, infelizmente sem culpa formada, por pressão
do regime. Durante esta fase toda já sofri três prisões: a primeira foi em 2001,
quando publiquei um artigo “Magistratura Faca de dois gumes”, onde os cidadãos
se queixavam de um determinado magistrado que prendia, sem culpa formada.
Em 2007, publiquei uma notícia que envolvia um governador muito conhecido,
numa altura em que ele destruiu todos os mercados paralelos para
se construir um mercado único.
O povo, naquela altura, pagava os seus direitos à administração municipal.
Um Buldozer passou por cima de uma pessoa. Eu fui para lá fazer a cobertura
das demolições e a resposta das autoridades governamentais foi prender-me
e condenar-me a trinta dias de prisão por incitação à violência da população.
E o mais grave: o julgamento, na altura, foi dirigido por um juiz chamado Pereira
da Silva; o juíz inverteu os termos, em vez de me ter condenado por incitação
à violência, ele disse que eu seria condenado por indisciplina, porque não tinha
respeitado a polícia.
Infelizmente é mais um caso da pouca vergonha da justiça angolana, em que
um juiz, que julga um caso, é um juiz da mesma câmara do tribunal do Namibe
e, evidentemente, contra um juiz presidente não havia alternativa. E o mais
engraçado é que o meu advogado, já na altura da sentença, encontrava-se na
HUILA e eu fui condenado sem a presença dele, condenado a um ano de prisão.
O meu advogado apresentou recurso e o juiz negou. Portanto são estas algumas
das histórias de perseguição aos jornalistas.
O objectivo é mesmo abafar o trabalho do jornalismo. E, como se não bastasse,
eu desde há cinco ou dez anos para cá, recordo quarenta a cinquenta processos
por calúnia e difamação quando nunca houve nenhuma.
Acho que precisamos romper o medo, precisamos dignificar a nossa imagem,
fazer com que o jornalismo em Angola seja um jornalismo, tal como acontece
em Portugal, na América e noutras paragens.
A liberdade de imprensa, a liberdade de informação em Angola, é uma luta.
É preciso lutar e, se necessário, ainda fazer alguns sacrifícios para que os
próximos vindouros, os colegas vindouros, nossos filhos, então possam ser
livres de medo, de abusos.
Outro exemplo: eu tenho um colega em Luanda que já perdeu computadores, já
perdeu tudo, mas continua a lutar. Refiro-me, portanto, ao Alexandre Neto. Tenho
uma activista amiga, que é a Lisa Rimli da “Human Rights Watch”, todos sabemos
o que se passou com ela; alguns jornalistas, também portugueses, estiveram em
Luanda fazendo cobertura.
Portanto, em Angola, não há liberdade de imprensa. Os dirigentes, os políticos,
os governantes, têm dois discursos: um discurso para mostrar ao mundo que são
democratas e outro discurso para consumo interno.
É verdade que, neste momento, a universidade vai-se expandindo um pouco pelas
províncias; a sociedade civil está completamente activa; acredito que os abusos
vão diminuir; que, das duas uma: ou os que governam vão ter de se converter, ou
então vão ter de assumir todas as consequências que hão de vir, porque ninguém
vai aceitar mentiras, ninguém vai mais aceitar a neocolonização.
O que se passa em Angola é mesmo o abuso do poder, não há outra coisa,
é mesmo abuso do poder.
É completamente limitado. Ainda existe coacção. Mesmo os que governam,
para falar de determinada matéria, têm de pedir autorização ao chefe máximo.
Na minha província do Namibe, já estamos a ultrapassar isso. Na província
Huíla a coisa é outra porque, como podem ver, em véspera de eleições, ainda o
governador parte a casa das pessoas, ele diz que dá tijolo, que dá telhas, que dá
mais não sei o quê...mas o povo diz que não, não há telha, não há tijolo, não há
nada. Os jornalistas da província da Huíla não podem divulgar porque, se forem
de um órgão do estado, vão para a rua; se forem de um órgão privado infelizmente
também são funcionários do estado e também sofrem na pele e são penalizados
a partir dos serviços.
É tudo isto...Em Angola precisamos de lutar um pouco mais, em termos de
diplomacia, em termos de dignidade. Somos ainda prisioneiros de consciência,
precisamos de nos libertar.
Queres partilhar connosco alguma história de repressão por informação
jornalística?
O tema é o acesso à informação, como vês o acesso à informação em Angola?
Portanto o acesso de informação em Angola é limitado...
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os cidadãos se queixavam de um determinado magistrado que prendia, sem culpa formada. Em 2007, publiquei uma notícia que envolvia um governador muito conhecido, numa altura em que ele destruiu todos os mercados paralelos para
mercado único.
cobertura das demolições e a resposta das autoridades governamentais foi prender-me e condenar-me a trinta dias de prisão por incitação à violência da população.
vez de me ter condenado por incitação à violência, ele disse que eu seria condenado por indisciplina, porque não tinha respeitado a polícia.
dente não havia alternativa. E o mais engraçado é que o meu advogado, já na altura da sentença, encontrava-se na HUILA e eu fui condenado sem a presença dele, condenado a um ano de prisão.
são estas algumas das histórias de perseguição aos jornalistas.
do jornalismo. E, como se não bastasse,
a cinquenta processos por calúnia e difamação quando nunca houve nenhuma.
ismo em Angola seja um jornalismo, tal como acontece em Portugal, na América e noutras paragens.
de informação em Angola, é uma luta.
vindouros, os colegas vindouros, nossos filhos, então possam ser livres de medo, de abusos.
amiga, que é a Lisa Rimli da “Human Rights Watch”, todos sabemos o que se passou com ela; alguns jornalistas, também portugueses, estiveram em Luanda fazendo cobertura.
discursos: um discurso para mostrar ao mundo que são democratas e outro discurso para consumo interno.
os que governam vão ter de se converter, ou então vão ter de assumir todas as consequências que hão de vir, porque ninguém vai aceitar mentiras, ninguém vai mais aceitar a neocolonização.
poder, não há outra coisa, é mesmo abuso do poder.
de eleições, ainda o governador parte a casa das pessoas, ele diz que dá tijolo, que dá telhas, que dá mais não sei o quê...mas o povo diz que não, não há telha, não há tijolo, não há nada. Os jornalistas da província da Huíla não podem divulgar porque, se forem
infelizmente também são funcionários do estado e também sofrem na pele e são penalizados
dos serviços.
em termos de dignidade. Somos ainda prisioneiros de consciência, precisamos de nos libertar.
MUITO DE REGIÃO PARA REGIÃO. DO
DECORRENTE DAS ASSIMETRIAS POLÍTICAS EXISTENTES.
NÃO ALGUMAS,
NA PACIFICAÇÃO OU NA MITIGAÇÃO DO CONFLITO
INFORMAR O QUE OCORRE AQUI
PROPOSTAS E, POR TER RECUSADO, AS DIVERSAS OFERTAS,
TODO O MATERIAL
SE VIVE UM
POR CENTO DAS RIQUEZAS, QUE SE
POTENCIALIDADES ECONÓMICAS
VISA CONTRARIAR A REALIDADE
GABINETE, POR CAUSA DE UMA NOTÍCIA
ENTREVISTA DE CRITINA MAGALHÃES A JOSÉ MANUEL		 	 JULHO DE 2012
ADVOGADO, JORNALISTA E PROFESSOR UNIVERSITÁRIO, TEM 38
ANOS. COMEÇOU A CARREIRA DE JORNALISTA NA RÁDIO COMERCIAL
DE CABINDA. FOI COLABORADOR DA AGÊNCIA LUSA E EM RÁDIOS
LOCAIS DE BENGUELA E LUANDA. PASSOU PELA RÁDIO RENASCENÇA,
ONDE ESTAGIOU, É CORRESPONDENTE DA VOZ DA AMÉRICA EM
CABINDA, DESDE 2003.
Analisar este tema em Angola... Nós poderíamos dividir isto em contextos. O contexto político angolano varia muito de região para região. Do ponto
O contexto particular, onde eu estou baseado, como sabeis é um contexto bastante complexo, decorrente das assimetrias políticas existentes. Concr
Em consequência disso temos vivendo não algumas, mas
Como sabe Cabinda vive um contexto político distinto do resto do país. Ora, os esforços que o Governo tem feito na pacificação ou na mitigação do conflito de Cab
Por esta razão e sendo apenas o único órgão de transparência ou que tenta informar o que ocorre aqui em
Eu fui, digamos, vítima de muitos assédios, muitos deles até de uma certa natureza de corrupção. Nem sempre conseguimos sobreviver às propostas e, por ter recusado, as diversas ofertas,
Uma das formas era assaltar a casa, recolherem todo o material
Seria, digamos paradoxal eu em Cabinda, (por exemplo) onde se vive um
Seria um pouco contra-senso falar de um desenvolvimento económico em Cabinda, onde se explora e retira setenta por cento das riquezas, que se usam
Esse tipo de factos, comparado com as potencialidades económicas da
Então esse tipo de informações, numa altura onde há muita propaganda que visa contrariar a realidade
Repara que, recentemente, antes da sua exoneração, o governador Mawete João Baptista chamou-me ao seu gabinete, por causa de uma notícia
PONTO DE VISTA GERAL NÃO ESTARIA
CONCRETAMENTE CABINDA, NO NOROESTE DE
MAS MUITAS
DE CABINDA, IMPÕE O RECURSO A MEIOS PARA,
EM CABINDA, HÁ UM INTERESSE
QUER DO PONTO DE VISTA FINANCEIRO, QUER DO
INFORMÁTICO E ELECTRÓNICO
CONFLITO POLÍTICO/MILITAR, RELATAR
USAM PARA O DESENVOLVIMENTO DE ANGOLA; QUANDO
DA REGIÃO, QUANDO
RELATADA PELA IMPRENSA, (
ECONÓMICA QUE EU TINHA PUBLICADO. EU
Tens limitações à informação? Como vives essa situação? Analisar este tema em Angola... Nós poderíamos dividir isto em contextos.
O contexto político angolano varia muito de região para região. Do ponto de vista
geral não estaria em condições de descrever, porque os demais jornalistas vivem
noutras regiões, apesar de algumas questões se assemelharem.
O contexto particular, onde eu estou baseado, como sabeis é um contexto
bastante complexo, decorrente das assimetrias políticas existentes.
Concretamente Cabinda, no noroeste de Angola. Essas assimetrias inviabilizam
qualquer projecto de garantia de liberdade de expressão e de informação.
Em consequência disso temos vivendo não algumas, mas muitas dificuldades,
no desempenho das nossas funções.
Como sabe Cabinda vive um contexto político distinto do resto do país. Ora,
os esforços que o Governo tem feito na pacificação ou na mitigação do conflito
de Cabinda, impõe o recurso a meios para, digamos, abafar a nível nacional e
internacional, qualquer informação que tenta manifestar os descontentamentos
com a continuação do conflito militar.
Por esta razão e sendo apenas o único órgão de transparência ou que tenta
informar o que ocorre aqui em Cabinda, há um interesse enorme, da parte do
Governo, em reduzir o impacto dos correspondentes da Voz da América...
Eu fui, digamos, vítima de muitos assédios, muitos deles até de uma certa
natureza de corrupção. Nem sempre conseguimos sobreviver às propostas e, por
ter recusado, as diversas ofertas, quer do ponto de vista financeiro, quer do ponto
de vista do enquadramento profissional, tiveram que recorrer a outros métodos,
para influenciarem quer a mim quer à minha própria família.
Uma das formas era assaltar a casa, recolherem todo o material informático
e electrónico que uso para o desempenho das minha funções.
Seria, digamos paradoxal eu em Cabinda, (por exemplo) onde se vive um conflito
político/militar, relatar factos adversos da realidade política e social do enclave.
Seria um pouco contra-senso falar de um desenvolvimento económico em
Cabinda, onde se explora e retira setenta por cento das riquezas, que se usam
para o desenvolvimento de Angola; quando nem um terço da população tem
água potável, luz eléctrica, vias rodoviárias asfaltadas, infra-estruturas públicas
e condições.
Esse tipo de factos, comparado com as potencialidades económicas da região,
quando relatados, criam sempre um constrangimento ao regime.
Então esse tipo de informações, numa altura onde há muita propaganda que
visa contrariar a realidade relatada pela imprensa, ( abro aqui um parêntesis
“independente”) acaba sempre por deixar mal a governação.
Repara que, recentemente, antes da sua exoneração, o governador Mawete João
Baptista chamou-me ao seu gabinete, por causa de uma notícia económica que
eu tinha publicado. Eu levantava questões de não pagamento de dívida pública
a empresas de Cabinda, o que era verdade.
E que tipo de informação é que estavas a tentar publicar?
28	 					 	 29
de vista geral não estaria em condições de descrever, porque os demais jornalistas vivem noutras regiões, apesar de algumas questões se assemelharem.
retamente Cabinda, no noroeste de Angola. Essas assimetrias inviabilizam qualquer projecto de garantia de liberdade de expressão e de informação.
muitas dificuldades, no desempenho das nossas funções.
binda, impõe o recurso a meios para, digamos, abafar a nível nacional e internacional, qualquer informação que tenta manifestar os descontentamentos com a continuação do conflito militar.
Cabinda, há um interesse enorme, da parte do Governo, em reduzir o impacto dos correspondentes da Voz da América...
quer do ponto de vista financeiro, quer do ponto de vista do enquadramento profissional, tiveram que recorrer a outros métodos, para influenciarem quer a mim quer à minha própria família.
informático e electrónico que uso para o desempenho das minha funções.
conflito político/militar, relatar factos adversos da realidade política e social do enclave.
para o desenvolvimento de Angola; quando nem um terço da população tem água potável, luz eléctrica, vias rodoviárias asfaltadas, infra-estruturas públicas e condições.
região, quando relatados, criam sempre um constrangimento ao regime.
relatada pela imprensa, ( abro aqui um parêntesis “independente”) acaba sempre por deixar mal a governação.
económica que eu tinha publicado. Eu levantava questões de não pagamento de dívida pública a empresas de Cabinda, o que era verdade.
A manipulação da informação na guerra do Golfo
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  • 2. ÍNDICE O PENSAMENTO ÚNICO 4 DESINFORMAR 6 SINAIS DO TEMPO 8 IMPRENSA, PODERES E DEMOCRACIA 10 RANKING MUNDIAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA 2011/12 18 CABO VERDE AUTARQUICAS 20 ANGOLA CAI NA LISTA 22 HRW DENUNCIA DETENÇÕES 24 ENTREVISTAS JOSÉ MANUEL ROSENDO 12 ALEXANDRE NETO 24 JOSÉ MANUEL 26 ARMANDO CHICOCA 30 WILLIAM RONET 32 RAFAEL MARQUES DE MORAIS 34 BILL VIOLA INFORMATION
  • 3. Nestas últimas décadas temos assistido a uma constante busca ao acesso e rápida evolução dos multimedia. O computador acelerou todo o processo e colocou cada vez mais próximo o utilizador da realidade, independentemente dos limites do espaço. A rede/internet e o computador pessoal, permitem actualmente que possamos ser nós os criadores de informação, em qualquer lugar e a qualquer hora. Vivemos numa sociedade de excessos e estes, como não podia deixar de ser, atingem a informação, infelizmente na parte menos interessante ou seja na que não traz desenvolvimento cultural ao receptor. Faz sentido criar e desenvolver uma maior exigência, um mais profundo sentido crítico dirigido ao conteúdo da informação; aceitar de imediato o que nos é apresentado nos ecrãs e sem pesquisar até que ponto o conteúdo é verdadeiro e a intenção com que nos é fornecido, é uma forma unilateral de adquirir conhecimento: o receptor deve ter um comportamento mais crítico, exigente e participativo. Temos a possibilidade de filmar, fotografar, comunicar... podemos registar qualquer acontecimento e colocá-lo online à disposição de todos os utilizadores e difundir a mensagem a uma velocidade tal que, por vezes, ultrapassa as barreiras dos grandes media como a televisão e a rádio. A desvantagem desta evolução é que, por vezes, não conseguimos ter noção nem controle sobre a veracidade da informação a que temos acesso; a facilidade com que as noticias nos sao fornecidas atribuiu ao observador um papel passivo. MESSAGE consiste numa pequena investigação que levanta questões sobre o acesso à informação na actualidade. Esta evolução veio alterar, e muito, a forma e atitudes dos agentes emissor e receptor: o receptor adopta a atitude de um agente passivo, cada vez mais sujeito à manipulação. o emissor já não assume um papel tão critico relativamente á matéria que publica. A Televisão, rádio e imprensa disputam entre si em função de audiências e lucros: o sensacionalismo, apodera-se cada vez mais do nosso quotidiano. Enquanto cidadão, senti a necessidade de me envolver no seio deste ambiente mediático para poder recolher algumas experiências de profissionais que lidam com tal tipo de problemas diariamente: Os jornalistas, elementos intermediários, é por eles que a informação é tratada e, à partida, é neles que nós confiamos a veracidade e pertinência da notícia. 0 1
  • 4. JOHNATHAN BARNBROOK RADIO SCOTLAND
  • 5. 2 3
  • 6. LE MONDE, JANEIRO DE 1995 IGNACIO RAMONET O PENSAMENTO ÚNICO 1 Le Monde, 17 de Dezembro de 1994. 2 Cambio 16, Madrid, 5 de Dezembro de 1994. 3 Testemunho: a França do ano 2000 entrega ao seu primeiro ministro, as edições "Odile Jacob". Paris, 1994. 4 É conhecida a célebre resposta de M. Dominique Strauss-Kahn. The Wall Street Journal Europe, 18 de Março de 1993. 5 Será por isso que muitos intelectuais como Guy Debord se suicidaram nestas últimas semanas? WALTER CRONKITE
  • 7. Aprisionados. Nas democracias actuais, cada vez mais cidadãos livres se sentem aprisionados, presos por um tipo de doutrina envolvente que, insensivelmente paralisa todos os espíritos rebeldes, inibindo-os, perturbando-os, paralisando-os e acabando por suprimi-los. Depois da queda do muro de Berlim, a derrocada dos regimes comunistas e a desmoralização do socialismo, a arrogância, a soberba e a insolência deste novo Evangelho atingiu um tal nível que pode-se, sem exagero, qualificar este furor ideológico de moderno dogmatismo. O que é o pensamento único? Tradução em termos ideológicos com pretensão universal das vantagens de um conjunto de forças económicas, estas, em particular, do capital internacional. Ela foi formulada e definida desde 1944, por ocasião dos acordos de Bretton-Woods. Os seus arautos principais são as grandes instituições económicas e monetárias - Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, Organização de Cooperação do Desenvolvimento Económico, Acordo Geral sobre Tarifas Alfandegárias e Comércio, Comissão Europeia, Banco da França, etc. - que, através dos seus financiamentos, recrutam ao serviço das suas ideias, através de todo o mundo, inúmeros centros de pesquisas, universidades, fundações que, por sua vez, elaboram e divulgam os ensinamentos. Este discurso anónimo é retomado e reproduzido pelos principais órgãos de informação económica, e nomeadamente pelas "bíblias" dos investidores e dos representantes das bolsas de valores - The Wall Street Journal, Financial Times, The Economist, Far Eastern Economic Review, os Echos, Agência Reuter, etc., pertencentes, quase sempre, aos grandes grupos industriais e financeiros. Em todos os lugares, faculdades de ciências económicas, jornalistas, ensaístas, homens políticos, e outros, retomam os novos ensinamentos destas novas tábuas da lei e, por intermédio dos veículos de comunicação de massa, os repetem até a náusea. Sabendo de forma pertinente que, nas nossas sociedades de mídia, a repetição vale pela demonstração. O primeiro princípio do pensamento único é tão forte que um marxista distraído não o recusaria: o económico prevalece sobre o político. Fundando-se em tal princípio, por exemplo, um instrumento tão importante quanto o Banco da França tornou-se, sem oposição, independente em 1994 e, de alguma maneira, "colocado ao abrigo dos credos políticos". "O Banco da França é independente, apolítico e imparcial" afirma o seu expoente máximo, M. Jean-Claude Trichet, que entretanto acrescenta: "nós pregamos a redução dos déficits públicos" e nós perseguimos uma estratégia de moeda estável 1 . Como se estes dois objectivos não fossem essencialmente políticos! É em nome do "realismo" e do "pragmatismo" - que M. Alain Minc se expressa da maneira seguinte: "O capitalismo não pode afundar, pois ele é o estado natural da sociedade. A democracia não é o estado natural da sociedade. O mercado sim 2 . A economia é alçada à posição de comando. Uma economia desligada dos obstáculos do social, cujo peso por decorrência seria a causa da recessão e da crise. Os outros conceitos-chaves do pensamento único são conhecidos: o mercado, ídolo onde "a mão invisível corrige as asperezas e as deseconomias do capitalismo" e particularmente os mercados financeiros, onde "os sinais orientam e determinam, o movimento geral da economia"; a concorrência e a competitividade, que "estimulam e dinamizam as empresas levando-as a uma permanente e benéfica modernização"; o livre-comércio sem barreiras, "factor de desenvolvimento ininterrupto do comércio e das sociedades", também a mundialização da produção manufactureira e os fluxos financeiros; a divisão internacional do trabalho que "modera as reivindicações sindicais e baixam os custos salariais"; a moeda forte, “factor de estabilidade”; a desregulamentação; a privatização; a liberalização, etc. Sempre "menos Estado", uma arbitragem constante a favor dos lucros do capital em detrimento dos custos do trabalho. E uma indiferença no tocante ao custo ecológico. A repetição constante, em todas as mídias, deste catecismo3 por quase todos os homens políticos, tanto de direita quanto de esquerda4 , confere-lhe uma tal força de intimidação que abafa qualquer tentativa de reflexão livre, e dificulta a resistência contra esse novo obscurantismo5 . Poder-se-ia quase considerar que os 17,4 milhões de desempregados europeus, o desastre urbano, a precarização geral, a corrupção, as periferias violentas, o desastre ecológico, o retorno dos racismos, os integralismos e os extremismos religiosos, a massa de excluídos são apenas miragens, resultado de delírios, fortemente discordantes do melhor dos mundos que se edifica para nossas consciências anestesiadas, o pensamento único. 4 5 TRADUZIDO POR JAERSON LUCAS BEZERRA
  • 8. INFORMAÇÃO, MANIPULAÇÃO ALAIN WOODROW DESINFORMAR ELES SÃO 84% A CONSIDERAR QUE FORAM MANIPULADOS DURANTE A GUERRA DO GOLFO. “ELES”? QUANDO SE SABE QUE NÃO SÃO OS CONSUMIDORES DOS MEDIA (N.T: UTILIZO SEMPRE O PLURAL LATIM MEDIA PARA O (S) MEIO(S) DE INFORMAÇÃO) QUE ASSIM SE EXPRIMEM, MAS MAIS DE TREZENTOS JORNALISTAS, QUESTIONADOS PELO L'EXPRESS E POR RÉPORTERS SANS FRONTIERES, ATRAVÉS DO INSTITUTO DE SONDAGENS FRANCE OPINIONS, DE 4 A 10 DE FEVEREIRO DE 1991, VERIFICA-SE QUE O MAL-ESTAR É REAL. UM MAL-ESTAR QUE, INCUBADO DESDE OS ACONTECIMENTOS DA ROMÉNIA — E MESMO BEM ANTES — FOI CRUELMENTE REVELADO POR UMA GUERRA ANUNCIADA COMO A MAIS MEDIÁTICA DA HISTÓRIA, MAS QUE ACABOU POR SER A MAIS SECRETA. QUARENTA E DOIS DIAS DE COMBATES QUASE CLANDESTINOS. UMA GUERRA SEM IMAGENS E ONDE AS INFORMAÇÕES ERAM CUIDADOSAMENTE FILTRADAS. ENORME NARIZ DE PALMO E MEIO FEITO A UMA MÁQUINA DE COMUNICAÇÃO QUE SE JULGAVA TODA-PODEROSA. OS JORNALISTAS DESCOBRIRAM BRUSCAMENTE A FRAGILIDADE DA PROFISSÃO E A JACTÂNCIA DAS SUAS PRETENSÕES. A SUA AUTOCRÍTICA, NESTA SONDAGEM, E IMPIEDOSA: 75% PENSAM QUE A COBERTURA DA GUERRA FEITA PELA TELEVISÃO FOI “JORNALISMO- ESPECTÁCULO” E 53% RECEIAM QUE A CONFIANÇA DEPOSITADA PELA OPINIÃO NOS MEDIA SAIA ENFRAQUECIDA DA GUERRA. MAIS SURPREENDENTE É QUE 63% CONSIDERAM A CENSURA MILITAR “NORMAL” EM TEMPO DE GUERRA E 78% QUE A AUTO- CENSURA SE JUSTIFICA. MAIS INESPERADO AINDA, 81% ACREDITAM QUE FORAM MANIPULADOS PELAS FONTES MILITARES ALIADAS E APENAS 68% PELAS FONTES IRAQUIANAS! CURIOSA LIÇÃO PARA A DEMOCRACIA. HARRY GRUYAERT TV SHOTS
  • 9. Se a primeira vítima da guerra, de acordo corn Rudyard Kipling, é a verdade, a segunda poderiam muito bem ser os informadores. Eis os jornalistas, normalmente tão susceptíveis quando a sua liberdade é posta em causa, a deitarem mão, eles próprios, à tesoura de Anastásia. Como se não lhes bastasse, qual Fabrício em Waterloo, haverem sido mantidos à distancia nos bastidores da guerra, consideram normal que lhes ponham uma venda nos olhos. Aproveitando o desnorte dos jornalistas, maioritariamente adeptos da censura, apesar das vozes isoladas (Marcel Trillat na A2 — N.T: Antena 2, um dos canais estatizados da televisão francesa) ou corporativistas (o sindicato SNJ-CGT de jornalistas) que lavraram protestos, os poderes públicos queriam reforçá-la ainda mais. Em Franca, o Conselho Superior do Audiovisual (N.T: CSA — o equivalente da Alta Autoridade portuguesa) intervinha junto dos canais de televisão, o primeiro-ministro multiplicava as admoestações e alguns parlamentares criaram mesmo um observatório dos media para acautelar os interesses que, em sua opinião, deveriam ser defendidos. Felizmente que os media aceitaram dizer a verdade, mesmo que não fosse nada mais do que a verdade e ainda menos toda a verdade... Nesta sondagem deve notar-se também a clivagem entre a imprensa escrita e o audiovisual. Menos de um terço (30%) dos profissionais da primeira dizem que os media informaram os franceses de modo satisfatório sobre a guerra, enquanto os seus colegas do audiovisual a pensar assim são duas vezes mais numerosos (60%). O antagonismo é grave na medida em que ultrapassa os simples ciúmes profissionais para mexer com a deontologia que lhes está subjacente. Será que a informação pela imagem é também de natureza — e não apenas de grau — diferente da informação escrita? Redactor do suplemento Rádio-Televisão do Le Monde, tenho um pé, digamos assim, em cada um dos dois campos. Escrevo, é verdade, mas a propósito da televisão: formado na escrita, julgo o visual; fiel ao texto, sou também seduzido pela imagem. Este posto de observação permite-me, como a Jano, espreitar para os dois lados ao mesmo tempo. Permite-me, sobretudo, constatar que a imagem está a matar a escrita. Imagem insolente e, além disso, pervertida pelo dinheiro. É assim que todos os media, sob o jugo da imagem, se deixam pouco a pouco desviar do seu objectivo — informar — para se tornarem, por sua vez, manipuladores. Perante este desvio funesto é imperioso gritar alto-lá! A credibilidade dos jornalistas diminui ano após ano, de sondagem em sondagem. A falsa carnificina de Timisoara, o processo encenado do casal Ceausescu e o blackout no Golfo: os pés de barro do colosso “Comunicações” aparecem à luz do dia. No entanto o colosso ainda está de pé e este quarto poder esmaga, com o seu poderio tecnológico e o seu magistério usurpado, os outros três poderes. Ora, apesar de tudo, ele tem um papa vital a desempenhar para garantir o equilíbrio da nossa democracia. É mais do que tempo para reflectir sobre a informação, designadamente no audiovisual. Porque a sua fiabilidade não acompanha, nem de perto nem de longe, os meios técnicos cada vez mais aperfeiçoados postos a sua disposição. Como conciliar a instantaneidade e o rigor? Não é certamente adoptando o “modelo CNN”, essa torneia de imagens contínuas, como imaginam alguns políticos de base da profissão: verificação dos factos, rigor e honestidade. Ou, parafraseando Peguy (N.T: escritor francês deste século): dizer totalmente as verdades tolas e dificilmente as verdades difíceis. 33 - 37 6 7
  • 10. RTP, CANAL 2, LISBOA, 20 DE OUTUBRO DE 1988 JOSÉ MANEL BARATA-FEYO SINAIS DO TEMPO NAQOYQATSI GODFREY REGGIO 2002
  • 11. Qualquer um de nós, cidadão contemporâneo, sabe menos, em relação àquilo que deveria saber, do que os cidadãos dos séculos XVIII ou XIX. Ou seja, a ignorância cresceu e aumentou à medida que cresceu e aumentou a informação. É que o mundo tornou-se mil vezes mais complexo e, para saber tanto quanto os nossos avós, teríamos que saber mil vezes mais. Tarefa impossível. Acontece então que o cérebro do homem contemporâneo sofre como que uma espécie de náusea que o leva a rejeitar parte da informação que lhe é oferecida. O acontecimento da primeira página dos jornais ou de abertura dos noticiários nas rádios e nas televisões, quase que por regra, desaparece no dia seguinte, empurrado por outro acontecimento, ao qual está reservado o mesmo destino. A notícia torna-se assim em algo sem princípio nem fim, afinal destinada ao alçapão de um imediato esquecimento. Para contrariar esta tendência que, levada ao extremo, faria com que, quanto mais informação recebêssemos mais ignorantes seríamos, tornou-se necessário criar espaços de acalmia onde seja possível ultrapassar a espuma da forma e do ritmo para ir mais fundo na reflexão. Tal é o propósito deste seu programa a que chamámos Sinais do Tempo. [...] 8 9 [...]
  • 12. A TIRANIA DA COMUNICAÇÃO IGNACIO RAMONET IMPRENSA, PODERES E DEMOCRACIA EM CAUSA ESTÁ UMA NOTÍCIA COM O TÍTULO «RECESSÃO: PRIMEIRO-MINISTRO RESPONDE A SOARES DOS SANTOS QUE “NÃO BASTA SER RICO PARA SER BEM-EDUCADO”», QUE FOI PARA A LINHA DA LUSA NO DIA 18 DE FEVEREIRO, ÀS 22:54. A REACÇÃO DO PRIMEIRO-MINISTRO A ANTERIORES DECLARAÇÕES DE ALEXANDRE SOARES DOS SANTOS, QUE A LUSA TINHA DIVULGADO ANTES, NÃO ME FOI TRANSMITIDA PELO PRÓPRIO JOSÉ SÓCRATES, MAS POR UM ASSESSOR DE IMPRENSA, JOÃO MORGADO FERNANDES, QUE NÃO QUERIA SER IDENTIFICADO. OU SEJA, A DECLARAÇÃO DO PRIMEIRO-MINISTRO ERA PARA COLOCAR NA BOCA DO PRÓPRIO SEM QUE ELE A TIVESSE DITO (POR TELEFONE) OU ESCRITO (EM COMUNICADO), COMO EU PEDI QUE O FIZESSE. POR SEU LADO, TAMBÉM NÃO A PODIA ATRIBUIR AO PRIMEIRO-MINISTRO, ACRESCENTANDO “COMO DISSE À LUSA UM ASSESSOR”. NESTE CASO, TRATANDO-SE, A MEU VER, DE UMA OPINIÃO/ COMENTÁRIO INSULTUOSO – “NÃO BASTA SER RICO PARA SE SER BEM EDUCADO” –, NÃO TERIA ACEITADO IGUALMENTE QUE O ASSESSOR DE IMPRENSA PUDESSE FALAR EM NOME DO PRIMEIRO- MINISTRO. ESTÁ EXPRESSO NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS JORNALISTAS QUE AS OPINIÕES DEVEM SER SEMPRE ATRIBUÍDAS AOS PRÓPRIOS. NÃO TENHO QUALQUER DÚVIDA DE TER TOMADO A DECISÃO MAIS CORRECTA. SOFIA BRANCO, AGOSTO DE 2012 PEDRO ROSA MENDES
  • 13. Porque razão se desmoronou esta nobre concepção do jornalismo? Como é que se passou de uma espécie de glorificação do jornalista, herói da sociedade moderna em meados dos anos 70, para a situação actual em que, transformado em “novo cão de fila”, ocupa o lugar cimeiro numa escala de descrédito? Intervieram considerações de vária ordem, algumas tecnológicas, outras políticas, económicas e também de linguagem. Podemos considerar que a viragem na abordagem teórica da informação se situou no ano de todos os acontecimentos que foi 1989. É possível que existissem, antes dessa época, elementos prenunciadores, mas foi só então que o fenómeno se tornou mediaticamente perceptível. No nosso meio intelectual, a verdade que conta é a verdade mediática. Que verdade é essa? Quando, a propósito de determinado acontecimento, a imprensa, a rádio e a televisão dizem que é algo é verídico, é ponto assente que isso é verídico. Mesmo que seja falso. De facto, actualmente a verdade é aquilo que os media propagam como tal. Ora o único meio que os cidadãos dispõem para confirmar se uma informação é verídica é confrontar os discursos dos diferentes media. Então, se todos afirmam a mesma coisa, não nos resta senão aceitar esse discurso único... O discurso de propaganda é, falando com propriedade, um discurso de censura, mas a censura, em contrapartida, não é necessariamente do tipo da propaganda. Esta consiste em suprimir, em amputar, em proibir um certo número de aspectos dos factos, ou até a totalidade dos factos, a oculta-los, a escondê-los. Se a censura existe ainda sob esta forma nos regimes autocráticos e nas ditaduras, ela funciona, sabemos isso, de outra maneira nos países desenvolvidos, aparentemente democráticos, Encontramos aí pouquíssimos exemplos de uma censura primária, que venha ocultar, cortar, suprimir, proibir factos. A censura já não funciona desta maneira, o que não significa que não exista. Ela assenta apenas noutros critérios, mais complexos, económicos, comerciais ou inversos dos da censura autoritária. Como se oculta hoje a informação? Através de um aumento de informações: a informação é dissimulada ou truncada porque há demasiada para consumir. E não chegamos mesmo a aperceber-nos da que falta. Porquanto uma das grandes diferenças entre o universo em que vivemos há alguns decénios e aquele que o precedeu, é que a informação já não é (mas foi-o, durante séculos) uma matéria rara. Antes da época moderna, dizia-se que quem detinha a informação detinha o poder, entendendo-se este como o controle da circulação da comunicação. Hoje, a informação é superabundante, tal como os quatro elementos (ar, água, terra, fogo ), e torna-se por isso, incontrolável. Tudo isto cria uma espécie de tela, uma tela opaca, que oculta, que torna eventualmente mais difícil do que nunca, para o cidadão, a procura da informação justa. pelo menos, no sistema anterior, a pasmaceira que a proibição provocava era visível, sabíamos que eram ocultadas imagens, informações. Nos anos 60 e 70, na época do regime dos militares no Brasil, tal como em França durante a guerra da Argélia, alguns jornais publicavam as suas páginas em branco no lugar dos artigos que a censura tinha proibido. Não os publicavam, mas mostravam a marca dos artigos, o que, paradoxalmente, tornava visível essa censura. Agora que a situação já não é visível, precisamos de desenvolver um esforço de reflexão ainda maior para conseguirmos compreender os novos mecanismos em que ela assenta. Não podemos contentar-nos com a tese da trama, em que uma comissão secreta puxaria todos os cordelinhos; a realidade dos media é bem mais complexa. O que ira acontecer no futuro? Certamente outro desvario, visto que o sistema de informação está descontrolado, ninguém o orienta. Porquê? Exactamente porque este tipo de informação, assegurada por um grande número jornalistas satisfeitos, dá a impressão de informar um vasto público que recebe essa informação com o mesmo contentamento como se se tratasse de um divertimento... 43 - 50 10 11
  • 14. ENTREVISTA DE RICARDO DIAS A JOSÉ MANUEL ROSENDO JULHO DE 2012 NASCEU NO PINHAL NOVO, HÁ 46 ANOS, FOI NA RÁDIO LOCAL DESTA FREGUESIA DO CONCELHO DE PALMELA QUE INICIOU A CARREIRA NO JORNALISMO. FREQUENTOU UM CURSO DE JORNALISMO NO CENJOR E EM 1993 ENTROU PARA A RÁDIO PRESS. AINDA NESSE COMEÇOU A TRABALHAR NA ANTENA 1. É AUTOR DE UM LIVRO “DE ISTAMBUL A NASSÍRIA” - CRÓNICAS DA GUERRA NO IRAQUE, QUE TEM POR BASE QUATRO REPORTAGENS FEITAS, PELO JORNALISTA DURANTE TRÊS MESES DE TRABALHO NO TERRENO, ENTRE MARÇO DE 2003 E ABRIL DE 2004. GANHOU, RECENTEMENTE, O PRÉMIO GAZETA DE RÁDIO 2011. O CLUBE DE JORNALISTAS DISTINGUIU A REPORTAGEM “TAHIA LÍBIA” SOBRE OS PRIMEIROS DIAS DA REVOLTA EM BENGAZZI E O TRABALHO “DESCOBRIR A LIBERDADE”.
  • 15. Eu acho que é a grande questão, ou seja, nós vivemos a ilusão, até um determinado momento em que o facto de termos acesso à informação, através da internet, vivemos a ilusão de que podemos saber tudo e de que temos acesso a tudo e até que todos podíamos ser jornalistas. Há aí uma coisa que se chama o “cidadão jornalista”, que eu não sei bem o que é. Sim, eu também te posso deitar numa marquesa, pôr um estetoscópio e ouvir a tua batida do coração. Mas isso não faz de mim um médico, certo? Portanto, colocar informação na internet não faz das pessoas jornalistas, porque fazer jornalismo obedece a uma série de critérios que as pessoas têm que conhecer e respeitar, para que possam ser considerados informação jornalística... Não basta tirar uma fotografia de um acontecimento e colocá-la na net sem a explicar, porque a própria fotografia pode deturpar a realidade. Tiveste agora o exemplo daquela fotografia ou imagem que foi utilizada durante o Euro 2012, de uma alemã a chorar. Ela até está a processar a UEFA por uma razão muito simples: a imagem de uma cidadã alemã a chorar pela eliminação do seu país foi, na verdade, obtida no momento em que tocava o hino da Alemanha, antes do jogo. Portanto, cada vez mais é preciso ter muito cuidado com a internet; é importantíssimo aprender a saber “peneirar” a informação. Há informação de todo o lado sobre tudo e mais alguma coisa, muitas vezes informação contraditória e depois as pessoas não têm forma de saber qual é a verdadeira; sentem-se a nadar no meio de tanto excesso de informação. É aí que entra a presença do jornalista no circuito para dar o carimbo de credibilidade à informação: o papel do jornalista, nesse circuito de informação, é cada vez mais essencial. Diz-se que o jornalismo um dia destes vai desaparecer, porque as pessoas têm acesso directo à informação e porque elas próprias produzem informação, mas isso é uma falácia. É exactamente ao contrário: o excesso de informação faz com que cada vez mais seja necessária a presença do jornalista no circuito, para dar o carimbo de credibilidade à informação. Na internet, há as páginas oficiais das organizações, não é!? É suposto que a informação que essas páginas têm, seja correcta ou não, correspondam à versão oficial das organizações em relação às mais variadas matérias, portanto isso pode ser um ponto de partida. Um caso recente: o curriculum do Miguel Relvas, as declarações que ele fez quando foi eleito deputado relativamente ao curriculum dele e que fazem parte do arquivo da Assembleia da República é suposto ele ter dito mesmo aquilo e, portanto, isso é um elemento que é um ponto de partida e é válido. Tu tens agora, relativamente à situação na Síria. É preciso ter muito cuidado com aquela informação que está a ser veiculada nos blogs, no Facebook, porque é informação que tu tens que ter sempre o pé atrás porque, sobretudo em situações de conflito, a guerra da informação é tremenda. Eu recordo-me, por exemplo, em relação à Líbia havia um blog de uma suposta blogger que mais tarde se veio a saber que era um homem) e que veio pedir desculpas enfim... houve montes de gente a ir atrás daquilo. Portanto, relativamente a isso, o meu conselho e só um: se eu quero falar com alguém e se quero saber a sua opinião não vou à internet, vou falar com a pessoa. A internet é uma coisa para nos entretermos. Eu não estou a dizer que não há coisas credíveis, há coisas credíveis, há sites, sabemos quem é a pessoa, sabemos o que ela escreve, conhecemos portanto, supostamente, que aquilo que está no seu blog corresponde à verdade. Por exemplo em relação às “primaveras árabes” até houve quem dissesse que eram as revoluções Facebook, quer dizer isso é tudo muito bonito, dá para a malta conversar no café, é giro, é uma frase bonita, faz um título engraçado na imprensa, mas a revolução não foi feita pelo Facebook ele foi uma ferramenta, só isso. Eu quando digo Facebook são todas essas plataformas online. Foram essas ferramentas que ajudaram, mas da mesma forma que há cinquenta anos o telefone ajudava. Há cem anos não havia fax, não havia televisão e, portanto, a informação demorava muito mais tempo a circular, as coisas eram mais difíceis e mais demoradas mas só nesse aspecto, quer dizer, não é o instrumento que faz a revolução. Sabendo nós que vivemos uma “guerra” de excesso de informação, como se lida com uma situação destas? Como é que o jornalista acede, trata e confia no que se pode chamar informação, hoje? De facto, principalmente com o nascimento da internet, parece que cada cidadão pode tomar o papel de jornalista e ele próprio fornecer informação aos outros cidadãos. Sabemos que a internet não é um meio muito fiável de informar, mas para si, como jornalista, despreza essas informações ou serve-se delas? 12 13
  • 16. UM ASSUNTO CONSPIRAÇÃO. COM ROBERT CORRESPONDENTE DIZ UMA COISA OS CONFLITOS TANTO NOS JORNAIS TEMPO, POR EXEMPLO, ÀS NOTÍCIAS AS JORNALISMO TÊM PARA ALCANÇAREM DEVE QUALIFICAÇÕES, HÁ NOTÍCIAS PARA O “DONO”, QUE É O JORNALISTAS QUE FIZERAM AS NOTÍCIAS; VEM DA DE QUE O CRISTIANO NÃO AVIÃO DESCOLAR TRANSPORTANDO A VEREM A ESCORREGOU A CERTEZA DE QUALQUER INFORMAÇÃO QUE COISA QUE É HÁBITO NO JORNALISMO QUE CONSTATAR QUE E NÃO O JORNALISTA PORQUE AS NOTÍCIAS SÉRIE DE SITES, Altera, em primeiro lugar conduz à superficialidade, ou seja, nós só tratamos um assunto pela rama e saltamos logo para outro, para outro e para outro... Isso é um pouco teoria da conspiração. Mas é possível, sim. Acho que isso é tratado dessa forma com objectividade e com intenção. Há um senhor que se chama Robert Fisk. Ele escreve para o “The Independent”. É o mais antigo correspondente ocidental no Médio Oriente. Ele deve estar no Líbano, foi para lá em 1976 portanto há quase quarenta anos que lá permanece. Diz uma coisa muito simples quando fala para os jovens repórteres que lá aparecem. Aconselha-os a que levem um livro de história em vez da internet, para perceberem como é que tudo aquilo evoluiu e os conflitos que hoje surgem, pois são conflitos muito antigos que não nasceram ontem. Depois há outra coisa que é o ciclo de vida das notícias, que eram quase de 24 horas tanto nos jornais como nas televisões. Na rádio era de hora em hora, actualmente é de segundo em segundo na internet. Portando há aqui um momento em que nós temos de parar para pensar o que fazer da informação: se continuamos nesta corrida louca ou se realmente fazemos uma triagem e damos mais tempo, por exemplo, às notícias que de facto são notícias importantes, aprofundando essa informação e deixando cair aquilo que é superficial, quer dizer aquilo que é “ruído”. Mas isso é um trabalho que os jornalistas têm de fazer. O problema aqui é que as empresas de comunicação, actualmente, têm muitos mais interesses para além do jornalismo e o jornalismo acaba por ser um instrumento na mão delas e dos seus interesses económicos muito diferentes. Acaba por ser a guerra da informação e a guerra económica em que as empresas esgrimem a comunicação que têm para alcançarem outro tipo de objectivos que não o de informar e, se calhar, estamos no tempo em que é necessário voltar a equacionar a quem se deve atribuir uma empresa de informação. Para se exercer determinadas profissões é preciso ter determinadas qualificações, mas qualquer pessoa pode ter um órgão de comunicação social. Não há incompatibilidades ou seja, por exemplo, no Público há notícias desagradáveis para o Belmiro de Azevedo? Alguém consegue encontrar alguma? Tenho dúvidas... No Expresso há notícias desagradáveis para o Balsemão? Tenho dúvidas... Na Cofina há notícias desagradáveis para o Paulo Fernandes? Tenho dúvidas... Curiosamente há um sítio onde há notícias para o “dono”, que é o Estado. Curiosamente é o serviço público que é atacado por toda a gente Porque será? É o espaço onde há mais liberdade, havendo condicionalismos... Eu não estou a dizer que é totalmente livre, estou a dizer que é o espaço onde há mais liberdade. Toda as pessoas atacam o serviço público, porquê? Porque querem acabar com esse espaço de liberdade... Enquanto que antigamente uma notícia tardava em chegar, hoje ela é visualizada quase no momento em que acontece... Acha que, devido a essa evolução, o facto de a informação chegar de uma forma mais rápida tem danificado a pertinência da mesma? Até que ponto os órgãos de comunicação não estarão a manipular os cidadãos dando-lhes notícias a um tal ritmo que eles nem podem aprofundar o conteúdo? Altera, em primeiro lugar conduz à superficialidade, ou seja, nós só tratamos um Isso é um pouco teoria da conspiração. é tratado dessa forma com Há um senhor que se chama Robert É o mais antigo correspondent Ele deve estar no Líbano, foi para lá em 1976 portanto há quase quarenta anos que lá permanece. Diz uma vez da internet, para perceberem como é que tudo aquilo evoluiu e os Depois há outra coisa que é o ciclo de vida das notícias, que eram quase de 24 horas tanto nos Portando há aqui um momento em que nós temos de parar para pensar o que fazer da informação: se continuamos nesta corrida louca ou se realmente fazemos uma triagem e damos mais tempo, por exemplo, à O problema aqui é que as muitos mais interesses para além do jo um instrumento na mão delas e Acaba por ser a guerra da informação e a guerra económica em que as empresas esgrimem a comunicação que têm para a equacionar a quem se deve Para se exercer determinadas profissões é preciso ter determinadas quali Não há incompatibilidades ou seja, por exemplo, no Público há notícias desagradáveis para o Belmiro de Azevedo? Alguém consegue encontrar alguma? Tenho dúvidas... No Expresso há notícias desagradáveis para o Balsemão? Tenho dúvidas... Na Cofina há notícias desagradáveis para o Paulo Fernandes? Tenho dúvidas... Curiosamente há um sítio onde há no Porque querem acabar com Às agências, normalmente, nós atribuímos mais credibilidade porque é suposto que a notícia, quando chega à agência, tenha percorrido os trâmites que respeitam os critérios jornalísticos ou seja, foram os jornalistas que fize Portanto eu tenho, à partida e teoricamente, confiança na notícia que vem da banana da internet. No caso, Foi a EFE, que é a agência de noticias espanhola; não sei se acompanhaste isso, mas às tantas, estava a dar a notícia de que o Quer dizer, a agência embarcou nisto. Eu se foi um jornalista maduro ou se foi um jornalista verde, mas um jornalista um pouco maduro perceberia que não era fácil um avião descolar transpo A EFE embarcou nisto e houve vários órgãos de informação que, ao verem fez isso e portanto escorre Eu não consigo estabelecer essas hierarquias; acho que as agências são confiáveis. Dos meus colegas espero exactamente a mesma coisa. No mínimo, quando não têm a certeza Eu acho que é assim que As fontes, os protagonistas é assim: quando tu pedes a opinião ou a versão ao protagonista é a versão dele; é evidente que nós também temos a obrigação de a tentar confirmar, para saber se ele está a mentir ou não, porque há uma coisa que é hábito no Não digo que consigamos fazer isso sempre, porque muitas vezes é possível constatar ser desmontado. Hoje em dia isso não é feito com essa história de ouvir as partes para validar a notícia; é insuficiente e às vezes é sinal de jornalismo preguiçoso. É preguiçoso o jornalismo e não o jornalista Os jornalistas, sobretudo jornalistas mais em operários das notíc É curioso! Às vezes faço, através da internet, uma pesquisa sobre determinado assunto e vejo uma série de
  • 17. PELA RAMA MAS FISK. MUITO SIMPLES QUANDO QUE HOJE COMO NAS TELEVISÕES. QUE DE FACTO SÃO NOTÍCIAS EMPRESAS E DOS OUTRO TIPO DE ATRIBUIR MAS QUALQUER ESTADO. CURIOSAMENTE É O SERVIÇO PÚBLICO QUE É ATACADO ESSE PORTANTO EU, À PARTIDA, ESPERO AGÊNCIA; PENSO RONALDO, NO REGRESSO DO SEI SELECÇÃO NACIONAL E NINGUÉM NOTÍCIA NA QUE ME ESTÃO A AS É: ACONTECE QUALQUER COISA QUE ENVOLVE DUAS ELES NÃO PESSOAS TAMBÉM TÊM UMA SÉRIE NOVOS, BLOGS, AGÊNCIAS Que fontes é que considera mais confiáveis: as agências, os colegas ou os próprios protagonistas da notícia? Às agências, normalmente, nós atribuímos mais credibilidade porque é suposto que a notícia, quando chega à agência, tenha percorrido os trâmites que respeitam os critérios jornalísticos ou seja, foram os jornalistas que fizeram as notícias; portanto eu, à partida, espero que esses jornalistas tenham feito o percurso como ele deve ser feito: que tenham confirmado as informações, que tenham confrontado as diversas partes envolvidas na notícia... Portanto eu tenho, à partida e teoricamente, confiança na notícia que vem da agência; curiosa e recentemente houve uma agência que escorregou na casca da banana da internet. No caso, penso que até aconteceu no Twitter. Foi a EFE, que é a agência de noticias espanhola; não sei se acompanhaste isso, mas às tantas, estava a dar a notícia de que o Cristiano Ronaldo, no regresso do europeu tinha perdido o avião porque tinha ficado para trás a fim de comprar um bolo, num bar do aeroporto. Quer dizer, a agência embarcou nisto. Eu não sei quem fez a notícia, não sei se foi um jornalista maduro ou se foi um jornalista verde, mas um jornalista um pouco maduro perceberia que não era fácil um avião descolar transportando a selecção nacional e ninguém dar pela falta do Ronaldo. No mínimo parava dois minutos para pensar e confirmar se aquilo era assim ou não. A EFE embarcou nisto e houve vários órgãos de informação que, ao verem a notícia na agência, seguiram aquele raciocínio, mas a agência parece que não fez isso e portanto escorregou na casca da banana. Eu não consigo estabelecer essas hierarquias; acho que as agências são confiáveis. Dos meus colegas espero exactamente a mesma coisa. No mínimo, quando não têm a certeza de qualquer informação que me estão a dar podem da-la e fazer essa ressalva que é “eu acho que é assim mas não tenho a certeza, portanto tem cuidado”. Eu acho que é assim que as coisas devem ser feitas. As fontes, os protagonistas é assim: quando tu pedes a opinião ou a versão ao protagonista é a versão dele; é evidente que nós também temos a obrigação de a tentar confirmar, para saber se ele está a mentir ou não, porque há uma coisa que é hábito no jornalismo que é: acontece qualquer coisa que envolve duas pessoas; nós ouvimos uma , ouvimos outra e o nosso trabalho está feito; mentira, nós temos a obrigação de verificar se o que um e outro dizem corresponde à verdade, tentar aprofundar até onde for possível. Não digo que consigamos fazer isso sempre, porque muitas vezes é possível constatar que eles não estão a dizer a verdade e, portanto, isso depois tem de ser desmontado. Hoje em dia isso não é feito com essa história de ouvir as partes para validar a notícia; é insuficiente e às vezes é sinal de jornalismo preguiçoso. É preguiçoso o jornalismo e não o jornalista porque as pessoas também têm uma série de coisas para fazer. Isso também tem um pouco a ver com a gestão. Hoje em dia uma das formas de também condicionar a informação é retirar-lhe os meios económicos. Os jornalistas, sobretudo jornalistas mais novos, estão a ser transformados em operários das notícias e não jornalistas. É curioso! Às vezes faço, através da internet, uma pesquisa sobre determinado assunto e vejo uma série de sites, blogs, agências de clipping, com textos iguais ou seja, “copy paste”, iguais nas mais diversas fontes... 14 15 assunto pela rama e saltamos logo para outro, para outro e para outro... Mas é possível, sim. Acho que isso objectividade e com intenção. Fisk. Ele escreve para o “The Independent”. te ocidental no Médio Oriente. coisa muito simples quando fala para os jovens repórteres que lá aparecem. Aconselha-os a que levem um livro de história em conflitos que hoje surgem, pois são conflitos muito antigos que não nasceram ontem. jornais como nas televisões. Na rádio era de hora em hora, actualmente é de segundo em segundo na internet. às notícias que de facto são notícias importantes, aprofundando essa informação e deixando cair aquilo que é superficial, quer dizer aquilo que é “ruído”. Mas isso é um trabalho que os jornalistas têm de fazer. empresas de comunicação, actualmente, têm ornalismo e o jornalismo acaba por ser dos seus interesses económicos muito diferentes. alcançarem outro tipo de objectivos que não o de informar e, se calhar, estamos no tempo em que é necessário voltar atribuir uma empresa de informação. ificações, mas qualquer pessoa pode ter um órgão de comunicação social. otícias para o “dono”, que é o Estado. Curiosamente é o serviço público que é atacado por toda a gente Porque será? É o espaço onde há mais liberdade, havendo condicionalismos... Eu não estou a dizer que é totalmente livre, estou a dizer que é o espaço onde há mais liberdade. Toda as pessoas atacam o serviço público, porquê? esse espaço de liberdade... eram as notícias; portanto eu, à partida, espero que esses jornalistas tenham feito o percurso como ele deve ser feito: que tenham confirmado as informações, que tenham confrontado as diversas partes envolvidas na notícia... da agência; curiosa e recentemente houve uma agência que escorregou na casca penso que até aconteceu no Twitter. Cristiano Ronaldo, no regresso do europeu tinha perdido o avião porque tinha ficado para trás a fim de comprar um bolo, num bar do aeroporto. não sei quem fez a notícia, não sei ortando a selecção nacional e ninguém dar pela falta do Ronaldo. No mínimo parava dois minutos para pensar e confirmar se aquilo era assim ou não. a notícia na agência, seguiram aquele raciocínio, mas a agência parece que não egou na casca da banana. de qualquer informação que me estão a dar podem da-la e fazer essa ressalva que é “eu acho que é assim mas não tenho a certeza, portanto tem cuidado”. as coisas devem ser feitas. jornalismo que é: acontece qualquer coisa que envolve duas pessoas; nós ouvimos uma , ouvimos outra e o nosso trabalho está feito; mentira, nós temos a obrigação de verificar se o que um e outro dizem corresponde à verdade, tentar aprofundar até onde for possível. que eles não estão a dizer a verdade e, portanto, isso depois tem de porque as pessoas também têm uma série de coisas para fazer. Isso também tem um pouco a ver com a gestão. Hoje em dia uma das formas de também condicionar a informação é retirar-lhe os meios económicos. novos, estão a ser transformados cias e não jornalistas. sites, blogs, agências de clipping, com textos iguais ou seja, “copy paste”, iguais nas mais diversas fontes...
  • 18. Eu acho que não. Prejudica se nós tivermos consciência disto que eu acabei de dizer, ou seja, a mim não me prejudica nada chegar a uma banca de jornais e ter lá cinquenta, nos quais eu não confio e, portanto, não compro. Eu acho que a liberdade deve existir; não devemos também agora entrar numa atitude censória, até porque quem publica coisas, quer seja na internet, quer seja noutro sítio qualquer, que não correspondem à verdade e que possam, de algum modo, estragar a vida a outras pessoas, pode ser chamado à justiça. Isso não está colocado de parte. Agora as pessoas também devem ter algum trabalho. Não sei se podes generalizar, mas as pessoas querem tudo na bandeja e não se preocupam em saber, dá algum trabalho, não é!? A telenovela é mais fácil. É frequente por exemplo, ouvirmos as pessoas dizerem: Onde é que viste, onde é que leste? Na internet. Mas na internet onde? Isto tem a ver com o nível de cada comunidade , tem a ver com a educação que as pessoas têm, com a sua formação, com a sua cultura. Temos mais meios, mais recursos, o conhecimento está a níveis que nunca esteve. É normal, tem evoluído. Porque é que temos mais desemprego e mais fome? Porquê? Se calhar alguém se está a apropriar dos recursos que deviam ser melhor distribuídos, não? Porque acham que têm o direito de se apropriar, porque trabalham muito e são muito inteligentes. Eu não percebo como é que há gestores que ganham prémios de milhões, não percebo! Será que produzem assim tanta riqueza? Eu estou a falar de riqueza real, não é a “multiplicação dos pães”, eles multiplicam o dinheiro, eles não produzem riqueza, quer dizer, há aqui coisas que são diferentes, e ganham milhões; e a informação é a mesma coisa: informação é poder! Quem tem a informação pode geri-la, e gere... Depois gere em função dos interesses que podem ser bons, podem ser maus, tanto podem ser interesses altruístas, como podem ser muito sacanas... No terreno é muito melhor, mas é assim: para quem está na redacção, a notícia tem de chegar de alguma forma; pode chegar por um telefonema, por um alerta numa agência de notícias, pelas BREAKING NEWS mas, a partir daí, começa a desenvolver-se um processo que deve ser independente. Quem é que consegue ser independente? Vamos lá ver. Primeiro temos que definir o que é a independência, não é? Nenhum de nós é independente ao ponto de não precisar dos outros, porque vivemos em sociedade. Temos de viver uns com os outros. Para se dizer que alguém é ou não independente é preciso primeiro definir muito bem a que tipo de independência é que nos estamos a referir, e eu acho que o jornalista tem um código deontológico, tem um estatuto que lhe dá as ferramentas para ele ser independente; independente na construção da notícia, em saber quem é que quer ouvir e como é que vai investigar, o que é que para ele é notícia, o que é que não é notícia, o que é que é verdade, o que é que não é verdade, o que é que está confirmado, o que é que não está... Tem as ferramentas para ter essa independência. Agora “não pode estar de bem com Deus e com o Diabo”. Não pode querer ser completamente independente, porque a independência tem um preço, e porque vivemos em sociedade e temos essa estrutura de empresas que têm interesses, hierarquias que se manifestam em influências. O jornalista tem de saber viver dentro disto. Enquanto jornalista, se eu tiver como objectivo chegar ao topo da hierarquia, tenho uma atitude, se eu tiver objectivo ser jornalista, tenho outra. É assim: só é condicionável quem se deixa condicionar. Eu posso atender a algumas razões de factos importantes para travar uma notícia, por exemplo em vez de dar a notícia agora, dá-la daqui a duas ou três ou quatro. Há questões que são atendíveis, mas não por razoes políticas, atenção, não estou a falar em razões políticas. Será que este excesso de informação prejudica a liberdade que nós pensamos que temos, devido a esta evolução dos meios? Mas se existem mais meios e mais facilidade no acesso, porque será que não os usamos de uma forma mais consciente, mais inteligente? É mais fácil agir de uma forma independente no terreno ou na redacção? Um jornalista ainda consegue ser independente? Acha que o poder político pode controlar a forma “livre” como acedemos à informação?
  • 19. Sim, tenho uma. Por exemplo, lembro-me bem. Estava no Iraque e os homens da GNR foram alvo de uma emboscada. Três ou quatro deles ficaram feridos e eu estava lá com eles. Não estava na emboscada, mas estava no Iraque e soube imediatamente que aquilo tinha acontecido. Isto foi em 2004 e nessa altura as comunicações no Iraque eram muito difíceis, porque eram só por satélite, não havia telemóveis, era preciso ligar o satélite. O comandante da GNR lá percebeu que eu tinha sabido e houve um contacto qualquer com o comando da GNR em Portugal, que me ligou a pedir para eu não dar a notícia pois queriam primeiro avisar as famílias. Essa é uma razão atendível, ou seja, eu não iria deixar de dar a notícia. Mas em vez de dá-la no momento em que tive a informação, dei-a uma hora ou duas depois. Eu acho que é humano, quer dizer, ninguém ganha nada e às vezes é uma competição estúpida entre órgãos de informação, só porque deram primeiro a notícia. Se o nosso objectivo é informar o público, não se ganha nada em dar a notícia uma hora mais ou meia hora mais cedo e não vamos criar problemas com as pessoas que são apanhadas de surpresa. Supondo que alguém pede que não se dê a notícia porque vai prejudicar a carreira política. Aí tenho muita pena, mas não atendo o pedido... As coisas, por vezes, são dadas de uma forma um pouco sensacionalista, não é? Pois, para dar mais dimensão à notícia do que aquela que ela realmente tem. Eu acho que não tem tanto a ver com conteúdos, com a força intrínseca da informação .Tem mais a ver com a forma. Na televisão diz-se normalmente que não há imagem, não há notícia, certo? Na rádio se não há som, não há notícia; neste aspecto os jornais têm mais facilidade porque, mesmo que não tenham imagem, mesmo que não tenham som, basta terem falado com alguém que disponibilize a informação, podem construir a notícia. Eu acho que isto não devia ser assim e às vezes não é, mas as regras são estas: se não há som a rádio tem alguma dificuldade em dar a notícia. Eu acho que não, se nós temos a informação, se a validámos através dos critérios que conhecemos, se há uma notícia, havendo som ou não, havendo imagem ou não, nós devemos dá-la. Agora, de facto há essa ideia que eu não digo que seja boa ou seja má, apenas que não concordo muito com ela. Há uma fronteira cada vez mais esbatida entre aquilo que é informação e aquilo que é entretenimento. Há aqui dois tipos de culpa. Para mim é feito em nome das audiências e lá está, é feito em nome daquilo que as pessoas querem ver, não em nome do que é importante, do que é notícia, não em nome dos critérios que definem o chamado valor notícia. Portanto é feito em função daquilo que supostamente as pessoas querem ver. Há aqui dois tipos de culpa no meio disto. Em primeiro lugar há culpa dos jornalistas. Perante a notícia que o Ronaldo foi comer um bolo, um editor devia ter a coragem de dizer: “Está bem, que faça bom proveito”. Põe para o lado. Mas ele não tem coragem de fazer isso porque, depois perante as audiências, aparecendo a peça do Ronaldo, elas disparam. O Ronaldo ir comer um bolo não é notícia em parte nenhuma do mundo, mas é um momento de entretenimento para quem vê televisão: “olha que giro o Ronaldo foi comer um bolo, e até tinha o chapéu com a pala virada para trás e mudou o brinco para a outra orelha”. Eu também gosto de ver essas coisas, também gosto de entretenimento, acho que qualquer jornalista gosta. Também vamos ao cinema, se calhar espreitamos as telenovelas, ficamos a ver o futebol, não tem mal nenhum. Não há aqui nenhum fundamentalismo. Agora aquilo que é preciso, é estabelecer a fronteira. O segundo culpado são as pessoas do entretenimento, porque elas sabem que, por enquanto, o jornalismo é sinónimo de credibilidade. As pessoas ouvem o jornalista e acreditam nele ou pelo menos deviam acreditar e, portanto, atraem o jornalista para a sua área, beneficiando assim, dessa credibilidade. Por sua vez o jornalista, muitas vezes, deixa-se abraçar neste abraço envenenado, porque tem sede de protagonismo, gosta de aparecer. Portanto, há aqui uma fronteira informação/entretenimento que está cada vez mais esbatida, precisamente porque há esta conjunção de interesses, que não tem em causa o interesse público, mas apenas as audiências, o protagonismo, etc... Tem alguma experiência que possa partilhar? Como trata a notícia para os diferentes meios? Considera que a informação, mais particularmente nos meios audiovisuais, é vista como entretenimento? 16 17
  • 20. RANKING MUNDIAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA 2011/12 Publicado em 25 de janeiro de 2012, a décima edição do Ranking da Liberdade de Imprensa conclui que as mudanças têm sido abundantes e as alterações refletem a actualidade no mundo árabe. Muitos meios de comunicação social pagaram caro a cobertura das aspirações democráticas desses movimentos de poder e de sobrevivência para os regimes repressivos e totalitários. 2011 reflecte o papel desempenhado pelos internautas para a divulgação de informações. Repressão é a palavra do ano. Nunca a liberdade de informação foi tão associada à democracia, nunca um jornalista envergonhou tanto os inimigos da liberdade, nunca os actos de censura e os danos à integridade física dos jornalistas parecem ter sido tantos.O trio infernal é composto pela Eritreia, Turquemenistão e Coreia do Norte, ditaduras onde não há liberdade pública, ocupando, sem surpresa, o fim da lista. Este ano, a Síria, o Irão e a China parecem ter perdido o contacto com a realidade, sugados por uma espiral louca de terror. Igualmente o Bahrain e o Vietnam, por excelência regimes opressivos. Outros países como Uganda e a Bielorussia são igualmente enfraquecidos pela vantagem da repressão. A classificação dos Repórteres sem Fronteiras, no período 2011/2012, mostra que a Finlândia, Noruega e Países Baixos continuam a respeitar as liberdades fundamentais, lembrando-nos que a imprensa independente deve ser preservada em democracias fortes e que a democracia vive da liberdade de imprensa. De no tar a entrada de dois países africanos: Cabo Verde e Namíbia, nos vinte mais bem classificados. Dois países africanos onde nenhuma interferferência foi apontada ao trabalho dos jornalistas durante o ano de 2011. OS MOVIMENTOS DE PROTESTO O mundo árabe tem sido o motor da história em 2011, contrastada pelas evoluções políticas. Destaques para a Tunísia e o Bahrain, em lugares opostos: a Tunísia, no lugar 134, progrediu 30 lugares num regime democrático que ainda não dá espaço pleno a uma imprensa independente. O Bahrain, no lugar 173, perdeu 29 lugares, devido à repressão implacável dos movimentos democráticos, processos em série aos defensores dos direitos humanos e bloqueio à liberdade. A Líbia no 154, virou a página da Era Kadafi. O Iemen estagnou na posição 171, assolado pela violência entre oposição e apoiantes do presidante Ali Abdullah Saleh. Ambos os países têm um futuro incerto. A questão de dar um lugar à imprensa continua por resolver. O Egipto perde 39 assentos; posiciona-se no lugar 166, com as esperanças democráticas a ficarem decepcionadas, onde o Conselho Supremo das Forças Armadas, no poder desde fevereiro de 2011, teima em não acabar com a prática decorrente da ditadura de Hosni Mubarak. A Síria, no lugar 176, já estava colocada, em 2010, numa má classificação e afundou ainda mais com a censura absoluta, vigilância generalizada, violência aleatória e manipulação do sistema que tornou impossível o trabalho dos jornalistas. Noutras partes do mundo, alguns movimentos democráticos t~em procurado imitar o exemplo árabe, mas foram recebidos com repressão feroz. Caso do Vietnam, no lugar 172, onde as prisões se têm intensificado. O regime chinês, em 174, tem assistido a alguns movimentos regionais e locais da pessoas contra as injustiças e escândalos, o que tem fortalecido o controlo da informação e o aumento das detenções extrajudiciais; também uma censura apertada na internet. Violência, ameaças e detenções têm explodido no Azerbeijão, no lugar 162, onde o regime autocrático de Ilham Aliev não hesitou em lançar internautas na prisão, sequestrar jornalistas de oposição e fechar meios de comunicação social estrangeiros. Uganda, no lugar 139. O regime do presidente Yomen Museveni lançou uma ofensiva, sem precedentes, contra os movimentos da oposição e meios de comunicação independentes, após as eleições de fevereiro de 2011. Da mesma forma o Chile, no lugar 80, perde 47 lugares, devido a numerosas violações da liberdade de informação, muitas vezes cometidas por forças de segurança, contra os movimentos estudantis. Os Estados Unidos, na posição 47, também desceu 27 lugares, com adetenção de vários jornalistas que firezam a cobertura do movimento “Ocupar Wall Street”. MICHAEL NAJJAR NETROPOLIS
  • 21. VÁRIOS PAÍSES EUROPEUS ABANDONAM O RESTO DO CONTINENTE. O ranking destaca a tenda de alguns países com o resto do continente. A repressão do protesto para a reeleição do presidente Lukashenko, em Belarus, é perder 14 assentos (168). Num momento em que ele aparece como um modelo regional. Túrquia (148, menos 10 lugares), opera um enorme retrocesso. Longe das reformas prometidas, a justiça lançou ataques a jornalistas, numa escala sem precedentes, desde o regime militar. Dentro da EU, o ranking reflecte uma certa falta de progresso, sempre marcada por uma clara divisão entre os países tradicional e altamente cotados (Finlândia, Países Baixos) e aqueles, como A Bulgária (80), Grécia (70) e Itália (61) que não resolvam os seus problemas com a liberdade de imprensa, principalmente pela falta de vontade política sobre o assunto. França, ela cresceu ligeiramente, passando de 44 para o lugar 38, tal como a Espanha (39) e Roménia (47). Liberdade de Imprensa é mais do que nunca um desafio na Península Balcânica, presa entre o desejo de integração europeia e os efeitos deletérios da crise económica. A PERPETUAÇÃO DA VIOLÊNCIA Vários países são marcados por uma cultura de violência contra a imprensa, que está definitivamente implantada. Vai ser difícil de reverter, sem uma luta eficaz contra a impunidade. México e Honduras são, respectivamente, na posição 149 e 135. Paquistão (151) é, para o segundo ano consecutivo, o país mais letal para os jornalistas. Somália (164), em guerra há vinte anos, que em nada sugere uma situação de caos, onde os jornalistas pagaram um alto preço. Irão (175), a repressão e humilhaão de jornalistas foram erguidas por muitos anos na cultura política do poder. O sistema alimenta-see de repressão da Media. Iraque (152) despencou 22 lugares e aproxima-se, perigosamente, de sua posição em 2008 (158) VARIAÇÕES SIGNIFICATIVAS Sul do Sudão, jovem nação enfrenta vários desafios, fez a sua estreia no ranking para a posição de honra (111), para este subconjunto de qualquer um dos países mais bem classificados. Sudão (170), Birmânia (169). É avaliado ligeiramente melhor do que em anos anteriores, seguindo as mudanças políticas nos últimos meses e que tenham mostrado alguma promessa, no entanto a ser confirmada. Níger (29) registou o maior aumento do ranking, com 75 assentos conquistados por uma transição política bem sucedida. É também o continente africano que representa as maiores quedas: Djibouti, ditadura pouco discreta do corno de África, perdeu 49 assentos (159). Malawi (146) perdeu 67 assentos por causa da deriva totalitária do seu presidente, Bingu Wa Mutharika. Citado acima, Uganda (139) perdeu 43 lugares (139) perdeu 43 lugares. Finalemte entre So Campos de Laurent Gbagbo e Quattara Alassane, que atingiu a imprensa. Na América Latina, a queda mais sensível recaiu o Brasil, está no 99, uma descida de 41 pontos, devido à grande insegurança que se reflectiu, em particular, pela trágica morte de três jornalistas e blogueiros. 18 19
  • 22. Assomada, Cabo Verde, 19 jul (Lusa) - As equipas de reportagem da delegação da Televisão de Cabo Verde (TCV) em Santa Catarina de Santiago estão a ser acompanhadas por polícias à paisana no terreno, devido às sucessivas ameaças à integridade física dos jornalistas. Em causa está a inédita repetição, devido a fraudes eleitorais, da votação autárquica, no domingo, em duas pequenas localidades - Boa Entrada e Cruz Grande - de Santa Catarina de Santiago, na ilha de Santiago, de cujos resultados depende a eleição do novo presidente da câmara, o que tem gerado um clima de tensão política num concelho com cerca de 60.000 habitantes. Julieta Tavares, delegada e jornalista da TCV há sete anos na Assomada ("capital" de Santa Catarina de Santiago), disse à Lusa serem recorrentes as ameaças à sua integridade física por parte de vários atores políticos, que não especificou, razão pela qual apresentou, desta vez, uma queixa na polícia local. "É muito difícil trabalhar aqui em Santa Catarina, porque é uma região de gente simples, mas também complicada a nível político. Tudo é politizado e dificilmente se consegue ficar à margem da política. Ou se é A ou B. Não se pode ser C", disse, lembrando que já foi várias vezes perseguida até casa. "Já me ameaçaram bater, perseguiram-me até casa e disseram que vão fazer tudo para me tirar daqui. Como sou delegada da TCV, todos pensam que fui nomeada pelo poder", desabafou, frisando a isenção, "por todos reconhecida", do seu trabalho. Lembrando que já durante a campanha das autárquicas de 01 deste mês se viveram momentos de tensão, Julieta Tavares sublinhou "não ser normal" haver um órgão de comunicação social "com segurança policial" para poder trabalhar. À Lusa, o comandante regional de Santiago Norte da polícia cabo-verdiana, Alcides da Luz, confirmou a presença da polícia junto à delegação da TCV para acompanhar, por precaução, os jornalistas nas reportagens. "Recebemos uma denúncia da delegada (da TCV) e tomámos as medidas que devíamos tomar. Neste momento, temos um polícia colocado na delegação", disse. Também à Lusa, Valdemar Pires, diretor da TCV, disse estar “preocupado e apreensivo” com a violação aos direitos dos jornalistas, lembrando que Cabo Verde surgiu em 9.º lugar no último “ranking” mundial sobre liberdade de imprensa. “Onde estamos? Estamos a falar de Cabo Verde, que é considerado um ‘farol’ de democracia em África, o nono país do mundo em liberdade de imprensa? É lamentável”, sublinhou, frisando que a situação obrigou a direção da televisão pública cabo-verdiana a enviar para a Assomada uma equipa de trabalho da sede, na Praia. “Qual é a finalidade destas pessoas? Gostam de intimidar jornalistas? Esta situação indigna a sociedade cabo-verdiana no seu todo”, frisou. A presidente da Associação de Jornalistas Cabo-Verdianos (AJOC), Carla Lima, responsabilizou também os partidos políticos pela atual situação. Carla Lima salientou a importância da colaboração da polícia e considerou intimidações e ameaças lamentáveis e pediu aos partidos políticos - Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) e Movimento para a Democracia (MpD) - um “papel pedagógico” junto de dirigentes, militantes e apoiantes. DELEGADO DA ANGÊNCIA LUSA, EM CABO VERDE JOSÉ SOUSA DIAS CABO VERDE/AUTÁRQUICAS NAQOYQATSI GODFREY REGGIO 2002
  • 23. ANGOLA CAI NA LISTA DOS REPÓRTERES SEM FRONTEIRAS Alguns regimes enfrentaram fortes reivindicações políticas e sociais”, referiu o documento, acrescentando que a polícia tentou reprimir com violência em muitos casos, isso foi o caso de Angola que os governantes tem que aprender que a contestação a má governação não se resolve com violência mas sim com mais reformas sociais. Brasil e Angola caíram na lista dos Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que classifica a liberdade de imprensa no mundo, e Cabo Verde está entre os dez países que lideram o ranking, revela um relatório hoje divulgado. Entre os países lusófonos, uma das quedas mais sensíveis no ranking foi a do Brasil, que passou do 58.º lugar em 2010 para 99.º em 2011, em resultado da morte de três jornalistas e bloguers. “No norte e nordeste do país, como nas regiões de fronteira com o Paraguai, a corrupção local, as atividades do crime organizado ou os atentados contra o meio ambiente são temas perigosos para os jornalistas, mas também para os bloguers”, sublinhou o relatório. Embora os RFS tenham reconhecido avanços na luta contra a impunidade, detetou também substanciais diferenças em função das regiões, com grandes pressões dos poderes locais. “Muito embora a primavera árabe não se tenha estendido à África subsaariana, ao ponto de ter provocado a queda de governos, alguns regimes enfrentaram fortes reivindicações políticas e sociais”, referiu o documento, acrescentando que a polícia tentou reprimir com violência em muitos casos. “Este foi o caso em Angola, que ficou em 132.º lugar (104.º em 2010), onde vários jornalistas foram detidos durante as manifestações de setembro”, avançou o documento. Várias manifestações e marchas foram organizadas por grupos de jovens, tendo sido muitos presos e enfrentado julgamentos em tribunais angolanos. O primeiro Estado não europeu do ranking é Cabo Verde, que ocupa a 9.ª posição (subiu na tabela, já que em 2010 ocupava o 26.º lugar). O relatório diz que Cabo Verde é uma “democracia saudável, modelo de boa governação, onde a alternância faz parte da vida política, como se constatou nas eleições presidenciais do verão passado. Os jornalistas são completamente livres e o acesso de todas as forças políticas aos meios de comunicação públicos está assegurado”. A Guiné-Bissau sofreu uma queda na lista, passando de 67.º lugar em 2010 para 75.º em 2011, num país em que a agitação política, os sucessivos assassínios e golpes contra o governo são uma constante. Portugal ascendeu na tabela, passando do 40.º lugar em 2010 para 33.º em 2011. Timor-Leste e Moçambique também subiram no ranking, de 93.º lugar em 2010 para 86.º em 2011, e da 98.ª posição em 2010 para 66.ª em 2011, respetivamente. A Guiné Equatorial, que pediu a adesão à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), passou de 167.º lugar em 2010 para 161.º em 2011. Depois da Finlândia e da Noruega, que partilham o primeiro lugar na tabela, surgem a Estónia e a Holanda, ambas no segundo lugar, seguindo-se a Áustria, Islândia e Luxemburgo. Por oposição, no final da lista, estão a Eritreia, a Coreia do Norte, o Turquemenistão, a Síria, o Irão, a China, o Bahrein, o Vietname, o Iémen e o Sudão. Para realizar este índice, que abrange 179 países, a RSF dirigiu um inquérito a 18 associações de defesa da liberdade de expressão nos cinco continentes, aos seus 150 correspondentes, bem como a jornalistas, investigadores, juristas e militantes dos direitos humanos. O documento refere-se a ataques diretos contra jornalistas e cibernautas (mortes, detenções, agressões, ameaças) e a meios de comunicação social (censura, apreensões, perseguições e pressões). 20 21 CIRCULO ANGOLANO INTELECTUAL, JANEIRO 26, 2012
  • 24. A HRW, DENUNCIA AS DETENÇÕES ARBITRÁRIAS DE OPOSITORES DO REGIME À medida que se vão aproximando as eleições em Angola, marcadas para 31 de agosto, aumenta a tensão no país e sucedem-se as denúncias de atropelos aos direitos fundamentais e de repressão. Esta quinta-feira (05.07) foi a vez da Human Rights Watch (HRW) fazer, num comunicado, severas acusações ao regime de José Eduardo dos Santos. Leslie Lefkow directora-adjunta da divisão africana da Human Rights Watch (HRW) expressa a sua apreensão pela “vaga de abusos graves cometidos contra manifestantes”. Segundo a HRW estes abusos são “um sinal alarmante de que o governo angolano não aceita a dissidência pacífica”. ESCALADA DE VIOLÊNCIA NA REPRESSÃO DAS MANIFESTAÇÕES EM ANGOLA Desde 2011 que em Angola se têm realizado protestos públicos, sem precedentes, encabeçados por movimentos juvenis e veteranos de guerra. Os jovens reivindicam reformas económico-sociais e o afastamento do poder do presidente José Eduardo dos Santos. Os veteranos de guerra exigem benefícios sociais há muito devidos. A HRW refere que ao longo do último ano, “agentes da polícia angolana, fardados e à paisana, têm reagido às manifestações juvenis com repressões cada vez mais violentas, apesar da pequena escala dos protestos, e detiveram vários líderes juvenis, jornalistas e líderes da oposição”. Neste momento estarão detidos pelo menos 28 veteranos de guerra. JOVENS ATIVISTAS TAMBÉM FORAM ALVO DE AMEAÇAS Os organizadores das manifestações de jovens tem sido igualmente visados e ameaçados por causa das suas atividades, denuncia a HRW. Todos os líderes de protestos juvenis que falaram recentemente com a Human Rights Watch disseram sentir “que correm perigo de vida”. A organização inumera vários casos. “ A 14 de junho, Gaspar Luamba, estudante universitário e organizador do movimento de protestos juvenis, foi raptado ao meio-dia por quatro homens vestidos à civil, numa universidade no bairro de Viana, em Luanda”, pode ler-se no comunicado. “Levaram-me para um estaleiro de construção da empresa brasileira Odebrecht e interrogaram-me durante várias horas”, contou Luamba à HRW. “Exibiram facas e alicates e ameaçaram usá-los. Perguntaram-me se os partidos da oposição nos estavam a financiar e quanto é que queríamos. Ameaçaram-me a mim e aos meus colegas com a adoção de medidas drásticas caso nos recusássemos a negociar. Mas não me agrediram fisicamente.” Outro organizador dos protestos juvenis, Adolfo Campos, foi atacado e ameaçado de morte por dois homens vestidos à civil a 12 de junho. “Dois Land Cruisers forçaram-me a parar o carro na estrada às 22:00 horas. Saí do carro e dois indivíduos armados com uma pistola e uma metralhadora automática bateram-me na cara com as armas. Caí no chão e um deles apontou- me a sua arma. O outro disse: ‘Não o mates já. Vamos’”. Disse que os agressores revistaram o carro mas limitaram-se a levar o seu telefone, tendo deixado 3000 dólares intactos. Um dia antes, a 11 de junho, o conhecido músico de rap e organizador de protestos juvenis, Luaty Beirão, foi detido pelas autoridades portuguesas no aeroporto de Lisboa, após a polícia ter detetado um pacote de cocaína numa roda de bicicleta, a única bagagem que trazia no voo de Luanda, devido a receios de que a bagagem pudesse ser adulterada. De acordo com os meios de comunicação social, um tribunal de Lisboa ordenou rapidamente que Beirão fosse libertado, com base em fortes indícios de que agentes da polícia angolana haviam colocado a droga na sua bagagem para o incriminarem. HRW apela aos parceiros de Angola para que ergam a voz para acabar com a violência “O uso crescente de violência, ameaças e outras represálias destinadas a silenciar organizadores de protestos é alarmante”, afirma Leslie Lefkow. “Os parceiros regionais e internacionais de Angola deveriam erguer as suas vozes e urgir o governo a pôr termo à violência e a respeitar os direitos fundamentais.” No próximo dia 31 de agosto terão lugar eleições em Angola , sufrágio que definirá o futuro presidente do país. José Eduardo dos Santos, líder do MPLA, que ocupa o poder há 33 anos, é candidato à sua própria sucessão. O AMBIENTE PARA OS MEDIA SEMPRE FOI RESTRITO EM ANGOLA. NOTAMOS, CLARAMENTE, A PREOCUPAÇÃO DOS PRÓPRIOS JORNALISTAS, DE FAZER COBERTURA DESTE TIPO DE INCIDENTES COMO AS MANIFESTAÇÕES CONTRA O GOVERNO QUE TÊM SOFRIDO REPRESÁLIAS, VIOLÊNCIA, MAS TAMBÉM AMEAÇAS. LISA RIMLI, ACTIVISTA DA HRW. DEUTSCHE WELLE, 5 DE JULHO DE 2012 HELENA FERRO DE GOUVEIA
  • 25. BENTO BEMBE, DESMENTIU AS DENÚNCIAS DA HRW Segundo Bento Bembe, a Secretária de Estado para os Direitos Humanos de Angola é várias vezes consultada pela HWR para situações de violação de direitos humanos que acontecem em Angola, mas os dados que divulgou na semana passada “não são verídicos”. Num comunicado divulgado na quinta-feira passada, a HRW denunciava que pelo menos 50 veteranos de guerra foram detidos numa manifestação no passado dia 20 de junho e cerca de 30 permanecem na prisão. “Essa informação não corresponde à verdade”, sintetizou Bento Bembe, instado a reagir às denúncias da HRW. No seu comunicado, a HRW, com sede em Nova Iorque, apelou às autoridades angolanas para que libertem os detidos e garantam o seu acesso imediato à assistência legal. “As autoridades devem urgentemente investigar os alegados raptos de vários organizadores de protestos” (contra o Governo de Angola), pedia a HRW na nota. A organização de defesa dos direitos humanos denunciou igualmente supostos sequestros, por parte das forças de segurança de Angola, de opositores e líderes das manifestações, que foram detidos dias antes dos protestos e mantidos presos durante dias para impedir que se manifestassem. O secretário de Estado iniciou a conferência de imprensa com a leitura de um relatório de 17 páginas sobre o “Estado dos Direitos Humanos em Angola”, onde destacou que foram alcançados nos últimos anos “importantes progressos e melhorias que concretizam o objetivo principal do Executivo de melhorar constantemente a qualidade de vida do povo angolano”. No relatório, Bento Bembe apontou a falta de cultura dos cidadãos para exigirem o respeito dos seus direitos. Bento Bembe repetiu várias vezes que o papel da sua Secretaria de Estado não é resolver os problemas, mas apenas identificá-los e apontar soluções, para que as autoridades competentes os resolvam. 22 23 LUSA, 10 DE JULHO DE 2012
  • 26. INDEPENDÊNCIA E SE DIRIGIAM PARA COLHEITA EM MATERIAL PRECIOSO. QUANDO EU NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL SÃO IMAGENS INÉDITAS A SITUAÇÃO SE DESANUVIOU. Q COM AS MESMAS QUER FAZER; PASSADO, ÉRAMOS QUE NÃO QU TERRENO. O FACTO DE SUBLINHO ISTO PORQUE UM PANFLETO DESTES, SUBVERTIDO, ESTÁ-SE A LEGITIMAR A REACÇÃO NATURAL DA PROVÍNCIA DO HUAMBO, TEM 45 ANOS. TRABALHOU NA RÁDIO NACIONAL DE ANGOLA, NO JORNAL DE ANGOLA E NA TELEVISÃO PÚBLICA REGIONAL DO HUAMBO. É, ACTUALMENTE, CORRESPONDENTE DA VOZ DA AMÉRICA, EM LUANDA ENTREVISTA DE CRISTINA MAGALHÃES A ALEXANDRE NETO JULHO DE 2012 No dia 3 de Setembro de 2011, eu acho que tive um dos momentos mais difíceis vividos na minha vida. Acompanhei o movimento dos jovens, que se manifestavam na Praça da Independência e se dirigiam para Eu estava satisfeito porque tinha feito uma boa colheita em Quando estava a preparar-me para retirar apercebi-me de indivíduos à paisana, à civil; percebi que estavam a olhar fixamente para mim... Eles perceberam que eu tinha um material precioso. Quando por causa do ambiente que eu Não conseguiram tirar o gravador nem a máquina fotográfica. Foi muito difícil, porque eu resisti e não me apercebi que um deles tinha dado a volta e atacou-me com paulada por trás... Mas eu estava determinado a não largar os meus meios materiais, eram preciosos, aliás as imagens que circulam hoje pela Internet e nos meios de comunicação social são imagens inéditas A senhora percebeu que eu estava embaraçado, que não tinha dinheiro e disse que ia assumir a despesa. Fiquei ali resguardado, saindo daquele vulcão, só quando a situação se desanuviou. Fiquei sem documentos durante muitos meses. Quando ia à polícia, porque eles queriam que eu participasse do caso, parecia-me que me cruzava com as mesmas pe O que me motiva fazer a cobertura destes movimentos é o sentimento, a percepção de que ninguém quer fazer; Eu noto que, quando nós começámos em Abril do ano passado, éramos A minha preocupação é não querer ter sentimentos de culpa. Então um jornalista que não Não é bom ambiente, normalmente, o qu Como sabe, a profissão de jornalismo tem este inconveniente. É a probabilidade, muito grande, de nós nos contagiarmos emocionalmente com situações que se vivem no terreno. O facto de A manipulação que se regista em Angola é da mais grosseira que existe no mundo, é da mais grosseira que existe no mundo. Eu sublinho isto porque os Chegou a acontecer numa destas manifestações em que os jovens criaram um código de conduta; distribuíram esse código na perspectiva de amainar espíritos e, sobretudo, tornar a manifestação pacifica e eles pegaram no panfleto, (estou a falar da televisão publica) subverteram o conteúdo, no sentido contrário àquele de pacificação ou manifestação pacífica. Isto quer dizer o quê? Quando se cria um panfleto destes, subvertido, está-se a legitimar a
  • 27. O PALÁCIO PRESIDENCIAL, ONDE QUERIAM TERMOS ME INTERPELARAM, AGARRARAM-ME NOS QUERIA MINHAS....E PORQUE EU SABIA O VALOR QUE TINHA QUANDO VOLTEI A SAIR DO PESSOAS QUE ESTAVAM À MAS O QUE UM NÚMERO VAI COBRIR UM UE NÓS ESTARMOS EM CONTACTO OS ÓRGÃOS PÚBLICOS DE DE ÓRGÃOS DE SEGURANÇA, ESTÁ-SE A MOTIVAR OS ÓRGÃOS DE No dia 3 de Setembro de 2011, eu acho que tive um dos momentos mais difíceis vividos na minha vida. Acompanhei o movimento dos jovens, que se manifestavam na Praça da Independência e se dirigiam para o palácio presidencial, onde queriam chegar. A dada altura do percurso a segurança decidiu que tinham de parar a marcha nas imediações da igreja da Sagrada Família. Então ali foi o ponto mais difícil que tivemos... Eu estava satisfeito porque tinha feito uma boa colheita em termos de reportagem: tinha factos, tinha elementos, tinha dados... Quando estava a preparar-me para retirar apercebi-me de indivíduos à paisana, à civil; percebi que estavam a olhar fixamente para mim... Eles perceberam que eu tinha um material precioso. Quando me interpelaram, agarraram-me nos dois braços e nas duas mãos, perguntando porque é que eu estava a filmar. Eu tinha numa mão uma câmera pequena, muito discreta e na mão direita um gravador, por causa do ambiente que eu queria captar. Eles queriam este material. Não conseguiram tirar o gravador nem a máquina fotográfica. Foi muito difícil, porque eu resisti e não me apercebi que um deles tinha dado a volta e atacou-me com paulada por trás... Mas eu estava determinado a não largar os meus meios materiais, eram preciosos, aliás as imagens que circulam hoje pela Internet e nos meios de comunicação social são imagens inéditas minhas....e porque eu sabia o valor que tinha este material, havia sangue a correr, os manifestantes tinham sido atacados, e eu não queria perder aquela documentação histórica. Bateram em mim e eu, descontrolado, larguei as pastas e entrei para um restaurante ao lado. Pedi uma água e, quando quis pagar, só ai me apercebi que não tinha dinheiro, porque largara a pasta. A senhora percebeu que eu estava embaraçado, que não tinha dinheiro e disse que ia assumir a despesa. Fiquei ali resguardado, saindo daquele vulcão, só quando a situação se desanuviou. Quando voltei a sair do restaurante lembro-me de ver alguns colegas da Lusa e da RTP, que também estavam a reclamar pelo controlo; queriam ter o seu material, que tinha sido confiscado... Fiquei sem documentos durante muitos meses. Quando ia à polícia, porque eles queriam que eu participasse do caso, parecia-me que me cruzava com as mesmas pessoas que estavam à civil na manifestação. Achava isso contraproducente, ir à policia reclamar junto de pessoas que, aparentemente, eram as mesmas que tinham sido atacantes. O que me motiva fazer a cobertura destes movimentos é o sentimento, a percepção de que ninguém quer fazer; mas o que me motiva a ir é perceber que, no decorrer dessas manifestações, normalmente não há cobertura jornalística. Eu noto que, quando nós começámos em Abril do ano passado, éramos um número de jornalistas, mas este número foi decrescendo, muita gente desistiu. A minha preocupação é não querer ter sentimentos de culpa. Então um jornalista que não vai cobrir um evento destes, penso que não dorme bem com a sua própria consciência. Não é bom ambiente, normalmente, o que se vive nas manifestações em Luanda. Como sabe, a profissão de jornalismo tem este inconveniente. É a probabilidade, muito grande, de nós nos contagiarmos emocionalmente com situações que se vivem no terreno. O facto de nós estarmos em contacto com este ambiente de tensão, de vermos sangue, quer se queira ou não, ficamos contagiados... eu, pessoalmente, confesso que tenho sentido um pouco isso. A manipulação que se regista em Angola é da mais grosseira que existe no mundo, é da mais grosseira que existe no mundo. Eu sublinho isto porque os órgãos públicos de comunicação são capazes de pegar num panfleto distribuído pelos jovens, inverter o conteúdo do panfleto e publicar como se fosse original dos jovens. Chegou a acontecer numa destas manifestações em que os jovens criaram um código de conduta; distribuíram esse código na perspectiva de amainar espíritos e, sobretudo, tornar a manifestação pacifica e eles pegaram no panfleto, (estou a falar da televisão publica) subverteram o conteúdo, no sentido contrário àquele de pacificação ou manifestação pacífica. Isto quer dizer o quê? Quando se cria um panfleto destes, subvertido, está-se a legitimar a reacção de órgãos de segurança, está-se a motivar os órgãos de segurança para reprimir os manifestantes. E é isso que nós temos aqui, é manipulação da grossa. Portanto nós temos uma democracia em Angola, de fachada, é mesmo de fachada, para mostrar ao mundo que em Angola há democracia; para fazer de conta que ela existe, para amainar as pressões internacionais; portanto, uma democracia maquilhada mas, na prática, ela não existe. Entre os países africanos de expressão portuguesa, Angola é o que mais viola a liberdade de imprensa, de acordo com o último relatório dos Repórteres sem Fronteiras. Alexandre, sendo um jornalista angolano, vítima da repressão do regime e que, segundo me disse, pode contar várias histórias, entre as quais as últimas manifestações de Luanda, partilhe uma connosco. Isto tudo porquê Alexandre? Porque quer fazer informação, que incomoda o regime angolano... O tema deste trabalho, para o qual está a colaborar, tem como titulo: « direito ao livre acesso da informação/manipulação».Como é que classifica este tema aí, em Angola? 24 25 o palácio presidencial, onde queriam chegar. A dada altura do percurso a segurança decidiu que tinham de parar a marcha nas imediações da igreja da Sagrada Família. Então ali foi o ponto mais difícil que tivemos... termos de reportagem: tinha factos, tinha elementos, tinha dados... me interpelaram, agarraram-me nos dois braços e nas duas mãos, perguntando porque é que eu estava a filmar. Eu tinha numa mão uma câmera pequena, muito discreta e na mão direita um gravador, queria captar. Eles queriam este material. minhas....e porque eu sabia o valor que tinha este material, havia sangue a correr, os manifestantes tinham sido atacados, e eu não queria perder aquela documentação histórica. Bateram em mim e eu, descontrolado, larguei as pastas e entrei para um restaurante ao lado. Pedi uma água e, quando quis pagar, só ai me apercebi que não tinha dinheiro, porque largara a pasta. Quando voltei a sair do restaurante lembro-me de ver alguns colegas da Lusa e da RTP, que também estavam a reclamar pelo controlo; queriam ter o seu material, que tinha sido confiscado... essoas que estavam à civil na manifestação. Achava isso contraproducente, ir à policia reclamar junto de pessoas que, aparentemente, eram as mesmas que tinham sido atacantes. mas o que me motiva a ir é perceber que, no decorrer dessas manifestações, normalmente não há cobertura jornalística. um número de jornalistas, mas este número foi decrescendo, muita gente desistiu. vai cobrir um evento destes, penso que não dorme bem com a sua própria consciência. ue se vive nas manifestações em Luanda. nós estarmos em contacto com este ambiente de tensão, de vermos sangue, quer se queira ou não, ficamos contagiados... eu, pessoalmente, confesso que tenho sentido um pouco isso. órgãos públicos de comunicação são capazes de pegar num panfleto distribuído pelos jovens, inverter o conteúdo do panfleto e publicar como se fosse original dos jovens. reacção de órgãos de segurança, está-se a motivar os órgãos de segurança para reprimir os manifestantes. E é isso que nós temos aqui, é manipulação da grossa. Portanto nós temos uma democracia em Angola, de fachada, é mesmo de fachada, para mostrar ao mundo que em Angola há democracia; para fazer de conta que ela existe, para amainar as pressões internacionais; portanto, uma democracia maquilhada mas, na prática, ela não existe.
  • 28. ARTIGO “MAGISTRATURA FACA DE DOIS GUMES”, ONDE UM EU FUI PARA LÁ FAZER INVERTEU OS TERMOS, EM NAMIBE E, EVIDENTEMENTE, CONTRA UM JUIZ PRESI NEGOU. PORTANTO TRABALHO RECORDO QUARENTA QUE O JORNALIS LIBERDADE D QUE OS PRÓXIMOS ALEXANDRE NETO. TENHO UMA ACTIVISTA GOVERNANTES, TÊM DOIS UIR; QUE, DAS DUAS UMA: OU ABUSO DO RA PORQUE, COMO PODEM VER, EM VÉSPERA DE ELEIÇÕES, UM ÓRGÃO PRIVADO NATURAL DA PROVÍNCIA DO NAMIBE, ONDE É CORRESPONDENTE DA VOZ DA AMÉRICA. ESTÁ SUSPENSO DA RÁDIO ECLÉSIA, PROPRIEDADE DA IGREJA CATÓLICA EM ANGOLA, POR VÁRIAS REPORTAGENS QUE “FEREM O BOM NOME” DE ALGUMAS PERSONALIDADES PROVINCIAIS, LIGADAS AO REGIME. COLABOROU EM JORNAIS COMO O “FOLHA 8”, O “AGORA” E O “ANGOLENSE”. ENTREVISTA DE CRISTINA MAGALHÃES A ARMANDO CHICOCA JULHO DE 2012 Encontro-me suspenso ha três anos, infelizmente sem culpa formada, por pressão do regime. Durante esta fase toda já sofri três prisões: a primeira foi em 2001, quando publiquei um artigo “Magistratura Faca de dois gumes”, onde se construir um O povo, naquela altura, pagava os seus direitos à administração municipal. Um Buldozer passou por cima de uma pessoa. Eu fui para lá fazer a E o mais grave: o julgamento, na altura, foi dirigido por um juiz chamado Pereira da Silva; o juíz inverteu os termos, em Infelizmente é mais um caso da pouca vergonha da justiça angolana, em que um juiz, que julga um caso, é um juiz da mesma câmara do tribunal do Namibe e, evidentemente, contra um juiz presid O meu advogado apresentou recurso e o juiz negou. Portanto O objectivo é mesmo abafar o trabalho eu desde há cinco ou dez anos para cá, recordo quarenta Acho que precisamos romper o medo, precisamos dignificar a nossa imagem, fazer com que o jornali A liberdade de imprensa, a liberdade d É preciso lutar e, se necessário, ainda fazer alguns sacrifícios para que os próximos Outro exemplo: eu tenho um colega em Luanda que já perdeu computadores, já perdeu tudo, mas continua a lutar. Refiro-me, portanto, ao Alexandre Neto. Tenho uma activista Portanto, em Angola, não há liberdade de imprensa. Os dirigentes, os políticos, os governantes, têm dois É verdade que, neste momento, a universidade vai-se expandindo um pouco pelas províncias; a sociedade civil está completamente activa; acredito que os abusos vão diminuir; que, das duas uma: ou O que se passa em Angola é mesmo o abuso do É completamente limitado. Ainda existe coacção. Mesmo os que governam, para falar de determinada matéria, têm de pedir autorização ao chefe máximo. Na minha província do Namibe, já estamos a ultrapassar isso. Na província Huíla a coisa é outra porque, como podem ver, em véspera de um órgão do estado, vão para a rua; se forem de um órgão privado a partir É tudo isto...Em Angola precisamos de lutar um pouco mais, em termos de diplomacia,
  • 29. OS CIDADÃOS SE QUEIXAVAM DE UM DETERMINADO M A COBERTURA DAS DEMOLIÇÕES E VEZ DE ME TER IDENTE NÃO HAVIA ALTERNATIVA. E O MAIS SÃO DO A CINQUENTA SMO EM ANGOLA DE INFORMAÇÃO VINDOUROS, OS COLEGAS AMIGA, QUE É A LISA DISCURSOS: UM DISCURSO OS QUE GOVERNAM VÃO TER DE PODER, AINDA O GOVERNADOR PARTE A CASA DAS PESSOAS, ELE INFELIZMENTE TAMBÉM Encontro-me suspenso ha três anos, infelizmente sem culpa formada, por pressão do regime. Durante esta fase toda já sofri três prisões: a primeira foi em 2001, quando publiquei um artigo “Magistratura Faca de dois gumes”, onde os cidadãos se queixavam de um determinado magistrado que prendia, sem culpa formada. Em 2007, publiquei uma notícia que envolvia um governador muito conhecido, numa altura em que ele destruiu todos os mercados paralelos para se construir um mercado único. O povo, naquela altura, pagava os seus direitos à administração municipal. Um Buldozer passou por cima de uma pessoa. Eu fui para lá fazer a cobertura das demolições e a resposta das autoridades governamentais foi prender-me e condenar-me a trinta dias de prisão por incitação à violência da população. E o mais grave: o julgamento, na altura, foi dirigido por um juiz chamado Pereira da Silva; o juíz inverteu os termos, em vez de me ter condenado por incitação à violência, ele disse que eu seria condenado por indisciplina, porque não tinha respeitado a polícia. Infelizmente é mais um caso da pouca vergonha da justiça angolana, em que um juiz, que julga um caso, é um juiz da mesma câmara do tribunal do Namibe e, evidentemente, contra um juiz presidente não havia alternativa. E o mais engraçado é que o meu advogado, já na altura da sentença, encontrava-se na HUILA e eu fui condenado sem a presença dele, condenado a um ano de prisão. O meu advogado apresentou recurso e o juiz negou. Portanto são estas algumas das histórias de perseguição aos jornalistas. O objectivo é mesmo abafar o trabalho do jornalismo. E, como se não bastasse, eu desde há cinco ou dez anos para cá, recordo quarenta a cinquenta processos por calúnia e difamação quando nunca houve nenhuma. Acho que precisamos romper o medo, precisamos dignificar a nossa imagem, fazer com que o jornalismo em Angola seja um jornalismo, tal como acontece em Portugal, na América e noutras paragens. A liberdade de imprensa, a liberdade de informação em Angola, é uma luta. É preciso lutar e, se necessário, ainda fazer alguns sacrifícios para que os próximos vindouros, os colegas vindouros, nossos filhos, então possam ser livres de medo, de abusos. Outro exemplo: eu tenho um colega em Luanda que já perdeu computadores, já perdeu tudo, mas continua a lutar. Refiro-me, portanto, ao Alexandre Neto. Tenho uma activista amiga, que é a Lisa Rimli da “Human Rights Watch”, todos sabemos o que se passou com ela; alguns jornalistas, também portugueses, estiveram em Luanda fazendo cobertura. Portanto, em Angola, não há liberdade de imprensa. Os dirigentes, os políticos, os governantes, têm dois discursos: um discurso para mostrar ao mundo que são democratas e outro discurso para consumo interno. É verdade que, neste momento, a universidade vai-se expandindo um pouco pelas províncias; a sociedade civil está completamente activa; acredito que os abusos vão diminuir; que, das duas uma: ou os que governam vão ter de se converter, ou então vão ter de assumir todas as consequências que hão de vir, porque ninguém vai aceitar mentiras, ninguém vai mais aceitar a neocolonização. O que se passa em Angola é mesmo o abuso do poder, não há outra coisa, é mesmo abuso do poder. É completamente limitado. Ainda existe coacção. Mesmo os que governam, para falar de determinada matéria, têm de pedir autorização ao chefe máximo. Na minha província do Namibe, já estamos a ultrapassar isso. Na província Huíla a coisa é outra porque, como podem ver, em véspera de eleições, ainda o governador parte a casa das pessoas, ele diz que dá tijolo, que dá telhas, que dá mais não sei o quê...mas o povo diz que não, não há telha, não há tijolo, não há nada. Os jornalistas da província da Huíla não podem divulgar porque, se forem de um órgão do estado, vão para a rua; se forem de um órgão privado infelizmente também são funcionários do estado e também sofrem na pele e são penalizados a partir dos serviços. É tudo isto...Em Angola precisamos de lutar um pouco mais, em termos de diplomacia, em termos de dignidade. Somos ainda prisioneiros de consciência, precisamos de nos libertar. Queres partilhar connosco alguma história de repressão por informação jornalística? O tema é o acesso à informação, como vês o acesso à informação em Angola? Portanto o acesso de informação em Angola é limitado... 26 27 os cidadãos se queixavam de um determinado magistrado que prendia, sem culpa formada. Em 2007, publiquei uma notícia que envolvia um governador muito conhecido, numa altura em que ele destruiu todos os mercados paralelos para mercado único. cobertura das demolições e a resposta das autoridades governamentais foi prender-me e condenar-me a trinta dias de prisão por incitação à violência da população. vez de me ter condenado por incitação à violência, ele disse que eu seria condenado por indisciplina, porque não tinha respeitado a polícia. dente não havia alternativa. E o mais engraçado é que o meu advogado, já na altura da sentença, encontrava-se na HUILA e eu fui condenado sem a presença dele, condenado a um ano de prisão. são estas algumas das histórias de perseguição aos jornalistas. do jornalismo. E, como se não bastasse, a cinquenta processos por calúnia e difamação quando nunca houve nenhuma. ismo em Angola seja um jornalismo, tal como acontece em Portugal, na América e noutras paragens. de informação em Angola, é uma luta. vindouros, os colegas vindouros, nossos filhos, então possam ser livres de medo, de abusos. amiga, que é a Lisa Rimli da “Human Rights Watch”, todos sabemos o que se passou com ela; alguns jornalistas, também portugueses, estiveram em Luanda fazendo cobertura. discursos: um discurso para mostrar ao mundo que são democratas e outro discurso para consumo interno. os que governam vão ter de se converter, ou então vão ter de assumir todas as consequências que hão de vir, porque ninguém vai aceitar mentiras, ninguém vai mais aceitar a neocolonização. poder, não há outra coisa, é mesmo abuso do poder. de eleições, ainda o governador parte a casa das pessoas, ele diz que dá tijolo, que dá telhas, que dá mais não sei o quê...mas o povo diz que não, não há telha, não há tijolo, não há nada. Os jornalistas da província da Huíla não podem divulgar porque, se forem infelizmente também são funcionários do estado e também sofrem na pele e são penalizados dos serviços. em termos de dignidade. Somos ainda prisioneiros de consciência, precisamos de nos libertar.
  • 30. MUITO DE REGIÃO PARA REGIÃO. DO DECORRENTE DAS ASSIMETRIAS POLÍTICAS EXISTENTES. NÃO ALGUMAS, NA PACIFICAÇÃO OU NA MITIGAÇÃO DO CONFLITO INFORMAR O QUE OCORRE AQUI PROPOSTAS E, POR TER RECUSADO, AS DIVERSAS OFERTAS, TODO O MATERIAL SE VIVE UM POR CENTO DAS RIQUEZAS, QUE SE POTENCIALIDADES ECONÓMICAS VISA CONTRARIAR A REALIDADE GABINETE, POR CAUSA DE UMA NOTÍCIA ENTREVISTA DE CRITINA MAGALHÃES A JOSÉ MANUEL JULHO DE 2012 ADVOGADO, JORNALISTA E PROFESSOR UNIVERSITÁRIO, TEM 38 ANOS. COMEÇOU A CARREIRA DE JORNALISTA NA RÁDIO COMERCIAL DE CABINDA. FOI COLABORADOR DA AGÊNCIA LUSA E EM RÁDIOS LOCAIS DE BENGUELA E LUANDA. PASSOU PELA RÁDIO RENASCENÇA, ONDE ESTAGIOU, É CORRESPONDENTE DA VOZ DA AMÉRICA EM CABINDA, DESDE 2003. Analisar este tema em Angola... Nós poderíamos dividir isto em contextos. O contexto político angolano varia muito de região para região. Do ponto O contexto particular, onde eu estou baseado, como sabeis é um contexto bastante complexo, decorrente das assimetrias políticas existentes. Concr Em consequência disso temos vivendo não algumas, mas Como sabe Cabinda vive um contexto político distinto do resto do país. Ora, os esforços que o Governo tem feito na pacificação ou na mitigação do conflito de Cab Por esta razão e sendo apenas o único órgão de transparência ou que tenta informar o que ocorre aqui em Eu fui, digamos, vítima de muitos assédios, muitos deles até de uma certa natureza de corrupção. Nem sempre conseguimos sobreviver às propostas e, por ter recusado, as diversas ofertas, Uma das formas era assaltar a casa, recolherem todo o material Seria, digamos paradoxal eu em Cabinda, (por exemplo) onde se vive um Seria um pouco contra-senso falar de um desenvolvimento económico em Cabinda, onde se explora e retira setenta por cento das riquezas, que se usam Esse tipo de factos, comparado com as potencialidades económicas da Então esse tipo de informações, numa altura onde há muita propaganda que visa contrariar a realidade Repara que, recentemente, antes da sua exoneração, o governador Mawete João Baptista chamou-me ao seu gabinete, por causa de uma notícia
  • 31. PONTO DE VISTA GERAL NÃO ESTARIA CONCRETAMENTE CABINDA, NO NOROESTE DE MAS MUITAS DE CABINDA, IMPÕE O RECURSO A MEIOS PARA, EM CABINDA, HÁ UM INTERESSE QUER DO PONTO DE VISTA FINANCEIRO, QUER DO INFORMÁTICO E ELECTRÓNICO CONFLITO POLÍTICO/MILITAR, RELATAR USAM PARA O DESENVOLVIMENTO DE ANGOLA; QUANDO DA REGIÃO, QUANDO RELATADA PELA IMPRENSA, ( ECONÓMICA QUE EU TINHA PUBLICADO. EU Tens limitações à informação? Como vives essa situação? Analisar este tema em Angola... Nós poderíamos dividir isto em contextos. O contexto político angolano varia muito de região para região. Do ponto de vista geral não estaria em condições de descrever, porque os demais jornalistas vivem noutras regiões, apesar de algumas questões se assemelharem. O contexto particular, onde eu estou baseado, como sabeis é um contexto bastante complexo, decorrente das assimetrias políticas existentes. Concretamente Cabinda, no noroeste de Angola. Essas assimetrias inviabilizam qualquer projecto de garantia de liberdade de expressão e de informação. Em consequência disso temos vivendo não algumas, mas muitas dificuldades, no desempenho das nossas funções. Como sabe Cabinda vive um contexto político distinto do resto do país. Ora, os esforços que o Governo tem feito na pacificação ou na mitigação do conflito de Cabinda, impõe o recurso a meios para, digamos, abafar a nível nacional e internacional, qualquer informação que tenta manifestar os descontentamentos com a continuação do conflito militar. Por esta razão e sendo apenas o único órgão de transparência ou que tenta informar o que ocorre aqui em Cabinda, há um interesse enorme, da parte do Governo, em reduzir o impacto dos correspondentes da Voz da América... Eu fui, digamos, vítima de muitos assédios, muitos deles até de uma certa natureza de corrupção. Nem sempre conseguimos sobreviver às propostas e, por ter recusado, as diversas ofertas, quer do ponto de vista financeiro, quer do ponto de vista do enquadramento profissional, tiveram que recorrer a outros métodos, para influenciarem quer a mim quer à minha própria família. Uma das formas era assaltar a casa, recolherem todo o material informático e electrónico que uso para o desempenho das minha funções. Seria, digamos paradoxal eu em Cabinda, (por exemplo) onde se vive um conflito político/militar, relatar factos adversos da realidade política e social do enclave. Seria um pouco contra-senso falar de um desenvolvimento económico em Cabinda, onde se explora e retira setenta por cento das riquezas, que se usam para o desenvolvimento de Angola; quando nem um terço da população tem água potável, luz eléctrica, vias rodoviárias asfaltadas, infra-estruturas públicas e condições. Esse tipo de factos, comparado com as potencialidades económicas da região, quando relatados, criam sempre um constrangimento ao regime. Então esse tipo de informações, numa altura onde há muita propaganda que visa contrariar a realidade relatada pela imprensa, ( abro aqui um parêntesis “independente”) acaba sempre por deixar mal a governação. Repara que, recentemente, antes da sua exoneração, o governador Mawete João Baptista chamou-me ao seu gabinete, por causa de uma notícia económica que eu tinha publicado. Eu levantava questões de não pagamento de dívida pública a empresas de Cabinda, o que era verdade. E que tipo de informação é que estavas a tentar publicar? 28 29 de vista geral não estaria em condições de descrever, porque os demais jornalistas vivem noutras regiões, apesar de algumas questões se assemelharem. retamente Cabinda, no noroeste de Angola. Essas assimetrias inviabilizam qualquer projecto de garantia de liberdade de expressão e de informação. muitas dificuldades, no desempenho das nossas funções. binda, impõe o recurso a meios para, digamos, abafar a nível nacional e internacional, qualquer informação que tenta manifestar os descontentamentos com a continuação do conflito militar. Cabinda, há um interesse enorme, da parte do Governo, em reduzir o impacto dos correspondentes da Voz da América... quer do ponto de vista financeiro, quer do ponto de vista do enquadramento profissional, tiveram que recorrer a outros métodos, para influenciarem quer a mim quer à minha própria família. informático e electrónico que uso para o desempenho das minha funções. conflito político/militar, relatar factos adversos da realidade política e social do enclave. para o desenvolvimento de Angola; quando nem um terço da população tem água potável, luz eléctrica, vias rodoviárias asfaltadas, infra-estruturas públicas e condições. região, quando relatados, criam sempre um constrangimento ao regime. relatada pela imprensa, ( abro aqui um parêntesis “independente”) acaba sempre por deixar mal a governação. económica que eu tinha publicado. Eu levantava questões de não pagamento de dívida pública a empresas de Cabinda, o que era verdade.