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Por que eu gosto tanto
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• Possibilidade de sentir uma emoção profunda em pouco tempo
• Estrutura simples e eficaz
Por que você deve ler e estudar contos?
• Desenvolvimento de habilidades técnicas essenciais
• Experimentar diferentes gêneros
• Portifólio
• Revistas e Coletâneas
O que é o conto
• Narrativa breve
• Situação inicial + Escalada da situação inicial > Clímax
A estrutura do conto está presente nas narrativas
que consumimos diariamente
Para Cortázar, o conto está mais próximo do poema do que do romance.
“Tal como o poema, o conto é uma ‘síntese implacável de uma certa condição
humana’”.
"Vietnã", de Wislawa Szymborska
Mulher, como você se chama? - Não sei.
Quando você nasceu, de onde você vem? - Não sei.
Para que cavou uma toca na terra? - Não sei.
Desde quando está está aqui escondida? - Não sei.
Por que mordeu o meu dedo anular? Não sei.
Não sabe que não vamos te fazer nenhum mal? - Não sei.
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A técnica C.R.I.
• Coesão
• Ritmo/ Tensão
• Impacto
Coesão
Cortázar diz que um bom conto deve ter uma estrutura coesa, na qual cada parte
tenha uma função no edifício geral da obra.
Ritmo
O ritmo é a batida que dá vida ao seu conto. É ele que mantém os leitores presos e ansiosos por virar a próxima
página. É necessário criar uma cadência envolvente, alternando momentos de tensão e alívio, e sobretudo sabendo
levar a tensão dramática ao limite.
Impacto
Para Cortázar, um conto memorável é aquele capaz de projetar a imaginação do leitor
para além das palavras.
Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de
Ela estava em meio à multidão ondulante na estação da North Wall. Frank segurava a mão dela e ela notou
que ele estava falando, dizendo e redizendo alguma coisa sobre a passagem. A estação estava cheia de
soldados com bagagens marrons. Pelas amplas portas dos armazéns ela vislumbrou o vulto negro do barco,
parado ao lado do muro do cais com as vigias iluminadas. Ela não respondeu nada. Sentiu o rosto pálido e
frio e, em um labirinto de sofrimento, rezou a Deus para que a guiasse, para que indicasse o caminho do
dever. O barco soltou um longo apito triste em meio à neblina. Se fosse embora, amanhã estaria no mar
com Frank, deixando uma trilha de vapor a caminho de Buenos Aires. A passagem estava reservada. Será
que ainda seria possível mudar de ideia depois de tudo o que ele tinha feito? O sofrimento despertou-lhe
uma náusea no corpo e ela continuou movendo os lábios em uma ardorosa oração muda.
Um sino dobrou no peito dela. Sentiu quando Frank tomou-lhe a mão:
- Venha.
Todos os mares do mundo desaguavam no peito dela. Ele a puxava para o fundo: acabaria por afogá-la. Ela
se agarrou com as duas mãos à balaustrada de ferro.
- Venha!
Não! Não! Não! Era impossível. As mãos se agarravam desesperadas ao metal. Em meio aos mares ela
soltou um grito de angústia!
- Eveline! Evvy!
Frank tinha ultrapassado a barreira e naquele instante a chamava. Outras vozes gritavam para que andasse,
mas ele continuava a chamar. Ela voltou o semblante branco em direção a ele, passiva, como um animal
indefeso. Nos olhos dela não havia sinal de amor, despedida ou reconhecimento.
Trecho final de Eveline, de James Joyce
Todo dia, meu pai cavava em nosso terreno à procura de ouro.
Todo dia, toda semana, todo mês.
Desistimos de tentar convencê-lo de que aquilo era ridículo, e passamos a
ajudá-lo.
Demos a ele uma pá de dia dos pais, uma peneira de aniversário, grossas
luvas no natal.
Anos após sua morte, comecei a cavar, saudoso de seu jeito excêntrico.
E foi quando encontrei os corpos.
Microconto de Rodrigo Vataha
Um bom conto precisa ter...
1) Tensão e intensidade — O conto parte da noção de limite e, em primeiro lugar, de limite físico.
Assim, deve conter, compactar as situações, uma vez que os desenvolvimentos narrativos cabem mais à
novela e ao romance.
2) Significação — O conto, como a fotografia, “recorta um fragmento da realidade”, devendo,
portanto, ser “significativo”. Isto é, capaz de uma “abertura” que projete a inteligência e a sensibilidade do
leitor para além da história narrada.
“O instante
decisivo”
Ao acordar, disse para a mulher:
— Escuta, minha filha: hoje é dia de pagar a prestação da televisão, vem aí o sujeito com a conta, na certa.
Mas acontece que ontem eu não trouxe dinheiro da cidade, estou a nenhum.
— Explique isso ao homem — ponderou a mulher.
— Não gosto dessas coisas. Dá um ar de vigarice, gosto de cumprir rigorosamente as minhas obrigações.
Escuta: quando ele vier a gente fica quieto aqui dentro, não faz barulho, para ele pensar que não tem
ninguém. Deixa ele bater até cansar — amanhã eu pago.
Pouco depois, tendo despido o pijama, dirigiu-se ao banheiro para tomar um banho, mas a mulher já se
trancara lá dentro. Enquanto esperava, resolveu fazer um café. Pôs a água a ferver e abriu a porta de serviço
para apanhar o pão. Como estivesse completamente nu, olhou com cautela para um lado e para outro
antes de arriscar-se a dar dois passos até o embrulhinho deixado pelo padeiro sobre o mármore do
parapeito. Ainda era muito cedo, não poderia aparecer ninguém. Mal seus dedos, porém, tocavam o pão, a
porta atrás de si fechou-se com estrondo, impulsionada pelo vento.
Aterrorizado, precipitou-se até a campainha e, depois de tocá-la, ficou à espera, olhando ansiosamente ao
redor. Ouviu lá dentro o ruído da água do chuveiro interromper-se de súbito, mas ninguém veio abrir. Na
certa a mulher pensava que já era o sujeito da televisão. Bateu com o nó dos dedos:
— Maria! Abre aí, Maria. Sou eu — chamou, em voz baixa. Quanto mais batia, mais silêncio fazia lá dentro.
Enquanto isso, ouvia lá embaixo a porta do elevador fechar-se, viu o ponteiro subir lentamente os andares...
Desta vez, era o homem da televisão! Não era.
Fernando Sabino | “O homem nu”
Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão:
— Maria, por favor! Sou eu!
Desta vez não teve tempo de insistir: ouviu passos na escada, lentos, regulares, vindos lá de baixo... Tomado
de pânico, olhou ao redor, fazendo uma pirueta, e assim despido, embrulho na mão, parecia executar um
ballet grotesco e mal ensaiado. Os passos na escada se aproximavam, e ele sem onde se esconder. Correu
para o elevador, apertou o botão. Foi o tempo de abrir a porta e entrar, e a empregada passava, vagarosa,
encetando a subida de mais um lanço de escada. Ele respirou aliviado, enxugando o suor da testa com o
embrulho do pão.
Mas eis que a porta interna do elevador se fecha e ele começa a descer.
— Ah, isso é que não! — fez o homem nu, sobressaltado.
E agora? Alguém lá embaixo abriria a porta do elevador e daria com ele ali, em pêlo, podia mesmo ser
algum vizinho conhecido... Percebeu, desorientado, que estava sendo levado cada vez para mais longe de
seu apartamento, começava a viver um verdadeiro pesadelo de Kafka, instaurava-se naquele momento o
mais autêntico e desvairado Regime do Terror!
— Isso é que não — repetiu, furioso.
Agarrou-se à porta do elevador e abriu-a com força entre os andares, obrigando-o a parar. Respirou fundo,
fechando os olhos, para ter a momentânea ilusão de que sonhava. Depois experimentou apertar o botão do
seu andar. Lá embaixo continuavam a chamar o elevador. Antes de mais nada:
Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão:
“Emergência: parar". Muito bem. E agora? Iria subir ou descer? Com cautela desligou a parada de
emergência, largou a porta, enquanto insistia em fazer o elevador subir.
O elevador subiu.
— Maria! Abre esta porta! — gritava, desta vez esmurrando a porta, já sem nenhuma cautela. Ouviu que
outra porta se abria atrás de si.
Voltou-se, acuado, apoiando o traseiro no batente e tentando inutilmente cobrir-se com o embrulho de
pão. Era a velha do apartamento vizinho:
— Bom dia, minha senhora — disse ele, confuso. — Imagine que eu... A velha, estarrecida, atirou os braços
para cima, soltou um grito:
— Valha-me Deus! O padeiro está nu!
E correu ao telefone para chamar a radiopatrulha:
— Tem um homem pelado aqui na porta!
Outros vizinhos, ouvindo a gritaria, vieram ver o que se passava:
— É um tarado! — Olha, que horror! — Não olha não! Já pra dentro, minha filha! Maria, a esposa do infeliz,
abriu finalmente a porta para ver o que era. Ele entrou como um foguete e vestiu-se precipitadamente, sem
nem se lembrar do banho. Poucos minutos depois, restabelecida a calma lá fora, bateram na porta.
— Deve ser a polícia — disse ele, ainda ofegante, indo abrir.
Não era: era o cobrador da televisão.

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  • 3. Por que eu gosto tanto de contos? • Possibilidade de sentir uma emoção profunda em pouco tempo • Estrutura simples e eficaz
  • 4. Por que você deve ler e estudar contos? • Desenvolvimento de habilidades técnicas essenciais • Experimentar diferentes gêneros • Portifólio • Revistas e Coletâneas
  • 5. O que é o conto • Narrativa breve • Situação inicial + Escalada da situação inicial > Clímax
  • 6. A estrutura do conto está presente nas narrativas que consumimos diariamente
  • 7. Para Cortázar, o conto está mais próximo do poema do que do romance. “Tal como o poema, o conto é uma ‘síntese implacável de uma certa condição humana’”.
  • 8. "Vietnã", de Wislawa Szymborska Mulher, como você se chama? - Não sei. Quando você nasceu, de onde você vem? - Não sei. Para que cavou uma toca na terra? - Não sei. Desde quando está está aqui escondida? - Não sei. Por que mordeu o meu dedo anular? Não sei. Não sabe que não vamos te fazer nenhum mal? - Não sei. De que lado você está? - Não sei. É a guerra, você tem que escolher. - Não sei. Tua aldeia ainda existe? - Não sei. Esses são teus filhos? - São.
  • 9. A técnica C.R.I. • Coesão • Ritmo/ Tensão • Impacto
  • 10. Coesão Cortázar diz que um bom conto deve ter uma estrutura coesa, na qual cada parte tenha uma função no edifício geral da obra.
  • 11. Ritmo O ritmo é a batida que dá vida ao seu conto. É ele que mantém os leitores presos e ansiosos por virar a próxima página. É necessário criar uma cadência envolvente, alternando momentos de tensão e alívio, e sobretudo sabendo levar a tensão dramática ao limite.
  • 12. Impacto Para Cortázar, um conto memorável é aquele capaz de projetar a imaginação do leitor para além das palavras.
  • 13. Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de Ela estava em meio à multidão ondulante na estação da North Wall. Frank segurava a mão dela e ela notou que ele estava falando, dizendo e redizendo alguma coisa sobre a passagem. A estação estava cheia de soldados com bagagens marrons. Pelas amplas portas dos armazéns ela vislumbrou o vulto negro do barco, parado ao lado do muro do cais com as vigias iluminadas. Ela não respondeu nada. Sentiu o rosto pálido e frio e, em um labirinto de sofrimento, rezou a Deus para que a guiasse, para que indicasse o caminho do dever. O barco soltou um longo apito triste em meio à neblina. Se fosse embora, amanhã estaria no mar com Frank, deixando uma trilha de vapor a caminho de Buenos Aires. A passagem estava reservada. Será que ainda seria possível mudar de ideia depois de tudo o que ele tinha feito? O sofrimento despertou-lhe uma náusea no corpo e ela continuou movendo os lábios em uma ardorosa oração muda. Um sino dobrou no peito dela. Sentiu quando Frank tomou-lhe a mão: - Venha. Todos os mares do mundo desaguavam no peito dela. Ele a puxava para o fundo: acabaria por afogá-la. Ela se agarrou com as duas mãos à balaustrada de ferro. - Venha! Não! Não! Não! Era impossível. As mãos se agarravam desesperadas ao metal. Em meio aos mares ela soltou um grito de angústia! - Eveline! Evvy! Frank tinha ultrapassado a barreira e naquele instante a chamava. Outras vozes gritavam para que andasse, mas ele continuava a chamar. Ela voltou o semblante branco em direção a ele, passiva, como um animal indefeso. Nos olhos dela não havia sinal de amor, despedida ou reconhecimento. Trecho final de Eveline, de James Joyce
  • 14. Todo dia, meu pai cavava em nosso terreno à procura de ouro. Todo dia, toda semana, todo mês. Desistimos de tentar convencê-lo de que aquilo era ridículo, e passamos a ajudá-lo. Demos a ele uma pá de dia dos pais, uma peneira de aniversário, grossas luvas no natal. Anos após sua morte, comecei a cavar, saudoso de seu jeito excêntrico. E foi quando encontrei os corpos. Microconto de Rodrigo Vataha
  • 15. Um bom conto precisa ter... 1) Tensão e intensidade — O conto parte da noção de limite e, em primeiro lugar, de limite físico. Assim, deve conter, compactar as situações, uma vez que os desenvolvimentos narrativos cabem mais à novela e ao romance. 2) Significação — O conto, como a fotografia, “recorta um fragmento da realidade”, devendo, portanto, ser “significativo”. Isto é, capaz de uma “abertura” que projete a inteligência e a sensibilidade do leitor para além da história narrada.
  • 17.
  • 18. Ao acordar, disse para a mulher: — Escuta, minha filha: hoje é dia de pagar a prestação da televisão, vem aí o sujeito com a conta, na certa. Mas acontece que ontem eu não trouxe dinheiro da cidade, estou a nenhum. — Explique isso ao homem — ponderou a mulher. — Não gosto dessas coisas. Dá um ar de vigarice, gosto de cumprir rigorosamente as minhas obrigações. Escuta: quando ele vier a gente fica quieto aqui dentro, não faz barulho, para ele pensar que não tem ninguém. Deixa ele bater até cansar — amanhã eu pago. Pouco depois, tendo despido o pijama, dirigiu-se ao banheiro para tomar um banho, mas a mulher já se trancara lá dentro. Enquanto esperava, resolveu fazer um café. Pôs a água a ferver e abriu a porta de serviço para apanhar o pão. Como estivesse completamente nu, olhou com cautela para um lado e para outro antes de arriscar-se a dar dois passos até o embrulhinho deixado pelo padeiro sobre o mármore do parapeito. Ainda era muito cedo, não poderia aparecer ninguém. Mal seus dedos, porém, tocavam o pão, a porta atrás de si fechou-se com estrondo, impulsionada pelo vento. Aterrorizado, precipitou-se até a campainha e, depois de tocá-la, ficou à espera, olhando ansiosamente ao redor. Ouviu lá dentro o ruído da água do chuveiro interromper-se de súbito, mas ninguém veio abrir. Na certa a mulher pensava que já era o sujeito da televisão. Bateu com o nó dos dedos: — Maria! Abre aí, Maria. Sou eu — chamou, em voz baixa. Quanto mais batia, mais silêncio fazia lá dentro. Enquanto isso, ouvia lá embaixo a porta do elevador fechar-se, viu o ponteiro subir lentamente os andares... Desta vez, era o homem da televisão! Não era. Fernando Sabino | “O homem nu”
  • 19. Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão: — Maria, por favor! Sou eu! Desta vez não teve tempo de insistir: ouviu passos na escada, lentos, regulares, vindos lá de baixo... Tomado de pânico, olhou ao redor, fazendo uma pirueta, e assim despido, embrulho na mão, parecia executar um ballet grotesco e mal ensaiado. Os passos na escada se aproximavam, e ele sem onde se esconder. Correu para o elevador, apertou o botão. Foi o tempo de abrir a porta e entrar, e a empregada passava, vagarosa, encetando a subida de mais um lanço de escada. Ele respirou aliviado, enxugando o suor da testa com o embrulho do pão. Mas eis que a porta interna do elevador se fecha e ele começa a descer. — Ah, isso é que não! — fez o homem nu, sobressaltado. E agora? Alguém lá embaixo abriria a porta do elevador e daria com ele ali, em pêlo, podia mesmo ser algum vizinho conhecido... Percebeu, desorientado, que estava sendo levado cada vez para mais longe de seu apartamento, começava a viver um verdadeiro pesadelo de Kafka, instaurava-se naquele momento o mais autêntico e desvairado Regime do Terror! — Isso é que não — repetiu, furioso. Agarrou-se à porta do elevador e abriu-a com força entre os andares, obrigando-o a parar. Respirou fundo, fechando os olhos, para ter a momentânea ilusão de que sonhava. Depois experimentou apertar o botão do seu andar. Lá embaixo continuavam a chamar o elevador. Antes de mais nada:
  • 20. Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão: “Emergência: parar". Muito bem. E agora? Iria subir ou descer? Com cautela desligou a parada de emergência, largou a porta, enquanto insistia em fazer o elevador subir. O elevador subiu. — Maria! Abre esta porta! — gritava, desta vez esmurrando a porta, já sem nenhuma cautela. Ouviu que outra porta se abria atrás de si. Voltou-se, acuado, apoiando o traseiro no batente e tentando inutilmente cobrir-se com o embrulho de pão. Era a velha do apartamento vizinho: — Bom dia, minha senhora — disse ele, confuso. — Imagine que eu... A velha, estarrecida, atirou os braços para cima, soltou um grito: — Valha-me Deus! O padeiro está nu! E correu ao telefone para chamar a radiopatrulha: — Tem um homem pelado aqui na porta! Outros vizinhos, ouvindo a gritaria, vieram ver o que se passava: — É um tarado! — Olha, que horror! — Não olha não! Já pra dentro, minha filha! Maria, a esposa do infeliz, abriu finalmente a porta para ver o que era. Ele entrou como um foguete e vestiu-se precipitadamente, sem nem se lembrar do banho. Poucos minutos depois, restabelecida a calma lá fora, bateram na porta. — Deve ser a polícia — disse ele, ainda ofegante, indo abrir. Não era: era o cobrador da televisão.