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HIDROLOGIA APLICADA
TEXTO BÁSICO
Disciplina Ministrada na Universidade Estadual do Rio Grande do
Sul, para o curso de graduação em Engenharia de Bioprocessos e
Biotecnologia na unidade de Caxias do Sul.
Adriano Rolim da Paz
Adriano Rolim da Paz
Adriano Rolim da Paz
Adriano Rolim da Paz
adrianorpaz@yahoo.com.br
Setembro/2004
2
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo 1
1
1
1
Introdução à hidrologia
Introdução à hidrologia
Introdução à hidrologia
Introdução à hidrologia
Aspectos gerais
A Hidrologia pode ser entendida como a ciência que estuda a água, como a
própria origem da palavra indica (do grego): hidrologia = hydor (“água”) + logos
(“ciência” ou “estudo”). Entretanto, uma boa definição adotada por vários autores é a
seguinte:
“Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência,
circulação e distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua
reação com o meio ambiente, incluindo sua relação com as formas
vivas” (Definição do U.S. Federal Council of Service and Technology,
citada por Chow, 1959, apud Tucci, 2000).
Como se pode perceber pela definição acima, a hidrologia é uma ciência
consideravelmente ampla, cujo escopo de trabalho abrange diversas sub-áreas mais
específicas, como por exemplo:
- Hidrometeorologia: trata da água na atmosfera;
- Limnologia: estuda os lagos e reservatórios;
- Potamologia: estuda os rios;
- Oceanografia: estuda os oceanos;
- Hidrogeologia: estudas as águas subterrâneas;
- Glaciologia: trata da ocorrência de neve/gelo na natureza.
3
Entretanto, cabe salientar que a maioria dos estudos envolve mais de uma das
sub-áreas, já que os fenômenos e processos envolvendo a água na natureza (ocorrência,
distribuição, propriedades físico-químicas, etc.) estão interrelacionados de tal forma que
a explicação e o entendimento dos mesmos só são alcançados mediante a reunião dos
conhecimentos das diversas sub-áreas. Por exemplo, como estudar os processos de
deposição de nutrientes e sedimentos em um reservatório (limnologia) sem a
caracterização do aporte dessas substâncias oriundo do curso d’água (rio) barrado para
formar o reservatório (potamologia)?
Tornando a análise um pouco mais geral, face ao caráter de escassez atribuído à
água atualmente, sendo reconhecida a importância em preservar e usar racionalmente
esse recurso, uma vasta gama de profissionais tem se dedicado a estudar a hidrologia,
entre eles os engenheiros, economistas, estatísticos, químicos, biólogos, químicos,
matemáticos, geólogos, agrônomos, geógrafos, etc.
Os problemas relacionados à água geralmente requerem um enfoque
multidisciplinar, segundo o qual diversos especialistas contribuem em suas áreas para
entender a situação e alcançar a melhor alternativa, sob determinados critérios. Um
exemplo disso é um projeto que vise o barramento de um rio para formação de um
reservatório, com o objetivo de captar água para abastecimento humano e irrigação.
Simplificadamente, poder-se-ia dizer que o hidrólogo seria responsável pela
caracterização da área contribuinte ao reservatório, estimando a vazão afluente e
dimensionando a barragem; ao especialista em hidráulica caberia projetar o sistema de
captação, bombeamento e distribuição da água; o biólogo analisaria o impacto do
barramento do rio sobre o ecossistema, em particular sobre a biota aquática, bem como
no levantamento das espécies que habitam a região a ser alagada; o sociólogo (e
psicólogo) estaria envolvido com a remoção da população residente na área alagada pela
barragem, a qual seria realocada; a vegetação que ficaria submersa com o enchimento
do lago iria se degradar, merecendo o devido monitoramento da qualidade da água, que
poderia ser realizado por um especialista na área de saneamento/química; o agrônomo
iria definir as condições de irrigação das culturas agrícolas atendidas, e assim por
diante.
4
Por outro lado, também cabe salientar que, a despeito dos vários profissionais
envolvidos na problemática da água, os estudos hidrológicos, propriamente ditos,
geralmente envolvem técnicas originárias ou desenvolvidas a partir de conceitos de
outras áreas, mas que o profissional que lida com a hidrologia deve estar familiarizado e
ser capaz de aplica-las e entender seus resultados. Entre tais técnicas pode-se citar:
teoria estocástica, séries temporais, análise multicritério, teoria das decisões, análise
econômica, programação dinâmica, inteligência artificial, otimização, interpretação de
imagens de satélite, etc.
Breve histórico da hidrologia
A importância da água na história da humanidade é identificada quando se
observa que os povos e civilizações se desenvolveram às margens de corpos d’água,
como rios e lagos. A seguir serão listados alguns fatos marcantes da história da
hidrologia, de maneira superficial, sendo maiores detalhes encontrados na bibliografia
pesquisada, citada ao final deste documento.
• Diversos autores citam registros de que no Egito Antigo, na época dos
faraós, existiram obras de irrigação e drenagem. Também na Mesopotâmia,
na região conhecida como Crescente Fértil, entre os rios Tigre e Eufrates, a
água já era usada para irrigação.
• Os filósofos gregos são considerados os primeiros a estudar a hidrologia
como ciência. Por exemplo, Anaxágoras, que viveu entre 500 e 428 a. C,
tinha conhecimento de que as chuvas eram importantes na manutenção do
equilíbrio hídrico na Terra.
• Mas apenas na época de Leonardo da Vinci é que o ciclo hidrológico veio a
ser melhor compreendido. Um fato relevante foi o realizado por Perrault, no
século 17, que analisou a relação precipitação-vazão, comparando a
precipitação com dados de vazão.
• No século 19 dá-se o início de medições sistemáticas de vazão e
precipitação;
• Até a década de 30, prevalece o empirismo, procurando descrever os
fenômenos naturais, enquanto até a década de 50 é predominante o uso de
indicadores estatísticos dos processos envolvidos;
5
• Com o advento do computador em conjunto com o aprimoramento de
técnicas estatísticas e numéricas, deu-se um grande avanço na hidrologia.
Foram desenvolvidos modelos precipitação-vazão e avanços na hidrologia
estocástica. O escoamento subterrâneo, a limnologia e a modelação
matemática de processos constituem outros desenvolvimentos importantes.
A modelagem ajuda a entender e explicar padrões de ocorrência e possibilita
simular cenários futuros, fornecendo subsídios importantes para responder a perguntas
do tipo “o que aconteceria se...?”. Um exemplo de modelagem de processos é a
simulação da circulação da água e do transporte de poluentes em um lago ou rio. Com
um modelo computacional, é possível inferir sobre o que aconteceria se ocorresse um
vazamento de óleo próximo a um lago, em termos de áreas atingidas, tempo de
deslocamento da mancha de óleo, etc. Isso tudo sem o processo estar ocorrendo, apenas
hipoteticamente, o que permite prever impactos e traçar alternativas de combate
previamente.
Ocorrência de água na Terra
Considera-se, atualmente, que a quantidade total de água na Terra, estimada em
cerca de 1.386 milhões de km3
, tem permanecido de modo aproximadamente constante
durante os últimos 500 milhões de anos. Entretanto, as quantidades de água estocadas
na Terra sob as diferentes formas (ou nos diferentes “reservatórios”) variaram
substancialmente nesse período.
Na Figura 1.1 é apresentada a distribuição da água na Terra, conforme
Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001).
Verifica-se que cerca de 97,5% do volume total de água na Terra estão nos
oceanos (água salgada), sendo apenas 2,5% do total constituído por água doce. Por sua
vez, a água doce é encontrada principalmente sob a forma de geleiras, que representam
68,7% do total de água doce. Considerando que as águas doces contidas em rios e lagos
constituem as formas mais acessíveis ao uso humano e de ecossistemas, tem-se um
percentual muito pequeno de água disponível – em torno de 0,27% da água doce o que
corresponde a 0,007% do volume total de água.
6
Assim, embora a Terra apresente 1.386 milhões de km3
de água, considera-se
que o que está disponível ao uso humano é apenas 0,007% dessa quantidade.
Reservatório
Volume
(x 10
3
km
3
)
% do
volume
total
% do
volume
de água
doce
Oceanos 1.338.000,0 96,5379 -
Subsolo: 23.400,0 1,6883 -
Água doce 10.530,0 0,7597 30,0607
Água salgada 12.870,0 0,9286 -
Umidade do solo 16,5 0,0012 0,0471
Áreas congeladas 24.064,0 1,7362 68,6971
Antártida 21.600,0 1,5585 61,6629
Groenlândia 2.340,0 0,1688 6,6802
Ártico 83,5 0,0060 0,2384
Montanhas 40,6 0,0029 0,1159
Solos congelados 300,0 0,0216 0,8564
Lagos 176,4 0,0127 -
Água doce 91,0 0,0066 0,2598
Água salgada 85,4 0,0062 -
Pântanos 11,5 0,0008 0,0328
Rios 2,1 0,0002 0,0061
Biomassa 1,1 0,0001 0,0032
Vapor d'água na atmosfera 12,9 0,0009 0,0368
Armazenamento total de água salgada 1.350.955,4 97,4726 -
Armazenamento total de água doce 35.029,1 2,5274 100,0
Armazenamento total de água 1.385.984,5 100,0 -
Figura 1.1 – Distribuição da água na Terra (adaptado de Shiklomanov, 1997, apud Setti
et al. 2001).
2,5%
97,5%
Água doce
Água salgada
30%
69%
1%
outros
água doce no
subsolo
água
congelada
7
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo 2
2
2
2
Ciclo hidrológico
Ciclo hidrológico
Ciclo hidrológico
Ciclo hidrológico
Descrição geral
Embora tenham sido estimados os volumes em cada um dos “reservatórios” na
Terra (ver Figura 1.1), é importante lembrar que a água está em constante movimento,
constituindo o que se denomina de ciclo hidrológico. Esse ciclo tem o Sol como
principal fonte de energia, através de sua radiação, e o campo gravitacional terrestre
como a principal força atuante.
A Figura 2.1 apresenta um esquema do ciclo hidrológico, identificando as
diversas etapas que o compõem.
8
Figura 2.1 – Ciclo hidrológico (fonte: adaptado de EPA, 1998).
De maneira simplificada, o ciclo hidrológico pode ser descrito da seguinte
forma:
- ocorre evaporação da água dos oceanos e formação do vapor de água;
- sob determinadas condições, o vapor precipita na forma de chuva, neve, granizo,
etc (precipitação);
- parte da precipitação não chega nem a atingir a superfície terrestre, sendo
evaporada;
- boa parte da precipitação atinge diretamente a superfície de lagos e oceanos, daí
evaporando parcela;
- da precipitação que atinge a superfície terrestre, uma parte é interceptada pela
cobertura vegetal (interceptação), de onde parte evapora e parte acaba
escorrendo até o solo;
- da precipitação que chega ao solo, parcela infiltra sub-superficialmente
(infiltração), e desta uma parte escoa até corpos d’água próximos, como rios e
lagos (escoamento sub-superficial);
- uma parte infiltrada percola atingindo os aqüíferos (percolação), que escoam
lentamente até rios e lagos (escoamento subterrâneo);
- ainda quanto à parte da precipitação que atinge o solo, esta vai escoar
superficialmente (escoamento superficial), sendo retida em depressões do solo,
sofrendo infiltração, evaporação ou sendo absorvida pela vegetação. O
“restante” do escoamento superficial segue para rios, lagos e oceanos, governada
pela gravidade;
- a vegetação, que retém água das depressões do solo e infiltrações, elimina vapor
d’água para a atmosfera (transpiração), através do processo de fotossíntese;
- a água que alcança os rios, seja por escoamento superficial, sub-superficial ou
subterrâneo, ou mesmo precipitação direta, segue para lagos e oceanos,
governada pela gravidade.
Cabe ressaltar que o ciclo hidrológico não apresenta um “começo” nem um
“fim”, já que a água está em movimento contínuo, sendo o início da descrição do ciclo
realizado a partir da evaporação dos oceanos apenas por questões didáticas.
9
Outro fato a ser ressaltado é que a evaporação está presente em quase todas as
etapas do ciclo.
Um termo normalmente usado para denotar a evaporação associada à
transpiração da vegetação é a evapotranspiração.
Apesar de haver algumas divergências quantos aos valores estimados de autor
para autor, convém comentar que cerca de 383.000 km3
de água evaporam por ano dos
oceanos (Wundt, 1953, apud Esteves, 1988). Isso equivaleria à retirada de uma camada
de 106 cm de espessura dos oceanos por ano. Desse total evaporado, estima-se que 75%
retornem diretamente aos oceanos sob a forma de precipitação, enquanto os 25%
restantes precipitam sobre os continentes.
Uma curiosidade evidenciada por Esteves (1988) é que a composição química da
precipitação oceânica difere nitidamente da continental, particularmente no que diz
respeito à concentração de íons como Na+
, Mg2+
e Cl-
, maior na precipitação oceânica.
O ciclo hidrológico, como já colocado anteriormente, promove a movimentação
de enormes quantidades de água ao redor do planeta. Entretanto, algumas das fases do
ciclo são consideradas rápidas e outras muito lentas, se comparadas entre si. A Tabela
2.1 ilustra esse comentário, ao apresentar alguns períodos médios de renovação da água
nos diferentes “reservatórios”. Tais valores dizem respeito ao tempo necessário para que
toda a água contida em cada um dos reservatórios seja renovada – dentro de uma visão
bastante simplificada, é claro, da “entrada”, “circulação” e “saída” de água neles.
Tabela 2.1 – Período de renovação da água em diferentes reservatórios na Terra.
Fonte: Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001).
Reservatórios Período médio de renovação
Oceanos 2.500 anos
Águas subterrâneas 1.400 anos
Umidade do solo 1 ano
Áreas permanentemente congeladas 9.700 anos
Geleiras em montanhas 1.600 anos
Solos congelados 10.000 anos
Lagos 17 anos
Pântanos 5 anos
Rios 16 dias
Biomassa algumas horas
Vapor d'água na atmosfera 8 dias
10
A princípio, as etapas de precipitação e evaporação são consideradas as mais
importantes dentro do ciclo hidrológico, pensando em termos de volume de água
movimentado. Entretanto, à medida que se diminui a escala de análise, as demais fases
do ciclo se tornam muito importantes. Por exemplo, analisando uma determinada área
de dezenas de hectares, a interceptação, infiltração, percolação e escoamento superficial
são bastante relevantes para entendimento dos processos hidrológicos.
Impactos sobre o ciclo hidrológico
Observando a descrição do ciclo hidrológico, é fácil perceber o quanto ele é
condicionado pelas características locais, como clima, relevo, tipo de solo, uso e
ocupação do solo, geologia, tipo de cobertura vegetal, rede hidrográfica (rios), etc. Por
exemplo, a interceptação que ocorre em uma área com mata nativa é muito superior à de
áreas agrícolas, como o cultivo de fumo e arroz. Em áreas com solo tipo argiloso, pouco
permeável, a infiltração se dá em menor quantidade do que em áreas com solo arenoso,
mais permeável, enquanto que em áreas pavimentadas essa fase já não ocorre
praticamente. Como o escoamento se processa movido pela ação da gravidade, em
terrenos mais íngremes a tendência é ocorrer menor retenção da água em depressões do
solo, com escoamentos mais rápidos do que em terrenos mais planos, onde há maior
propensão ao acúmulo de água, facilitando a infiltração.
O homem vem modificando o meio em que vive, de modo à “adequá-lo” às suas
necessidades, o que repercute em sensíveis alterações do ciclo hidrológico. Por
exemplo, pode-se citar o barramento de rios, que modifica o regime de escoamento,
aumenta a evaporação e eleva o nível das águas subterrâneas (lençol freático), além de
outras conseqüências sobre a biota aquática. Outro exemplo é a impermeabilização do
solo devido à urbanização, o que diminui a parcela infiltrada e aumenta o escoamento
superficial, causando alagamentos. O desmatamento é outro exemplo, na medida em
que diminui a interceptação, deixando os solos expostos à ação das gotas de chuva e do
escoamento superficial, que erodem o solo e carreiam nutrientes e sedimentos para rios
e lagos.
Para ilustrar o efeito da substituição da cobertura natural do solo pela
urbanização sobre o ciclo hidrológico, tem-se a Figura 2.2. Observa-se que, após uma
impermeabilização entre 30% e 50% da superfície, o escoamento superficial passa a
11
corresponder a 55% do total precipitado, enquanto esse percentual era equivalente a
apenas 10% da precipitação para a situação de cobertura natural do solo.
Figura 2.2 – Ilustração do efeito da urbanização sobre o ciclo hidrológico (os
percentuais se referem à parcela da precipitação que “segue” cada uma das fases do
ciclo). Fonte: adaptado de EPA (1998).
Além de alterar as fases do ciclo hidrológico, as atividades antrópicas1
têm uma
série de repercussões sobre o meio ambiente, tais como: contaminação de corpos
d’água, devido ao lançamento de efluentes de origem industrial, agrícola ou doméstico
(esgoto das cidades); introdução de espécies exóticas (espécies que não eram
encontradas na região na região e foram introduzidas pelo homem); ocupação de
planícies de inundação; mudanças globais no clima; desmatamento; contaminação do ar,
ocasionando chuvas ácidas, etc (Tabela 2.2).
1
atividade antrópica = aquela relativa à ação humana.
12
Tabela 2.2 – Atividade humana e seus impactos sobre a disponibilidade hídrica. (Fonte:
adaptado de Tundisi, 2000).
Atividade humana Impacto nos ecossistemas aquáticos Valores/serviços em risco
Construção de
represas
Alteração do fluxo dos rios, transporte
de nutrientes e sedimentos,
intereferência na migração e
reprodução de peixes
Habitats, pesca comercial e
esportiva, deltas e suas
economias
Construção de
diques e canais
Destruição da conexão do rio com as
áreas inundáveis
Fertilidade natural das várzeas e
controles das enchentes
Alteração do canal
natural dos rios
Danos ecológicos dos rios. Modificação
dos fluxos dos rios
Habitats, pesca comercial e
esportiva. Produção de
hidroeletricidade e transporte.
Drenagem de áreas
alagadas
Eliminação de um componente
fundamental dos ecossistemas
aquáticos
Biodiversidade. Funções naturais
de filtragem e reciclagem de
nutrientes. Habitats para peixes e
aves aquáticas.
Desmatamento/uso
do solo
Mudança de padrões de drenagem,
inibição da recarga natural dos
aquíferos, aumento da sedimentação
Qualidade e quantidade da água,
pesca comercial, biodiversidade
e controle de enchentes.
Poluição não
controlada
Prejuízo da qualidade da água
Suprimento de água. Custos de
tratamento. Pesca comercial.
Biodiversidade. Saúde humana.
Remoção excessiva
de biomassa
Diminuição dos recursos vivos e da
biodiversidade
Pesca comercial e esportiva.
Ciclos naturais dos organismos.
Introdução de
espécies exóticas
Supressão das espécies nativas.
Alteração dos ciclos de nutrientes e
ciclos biológicos
Habitats, pesca comercial.
Biodiversidade natural e
estoques genéticos.
Poluentes do ar
(chuva ácida)
Perturbação da composição química de
rios e lagos
Pesca comercial. Biota aquática.
Recreação. Saúde humana.
Agricultura
Mudanças globais no
clima
Alteração drástica do volume dos
recursos hídricos, dos padrões de
distribuição da precipitação e
evaporação, riscos de enchente
Suprimento de água, transporte,
produção de energia elétrica,
produção agrícola, pesca.
Crescimento da
população e padrões
gerais do consumo
humano
Aumento na pressão para construção
de hidroelétricas, da poluição da água,
da acidificação de lagos e rios.
Modificação do ciclo hidrológico.
Praticamente todas as atividades
econômicas que dependem dos
serviços dos ecossistemas
aquáticos.
Usos da água
Os setores usuários das águas são diversos, utilizando-as para diferentes fins.
Dependendo do uso, há a necessidade de derivação da água e ocorre um consumo (uso
consuntivo), retornando determinada parcela da água aos corpos d’águas. Outros usos,
13
como a navegação, por exemplo, são considerados não consuntivos, pois não alteram a
quantidade deste recurso na natureza.
Na Tabela 2.3 são listados os principais usos da água, explicitando algumas
características: existência ou não de derivação de águas do seu curso natural; a
finalidade e os tipos de uso; as perdas por uso consuntivo da água; os requisitos de
qualidade exigidos para cada uso e; os efeitos da utilização, especialmente de qualidade.
Tabela 2.3 – Usos da água (Fonte: adaptado de Barth, 1987, apud Setti et al., 2001).
Forma Finalidade Tipo de uso Uso consuntivo
Requisitos de
qualidade
Efeitos nas águas
abastecimento
urbano
abastecimento
doméstico, industrial,
comercial e público
baixo, de 10%, sem
contar as perdas nas
redes
altos ou médios, influindo
no custo do tratamento
Poluição orgânica e
bacteriológica
abastecimento
industrial
sanitário, de processo,
incorporação ao
produto, refrigeração e
geração de vapor
médio, de 20%,
variando com o tipo de
uso e de indústria
médios, variando com o
tipo de uso
Poluição orgânica,
substâncias tóxicas,
elevação de
temperatura
irrigação
irrigação artificial de
culturas agrícolas
segundo diversos
métodos
alto, de 90%
Médios, dependendo do
tipo de cultura
Carreamento de
agrotóxicos e
fertilizantes
abastecimento
doméstico ou para
dessedentação de
animais
baixo, de 10% Médios
Alterações na qualidade
com efeitos difusos
Com
derivação
de águas
aqüicultura
estações de
piscicultura e outras
baixo, de 10% Altos
Carreamento de
matéria orgânica
geração
hidroelétrica
acionamento de
turbinas hidráulicas
perdas por evaporação
do reservatório
baixos
alterações no regime e
na qualidade da água
navegação
fluvial
manutenção de
calados mínimos e
eclusas
não há baixos
lançamento de óleo e
combustíveis
recreação, lazer
e harmonia
paisagística
natação e outros
esportes com contato
direto, como iatismo e
motonáutica
lazer contemplativo
altos, especialmente
recreação de contato
primário
não há
pesca
com comerciais de
espécies naturais ou
introduzidas através de
estações de
piscicultura
não há
altos, nos corpos d'água,
correntes, lagos, ou
reservatórios artificiais
alterações na qualidade
após mortandade de
peixes
assimilação de
esgotos
diluição,
autodepuração e
transporte de esgotos
urbanos e industriais
não há não há
poluição orgânica,
física, química e
bacteriológica
sem
derivação
das águas
usos de
preservação
vazões para assegurar
o equilíbrio ecológico
não há médios
melhoria da qualidade
da água
14
Escassez da água
Há algum tempo atrás, predominava a idéia da abundância da água na natureza,
o que não gerava preocupação quanto à quantidade de água consumida ou desperdiçada
por determinado uso. Entretanto, atualmente tem-se tentado tornar cada vez mais
consensual a noção de escassez de água, pelo menos em termos relativos, em virtude da
crescente demanda por esse valioso recurso.
São diferenciados dois tipos de escassez: (a) escassez quantitativa e (b) escassez
qualitativa.
A escassez quantitativa decorre da falta de água em quantidade suficiente para
atender àqueles usos pretendidos, sendo comum a ocorrência no Nordeste brasileiro
(região semi-árida, principalmente). Cabe salientar aqui a irregular distribuição
temporal (precipitações concentradas em poucos meses do ano) e espacial (abundância
de água na Amazônia e escassez no semi-árido nordestino).
A escassez qualitativa é resultante da falta de qualidade suficiente da água para
atender os usos pretendidos, ocasionada principalmente pelo lançamento de esgotos das
várias origens.
Assim, por ser um recurso escasso, a água é considerada dotada de valor
econômico, como dispõe a Lei 9.433 de 19972
, a chamada Lei das Águas. Por isso, além
da gestão da oferta de água (busca de novos mananciais de abastecimento ou aumento
da exploração dos existentes), praticada há mais tempo, tem-se ressaltado a necessidade
da gestão da demanda pela água. Isso visa proporcionar um uso racional desse recurso e,
para tanto, diversos instrumentos estão previstos na referida lei, entre eles alguns
instrumentos econômicos, como a outorga e a cobrança pela água. A outorga se refere
basicamente à concessão do direito de utilização da água, seja para captá-la, para usá-la
como diluição de esgotos (efluentes) ou para geração de energia elétrica, a ser emitida
pelo órgão responsável. A cobrança diz respeito ao pagamento de um valor pela retirada
da água do corpo d’água ou pelo lançamento de efluentes no mesmo.
2
Lei Federal n. 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria
o Sistema Nacional de Recursos Hídricos e dá outras providências.
15
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo 3
3
3
3
Bacia Hidrográfica
Bacia Hidrográfica
Bacia Hidrográfica
Bacia Hidrográfica
Conceito de bacia hidrográfica
A expressão bacia hidrográfica é usada para denotar a área de captação natural
da água de precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída,
que é chamado de exutório. A bacia é constituída por um conjunto de superfícies
vertentes – terreno sobre o qual escoa a água precipitada – e de uma rede de drenagem
formada por cursos d’água que confluem até resultar um leito único no exutório.
Figura 3.1 – Superfícies vertentes e rede de drenagem que compõem uma bacia
hidrográfica.
Fonte: adaptado
de EPA (1998)
Fonte: adaptado
de EPA (1998)
Superficies
vertentes
Superficies
vertentes
Rede de
drenagem
Rede de
drenagem
Superfícies
Vertentes
Rede de
drenagem
16
Relembrando os processos envolvidos no ciclo hidrológico (Capítulo 2), a bacia
hidrográfica pode ser considerada como um sistema físico, cuja entrada é o volume de
água precipitado e cuja saída é o volume de água escoado pelo exutório. Entretanto, esse
é um sistema aberto, já que nem toda a precipitação (entrada de água) se torna
escoamento no exutório (saída) ou fica armazenada na própria bacia. Há perdas
intermediárias, relativas aos volumes evaporados, transpirados (pela vegetação) ou
infiltrados profundamente (Figura 3.2). Tais volumes de água representam parcela da
entrada no sistema que é “perdida” para a atmosfera ou para camadas profundas do
subsolo.
Figura 3.2 – Representação da bacia hidrográfica como um sistema aberto.
Mesmo com esse aspecto de sistema aberto, o estudo hidrológico se dá a nível de
bacia hidrográfica, cujo papel hidrológico é entendido como sendo o de transformar
uma entrada de volume de água concentrada no tempo (que é a precipitação) em uma
saída de água de forma mais distribuída no tempo (escoamento pelo exutório).
Nesse meio termo, ou seja, entre a ocorrência da precipitação e a vazão de saída
da bacia, decorrem todos os processos descritos no Capítulo 2, compondo o Ciclo
Hidrológico. Há interceptação pela vegetação, erosão do solo, evaporação, transpiração,
armazenamento da água em depressões do solo, infiltração sub-superficial e profunda,
etc. Ocorrem também os diversos usos da água pela população residente na bacia, como
captação de água para abastecimento doméstico, uso para lazer, banho, lançamento de
esgotos e efluentes industriais, entre outros. Entretanto, como acontece cada processo do
ciclo ou cada uso da água e em que intensidade vai variar conforme as características da
Precipitação
Vazão
evaporação
transpiração
percolação profunda
limite da bacia
hidrográfica
rede de drenagem
17
bacia, como relevo, topografia, cobertura vegetal, tipo de solo, geologia, presença de
áreas urbanas, atividades agropecuárias ou industriais, etc.
Na Figura 3.3 são apresentados dois gráficos, denominados de hietograma e
hidrograma. O primeiro se refere à representação da precipitação ocorrida ao longo do
tempo, enquanto o hidrograma retrata o comportamento da vazão ao longo do tempo.
Tais gráficos são apenas exemplos típicos e serão discutidos em mais detalhes no
Capítulo referente ao Escoamento Superficial, mas permitem visualizar o papel
hidrológico da bacia, transformando a entrada de água concentrada no tempo em uma
saída mais distribuída.
Figura 3.3 – Exemplo de gráficos da precipitação ao longo do tempo (hietograma) e da
vazão (hidrograma), ilustrando o papel hidrológico de uma bacia hidrográfica.
Simplificadamente, pode-se descrever o processo de transformação da
precipitação em vazão do seguinte modo: a precipitação que cai sobre as vertentes
(superfícies que contribuem para os cursos d’água da rede de drenagem) infiltra-se
totalmente no solo até saturá-lo. Nesse instante, decresce a taxa de infiltração, que passa
a ser inferior à precipitação e aumenta o escoamento superficial (Figura 3.4), que segue
até a rede de drenagem e daí até o exutório da bacia. Esse processo de formação do
escoamento superficial é geralmente caracterizado como uma “produção de água” pelas
vertentes.
tempo
precipitacao
tempo
precipitacao
tempo
vazao
tempo
vazao
(
(
(
(Hietograma
Hietograma
Hietograma
Hietograma)
)
)
)
(
(
(
(Hidrograma
Hidrograma
Hidrograma
Hidrograma)
)
)
)
18
À medida que se processa o escoamento superficial nas vertentes, ocorre
também o transporte de partículas do solo (sedimentos), devido à força erosiva das gotas
da chuva e à própria ação do escoamento. Isso é referido como “produção de
sedimentos” pelas vertentes, de forma análoga à produção de água, e será melhor
discutido no Capítulo referente ao Transporte de Sedimentos.
Importante ressaltar que as superfícies vertentes e a rede de drenagem são
indissociáveis, visto que estão em constante interação. Durante a precipitação, as
vertentes contribuem para os arroios e rios com água e sedimentos carreados.
Entretanto, quando ocorre cheia no rio, este extravasa da sua calha principal, alcançando
a planície de inundação, ocorrendo fluxo inverso de água e sedimentos (agora no
sentido calha do rio para planície de inundação).
Figura 3.4 – “Produção” de escoamento superficial nas superfícies vertentes de uma
bacia hidrográfica.
Delimitação da bacia hidrográfica
Como já mencionado, a bacia hidrográfica é vista como o conjunto de áreas que
contribuem para um determinado ponto. Entretanto, como definir tal área de
contribuição, também conhecida como área de drenagem? Normalmente, os limites da
bacia são estabelecidos analisando a topografia do terreno (relevo), através das curvas
de nível (linhas indicativas da altitude do terreno – cotas – em relação a um referencial,
como o nível do mar). Seja utilizando mapas impressos ou arquivos eletrônicos, a bacia
hidrográfica é delimitada identificando as áreas de maior cota, que constituem os
19
chamados divisores topográficos da bacia. Como o escoamento se dá pela ação da
gravidade, e a bacia é definida como o conjunto de áreas que contribuem para um ponto,
é fácil perceber que as regiões de terreno mais elevado estabelecem uma divisão entre a
parte do terreno cujo escoamento segue até o rio em questão e a parte cujo escoamento
segue para outro rio de outra bacia.
Também é importante ter em mente o conceito de “bacias dentro de bacias”, o
qual é ilustrado pela Figura 3.5. Tendo o ponto A como base, a área contribuinte, ou
seja, sua bacia hidrográfica é a indicada em tal figura. Entretanto, essa bacia está
inserida na bacia do ponto B que, por sua vez, está contida na bacia do ponto C. Assim,
conforme a escala em que se trabalhe e, principalmente, o interesse do estudo a ser
realizado, serão tomadas as bacias “maiores” ou as sub-bacias e micro-bacias.
Figura 3.5 – Delimitação da área contribuinte conforme o ponto considerado (A, B ou
C, cuja localização é indicada pelas setas).
Voltando à questão da delimitação de uma bacia, a rigor existem três tipos de
divisores de bacias: divisor topográfico, baseado no relevo; divisor geológico, em
função das características geológicas; e divisor freático, estabelecido de acordo com a
posição do lençol freático (nível das águas subterrâneas no subsolo) (Figura 3.6). Mas,
devido à falta de informações e à não praticidade no estabelecimento dos divisores
geológicos e freáticos, geralmente são empregados apenas os divisores topográficas
para identificar e delimitar uma bacia.
A
B
C
20
Fonte: Villela (1975)
Fonte: Villela (1975)
Figura 3.6 – Indicação dos divisores topográficos e freáticos de uma bacia hidrográfica
(Fonte: Villela, 1975).
Bacia hidrográfica x gestão dos recursos hídricos
Com base nas definições de bacia hidrográfica, percebe-se porque se adota a
bacia hidrográfica como unidade para a gestão dos recursos hídricos. Como a bacia
define todas as áreas contribuintes para um ponto, isso significa que os impactos, ações,
intervenções, projetos em um ponto da bacia poderão repercutir em toda a área a jusante
da área afetada inicialmente. Por exemplo, o lançamento de efluentes de uma indústria
em um determinado ponto de um arroio irá influir na qualidade da água em todo o
restante do arroio a jusante, bem como nos demais cursos d’água para o qual tal arroio
conflui. Outro exemplo diz respeito ao desmatamento de uma parte da área da bacia,
cujo efeito (maior geração de escoamento superficial) será sentido nos trechos a jusante
da bacia. Assim, os problemas relativos à água são comumente tratados pensando na
bacia hidrográfica onde estão inseridos, cuja delimitação prevalece sobre os limites
municipais e estaduais, por exemplo.
Por isso, a Lei 9.433 (1997) estabelece como um dos princípios a definição da
bacia hidrográfica como unidade territorial para implementação da Política Nacional de
Recursos Hídricos.
21
O território brasileiro foi dividido inicialmente em 8 regiões hidrográficas (R.
H.), mas atualmente, segundo a Resolução 32 do Conselho Nacional de Recursos
Hídricos (CNRH) de 15 de outubro de 2003, são estabelecidas 12 regiões hidrográficas
(Figura 3.6): R. H. do Amazonas; R. H. do Tocantins; R. H. do Paraguai; R. H. do
Paraná; R. H. do Atlântico Nordeste Ocidental; R. H. do Atlântico Nordeste Oriental; R.
H. do Parnaíba; R. H. do São Francisco; R. H. do Atlântico Leste; R. H. do Atlântico
Sudeste; R. H. do Atlântico Sul; R. H. do Uruguai.
Figura 3.7 – Divisão hidrográfica nacional (Fonte: adaptado de ANA, 2004).
O Estado do Rio Grande do Sul, portanto, está inserido nas Regiões
Hidrográficas do Uruguai e do Atlântico Sul. Por outro lado, o próprio Estado foi
dividido em três regiões hidrográficas menores, que são: a Região Hidrográfica do
Uruguai, a Região Hidrográfica do Guaíba e a Região Hidrográfica do Litoral (Figura
3.8).
Vale ressaltar aqui que o conceito de região hidrográfica difere um pouco de
bacia hidrográfica. As regiões hidrográficas foram traçadas com base nas bacias
hidrográficas mas respeitando alguns limites geopolíticos. Por exemplo, tem-se a
Região Hidrográfica Amazônica. Parte da bacia contribuinte ao rio Amazonas está além
R.H. Amazônica
R.H. Atlântico
Nordeste Ocidental
R.H. Atlântico
Nordeste Oriental
R.H. do Parnaíba
R.H. do
Tocantins
R.H. do São
Francisco
R.H. Atlântico Leste
R.H. Atlântico Sudeste
R.H. Atlântico Sul
R.H. do Uruguai
R.H. do
Paraná
R.H. do Paraguai
22
da fronteira do Brasil, de modo que o traçado da região correspondente seguiu a
delimitação do país na parte norte.
No caso do Rio Grande do Sul, a Região Hidrográfica do Uruguai constitui o
conjunto de áreas que drenam para o Rio Uruguai, embora haja uma parcela de área
contribuinte a esse corpo d’água situada na Argentina e no Uruguai. A Região
Hidrográfica do Guaíba contempla todas as áreas cuja contribuição segue para o Lago
Guaíba. Já a Região Hidrográfica do Litoral é composta pelas áreas que drenam
diretamente para o oceano ou para o sistema de lagoas Mirim, Mangueira e Lagoa dos
Patos.
Figura 3.8 – Divisão hidrográfica do Estado do Rio Grande do Sul.
23
Fisiografia da bacia hidrográfica
A caracterização física da bacia hidrográfica, em termos de relevo, rede de
drenagem, forma e área de drenagem, constitui o que se denomina de fisiografia. Para
essa caracterização são utilizados mapas, fotografias aéreas, imagens de satélite
(sensoriamento remoto) e levantamentos topográficos. Até um tempo atrás utiliza-se
instrumentos como o curvímetro e o planímetro, que permitiam calcular comprimentos e
áreas sobre mapas impressos. Entretanto, hoje em dia são empregados programas
computacionais específicos, facilitando e agilizando enormemente essa tarefa.
A seguir serão apresentadas algumas características fisiográficas mais utilizadas.
Área da bacia
A área da bacia (A) corresponde a sua área de drenagem, cujo valor corresponde
à área plana entre os divisores topográficos projetada verticalmente. O conhecimento da
área da bacia permite estimar qual o volume precipitado de água, para uma certa lâmina
de precipitação3
, pela expressão:
volume precipitado = lâmina precipitada x área da bacia
Como exemplo, a bacia do rio Caí tem uma área estimada em 4.983 km2
,
enquanto a área da bacia dos rios Taquari-Antas é de cerca de 26.536 km2
.
Forma da bacia
A forma da bacia, obviamente, é função da delimitação da área da bacia e tem
influência no tempo transcorrido entre a ocorrência da precipitação e o escoamento no
exutório. Em bacias de formato mais arredondado esse tempo tende a ser menor do que
em bacias mais compridas, como ilustra a Figura 3.9 para três bacias hipotéticas.
Dois coeficientes são comumente empregados como indicativos da forma da
bacia: fator de forma e coeficiente de compacidade.
- Fator de forma: esse coeficiente é definido pela relação entre a largura média da
bacia e o comprimento axial do curso d’água principal ( )
C
L . A largura média L
é calculada pela expressão:
3
O conceito de lâmina de precipitação é definido no Capítulo 4 – Precipitação.
24
c
L
A
L = ,
e, portanto, o fator de forma f
K é determinado por:
2
c
c
f
L
A
L
L
K =
=
Esse coeficiente dá uma idéia da tendência da bacia a cheias e, a princípio,
comparando-se duas bacias, aquela de maior fator de forma estaria mais
propensa a cheias do que a outra.
- Coeficiente de compacidade: esse coeficiente é definido como a relação entre o
perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de mesma área da bacia.
Assim, considerando uma bacia de área A e um círculo também de área A, tem-
se que:
r
P
P
P
K
cículo
bacia
c
π
2
=
= e 2
r
A π
=
Logo:
A
P
Kc 28
,
0
=
Pela sua definição, se 1
=
c
K a forma da bacia é um círculo, sendo mais
“irregular” quanto maior o valor desse coeficiente, o que implica em uma menor
tendência a cheias.
Figura 3.9 – Bacias hipotéticas de mesma área, onde o tempo entre a precipitação e a
vazão no exutório tende a ser na seguinte ordem: t2<t1<t3, devido à forma da bacia.
b. 1
b. 1
b. 1
b. 1 b. 2
b. 2
b. 2
b. 2 b. 3
b. 3
b. 3
b. 3
25
Rede de drenagem
A rede de drenagem é constituída pelo rio principal e seus afluentes. O rio
principal é identificado a partir do exutório da bacia, “subindo o rio”, ou seja,
percorrendo o sentido inverso do fluxo da água, até percorrer a maior distância (em
outras palavras, o rio principal é aquele maior curso d’água do exutório até a cabeceira
da bacia). Quatro indicadores são utilizados, geralmente, para descrever a rede de
drenagem de uma bacia: ordem dos cursos d’água, densidade de drenagem, extensão
média do escoamento superficial e sinuosidade do curso d’água principal, os quais serão
descritos a seguir.
- Ordem dos cursos d’água: esse parâmetro dá uma idéia do grau de ramificação
da rede de drenagem, sendo a regra mais usual de classificar cada curso d’água a
que considera que todos os cursos d’água que não recebem afluência de outros
são de ordem 1; dois de ordem n formam um curso d’água de ordem n+1; dois
de ordens diferentes formam um de ordem igual àquele formador de maior
ordem. A bacia hipotética da Figura 3.10 exemplifica esse processo.
Figura 3.10 – Classificação dos cursos d’água de uma bacia quanto à ordem.
- Densidade de drenagem: esse índice é definido pela relação entre o comprimento
total dos cursos d’água da bacia )
(∑ c
l e sua área:
A
l
D c
d
∑
=
Os valores mais usuais da densidade de drenagem são: 2
/
5
,
3
5
,
0 km
km
Dd ≤
≤ .
- Extensão média do escoamento superficial: representa a distância média que
água teria que percorrer, em linha reta, do ponto onde atingiu o solo até a rede de
drenagem. Para sua determinação, considera-se um retângulo de área igual à da
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
3
3
3
3
3
3
3
3
26
∑
= C
l
x ∑
= C
l
x
m
lm
l
m
l
2
m
l
4
m
l
2 m
l
2
m
l
4 m
l
4
bacia e com o maior lado igual à soma do comprimento total dos cursos d’água,
como exemplifica a Figura 3.11.
Figura 3.11 – Retângulo auxiliar de área igual à da bacia, para determinação da extensão
média do escoamento superficial.
Interpretando o retângulo anterior como sendo a bacia, é fácil perceber que a
distância média que a água precipitada percorre até alcançar a rede de drenagem
é um quarto do seu lado menor. No caso do retângulo, a rede de drenagem se
limita ao curso d’água central, cujo comprimento é equivalente ao comprimento
total dos cursos d’água da bacia original.
Como o retângulo da Figura 3.11 tem área igual à da bacia, tem-se que:
∑
=
⇒
⋅
=
c
m
m
l
A
l
l
x
A
4
4
- Sinuosidade do curso d’água principal: representa a relação entre o comprimento
do rio principal )
( c
L e a distância entre a nascente (cabeceira) e a foz )
( c
d ,
medida em linha reta. Esse termo dá uma idéia da “quantidade” de curvatura do
rio, sendo determinado pela expressão:
c
c
c
d
L
S =
A Figura 3.12 ilustra a definição das variáveis c
L e c
d , enquanto a Figura 3.13
mostra um rio nos EUA que apresenta grande sinuosidade, evidenciada pela quantidade
de meandros.
27
C
LC
L
C
dC
d
Fonte: EPA (1998)
Fonte: EPA (1998)
Figura 3.12 – Representação do comprimento do rio principal )
( c
L e a distância entre
sua foz e nascente )
( c
d .
Figura 3.13 – Foto de um rio nos EUA dando idéia da sinuosidade de um curso d’água
natural.
Relevo da bacia
As características do relevo da bacia têm influência direta sobre o escoamento
superficial, principalmente na velocidade do escoamento e na maior ou menor tendência
ao armazenamento da água na superfície ou depressões do solo. Entretanto, o relevo
também influencia a evaporação, a precipitação e a temperatura, por serem função da
altitude, dentre outras variáveis.
28
38%
20% 40% 60% 80% 100%
50
100
150
Cota (m)
20% 40% 60% 80% 100%
50
100
150
20% 40% 60% 80% 100%
50
100
150
20% 40% 60% 80% 100%
20% 40% 60% 80% 100%
50
100
150
50
100
150
Cota (m)
- Declividade da bacia: bacia com maior declividade tende a ter maior velocidade
do escoamento e ser mais susceptível à erosão do solo, caso este esteja
descoberto; a declividade da bacia é geralmente estimada pelo método das
quadrículas, analisando as curvas de nível do terreno. O referido método foge ao
escopo desta disciplina e não é descrito neste texto.
- Declividade do curso d’água principal: para dois pontos quaisquer do curso
d’água, a declividade é determinada pela relação entre a diferença total de
elevação do leito (cotas) e a distância horizontal entre eles:
.
.
1
horiz
dist
Cota
DC
∆
=
- Curva hipsométrica: representação gráfica do relevo médio da bacia, indicando
para cada cota do terreno a porcentagem da área da bacia situada acima ou
abaixo dessa cota. A Figura 3.14 mostra um exemplo típico de uma curva
hipsométrica, na qual 38% da área da bacia está situada acima da cota 50 m.
Figura 3.14 – Exemplo de uma curva hipsométrica, segundo a qual, por exemplo, 38%
da área da bacia está em cotas superiores à 50 m.
29
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo 4
4
4
4
Precipitação
Precipitação
Precipitação
Precipitação
Aspectos gerais
A precipitação é entendida como qualquer forma de água proveniente da
atmosfera que atinge a superfície terrestre, como, por exemplo, neve, granizo, chuva,
orvalho, geada, etc. O que diferencia as várias formas de precipitação é o estado em que
a água se encontra.
Devido a sua capacidade de gerar escoamento, a chuva constitui a forma de
precipitação de maior interesse para a hidrologia. Como visto nos Capítulos 2 e 3
anteriores, parcela da chuva que atinge o solo gera escoamento nas vertentes da bacia
hidrográfica, alcançando a rede de drenagem e daí seguindo até o exutório da bacia.
Como a precipitação constitui a “entrada” de água na bacia hidrográfica,
tomando-a como um sistema físico, a estimativa da precipitação em uma bacia dá idéia
da disponibilidade hídrica nela, servindo para avaliar a necessidade de irrigação, a
previsão de enchentes nos rios, a operação de hidroelétricas, o atendimento às demandas
para abastecimento público, etc.
Mecanismo de formação da precipitação
A precipitação ocorre a partir da presença de vapor d’água na atmosfera, que sob
determinadas condições precipita na forma de neve, gelo, chuva, etc.
Para a ocorrência de chuva, deve-se haver condições propícias para o
crescimento das gotas de água, até que elas possuam peso superior às forças que as
mantêm em suspensão na atmosfera. Esse crescimento se dá principalmente devido à
presença dos chamados núcleos de condensação nas nuvens, que são partículas
orgânicas, sais, cristais de gelo, produtos resultantes da combustão, entre outros. As
gotas de chuva tendem a condensar sobre tais partículas e, mediante alguns processos
30
físicos, ocorre o crescimento das gotas, em parte devido ao choque das primeiras com
outras gotas menores. Ao atingir peso suficiente, as gotas precipitam.
Classificação da precipitação
A ocorrência de precipitação está geralmente relacionada à ascensão de ar
úmido, após o qual se dá o processo de condensação sobre os núcleos e de crescimento
das gotas, descritos no item anterior. Mas há diferentes mecanismos agindo no sentido
de causar a referida ascensão do ar úmido e, conforme o tipo de mecanismo, as
precipitações são classificadas em:
- Convectivas: a ascensão do ar úmido e quente decorrente de uma elevação
excessiva de temperatura; como o ar quente é menos denso, ocorre uma brusca
ascensão desse ar que, ao subir, sofre um resfriamento rápido, gerando
precipitações intensas com pequena duração, cobrindo pequenas áreas; ocorrem
com freqüência em regiões equatoriais;
- Orográficas: a ascensão do ar quente e úmido, proveniente do oceano, ocorre
devido a obstáculos orográficos, como montanhas e serras; ao subir, ocorre o
resfriamento e em seguida a precipitação; são caracterizadas por serem de
pequena intensidade, mas longa duração, cobrindo pequenas áreas; como as
montanhas constituem um obstáculo à passagem do ar úmido (com “potencial”
para formar precipitação), normalmente existem áreas no lado oposto
caracterizadas por baixos índices de precipitação, sendo chamadas de “sombras
pluviométricas”;
- Frontais: neste tipo de precipitação, a ascensão do ar decorre do “encontro” entre
massas de ar frias e quentes; como resultado, o ar mais quente e úmido sofre
ascensão, resfria-se e ocorre a precipitação, caracterizada por longa duração e
intensidade média, cobrindo grandes áreas.
31
Caracterização da precipitação
Uma precipitação, no caso chuva, é caracterizada pelas seguintes grandezas:
- altura pluviométrica (P): representa a espessura média da lâmina de água
precipitada, sendo geralmente adotada como unidade o milímetro (mm);
significa a espessura da lâmina de água que recobriria toda a região, supondo-se
que não houvesse infiltração, evaporação nem escoamento para fora da região;
- duração (t): representa o período de tempo durante o qual ocorreu a precipitação;
geralmente se utilizam horas (h) ou minutos (min) como unidade;
- intensidade (i): fazendo-se a relação da lâmina de água precipitada com o
intervalo de tempo transcorrido, obtém-se a intensidade dessa precipitação,
geralmente em mm/h ou mm/min; assim i = P/t;
- tempo de recorrência (Tr): representa o número médio de anos durante o qual se
espera que uma determinada precipitação seja igualada ou superada; por
exemplo, ao se dizer que o tempo de recorrência de uma precipitação é de 10
anos, tem-se que, em média, deve-se esperar 10 anos para que tal precipitação
seja igualada ou superada.
Medição da precipitação
Os instrumentos usuais de medição da precipitação são o pluviômetro e o
pluviógrafo, descritos sucintamente a seguir.
O pluviômetro é constituído por um recipiente metálico dotado de funil com anel
receptor (Figura 4.1), geralmente com uma proveta graduada para leitura direta da
lâmina de água precipitada. Esse instrumento armazena a água da chuva e, fazendo-se a
leitura da proveta, tem-se a lâmina precipitada (P). Normalmente, a leitura é feita
diariamente, às 7h da manhã, por uma pessoa encarregada (operador) – geralmente, um
morador da região, cujo acesso diário ao equipamento seja fácil, e que recebe orientação
do órgão/empresa responsável pelo monitoramento.
32
Fonte: Studart,
2003.
Fonte: Studart,
2003.
Assim, o pluviômetro indica a precipitação ocorrida nas últimas 24 horas, desde
a última leitura, a qual é anotada pelo operador em uma caderneta diariamente.
Figura 4.1 – Foto de um pluviômetro. (Fonte: Studart, 2003).
O outro instrumento utilizado para registrar a precipitação, o pluviógrafo, difere
do pluviômetro basicamente por possuir um mecanismo de registro automático da
precipitação, gerando informações mais discretizadas no tempo, isto é, informações em
intervalos de tempo menores. Os equipamentos mais antigos utilizam um braço
mecânico para traçado de um gráfico em papel graduado com os valores precipitados
(Figura 4.2). Os pluviógrafos mais modernos armazenam tais informações em meio
magnético (Figura 4.3) ou enviam em tempo real por sistema de transmissão remoto de
dados.
Para acionamento do mecanismo de registro, seja em papel ou em meio
magnético, há dois tipos principais de sensores: cubas basculantes, cujo enchimento e
vertimento aciona o registro; reservatório equipado com sifão, sendo a variação do nível
no reservatório a responsável pelo acionamento do registro.
Dessa forma, o pluviógrafo permite ter informações mais detalhadas ao longo do
tempo, além de uma maior precisão também. Outra grande vantagem é não necessitar da
visita diária do operador, cuja visita fica restrita à troca de papel ou para descarregar os
dados em um computador portátil, em períodos como 15 dias ou um mês. Em tais casos,
33
o operador já passa a ser alguém com conhecimento mais especializado, geralmente um
técnico.
Figura 4.2 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em papel graduado.
(Fonte: Studart, 2003).
Figura 4.3 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em meio magnético.
(Fonte: Hobeco, 2003).
34
Análise de dados de precipitação
Um posto de medição de chuva (posto pluviométrico) é instalado e mantido com
o objetivo de obter uma série ininterrupta de dados de precipitação ao longo dos anos.
Entretanto, é comum a ocorrência de problemas mecânicos ou com o operador, de modo
que normalmente existem períodos sem registros das precipitações ou com falhas nas
observações.
Como falhas são designados dados cujos valores são incoerentes ou denotam
erros grosseiros, os quais são detectados por análise visual no primeiro contato com a
série histórica de dados ou mesmo só no momento do processamento das informações,
durante os estudos hidrológicos.
São comuns as falhas cuja origem é o preenchimento errado da caderneta pelo
operador, constando valores absurdos de tão elevados ou com casas decimais acima da
precisão do instrumento. Por exemplo, em dados diários, uma precipitação de 1000 mm
com certeza representa uma falha de leitura, pois esse valor equivale ao precipitado
anual em algumas regiões. Outro exemplo é um valor de 1,25 mm, sabendo que o
pluviômetro usado tem graduação de 0,1 mm.
Também pode ocorrer que o operador não pôde comparecer ao local e “estime”
um valor para leitura, que, às vezes, é perceptível – o operador repete o último valor
anotado ou coloca zero, por exemplo.
Entretanto, as falhas também podem ter origem em problemas mecânicos no
sensor ou no registrador do instrumento, causado por intempéries ou até por animais ou
vandalismo.
Enfim, é normal que as séries históricas de precipitação contenham falhas, as
quais devem ser identificadas e excluídas, tornando as séries com “espaços” sem
informação. Isso por que os estudos hidrológicos requerem séries contínuas de
precipitação. Vale lembrar que, por exemplo, um dia com falha já incapacita o uso do
valor da precipitação mensal naquele mês, dada pela soma das precipitações diárias.
Preenchimento de falhas
Para realizar o preenchimento de falhas em séries de dados de precipitação,
tornando-as contínuas, são usualmente empregados os métodos da ponderação regional,
regressão linear e uma combinação dos dois anteriores. A seguir tais métodos serão
35
brevemente apresentados, sendo a descrição detalhada encontrada na bibliografia
indicada ao final deste documento.
- Método da ponderação regional
Este método consiste em estimar a precipitação ocorrida no posto com falha
considerando-a proporcional às precipitações em postos vizinhos, sendo o fator de
proporcionalidade função da precipitação média em tais postos, levando em
consideração ainda a precipitação média no próprio posto com falha.
Tal método é utilizado selecionando ao menos três postos vizinhos àquele com
falha, os quais devem estar localizados em região climatologicamente semelhante ao
posto com falha.
Por exemplo, considerando que em uma série de dados de um posto X tenham
sido encontradas falhas, e considerando que existem os postos Y, Z e W situados em
regiões de clima semelhante e com dados disponíveis, as falhas citadas podem ser
preenchidas pela seguinte equação, conforme o método da ponderação regional:
Xm
Wm
W
Ym
Y
Zm
Z
X P
P
P
P
P
P
P
P ⋅








+
+
=
3
1
,
onde PXm, PYm, PZm e PWm são as precipitações médias nos postos X, Y, Z e W,
respectivamente; PX, é a precipitação no posto X a determinar; PY, PZ e PW são as
precipitações nos postos Y, Z e W, respectivamente, no intervalo de tempo referente
àquele da precipitação no posto X a determinar.
Esse método é normalmente usado para séries mensais ou anuais, não sendo
recomendado para séries diárias, devido à grande variabilidade temporal e espacial da
precipitação.
- Método da regressão linear
Outro método de preenchimento de falhas de dados de precipitação consiste em
utilizar a técnica da regressão linear simples ou múltipla, segundo a qual a precipitação
no posto com falhas é correlacionada estatisticamente com a precipitação em um posto
vizinho com dados disponíveis, no caso da regressão simples, ou vários postos vizinhos,
no caso da regressão múltipla.
Basicamente, o referido método consiste em ajustar uma equação do tipo (para
regressão linear múltipla):
36
d
P
c
P
b
P
a
P W
Z
Y
X +
⋅
+
⋅
+
⋅
= ,
onde Px é a precipitação a ser determinada no posto X com falha; Py, Pz e Pw são as
precipitações nos postos vizinhos Y, Z e W, respectivamente; a, b, c, d são coeficientes
a ajustar com base nas séries de dados disponíveis dos quatro postos.
O método mais comum de determinar os coeficientes a, b, c, d é o método dos
mínimos quadrados, que procura ajustar tais valores de modo a minimizar o somatório
do quadrado das distâncias de cada valor em relação à média e cuja descrição foge ao
escopo deste texto, mas é facilmente encontrada em qualquer livro de Estatística, como
por exemplo Spiegel (1972).
- Método da ponderação regional com base em regressões lineares
Sendo uma combinação dos dois métodos anteriores, este consiste em
estabelecer regressões lineares entre o posto com falhas e cada um dos postos vizinhos
selecionados. Para cada regressão linear, obtém-se um coeficiente de correlação (que
estima o “grau de correlação” em cada regressão) e a partir desses coeficientes são
determinados os pesos de cada posto na equação de determinação da precipitação no
posto com falha.
Assim, a precipitação no posto com falha é determinada por uma ponderação das
precipitações nos postos vizinhos, sendo os pesos de cada posto estabelecidos em
função do grau de correlação dos seus dados com os do posto com falhas, obtidos
mediante regressão linear. Maiores informações sobre esse método podem ser
encontradas em Tucci (2000).
Análise de consistência
Dispondo das séries de precipitação sem falhas, preenchidas por algum dos
métodos descritos anteriormente, convém realizar uma análise de consistência, para
avaliar a homogeneidade das informações entre os postos pluviométricos. Embora à
primeira vista os dados possam estar com valores supostamente coerentes, é possível
haver inconsistência nas informações dos totais precipitados, oriundos de problemas
como troca de operador, troca de equipamento, mudança nas condições vizinhas ao
local onde o equipamento está instalado, etc.
37
Caso sejam identificadas inconsistências, devem ser revistas as falhas
preenchidas bem como tentar identificar outras falhas não apontadas inicialmente.
Para detectar tais inconsistências, geralmente são empregados os métodos da
Dupla Massa e do Vetor Regional. O primeiro método é descrito resumidamente a
seguir, enquanto o segundo pode ser encontrado em detalhes em Tucci (2000).
- Método da Dupla Massa
Este é um método simples, desenvolvido pelo U.S. Geological Survey (Tucci,
2000), o qual consiste em traçar em um gráfico os totais acumulados de precipitação do
posto a consistir (posto cuja consistência se quer analisar) versus os totais acumulados
de um posto base de comparação.
Se os pontos de tal gráfico se alinharem em uma reta aproximada, isso indica
uma proporcionalidade entre os dados dos dois postos em questão, como ilustra a Figura
4.4-a.
Figura 4.4 – Exemplos de resultados da análise de consistência do Posto Y tendo como
base o posto X (totais precipitados acumulados).
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
Posto Y
Posto X
(a) (b)
(c) (d)
38
Entretanto, pode ocorrer que os pontos se alinhem em uma reta até certo instante
e em outra a partir daí, sendo duas retas de declividades diferentes (Figura 4.4-b). Isso
indica uma mudança de tendência no posto a consistir (no caso, posto Y), que pode ser
causada por erros sistemáticos (por exemplo, mudança do operador, que está fazendo a
leitura do instrumento erroneamente), por alterações climáticas, como a construção de
um lago artificial próximo ao local de medição, entre outras.
Também pode ocorrer dos pontos se alinharem em duas ou mais retas de mesma
declividade (paralelas) (Figura 4.4-c). A principal causa são erros de transcrição dos
dados, causados pelo operador ou durante o processamento das informações.
Quando o gráfico dos totais acumulados apresenta a forma da Figura 4.4-d, onde
os pontos estão distribuídos de forma dispersa, sem haver nenhuma tendência clara, isso
indica, geralmente, que os postos em questão apresentam regimes pluviométricos
distintos, não devendo ser usados conjuntamente nos estudos hidrológicos.
Análise de freqüência dos totais precipitados
Uma análise simples e rápida de se fazer sobre os totais precipitados é verificar
com qual freqüência eles ocorreram historicamente, com base nos dados observados
disponíveis. Para tanto, os dados são dispostos em ordem decrescente de valores, sendo
atribuído a cada um deles um número (m) correspondente a sua ordem – o primeiro
(maior valor) recebe o valor m = 1, o segundo m = 2, e assim sucessivamente até o
número de dados ou registros disponíveis, representado por n. O valor de m varia então
de 1 até n.
A freqüência (F) é determinada pelas equações abaixo, conforme se opte pelo
método da Califórnia ou de Kimball:
n
m
F =
1
+
=
n
m
F
Convém ressaltar que o valor de F representa a freqüência com que o valor da
precipitação de ordem m foi igualada ou superada, tendo como fonte de informações a
série de dados disponíveis. Como já ressaltado, a precipitação é um fenômeno aleatório,
(método da Califórnia)
(método de Kimball)
39
de grande variabilidade temporal e espacial, e a estimativa da freqüência F apenas dá
uma idéia da probabilidade de ocorrência de cada valor da precipitação na área em
estudo, havendo técnicas estatísticas mais complexas para realizar previsões mais
confiáveis.
Precipitação média em uma bacia
Os postos pluviométricos registram a precipitação pontual, naquele local onde
estão instalados e, devido à variabilidade espacial e temporal da precipitação, as
medições em postos geograficamente próximos são distintas. Para os estudos
hidrológicos acerca de uma bacia hidrográfica, uma das informações mais
imprescindíveis é o regime pluviométrico da região. Uma forma, então, de incorporar as
medições pontuais dos postos e espacializar tais informações para a área da bacia é
determinando a precipitação média.
A precipitação média em uma bacia é entendida como sendo a lâmina de água de
altura uniforme sobre toda a sua área, associada a um período de tempo (um dia, um
mês, etc.). Obviamente, isso constitui uma simplificação, mas que permite inferir sobre
o regime pluviométrico da região e servir de comparação entre bacias.
Com base nos dados disponíveis de postos inseridos na área da bacia
hidrográfica ou em regiões próximas, costuma-se estimar a precipitação média em uma
bacia empregando o método aritmético, o método de Thiessen ou o método das isoietas,
os quais serão descritos a seguir.
Método artimético
Esse método é o mais simples e consiste apenas em obter a precipitação média a
partir da média aritmética das precipitações nos postos selecionados. Assim, supondo
que estejam disponíveis dados dos postos X, Y, Z e W, a precipitação média na bacia da
Figura 4.5 pode ser estimada como:
4
W
Z
Y
X
m
P
P
P
P
P
+
+
+
= ,
onde PX, PY, PZ, PW, são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente, e Pm
é a precipitação média na bacia.
40
Figura 4.5 – Postos com dados disponíveis para estimativa da precipitação média da
bacia do exemplo.
Esse método não considera a localização geográfica dos postos, relativamente à
bacia. Para o exemplo dado, a precipitação registrada no posto W tem a mesma
“importância” daquela medida em Y, situada no interior da bacia, na estimativa da
precipitação média via o método aritmético.
Método de Thiessen
Esse método determina a precipitação média em uma bacia a partir das
precipitações observadas nos postos disponíveis, incorporando um peso a cada um
deles, em função de suas “áreas de influência”. Com base na disposição espacial dos
postos, são traçados os chamados polígonos de Thiessen, que definem a área de
influência de cada posto em relação à bacia em questão.
Dessa forma, a precipitação média é obtida pela ponderação dos valores
registrados em cada posto e de suas áreas de influência. Considerando quatro postos
com informação disponível (postos X, Y, Z e W), a precipitação média estimada por
esse método é:
A
P
A
P
A
P
A
P
A
P W
W
Z
Z
Y
Y
X
X
m
⋅
+
⋅
+
⋅
+
⋅
= ,
onde: PX, PY, PZ, PW são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente; AX,
AY, AZ, AW são as áreas de influência dos postos X, Y, Z e W; Pm é a precipitação média
na bacia; A é a área da bacia que, no caso, corresponde à soma das áreas AX, AY, AZ, AW.
41
Para o traçado dos polígonos de Thiessen, inicialmente os postos são unidos por
linhas retas formando um polígono fechado (Figura 4.6-b); em seguida, são traçadas
retas perpendiculares aos segmentos que unem os postos, dividindo-os em duas partes
iguais (Figura 4.6-c); essas retas perpendiculares são prolongadas até o cruzamento com
as demais, definindo os polígonos de Thiessen e, portanto, as áreas de influência de
cada posto na bacia (Figura 4.7).
Figura 4.6 – Exemplo do traçado dos polígonos de Thiessen, para estimativa da
precipitação média na bacia, com base nos dados dos postos X, Y, Z e W.
Figura 4.7 – Definição dos polígonos de Thiessen e das áreas de influência dos postos
X, Y, Z e W para estimativa da precipitação média na bacia do exemplo.
Esse método incorpora, portanto, a questão da disposição espacial dos postos,
relativamente à bacia, diferindo a “importância” de cada posto através da hipótese que
(a) (b) (c)
(a) (b)
42
cada um teria sua área de influência na bacia. Como essas áreas não variam, visto que os
postos têm localização fixa, o cálculo pode ser automatizado, agilizando o processo.
Entretanto, uma crítica a esse método é que ele não leva em conta as
características do relevo, apresentando bons resultados parar terrenos levemente
ondulados e também quando há uma boa densidade de postos de medição da
precipitação.
Método das isoietas
O método das isoietas, como o próprio nome sugere, utiliza as isoietas para
determinação da precipitação média em uma bacia. As isoietas são linhas de igual
precipitação, traçadas para um evento específico ou para uma determinada duração. Por
exemplo, pode-se ter um mapa com as isoietas referentes ao evento chuvoso ocorrido
em tal data, ou as isoietas de precipitação mensal na bacia. Enquanto a primeira seria
obtida a partir dos dados do evento especificado, a segunda seria com base nas séries de
dados mensais disponíveis.
As isoietas são determinadas por interpolação a partir dos dados disponíveis nos
postos da área em estudo, podendo depois ser ajustadas conforme o relevo. Na Figura
4.8 é apresentado um exemplo fictício das isoietas em uma bacia hidrográfica,
correspondendo a valores mensais.
Figura 4.8 – Exemplo de isoietas mensais, com valores em mm.
43
A precipitação média na bacia pode ser obtida, portanto, a partir das isoietas
traçadas, fazendo uma média ponderada em função das áreas entre duas isoietas
consecutivas e o valor médio entre elas, como mostra a expressão a seguir:
A
P
P
A
P
i
i
i
i
m
∑ 












 +
⋅
=
+
+
2
1
1
,
,
onde Ai,i+1 é a área entre a isoieta i e a consecutiva i+1; Pi e Pi+1 são as precipitações
referentes às isoietas i e i+1; Pm é a precipitação média na bacia; e A é a área da bacia
que, no caso, é equivalente ao somatório das áreas entre as isoietas.
O emprego das isoietas para determinação da precipitação média em uma bacia
tem a vantagem de que leva em consideração a disposição espacial dos postos na bacia,
quando realiza a interpolação para traçado das isoietas, e também o relevo da bacia, ao
permitir ajustar o traçado por ele.
Precipitações máximas
A precipitação máxima é entendida como aquela ocorrência extrema, com
duração, distribuição espacial e temporal críticas para uma área ou bacia hidrográfica.
Em diversos estudos hidrológicos, o maior interesse é justamente conhecer ou estimar
qual a precipitação máxima, ou seja, qual o total de precipitação, sua duração e
distribuição espacial e temporal que sejam críticas para a área em estudo. Geralmente,
para os estudos de drenagem urbana e de previsão de enchentes torna-se imprescindível
a caracterização das precipitações máximas. Além disso, os dados de vazão estão menos
disponíveis do que de precipitação e, com base nestes, pode-se determinar a
precipitação máxima e então estimar a vazão de enchente na bacia.
É importante perceber que uma precipitação máxima deve ser caracterizada
pelas grandezas intensidade, duração e freqüência ou tempo de retorno. Dizer que a
precipitação máxima em uma certa bacia é 120 mm não permite saber nada, sem
informar a duração, pois esse total precipitado pode ocorrer em um dia ou em um mês,
representando situações completamente distintas. E ao associar a intensidade e duração
da precipitação com seu tempo de retorno, é possível ter uma idéia da freqüência de
ocorrência da precipitação máxima especificada e, portanto, o quanto determinado
projeto está “vulnerável” ou “seguro” ao considerar tal precipitação máxima.
44
Assim, para caracterizar a precipitação máxima em uma área, são normalmente
empregadas as chamadas curvas i-d-f ou curvas intensidade-duração-freqüência. Tais
curvas são obtidas a partir de dados de pluviógrafos, como apresentado por Tucci
(2000).
Para um determinado tempo de retorno (Tr), a curva i-d-f estabelece as máximas
intensidades da precipitação (i) para cada duração (t), tendo geralmente a seguinte
forma:
4
2
)
( 3
1
c
c
r
c
t
T
c
i
+
⋅
= ,
onde c1, c2, c3, c4, são coeficientes ajustados para cada região; i é a intensidade da
precipitação em mm/h; t é a duração em minutos e Tr é o tempo de retorno em anos.
Por exemplo, as curvas i-d-f para a cidade de Curitiba (PR) e para a região do
Parque da Redenção, em Porto Alegre (RS), são:
15
,
1
217
,
0
)
26
(
5950
+
⋅
=
t
T
i r
(curva i-d-f de Curitiba – PR)
88
,
0
052
,
0
)
12
(
1265
+
⋅
=
t
T
i r
(curva i-d-f da Redenção, Porto Alegre –RS)
Assim, para um tempo de retorno de 10 anos, a precipitação máxima com
duração de 2 horas, para a área próxima ao Parque da Redenção, em Porto Alegre, tem
intensidade de 19 mm/h. Já para Curitiba, essa precipitação tem intensidade de 32
mm/h.
Outra forma de apresentar a curva i-d-f é graficamente, como exemplifica a
Figura 4.9, referente à cidade de Caxias do Sul, na qual são traçadas as curvas para os
tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos. Por exemplo, para um Tr = 10 anos e uma duração
de 2 h, a intensidade da precipitação máxima em Caxias do Sul é em torno de 30 mm/h.
45
Figura 4.9 – Curva i-d-f de Caxias do Sul, para os tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos
(nas ordenadas, tem-se a intensidade da precipitação, em mm/h; nas abscissas, a duração
da precipitação, em horas) (Fonte: IPH, 2001).
46
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo 5
5
5
5
Escoamento Superficial
Escoamento Superficial
Escoamento Superficial
Escoamento Superficial
Introdução
Conforme visto no Capítulo 2, uma das etapas do ciclo hidrológico compreende
o escoamento superficial, cuja principal origem é a precipitação. Notadamente, dentre as
várias formas de precipitação (granizo, neve, chuva, etc), ao se estudar o escoamento
superficial o maior interesse e praticamente o único se resume à chuva, pela própria
capacidade de gerar escoamento superficial.
Relembrando o ciclo hidrológico, a precipitação que atinge o solo vai sendo
armazenada nas depressões do solo e infiltrando até saturá-lo, quando então o
escoamento superficial fica mais intenso. Esse é o chamado escoamento superficial
“livre”, que ocorre sobre as diversas superfícies que compõem a bacia hidrográfica. Tal
escoamento passa, então, a constituir a microrrede de drenagem, formando pequenos
canaletes de água que procuram seguir caminhos preferenciais no solo, conforme a
topografia (relevo), a presença de obstáculos, como rochas, raízes, plantas, etc, sob ação
da gravidade. Ocorre, então, a formação de pequenos cursos d’água, os córregos, que
também vão confluindo uns aos outros até alcançarem os rios.
Nota-se, portanto, que há um longo caminho da água precipitada na bacia até o
curso d’água principal, escoando inicialmente sobre o solo nas superfícies vertentes e
daí seguindo o direcionamento da rede de drenagem, dos menores filetes de água até os
maiores rios.
Entretanto, a água que corre nos rios não tem como origem apenas o escoamento
superficial sobre as superfícies vertentes da bacia. Uma parte da vazão4
do rio é
proveniente do escoamento sub-superficial e subterrâneo, como descrito no Capítulo 2.
Ou seja, parcela da água precipitada que infiltra vai escoar sub-superficialmente e outra
4
Vazão = volume por unidade de tempo, geralmente em m3
/s ou l/s.
47
parcela vai se juntar ao escoamento subterrâneo, alimentando os rios. A rigor, há ainda a
parcela da precipitação que cai diretamente sobre a superfície dos rios, mas que é
geralmente desprezível, se for considerada relativamente às demais contribuições.
Resumindo, em um corpo d’água o escoamento tem como origem as seguintes
componentes:
- precipitação direta sobre a superfície do corpo d’água;
- escoamento superficial nas vertentes da bacia;
- escoamento sub-superficial;
- escoamento subterrâneo.
Hidrograma
Para estudar ou avaliar o escoamento superficial, é de grande utilidade o traçado
do hidrograma, que consiste em um gráfico da evolução da vazão ao longo do tempo.
Para um rio, o hidrograma se refere a uma seção transversal específica, já que ao longo
do seu curso o rio vai recebendo mais contribuições (volumes de água) e aumentando
sua vazão5
, de jusante para montante. Assim, tomando uma determinada seção de um
rio, o hidrograma correspondente indica o volume de água escoado por unidade de
tempo através daquela seção.
Como comentado anteriormente, há um longo percurso para a água precipitada
percorrer até atingir uma determinada seção do rio principal na bacia, além de
“intervirem” ao longo desse caminho outras etapas do ciclo hidrológico, como
evaporação, transpiração, infiltração, etc. Portanto, o comportamento da vazão ao longo
do tempo é o resultado de todos os processos e etapas do ciclo hidrológico que
ocorreram na bacia hidrográfica em questão, desde a ocorrência da precipitação até a
composição dessa vazão.
Vendo a bacia hidrográfica como um sistema físico, cuja entrada é a precipitação
e a saída é a vazão no seu exutório, como comentado no Capítulo 3, entende-se que o
hidrograma representa a “resposta” da bacia, naquele ponto ou seção considerada, à
precipitação que ocorreu na sua área de contribuição. E o modo como ocorre essa
“resposta”, ou seja, o formato do hidrograma (como evoluiu a vazão ao longo do
5
Em capítulo posterior, será dado maior ênfase às características do fluxo de água em um rio
propriamente dito (fluxo fluvial).
48
Vazão no Rio Uruguai (RS), seção em Garruchos
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
35.000
27/jul 06/ago 16/ago 26/ago 05/set 15/set 25/set
data (ano de 1965)
vazão
(m3/s)
tempo), é reflexo direto das particularidades de cada bacia hidrográfica, estando
envolvidos fatores como grau de urbanização, tipo de solo, área, etc.
A título de curiosidade e ilustração, na Figura 5.1 é apresentado um hidrograma
composto por dados observados (vazões diárias medidas no próprio rio)6
no Rio
Uruguai, na seção localizada em Garruchos, a cerca de 300 km a montante de
Uruguaiana. Esse hidrograma é referente ao período entre julho e setembro de 1965,
com destaque para a cheia que ocorreu entre os dias 16 e 30 de agosto.
Figura 5.1 – Hidrograma na seção transversal do Rio Uruguai localizada em Garruchos,
no período de 27/jul/1965 a 15/set/1965.
O hidrograma no Rio Uruguai apresentado ilustra bem a questão da resposta da
bacia a um evento chuvoso. Observa-se que a vazão no rio oscilava em torno de 1.000
m3
/s até 16 de agosto, quando começa a aumentar relativamente rápido, superando
30.000 m3
/s por volta do dia 24 de agosto. Claramente, essa ascensão do hidrograma foi
devido à ocorrência de uma precipitação intensa na área de contribuição a montante.
Antes da precipitação, praticamente apenas o escoamento subterrâneo estava
contribuindo para a formação daquela vazão no rio, em torno de 1.000 m3
/s.
Então, dada à ocorrência de um evento chuvoso, a resposta da bacia ou o
hidrograma resultante tem tipicamente o aspecto daquele mostrado na Figura 5.2, ao
qual se aproxima bem o hidrograma observado no Rio Uruguai.
6
Também no capítulo sobre Fluxo Fluvial serão descritos os métodos de medição de vazão.
49
Figura 5.2 – Hidrograma típico resultante da ocorrência de uma precipitação na área
contribuinte.
No hidrograma esquemático da Figura 5.2, convém destacar alguns pontos
interessantes:
- em resposta à precipitação ocorrida, apresentada no alto da figura, a vazão no rio
começa a subir a partir do instante correspondente ao ponto A, alcançando o pico (ponto
de máxima vazão) em B e depois decrescendo;
- o trecho de subida do hidrograma, entre os pontos A e B, é a curva de ascensão do
hidrograma, enquanto o trecho B-C é a curva de depleção;
- no hidrograma em questão, parte da vazão é devido ao escoamento superficial nas
vertentes e parte é devido à alimentação do rio pelas águas subterrâneas (escoamento
subterrâneo), sendo cada parcela correspondente indicada na figura – do eixo horizontal
até a curva azul claro corresponde à vazão contribuinte do escoamento subterrâneo; de
tal curva até a curva azul escuro (hidrograma propriamente dito) corresponde à
contribuição do escoamento superficial na bacia;
50
- o ponto C caracteriza o instante de tempo em que não há mais escoamento superficial
devido àquela precipitação contribuindo para essa seção do rio; esse ponto C é
conhecido como ponto de inflexão;
- também é interessante a caracterização do tempo de pico (tpico), ou seja, o tempo
transcorrido desde o centro de massa da precipitação até o hidrograma atingir seu
máximo.
O traçado da curva indicativa da parcela do hidrograma referente à contribuição
do escoamento subterrâneo (curva azul claro) compreende o que se chama de separação
do escoamento superficial. Geralmente são adotados métodos gráficos para o traçado
dessa curva, cuja descrição foge ao propósito deste texto, podendo ser encontrados
alguns exemplos em Tucci (2000).
Convém ressaltar que, desde o início da precipitação (instante de tempo t0),
transcorreu um certo tempo até que essa água precipitada atingisse o curso d’água na
seção em questão, o que só ocorreu no instante de tempo tA, referente ao ponto A, que já
foi indicado como o início da ascensão do hidrograma. Novamente, isso é decorrente de
todos os processos que estão envolvidos de certa forma no caminho desde a ocorrência
da precipitação até a vazão no rio.
Tempo de Concentração
Uma característica importante do hidrograma de uma bacia é o tempo de
concentração (tc), definido como sendo o tempo necessário para que toda a bacia
hidrográfica contribua para o ponto (seção) analisado. Em outras palavras, o tempo de
concentração também pode ser entendido como o tempo necessário para que a água
precipitada no ponto mais distante da bacia se desloque até a seção analisada.
Na prática, há diversas equações empíricas que correlacionam aspectos físicos
da bacia com o tempo de concentração, sendo uma forma usual de estimar esse
parâmetro. A equação de Kirpich e a desenvolvida pelo California Culverts Practice
são dois exemplos:
385
,
0
77
,
0
989
,
3 −
⋅
⋅
= S
L
tC (Kirpich)
385
,
0
155
,
1
57 −
⋅
⋅
= H
L
tC (Califonia Culverts Practice)
51
onde: tC é o tempo de concentração (min); L é o comprimento do rio principal (km); S é
a declividade do rio principal (m/m); H é a diferença de cota entre o exutório da bacia e
o ponto mais a montante (m).
Fatores intervenientes no hidrograma
Como já comentado, o hidrograma constitui a resposta da bacia à ocorrência de
uma determinada precipitação, sendo resultado de todos os processos envolvidos que
acontecem na bacia desde o instante em que a chuva cai até atingir o rio. Então, ao
imaginar esse caminho e os processos envolvidos, percebe-se que há diversos fatores
que influenciam no modo como a bacia vai responder à precipitação, ou seja, em como
é o comportamento da vazão ao longo do tempo – o hidrograma. Os seguintes fatores
podem ser listados como os principais: características fisiográficas da bacia; tipo de
solo; uso e ocupação do solo; intervenções no rio; características da precipitação.
Características fisiográficas da bacia
Aspectos como forma, área, relevo e rede de drenagem têm grande influência na
forma do hidrograma. Por exemplo, uma bacia com formato arredondado tende a
apresentar o pico do hidrograma maior do que o de uma bacia de formato mais
alongado, considerando semelhantes as demais condições. Como o escoamento ocorre
pela ação da gravidade, é intuitiva a percepção de que uma bacia com maiores
declividades do terreno também está sujeita a maiores cheias (hidrogramas mais
acentuados) do que aquelas mais planas.
No mesmo sentido, o fato de apresentar uma rede de drenagem melhor
distribuída espacialmente (mais ramificada e com menor “espaço” entre os cursos
d’água) também facilita o escoamento superficial e aumenta a vazão de pico no exutório
da bacia.
Tipo de solo
Conforme a bacia apresente solos mais ou menos permeáveis, haverá maior ou
menor infiltração, respectivamente, ditando portanto a geração de escoamento
superficial. Solos argilosos, por exemplo, apresentam menor permeabilidade do que
solos arenosos. Também influencia a questão da umidade inicial do solo, ou seja, a
umidade do solo no instante em que ocorre a precipitação. Obviamente, se o solo já está
52
urbanizada
rural
saturado ou com uma certa umidade, decorrente de uma precipitação anterior, ao ocorrer
a nova precipitação sua capacidade de absorver essa água será nula ou bem inferior
àquela se ele estivesse em condições normais, repercutindo na maior geração de
escoamento superficial7
.
Uso e ocupação do solo
Analogamente ao tipo de solo, o tipo de atividade ou de ocupação da bacia
reflete diretamente no escoamento superficial, pois áreas urbanas, florestas e campos
agrícolas, por exemplo, apresentam diferentes comportamentos quanto à capacidade de
infiltração e de armazenamento da água precipitada.
Áreas urbanas apresentam praticamente toda a área coberta por superfícies
impermeáveis, fazendo com que quase todo o total precipitado escoe superficialmente,
ao passo que em áreas rurais uma parcela da precipitação infiltra no solo. Assim, no
primeiro caso, o hidrograma apresenta um pico mais acentuado e que ocorre mais rápido
do que no segundo caso, como ilustra a Figura 5.3.
Figura 5.3 – Comparação esquemática entre os hidrogramas de uma bacia rural e depois
na situação urbanizada (Fonte: adaptado de Tucci, 2000).
Intervenções no rio
Procurando atender suas necessidades, o homem tem alterado substancialmente
os rios e arroios, seja na forma de barramentos como através de desvios, retificação e
canalização do rio. A construção de barragens altera drasticamente a variação natural da
vazão no rio a jusante da obra e, portanto, o hidrograma no trecho em questão é
7
Esse processo será melhor discutido em capítulo específico referente à Infiltração.
53
natural
regularizada
totalmente dependente do modo como é operada a barragem, do quanto de vazão ela
“deixa passar” para jusante – a vazão no rio a jusante de uma barragem é normalmente
referida como vazão regularizada (Figura 5.4).
As intervenções humanas no sentido de retificar e canalizar o curso d’água
também repercutem na forma do hidrograma, já que a canalização geralmente
possibilita um fluxo mais rápido, com maiores velocidades do escoamento.
Figura 5.4 – Comparação esquemática dos hidrogramas em um rio a montante
(hidrograma natural) e a jusante de uma barragem (hidrograma regularizado) (Fonte:
adaptado de Tucci, 2000).
Características da precipitação
Além dos demais fatores mencionados, que são função da própria bacia, as
características da precipitação também influenciam bastante o formato do hidrograma.
Chuvas rápidas mas com maior intensidade tendem a provocar hidrogramas com
maiores picos do que chuvas de menor intensidade e maior duração, cujo hidrograma é
“mais achatado”, ou seja, a vazão é mais uniforme ao longo tempo, relativamente ao
primeiro caso – a Figura 5.5 traz um exemplo.
Mas a distribuição espacial da chuva também repercute significativamente no
aspecto do hidrograma, pois a ocorrência da precipitação em uma área próxima à seção
do rio em análise vai gerar maiores vazões do que se essa mesma precipitação ocorresse
apenas na cabeceira da bacia.
54
P1
P2
P1
P2
evapora
arm. depres.
infiltra
gera
escoam.
superficial
total
total
total
total
precipitado
precipitado
precipitado
precipitado
evapora
arm. depres.
infiltra
gera
escoam.
superficial
total
total
total
total
precipitado
precipitado
precipitado
precipitado
evapora
evapora
arm. depres.
arm. depres.
infiltra
infiltra
gera
escoam.
superficial
gera
escoam.
superficial
total
total
total
total
precipitado
precipitado
precipitado
precipitado
Figura 5.5 – Comparação esquemática entre os hidrogramas resultantes de uma
precipitação mais concentrada no tempo (P1) e uma uniformemente distribuída no
tempo (P2) (Fonte: adaptado de Tucci, 2000).
Precipitação efetiva
Como já comentado, a principal origem do escoamento superficial é a
precipitação. Entretanto, apenas uma parcela da precipitação que atinge o solo gera
escoamento superficial, já que parte evapora, infiltra ou fica armazenada em depressões
do solo (Figura 5.6).
Figura 5.6 – Principais “destinos” do total precipitado que atinge o solo.
À parcela da precipitação que produz escoamento superficial dá-se o nome de
precipitação efetiva. Para sua determinação, os principais métodos são aqueles que
utilizam equações de infiltração, índices e o método SCS.
55
Na tentativa de representar o processo de infiltração da água no solo, foram
desenvolvidas algumas equações, que serão descritas em capítulo posterior deste texto.
Tais equações não são normalmente empregadas para a determinação da precipitação
efetiva por requererem uma caracterização do solo da região, para estimar os parâmetros
da infiltração, o que nem sempre está disponível.
Índices
O uso de índices consiste em um método simplificado de determinar a
precipitação efetiva, através do emprego de um fator constante, chamado índice. Tal
fator pode ser estimado a partir dos dados de vazão ou adotando-se um valor pré-
ajustado com base em eventos anteriores de chuva ou com base no valor estimado para
outras bacias com características semelhantes.
O índice α
α
α
α é um fator constante multiplicativo da precipitação total (P), cujo
resultado é a precipitação efetiva (Pef), sendo seu valor geralmente entre 0,8 e 0,9
(Tucci, 2000):
P
Pef ⋅
= α
Outro índice é o φ
φ
φ
φ, cujo valor também constante deve ser subtraído do total
precipitado para obter a precipitação efetiva:
φ
−
= P
Pef ,
onde φ pode ser determinado dividindo-se a diferença entre o total precipitado e o total
escoado pelo número de intervalos de tempo em que a precipitação foi discretizada:
t
t
t
n
Q
P
∑ ∑
−
=
φ ,
onde Pt e Qt é a precipitação e a vazão no instante de tempo t, e nt é o número de
intervalos de tempo.
Seguindo o mesmo raciocínio, o índice w também constitui um valor constante a
ser descontado da precipitação total para obter a precipitação efetiva:
w
P
Pef −
= ,
sendo que na estimativa de tal índice é considerado explicitamente um termo para
contabilizar as perdas iniciais de precipitação – parâmetro S, cujo valor é adotado –:
56
t
t
t
n
S
Q
P
w
∑ ∑ −
−
=
Método SCS
Esse método foi desenvolvido pelo Soil Conservation Service, do Departamento
de Agricultura dos EUA, em 1957, baseado em estudos que procuraram correlacionar a
precipitação total e a efetiva. Tais estudos indicaram uma relação do tipo:
( ) d
d
P
P n
n
ef −
+
= ,
onde P é a precipitação total, Pef é a precipitação efetiva, n é um coeficiente empírico e
d = P - Pef.
Fazendo algumas suposições e considerações, foi obtida a seguinte expressão
para determinação da precipitação efetiva:
( )
S
P
S
P
Pef
8
,
0
2
,
0
2
+
−
= (se P > 0,2S)
onde S representa a retenção potencial do solo, isto é, a sua capacidade de armazenar
água.
Este método considera que para cada precipitação ocorrem perdas iniciais
(evaporação, infiltração, etc) da ordem de 0,2S e, portanto, caso a precipitação seja
inferior a tais perdas iniciais, não há formação de escoamento superficial, ou seja, a
precipitação efetiva é zero:
0
=
ef
P (se P < 0,2S)
Para estimar o valor de S, estabeleceu-se a relação desse parâmetro com um
outro, o chamado CurveNumber (CN), que não possui significado físico em si mas tem
seu valor diretamente relacionado ao tipo e umidade do solo e à ocupação da bacia. A
relação entre S e CN é:
254
25400
−
=
CN
S
A definição do valor de CN é feita por consulta a valores tabelados, em função
do tipo do solo, da umidade antecedente do solo (condições de umidade do solo
anteriormente à ocorrência da precipitação que está sendo analisada), e do tipo de
atividade/ocupação que é desenvolvida na bacia.
57
Grupo Descrição
Fonte: Porto (1995).
Solos barrentos com teor de argila de 20 a 30%, mas sem
camadas argilosas impermeáveis ou contendo pedras até
profundidades de 1,2m. No caso de terras roxas, esses dois limites
máximos podem ser de 40% e 1,5m. Nota-se a cerca de 60 cm de
profundidade, camada mais densificada que no Grupo B, mas
ainda longe das condições de impermebialidade.
C
Solos argilosos (30 - 40% de argila total) e ainda com camada
densificada a uns 50 cm de profundidade. Ou solos arenosos
como do Grupo B, mas com camada argilosa quase impermeável,
ou horizonte de seixos rolados.
D
Solos arenosos com baixo teor de argila total, inferior a 8%, não
havendo rocha nem camadas argilosas, e nem mesmo
densificadas até a profundidade de 1,5 m. O teor de húmus é
muito baixo, não atingindo 1%.
A
Solos arenosos menos profundos que os do Grupo A e com menor
teor de argila total, porém ainda inferior a 15%. No caso de terras
roxas, esse limite pode subir a 20% graças à maior porosidade. Os
dois teores de húmus podem subir, respectivamente, a 1,2 e 1,5%.
Não pode haver pedras e nem camadas argilosas até 1,5m, mas é,
quase sempre, presente camada mais densificada que a camada
superficial.
B
Condição Descrição
Fonte: Porto (1995).
I
Solo úmido (próximo da saturação): as chuvas, nos últimos
cinco dias, foram superiores a 40 mm, e as condições
meterológicas foram desfavoráveis a altas taxas de evaporação.
III
II
Solos secos: as chuvas, nos últimos cinco dias, não
ultrapassaram 15 mm.
Situação média na época das cheias: as chuvas, nos últimos
cinco dias, totalizaram de 15 a 40 mm.
Inicialmente deve-se escolher o tipo de solo dentre os quatro grupos
especificados na Tabela 5.1. Em seguida, é definida a condição de umidade antecedente
do solo, sendo estabelecidas três condições especificadas na Tabela 5.2. Independente
de qual condição de umidade do solo foi escolhida na tabela anterior, o próximo passo
consiste em escolher o valor do CN para a condição de umidade II, conforme o uso do
solo e o tratamento feito na sua superfície (Tabela 5.3). Por fim, caso a condição de
umidade não seja a II, procede-se à conversão do valor do CN escolhido no passo
anterior, utilizando-se da Tabela 5.4.
Tabela 5.1 – Tipos de solo considerados pelo SCS para escolha do CN.
Tabela 5.2 – Condições de umidade antecedente do solo considerados pelo SCS para
escolha do CN.
58
A B C D
Uso residencial
Tamanho médio do lote % Impermeável
até 500 m
2
65 77 85 90 92
1000 m
2
38 61 75 83 87
1500 m
2
30 57 72 81 86
Estacionamentos pavimentados, telhados 98 98 98 98
Ruas e estradas:
pavimentadas, com guias e drenagens 98 98 98 98
com cascalho 76 85 89 91
de terra 72 82 87 89
Áreas comerciais (85% de impermebialização) 89 92 94 95
Distritos industriais (72% de impermebialização) 81 88 91 93
Espaços abertos, parques, jardins:
boas condições, cobertura de grama > 75% 39 61 74 80
condições médias, cobertura de grama > 50% 49 69 79 84
Terreno preparado para plantio, descoberto
plantio em linha reta 77 86 91 94
Culturas em fileira
linha reta condições ruins 72 81 88 91
condições boas 67 78 85 89
curva de nível condições ruins 70 79 84 88
condições boas 65 75 82 86
Cultura de grãos
linha reta condições ruins 65 76 84 88
condições boas 63 75 83 87
curva de nível condições ruins 63 74 82 85
condições boas 61 73 81 84
Pasto
linha reta condições ruins 68 79 86 89
condições médias 49 69 79 84
condições boas 39 61 74 80
curva de nível condições ruins 47 67 81 88
condições médias 25 59 75 83
condições boas 6 35 70 79
Campos condições boas 30 58 71 78
Florestas condições ruins 45 66 77 83
condições médias 36 60 73 79
condições boas 25 55 70 77
Fonte: Porto (1995).
Uso do solo/Tratamento/Condições hidrológicas
Grupo hidrológico de solos
Tabela 5.3 – Valores de CN em função da cobertura do solo e do tipo hidrológico de
solo, para a condição de umidade II.
59
Fonte: Porto (1995).
15 30 50
23 40 60
19 35 55
31 50 70
27 45 65
40 60 79
35 55 75
51 70 87
45 65 83
63 80 94
57 75 91
78 90 98
70 85 97
100 100 100
87 95 99
Condições de umidade
I II III
Tabela 5.4 – Conversão dos valores de CN conforme as condições de umidade
antecedente do solo.
Transformação da precipitação em vazão
Com já foi comentado em capítulos anteriores, o papel hidrológico da bacia
hidrográfica é o de transformar uma entrada de volume de água concentrada no tempo –
a precipitação – em uma saída de água mais distribuída no tempo – a vazão –. Isso é o
que se chama de transformação chuva-vazão.
Um dos principais interesses da hidrologia consiste justamente em estimar a
transformação chuva-vazão, ou seja, tentar estimar qual a resposta da bacia hidrográfica
dada a ocorrência de uma determinada precipitação. Isso tem grandes aplicações como,
por exemplo, estimar os impactos sobre a vazão em um rio e sobre o meio ambiente
decorrentes de mudanças na ocupação do solo, como a impermeabilização de áreas pela
urbanização ou o desmatamento. Outro exemplo é a previsão e controle de enchentes.
Há duas formas mais usadas para realizar a transformação chuva-vazão: (i)
métodos simplificados que procuram estimar características do hidrograma; (ii)
modelagem do processo “chuva-vazão”.
No primeiro caso, são empregadas equações empíricas que estimam parâmetros
como a vazão e o tempo de pico do hidrograma, por exemplo, sendo mais comuns os
métodos racional e do hidrograma unitário. Utilizando modelos hidrológicos (modelos
chuva-vazão), no outro caso, procura-se reproduzir os processos físicos envolvidos na
60
transformação chuva-vazão, sendo necessária uma grande quantidade de informações,
como dados históricos observados chuva e vazão, caracterização espacial do tipo e uso
do solo, parâmetros específicos para diversas equações, informações de relevo, rede de
drenagem, etc, além de um alto custo de recursos e de tempo.
Em função de fatores como objetivo do estudo, características da bacia (área,
tempo de concentração, homogeneidade, rede de drenagem), escala de trabalho,
disponibilidade e qualidade de informações, tempo e recursos disponíveis, deve-se optar
entre as duas metodologias citadas para estimar a transformação chuva-vazão.
Em projetos de drenagem urbana, geralmente são empregados métodos
simplificados, como o racional e do hidrograma unitário, os quais são descritos a seguir.
Método racional
Esse método consiste apenas em estimar a vazão de pico do hidrograma para
uma determinada bacia, considerando que a vazão é diretamente proporcional à área da
bacia e à intensidade da chuva. Essa consideração assume que a precipitação ocorre
uniformemente em toda a área da bacia, e também que a intensidade é constante ao
longo da duração da precipitação – em outras palavras, distribuição espacial e temporal
uniformes da precipitação.
A expressão do método racional, adotando unidades usuais para a área da bacia e
a intensidade da chuva, é:
A
i
C
Qp ⋅
⋅
⋅
= 275
,
0 ,
onde Qp é a vazão de pico do hidrograma; i é a intensidade da chuva (mm/h); A é a área
da bacia (km2
); C é o coeficiente de escoamento superficial (adimensional); e o valor
0,275 é usado para conversão de unidades.
O valor do coeficiente C é escolhido conforme o tipo de ocupação do solo,
denotando uma maior ou menor tendência à geração de escoamento superficial (Tabela
5.5). Caso a ocupação da bacia seja relativamente diversificada, podendo-se identificar
sub-áreas homogêneas, correspondendo a diferentes valores do coeficiente de
escoamento superficial, o valor a adotar pode ser determinado pela média ponderada
daqueles referentes a cada sub-área:
∑
=
⋅
=
n
j
j
j
m A
C
A
C
1
)
(
1
,
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Apostila hidrologia aplicada_uergs

  • 1. HIDROLOGIA APLICADA TEXTO BÁSICO Disciplina Ministrada na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, para o curso de graduação em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia na unidade de Caxias do Sul. Adriano Rolim da Paz Adriano Rolim da Paz Adriano Rolim da Paz Adriano Rolim da Paz adrianorpaz@yahoo.com.br Setembro/2004
  • 2. 2 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo 1 1 1 1 Introdução à hidrologia Introdução à hidrologia Introdução à hidrologia Introdução à hidrologia Aspectos gerais A Hidrologia pode ser entendida como a ciência que estuda a água, como a própria origem da palavra indica (do grego): hidrologia = hydor (“água”) + logos (“ciência” ou “estudo”). Entretanto, uma boa definição adotada por vários autores é a seguinte: “Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circulação e distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua reação com o meio ambiente, incluindo sua relação com as formas vivas” (Definição do U.S. Federal Council of Service and Technology, citada por Chow, 1959, apud Tucci, 2000). Como se pode perceber pela definição acima, a hidrologia é uma ciência consideravelmente ampla, cujo escopo de trabalho abrange diversas sub-áreas mais específicas, como por exemplo: - Hidrometeorologia: trata da água na atmosfera; - Limnologia: estuda os lagos e reservatórios; - Potamologia: estuda os rios; - Oceanografia: estuda os oceanos; - Hidrogeologia: estudas as águas subterrâneas; - Glaciologia: trata da ocorrência de neve/gelo na natureza.
  • 3. 3 Entretanto, cabe salientar que a maioria dos estudos envolve mais de uma das sub-áreas, já que os fenômenos e processos envolvendo a água na natureza (ocorrência, distribuição, propriedades físico-químicas, etc.) estão interrelacionados de tal forma que a explicação e o entendimento dos mesmos só são alcançados mediante a reunião dos conhecimentos das diversas sub-áreas. Por exemplo, como estudar os processos de deposição de nutrientes e sedimentos em um reservatório (limnologia) sem a caracterização do aporte dessas substâncias oriundo do curso d’água (rio) barrado para formar o reservatório (potamologia)? Tornando a análise um pouco mais geral, face ao caráter de escassez atribuído à água atualmente, sendo reconhecida a importância em preservar e usar racionalmente esse recurso, uma vasta gama de profissionais tem se dedicado a estudar a hidrologia, entre eles os engenheiros, economistas, estatísticos, químicos, biólogos, químicos, matemáticos, geólogos, agrônomos, geógrafos, etc. Os problemas relacionados à água geralmente requerem um enfoque multidisciplinar, segundo o qual diversos especialistas contribuem em suas áreas para entender a situação e alcançar a melhor alternativa, sob determinados critérios. Um exemplo disso é um projeto que vise o barramento de um rio para formação de um reservatório, com o objetivo de captar água para abastecimento humano e irrigação. Simplificadamente, poder-se-ia dizer que o hidrólogo seria responsável pela caracterização da área contribuinte ao reservatório, estimando a vazão afluente e dimensionando a barragem; ao especialista em hidráulica caberia projetar o sistema de captação, bombeamento e distribuição da água; o biólogo analisaria o impacto do barramento do rio sobre o ecossistema, em particular sobre a biota aquática, bem como no levantamento das espécies que habitam a região a ser alagada; o sociólogo (e psicólogo) estaria envolvido com a remoção da população residente na área alagada pela barragem, a qual seria realocada; a vegetação que ficaria submersa com o enchimento do lago iria se degradar, merecendo o devido monitoramento da qualidade da água, que poderia ser realizado por um especialista na área de saneamento/química; o agrônomo iria definir as condições de irrigação das culturas agrícolas atendidas, e assim por diante.
  • 4. 4 Por outro lado, também cabe salientar que, a despeito dos vários profissionais envolvidos na problemática da água, os estudos hidrológicos, propriamente ditos, geralmente envolvem técnicas originárias ou desenvolvidas a partir de conceitos de outras áreas, mas que o profissional que lida com a hidrologia deve estar familiarizado e ser capaz de aplica-las e entender seus resultados. Entre tais técnicas pode-se citar: teoria estocástica, séries temporais, análise multicritério, teoria das decisões, análise econômica, programação dinâmica, inteligência artificial, otimização, interpretação de imagens de satélite, etc. Breve histórico da hidrologia A importância da água na história da humanidade é identificada quando se observa que os povos e civilizações se desenvolveram às margens de corpos d’água, como rios e lagos. A seguir serão listados alguns fatos marcantes da história da hidrologia, de maneira superficial, sendo maiores detalhes encontrados na bibliografia pesquisada, citada ao final deste documento. • Diversos autores citam registros de que no Egito Antigo, na época dos faraós, existiram obras de irrigação e drenagem. Também na Mesopotâmia, na região conhecida como Crescente Fértil, entre os rios Tigre e Eufrates, a água já era usada para irrigação. • Os filósofos gregos são considerados os primeiros a estudar a hidrologia como ciência. Por exemplo, Anaxágoras, que viveu entre 500 e 428 a. C, tinha conhecimento de que as chuvas eram importantes na manutenção do equilíbrio hídrico na Terra. • Mas apenas na época de Leonardo da Vinci é que o ciclo hidrológico veio a ser melhor compreendido. Um fato relevante foi o realizado por Perrault, no século 17, que analisou a relação precipitação-vazão, comparando a precipitação com dados de vazão. • No século 19 dá-se o início de medições sistemáticas de vazão e precipitação; • Até a década de 30, prevalece o empirismo, procurando descrever os fenômenos naturais, enquanto até a década de 50 é predominante o uso de indicadores estatísticos dos processos envolvidos;
  • 5. 5 • Com o advento do computador em conjunto com o aprimoramento de técnicas estatísticas e numéricas, deu-se um grande avanço na hidrologia. Foram desenvolvidos modelos precipitação-vazão e avanços na hidrologia estocástica. O escoamento subterrâneo, a limnologia e a modelação matemática de processos constituem outros desenvolvimentos importantes. A modelagem ajuda a entender e explicar padrões de ocorrência e possibilita simular cenários futuros, fornecendo subsídios importantes para responder a perguntas do tipo “o que aconteceria se...?”. Um exemplo de modelagem de processos é a simulação da circulação da água e do transporte de poluentes em um lago ou rio. Com um modelo computacional, é possível inferir sobre o que aconteceria se ocorresse um vazamento de óleo próximo a um lago, em termos de áreas atingidas, tempo de deslocamento da mancha de óleo, etc. Isso tudo sem o processo estar ocorrendo, apenas hipoteticamente, o que permite prever impactos e traçar alternativas de combate previamente. Ocorrência de água na Terra Considera-se, atualmente, que a quantidade total de água na Terra, estimada em cerca de 1.386 milhões de km3 , tem permanecido de modo aproximadamente constante durante os últimos 500 milhões de anos. Entretanto, as quantidades de água estocadas na Terra sob as diferentes formas (ou nos diferentes “reservatórios”) variaram substancialmente nesse período. Na Figura 1.1 é apresentada a distribuição da água na Terra, conforme Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001). Verifica-se que cerca de 97,5% do volume total de água na Terra estão nos oceanos (água salgada), sendo apenas 2,5% do total constituído por água doce. Por sua vez, a água doce é encontrada principalmente sob a forma de geleiras, que representam 68,7% do total de água doce. Considerando que as águas doces contidas em rios e lagos constituem as formas mais acessíveis ao uso humano e de ecossistemas, tem-se um percentual muito pequeno de água disponível – em torno de 0,27% da água doce o que corresponde a 0,007% do volume total de água.
  • 6. 6 Assim, embora a Terra apresente 1.386 milhões de km3 de água, considera-se que o que está disponível ao uso humano é apenas 0,007% dessa quantidade. Reservatório Volume (x 10 3 km 3 ) % do volume total % do volume de água doce Oceanos 1.338.000,0 96,5379 - Subsolo: 23.400,0 1,6883 - Água doce 10.530,0 0,7597 30,0607 Água salgada 12.870,0 0,9286 - Umidade do solo 16,5 0,0012 0,0471 Áreas congeladas 24.064,0 1,7362 68,6971 Antártida 21.600,0 1,5585 61,6629 Groenlândia 2.340,0 0,1688 6,6802 Ártico 83,5 0,0060 0,2384 Montanhas 40,6 0,0029 0,1159 Solos congelados 300,0 0,0216 0,8564 Lagos 176,4 0,0127 - Água doce 91,0 0,0066 0,2598 Água salgada 85,4 0,0062 - Pântanos 11,5 0,0008 0,0328 Rios 2,1 0,0002 0,0061 Biomassa 1,1 0,0001 0,0032 Vapor d'água na atmosfera 12,9 0,0009 0,0368 Armazenamento total de água salgada 1.350.955,4 97,4726 - Armazenamento total de água doce 35.029,1 2,5274 100,0 Armazenamento total de água 1.385.984,5 100,0 - Figura 1.1 – Distribuição da água na Terra (adaptado de Shiklomanov, 1997, apud Setti et al. 2001). 2,5% 97,5% Água doce Água salgada 30% 69% 1% outros água doce no subsolo água congelada
  • 7. 7 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo 2 2 2 2 Ciclo hidrológico Ciclo hidrológico Ciclo hidrológico Ciclo hidrológico Descrição geral Embora tenham sido estimados os volumes em cada um dos “reservatórios” na Terra (ver Figura 1.1), é importante lembrar que a água está em constante movimento, constituindo o que se denomina de ciclo hidrológico. Esse ciclo tem o Sol como principal fonte de energia, através de sua radiação, e o campo gravitacional terrestre como a principal força atuante. A Figura 2.1 apresenta um esquema do ciclo hidrológico, identificando as diversas etapas que o compõem.
  • 8. 8 Figura 2.1 – Ciclo hidrológico (fonte: adaptado de EPA, 1998). De maneira simplificada, o ciclo hidrológico pode ser descrito da seguinte forma: - ocorre evaporação da água dos oceanos e formação do vapor de água; - sob determinadas condições, o vapor precipita na forma de chuva, neve, granizo, etc (precipitação); - parte da precipitação não chega nem a atingir a superfície terrestre, sendo evaporada; - boa parte da precipitação atinge diretamente a superfície de lagos e oceanos, daí evaporando parcela; - da precipitação que atinge a superfície terrestre, uma parte é interceptada pela cobertura vegetal (interceptação), de onde parte evapora e parte acaba escorrendo até o solo; - da precipitação que chega ao solo, parcela infiltra sub-superficialmente (infiltração), e desta uma parte escoa até corpos d’água próximos, como rios e lagos (escoamento sub-superficial); - uma parte infiltrada percola atingindo os aqüíferos (percolação), que escoam lentamente até rios e lagos (escoamento subterrâneo); - ainda quanto à parte da precipitação que atinge o solo, esta vai escoar superficialmente (escoamento superficial), sendo retida em depressões do solo, sofrendo infiltração, evaporação ou sendo absorvida pela vegetação. O “restante” do escoamento superficial segue para rios, lagos e oceanos, governada pela gravidade; - a vegetação, que retém água das depressões do solo e infiltrações, elimina vapor d’água para a atmosfera (transpiração), através do processo de fotossíntese; - a água que alcança os rios, seja por escoamento superficial, sub-superficial ou subterrâneo, ou mesmo precipitação direta, segue para lagos e oceanos, governada pela gravidade. Cabe ressaltar que o ciclo hidrológico não apresenta um “começo” nem um “fim”, já que a água está em movimento contínuo, sendo o início da descrição do ciclo realizado a partir da evaporação dos oceanos apenas por questões didáticas.
  • 9. 9 Outro fato a ser ressaltado é que a evaporação está presente em quase todas as etapas do ciclo. Um termo normalmente usado para denotar a evaporação associada à transpiração da vegetação é a evapotranspiração. Apesar de haver algumas divergências quantos aos valores estimados de autor para autor, convém comentar que cerca de 383.000 km3 de água evaporam por ano dos oceanos (Wundt, 1953, apud Esteves, 1988). Isso equivaleria à retirada de uma camada de 106 cm de espessura dos oceanos por ano. Desse total evaporado, estima-se que 75% retornem diretamente aos oceanos sob a forma de precipitação, enquanto os 25% restantes precipitam sobre os continentes. Uma curiosidade evidenciada por Esteves (1988) é que a composição química da precipitação oceânica difere nitidamente da continental, particularmente no que diz respeito à concentração de íons como Na+ , Mg2+ e Cl- , maior na precipitação oceânica. O ciclo hidrológico, como já colocado anteriormente, promove a movimentação de enormes quantidades de água ao redor do planeta. Entretanto, algumas das fases do ciclo são consideradas rápidas e outras muito lentas, se comparadas entre si. A Tabela 2.1 ilustra esse comentário, ao apresentar alguns períodos médios de renovação da água nos diferentes “reservatórios”. Tais valores dizem respeito ao tempo necessário para que toda a água contida em cada um dos reservatórios seja renovada – dentro de uma visão bastante simplificada, é claro, da “entrada”, “circulação” e “saída” de água neles. Tabela 2.1 – Período de renovação da água em diferentes reservatórios na Terra. Fonte: Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001). Reservatórios Período médio de renovação Oceanos 2.500 anos Águas subterrâneas 1.400 anos Umidade do solo 1 ano Áreas permanentemente congeladas 9.700 anos Geleiras em montanhas 1.600 anos Solos congelados 10.000 anos Lagos 17 anos Pântanos 5 anos Rios 16 dias Biomassa algumas horas Vapor d'água na atmosfera 8 dias
  • 10. 10 A princípio, as etapas de precipitação e evaporação são consideradas as mais importantes dentro do ciclo hidrológico, pensando em termos de volume de água movimentado. Entretanto, à medida que se diminui a escala de análise, as demais fases do ciclo se tornam muito importantes. Por exemplo, analisando uma determinada área de dezenas de hectares, a interceptação, infiltração, percolação e escoamento superficial são bastante relevantes para entendimento dos processos hidrológicos. Impactos sobre o ciclo hidrológico Observando a descrição do ciclo hidrológico, é fácil perceber o quanto ele é condicionado pelas características locais, como clima, relevo, tipo de solo, uso e ocupação do solo, geologia, tipo de cobertura vegetal, rede hidrográfica (rios), etc. Por exemplo, a interceptação que ocorre em uma área com mata nativa é muito superior à de áreas agrícolas, como o cultivo de fumo e arroz. Em áreas com solo tipo argiloso, pouco permeável, a infiltração se dá em menor quantidade do que em áreas com solo arenoso, mais permeável, enquanto que em áreas pavimentadas essa fase já não ocorre praticamente. Como o escoamento se processa movido pela ação da gravidade, em terrenos mais íngremes a tendência é ocorrer menor retenção da água em depressões do solo, com escoamentos mais rápidos do que em terrenos mais planos, onde há maior propensão ao acúmulo de água, facilitando a infiltração. O homem vem modificando o meio em que vive, de modo à “adequá-lo” às suas necessidades, o que repercute em sensíveis alterações do ciclo hidrológico. Por exemplo, pode-se citar o barramento de rios, que modifica o regime de escoamento, aumenta a evaporação e eleva o nível das águas subterrâneas (lençol freático), além de outras conseqüências sobre a biota aquática. Outro exemplo é a impermeabilização do solo devido à urbanização, o que diminui a parcela infiltrada e aumenta o escoamento superficial, causando alagamentos. O desmatamento é outro exemplo, na medida em que diminui a interceptação, deixando os solos expostos à ação das gotas de chuva e do escoamento superficial, que erodem o solo e carreiam nutrientes e sedimentos para rios e lagos. Para ilustrar o efeito da substituição da cobertura natural do solo pela urbanização sobre o ciclo hidrológico, tem-se a Figura 2.2. Observa-se que, após uma impermeabilização entre 30% e 50% da superfície, o escoamento superficial passa a
  • 11. 11 corresponder a 55% do total precipitado, enquanto esse percentual era equivalente a apenas 10% da precipitação para a situação de cobertura natural do solo. Figura 2.2 – Ilustração do efeito da urbanização sobre o ciclo hidrológico (os percentuais se referem à parcela da precipitação que “segue” cada uma das fases do ciclo). Fonte: adaptado de EPA (1998). Além de alterar as fases do ciclo hidrológico, as atividades antrópicas1 têm uma série de repercussões sobre o meio ambiente, tais como: contaminação de corpos d’água, devido ao lançamento de efluentes de origem industrial, agrícola ou doméstico (esgoto das cidades); introdução de espécies exóticas (espécies que não eram encontradas na região na região e foram introduzidas pelo homem); ocupação de planícies de inundação; mudanças globais no clima; desmatamento; contaminação do ar, ocasionando chuvas ácidas, etc (Tabela 2.2). 1 atividade antrópica = aquela relativa à ação humana.
  • 12. 12 Tabela 2.2 – Atividade humana e seus impactos sobre a disponibilidade hídrica. (Fonte: adaptado de Tundisi, 2000). Atividade humana Impacto nos ecossistemas aquáticos Valores/serviços em risco Construção de represas Alteração do fluxo dos rios, transporte de nutrientes e sedimentos, intereferência na migração e reprodução de peixes Habitats, pesca comercial e esportiva, deltas e suas economias Construção de diques e canais Destruição da conexão do rio com as áreas inundáveis Fertilidade natural das várzeas e controles das enchentes Alteração do canal natural dos rios Danos ecológicos dos rios. Modificação dos fluxos dos rios Habitats, pesca comercial e esportiva. Produção de hidroeletricidade e transporte. Drenagem de áreas alagadas Eliminação de um componente fundamental dos ecossistemas aquáticos Biodiversidade. Funções naturais de filtragem e reciclagem de nutrientes. Habitats para peixes e aves aquáticas. Desmatamento/uso do solo Mudança de padrões de drenagem, inibição da recarga natural dos aquíferos, aumento da sedimentação Qualidade e quantidade da água, pesca comercial, biodiversidade e controle de enchentes. Poluição não controlada Prejuízo da qualidade da água Suprimento de água. Custos de tratamento. Pesca comercial. Biodiversidade. Saúde humana. Remoção excessiva de biomassa Diminuição dos recursos vivos e da biodiversidade Pesca comercial e esportiva. Ciclos naturais dos organismos. Introdução de espécies exóticas Supressão das espécies nativas. Alteração dos ciclos de nutrientes e ciclos biológicos Habitats, pesca comercial. Biodiversidade natural e estoques genéticos. Poluentes do ar (chuva ácida) Perturbação da composição química de rios e lagos Pesca comercial. Biota aquática. Recreação. Saúde humana. Agricultura Mudanças globais no clima Alteração drástica do volume dos recursos hídricos, dos padrões de distribuição da precipitação e evaporação, riscos de enchente Suprimento de água, transporte, produção de energia elétrica, produção agrícola, pesca. Crescimento da população e padrões gerais do consumo humano Aumento na pressão para construção de hidroelétricas, da poluição da água, da acidificação de lagos e rios. Modificação do ciclo hidrológico. Praticamente todas as atividades econômicas que dependem dos serviços dos ecossistemas aquáticos. Usos da água Os setores usuários das águas são diversos, utilizando-as para diferentes fins. Dependendo do uso, há a necessidade de derivação da água e ocorre um consumo (uso consuntivo), retornando determinada parcela da água aos corpos d’águas. Outros usos,
  • 13. 13 como a navegação, por exemplo, são considerados não consuntivos, pois não alteram a quantidade deste recurso na natureza. Na Tabela 2.3 são listados os principais usos da água, explicitando algumas características: existência ou não de derivação de águas do seu curso natural; a finalidade e os tipos de uso; as perdas por uso consuntivo da água; os requisitos de qualidade exigidos para cada uso e; os efeitos da utilização, especialmente de qualidade. Tabela 2.3 – Usos da água (Fonte: adaptado de Barth, 1987, apud Setti et al., 2001). Forma Finalidade Tipo de uso Uso consuntivo Requisitos de qualidade Efeitos nas águas abastecimento urbano abastecimento doméstico, industrial, comercial e público baixo, de 10%, sem contar as perdas nas redes altos ou médios, influindo no custo do tratamento Poluição orgânica e bacteriológica abastecimento industrial sanitário, de processo, incorporação ao produto, refrigeração e geração de vapor médio, de 20%, variando com o tipo de uso e de indústria médios, variando com o tipo de uso Poluição orgânica, substâncias tóxicas, elevação de temperatura irrigação irrigação artificial de culturas agrícolas segundo diversos métodos alto, de 90% Médios, dependendo do tipo de cultura Carreamento de agrotóxicos e fertilizantes abastecimento doméstico ou para dessedentação de animais baixo, de 10% Médios Alterações na qualidade com efeitos difusos Com derivação de águas aqüicultura estações de piscicultura e outras baixo, de 10% Altos Carreamento de matéria orgânica geração hidroelétrica acionamento de turbinas hidráulicas perdas por evaporação do reservatório baixos alterações no regime e na qualidade da água navegação fluvial manutenção de calados mínimos e eclusas não há baixos lançamento de óleo e combustíveis recreação, lazer e harmonia paisagística natação e outros esportes com contato direto, como iatismo e motonáutica lazer contemplativo altos, especialmente recreação de contato primário não há pesca com comerciais de espécies naturais ou introduzidas através de estações de piscicultura não há altos, nos corpos d'água, correntes, lagos, ou reservatórios artificiais alterações na qualidade após mortandade de peixes assimilação de esgotos diluição, autodepuração e transporte de esgotos urbanos e industriais não há não há poluição orgânica, física, química e bacteriológica sem derivação das águas usos de preservação vazões para assegurar o equilíbrio ecológico não há médios melhoria da qualidade da água
  • 14. 14 Escassez da água Há algum tempo atrás, predominava a idéia da abundância da água na natureza, o que não gerava preocupação quanto à quantidade de água consumida ou desperdiçada por determinado uso. Entretanto, atualmente tem-se tentado tornar cada vez mais consensual a noção de escassez de água, pelo menos em termos relativos, em virtude da crescente demanda por esse valioso recurso. São diferenciados dois tipos de escassez: (a) escassez quantitativa e (b) escassez qualitativa. A escassez quantitativa decorre da falta de água em quantidade suficiente para atender àqueles usos pretendidos, sendo comum a ocorrência no Nordeste brasileiro (região semi-árida, principalmente). Cabe salientar aqui a irregular distribuição temporal (precipitações concentradas em poucos meses do ano) e espacial (abundância de água na Amazônia e escassez no semi-árido nordestino). A escassez qualitativa é resultante da falta de qualidade suficiente da água para atender os usos pretendidos, ocasionada principalmente pelo lançamento de esgotos das várias origens. Assim, por ser um recurso escasso, a água é considerada dotada de valor econômico, como dispõe a Lei 9.433 de 19972 , a chamada Lei das Águas. Por isso, além da gestão da oferta de água (busca de novos mananciais de abastecimento ou aumento da exploração dos existentes), praticada há mais tempo, tem-se ressaltado a necessidade da gestão da demanda pela água. Isso visa proporcionar um uso racional desse recurso e, para tanto, diversos instrumentos estão previstos na referida lei, entre eles alguns instrumentos econômicos, como a outorga e a cobrança pela água. A outorga se refere basicamente à concessão do direito de utilização da água, seja para captá-la, para usá-la como diluição de esgotos (efluentes) ou para geração de energia elétrica, a ser emitida pelo órgão responsável. A cobrança diz respeito ao pagamento de um valor pela retirada da água do corpo d’água ou pelo lançamento de efluentes no mesmo. 2 Lei Federal n. 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Recursos Hídricos e dá outras providências.
  • 15. 15 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo 3 3 3 3 Bacia Hidrográfica Bacia Hidrográfica Bacia Hidrográfica Bacia Hidrográfica Conceito de bacia hidrográfica A expressão bacia hidrográfica é usada para denotar a área de captação natural da água de precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, que é chamado de exutório. A bacia é constituída por um conjunto de superfícies vertentes – terreno sobre o qual escoa a água precipitada – e de uma rede de drenagem formada por cursos d’água que confluem até resultar um leito único no exutório. Figura 3.1 – Superfícies vertentes e rede de drenagem que compõem uma bacia hidrográfica. Fonte: adaptado de EPA (1998) Fonte: adaptado de EPA (1998) Superficies vertentes Superficies vertentes Rede de drenagem Rede de drenagem Superfícies Vertentes Rede de drenagem
  • 16. 16 Relembrando os processos envolvidos no ciclo hidrológico (Capítulo 2), a bacia hidrográfica pode ser considerada como um sistema físico, cuja entrada é o volume de água precipitado e cuja saída é o volume de água escoado pelo exutório. Entretanto, esse é um sistema aberto, já que nem toda a precipitação (entrada de água) se torna escoamento no exutório (saída) ou fica armazenada na própria bacia. Há perdas intermediárias, relativas aos volumes evaporados, transpirados (pela vegetação) ou infiltrados profundamente (Figura 3.2). Tais volumes de água representam parcela da entrada no sistema que é “perdida” para a atmosfera ou para camadas profundas do subsolo. Figura 3.2 – Representação da bacia hidrográfica como um sistema aberto. Mesmo com esse aspecto de sistema aberto, o estudo hidrológico se dá a nível de bacia hidrográfica, cujo papel hidrológico é entendido como sendo o de transformar uma entrada de volume de água concentrada no tempo (que é a precipitação) em uma saída de água de forma mais distribuída no tempo (escoamento pelo exutório). Nesse meio termo, ou seja, entre a ocorrência da precipitação e a vazão de saída da bacia, decorrem todos os processos descritos no Capítulo 2, compondo o Ciclo Hidrológico. Há interceptação pela vegetação, erosão do solo, evaporação, transpiração, armazenamento da água em depressões do solo, infiltração sub-superficial e profunda, etc. Ocorrem também os diversos usos da água pela população residente na bacia, como captação de água para abastecimento doméstico, uso para lazer, banho, lançamento de esgotos e efluentes industriais, entre outros. Entretanto, como acontece cada processo do ciclo ou cada uso da água e em que intensidade vai variar conforme as características da Precipitação Vazão evaporação transpiração percolação profunda limite da bacia hidrográfica rede de drenagem
  • 17. 17 bacia, como relevo, topografia, cobertura vegetal, tipo de solo, geologia, presença de áreas urbanas, atividades agropecuárias ou industriais, etc. Na Figura 3.3 são apresentados dois gráficos, denominados de hietograma e hidrograma. O primeiro se refere à representação da precipitação ocorrida ao longo do tempo, enquanto o hidrograma retrata o comportamento da vazão ao longo do tempo. Tais gráficos são apenas exemplos típicos e serão discutidos em mais detalhes no Capítulo referente ao Escoamento Superficial, mas permitem visualizar o papel hidrológico da bacia, transformando a entrada de água concentrada no tempo em uma saída mais distribuída. Figura 3.3 – Exemplo de gráficos da precipitação ao longo do tempo (hietograma) e da vazão (hidrograma), ilustrando o papel hidrológico de uma bacia hidrográfica. Simplificadamente, pode-se descrever o processo de transformação da precipitação em vazão do seguinte modo: a precipitação que cai sobre as vertentes (superfícies que contribuem para os cursos d’água da rede de drenagem) infiltra-se totalmente no solo até saturá-lo. Nesse instante, decresce a taxa de infiltração, que passa a ser inferior à precipitação e aumenta o escoamento superficial (Figura 3.4), que segue até a rede de drenagem e daí até o exutório da bacia. Esse processo de formação do escoamento superficial é geralmente caracterizado como uma “produção de água” pelas vertentes. tempo precipitacao tempo precipitacao tempo vazao tempo vazao ( ( ( (Hietograma Hietograma Hietograma Hietograma) ) ) ) ( ( ( (Hidrograma Hidrograma Hidrograma Hidrograma) ) ) )
  • 18. 18 À medida que se processa o escoamento superficial nas vertentes, ocorre também o transporte de partículas do solo (sedimentos), devido à força erosiva das gotas da chuva e à própria ação do escoamento. Isso é referido como “produção de sedimentos” pelas vertentes, de forma análoga à produção de água, e será melhor discutido no Capítulo referente ao Transporte de Sedimentos. Importante ressaltar que as superfícies vertentes e a rede de drenagem são indissociáveis, visto que estão em constante interação. Durante a precipitação, as vertentes contribuem para os arroios e rios com água e sedimentos carreados. Entretanto, quando ocorre cheia no rio, este extravasa da sua calha principal, alcançando a planície de inundação, ocorrendo fluxo inverso de água e sedimentos (agora no sentido calha do rio para planície de inundação). Figura 3.4 – “Produção” de escoamento superficial nas superfícies vertentes de uma bacia hidrográfica. Delimitação da bacia hidrográfica Como já mencionado, a bacia hidrográfica é vista como o conjunto de áreas que contribuem para um determinado ponto. Entretanto, como definir tal área de contribuição, também conhecida como área de drenagem? Normalmente, os limites da bacia são estabelecidos analisando a topografia do terreno (relevo), através das curvas de nível (linhas indicativas da altitude do terreno – cotas – em relação a um referencial, como o nível do mar). Seja utilizando mapas impressos ou arquivos eletrônicos, a bacia hidrográfica é delimitada identificando as áreas de maior cota, que constituem os
  • 19. 19 chamados divisores topográficos da bacia. Como o escoamento se dá pela ação da gravidade, e a bacia é definida como o conjunto de áreas que contribuem para um ponto, é fácil perceber que as regiões de terreno mais elevado estabelecem uma divisão entre a parte do terreno cujo escoamento segue até o rio em questão e a parte cujo escoamento segue para outro rio de outra bacia. Também é importante ter em mente o conceito de “bacias dentro de bacias”, o qual é ilustrado pela Figura 3.5. Tendo o ponto A como base, a área contribuinte, ou seja, sua bacia hidrográfica é a indicada em tal figura. Entretanto, essa bacia está inserida na bacia do ponto B que, por sua vez, está contida na bacia do ponto C. Assim, conforme a escala em que se trabalhe e, principalmente, o interesse do estudo a ser realizado, serão tomadas as bacias “maiores” ou as sub-bacias e micro-bacias. Figura 3.5 – Delimitação da área contribuinte conforme o ponto considerado (A, B ou C, cuja localização é indicada pelas setas). Voltando à questão da delimitação de uma bacia, a rigor existem três tipos de divisores de bacias: divisor topográfico, baseado no relevo; divisor geológico, em função das características geológicas; e divisor freático, estabelecido de acordo com a posição do lençol freático (nível das águas subterrâneas no subsolo) (Figura 3.6). Mas, devido à falta de informações e à não praticidade no estabelecimento dos divisores geológicos e freáticos, geralmente são empregados apenas os divisores topográficas para identificar e delimitar uma bacia. A B C
  • 20. 20 Fonte: Villela (1975) Fonte: Villela (1975) Figura 3.6 – Indicação dos divisores topográficos e freáticos de uma bacia hidrográfica (Fonte: Villela, 1975). Bacia hidrográfica x gestão dos recursos hídricos Com base nas definições de bacia hidrográfica, percebe-se porque se adota a bacia hidrográfica como unidade para a gestão dos recursos hídricos. Como a bacia define todas as áreas contribuintes para um ponto, isso significa que os impactos, ações, intervenções, projetos em um ponto da bacia poderão repercutir em toda a área a jusante da área afetada inicialmente. Por exemplo, o lançamento de efluentes de uma indústria em um determinado ponto de um arroio irá influir na qualidade da água em todo o restante do arroio a jusante, bem como nos demais cursos d’água para o qual tal arroio conflui. Outro exemplo diz respeito ao desmatamento de uma parte da área da bacia, cujo efeito (maior geração de escoamento superficial) será sentido nos trechos a jusante da bacia. Assim, os problemas relativos à água são comumente tratados pensando na bacia hidrográfica onde estão inseridos, cuja delimitação prevalece sobre os limites municipais e estaduais, por exemplo. Por isso, a Lei 9.433 (1997) estabelece como um dos princípios a definição da bacia hidrográfica como unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos.
  • 21. 21 O território brasileiro foi dividido inicialmente em 8 regiões hidrográficas (R. H.), mas atualmente, segundo a Resolução 32 do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) de 15 de outubro de 2003, são estabelecidas 12 regiões hidrográficas (Figura 3.6): R. H. do Amazonas; R. H. do Tocantins; R. H. do Paraguai; R. H. do Paraná; R. H. do Atlântico Nordeste Ocidental; R. H. do Atlântico Nordeste Oriental; R. H. do Parnaíba; R. H. do São Francisco; R. H. do Atlântico Leste; R. H. do Atlântico Sudeste; R. H. do Atlântico Sul; R. H. do Uruguai. Figura 3.7 – Divisão hidrográfica nacional (Fonte: adaptado de ANA, 2004). O Estado do Rio Grande do Sul, portanto, está inserido nas Regiões Hidrográficas do Uruguai e do Atlântico Sul. Por outro lado, o próprio Estado foi dividido em três regiões hidrográficas menores, que são: a Região Hidrográfica do Uruguai, a Região Hidrográfica do Guaíba e a Região Hidrográfica do Litoral (Figura 3.8). Vale ressaltar aqui que o conceito de região hidrográfica difere um pouco de bacia hidrográfica. As regiões hidrográficas foram traçadas com base nas bacias hidrográficas mas respeitando alguns limites geopolíticos. Por exemplo, tem-se a Região Hidrográfica Amazônica. Parte da bacia contribuinte ao rio Amazonas está além R.H. Amazônica R.H. Atlântico Nordeste Ocidental R.H. Atlântico Nordeste Oriental R.H. do Parnaíba R.H. do Tocantins R.H. do São Francisco R.H. Atlântico Leste R.H. Atlântico Sudeste R.H. Atlântico Sul R.H. do Uruguai R.H. do Paraná R.H. do Paraguai
  • 22. 22 da fronteira do Brasil, de modo que o traçado da região correspondente seguiu a delimitação do país na parte norte. No caso do Rio Grande do Sul, a Região Hidrográfica do Uruguai constitui o conjunto de áreas que drenam para o Rio Uruguai, embora haja uma parcela de área contribuinte a esse corpo d’água situada na Argentina e no Uruguai. A Região Hidrográfica do Guaíba contempla todas as áreas cuja contribuição segue para o Lago Guaíba. Já a Região Hidrográfica do Litoral é composta pelas áreas que drenam diretamente para o oceano ou para o sistema de lagoas Mirim, Mangueira e Lagoa dos Patos. Figura 3.8 – Divisão hidrográfica do Estado do Rio Grande do Sul.
  • 23. 23 Fisiografia da bacia hidrográfica A caracterização física da bacia hidrográfica, em termos de relevo, rede de drenagem, forma e área de drenagem, constitui o que se denomina de fisiografia. Para essa caracterização são utilizados mapas, fotografias aéreas, imagens de satélite (sensoriamento remoto) e levantamentos topográficos. Até um tempo atrás utiliza-se instrumentos como o curvímetro e o planímetro, que permitiam calcular comprimentos e áreas sobre mapas impressos. Entretanto, hoje em dia são empregados programas computacionais específicos, facilitando e agilizando enormemente essa tarefa. A seguir serão apresentadas algumas características fisiográficas mais utilizadas. Área da bacia A área da bacia (A) corresponde a sua área de drenagem, cujo valor corresponde à área plana entre os divisores topográficos projetada verticalmente. O conhecimento da área da bacia permite estimar qual o volume precipitado de água, para uma certa lâmina de precipitação3 , pela expressão: volume precipitado = lâmina precipitada x área da bacia Como exemplo, a bacia do rio Caí tem uma área estimada em 4.983 km2 , enquanto a área da bacia dos rios Taquari-Antas é de cerca de 26.536 km2 . Forma da bacia A forma da bacia, obviamente, é função da delimitação da área da bacia e tem influência no tempo transcorrido entre a ocorrência da precipitação e o escoamento no exutório. Em bacias de formato mais arredondado esse tempo tende a ser menor do que em bacias mais compridas, como ilustra a Figura 3.9 para três bacias hipotéticas. Dois coeficientes são comumente empregados como indicativos da forma da bacia: fator de forma e coeficiente de compacidade. - Fator de forma: esse coeficiente é definido pela relação entre a largura média da bacia e o comprimento axial do curso d’água principal ( ) C L . A largura média L é calculada pela expressão: 3 O conceito de lâmina de precipitação é definido no Capítulo 4 – Precipitação.
  • 24. 24 c L A L = , e, portanto, o fator de forma f K é determinado por: 2 c c f L A L L K = = Esse coeficiente dá uma idéia da tendência da bacia a cheias e, a princípio, comparando-se duas bacias, aquela de maior fator de forma estaria mais propensa a cheias do que a outra. - Coeficiente de compacidade: esse coeficiente é definido como a relação entre o perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de mesma área da bacia. Assim, considerando uma bacia de área A e um círculo também de área A, tem- se que: r P P P K cículo bacia c π 2 = = e 2 r A π = Logo: A P Kc 28 , 0 = Pela sua definição, se 1 = c K a forma da bacia é um círculo, sendo mais “irregular” quanto maior o valor desse coeficiente, o que implica em uma menor tendência a cheias. Figura 3.9 – Bacias hipotéticas de mesma área, onde o tempo entre a precipitação e a vazão no exutório tende a ser na seguinte ordem: t2<t1<t3, devido à forma da bacia. b. 1 b. 1 b. 1 b. 1 b. 2 b. 2 b. 2 b. 2 b. 3 b. 3 b. 3 b. 3
  • 25. 25 Rede de drenagem A rede de drenagem é constituída pelo rio principal e seus afluentes. O rio principal é identificado a partir do exutório da bacia, “subindo o rio”, ou seja, percorrendo o sentido inverso do fluxo da água, até percorrer a maior distância (em outras palavras, o rio principal é aquele maior curso d’água do exutório até a cabeceira da bacia). Quatro indicadores são utilizados, geralmente, para descrever a rede de drenagem de uma bacia: ordem dos cursos d’água, densidade de drenagem, extensão média do escoamento superficial e sinuosidade do curso d’água principal, os quais serão descritos a seguir. - Ordem dos cursos d’água: esse parâmetro dá uma idéia do grau de ramificação da rede de drenagem, sendo a regra mais usual de classificar cada curso d’água a que considera que todos os cursos d’água que não recebem afluência de outros são de ordem 1; dois de ordem n formam um curso d’água de ordem n+1; dois de ordens diferentes formam um de ordem igual àquele formador de maior ordem. A bacia hipotética da Figura 3.10 exemplifica esse processo. Figura 3.10 – Classificação dos cursos d’água de uma bacia quanto à ordem. - Densidade de drenagem: esse índice é definido pela relação entre o comprimento total dos cursos d’água da bacia ) (∑ c l e sua área: A l D c d ∑ = Os valores mais usuais da densidade de drenagem são: 2 / 5 , 3 5 , 0 km km Dd ≤ ≤ . - Extensão média do escoamento superficial: representa a distância média que água teria que percorrer, em linha reta, do ponto onde atingiu o solo até a rede de drenagem. Para sua determinação, considera-se um retângulo de área igual à da 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 3 3 3 3 3 3 3 3
  • 26. 26 ∑ = C l x ∑ = C l x m lm l m l 2 m l 4 m l 2 m l 2 m l 4 m l 4 bacia e com o maior lado igual à soma do comprimento total dos cursos d’água, como exemplifica a Figura 3.11. Figura 3.11 – Retângulo auxiliar de área igual à da bacia, para determinação da extensão média do escoamento superficial. Interpretando o retângulo anterior como sendo a bacia, é fácil perceber que a distância média que a água precipitada percorre até alcançar a rede de drenagem é um quarto do seu lado menor. No caso do retângulo, a rede de drenagem se limita ao curso d’água central, cujo comprimento é equivalente ao comprimento total dos cursos d’água da bacia original. Como o retângulo da Figura 3.11 tem área igual à da bacia, tem-se que: ∑ = ⇒ ⋅ = c m m l A l l x A 4 4 - Sinuosidade do curso d’água principal: representa a relação entre o comprimento do rio principal ) ( c L e a distância entre a nascente (cabeceira) e a foz ) ( c d , medida em linha reta. Esse termo dá uma idéia da “quantidade” de curvatura do rio, sendo determinado pela expressão: c c c d L S = A Figura 3.12 ilustra a definição das variáveis c L e c d , enquanto a Figura 3.13 mostra um rio nos EUA que apresenta grande sinuosidade, evidenciada pela quantidade de meandros.
  • 27. 27 C LC L C dC d Fonte: EPA (1998) Fonte: EPA (1998) Figura 3.12 – Representação do comprimento do rio principal ) ( c L e a distância entre sua foz e nascente ) ( c d . Figura 3.13 – Foto de um rio nos EUA dando idéia da sinuosidade de um curso d’água natural. Relevo da bacia As características do relevo da bacia têm influência direta sobre o escoamento superficial, principalmente na velocidade do escoamento e na maior ou menor tendência ao armazenamento da água na superfície ou depressões do solo. Entretanto, o relevo também influencia a evaporação, a precipitação e a temperatura, por serem função da altitude, dentre outras variáveis.
  • 28. 28 38% 20% 40% 60% 80% 100% 50 100 150 Cota (m) 20% 40% 60% 80% 100% 50 100 150 20% 40% 60% 80% 100% 50 100 150 20% 40% 60% 80% 100% 20% 40% 60% 80% 100% 50 100 150 50 100 150 Cota (m) - Declividade da bacia: bacia com maior declividade tende a ter maior velocidade do escoamento e ser mais susceptível à erosão do solo, caso este esteja descoberto; a declividade da bacia é geralmente estimada pelo método das quadrículas, analisando as curvas de nível do terreno. O referido método foge ao escopo desta disciplina e não é descrito neste texto. - Declividade do curso d’água principal: para dois pontos quaisquer do curso d’água, a declividade é determinada pela relação entre a diferença total de elevação do leito (cotas) e a distância horizontal entre eles: . . 1 horiz dist Cota DC ∆ = - Curva hipsométrica: representação gráfica do relevo médio da bacia, indicando para cada cota do terreno a porcentagem da área da bacia situada acima ou abaixo dessa cota. A Figura 3.14 mostra um exemplo típico de uma curva hipsométrica, na qual 38% da área da bacia está situada acima da cota 50 m. Figura 3.14 – Exemplo de uma curva hipsométrica, segundo a qual, por exemplo, 38% da área da bacia está em cotas superiores à 50 m.
  • 29. 29 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo 4 4 4 4 Precipitação Precipitação Precipitação Precipitação Aspectos gerais A precipitação é entendida como qualquer forma de água proveniente da atmosfera que atinge a superfície terrestre, como, por exemplo, neve, granizo, chuva, orvalho, geada, etc. O que diferencia as várias formas de precipitação é o estado em que a água se encontra. Devido a sua capacidade de gerar escoamento, a chuva constitui a forma de precipitação de maior interesse para a hidrologia. Como visto nos Capítulos 2 e 3 anteriores, parcela da chuva que atinge o solo gera escoamento nas vertentes da bacia hidrográfica, alcançando a rede de drenagem e daí seguindo até o exutório da bacia. Como a precipitação constitui a “entrada” de água na bacia hidrográfica, tomando-a como um sistema físico, a estimativa da precipitação em uma bacia dá idéia da disponibilidade hídrica nela, servindo para avaliar a necessidade de irrigação, a previsão de enchentes nos rios, a operação de hidroelétricas, o atendimento às demandas para abastecimento público, etc. Mecanismo de formação da precipitação A precipitação ocorre a partir da presença de vapor d’água na atmosfera, que sob determinadas condições precipita na forma de neve, gelo, chuva, etc. Para a ocorrência de chuva, deve-se haver condições propícias para o crescimento das gotas de água, até que elas possuam peso superior às forças que as mantêm em suspensão na atmosfera. Esse crescimento se dá principalmente devido à presença dos chamados núcleos de condensação nas nuvens, que são partículas orgânicas, sais, cristais de gelo, produtos resultantes da combustão, entre outros. As gotas de chuva tendem a condensar sobre tais partículas e, mediante alguns processos
  • 30. 30 físicos, ocorre o crescimento das gotas, em parte devido ao choque das primeiras com outras gotas menores. Ao atingir peso suficiente, as gotas precipitam. Classificação da precipitação A ocorrência de precipitação está geralmente relacionada à ascensão de ar úmido, após o qual se dá o processo de condensação sobre os núcleos e de crescimento das gotas, descritos no item anterior. Mas há diferentes mecanismos agindo no sentido de causar a referida ascensão do ar úmido e, conforme o tipo de mecanismo, as precipitações são classificadas em: - Convectivas: a ascensão do ar úmido e quente decorrente de uma elevação excessiva de temperatura; como o ar quente é menos denso, ocorre uma brusca ascensão desse ar que, ao subir, sofre um resfriamento rápido, gerando precipitações intensas com pequena duração, cobrindo pequenas áreas; ocorrem com freqüência em regiões equatoriais; - Orográficas: a ascensão do ar quente e úmido, proveniente do oceano, ocorre devido a obstáculos orográficos, como montanhas e serras; ao subir, ocorre o resfriamento e em seguida a precipitação; são caracterizadas por serem de pequena intensidade, mas longa duração, cobrindo pequenas áreas; como as montanhas constituem um obstáculo à passagem do ar úmido (com “potencial” para formar precipitação), normalmente existem áreas no lado oposto caracterizadas por baixos índices de precipitação, sendo chamadas de “sombras pluviométricas”; - Frontais: neste tipo de precipitação, a ascensão do ar decorre do “encontro” entre massas de ar frias e quentes; como resultado, o ar mais quente e úmido sofre ascensão, resfria-se e ocorre a precipitação, caracterizada por longa duração e intensidade média, cobrindo grandes áreas.
  • 31. 31 Caracterização da precipitação Uma precipitação, no caso chuva, é caracterizada pelas seguintes grandezas: - altura pluviométrica (P): representa a espessura média da lâmina de água precipitada, sendo geralmente adotada como unidade o milímetro (mm); significa a espessura da lâmina de água que recobriria toda a região, supondo-se que não houvesse infiltração, evaporação nem escoamento para fora da região; - duração (t): representa o período de tempo durante o qual ocorreu a precipitação; geralmente se utilizam horas (h) ou minutos (min) como unidade; - intensidade (i): fazendo-se a relação da lâmina de água precipitada com o intervalo de tempo transcorrido, obtém-se a intensidade dessa precipitação, geralmente em mm/h ou mm/min; assim i = P/t; - tempo de recorrência (Tr): representa o número médio de anos durante o qual se espera que uma determinada precipitação seja igualada ou superada; por exemplo, ao se dizer que o tempo de recorrência de uma precipitação é de 10 anos, tem-se que, em média, deve-se esperar 10 anos para que tal precipitação seja igualada ou superada. Medição da precipitação Os instrumentos usuais de medição da precipitação são o pluviômetro e o pluviógrafo, descritos sucintamente a seguir. O pluviômetro é constituído por um recipiente metálico dotado de funil com anel receptor (Figura 4.1), geralmente com uma proveta graduada para leitura direta da lâmina de água precipitada. Esse instrumento armazena a água da chuva e, fazendo-se a leitura da proveta, tem-se a lâmina precipitada (P). Normalmente, a leitura é feita diariamente, às 7h da manhã, por uma pessoa encarregada (operador) – geralmente, um morador da região, cujo acesso diário ao equipamento seja fácil, e que recebe orientação do órgão/empresa responsável pelo monitoramento.
  • 32. 32 Fonte: Studart, 2003. Fonte: Studart, 2003. Assim, o pluviômetro indica a precipitação ocorrida nas últimas 24 horas, desde a última leitura, a qual é anotada pelo operador em uma caderneta diariamente. Figura 4.1 – Foto de um pluviômetro. (Fonte: Studart, 2003). O outro instrumento utilizado para registrar a precipitação, o pluviógrafo, difere do pluviômetro basicamente por possuir um mecanismo de registro automático da precipitação, gerando informações mais discretizadas no tempo, isto é, informações em intervalos de tempo menores. Os equipamentos mais antigos utilizam um braço mecânico para traçado de um gráfico em papel graduado com os valores precipitados (Figura 4.2). Os pluviógrafos mais modernos armazenam tais informações em meio magnético (Figura 4.3) ou enviam em tempo real por sistema de transmissão remoto de dados. Para acionamento do mecanismo de registro, seja em papel ou em meio magnético, há dois tipos principais de sensores: cubas basculantes, cujo enchimento e vertimento aciona o registro; reservatório equipado com sifão, sendo a variação do nível no reservatório a responsável pelo acionamento do registro. Dessa forma, o pluviógrafo permite ter informações mais detalhadas ao longo do tempo, além de uma maior precisão também. Outra grande vantagem é não necessitar da visita diária do operador, cuja visita fica restrita à troca de papel ou para descarregar os dados em um computador portátil, em períodos como 15 dias ou um mês. Em tais casos,
  • 33. 33 o operador já passa a ser alguém com conhecimento mais especializado, geralmente um técnico. Figura 4.2 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em papel graduado. (Fonte: Studart, 2003). Figura 4.3 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em meio magnético. (Fonte: Hobeco, 2003).
  • 34. 34 Análise de dados de precipitação Um posto de medição de chuva (posto pluviométrico) é instalado e mantido com o objetivo de obter uma série ininterrupta de dados de precipitação ao longo dos anos. Entretanto, é comum a ocorrência de problemas mecânicos ou com o operador, de modo que normalmente existem períodos sem registros das precipitações ou com falhas nas observações. Como falhas são designados dados cujos valores são incoerentes ou denotam erros grosseiros, os quais são detectados por análise visual no primeiro contato com a série histórica de dados ou mesmo só no momento do processamento das informações, durante os estudos hidrológicos. São comuns as falhas cuja origem é o preenchimento errado da caderneta pelo operador, constando valores absurdos de tão elevados ou com casas decimais acima da precisão do instrumento. Por exemplo, em dados diários, uma precipitação de 1000 mm com certeza representa uma falha de leitura, pois esse valor equivale ao precipitado anual em algumas regiões. Outro exemplo é um valor de 1,25 mm, sabendo que o pluviômetro usado tem graduação de 0,1 mm. Também pode ocorrer que o operador não pôde comparecer ao local e “estime” um valor para leitura, que, às vezes, é perceptível – o operador repete o último valor anotado ou coloca zero, por exemplo. Entretanto, as falhas também podem ter origem em problemas mecânicos no sensor ou no registrador do instrumento, causado por intempéries ou até por animais ou vandalismo. Enfim, é normal que as séries históricas de precipitação contenham falhas, as quais devem ser identificadas e excluídas, tornando as séries com “espaços” sem informação. Isso por que os estudos hidrológicos requerem séries contínuas de precipitação. Vale lembrar que, por exemplo, um dia com falha já incapacita o uso do valor da precipitação mensal naquele mês, dada pela soma das precipitações diárias. Preenchimento de falhas Para realizar o preenchimento de falhas em séries de dados de precipitação, tornando-as contínuas, são usualmente empregados os métodos da ponderação regional, regressão linear e uma combinação dos dois anteriores. A seguir tais métodos serão
  • 35. 35 brevemente apresentados, sendo a descrição detalhada encontrada na bibliografia indicada ao final deste documento. - Método da ponderação regional Este método consiste em estimar a precipitação ocorrida no posto com falha considerando-a proporcional às precipitações em postos vizinhos, sendo o fator de proporcionalidade função da precipitação média em tais postos, levando em consideração ainda a precipitação média no próprio posto com falha. Tal método é utilizado selecionando ao menos três postos vizinhos àquele com falha, os quais devem estar localizados em região climatologicamente semelhante ao posto com falha. Por exemplo, considerando que em uma série de dados de um posto X tenham sido encontradas falhas, e considerando que existem os postos Y, Z e W situados em regiões de clima semelhante e com dados disponíveis, as falhas citadas podem ser preenchidas pela seguinte equação, conforme o método da ponderação regional: Xm Wm W Ym Y Zm Z X P P P P P P P P ⋅         + + = 3 1 , onde PXm, PYm, PZm e PWm são as precipitações médias nos postos X, Y, Z e W, respectivamente; PX, é a precipitação no posto X a determinar; PY, PZ e PW são as precipitações nos postos Y, Z e W, respectivamente, no intervalo de tempo referente àquele da precipitação no posto X a determinar. Esse método é normalmente usado para séries mensais ou anuais, não sendo recomendado para séries diárias, devido à grande variabilidade temporal e espacial da precipitação. - Método da regressão linear Outro método de preenchimento de falhas de dados de precipitação consiste em utilizar a técnica da regressão linear simples ou múltipla, segundo a qual a precipitação no posto com falhas é correlacionada estatisticamente com a precipitação em um posto vizinho com dados disponíveis, no caso da regressão simples, ou vários postos vizinhos, no caso da regressão múltipla. Basicamente, o referido método consiste em ajustar uma equação do tipo (para regressão linear múltipla):
  • 36. 36 d P c P b P a P W Z Y X + ⋅ + ⋅ + ⋅ = , onde Px é a precipitação a ser determinada no posto X com falha; Py, Pz e Pw são as precipitações nos postos vizinhos Y, Z e W, respectivamente; a, b, c, d são coeficientes a ajustar com base nas séries de dados disponíveis dos quatro postos. O método mais comum de determinar os coeficientes a, b, c, d é o método dos mínimos quadrados, que procura ajustar tais valores de modo a minimizar o somatório do quadrado das distâncias de cada valor em relação à média e cuja descrição foge ao escopo deste texto, mas é facilmente encontrada em qualquer livro de Estatística, como por exemplo Spiegel (1972). - Método da ponderação regional com base em regressões lineares Sendo uma combinação dos dois métodos anteriores, este consiste em estabelecer regressões lineares entre o posto com falhas e cada um dos postos vizinhos selecionados. Para cada regressão linear, obtém-se um coeficiente de correlação (que estima o “grau de correlação” em cada regressão) e a partir desses coeficientes são determinados os pesos de cada posto na equação de determinação da precipitação no posto com falha. Assim, a precipitação no posto com falha é determinada por uma ponderação das precipitações nos postos vizinhos, sendo os pesos de cada posto estabelecidos em função do grau de correlação dos seus dados com os do posto com falhas, obtidos mediante regressão linear. Maiores informações sobre esse método podem ser encontradas em Tucci (2000). Análise de consistência Dispondo das séries de precipitação sem falhas, preenchidas por algum dos métodos descritos anteriormente, convém realizar uma análise de consistência, para avaliar a homogeneidade das informações entre os postos pluviométricos. Embora à primeira vista os dados possam estar com valores supostamente coerentes, é possível haver inconsistência nas informações dos totais precipitados, oriundos de problemas como troca de operador, troca de equipamento, mudança nas condições vizinhas ao local onde o equipamento está instalado, etc.
  • 37. 37 Caso sejam identificadas inconsistências, devem ser revistas as falhas preenchidas bem como tentar identificar outras falhas não apontadas inicialmente. Para detectar tais inconsistências, geralmente são empregados os métodos da Dupla Massa e do Vetor Regional. O primeiro método é descrito resumidamente a seguir, enquanto o segundo pode ser encontrado em detalhes em Tucci (2000). - Método da Dupla Massa Este é um método simples, desenvolvido pelo U.S. Geological Survey (Tucci, 2000), o qual consiste em traçar em um gráfico os totais acumulados de precipitação do posto a consistir (posto cuja consistência se quer analisar) versus os totais acumulados de um posto base de comparação. Se os pontos de tal gráfico se alinharem em uma reta aproximada, isso indica uma proporcionalidade entre os dados dos dois postos em questão, como ilustra a Figura 4.4-a. Figura 4.4 – Exemplos de resultados da análise de consistência do Posto Y tendo como base o posto X (totais precipitados acumulados). Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X Posto Y Posto X (a) (b) (c) (d)
  • 38. 38 Entretanto, pode ocorrer que os pontos se alinhem em uma reta até certo instante e em outra a partir daí, sendo duas retas de declividades diferentes (Figura 4.4-b). Isso indica uma mudança de tendência no posto a consistir (no caso, posto Y), que pode ser causada por erros sistemáticos (por exemplo, mudança do operador, que está fazendo a leitura do instrumento erroneamente), por alterações climáticas, como a construção de um lago artificial próximo ao local de medição, entre outras. Também pode ocorrer dos pontos se alinharem em duas ou mais retas de mesma declividade (paralelas) (Figura 4.4-c). A principal causa são erros de transcrição dos dados, causados pelo operador ou durante o processamento das informações. Quando o gráfico dos totais acumulados apresenta a forma da Figura 4.4-d, onde os pontos estão distribuídos de forma dispersa, sem haver nenhuma tendência clara, isso indica, geralmente, que os postos em questão apresentam regimes pluviométricos distintos, não devendo ser usados conjuntamente nos estudos hidrológicos. Análise de freqüência dos totais precipitados Uma análise simples e rápida de se fazer sobre os totais precipitados é verificar com qual freqüência eles ocorreram historicamente, com base nos dados observados disponíveis. Para tanto, os dados são dispostos em ordem decrescente de valores, sendo atribuído a cada um deles um número (m) correspondente a sua ordem – o primeiro (maior valor) recebe o valor m = 1, o segundo m = 2, e assim sucessivamente até o número de dados ou registros disponíveis, representado por n. O valor de m varia então de 1 até n. A freqüência (F) é determinada pelas equações abaixo, conforme se opte pelo método da Califórnia ou de Kimball: n m F = 1 + = n m F Convém ressaltar que o valor de F representa a freqüência com que o valor da precipitação de ordem m foi igualada ou superada, tendo como fonte de informações a série de dados disponíveis. Como já ressaltado, a precipitação é um fenômeno aleatório, (método da Califórnia) (método de Kimball)
  • 39. 39 de grande variabilidade temporal e espacial, e a estimativa da freqüência F apenas dá uma idéia da probabilidade de ocorrência de cada valor da precipitação na área em estudo, havendo técnicas estatísticas mais complexas para realizar previsões mais confiáveis. Precipitação média em uma bacia Os postos pluviométricos registram a precipitação pontual, naquele local onde estão instalados e, devido à variabilidade espacial e temporal da precipitação, as medições em postos geograficamente próximos são distintas. Para os estudos hidrológicos acerca de uma bacia hidrográfica, uma das informações mais imprescindíveis é o regime pluviométrico da região. Uma forma, então, de incorporar as medições pontuais dos postos e espacializar tais informações para a área da bacia é determinando a precipitação média. A precipitação média em uma bacia é entendida como sendo a lâmina de água de altura uniforme sobre toda a sua área, associada a um período de tempo (um dia, um mês, etc.). Obviamente, isso constitui uma simplificação, mas que permite inferir sobre o regime pluviométrico da região e servir de comparação entre bacias. Com base nos dados disponíveis de postos inseridos na área da bacia hidrográfica ou em regiões próximas, costuma-se estimar a precipitação média em uma bacia empregando o método aritmético, o método de Thiessen ou o método das isoietas, os quais serão descritos a seguir. Método artimético Esse método é o mais simples e consiste apenas em obter a precipitação média a partir da média aritmética das precipitações nos postos selecionados. Assim, supondo que estejam disponíveis dados dos postos X, Y, Z e W, a precipitação média na bacia da Figura 4.5 pode ser estimada como: 4 W Z Y X m P P P P P + + + = , onde PX, PY, PZ, PW, são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente, e Pm é a precipitação média na bacia.
  • 40. 40 Figura 4.5 – Postos com dados disponíveis para estimativa da precipitação média da bacia do exemplo. Esse método não considera a localização geográfica dos postos, relativamente à bacia. Para o exemplo dado, a precipitação registrada no posto W tem a mesma “importância” daquela medida em Y, situada no interior da bacia, na estimativa da precipitação média via o método aritmético. Método de Thiessen Esse método determina a precipitação média em uma bacia a partir das precipitações observadas nos postos disponíveis, incorporando um peso a cada um deles, em função de suas “áreas de influência”. Com base na disposição espacial dos postos, são traçados os chamados polígonos de Thiessen, que definem a área de influência de cada posto em relação à bacia em questão. Dessa forma, a precipitação média é obtida pela ponderação dos valores registrados em cada posto e de suas áreas de influência. Considerando quatro postos com informação disponível (postos X, Y, Z e W), a precipitação média estimada por esse método é: A P A P A P A P A P W W Z Z Y Y X X m ⋅ + ⋅ + ⋅ + ⋅ = , onde: PX, PY, PZ, PW são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente; AX, AY, AZ, AW são as áreas de influência dos postos X, Y, Z e W; Pm é a precipitação média na bacia; A é a área da bacia que, no caso, corresponde à soma das áreas AX, AY, AZ, AW.
  • 41. 41 Para o traçado dos polígonos de Thiessen, inicialmente os postos são unidos por linhas retas formando um polígono fechado (Figura 4.6-b); em seguida, são traçadas retas perpendiculares aos segmentos que unem os postos, dividindo-os em duas partes iguais (Figura 4.6-c); essas retas perpendiculares são prolongadas até o cruzamento com as demais, definindo os polígonos de Thiessen e, portanto, as áreas de influência de cada posto na bacia (Figura 4.7). Figura 4.6 – Exemplo do traçado dos polígonos de Thiessen, para estimativa da precipitação média na bacia, com base nos dados dos postos X, Y, Z e W. Figura 4.7 – Definição dos polígonos de Thiessen e das áreas de influência dos postos X, Y, Z e W para estimativa da precipitação média na bacia do exemplo. Esse método incorpora, portanto, a questão da disposição espacial dos postos, relativamente à bacia, diferindo a “importância” de cada posto através da hipótese que (a) (b) (c) (a) (b)
  • 42. 42 cada um teria sua área de influência na bacia. Como essas áreas não variam, visto que os postos têm localização fixa, o cálculo pode ser automatizado, agilizando o processo. Entretanto, uma crítica a esse método é que ele não leva em conta as características do relevo, apresentando bons resultados parar terrenos levemente ondulados e também quando há uma boa densidade de postos de medição da precipitação. Método das isoietas O método das isoietas, como o próprio nome sugere, utiliza as isoietas para determinação da precipitação média em uma bacia. As isoietas são linhas de igual precipitação, traçadas para um evento específico ou para uma determinada duração. Por exemplo, pode-se ter um mapa com as isoietas referentes ao evento chuvoso ocorrido em tal data, ou as isoietas de precipitação mensal na bacia. Enquanto a primeira seria obtida a partir dos dados do evento especificado, a segunda seria com base nas séries de dados mensais disponíveis. As isoietas são determinadas por interpolação a partir dos dados disponíveis nos postos da área em estudo, podendo depois ser ajustadas conforme o relevo. Na Figura 4.8 é apresentado um exemplo fictício das isoietas em uma bacia hidrográfica, correspondendo a valores mensais. Figura 4.8 – Exemplo de isoietas mensais, com valores em mm.
  • 43. 43 A precipitação média na bacia pode ser obtida, portanto, a partir das isoietas traçadas, fazendo uma média ponderada em função das áreas entre duas isoietas consecutivas e o valor médio entre elas, como mostra a expressão a seguir: A P P A P i i i i m ∑               + ⋅ = + + 2 1 1 , , onde Ai,i+1 é a área entre a isoieta i e a consecutiva i+1; Pi e Pi+1 são as precipitações referentes às isoietas i e i+1; Pm é a precipitação média na bacia; e A é a área da bacia que, no caso, é equivalente ao somatório das áreas entre as isoietas. O emprego das isoietas para determinação da precipitação média em uma bacia tem a vantagem de que leva em consideração a disposição espacial dos postos na bacia, quando realiza a interpolação para traçado das isoietas, e também o relevo da bacia, ao permitir ajustar o traçado por ele. Precipitações máximas A precipitação máxima é entendida como aquela ocorrência extrema, com duração, distribuição espacial e temporal críticas para uma área ou bacia hidrográfica. Em diversos estudos hidrológicos, o maior interesse é justamente conhecer ou estimar qual a precipitação máxima, ou seja, qual o total de precipitação, sua duração e distribuição espacial e temporal que sejam críticas para a área em estudo. Geralmente, para os estudos de drenagem urbana e de previsão de enchentes torna-se imprescindível a caracterização das precipitações máximas. Além disso, os dados de vazão estão menos disponíveis do que de precipitação e, com base nestes, pode-se determinar a precipitação máxima e então estimar a vazão de enchente na bacia. É importante perceber que uma precipitação máxima deve ser caracterizada pelas grandezas intensidade, duração e freqüência ou tempo de retorno. Dizer que a precipitação máxima em uma certa bacia é 120 mm não permite saber nada, sem informar a duração, pois esse total precipitado pode ocorrer em um dia ou em um mês, representando situações completamente distintas. E ao associar a intensidade e duração da precipitação com seu tempo de retorno, é possível ter uma idéia da freqüência de ocorrência da precipitação máxima especificada e, portanto, o quanto determinado projeto está “vulnerável” ou “seguro” ao considerar tal precipitação máxima.
  • 44. 44 Assim, para caracterizar a precipitação máxima em uma área, são normalmente empregadas as chamadas curvas i-d-f ou curvas intensidade-duração-freqüência. Tais curvas são obtidas a partir de dados de pluviógrafos, como apresentado por Tucci (2000). Para um determinado tempo de retorno (Tr), a curva i-d-f estabelece as máximas intensidades da precipitação (i) para cada duração (t), tendo geralmente a seguinte forma: 4 2 ) ( 3 1 c c r c t T c i + ⋅ = , onde c1, c2, c3, c4, são coeficientes ajustados para cada região; i é a intensidade da precipitação em mm/h; t é a duração em minutos e Tr é o tempo de retorno em anos. Por exemplo, as curvas i-d-f para a cidade de Curitiba (PR) e para a região do Parque da Redenção, em Porto Alegre (RS), são: 15 , 1 217 , 0 ) 26 ( 5950 + ⋅ = t T i r (curva i-d-f de Curitiba – PR) 88 , 0 052 , 0 ) 12 ( 1265 + ⋅ = t T i r (curva i-d-f da Redenção, Porto Alegre –RS) Assim, para um tempo de retorno de 10 anos, a precipitação máxima com duração de 2 horas, para a área próxima ao Parque da Redenção, em Porto Alegre, tem intensidade de 19 mm/h. Já para Curitiba, essa precipitação tem intensidade de 32 mm/h. Outra forma de apresentar a curva i-d-f é graficamente, como exemplifica a Figura 4.9, referente à cidade de Caxias do Sul, na qual são traçadas as curvas para os tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos. Por exemplo, para um Tr = 10 anos e uma duração de 2 h, a intensidade da precipitação máxima em Caxias do Sul é em torno de 30 mm/h.
  • 45. 45 Figura 4.9 – Curva i-d-f de Caxias do Sul, para os tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos (nas ordenadas, tem-se a intensidade da precipitação, em mm/h; nas abscissas, a duração da precipitação, em horas) (Fonte: IPH, 2001).
  • 46. 46 Capítulo Capítulo Capítulo Capítulo 5 5 5 5 Escoamento Superficial Escoamento Superficial Escoamento Superficial Escoamento Superficial Introdução Conforme visto no Capítulo 2, uma das etapas do ciclo hidrológico compreende o escoamento superficial, cuja principal origem é a precipitação. Notadamente, dentre as várias formas de precipitação (granizo, neve, chuva, etc), ao se estudar o escoamento superficial o maior interesse e praticamente o único se resume à chuva, pela própria capacidade de gerar escoamento superficial. Relembrando o ciclo hidrológico, a precipitação que atinge o solo vai sendo armazenada nas depressões do solo e infiltrando até saturá-lo, quando então o escoamento superficial fica mais intenso. Esse é o chamado escoamento superficial “livre”, que ocorre sobre as diversas superfícies que compõem a bacia hidrográfica. Tal escoamento passa, então, a constituir a microrrede de drenagem, formando pequenos canaletes de água que procuram seguir caminhos preferenciais no solo, conforme a topografia (relevo), a presença de obstáculos, como rochas, raízes, plantas, etc, sob ação da gravidade. Ocorre, então, a formação de pequenos cursos d’água, os córregos, que também vão confluindo uns aos outros até alcançarem os rios. Nota-se, portanto, que há um longo caminho da água precipitada na bacia até o curso d’água principal, escoando inicialmente sobre o solo nas superfícies vertentes e daí seguindo o direcionamento da rede de drenagem, dos menores filetes de água até os maiores rios. Entretanto, a água que corre nos rios não tem como origem apenas o escoamento superficial sobre as superfícies vertentes da bacia. Uma parte da vazão4 do rio é proveniente do escoamento sub-superficial e subterrâneo, como descrito no Capítulo 2. Ou seja, parcela da água precipitada que infiltra vai escoar sub-superficialmente e outra 4 Vazão = volume por unidade de tempo, geralmente em m3 /s ou l/s.
  • 47. 47 parcela vai se juntar ao escoamento subterrâneo, alimentando os rios. A rigor, há ainda a parcela da precipitação que cai diretamente sobre a superfície dos rios, mas que é geralmente desprezível, se for considerada relativamente às demais contribuições. Resumindo, em um corpo d’água o escoamento tem como origem as seguintes componentes: - precipitação direta sobre a superfície do corpo d’água; - escoamento superficial nas vertentes da bacia; - escoamento sub-superficial; - escoamento subterrâneo. Hidrograma Para estudar ou avaliar o escoamento superficial, é de grande utilidade o traçado do hidrograma, que consiste em um gráfico da evolução da vazão ao longo do tempo. Para um rio, o hidrograma se refere a uma seção transversal específica, já que ao longo do seu curso o rio vai recebendo mais contribuições (volumes de água) e aumentando sua vazão5 , de jusante para montante. Assim, tomando uma determinada seção de um rio, o hidrograma correspondente indica o volume de água escoado por unidade de tempo através daquela seção. Como comentado anteriormente, há um longo percurso para a água precipitada percorrer até atingir uma determinada seção do rio principal na bacia, além de “intervirem” ao longo desse caminho outras etapas do ciclo hidrológico, como evaporação, transpiração, infiltração, etc. Portanto, o comportamento da vazão ao longo do tempo é o resultado de todos os processos e etapas do ciclo hidrológico que ocorreram na bacia hidrográfica em questão, desde a ocorrência da precipitação até a composição dessa vazão. Vendo a bacia hidrográfica como um sistema físico, cuja entrada é a precipitação e a saída é a vazão no seu exutório, como comentado no Capítulo 3, entende-se que o hidrograma representa a “resposta” da bacia, naquele ponto ou seção considerada, à precipitação que ocorreu na sua área de contribuição. E o modo como ocorre essa “resposta”, ou seja, o formato do hidrograma (como evoluiu a vazão ao longo do 5 Em capítulo posterior, será dado maior ênfase às características do fluxo de água em um rio propriamente dito (fluxo fluvial).
  • 48. 48 Vazão no Rio Uruguai (RS), seção em Garruchos 0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 35.000 27/jul 06/ago 16/ago 26/ago 05/set 15/set 25/set data (ano de 1965) vazão (m3/s) tempo), é reflexo direto das particularidades de cada bacia hidrográfica, estando envolvidos fatores como grau de urbanização, tipo de solo, área, etc. A título de curiosidade e ilustração, na Figura 5.1 é apresentado um hidrograma composto por dados observados (vazões diárias medidas no próprio rio)6 no Rio Uruguai, na seção localizada em Garruchos, a cerca de 300 km a montante de Uruguaiana. Esse hidrograma é referente ao período entre julho e setembro de 1965, com destaque para a cheia que ocorreu entre os dias 16 e 30 de agosto. Figura 5.1 – Hidrograma na seção transversal do Rio Uruguai localizada em Garruchos, no período de 27/jul/1965 a 15/set/1965. O hidrograma no Rio Uruguai apresentado ilustra bem a questão da resposta da bacia a um evento chuvoso. Observa-se que a vazão no rio oscilava em torno de 1.000 m3 /s até 16 de agosto, quando começa a aumentar relativamente rápido, superando 30.000 m3 /s por volta do dia 24 de agosto. Claramente, essa ascensão do hidrograma foi devido à ocorrência de uma precipitação intensa na área de contribuição a montante. Antes da precipitação, praticamente apenas o escoamento subterrâneo estava contribuindo para a formação daquela vazão no rio, em torno de 1.000 m3 /s. Então, dada à ocorrência de um evento chuvoso, a resposta da bacia ou o hidrograma resultante tem tipicamente o aspecto daquele mostrado na Figura 5.2, ao qual se aproxima bem o hidrograma observado no Rio Uruguai. 6 Também no capítulo sobre Fluxo Fluvial serão descritos os métodos de medição de vazão.
  • 49. 49 Figura 5.2 – Hidrograma típico resultante da ocorrência de uma precipitação na área contribuinte. No hidrograma esquemático da Figura 5.2, convém destacar alguns pontos interessantes: - em resposta à precipitação ocorrida, apresentada no alto da figura, a vazão no rio começa a subir a partir do instante correspondente ao ponto A, alcançando o pico (ponto de máxima vazão) em B e depois decrescendo; - o trecho de subida do hidrograma, entre os pontos A e B, é a curva de ascensão do hidrograma, enquanto o trecho B-C é a curva de depleção; - no hidrograma em questão, parte da vazão é devido ao escoamento superficial nas vertentes e parte é devido à alimentação do rio pelas águas subterrâneas (escoamento subterrâneo), sendo cada parcela correspondente indicada na figura – do eixo horizontal até a curva azul claro corresponde à vazão contribuinte do escoamento subterrâneo; de tal curva até a curva azul escuro (hidrograma propriamente dito) corresponde à contribuição do escoamento superficial na bacia;
  • 50. 50 - o ponto C caracteriza o instante de tempo em que não há mais escoamento superficial devido àquela precipitação contribuindo para essa seção do rio; esse ponto C é conhecido como ponto de inflexão; - também é interessante a caracterização do tempo de pico (tpico), ou seja, o tempo transcorrido desde o centro de massa da precipitação até o hidrograma atingir seu máximo. O traçado da curva indicativa da parcela do hidrograma referente à contribuição do escoamento subterrâneo (curva azul claro) compreende o que se chama de separação do escoamento superficial. Geralmente são adotados métodos gráficos para o traçado dessa curva, cuja descrição foge ao propósito deste texto, podendo ser encontrados alguns exemplos em Tucci (2000). Convém ressaltar que, desde o início da precipitação (instante de tempo t0), transcorreu um certo tempo até que essa água precipitada atingisse o curso d’água na seção em questão, o que só ocorreu no instante de tempo tA, referente ao ponto A, que já foi indicado como o início da ascensão do hidrograma. Novamente, isso é decorrente de todos os processos que estão envolvidos de certa forma no caminho desde a ocorrência da precipitação até a vazão no rio. Tempo de Concentração Uma característica importante do hidrograma de uma bacia é o tempo de concentração (tc), definido como sendo o tempo necessário para que toda a bacia hidrográfica contribua para o ponto (seção) analisado. Em outras palavras, o tempo de concentração também pode ser entendido como o tempo necessário para que a água precipitada no ponto mais distante da bacia se desloque até a seção analisada. Na prática, há diversas equações empíricas que correlacionam aspectos físicos da bacia com o tempo de concentração, sendo uma forma usual de estimar esse parâmetro. A equação de Kirpich e a desenvolvida pelo California Culverts Practice são dois exemplos: 385 , 0 77 , 0 989 , 3 − ⋅ ⋅ = S L tC (Kirpich) 385 , 0 155 , 1 57 − ⋅ ⋅ = H L tC (Califonia Culverts Practice)
  • 51. 51 onde: tC é o tempo de concentração (min); L é o comprimento do rio principal (km); S é a declividade do rio principal (m/m); H é a diferença de cota entre o exutório da bacia e o ponto mais a montante (m). Fatores intervenientes no hidrograma Como já comentado, o hidrograma constitui a resposta da bacia à ocorrência de uma determinada precipitação, sendo resultado de todos os processos envolvidos que acontecem na bacia desde o instante em que a chuva cai até atingir o rio. Então, ao imaginar esse caminho e os processos envolvidos, percebe-se que há diversos fatores que influenciam no modo como a bacia vai responder à precipitação, ou seja, em como é o comportamento da vazão ao longo do tempo – o hidrograma. Os seguintes fatores podem ser listados como os principais: características fisiográficas da bacia; tipo de solo; uso e ocupação do solo; intervenções no rio; características da precipitação. Características fisiográficas da bacia Aspectos como forma, área, relevo e rede de drenagem têm grande influência na forma do hidrograma. Por exemplo, uma bacia com formato arredondado tende a apresentar o pico do hidrograma maior do que o de uma bacia de formato mais alongado, considerando semelhantes as demais condições. Como o escoamento ocorre pela ação da gravidade, é intuitiva a percepção de que uma bacia com maiores declividades do terreno também está sujeita a maiores cheias (hidrogramas mais acentuados) do que aquelas mais planas. No mesmo sentido, o fato de apresentar uma rede de drenagem melhor distribuída espacialmente (mais ramificada e com menor “espaço” entre os cursos d’água) também facilita o escoamento superficial e aumenta a vazão de pico no exutório da bacia. Tipo de solo Conforme a bacia apresente solos mais ou menos permeáveis, haverá maior ou menor infiltração, respectivamente, ditando portanto a geração de escoamento superficial. Solos argilosos, por exemplo, apresentam menor permeabilidade do que solos arenosos. Também influencia a questão da umidade inicial do solo, ou seja, a umidade do solo no instante em que ocorre a precipitação. Obviamente, se o solo já está
  • 52. 52 urbanizada rural saturado ou com uma certa umidade, decorrente de uma precipitação anterior, ao ocorrer a nova precipitação sua capacidade de absorver essa água será nula ou bem inferior àquela se ele estivesse em condições normais, repercutindo na maior geração de escoamento superficial7 . Uso e ocupação do solo Analogamente ao tipo de solo, o tipo de atividade ou de ocupação da bacia reflete diretamente no escoamento superficial, pois áreas urbanas, florestas e campos agrícolas, por exemplo, apresentam diferentes comportamentos quanto à capacidade de infiltração e de armazenamento da água precipitada. Áreas urbanas apresentam praticamente toda a área coberta por superfícies impermeáveis, fazendo com que quase todo o total precipitado escoe superficialmente, ao passo que em áreas rurais uma parcela da precipitação infiltra no solo. Assim, no primeiro caso, o hidrograma apresenta um pico mais acentuado e que ocorre mais rápido do que no segundo caso, como ilustra a Figura 5.3. Figura 5.3 – Comparação esquemática entre os hidrogramas de uma bacia rural e depois na situação urbanizada (Fonte: adaptado de Tucci, 2000). Intervenções no rio Procurando atender suas necessidades, o homem tem alterado substancialmente os rios e arroios, seja na forma de barramentos como através de desvios, retificação e canalização do rio. A construção de barragens altera drasticamente a variação natural da vazão no rio a jusante da obra e, portanto, o hidrograma no trecho em questão é 7 Esse processo será melhor discutido em capítulo específico referente à Infiltração.
  • 53. 53 natural regularizada totalmente dependente do modo como é operada a barragem, do quanto de vazão ela “deixa passar” para jusante – a vazão no rio a jusante de uma barragem é normalmente referida como vazão regularizada (Figura 5.4). As intervenções humanas no sentido de retificar e canalizar o curso d’água também repercutem na forma do hidrograma, já que a canalização geralmente possibilita um fluxo mais rápido, com maiores velocidades do escoamento. Figura 5.4 – Comparação esquemática dos hidrogramas em um rio a montante (hidrograma natural) e a jusante de uma barragem (hidrograma regularizado) (Fonte: adaptado de Tucci, 2000). Características da precipitação Além dos demais fatores mencionados, que são função da própria bacia, as características da precipitação também influenciam bastante o formato do hidrograma. Chuvas rápidas mas com maior intensidade tendem a provocar hidrogramas com maiores picos do que chuvas de menor intensidade e maior duração, cujo hidrograma é “mais achatado”, ou seja, a vazão é mais uniforme ao longo tempo, relativamente ao primeiro caso – a Figura 5.5 traz um exemplo. Mas a distribuição espacial da chuva também repercute significativamente no aspecto do hidrograma, pois a ocorrência da precipitação em uma área próxima à seção do rio em análise vai gerar maiores vazões do que se essa mesma precipitação ocorresse apenas na cabeceira da bacia.
  • 54. 54 P1 P2 P1 P2 evapora arm. depres. infiltra gera escoam. superficial total total total total precipitado precipitado precipitado precipitado evapora arm. depres. infiltra gera escoam. superficial total total total total precipitado precipitado precipitado precipitado evapora evapora arm. depres. arm. depres. infiltra infiltra gera escoam. superficial gera escoam. superficial total total total total precipitado precipitado precipitado precipitado Figura 5.5 – Comparação esquemática entre os hidrogramas resultantes de uma precipitação mais concentrada no tempo (P1) e uma uniformemente distribuída no tempo (P2) (Fonte: adaptado de Tucci, 2000). Precipitação efetiva Como já comentado, a principal origem do escoamento superficial é a precipitação. Entretanto, apenas uma parcela da precipitação que atinge o solo gera escoamento superficial, já que parte evapora, infiltra ou fica armazenada em depressões do solo (Figura 5.6). Figura 5.6 – Principais “destinos” do total precipitado que atinge o solo. À parcela da precipitação que produz escoamento superficial dá-se o nome de precipitação efetiva. Para sua determinação, os principais métodos são aqueles que utilizam equações de infiltração, índices e o método SCS.
  • 55. 55 Na tentativa de representar o processo de infiltração da água no solo, foram desenvolvidas algumas equações, que serão descritas em capítulo posterior deste texto. Tais equações não são normalmente empregadas para a determinação da precipitação efetiva por requererem uma caracterização do solo da região, para estimar os parâmetros da infiltração, o que nem sempre está disponível. Índices O uso de índices consiste em um método simplificado de determinar a precipitação efetiva, através do emprego de um fator constante, chamado índice. Tal fator pode ser estimado a partir dos dados de vazão ou adotando-se um valor pré- ajustado com base em eventos anteriores de chuva ou com base no valor estimado para outras bacias com características semelhantes. O índice α α α α é um fator constante multiplicativo da precipitação total (P), cujo resultado é a precipitação efetiva (Pef), sendo seu valor geralmente entre 0,8 e 0,9 (Tucci, 2000): P Pef ⋅ = α Outro índice é o φ φ φ φ, cujo valor também constante deve ser subtraído do total precipitado para obter a precipitação efetiva: φ − = P Pef , onde φ pode ser determinado dividindo-se a diferença entre o total precipitado e o total escoado pelo número de intervalos de tempo em que a precipitação foi discretizada: t t t n Q P ∑ ∑ − = φ , onde Pt e Qt é a precipitação e a vazão no instante de tempo t, e nt é o número de intervalos de tempo. Seguindo o mesmo raciocínio, o índice w também constitui um valor constante a ser descontado da precipitação total para obter a precipitação efetiva: w P Pef − = , sendo que na estimativa de tal índice é considerado explicitamente um termo para contabilizar as perdas iniciais de precipitação – parâmetro S, cujo valor é adotado –:
  • 56. 56 t t t n S Q P w ∑ ∑ − − = Método SCS Esse método foi desenvolvido pelo Soil Conservation Service, do Departamento de Agricultura dos EUA, em 1957, baseado em estudos que procuraram correlacionar a precipitação total e a efetiva. Tais estudos indicaram uma relação do tipo: ( ) d d P P n n ef − + = , onde P é a precipitação total, Pef é a precipitação efetiva, n é um coeficiente empírico e d = P - Pef. Fazendo algumas suposições e considerações, foi obtida a seguinte expressão para determinação da precipitação efetiva: ( ) S P S P Pef 8 , 0 2 , 0 2 + − = (se P > 0,2S) onde S representa a retenção potencial do solo, isto é, a sua capacidade de armazenar água. Este método considera que para cada precipitação ocorrem perdas iniciais (evaporação, infiltração, etc) da ordem de 0,2S e, portanto, caso a precipitação seja inferior a tais perdas iniciais, não há formação de escoamento superficial, ou seja, a precipitação efetiva é zero: 0 = ef P (se P < 0,2S) Para estimar o valor de S, estabeleceu-se a relação desse parâmetro com um outro, o chamado CurveNumber (CN), que não possui significado físico em si mas tem seu valor diretamente relacionado ao tipo e umidade do solo e à ocupação da bacia. A relação entre S e CN é: 254 25400 − = CN S A definição do valor de CN é feita por consulta a valores tabelados, em função do tipo do solo, da umidade antecedente do solo (condições de umidade do solo anteriormente à ocorrência da precipitação que está sendo analisada), e do tipo de atividade/ocupação que é desenvolvida na bacia.
  • 57. 57 Grupo Descrição Fonte: Porto (1995). Solos barrentos com teor de argila de 20 a 30%, mas sem camadas argilosas impermeáveis ou contendo pedras até profundidades de 1,2m. No caso de terras roxas, esses dois limites máximos podem ser de 40% e 1,5m. Nota-se a cerca de 60 cm de profundidade, camada mais densificada que no Grupo B, mas ainda longe das condições de impermebialidade. C Solos argilosos (30 - 40% de argila total) e ainda com camada densificada a uns 50 cm de profundidade. Ou solos arenosos como do Grupo B, mas com camada argilosa quase impermeável, ou horizonte de seixos rolados. D Solos arenosos com baixo teor de argila total, inferior a 8%, não havendo rocha nem camadas argilosas, e nem mesmo densificadas até a profundidade de 1,5 m. O teor de húmus é muito baixo, não atingindo 1%. A Solos arenosos menos profundos que os do Grupo A e com menor teor de argila total, porém ainda inferior a 15%. No caso de terras roxas, esse limite pode subir a 20% graças à maior porosidade. Os dois teores de húmus podem subir, respectivamente, a 1,2 e 1,5%. Não pode haver pedras e nem camadas argilosas até 1,5m, mas é, quase sempre, presente camada mais densificada que a camada superficial. B Condição Descrição Fonte: Porto (1995). I Solo úmido (próximo da saturação): as chuvas, nos últimos cinco dias, foram superiores a 40 mm, e as condições meterológicas foram desfavoráveis a altas taxas de evaporação. III II Solos secos: as chuvas, nos últimos cinco dias, não ultrapassaram 15 mm. Situação média na época das cheias: as chuvas, nos últimos cinco dias, totalizaram de 15 a 40 mm. Inicialmente deve-se escolher o tipo de solo dentre os quatro grupos especificados na Tabela 5.1. Em seguida, é definida a condição de umidade antecedente do solo, sendo estabelecidas três condições especificadas na Tabela 5.2. Independente de qual condição de umidade do solo foi escolhida na tabela anterior, o próximo passo consiste em escolher o valor do CN para a condição de umidade II, conforme o uso do solo e o tratamento feito na sua superfície (Tabela 5.3). Por fim, caso a condição de umidade não seja a II, procede-se à conversão do valor do CN escolhido no passo anterior, utilizando-se da Tabela 5.4. Tabela 5.1 – Tipos de solo considerados pelo SCS para escolha do CN. Tabela 5.2 – Condições de umidade antecedente do solo considerados pelo SCS para escolha do CN.
  • 58. 58 A B C D Uso residencial Tamanho médio do lote % Impermeável até 500 m 2 65 77 85 90 92 1000 m 2 38 61 75 83 87 1500 m 2 30 57 72 81 86 Estacionamentos pavimentados, telhados 98 98 98 98 Ruas e estradas: pavimentadas, com guias e drenagens 98 98 98 98 com cascalho 76 85 89 91 de terra 72 82 87 89 Áreas comerciais (85% de impermebialização) 89 92 94 95 Distritos industriais (72% de impermebialização) 81 88 91 93 Espaços abertos, parques, jardins: boas condições, cobertura de grama > 75% 39 61 74 80 condições médias, cobertura de grama > 50% 49 69 79 84 Terreno preparado para plantio, descoberto plantio em linha reta 77 86 91 94 Culturas em fileira linha reta condições ruins 72 81 88 91 condições boas 67 78 85 89 curva de nível condições ruins 70 79 84 88 condições boas 65 75 82 86 Cultura de grãos linha reta condições ruins 65 76 84 88 condições boas 63 75 83 87 curva de nível condições ruins 63 74 82 85 condições boas 61 73 81 84 Pasto linha reta condições ruins 68 79 86 89 condições médias 49 69 79 84 condições boas 39 61 74 80 curva de nível condições ruins 47 67 81 88 condições médias 25 59 75 83 condições boas 6 35 70 79 Campos condições boas 30 58 71 78 Florestas condições ruins 45 66 77 83 condições médias 36 60 73 79 condições boas 25 55 70 77 Fonte: Porto (1995). Uso do solo/Tratamento/Condições hidrológicas Grupo hidrológico de solos Tabela 5.3 – Valores de CN em função da cobertura do solo e do tipo hidrológico de solo, para a condição de umidade II.
  • 59. 59 Fonte: Porto (1995). 15 30 50 23 40 60 19 35 55 31 50 70 27 45 65 40 60 79 35 55 75 51 70 87 45 65 83 63 80 94 57 75 91 78 90 98 70 85 97 100 100 100 87 95 99 Condições de umidade I II III Tabela 5.4 – Conversão dos valores de CN conforme as condições de umidade antecedente do solo. Transformação da precipitação em vazão Com já foi comentado em capítulos anteriores, o papel hidrológico da bacia hidrográfica é o de transformar uma entrada de volume de água concentrada no tempo – a precipitação – em uma saída de água mais distribuída no tempo – a vazão –. Isso é o que se chama de transformação chuva-vazão. Um dos principais interesses da hidrologia consiste justamente em estimar a transformação chuva-vazão, ou seja, tentar estimar qual a resposta da bacia hidrográfica dada a ocorrência de uma determinada precipitação. Isso tem grandes aplicações como, por exemplo, estimar os impactos sobre a vazão em um rio e sobre o meio ambiente decorrentes de mudanças na ocupação do solo, como a impermeabilização de áreas pela urbanização ou o desmatamento. Outro exemplo é a previsão e controle de enchentes. Há duas formas mais usadas para realizar a transformação chuva-vazão: (i) métodos simplificados que procuram estimar características do hidrograma; (ii) modelagem do processo “chuva-vazão”. No primeiro caso, são empregadas equações empíricas que estimam parâmetros como a vazão e o tempo de pico do hidrograma, por exemplo, sendo mais comuns os métodos racional e do hidrograma unitário. Utilizando modelos hidrológicos (modelos chuva-vazão), no outro caso, procura-se reproduzir os processos físicos envolvidos na
  • 60. 60 transformação chuva-vazão, sendo necessária uma grande quantidade de informações, como dados históricos observados chuva e vazão, caracterização espacial do tipo e uso do solo, parâmetros específicos para diversas equações, informações de relevo, rede de drenagem, etc, além de um alto custo de recursos e de tempo. Em função de fatores como objetivo do estudo, características da bacia (área, tempo de concentração, homogeneidade, rede de drenagem), escala de trabalho, disponibilidade e qualidade de informações, tempo e recursos disponíveis, deve-se optar entre as duas metodologias citadas para estimar a transformação chuva-vazão. Em projetos de drenagem urbana, geralmente são empregados métodos simplificados, como o racional e do hidrograma unitário, os quais são descritos a seguir. Método racional Esse método consiste apenas em estimar a vazão de pico do hidrograma para uma determinada bacia, considerando que a vazão é diretamente proporcional à área da bacia e à intensidade da chuva. Essa consideração assume que a precipitação ocorre uniformemente em toda a área da bacia, e também que a intensidade é constante ao longo da duração da precipitação – em outras palavras, distribuição espacial e temporal uniformes da precipitação. A expressão do método racional, adotando unidades usuais para a área da bacia e a intensidade da chuva, é: A i C Qp ⋅ ⋅ ⋅ = 275 , 0 , onde Qp é a vazão de pico do hidrograma; i é a intensidade da chuva (mm/h); A é a área da bacia (km2 ); C é o coeficiente de escoamento superficial (adimensional); e o valor 0,275 é usado para conversão de unidades. O valor do coeficiente C é escolhido conforme o tipo de ocupação do solo, denotando uma maior ou menor tendência à geração de escoamento superficial (Tabela 5.5). Caso a ocupação da bacia seja relativamente diversificada, podendo-se identificar sub-áreas homogêneas, correspondendo a diferentes valores do coeficiente de escoamento superficial, o valor a adotar pode ser determinado pela média ponderada daqueles referentes a cada sub-área: ∑ = ⋅ = n j j j m A C A C 1 ) ( 1 ,