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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
FACULDADE DE FARMÁCIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ASSISTÊNCIA E
AVALIAÇÃO EM SAÚDE
CRISTIANE NOGUEIRA DA COSTA
Práticas de cuidado de um CAPS ADI III a partir do Projeto
Terapêutico Singular
Goiânia
2022
ii
iii
CRISTIANE NOGUEIRA DA COSTA
Práticas de cuidado de um CAPS ADI III a partir do
Projeto Terapêutico Singular
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Assistência e
Avaliação em Saúde em 2022, da Faculdade de
Farmácia, da Universidade Federal de Goiás
como requisito para obtenção do Título Mestre
em Assistência e Avaliação em Saúde.
Área de concentração: Assistência e Avaliação em Saúde
Orientador: Dra. Silva Helena Rabelo dos Santos
Coorientador: Dr. Reginaldo Teixeira Mendonça
Goiânia
2022
iv
v
vi
vii
Dedico este trabalho ao meu
irmão que me incentivou a retomar
meus sonhos.
viii
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus por me permitir vivenciar este sonho de
ingressar no Mestrado nesta instituição que sempre admirei.
A minha mãe por ter me dado a vida e por ter me apoiado no meu
percurso até aqui.
Ao meu irmão, por me incentivar a sempre progredir na carreira
profissional e acadêmica, me oferecendo suporte.
Ao professor e orientador Reginaldo que aceitou o desafio de estar
comigo nesta caminhada, mesmo de forma inesperada, sempre se mostrando
compreensivo com minhas limitações, conduzindo minha busca pelo
conhecimento, mas permitindo que eu desenvolvesse esta pesquisa com
autonomia.
A minha amiga Sandra, farmacêutica, com quem tive a oportunidade
de compartilhar o processo de trabalho e me apresentou este programa de
mestrado.
As amigas e colegas do curso e do trabalho que sempre me ofereçam
a escuta e se dispuseram a discutir comigo minhas angústias
Ao meu noivo por escutar minhas demandas e sempre fortalecer a
minha autoestima, autoeficácia e autoconfiança durante o percurso.
A Secretaria de Saúde do Município de Aparecida de Goiânia por
permitir o desenvolvimento desta pesquisa.
Ao CAPS ADi por me proporcionar tantas vivências e aprendizados.
E especialmente, aos usuários, familiares e trabalhadores que
aceitaram participar desta pesquisa e tornaram tudo isso possível.
ix
As coisas não são
ultrapassadas tão facilmente,
são transformadas (Nise da
Silveira)
x
SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS
CAPS -Centro de Atenção Psicossocial
CAPS AD – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas
CAPS ADi – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas Infanto-
Juvenil
CAPSi – Centro de Atenção Psicossocial Infantil
CEBES – Centro Brasileiro de Estudo em Saúde
CEP - Comitê de Ética em Pesquisa
CNSM - Conferência Nacional de Saúde Mental
COVID-19 - Corona Virus Disease (Doença do Coronavírus) que teve
reaparecimento de casos em 2019
CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito
CSM - Centros de Saúde Mental
CVC - Centro de Valorização da Criança e do Adolescente
DINSAM - Divisão Nacional de Saúde Mental
ESF - Estratégia de Saúde em Família
EUA – Estados Unidos da América
FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz
HIV/Aids - Vírus da Imunodeficiência Humana/Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida
HPII - Hospício de Pedro II
INPS - Instituto Nacional de Previdência Social
MTSM - Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
NAPS - Núcleo de Atenção Psicossocial
PAIUAD - Política de Atenção Integral aos Usuários de Álcool e outras Drogas
xi
PTI – Projeto Terapêutico Individual
PTS – Projeto Terapêutico Singular
RAPS - Rede de Atenção Psicossocial
REME - Renovação Médica
SUS – Sistema Único de Saúde
SP – São Paulo
TALE - Termo de Assentimento Livre e Esclarecido
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TO – Terapeuta Ocupacional
UFG - Universidade Federal de Goiás
xii
RESUMO
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como serviços substitutivos e
estratégicos na assistência aos indivíduos com sofrimento psíquico no
contexto social e de saúde, sendo responsáveis, no âmbito do seu território,
pela organização da demanda e da rede de cuidados em saúde mental. Uma
das ferramentas utilizadas no CAPS o Projeto Terapêutico Singular (PTS),
sendo importante ferramenta de cuidado, resultado de discussão coletiva de
equipe interdisciplinar, usuário e família, visando o protagonismo no usuário,
a singularização das práticas em saúde, a territorialização do cuidado e
promovendo a corresponsabilização nas ações pactuadas. Neste contexto o
objetivo desse trabalho é descrever e analisar como ocorre a construção e
operacionalização do Projeto Terapêutico Singular em um Centro de
Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas Infanto-Juvenil (CAPS ADi) da
região metropolitana de Goiânia -GO. Esta é uma pesquisa exploratório-
descritiva, de abordagem qualitativa. O cenário do estudo foi o CAPS ADi III
de Aparecida de Goiânia, sendo que participaram usuários, familiares e
trabalhadores que são envolvidos na construção compartilhada do PTS. A
coleta dos dados foi realizada com entrevista semiestruturadas e a
organização e interpretação dos dados ocorreu utilizando a técnica Análise
de Conteúdo proposta por Minayo. Os resultados apontam ainda
dissonância e contradições entre a prática e os pressupostos teóricos nos
processos terapêuticos e na forma como é construído e operacionalizado o
projeto terapêutico singular no CAPS ADi. Observou-se que as ações em
saúde mental neste serviço são permeadas pelos dois paradigmas de
atenção: manicomial e psicossocial. No entanto, como a proposta de reforma
psiquiátrica é relativamente recente, os saberes e práticas ainda passam por
um momento de transição pragmática, tendo avanços e retrocessos
característicos dos processos de mudança.
Palavras-chave: Projeto Terapêutico Singular, CAPS, Saúde Mental
Infantojuvenil
xiii
ABSTRACT
Psychosocial Care Centers (CAPS) as substitutive and strategic services in
assisting individuals with psychological distress in the social and health
context, being responsible, within their territory, for the organization of
demand and the network of mental health care. One of the tools used in
CAPS is the Singular Therapeutic Project (PTS), being an important care
tool, the result of a collective discussion by an interdisciplinary team, user
and family, aiming at the protagonism in the user, the singularization of
health practices, the territorialization of care and promoting co-responsibility
in the agreed actions. In this context, the objective of this work is to describe
and analyze how the construction and operation of the Singular Therapeutic
Project occurs in a Psychosocial Care Center for Alcohol and Other Drugs for
Children and Youth (CAPS ADi) in the metropolitan region of Goiânia -GO.
This is an exploratory-descriptive research, with a qualitative approach. The
study setting was the CAPS ADi III in Aparecida de Goiânia, with the
participation of users, family members and workers who are involved in the
shared construction of the PTS. Data collection was carried out with semi-
structured interviews and the organization and interpretation of data took
place using the Content Analysis technique proposed by Minayo. The results
also point to dissonance and contradictions between the practice and the
theoretical assumptions in the therapeutic processes and in the way in which
the singular therapeutic project is constructed and operationalized in CAPS
ADi. It was observed that the actions in mental health in this service are
permeated by two paradigms of care: asylum and psychosocial. However, as
the psychiatric reform proposal is relatively recent, knowledge and practices
are still undergoing a moment of pragmatic transition, with advances and
setbacks characteristic of the processes of change.
Keyword: Singular Therapeutic Project, CAPS, Children's Mental Health
xiv
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................... 8
1. REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................................... 11
1.1. A REFORMA PSIQUIÁTRICA........................................................................................ 11
1.2. PRÁTICAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL .......................................................... 27
1.3. UMA NOVA PROPOSTA DE CLÍNICA.......................................................................... 32
1.4. PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR......................................................................... 39
2. JUSTIFICATIVA ..................................................................................................................... 45
3. OBJETIVOS............................................................................................................................ 46
4. MÉTODO(S)............................................................................................................................ 47
4.1. DELINEAMENTO DO ESTUDO ..................................................................................... 47
4.2. CENÁRIO DO ESTUDO ................................................................................................. 47
4.3. AMOSTRA POPULACIONAL: ....................................................................................... 50
4.4. PROCEDIMENTOS:........................................................................................................ 52
4.5. ANÁLISE DOS DADOS.................................................................................................. 53
4.6. ASPECTOS ÉTICOS ...................................................................................................... 54
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................. 56
5.1. CONCEPÇÕES SOBRE AS PRÁTICAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL ........... 56
5.2. PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR......................................................................... 64
5.3. LIMITES, DIFICULDADES E DESAFIOS RELACIONADOS AO PTS.......................... 83
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................... 95
7. REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 97
8. ANEXOS ............................................................................................................................... 109
ANEXO 1 – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA ................................................................. 110
ANEXO 2 – TERMO DE ASSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .............................. 117
ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(TRABALHADORES)............................................................................................................ 120
xv
ANEXO 4 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(RESPONSÁVEIS) ................................................................................................................ 124
ANEXO 5 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (TRABALHADORES) ..................................... 129
ANEXO 6 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (ADOLESCENTES) ........................................ 131
ANEXO 7 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (RESPONSÁVEIS).......................................... 133
ANEXO 8 – PRODUTO TÉCNICO – CAPÍTULO DE LIVRO .............................................. 135
ANEXO 9 – SUBMISSÃO DE PRODUTO ........................................................................... 150
8
APRESENTAÇÃO
O presente estudo foi desenvolvido a partir das reflexões e práticas
surgidas ao longo de nove anos de trabalho da pesquisadora em saúde
mental. Dois desses foram no modelo asilar e sete em Centro de Atenção
Psicossocial. As inquietações foram se intensificando com as leituras sobre
as práticas de cuidado aos indivíduos com sofrimento psíquico e sobre os
pressupostos propostos pela Reforma Psiquiátrica, sendo que eu já
observava no meu cotidiano de trabalho nas instituições, que este
movimento de mudança ainda estava em processo.
A vivência de dificuldades relacionadas ao Projeto Terapêutico
Singular (PTS) no CAPS ADi despertaram a necessidade de buscar ampliar
a compreensão deste instrumento de gestão do cuidado, tanto em aspectos
teóricos como quanto aos atores envolvidos no processo terapêutico, sendo
que estas inquietações deflagraram esta pesquisa.
Este trabalho se inscreve no campo de atenção psicossocial, em um
cenário pós reforma psiquiátrica, que demandou não apenas a substituição e
criação de novos dispositivos de cuidado, mas demandou a reflexão e
inovação de saberes e práticas na área de saúde mental. Propõe-se a
horizontalização da relação entre equipe e população usuária, sendo que o
processo terapêutico não tem como foco apenas o binômio cura-doença,
mas a produção de novas formas de vida. O foco de atuação não é apenas o
indivíduo, mas a sua família e o contexto em que e se insere. O usuário é o
protagonista do processo e as ações visam o fortalecimento de sua
autonomia e a construção de um cuidado coletivo. Sendo este processo
relativamente recente, faz-se necessário pesquisas que apreendam como
estão se configurando este movimento de mudança do cuidado em saúde
mental nos serviços substitutivos.
Neste contexto, esta pesquisa visou compreender e discutir como os
atores envolvidos no processo terapêutico no CAPS ADi apreendem e
9
participam do projeto terapêutico singular que orientam o cuidado neste novo
modo de atenção. Tem-se o foco na utilização do Projeto Terapêutico
Singular no CAPS, sendo que nesta perspectiva visa o planejamento e
organização das ações em saúde mental buscando a centralidade no sujeito,
respeitando sua singularidade, práticas em saúde no território, levando em
consideração o contexto em que o sujeito está inserido. O PTS demanda
uma construção coletiva promovendo a participação ativa dos envolvidos no
processo terapêutico (usuário-família-equipe) propiciando a
corresponsabilização e pactuação compartilhada de objetivos e ações.
Nesta perspectiva esta dissertação é organizada em cinco partes.
Inicia-se pelo referencial teórico em se que descreve o processo da reforma
psiquiátrica no mundo e no Brasil demonstrando como foi deflagrado e
construído esse movimento de mudança na forma de cuidado aos usuários,
com a construção e reconstrução de ações que culminaram na
desinstitucionalização, criação de serviços substitutivos aos manicômios e a
proposta de um novo modelo de atenção em saúde, denominado
psicossocial, em oposição ao hospitalocêntrico. Posteriormente, discute-se
sobre os paradigmas de atenção em saúde mental, expondo características
do modelo manicomial e do modelo psicossocial. Discute-se ainda nas
formas de fazer a clínica nessa nova perspectiva de cuidado da mudança do
foco biomédico para uma proposta ampliada de intervenção. Por fim,
discute-se sobre o PTS na saúde mental, sendo que foi apreendido neste
cenário nas primeiras experiências de cuidado no CAPS e propõe a
organização no cuidado nos serviços substitutivos.
Na parte II ocorre a apresentação dos argumentos que justificaram o
desenvolvimento desta pesquisa e os objetivos que se propõe a alcançar.
Na parte III apresentou-se a metodologia utilizada no estudo, o delineamento
do estudo, o cenário, os sujeitos, os procedimentos, a coleta de dados e
como ocorreu a análise dos dados. Nesta parte também se discutiu sobre
aspectos éticos que permearam o desenvolvimento da pesquisa.
Na parte IV ocorre a apresentação e discussão dos dados que foram
organizados em três categorias: Concepções sobre as práticas de cuidado
10
em saúde mental, Projeto Terapêutico Singular e Desafios, Dificuldades e
obstáculos relacionados ao Projeto Terapêutico Singular.
Por fim, na parte V são traçadas as considerações finais a respeito da
pesquisa.
11
1. REFERENCIAL TEÓRICO
1.1. A Reforma Psiquiátrica
Durante muitos anos a psiquiatria desempenhou o papel de controle
dos sujeitos sociais desviantes. Os pacientes psiquiátricos eram excluídos
da sociedade, marginalizados e desprovidos de sua autonomia e
independência. Para abriga-los e para mantê-los distantes do meio que,
segundo a crença da época os deixavam insanos, foram construídos
grandes e cruéis manicômios. O principal foco do tratamento era a doença.
A assistência ao paciente em sofrimento psiquiátrico era caracterizada pela
repressão, punição e vigilância. O doente mental não recebia tratamento
digno, sendo tratado, muitas vezes com violência. O tratamento com foco na
doença, sem estímulo das potencialidades, que eram reduzidas até os
indivíduos se tornarem incapazes de retornar ao convívio social (1).
O modelo da psiquiatria tradicional baseava na tese psiquiatrizante,
surgida com base no paradigma científico positivista, no final do século XIX,
em contraposição a visão medieval de saúde como “dádiva de Deus” e de
doença e loucura como “pecado” ou “possessão demoníaca”. O pilar de
sustentação epistêmico é a noção de “doença mental” tendo como
pressupostos o conceito de “doença” com o determinismo organicista
explicando o fenômeno do sofrimento psíquico e o termo “mental”
relacionado ao racionalismo e dualismo cartesiano, implicando a percepção
do sofrimento psíquico como desordem de caráter individual, decorrentes da
perda da razão e do afastamento da lógica socialmente aceita (2).
Nessa perspectiva da psiquiatria tradicional, o tratamento ocorria
exclusivamente dentro dos hospitais psiquiátricos. No século XVII estas
instituições passaram a exercer também função social e disciplinar,
12
recebendo além dos pobres e necessitados, os delinquentes e loucos. Marco
importante desse processo foi a criação do Hospital Geral na França, sendo
que a internação desses pacientes passou a ser determinada por
autoridades reais e judiciárias. Nestas instituições, denominadas
manicômios, centenas ou milhares de pessoas permaneceram amontoadas
em pavilhões e pátios. Tinham como objetivo a segregação da sociedade
das pessoas que não se encaixavam nos padrões sociais, incluindo os
loucos. Até antes dessa transformação a loucura tinha múltiplos significados
e lugares. Os loucos eram vistos como demônios, endeusados e ocupavam
ruas, asilos prisões, igrejas. No entanto o advento do hospital geral foi
fundamental para definir um novo lugar social para a loucura (3,4).
Após a Revolução Francesa, os médicos ocuparam essa nova
modalidade de instituição e iniciaram uma atuação no sentido de humaniza-
las, inspirados pelo lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” existia o
objetivo de sanear o aspecto insalubre e de superar a natureza de violência
e exclusão social que os hospitais representavam. Com a intervenção
médica foram libertados vários internos que ali estavam em decorrência de
outros regimes e os hospitais iniciaram um processo de mudança, perdendo
as funções de caridade e controle, passando a assumir funções de
tratamento dos enfermos (5).
Logo os médicos passaram a gerir essas instituições e serem os
detentores máximos do poder, tornado o hospital a principal instituição
médica e a medicina se tornou uma prática e um saber predominantemente
hospitalar, caracterizando o processo denominado medicalização do
hospital. Estas instituições tornaram-se o espaço de exame, tratamento e
reprodução do saber médico. Com isolamento do doente, podia-se ter
controle e vigilância, permitindo o estudo das doenças de forma
institucionalizada (3).
A medicalização dos hospitais inspirou o modelo biomédico da
medicina ocidental, tendo como algumas características que se
fundamentaram nesse contexto, foco na doença, no conhecimento
13
especializado em partes em detrimento do todo, na atenção verticalizada e
hierarquizada entre outras (3).
Esse processo de transformação nos hospitais teve como importante
expoente Phillippe Pinel que em 1793 passou a dirigir o Hospital de Bicêtre
na França. Após retirar da instituição os que não eram especificamente
enfermos, ele iniciou a separação dos doentes de acordo com as
enfermidades. Tal processo permitiu a identificação, observação, descrição e
classificação das patologias. Pinel dedicou-se principalmente a loucura, que
denominou alienação mental sendo considerado o fundador da psiquiatria. O
conceito de alienação está relacionado a alguém fora da realidade, fora de
si, sem controle das suas vontades e desejos. Nesse sentido o conceito de
alienação mental nasce associado a ideia de periculosidade, sendo que o
alienado supostamente não tem discernimento entre o erro e realidade.
Desta forma o alienado tinha que ser mantido isolado da sociedade,
institucionalizado para que fosse observado, diagnosticado e recebesse o
tratamento com ordem e disciplina para que a mente desregrada pudesse se
organizar novamente (4,6).
No entanto o hospital psiquiátrico criado por Pinel não se configurou
como lugar de tratamento e de cuidado das pessoas com sofrimento mental
como proposto. Logo os asilos em todo o mundo ficaram superlotados de
internos. Havia dificuldades em estabelecer limites entre sanidade e loucura
e surgiram as primeiras críticas ao modelo asilar que ainda cumpriam sua
função de segregação de segmentos marginalizados da população e era
cenário de constantes denúncias de violência, maus-tratos, violação de
direitos humanos (4).
Uma primeira tentativa de resgatar o potencial terapêutico da
instituição psiquiátrica ocorreu com a proposta das colônias de alienados,
localizadas em áreas agrícolas, onde os alienados eram submetidos ao
trabalho terapêutico. O trabalho era considerado importante prática
terapêutica que estimulava a vontade e a energia, consolidando a resistência
cerebral e fazendo desaparecer os sintomas psíquicos. No entanto, da ideia
de uma aldeia de pessoas livres, com sua própria história e cultura,
14
nasceram instituições asilares de recuperação pelo trabalho e as colônias se
mostraram semelhantes aos asilos tradicionais (5).
As duas Grandes Guerras Mundiais, promoveram uma reflexão na
sociedade sobre a natureza humana, tanto em aspectos de crueldade como
solidariedade, promovendo condições históricas para outro período de
transformações psiquiátricas. Após a segunda Guerra, a sociedade dirigiu
seus olhares para os hospícios e perceberam que as condições de vida
oferecida aos pacientes psiquiátricos eram semelhantes as vidas das vítimas
dos campos de concentração, com ausência absoluta de dignidade humana.
Surgiram então as primeiras experiências das reformas psiquiátricas pelo
mundo (5).
No contexto pós-guerra os soldados ingleses precisavam ser tratados
em suas enfermidades para trabalharem no projeto de reconstrução
nacional. No entanto, havia uma grande quantidade de pessoas que
demandavam cuidados e em contrapartida, uma oferta muito escassa de
profissionais para atendê-los. Nesse contexto, Main, Bion e Reichman
iniciaram no Hospital Monthfield (Inglaterra) uma prática terapêutica
utilizando o potencial dos próprios pacientes no tratamento. Organizavam
reuniões em que os pacientes discutiam as dificuldades, projetos, planos de
cada um. Realizavam assembleias em que eram elaboradas propostas de
trabalho em que todos, pacientes e funcionários eram envolvidos. Nesse
contexto surgiu a expressão psicossocial, a partir de um livro de James L.
Hallidy intitulado Psychosocial Meidicien, publicado em Londres no ano de
1948. Em 1959 Maxwell Jones passou a organizar grupos de discussão e
grupos operativos trazendo maior sistematização e dinâmica ao processo.
Ele propôs que os internos deviam participar ativamente de todas as
atividades disponíveis e entendia que a função terapêutica deveria ser
assumida por todos, técnicos, familiares, pacientes. Dessa forma seriam
organizadas comunidades terapêuticas que visava a mudança nas relações
de cuidado, opondo-se a hierarquização ou verticalização dos papéis e
buscando uma relação horizontal e democrática no processo terapêutico (3).
15
Na França, Tosquelles propôs uma experiência semelhante a
comunidade terapêutica. Também visava a experiência de coletivo
terapêutico com a perspectiva de que o hospital tinha a função terapêutica e
que os pacientes e técnicos deviam lutar contra a violência institucional e a
verticalidade nas relações interinstitucionais. A então concebida Psicoterapia
Institucional propôs a transversalidade, com encontro e ao mesmo tempo
confronto de papéis profissionais e institucionais para problematizar as
hierarquias e hegemonias. Resgatou a noção de trabalho terapêutico como
importante atividade que oferecia possibilidades de participação e
responsabilização dos internos (3).
Estas propostas foram importantes porque possibilitaram pela
primeira vez que a voz do paciente fosse ouvida e o reconhecimento do seu
potencial de participar ativamente sobre o próprio tratamento. Contudo
ficaram restritas ao modelo hospitalocêntrico, considerando essa instituição
de cura. Os pacientes permaneciam segregados da sociedade, afastados
das suas famílias e dos seus territórios. Outras propostas buscaram romper
o modelo hospitalocêntrico e forcaram na comunidade, visando reduzir a
ocorrência de enfermidades mentais ou a necessidade de internação. Com
estas propostas podem ser apontadas a psiquiatria de setor e a psiquiatria
preventiva norte-americana (5).
No final dos anos 50 e inícios dos anos 60, A Psiquiatria de Setor
apontou a necessidade de se adotar medidas de continuidade terapêutica
após a alta hospitalar visando evitar a reinternação ou prevenir a internação
de novos casos. Foram então criados na França os Centros de Saúde
Mental (CSM) que foram espalhados pelas regiões sendo organizados de
acordo com a distribuição populacional, inaugurando o conceito de
regionalização na assistência psiquiátrica (6).
A criação dos CSM trouxe outra importante mudança nas práticas de
cuidado, sendo que o tratamento passou a ser responsabilidade de uma
equipe multiprofissional, não apenas do médico psiquiatra. Enfermeiros,
psicólogos, assistentes sociais começaram a serem protagonistas no
contexto de política de saúde mental. A equipe que acompanhava o paciente
16
internado, continuava o tratamento quando o mesmo recebia alta. Da
mesma forma, o paciente que estava sendo acompanhado no CSM, quando
precisava de internação, também era acompanhado pela mesma equipe.
Começou-se a ser valorizado o vínculo como importante ferramenta
terapêutica (6).
No mesmo período, estava surgindo nos Estados Unidos a Psiquiatria
Preventiva tendo como seu fundador Gerald Caplan. Ele entendia que as
doenças mentais seguiam uma linearidade na evolução, sendo que
poderiam ser prevenidas se detectadas precocemente. Nessa perspectiva
poderia ser realizada a prevenção nos três níveis. A prevenção primária
corresponderia as intervenções nas condições etiológicas da doença mental,
seja de origem individual ou do meio. A prevenção secundária poderia ser
realizada a partir das intervenções visando diagnóstico e tratamento precoce
da doença mental. E por fim, a prevenção terciária seriam as estratégias de
readaptação do paciente a vida social, após a estabilização dos sintomas
(6).
A Psiquiatria Preventiva consolidou-se como uma proposta de saúde
mental comunitária, sendo que as equipes de saúde mental identificavam e
interviam em crises individuais, familiares e sociais. O conceito de crise foi
estratégico nesse movimento visto que consideravam que encarar novos
obstáculos e conflitos poderia promover saúde, se a pessoa fosse assistida
e recebesse apoio adequado durante tais situações de crise (5).
Na Psiquiatria Preventiva surgiu o termo desvio, apropriado pelas
ciências sociais, para se referir a comportamento desadaptado a norma
social estabelecida, referindo-se ao anormal e pré-patológico. O conceito de
desinstitucionalização também surgiu neste contexto e nomeava as medidas
de desospitalização dos pacientes. Foram implantados nos EUA vários
centros de saúde mental, oficinas, lares, hospital-dia, hospital-noite,
enfermarias e leitos em hospitais gerais e outros com objetivo de tornar o
hospital psiquiátrico um recurso obsoleto que fosse caindo em desuso na
medida que a incidência de doenças mentais reduzisse em decorrência das
ações preventivas e os serviços comunitários em saúde ampliassem a
17
competência e efetividade em tratar as doenças em regime extra-hospitalar
(5).
No entanto, os resultados foram diferentes do esperado, ocorrendo
aumento importante da demanda psiquiátrica nos EUA, tanto dos serviços
extra-hospitalares como nos hospitais psiquiátrico e os serviços
comunitários acabaram por se transformarem em grande captadores e
encaminhadores de pacientes para os hospitais psiquiátricos (3).
Durante este período, na Inglaterra surgiu um outro movimento
também questionando o modelo tradicional de cuidado aqueles que estavam
em sofrimento psíquico. A Antipsiquiatria teve como precursor Ronald
Cooper e considerava que a experiência patológica não ocorre entre corpo
ou mente doente, mas nas relações estabelecidas entre ele e a sociedade.
Concebia que o hospital psiquiátrico apenas reproduzia e radicalizava as
estruturas opressoras e patogênicas da organização social manifestadas
principalmente pela família. Como o conceito de doença mental era
rejeitado, questionava-se então a terapêutica como foco no tratamento da
doença e se propunha que a pessoa deveria vivenciar a experiência, que por
si só já era terapêutica e auxiliaria na sua organização interior. Ao terapeuta
cabia auxilia-lo a pessoa a vivenciar e superar este processo,
acompanhando e protegendo inclusive da violência da própria psiquiatria (3).
Paralelamente na Itália, Franco Basaglia iniciou o movimento
denominado Psiquiatria Democrática. Sua experiência mais rica e radical
aconteceu no hospital Psiquiátrico de Trieste e inspirou outros movimentos
pelo mundo. Basaglia buscava a superação da prática psiquiátrica
institucional original, visando a modificação do aparato manicomial não só
como estrutura física, mas também como conjunto de saberes e práticas
cientificas, sociais, legislativas e jurídicas que fundamentavam a existência
de um lugar de isolamento, segregação e patologização da experiência
humana (3).
Basaglia iniciou o fechamento de pavilhões e enfermarias
psiquiátricas. Foram criados os modelos substitutivos que vislumbraram
18
tomar o lugar das instituições psiquiátricas clássicas, não sendo paralelos,
simultâneos ou alternativo as mesmas (3).
Os substitutos também denominados Centros de Saúde Mental
(CSM), foram organizados de forma regionalizada na Cidade de Trieste. Mas
diferentemente dos anteriores propostos, estes centros não davam
continuidade ao tratamento após alta hospitalar ou reintegravam os
pacientes ao manicômio quando eram situações consideradas graves e de
difícil manejo em regime externo. Os CSM foram organizados levando em
consideração o conceito de “tomada de responsabilidade”, passando a
assumir a integralidade do cuidado em saúde mental em cada território.
Atuavam reconstruindo as formas como a sociedade lidavam com as
pessoas em sofrimento mental, restabelecendo o lugar social da loucura que
tradicionalmente estava relacionado ao erro, periculosidade, insensatez e
incapacidade (5).
Outras estratégias utilizadas nesse processo diziam respeito as
possibilidades de inclusão social, por meio de criação de cooperativas de
trabalho, construção de residências para ex-internos do hospital e outras
formas de participação e produção social (grupos musicais e de teatro,
produção de vídeos, oficinas de trabalho entre outras (4).
A proposta italiana rompeu com as experiências anteriores
principalmente no que diz respeito a desinstitucionalização, sendo que
finalmente concretizou a substituição do hospital psiquiátrico por outros
serviços com base territorial. Promoveu a construção de um novo modelo de
atenção assistencial. As práticas terapêuticas comuns dos manicômios
foram substituídas pelas práticas de cuidado no território, colocando a
doença em parênteses e se ocupando do indivíduo em sua totalidade,
considerando suas relações com sofrimento, seu contexto social, sua
subjetividade. Surge a noção de trabalho em base territorial, ou seja, que se
desenvolve no cotidiano da cidade, nos bairros, nos locais onde as pessoas
vivem, trabalham e ser relacionam (3–6).
19
A experiência de Trieste desencadeou o processo de mudança em
toda Itália, onde em 13 de maio de 1978 foi aprovada a Lei 180, conhecida
como Lei da Reforma Italiana ou Lei Basaglia. Essa lei prescreveu a
extinção dos manicômios em território nacional e determinou a construção
dos serviços substitutivos (4).
O Brasil também conta com tristes momentos na história pelo modo
como tratar pessoas com sofrimento psíquico. Em 1841 foi inaugurado o
primeiro hospital psiquiátrico brasileiro e da América Latina, denominado
Hospício de Pedro II (HPII) no Rio de Janeiro. A estrutura era inspirada no
estilo neoclássico, provido de espaços suntuosos, decoração luxuosa e ficou
conhecido como o “Palácio dos Loucos”. A amplidão dos espaços, a
disciplina, os passeios supervisionados, a separação por classes sociais e
diagnósticos, as constantes vigilâncias representam o nascimento da
psiquiatria no Brasil. Anteriormente a criação do HPII, os doentes mentais
considerados perigosos eram internados no Hospital Geral da Santa Casa
de Misericórdia, mas não recebiam assistência médica nem de enfermagem,
tendo a internação apenas como papel de exclusão social (7).
Posteriormente foram construídos inúmeros outros hospitais
psiquiátricos em todas as capitais brasileiras. Durante o período de 1960 até
1980 muitos desses hospitais eram financiados pelo INPS (Instituto Nacional
de Previdência Social) sendo considerados negócios rentáveis pois podiam
ter centenas e até milhares de pacientes internados com pouquíssimos
funcionários, péssimas condições sanitárias e anulação dos direitos de
cidadania de seus internos. Assim como ocorreu mundialmente, no Brasil
também houveram numerosas experiências de transformações a assistência
as pessoas com sofrimento psíquico anteriores a Reforma, mas que não
romperam o paradigma hospitalocêntrico (6).
O movimento da Reforma Psiquiátrica brasileira tem início no
processo que foi denominado crise de DINSAM (Divisão Nacional de Saúde
Mental). Este instituto havia realizado o último concurso em 1956/1957 e a
partir de 1974 estava com déficits de funcionários. Foram então contratados
bolsistas, que eram profissionais graduados ou estudantes e trabalhavam
20
como médicos, psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais. No entanto, os
profissionais vivenciaram nas instituições situações precárias de trabalho, e
constantes ameaças e violências contra aos pacientes. Eram frequentes as
denúncias de agressão, estupro, trabalho escravo e mortes (3).
Essa crise foi iniciada com a denúncia de três bolsistas que
registraram no livro de ocorrência de plantão as irregularidades da unidade
hospitalar (Centro Psiquiátrico Dom Pedro II). Esse ato repercutiu e
mobilizou apoio de profissionais de outras unidades, do Movimento de
Renovação Médica (REME) e do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
(CEBES). Decorrente dessa situação foram organizados o Núcleo de Saúde
Mental do Sindicado Médico e o Núcleo de Saúde Mental do CEBES sendo
promovidas sucessivas reuniões, assembleias e greves que mobilizaram
profissionais de saúde mental e demais entidades da sociedade civil. Nesse
contexto foi criado o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
(MTSM) no Rio de Janeiro que teve importante papel no processo da
reforma psiquiátrica (3).
O MTSM organiza-se como movimento plural sendo composto não
apenas por trabalhadores da saúde, mas também por associações de
familiares, sindicalistas e pessoas com longo histórico de internações
psiquiátricas. O MTSM se configurava como um espaço de debate e luta
visando transformações na assistência psiquiátrica. Reivindicavam a
regularização dos bolsistas, aumento salarial, redução do número excessivo
de consulta por turno de trabalho, a humanização da assistência. Criticavam
a cronificação do manicômio, a falta de recurso nas unidades e a
precariedade do trabalho que refletia na qualidade da assistência oferecida
aos pacientes. O movimento cresceu por todo o país nos anos seguintes e
ampliou as pautas de discussão denunciando a violência dos manicômios e
a mercantilização da loucura (7).
Em 1978 aconteceu um importante evento que influenciou o
pensamento crítico do MTSM. O I Congresso Brasileiro de Psicanálise de
Grupos e Instituições foi realizado no Rio de Janeiro e possibilitou a vinda ao
Brasil dos principais mentores da Rede de Alternativas a Psiquiatria, tais
21
como do movimento da Psiquiatria Democrática Italiana, da Antipsiquiatria,
sendo que compareceram ao evento Frango Basaglia, Robert Castel, Felix
Guattari, Erwing Goffman, dentre outros. Ocorreram inúmeros debates e
polêmicas durante e posteriormente Basaglia seguiu fazendo conferências
em universidades, sindicatos e associações. Suas ideias e críticas foram
incorporadas e inspiraram os movimentos do MTSM (6).
Dessa forma nos encontros para discussões em Saúde Mental que
acontecem nos anos subsequentes surgiram a crítica ao modelo asilar dos
grandes hospitais psiquiátricos, as necessidades de mudanças nas diretrizes
legais para assistência psiquiátrica, as possibilidades alternativas para o
tratamento de pessoas com transtornos mentais. Permaneceram as
denúncias sobre as barbaridades ocorridas nas instituições psiquiátricas e
deflagram-se discussões sobre os direitos humanos dos pacientes
psiquiátricos. Criticou-se o modelo assistencial hospitalocêntrico sendo
considerado como ineficiente, cronificador e estigmatizante (5).
Em 1980 foi criada a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no
Congresso Nacional para apurar as distorções na assistência psiquiátrica
brasileira e discutir a legislação penal e civil relacionada a pessoas com
sofrimento psíquico. Teve também como objetivo de vincular os movimentos
populares que lutavam pela liberdade de organização e participação nas
políticas como também pela democratização da ordem econômica e social
(5).
Em 1986 ocorreu a VIII Conferência Nacional de Saúde que pela
primeira vez teve caráter de consulta e participação social, sendo aberta ao
público. Foi discutida uma nova concepção de saúde como direito do
cidadão e dever do estado. Foram definidos princípios como universalização
do acesso a saúde, descentralização, democratização. Ampliou-se o
conceito de saúde sendo considerado como sinônimo de qualidade de vida e
o Estado foi responsabilizado como agente promotor de políticas de bem-
estar social. Neste evento decide-se pela implantação da Reforma Sanitária
e criação de um sistema único e público de saúde (SUS). No campo da
Saúde Mental foram realizadas discussões sobre a participação de
22
pacientes e ex-pacientes psiquiátricos para formular e executar políticas de
assistência em saúde mental (5,7).
Em 1987 ocorreu no Rio de Janeiro a I Conferência Nacional de
Saúde Mental (I CNSM) e em São Paulo ocorreu o II Congresso Nacional do
Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental. Foram discutidos a
priorização dos serviços extra-hospitalares e multiprofissionais como
oposição ao modelo hospitalocêntrico, a participação da população na
construção de novas políticas de saúde mental e estratégias de
desinstitucionalização transferindo o centro da atenção da instituição para a
comunidade (8,9).
O processo de desinstitucionalização brasileira foi orientado tendo
como referencial teórico-conceitual a tradição basagliana, que inspirou a
reorganização do sistema de serviços e ações em saúde mental, sendo
orientado pelo lema “por uma sociedade sem manicômios”. Esse processo
repercutiu em mudanças no âmbito assistencial, cultural e na ação jurídica
política (7) .
No âmbito assistencial surgem novas modalidades de atenção que
passaram representar alternativas ao modelo psiquiátrico tradicional. Em
1987 foi inaugurado o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) na
cidade de São Paulo que tinha como objetivo ser um filtro entre o hospital e
a comunidade, oferecendo acolhimento às pessoas que sofriam de
transtornos psiquiátricos e promover a sua inserção social. Tinha também
como objetivo a construção de uma rede de serviços preferencialmente
comunitária (3) .
Em 1988 com a promulgação da Constituição Nacional e a criação do
Sistema Único de Saúde (SUS) sendo os princípios básicos discutidos na VII
Conferência em Saúde e estabelecendo condições institucionais para a
implantação de novas políticas de saúde, oferendo subsídios para
estabelecimentos de novas legislações em saúde mental. A saúde foi
oficializada como direito do cidadão e dever do estado e os municípios foram
responsabilizados por velar pela situação de saúde das pessoas. Foi nesse
23
princípio que se fundamentou a experiência em Santos que iniciou a
construção de um sistema de saúde mental a partir da desconstrução do
hospital psiquiátrico (8).
Dessa forma, o processo da Reforma psiquiátrica teve repercussão
nacional em 03 de maio 1989 após a intervenção da Secretaria de Saúde de
Santos (SP) na Casa de Saúde Anchieta dos Santos. Neste hospital
psiquiátrico privado foram constatadas ações de maus-tratos e mortes de
pacientes e neste dia uma legião de profissionais de saúde adentrou o
hospício para cuidar dos pacientes, alterando toda ordem institucional: celas
fortes foram fechadas, a aplicação de eletrochoques foi proibida, alguns
pacientes começaram a sair do hospital e famílias foram convocadas para
participar das altas. As enfermarias foram reorganizadas de maneira que
dignificasse a vida das pessoas. Os internos foram agrupados em
enfermarias segundo sua localidade de origem e quando a equipe técnica e
os pacientes estavam integrados eles saiam do hospital para fundar os
Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS). Esses núcleos eram fundados com
trabalho prévio de mobilização dos moradores locais realizando reuniões em
centros comunitários, sindicatos e igrejas no quais se mostravam vídeos da
intervenção e discutia-se sobre a necessidade de conviver com as pessoas
internadas no Hospital. Além dos NAPS foram criados Prontos-socorros
Psiquiátricos, o Núcleo de Trabalho, as cooperativas, a moradia para os
pacientes crônicos sem contato familiar, o Centro de Valorização da Criança
e do Adolescente (CVC) e o Núcleo de Artes TAM ex-clientes. A intervenção
iniciou-se em 1989, mas apenas em 1994 o hospital foi finalmente fechado
e tinha-se um sistema de saúde mental substitutivo funcionando (8).
A experiência de Santos foi um marco na Reforma Psiquiátrica que
avançou pelo Brasil iniciando a implantação de um novo sistema psiquiátrico
que substituiria o modelo manicomial. Em outros estados também foram
criados cooperativas, associações, instituições de residencialidade e os
Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), que eram regionalizados e tinham
como objetivo acolher e promover atendimento 24 horas para pessoas
egressas de hospitais psiquiátricos (8, 9).
24
Essa experiência em Santos repercutiu no campo jurídico-político,
sendo que em 1989 o deputado Paulo Delgado apresentou o projeto de Lei
3.651/89 que propunha a regulamentação dos direitos da pessoa com
transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país,
privilegiando o modelo de assistência em Saúde Mental com base
comunitária. No entanto, apenas doze anos depois de tramitação no
Congresso a Lei Paulo Delgado foi sancionada. Ocorreu, porém, a
aprovação de um substitutivo do Projeto de Lei original, que apresentou
modificação importantes no texto normativo. Assim a Lei Federal 10.216
redirecionou a assistência em saúde mental, dispôs sobre direitos das
pessoas com transtornos mentais e privilegiou o oferecimento de tratamento
em serviços de base comunitária. Todavia o texto legal não deixou claro
quais seriam as alternativas para extinção progressiva dos manicômios
(8,10).
Em 1990, foi realizada a II Conferência Nacional de Saúde Mental no
qual foi assinado a Declaração de Caracas, documento que marca a reforma
da saúde mental nas Américas. O Brasil se comprometeu com
reestruturação do modelo assistencial em Saúde Mental, priorizando o
atendimento realizados na comunidade visando a reabilitação e reinserção
social. Neste mesmo ano foram elaboradas as primeiras normas federais
que regulamentavam a implantação dos serviços de atenção diária
baseadas nas experiencias do CAPS e do NAPS e estabeleciam critérios de
classificação e fiscalização de hospitais psiquiátricos (11).
A década de 90 foi marcada por movimento intenso na área política e
de normativas para saúde mental, com respaldo da Declaração de Caracas
e dos relatórios da I e II Conferências Nacionais da Saúde Mental foram
estabelecidos programas intersetoriais para pessoas com sofrimento
psíquico, visando a integralidade do cuidado, tendo as práticas terapêuticas
que consideravam o indivíduo em sua totalidade, não apenas focada nos
sintomas. Foram também estabelecidos programas de capacitação de
recursos humanos, apoio técnico, ações de supervisão, controle e avaliação
da rede assistencial (3).
25
A realização da III Conferência Nacional de Saúde mental ocorreu
logo após a promulgação da lei 10.216 sendo realizada no mesmo ano em
Brasília. Esse evento contou com a participação dos movimentos sociais, de
usuários, familiares e durante o processo de realização e no teor das
deliberações condensadas no Relatório Final a Reforma psiquiátrica foi
enfim, consolidada como política de governo, sendo pactuadas
democraticamente os princípios, diretrizes e estratégias para mudança da
atenção em saúde mental no Brasil. O CAPS passou a assumir papel
estratégico para mudança do modelo de assistência. Foi também discutida a
necessidade da construção de uma política de saúde mental pra os usuários
de álcool e outras drogas e se estabeleceu o controle social como garantia
do avanço da Reforma Psiquiátrica no Brasil (8).
A partir de 2002 inúmeras normativas foram discutidas e implantadas
promovendo paulatinamente a reorganização dos Serviços de Saúde Mental,
criando novos equipamentos e dispositivos, consolidando a ideia de que as
intervenções devem ser realizadas prioritariamente nos serviços
comunitários de saúde, sempre visando a reinserção social do indivíduo em
seu convívio social e familiar. As intervenções se deslocaram dos hospitais
psiquiátricos, para as comunidades, da doença, para a pessoa em sua
totalidade, das ações individuais para as ações coletivas (9,12).
Destaca-se em 2002 a promulgação da Portaria 336 do Ministério da
Saúde que cria oficialmente os CAPS, ampliando seu funcionamento e
complexidade. O CAPS surgiu para substituir o hospital, tendo a missão de
oferecer atendimento diuturno as pessoas com transtornos mentais severos
e persistentes no território, devendo oferecer cuidados clínicos e de
reabilitação psicossocial, favorecendo o exercício e a inclusão social dos
usuários e de suas famílias (13).
Os CAPS são, portanto, instituições destinadas a acolher crianças,
adolescentes e adultos em sofrimento psíquico severo e/ou persistentes,
com grave comprometimento psíquico, incluindo os transtornos relacionados
ao uso de substâncias psicoativas (álcool e outras drogas). Para ser
26
atendido nesse serviço para o indivíduo procurar espontaneamente o CAPS
ou pode ser encaminhado por qualquer outra instituição (14) .
Os CAPS podem oferecer diferente tipos de atividades terapêuticas,
indo além do uso de consultas e distribuição de medicamentos. Algumas
atividades são realizadas em grupo, outras individualmente. São promovidas
também atividades direcionadas a família e a comunidade. Alguns exemplos
de atividades terapêuticas oferecidas são psicoterapia individual ou em
grupo, oficinas terapêuticas, atividades comunitárias, atividades artísticas,
atividades de lazer, atividade de ensino, orientação e acompanhamento do
uso de medicamento, atendimento domiciliar e aos familiares, entre outras
(14).
O tratamento nos CAPS, no entanto não deve ser realizado de forma
que o usuário permaneça a maior parte do tempo realizando atividades
internas no serviço. As atividades também devem ser desenvolvidas fora do
serviço, como parte de uma estratégia de reabilitação psicossocial, podendo
ser iniciada ou articulada no CAPS, mas sendo realizadas na comunidade,
no trabalho ou na vida social (14).
Os CAPS são pontos estratégicos na Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS), tanto no que ser refere a atenção direta ao usuário visando a
promoção do protagonismo, autonomia e vida comunitária, quando na
ordenação do cuidado, devendo trabalhar em conjunto com os outros
serviços, articulando os recursos e serviços existentes no território e em
outras redes (15).
Nessa perspectiva o CAPS opera no território compreendido não
como espaço geográfico, mas território de pessoas, instituições, cenários de
referência nos quais se desenvolvem a vida cotidiana dos usuários e
familiares. O território é apreendido como lugar de cuidado, promotor de vida
e a ação do CAPS nesse local tem a missão de garantir o exercício da
cidadania e a inclusão de usuários e de familiares (14).
27
Os CAPS podem ser classificados em CAPS I, CAPS II, CAPS III e
CAPS IV definidos por ordem crescente de porte/complexidade e
abrangência populacional. Além destes há ainda os CAPS Infantil (CAPSi) e
os CAPS Álcool e Drogas (CAPS AD), os quais se destinam
respectivamente ao atendimento de crianças e adolescentes e de pacientes
com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias
psicoativas (13,16).
O CAPS tem o caráter de serviço aberto e comunitário e atualmente
são substitutivos ao modelo asilar e a implantação desse serviço em todo
país demonstra um importante avanço na Reforma Psiquiátrica Brasileira, no
entanto não é sinônimo de mudança pragmática da atenção em saúde
mental. Para isso é necessário que o processo de mudança inclua quatro
dimensões. A primeira se refere ao campo epistemológico ou teórico-
conceitual, sendo questionado os saberes e conceitos dentro da ciência e
psiquiatria clássica, tais como isolamento, neutralidade, tratamento moral,
anormalidade, doença e cura. A segunda diz respeito as mudanças
técnicos-assistências que buscam construir novos espaços de sociabilidade,
troca e produção de subjetividade. A terceira relaciona-se com as questões
jurídicas-políticas sobre a discussão e redefinição das legislações que
envolvem os doentes mentais e as novas possibilidades de inserção social.
Por fim a quarta requer uma mudança sociocultural que se refere nas
transformações da relação da sociedade com a doença mental que é
influenciada pelos conceitos construídos historicamente (3). Esse conjunto
de modificações alicerça um novo modelo de atenção em saúde mental
denominado psicossocial.
1.2.Práticas de cuidado em saúde mental
As reestruturações da atenção em saúde mental no Brasil
preconizada pelo Movimento da Reforma Psiquiátrica transcendem a oferta
de novos serviços ou reestruturação de modelos assistência. Implicam em
mudanças de ordem política, ideológica, ética e das concepções de clínica e
28
reabilitação (17). Demarcam a configuração de dois modos diferentes de
conceber e produzir práticas de cuidado aos indivíduos que apresentam
sofrimento psíquico, sendo eles o modo psicossocial e o modo asilar ou
manicomial. O modo asilar é o modo dominante, que historicamente foi
caracterizado por práticas enclausurantes, medicalizadores e centrado em
ação sobre a doença mental. Por outro lado, o modo psicossocial se
contrapõe e vai se construindo por meio de críticas ao paradigma
psiquiátrico tradicional e pela efetivação de novas formas de intervenção e
da criação de novos equipamentos e dispositivos para o cuidado ao sujeito
em sofrimento psíquico. O modo psicossocial configura-se como sinônimo
de extra-asilar ou não-asilar e está se organizando em função das ações e
conhecimentos acumulados pelo processo da Reforma Psiquiátrica que
caracterizam o campo de Atenção Psicossocial (18,19).
Esse dois modos básicos (asilar e psicossocial) que compõe as
práticas em saúde mental são caracterizado considerando quatro
dimensões: a) concepção de objeto e dos meios de trabalho; b) concepção
das formas de organização do dispositivo institucional; c) concepção das
formas de relacionamento com a clientela; d) concepção dos efeitos típicos
em termos terapêuticos e éticos (19).
Em relação a concepção do objeto e dos meios de trabalho o modo
asilar apresenta ênfase nas determinações orgânicas da doença, focando no
processo de doença-cura, utilizando como importante meio de intervenção
os medicamentos. O foco das práticas é o organismo, sendo que o indivíduo
não é percebido na sua totalidade, sua subjetividade desejante é ignorada e
ele é passivo em todo processo de cuidado. A relação estabelecida entre
profissionais de saúde e o indivíduo em sofrimento é hierárquica, sendo que
cabe ao indivíduo em tratamento aceitar as intervenções do profissionais
detentores do saber (19).
No modo asilar as práticas de cuidado são centradas no indivíduo,
pois ele é percebido como centro do problema. Portanto, a participação ou
intervenções com sua família ou em seu contexto social não se fazem
necessárias. Muito pelo contrário, o indivíduo deve ser isolado ou exilado do
29
seu meio familiar e social, sendo que as práticas de cuidado devem ocorrer
em hospital fechado (19).
Sobre os meios de trabalho, no modo asilar encontra-se os recursos
multiprofissionais, no entanto a organização do trabalho é fragmentada. As
práticas de cuidado são encadeadas como a produção de mercadorias,
sendo que o psiquiatra comumente iniciava o processo realizando o
diagnóstico e definindo o que deve ser realizado pelos outros especialistas.
O médico é o principal protagonista do processo de cuidado. Os
profissionais não conversavam em atividades em comum, sendo que o
prontuário é considerado o instrumento de interconexão dos profissionais da
equipe (19).
O modo psicossocial no que se refere a concepções do objeto e dos
meios de trabalho considera como determinantes no processo de
adoecimento além dos aspectos biológicos, fatores políticos, sociais,
culturais e psicológicos. Os meios de intervenção além da medicação,
incluem psicoterapias, laborterapias, socioterapias e um conjunto de
dispositivos de reintegração social (19).
Contempla-se o indivíduo em sua totalidade, não apenas a sua
doença, mas também como suas relações interpessoais e seu contexto
sociais influenciam no seu processo de adoecimento. O indivíduo não é
percebido como o único problemático, sendo que a família e o grupo social
devem participar ativamente no processo terapêutico. As decisões sobre o
processo terapêutico são centralizados no indivíduo que participa
ativamente e é protagonista no seu tratamento (19).
Os meios de tratamento no modo psicossocial consideram o contínuo
saúde-doença psíquica e visam reposicionar o sujeito nesse processo de tal
modo que ele não apenas sofra os efeitos dessa situações, mas se
reconheça como agente implicado nesse sofrimento e também com agente
da possibilidade de mudanças (19).
30
O meio de trabalho característico do modo psicossocial é a equipe
interprofissional que busca formas de intercâmbio das visões teórica-
técnicas e das suas práticas, buscando a superação do modelo “linha de
montagem”. O objeto das práticas em saúde mental é ampliado, não sendo
mais doença cura, mas entendido como existência-sofrimento. Com essa
nova percepção são incorporadas novas práticas que visam além da cura,
ampliar as novas possibilidades do indivíduo promovendo novas formas de
sociabilidade que se distanciam da produção em série do cuidado do modo
asilar (19).
Os dispositivos institucionais do modo psicossocial são
territorializados e extra-hospitalares de atenção, substitutivos ao manicômio.
A ênfase no modo psicossocial é a reinserção social e recuperação da
cidadania. Propõe ampliação e diversificação da visão dos problemas e das
possibilidades de solução. Tem como metas principais a desospitalização,
desmedicalização e a inserção da subjetividade e dos aspectos
socioculturais no processo terapêutico (19).
Em relação as formas de organização institucional no modo asilar os
organogramas são piramidais ou verticais sendo que o fluxo do poder
institucional vem do ápice para a base, no qual poucos determinam e a
maioria obedece. Há espaços fechados para os usuários e a população
geral. O poder decisório e de coordenação são concentrados nas mesmas
pessoas. É enfatizado a estratificação do poder e do saber, tanto no âmbito
pessoal da instituição como na relação com o usuário e a população, sendo
que o usuário é passivo nas intervenções (19).
No modo psicossocial o organograma deve ser horizontal e a equipe,
os usuários, família e comunidade tem poder decisório. As decisões são
tomadas por meio do diálogo em conjunto. A participação, a autogestão e a
interdisplinaridade do modo psicossocial se opõem ao estratificação e
interdição institucionais, heterogestão e disciplina das especialidade do
modo asilar (19).
31
Sobre as formas do relacionamento com a clientela o modo asilar se
caracteriza por uma diferenciação entre doentes e sadios. O hospital é
considerado como lugar depositário para enviar os problemáticos, separando
os da sociedade. Internamente ocorre a separação entre equipe e
pacientes, não havendo espaço para o diálogo, cabendo ao interno
imobilidade e mutismo (19).
No modo psicossocial o relacionamento entre as instituições e a
clientela é caraterizado pela pelo dialogo, sendo que a instituição funciona
como ponto de fala e escuta da população. O cuidado não é centralizado no
hospital, mas é compartilhado entre os dispositivos que compõem a rede de
atenção psicossocial e tem como base o território. A interlocução, livre
trânsito do usuário e da população, territorialização, integralidade são
atributos do modo psicossocial se contrapondo a imobilidade, mutismo e
estratificação da atenção que caracterizam o modo asilar (19).
Sobre a concepção dos efeitos típicos em termos terapêuticos e
éticos no modo asilar busca-se a remoção dos sintomas e tem como
consequências a cronificação asilar ou excesso no uso de medicamentos.
No modo psicossocial também se busca a redução dos sintomas, no entanto
esse não é o único objetivo do processo terapêutico. A ações visam também
o reposicionamento do sujeito na sua relação com o adoecimento e nas suas
relações sociais. As práticas precisam ser individualizadas, respeitando as
singularidades, para atender as demandas daquele sujeito especificamente,
de acordo com o seu contexto social (19).
Ao considerar o paradigma asilar como dominante no campo da
saúde mental, a transição paradigmática para o psicossocial se dá por meio
de transformações significativas nos parâmetros acima propostos. Dessa
forma, a transformação ou revolução paradigmática prevê mudanças
radicais que superem as concepções teóricas, técnicas, éticas e práticas do
paradigma asilar e as substituam por concepções e práticas do paradigma
psicossocial (18).
32
1.3.Uma nova proposa de clínica
A reforma da prática clínica em saúde mental propôs mudança na
oferta do tratamento, substituindo o modelo hospitalar por serviços de
atenção psicossocial com base territorial. Ampliou-se a concepção sobre o
processo saúde-doença e alguns determinantes que anteriormente eram
negados pela psiquiatria clássica, ingressaram na oferta de tratamento aos
sujeitos em sofrimento psíquico (20).
A clínica tradicional se apoia no modelo biomédico, sendo embasada
em uma percepção fragmentada do ser humano, tendo como foco de suas
práticas em saúde exclusivamente a doença, que demandava uma
intervenção médica e era dissociada dos aspectos da vida social que não
eram considerados no processo de cuidado. O paciente era reduzido ao seu
diagnóstico, sendo ignorados outros aspectos relacionados ao seu contexto
ou sua percepção sobre seu processo de adoecimento. Buscava-se a
padronização e aplicação de protocolos, não se observando a singularidade
do sujeito. Tal modo de se fazer a clínica se apoiava no conceito de que
saúde era a ausência de doença (20).
O modelo biomédico foi utilizado na clínica como instrumento de
controle social, onde fenômenos históricos e sociais foram enquadrados na
perspectiva de fenômenos naturais. Com a evolução da clínica tradicional
estes fatores ambientais/sanitários foram incluídos como eliciadores de
doenças, mas ainda eram desconsiderados fatores históricos, psicológicos,
socioeconômicos que estão relacionados ao processo de saúde e doença
(20).
No entanto com a ampliação da concepção de saúde não apenas
como ausência de doença, mas como bem estar biopsicossocial e uma vida
de qualidade, a forma de se fazer a clínica também demandou mudanças,
sendo que as práticas deveriam se comprometer a cuidar, proteger, tratar,
recuperar, promover, enfim produzir saúde (21).
Esta nova concepção de saúde exige a construção de novas práticas
e saberes, sendo que a clínica passa por um processo de transformação,
fazendo-se necessário sua reformulação e ampliação e fomentando uma
33
nova proposta de um novo modo de se fazer, um modelo de clínica
ampliada, com foco no sujeito e seu contexto, visando além da patologia a
compreensão da integralidade. Busca ampliar seu objeto de estudo e
intervenção, surgindo de uma clínica do sujeito que compreende a
enfermidade como uma parcela do problema enfrentado pelo indivíduo,
parcela que não pode ser dissociada de elementos subjetivos, sociais e
históricos. A necessidade de transformar a clínica advém da singularidade
de cada sujeito sendo que fatores do contexto em que o sujeito está inserido
podem atuar de forma direta ou indireta na manifestação e manutenção do
processo saúde-doença (22,23).
Propõe-se uma nova perspectiva de sujeito, considerado como
coproduzido dialeticamente pela tensão constante forças externas e
internas, sendo que o sujeito singular surge como região de contato do
interno com o externo. A região de forças predominantemente Imanentes ao
Sujeito (particular, interno), estaria dividida entre três planos: a Estrutura
Biológica, o Desejo e o Interesse. A região de Forças predominante
Transcendentes ao Sujeito (Externa, Universal) seria constituída por dois
grandes planos: Necessidades Sociais e Instituições. A Região de Síntese
entre o Sujeito e seu contexto resultaria na formação de compromisso, na
constituição e gestão de Contratos e Projetos (24).
Considerando cada Sujeito como Singular e dialeticamente
coproduzido por forças universais e particulares, propõe se um modelo de
clínica como um encontro desses Sujeitos coproduzidos marcado pela força
de instituição externa aos dois Sujeitos: A Instituição Saúde (25).
Neste contexto o profissional de saúde também é entendido como
Sujeito coproduzido e está inserido numa Instituição de Saúde e munido de
Saberes específicos. Dessa forma também está “tensionado” por forças
Universais e Particulares que o constituem (25).
O Sujeito Demandante de Intervenção também é coproduzido
dialeticamente. Quando ele procura o cuidado é porque está sobre algum
tensionamento no seu equilíbrio singular constitutivo, independente da
presença ou da ausência de classificação diagnóstica (25).
34
A clínica então é uma interação complexa entre Sujeitos sendo que
apesar de todas as proteções institucionais a clínica efetivamente é um
encontro entre dois Sujeitos singulares. Essa é a perspectiva da clínica
ampliada cuja proposta não é negar a patologia existente, mas negar a
preponderância de qualquer elemento a priori. O elemento mais importante
em cada momento define-se na singularidade dos Sujeitos e instituições
imersos na relação (25).
A clínica ampliada é construída na prática de um saber ético, de
profunda responsabilidade sobre a saúde dos usuários e dos serviços. É
uma forma de clínica que garante uma visão singular sobre a problemática
enfrentada pelo usuário e a produção de intervenções de caráter intersetorial
(26).
Esta nova forma de produzir saúde propõe a horizontalização dos
processos de trabalho e a adoção de práticas integrais frente as
necessidades dos usuários dos serviços. Faz necessário a promoção de
espaços de diálogos e troca de conhecimentos entre os diferentes núcleos
profissionais, sendo que isso é fundamental para a implantação da lógica do
trabalho em redes de produção de saúde (27).
Assume-se uma responsabilidade muito maior do que tratar o doente
ou a doença. Trata-se de reconhecer um compromisso com o Sujeito e sua
capacidade de produção da sua própria vida. Trata-se de uma clínica que se
abre para perceber e ajudar o Sujeito doente a construir sua percepção
sobre a vida e o adoecimento. Para isso a própria clínica precisa se perceber
enquanto instrumento de uma instituição muito forte (instituição médica),
manipulando saberes e classificações diagnósticas de grande repercussão
para os Sujeitos que se submetem a ela e deve desenvolver a competência
de utilizar os poderes que possui e desenvolve na relação terapêutica a
favor da autonomia dos Sujeitos (25).
Ressalta-se que é ampliação, não é uma troca. Propõe a invenção da
saúde que inclui uma intervenção técnica, mas está relacionada a noção de
reprodução social do paciente, a produção de novas formas de vida. Está
noção é influenciada pela perspectiva de cidadania ativa e de protagonismo,
35
partindo da concepção do paciente como uma pessoa com direitos que teve
ser incentivada ao protagonismo e cidadania. O objeto da Clínica do Sujeito
inclui a doença, o contexto e o próprio sujeito (23).
Não se propõe, portanto, que a clínica abra mão de seus poderes de
intervenção (simbólicos e teóricos), pois isso inviabiliza a terapêutica.
Propõe-se que os poderes sejam reconhecidos com seus limites e riscos e
utilizados a favor dos Sujeitos e não apenas a favor dela mesma. A clínica
pode ser então uma afirmação de liberdade, uma liberdade concreta e
singular, construída a partir de uma postura crítica ou ao menos a partir de
uma postura mais atenta aos riscos de cumplicidades com tiranias (25).
Pretende-se a discussão dos saberes biomédicos e o protagonismo
dos Sujeitos Singulares, aceitando ou não os caminhos terapêuticos que os
saberes propõem. Quando se discute a clínica, se discute o poder, o poder
do saber que é alicerçado nos tratados sobre doença e fisiologia padrão que
tornam a clínica possível. Com a ampliação da clínica intenta ir além desde
campo de certezas e regularidades para abarcar a imprevisibilidade da vida
cotidiana. Deve-se reconhecer os limites dos saberes em relação a
singularidade do Sujeito para ir além de uma certa classificação de doenças
e compreender o Sujeito que não será apreendido por um diagnóstico (25).
Na relação entre doença e Sujeito, há, portanto, muitas posições
possíveis. Desde aquelas em que a doença ocupa grandes espaços na
existência, até outras em que a enfermidade é transitória e fugaz. Por outro
lado, doenças semelhantes do ponto de vista classificatório podem incidir de
forma diferenciada conforme a história e os recurso subjetivos e materiais de
cada Sujeito. Os serviços de saúde devem ter plasticidade suficiente para
dar conta desta variedade (23).
A ampliação da clínica trabalha os danos e os benefícios gerados
pelas práticas de saúde e prevê que as equipes de diferentes especialidades
compartilhando a responsabilidades com os usuários e seu entorno. O
serviço de saúde não deixa de acolher a queixa do usuário mesmo que a
fala pareça não ter relação direta para a diagnóstico e tratamento pois essa
escuta auxilia o próprio usuário a descobrir os motivos de seus adoecimento
36
(28).
Dessa forma a prática da clínica ampliada acontece através da
escuta, sendo que o trabalhador e o usuário buscam juntos os motivos pelos
quais ele adoeceu e como se sente com os sintomas, para compreender a
doença e se responsabilizar na produção da saúde. É importante estar
atento para os afetos entre os trabalhadores e usuários e buscar a
autonomia da pessoa diante do seu tratamento considerando cada caso de
forma única e singular (28).
A clínica ampliada propõe então que o profissional de saúde
desenvolva a capacidade de ajudar as pessoas, não só a combater as
doenças, mas a transformar-se de forma que a doença, mesmo sendo um
limite, não a impeça de viver outras coisas na sua vida. A clínica ampliada foi
oficializada como diretriz teórica e prática dos cuidados no processo
saúde/doença por meio da Política Nacional de Humanização (PNH). A
adoção desse novo conceito de clínica visa promover a mudança na forma
da atenção e na gestão dos processos de trabalho em saúde visando
alinhar aos princípios e diretrizes do SUS (21).
A PNH busca pôr em prática princípios do SUS no cotidiano dos
serviços de saúde, produzindo mudanças nos modos de gerir e cuidar.
Estimula a comunicação entre gestores, trabalhadores e usuários para
construir processos coletivos de enfrentamento de relações de poder,
trabalho e afeto que muitas vezes produzem atitudes e práticas
desumanizadoras que inibem a autonomia e a corresponsabilidade dos
profissionais de saúde em seu trabalho e dos usuários no cuidado de si. A
PNH também é conhecida como HumanizaSUS e aposta na inclusão de
trabalhadores, usuários e gestores na produção e gestão do cuidado e dos
processos de trabalho (27).
Humanizar traduz-se na inclusão das diferenças nos processos de
gestão e de cuidado, sendo que tais mudanças só podem ser construídas de
forma coletiva e compartilhada. É necessário incluir para estimular a
produção de novos modos de cuidar e novas formas de organizar o trabalho.
Propõe-se a inclusão dos trabalhadores na gestão para que eles reinventem
37
seus processos de trabalho e sejam agentes ativos das mudanças no
serviço de saúde. A inclusão de usuários e suas redes sociofamiliares nos
processos de cuidado é fundamental para a ampliação da
corresponsabilização no cuidado de si (27).
Para que ocorram mudanças nas formas de produzir saúde é
necessário que seja promovida a ampliação da autonomia e a vontade das
pessoas envolvidas que compartilham responsabilidades, sendo necessário
reconhecer o papel de cada um no processo de mudança. O SUS
humanizado reconhece cada pessoas como cidadã de direitos e valoriza e
incentiva sua atuação na produção de saúde (27).
A PNH é orientada pelo princípio de transversalidade, sendo que deve
estar presente e inserida em todas as políticas e programas do SUS. Busca-
se transformar as relações de trabalho a partir da ampliação do grau de
contato e da comunicação entre as pessoas e grupos, tirando-os do
isolamento e das relações de poder hierarquizadas. Transversalizar é
reconhecer que as diferentes especialidades e práticas de saúde podem
conversar com a experiência daquele que é assistido. Juntos os saberes
podem produzir saúde de forma mais responsável (27).
Aposta na indissociabilidade entre os modos de produzir saúde e os
modos de gerir os processos de trabalho, entre a atenção e a gestão, entre
clínica e política, entre produção de saúde e produção de subjetividade. Tem
por objetivo provocar inovações nas práticas gerenciais e nas práticas de
produção de saúde, propondo para os diferentes coletivos/equipes
implicados nestas práticas o desafio de superar limites e experimentar novas
formas de organização e novos modos de produção e circulação de poder
(28).
Considera-se, portanto, que as decisões da gestão interferem
diretamente na atenção à saúde. Por isso trabalhadores e usuários devem
buscar conhecer como funciona a gestão dos serviços e da rede de saúde e
participar ativamente do processo de tomada de decisão nas organizações
de saúde e nas ações de saúde coletiva. O cuidado e a assistência em
saúde não se restringem às responsabilidades da equipe de saúde, pois o
38
usuário e sua rede sociofamiliar devem também se corresponsabilizar pelo
cuidado de si nos tratamentos, assumindo posição protagonista com relação
a sua saúde e dos seus familiares (27).
O SUS tem como um de seus princípios a participação social na
perspectiva de democratizar a gestão da saúde. Entende-se, portanto, que
participação social não pode estar restrita a essas instâncias formalizadas
para a participação cidadã em saúde. Ela deve ser valorizada e incentivada
no dia-a-dia dos serviços do SUS, nos quais a participação tem sido
ampliada gradativamente (28).
Uma gestão mais compartilhada e mais democrática dos serviços de
saúde, no cotidiano das práticas de saúde, envolve as relações, a clínica, os
encontros entre usuários, sua família e rede social com trabalhadores e
equipes de saúde, demandam alterações nos modos de organização do
trabalho em saúde. Ou seja, é necessário que se alterem os processos de
definição das tarefas, responsabilidades e encargos assumidos pelos
trabalhadores (28).
Para realização dos objetivos da saúde (produzir saúde, garantir a
realização profissional e pessoal dos trabalhadores, reproduzir o SUS como
política democrática e solidária) é necessário incluir trabalhadores, gestores
e usuários dos serviços de saúde em um pacto de corresponsabilidade (28).
A PNH propõe a tríplice inclusão que se configura com a inclusão de
sujeitos, coletivos e a perturbação que estas inclusões produzem nos
processos de gestão. Assim, mudanças nos modos de cuidar e de se fazer
gestão decorreriam da produção de plano e ação comum entre sujeitos
guiados pelo pressuposto ético de produzir saúde com o outro (28).
A inclusão de novos sujeitos nos processos de gestão traria como
efeito a ampliação da implicação e corresponsabilização do cuidado, uma
vez que as definições, na forma da produção de tarefas, seriam coletivas, ou
seja, derivadas de pactos entre os sujeitos e não de imposições sobre eles.
De outra parte, maior implicação e uma produção mais compartilhada de
responsabilidades resultaria em mais e melhor produção de saúde, uma vez
que a vontade de fazer estaria ampliada, reafirmando pressupostos éticos no
39
fazer da saúde (28).
Alguns sãos os dispositivos da PNH que funcionam para modificar as
práticas de produção de saúde, envolvendo coletivos e visando promover
mudanças nos modelos de atenção e gestão. Entende-se por dispositivos a
atualização das diretrizes de uma política em arranjos de processos de
trabalho. Entre estes dispositivos destaca-se neste estudo o Projeto
Terapêutico Singular (PTS), como um instrumento de organização e
sistematização do cuidado construído entre equipe de saúde e usuário,
considerando singularidades do sujeito e complexidade de cada caso. (21).
A herança das revoluções na Saúde Mental (Reforma Psiquiátrica),
experimentando a proposta de que o sujeito é construção permanente e que
pode produzir “margens de manobra”, também foi incorporada no Projeto
Terapêutico Singular. No Projeto Terapêutico Singular tem implícito uma
certa crença de que a pessoa tem grande poder de mudar a sua relação
com a vida e com a própria doença. À equipe cabe exercitar uma abertura
para o imprevisível e para o novo e lidar com a possível ansiedade que essa
proposta traz. Nas situações em que só se enxergavam certezas, podem-se
ver possibilidades. Nas situações em que se enxergavam apenas
igualdades, podem-se encontrar, a partir dos esforços do Projeto
Terapêutico Singular, grandes diferenças. Nas situações em que se
imaginava haver pouco o que fazer, pode-se encontrar muito trabalho. As
possibilidades descortinadas por este tipo de abordagem têm que ser
trabalhadas cuidadosamente pela equipe para evitar atropelamentos. O
caminho do usuário ou do coletivo é somente dele, e é ele que dirá se e
quando quer ir, negociando ou rejeitando as ofertas da equipe de saúde
(29).
1.4.Projeto Terapêutico Singular
O novo modelo de atenção aos pacientes psiquiátricos propõe
mudança na terapêutica, sendo necessário o desenvolvimento de novas
práticas de cuidado. Como substitutivo ao modelo asilar, foi proposto o
40
modelo psicossocial que tem como cerne o protagonismo do usuário nos
processos terapêuticos. Com este novo olhar sobre a saúde, foi viabilizadaa
apropriação do Projeto Terapêutico Singular (PTS) como ferramenta na
promoção do cuidado integral em saúde mental nos Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS) (30).
A concepção de projeto terapêutico está em processo de construção
no Brasil ao longo dos últimos anos, junto com a história do SUS, do
movimento sanitário e da reforma psiquiátrica (25). O termo projeto
terapêutico singular (PTS), também já foi denominado como projeto
terapêutico individual (PTI) que era definido como um conjunto de
atendimentos organizados pela equipe de saúde no qual o cuidado era
articulado com o usuário. A construção do PTI já se dava de forma
compartilhada, com base no diálogo e troca de saberes, buscando práticas
centradas nos usuários e promovendo a decisão conjunta dos objetivos e
ações no processo terapêutico (31). As ações organizadas pelo PTI eram
realizadas considerando a singularidade do usuário, sendo que os
atendimentos eram realizados de forma individual de acordo com as
necessidades de cada sujeito (14).
A emergência do termo Projeto Terapêutico Singular apoia-se na ideia
de que o projeto terapêutico pode ser utilizado não só para indivíduos, mas
também para coletivos. O singular substitui o individual, considerando que
nas novas práticas de saúde é importante a compreensão não só o
indivíduo, mas também do seu o contexto social, levando em considerando
que cada usuário tem uma história única, que foi construída no seu seio
familiar e na sua comunidade e não é passível de reprodutibilidade (32) .
No Brasil, a configuração mais próxima do que atualmente é
conceituado PTS na saúde mental surge no início dos 1990 durante o
movimento antimanicomial em Santos (SP). Influenciados pela Reforma
Psiquiátrica Italiana os envolvidos naquele contexto buscavam além da
mudança do lócus de intervenção com a criação dos serviços substitutivos
ao manicômio, a construção de novas práticas de cuidado em saúde (31).
A ampliação da percepção da complexidade da problemática dos
41
sujeitos que anteriormente eram depositados nos manicômios demandou a
produção de novas respostas. A problematização e o redimensionamento
das concepções e práticas do processo terapêutico provocaram a
organização de novos dispositivos e arranjos. As intervenções não tinham
mais como único foco a cura, mas a emancipação do sujeito e produção de
vida, considerando sua singularidade e uma perspectiva ampliada de saúde,
que supera a ausência de doenças, sendo conceituada como bem estar
físico, psíquico e social (33).
Os projetos terapêuticos construídos na experiência de Santos eram
elaborados incorporando a liberdade e singularização dos processos
terapêuticos. Buscava-se que essa construção fosse realizada em conjunto
com os usuários e familiares promovendo a contratualização em conjunto
das ações e a corresponsabilização nas práticas de cuidado. O cuidado era
entendido e operacionalizado como processo, diferenciando-se da lógica de
“linha de montagem”, onde são elencados e sequenciados procedimentos.
Os projetos terapêuticos que orientavam o cuidado poderiam então ser
construídos, reconstruídos, repensados e redimensionados na relação
equipe-usuário-família. Eram acompanhados por uma dupla referência
formada por um trabalhador universitário e um auxiliar de enfermagem e
eram construídos alicerçados no diálogo, escuta e visando o fortalecimento
do vínculo (33).
Atualmente os Projetos Terapêuticos Singulares norteiam o
planejamento e a organização das ações em saúde mental sendo central
como dispositivo de cuidado, ressaltando a percepção do sujeito como
protagonista no seu processo terapêutico (34). Propõe uma estratégia de
cuidado personalizada, que respeita a particularidades de cada pessoa,
orientando as práticas dentro da unidade de saúde e fora dela (26). A
dimensão singular é a essência do PTS, é o que determina a ação de saúde
oferecida para alcançar os objetivo de criar produtos de saúde: cuidar,
melhorar a qualidade de vida dos usuários, ampliar o entendimento e a
apropriação do processo saúde-doença entre outros (35,36). Ademais como
indica o termo “projeto” trata-se de uma discussão prospectiva e não
42
retrospectiva, conforme acontecia tradicionalmente na discussão de casos
em medicina. A noção de projetualidade não se refere apenas como plano
com a organizações de atividades e ações centradas para resolução de um
dado problema. Refere a capacidade de lançar um olhar para o futuro,
provocando a reflexão, ampliando as possibilidades e elaboração de novas
realidades (37).
No cuidado em saúde os PTS podem ser utilizados como arranjo,
como dispositivo ou ainda como estratégia de gestão do trabalho das
equipes em saúde. Como dispositivo ele é capaz de promover a reflexão
sobre as práticas entre os profissionais e enquanto arranjo auxilia a
desenhar novas formas de organizar a gestão e o processo de trabalho (31).
A construção do PTS deve ser coletiva, sendo que demanda a
participação dos envolvidos: usuários, familiares e equipe de saúde. Este
processo visa compreender o sujeito em sua complexidade considerando os
aspectos biológicos, psicológicos, socioeconômicos e culturais. (14,38). As
ações devem favorecer a participação ativa do usuário e familiares,
promovendo autonomia e compartilhamento de informações e saberes (14).
Promove-se a discussão sobre uma situação de interesse comum e pactua-
se ações, formalizando compromissos e dividindo-se responsabilidades
entres os sujeitos envolvidos (14,26).
O desenvolvimento dos projetos terapêuticos devem ser orientados
pelos segundos eixos: a centralidade da ação na pessoa; a relação de
parceria terapeuta-cliente; o deslocamento do lócus da ação da instituição
para o território e para as situações da vida real; ênfase no sujeito em seu
contexto; construção compartilhada; estabelecimento de contrato de trabalho
com percursos a serem desenvolvidos em um tempo predeterminado e a
utilização de avalições periódicas conjuntas para redirecionamento do
projeto (39).
O PTS enquanto dispositivo de cuidado, se desenvolve em quatro
momentos. Inicialmente é realizado o diagnóstico com a
avaliação/problematização dos aspectos orgânicos, psicológicos e sociais,
43
buscando uma conclusão, ainda que provisória, a respeito dos riscos e da
vulnerabilidade do usuário. Neste momento busca-se entender como o
sujeito se relaciona com a situação do adoecimento. Tenta-se compreender
os desejos e os interesses, assim como o trabalho, a cultura, a família e a
rede social. É necessário lançar um olhar muito além dos problemas,
buscando as potencialidades. Nesse encontro se produz um consenso
operativo sobre os hipóteses e problemas relevantes na perspectiva da
equipe e do usuário (26).
Posteriormente são realizadas a definição das metas. A equipe, o
usuário e as pessoas envolvidas trabalham e negociam propostas de curto,
médio e longo prazo. Após a definição das metas é feita a divisão de
responsabilidades. Neste momento são definidas as tarefas de cada um com
clareza. Por fim a reavaliação, momento em que se discutirá a evolução e
serão realizadas correções dos rumos tomados (26).
A formulação e operacionalização do PTS inclui a realização de três
movimentos, sobrepostos e articulados: a coprodução da problematização, a
coprodução de projeto e a cogestão/avaliação do processo. A coprodução
da problematização diz respeito ao acesso dos sujeitos a singularidade do
caso, sendo que a equipe deve reconhecer a capacidade e o poder das
pessoas de interferirem na sua própria relação com a vida e com a doença.
Deve-se promover construção do vínculo e discussão conjunta sobre a
situação-problema, suas hipóteses explicativas e possíveis soluções. A
coprodução pressupõe o fazer junto e não pelo outro, buscando soluções
com e não para o outro em processo de troca de saberes,
corresponsabilização e construção de um cuidado coletivo. Devem conciliar
as práticas de planejamento com o sentido de projetualidade e estimular a
participação ativa dos envolvidos. As estratégias de intervenção são
construídas conjuntamente para que produzam novas respostas para as
problemáticas levantadas e além disso, promovam novas formas de vida.
Por fim, a cogestão/avaliação deve ser organizada de forma que a equipe-
usuário-família pactuem juntamente com as ações desenhadas, os prazos
para execução e as definições de papeis e o prazo de reavaliação (40) .
44
Para elaboração e acompanhamentos dos projetos terapêuticos os
profissionais dos CAPS podem ser organizar em Equipes de Referência, ou
utilizar um Profissional de Referência, sendo que este(s) servidor(es) da
saúde serão responsáveis por acompanhar o sujeito desde o início do
tratamento até a alta naquela instituição (40,41).
O dispositivo Profissional de Referência pressupõe a existência de
responsabilização e vínculo entre população usuária e profissional visando a
condução de uma terapêutica efetiva em saúde mental e a construção de um
PTS que atenda as reais necessidades do usuário. Não é o mesmo que ser
responsável pelo caso, mas é o profissional que articula e monitora o
processo, devendo estar informado do andamento de todas as ações
planejadas no PTS. Ele assume a gestão da clínica e do cuidado do projeto
terapêutico em andamento. É aquele profissional que o usuário e a família
procuram em caso de necessidade. Pode ser qualquer componente da
equipe, independente da formação (40,41).
O PTS é uma possibilidade de realização da Clínica Ampliada, sendo
que se caracteriza por práticas de cuidado interdisciplinar e pela percepção
do usuário como um ser complexo e autônomo. A construção do vínculo
estável entre profissional de saúde e usuário é fundamental para a
realização da Clínica Ampliada que se compromete a promover ações
visando o respeito a singularidade do sujeito em adoecimento e tem como
princípios a responsabilização sobre estes usuários dos serviços de saúde e
um compromisso ético profundo. Neste contexto reconhece os limites dos
conhecimentos dos profissionais de saúde e das tecnologias por eles
empregadas e estimula a busca por outros conhecimentos em diferentes
setores construindo a intersetorialidade (41).
Dessa forma, a partir do reconhecimento da importância do PTS faz
se necessários estudos contínuos sobre a construção, implementação e
reconstrução desde dispositivo, identificando fatores que facilitam e
dificultam este processo, sendo necessário ampliar o debate cientifico desde
norteador do cuidado nos serviços de atenção psicossocial em saúde
mental.
45
2. JUSTIFICATIVA
Com base no exposto na seção anterior, percebe-se que as
mudanças de saberes e práticas propostos pela Reforma Psiquiátrica são
relativamente recentes e a apropriação do projeto terapêutico singular
para nortear o cuidado em saúde mental auxilia na efetivação de
pressupostos propostos tais como a construção compartilhada do
cuidado, a corresponsabilização, a relação horizontal com valorização
dos saberes da equipe, usuários e familiares, o protagonismo do usuário
como cerne nesse processo. Considerando a importância que o PTS tem
atualmente na gestão dessas novas formas de cuidado faz-se necessário
ampliar a compreensão de como está ocorrendo a sua construção e
operacionalização nos diferentes CAPS. Importante se faz também
apreender as múltiplas perspectivas dos sujeitos envolvidos neste
processo (equipe-usuário-família), possibilitar esta compreensão, visando
conhecer como está se dando a construção, implementação e
reconstrução, identificando fatores que facilitam e dificultam este
processo no CAPS ADi III. Com isso espera-se contribuir para ampliação
do conhecimento sobre como estão sendo organizados os processos
terapêuticos neste novo cenário dos serviços substitutivos.
46
3. OBJETIVOS
• Objetivo Geral
Descrever e analisar o processo de construção e operacionalização
do Projeto Terapêutico Singular em um Centro de Atenção Psicossocial
Álcool e outras drogas Infanto-Juvenil (CAPS ADi III) de Aparecida de
Goiânia.
• Objetivos Específicos:
• Conhecer as finalidades do processo terapêutico no CAPS ADi III a
partir das concepções dos usuários, familiares e trabalhadores.
• Idenditicar como as ações e intervenções do processo terapêutico no
CAPS Adisão definidas e conduzidas.
• Descrever como os diferentes sujeitos envolvidos no processo
terapêutico (usuários, familiares, trabalhadores) compreendem o Projeto
Terapêutico Singular (PTS).
• Identificar fatores facilitadores e dificultadores no processo de
levantamento e concretização das metas estabelecidas no PTS.
47
4. MÉTODO (S)
4.1.Delineamento do estudo
O estudo foi uma pesquisa exploratório-descritiva, de abordagem
qualitativa. A abordagem qualitativa foi escolhida por ser tratar da busca a
compreensão de um fenômeno que não se reduz os aspectos objetivos
passíveis de quantificação. Os elementos centrais da pesquisa são
conjuntos de saberes e práticas de usuários, familiares e trabalhadores
sobre a construção e condução de projetos terapêuticos no CAPS ADi III.
A pesquisa qualitativa responde a questões da realidade que não
podem ser quantificadas, contemplando o universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes, que corresponde a um espaço das
relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à
quantificação de variáveis (42,43).
As abordagens qualitativas não tem a finalidade de estabelecer leis
que levem a generalização, pois os dados advindos desse tipo de pesquisa
visam a compreensão mais aprofundado de certos acontecimentos sociais
(42,43). No campo da saúde/doença as abordagens qualitativas promovem a
reflexão de como se dão as relações entre o saber teórico e as práticas
desenvolvidas dentro dos serviços de saúde. Tais reflexões podem suscitar
mudanças e transformações nas dinâmicas institucionais e nos processos
terapêuticos (44).
4.2.Cenário do estudo
O Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil - Álcool e outras
drogas (CAPS ADi III) onde foi realizado a pesquisa atende crianças e
adolescentes que fazem uso de drogas. Ele está localizado em Aparecida de
48
Goiânia e é o único do Centro-Oeste tipo III que é especifico dessa demanda
e está em funcionamento desde 2013. Além do CAPS ADi, estão localizados
nesta cidade outros três:
• CAPSi II: Oferece atendimento de segunda a sexta, das 07:00
as 19:00 horas a crianças e adolescentes com transtornos mentais.
• CAPS AD III: Oferece atendimento 24 horas para adultos que
apresentam transtornos decorrentes do uso de álcool e/ou outras drogas.
CAPS III Bem-me-quer: Oferece atendimento 24 horas para adultos
com transtornos mentais.Os CAPS tipo III são localizados em municípios
com população superior a 200.00 habitantes (13,14). O município em que
está localizado o CAPS que será cenário desde estudo conta no momento
com população estimada de 590,146 habitantes, segundo do IBGE, sendo o
segundo município mais populoso do estado (45).
O CAPS III constitui um serviço de atenção contínua, durante 24 horas
diariamente. Este serviço deve se responsabilizar por organizar a demanda
da rede cuidados em saúde mental, coordenar as atividades de supervisão de
unidades hospitalares psiquiátricas e capacitar as equipes de atenção básica,
serviços e programas de saúde mental no âmbito do seu território (13,14).
O atendimento no CAPS é porta-aberta, ou seja, não é necessário
nenhum encaminhamento ou regulação para ser inserido no Serviço. As
modalidades de atendimento oferecidas nesta Unidade são:
• Atendimentos em grupos ou individuais: Nesta modalidade o usuário
ou familiar comparecem a unidade apenas para atendimentos específicos que
duram entre 30 minutos a 1 hora.
•Acolhimento diurno: É caracterizado quando o usuário permanece no
serviço por um tempo mínimo de 4 horas e máximo de 9 horas, sendo que o
mesmo participa de todas atividades ofertadas durante este período, sendo
oferecidas as refeições durante este intervalo. Essa modalidade visa o
afastamento dos usuários de situações conflituosas e o manejo e situações
de crise decorrente do uso de álcool e outras drogas
49
• Acolhimento noturno: O acolhimento noturno tem como objetivo o
afastamento do usuário de situações conflituosas e o manejo de crises
desencadeadas pelo uso de álcool e outras drogas. Tais situações podem
envolver rupturas familiares, comunitárias, limites de comunicação e/ou
impossibilidade de convivência. Esta modalidade de atendimento não deve
exceder 14 dias nos quais devem ser organizadas e operacionalizadas ações
que visem o resgate e o redimensionamento das relações interpessoais e o
convívio familiar e comunitário. O usuário permanece diuturnamente na
unidade. No entanto, como CAPS é porta aberta, é acordado com o usuário
que ele pode encerrar o acolhimento a qualquer momento. A unidade conta
hoje com leitos doze leitos para acolhimento noturno.
No CAPS ADI III são realizadas as seguintes atividades:
1. Atendimentos individuais tais como:
1.1 Atendimento psicoterápico para usuários e familiares.
1.2 Consultas médicas com clínico geral e psiquiatra,
1.3 Consultas de enfermagem onde são identificados problemas de
saúde e estabelecidas condutas da enfermagem mais adequadas para
tais situações.
1.4 Orientações sobre medicamentos com farmacêutica.
1.5 Orientações sobre inserção em cursos profissionalizantes,
atividades esportivas e programas sociais com a assistente social.
2. Visitas e atendimentos domiciliares.
3. Busca ativa realizada por contato telefônico com objetivo de convidar
adolescentes que evadiram ao tratamento a retornar as atividades no CAPS.
4. Atendimentos em grupos: As atividades em grupo acontecem
diariamente, sendo que acontecem grupos no período nos dois períodos
(matutino e vespertino). Participam dos grupos adolescentes que estão em
acolhimento noturno, adolescentes que estão em acolhimento diurno e
aqueles adolescentes que vem especificamente para participar dessas
atividades. Os grupos são desenvolvidos pelos seguintes profissionais:
psiquiatra, clínico geral, assistente social, enfermeiro, farmacêutico e
psicólogo.
50
Reuniões de equipe.Atualmente a equipe que trabalha no CAPS ADi
III é composta pelos seguintes profissionais: duas cozinheiras, duas
auxiliares de higienização, duas assistentes administrativos, três psicólogas,
três assistentes sociais, oito enfermeiros, uma farmacêutica, duas gestoras
(psicóloga e enfermeira), um clínico geral, uma psiquiatra e 11 técnicos de
enfermagem. O quadro de funcionário é composto por concursados,
comissionados e credenciados.
Os usuários em sua maioria, são adolescentes, que fazem uso de
múltiplas drogas. Vivem em contexto de vulnerabilidade social, residem na
periferia, evadiram da escola e tem opções restritas de lazer e cultura.
4.3.Amostra Populacional:
A amostra da pesquisa foi composta por três grupos de sujeitos
contemplando os aqueles que participam dos processos que envolvem o
Projeto Terapêutico Singular, sendo eles usuários, familiares e
trabalhadores. Abaixo estão relacionados a quantidade de sujeitos de cada
grupo e os critérios de inclusão e exclusão utilizados no estudo.
• Sete usuários participaram da pesquisa. Os critérios de
inclusão foram: adolescentes (compreendido entre 12 anos e 17 anos e 11
meses), de ambos os sexos, que fazem uso de álcool e outras drogas, que
estavam frequentando o CAPS ADi III, com regularidade, de acordo com as
atividades acordadas no seu PTS, que aceitaram participar da pesquisa e
que os responsáveis autorizaram sua participação. Foi apresentado aos
responsáveis Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (anexo 4) e aos
adolescentes o Termo de Assentimento (anexo 2). O critério de exclusão
foi o adolescente ter alguma limitação cognitiva que prejudicasse a
compreensão das perguntas realizadas na entrevista.
• Sete familiares participaram da pesquisa. Os critérios de
inclusão foram: familiares de adolescentes que frequentavam as atividades
no CAPS ADi III no período da pesquisa, que aceitaram participar e
autorizaram a participação dos adolescentes. O critério de exclusão foi o
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular
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Análise das práticas de cuidado no CAPS ADi a partir do Projeto Terapêutico Singular

  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE FARMÁCIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ASSISTÊNCIA E AVALIAÇÃO EM SAÚDE CRISTIANE NOGUEIRA DA COSTA Práticas de cuidado de um CAPS ADI III a partir do Projeto Terapêutico Singular Goiânia 2022
  • 2.
  • 3. ii
  • 4. iii CRISTIANE NOGUEIRA DA COSTA Práticas de cuidado de um CAPS ADI III a partir do Projeto Terapêutico Singular Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Assistência e Avaliação em Saúde em 2022, da Faculdade de Farmácia, da Universidade Federal de Goiás como requisito para obtenção do Título Mestre em Assistência e Avaliação em Saúde. Área de concentração: Assistência e Avaliação em Saúde Orientador: Dra. Silva Helena Rabelo dos Santos Coorientador: Dr. Reginaldo Teixeira Mendonça Goiânia 2022
  • 5. iv
  • 6. v
  • 7. vi
  • 8. vii Dedico este trabalho ao meu irmão que me incentivou a retomar meus sonhos.
  • 9. viii AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus por me permitir vivenciar este sonho de ingressar no Mestrado nesta instituição que sempre admirei. A minha mãe por ter me dado a vida e por ter me apoiado no meu percurso até aqui. Ao meu irmão, por me incentivar a sempre progredir na carreira profissional e acadêmica, me oferecendo suporte. Ao professor e orientador Reginaldo que aceitou o desafio de estar comigo nesta caminhada, mesmo de forma inesperada, sempre se mostrando compreensivo com minhas limitações, conduzindo minha busca pelo conhecimento, mas permitindo que eu desenvolvesse esta pesquisa com autonomia. A minha amiga Sandra, farmacêutica, com quem tive a oportunidade de compartilhar o processo de trabalho e me apresentou este programa de mestrado. As amigas e colegas do curso e do trabalho que sempre me ofereçam a escuta e se dispuseram a discutir comigo minhas angústias Ao meu noivo por escutar minhas demandas e sempre fortalecer a minha autoestima, autoeficácia e autoconfiança durante o percurso. A Secretaria de Saúde do Município de Aparecida de Goiânia por permitir o desenvolvimento desta pesquisa. Ao CAPS ADi por me proporcionar tantas vivências e aprendizados. E especialmente, aos usuários, familiares e trabalhadores que aceitaram participar desta pesquisa e tornaram tudo isso possível.
  • 10. ix As coisas não são ultrapassadas tão facilmente, são transformadas (Nise da Silveira)
  • 11. x SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS CAPS -Centro de Atenção Psicossocial CAPS AD – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas CAPS ADi – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas Infanto- Juvenil CAPSi – Centro de Atenção Psicossocial Infantil CEBES – Centro Brasileiro de Estudo em Saúde CEP - Comitê de Ética em Pesquisa CNSM - Conferência Nacional de Saúde Mental COVID-19 - Corona Virus Disease (Doença do Coronavírus) que teve reaparecimento de casos em 2019 CPI - Comissão Parlamentar de Inquérito CSM - Centros de Saúde Mental CVC - Centro de Valorização da Criança e do Adolescente DINSAM - Divisão Nacional de Saúde Mental ESF - Estratégia de Saúde em Família EUA – Estados Unidos da América FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz HIV/Aids - Vírus da Imunodeficiência Humana/Síndrome da Imunodeficiência Adquirida HPII - Hospício de Pedro II INPS - Instituto Nacional de Previdência Social MTSM - Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental NAPS - Núcleo de Atenção Psicossocial PAIUAD - Política de Atenção Integral aos Usuários de Álcool e outras Drogas
  • 12. xi PTI – Projeto Terapêutico Individual PTS – Projeto Terapêutico Singular RAPS - Rede de Atenção Psicossocial REME - Renovação Médica SUS – Sistema Único de Saúde SP – São Paulo TALE - Termo de Assentimento Livre e Esclarecido TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TO – Terapeuta Ocupacional UFG - Universidade Federal de Goiás
  • 13. xii RESUMO Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como serviços substitutivos e estratégicos na assistência aos indivíduos com sofrimento psíquico no contexto social e de saúde, sendo responsáveis, no âmbito do seu território, pela organização da demanda e da rede de cuidados em saúde mental. Uma das ferramentas utilizadas no CAPS o Projeto Terapêutico Singular (PTS), sendo importante ferramenta de cuidado, resultado de discussão coletiva de equipe interdisciplinar, usuário e família, visando o protagonismo no usuário, a singularização das práticas em saúde, a territorialização do cuidado e promovendo a corresponsabilização nas ações pactuadas. Neste contexto o objetivo desse trabalho é descrever e analisar como ocorre a construção e operacionalização do Projeto Terapêutico Singular em um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas Infanto-Juvenil (CAPS ADi) da região metropolitana de Goiânia -GO. Esta é uma pesquisa exploratório- descritiva, de abordagem qualitativa. O cenário do estudo foi o CAPS ADi III de Aparecida de Goiânia, sendo que participaram usuários, familiares e trabalhadores que são envolvidos na construção compartilhada do PTS. A coleta dos dados foi realizada com entrevista semiestruturadas e a organização e interpretação dos dados ocorreu utilizando a técnica Análise de Conteúdo proposta por Minayo. Os resultados apontam ainda dissonância e contradições entre a prática e os pressupostos teóricos nos processos terapêuticos e na forma como é construído e operacionalizado o projeto terapêutico singular no CAPS ADi. Observou-se que as ações em saúde mental neste serviço são permeadas pelos dois paradigmas de atenção: manicomial e psicossocial. No entanto, como a proposta de reforma psiquiátrica é relativamente recente, os saberes e práticas ainda passam por um momento de transição pragmática, tendo avanços e retrocessos característicos dos processos de mudança. Palavras-chave: Projeto Terapêutico Singular, CAPS, Saúde Mental Infantojuvenil
  • 14. xiii ABSTRACT Psychosocial Care Centers (CAPS) as substitutive and strategic services in assisting individuals with psychological distress in the social and health context, being responsible, within their territory, for the organization of demand and the network of mental health care. One of the tools used in CAPS is the Singular Therapeutic Project (PTS), being an important care tool, the result of a collective discussion by an interdisciplinary team, user and family, aiming at the protagonism in the user, the singularization of health practices, the territorialization of care and promoting co-responsibility in the agreed actions. In this context, the objective of this work is to describe and analyze how the construction and operation of the Singular Therapeutic Project occurs in a Psychosocial Care Center for Alcohol and Other Drugs for Children and Youth (CAPS ADi) in the metropolitan region of Goiânia -GO. This is an exploratory-descriptive research, with a qualitative approach. The study setting was the CAPS ADi III in Aparecida de Goiânia, with the participation of users, family members and workers who are involved in the shared construction of the PTS. Data collection was carried out with semi- structured interviews and the organization and interpretation of data took place using the Content Analysis technique proposed by Minayo. The results also point to dissonance and contradictions between the practice and the theoretical assumptions in the therapeutic processes and in the way in which the singular therapeutic project is constructed and operationalized in CAPS ADi. It was observed that the actions in mental health in this service are permeated by two paradigms of care: asylum and psychosocial. However, as the psychiatric reform proposal is relatively recent, knowledge and practices are still undergoing a moment of pragmatic transition, with advances and setbacks characteristic of the processes of change. Keyword: Singular Therapeutic Project, CAPS, Children's Mental Health
  • 15. xiv SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................... 8 1. REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................................... 11 1.1. A REFORMA PSIQUIÁTRICA........................................................................................ 11 1.2. PRÁTICAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL .......................................................... 27 1.3. UMA NOVA PROPOSTA DE CLÍNICA.......................................................................... 32 1.4. PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR......................................................................... 39 2. JUSTIFICATIVA ..................................................................................................................... 45 3. OBJETIVOS............................................................................................................................ 46 4. MÉTODO(S)............................................................................................................................ 47 4.1. DELINEAMENTO DO ESTUDO ..................................................................................... 47 4.2. CENÁRIO DO ESTUDO ................................................................................................. 47 4.3. AMOSTRA POPULACIONAL: ....................................................................................... 50 4.4. PROCEDIMENTOS:........................................................................................................ 52 4.5. ANÁLISE DOS DADOS.................................................................................................. 53 4.6. ASPECTOS ÉTICOS ...................................................................................................... 54 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................................. 56 5.1. CONCEPÇÕES SOBRE AS PRÁTICAS DE CUIDADO EM SAÚDE MENTAL ........... 56 5.2. PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR......................................................................... 64 5.3. LIMITES, DIFICULDADES E DESAFIOS RELACIONADOS AO PTS.......................... 83 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................... 95 7. REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 97 8. ANEXOS ............................................................................................................................... 109 ANEXO 1 – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA ................................................................. 110 ANEXO 2 – TERMO DE ASSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .............................. 117 ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TRABALHADORES)............................................................................................................ 120
  • 16. xv ANEXO 4 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (RESPONSÁVEIS) ................................................................................................................ 124 ANEXO 5 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (TRABALHADORES) ..................................... 129 ANEXO 6 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (ADOLESCENTES) ........................................ 131 ANEXO 7 – ROTEIRO DE ENTREVISTAS (RESPONSÁVEIS).......................................... 133 ANEXO 8 – PRODUTO TÉCNICO – CAPÍTULO DE LIVRO .............................................. 135 ANEXO 9 – SUBMISSÃO DE PRODUTO ........................................................................... 150
  • 17. 8 APRESENTAÇÃO O presente estudo foi desenvolvido a partir das reflexões e práticas surgidas ao longo de nove anos de trabalho da pesquisadora em saúde mental. Dois desses foram no modelo asilar e sete em Centro de Atenção Psicossocial. As inquietações foram se intensificando com as leituras sobre as práticas de cuidado aos indivíduos com sofrimento psíquico e sobre os pressupostos propostos pela Reforma Psiquiátrica, sendo que eu já observava no meu cotidiano de trabalho nas instituições, que este movimento de mudança ainda estava em processo. A vivência de dificuldades relacionadas ao Projeto Terapêutico Singular (PTS) no CAPS ADi despertaram a necessidade de buscar ampliar a compreensão deste instrumento de gestão do cuidado, tanto em aspectos teóricos como quanto aos atores envolvidos no processo terapêutico, sendo que estas inquietações deflagraram esta pesquisa. Este trabalho se inscreve no campo de atenção psicossocial, em um cenário pós reforma psiquiátrica, que demandou não apenas a substituição e criação de novos dispositivos de cuidado, mas demandou a reflexão e inovação de saberes e práticas na área de saúde mental. Propõe-se a horizontalização da relação entre equipe e população usuária, sendo que o processo terapêutico não tem como foco apenas o binômio cura-doença, mas a produção de novas formas de vida. O foco de atuação não é apenas o indivíduo, mas a sua família e o contexto em que e se insere. O usuário é o protagonista do processo e as ações visam o fortalecimento de sua autonomia e a construção de um cuidado coletivo. Sendo este processo relativamente recente, faz-se necessário pesquisas que apreendam como estão se configurando este movimento de mudança do cuidado em saúde mental nos serviços substitutivos. Neste contexto, esta pesquisa visou compreender e discutir como os atores envolvidos no processo terapêutico no CAPS ADi apreendem e
  • 18. 9 participam do projeto terapêutico singular que orientam o cuidado neste novo modo de atenção. Tem-se o foco na utilização do Projeto Terapêutico Singular no CAPS, sendo que nesta perspectiva visa o planejamento e organização das ações em saúde mental buscando a centralidade no sujeito, respeitando sua singularidade, práticas em saúde no território, levando em consideração o contexto em que o sujeito está inserido. O PTS demanda uma construção coletiva promovendo a participação ativa dos envolvidos no processo terapêutico (usuário-família-equipe) propiciando a corresponsabilização e pactuação compartilhada de objetivos e ações. Nesta perspectiva esta dissertação é organizada em cinco partes. Inicia-se pelo referencial teórico em se que descreve o processo da reforma psiquiátrica no mundo e no Brasil demonstrando como foi deflagrado e construído esse movimento de mudança na forma de cuidado aos usuários, com a construção e reconstrução de ações que culminaram na desinstitucionalização, criação de serviços substitutivos aos manicômios e a proposta de um novo modelo de atenção em saúde, denominado psicossocial, em oposição ao hospitalocêntrico. Posteriormente, discute-se sobre os paradigmas de atenção em saúde mental, expondo características do modelo manicomial e do modelo psicossocial. Discute-se ainda nas formas de fazer a clínica nessa nova perspectiva de cuidado da mudança do foco biomédico para uma proposta ampliada de intervenção. Por fim, discute-se sobre o PTS na saúde mental, sendo que foi apreendido neste cenário nas primeiras experiências de cuidado no CAPS e propõe a organização no cuidado nos serviços substitutivos. Na parte II ocorre a apresentação dos argumentos que justificaram o desenvolvimento desta pesquisa e os objetivos que se propõe a alcançar. Na parte III apresentou-se a metodologia utilizada no estudo, o delineamento do estudo, o cenário, os sujeitos, os procedimentos, a coleta de dados e como ocorreu a análise dos dados. Nesta parte também se discutiu sobre aspectos éticos que permearam o desenvolvimento da pesquisa. Na parte IV ocorre a apresentação e discussão dos dados que foram organizados em três categorias: Concepções sobre as práticas de cuidado
  • 19. 10 em saúde mental, Projeto Terapêutico Singular e Desafios, Dificuldades e obstáculos relacionados ao Projeto Terapêutico Singular. Por fim, na parte V são traçadas as considerações finais a respeito da pesquisa.
  • 20. 11 1. REFERENCIAL TEÓRICO 1.1. A Reforma Psiquiátrica Durante muitos anos a psiquiatria desempenhou o papel de controle dos sujeitos sociais desviantes. Os pacientes psiquiátricos eram excluídos da sociedade, marginalizados e desprovidos de sua autonomia e independência. Para abriga-los e para mantê-los distantes do meio que, segundo a crença da época os deixavam insanos, foram construídos grandes e cruéis manicômios. O principal foco do tratamento era a doença. A assistência ao paciente em sofrimento psiquiátrico era caracterizada pela repressão, punição e vigilância. O doente mental não recebia tratamento digno, sendo tratado, muitas vezes com violência. O tratamento com foco na doença, sem estímulo das potencialidades, que eram reduzidas até os indivíduos se tornarem incapazes de retornar ao convívio social (1). O modelo da psiquiatria tradicional baseava na tese psiquiatrizante, surgida com base no paradigma científico positivista, no final do século XIX, em contraposição a visão medieval de saúde como “dádiva de Deus” e de doença e loucura como “pecado” ou “possessão demoníaca”. O pilar de sustentação epistêmico é a noção de “doença mental” tendo como pressupostos o conceito de “doença” com o determinismo organicista explicando o fenômeno do sofrimento psíquico e o termo “mental” relacionado ao racionalismo e dualismo cartesiano, implicando a percepção do sofrimento psíquico como desordem de caráter individual, decorrentes da perda da razão e do afastamento da lógica socialmente aceita (2). Nessa perspectiva da psiquiatria tradicional, o tratamento ocorria exclusivamente dentro dos hospitais psiquiátricos. No século XVII estas instituições passaram a exercer também função social e disciplinar,
  • 21. 12 recebendo além dos pobres e necessitados, os delinquentes e loucos. Marco importante desse processo foi a criação do Hospital Geral na França, sendo que a internação desses pacientes passou a ser determinada por autoridades reais e judiciárias. Nestas instituições, denominadas manicômios, centenas ou milhares de pessoas permaneceram amontoadas em pavilhões e pátios. Tinham como objetivo a segregação da sociedade das pessoas que não se encaixavam nos padrões sociais, incluindo os loucos. Até antes dessa transformação a loucura tinha múltiplos significados e lugares. Os loucos eram vistos como demônios, endeusados e ocupavam ruas, asilos prisões, igrejas. No entanto o advento do hospital geral foi fundamental para definir um novo lugar social para a loucura (3,4). Após a Revolução Francesa, os médicos ocuparam essa nova modalidade de instituição e iniciaram uma atuação no sentido de humaniza- las, inspirados pelo lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” existia o objetivo de sanear o aspecto insalubre e de superar a natureza de violência e exclusão social que os hospitais representavam. Com a intervenção médica foram libertados vários internos que ali estavam em decorrência de outros regimes e os hospitais iniciaram um processo de mudança, perdendo as funções de caridade e controle, passando a assumir funções de tratamento dos enfermos (5). Logo os médicos passaram a gerir essas instituições e serem os detentores máximos do poder, tornado o hospital a principal instituição médica e a medicina se tornou uma prática e um saber predominantemente hospitalar, caracterizando o processo denominado medicalização do hospital. Estas instituições tornaram-se o espaço de exame, tratamento e reprodução do saber médico. Com isolamento do doente, podia-se ter controle e vigilância, permitindo o estudo das doenças de forma institucionalizada (3). A medicalização dos hospitais inspirou o modelo biomédico da medicina ocidental, tendo como algumas características que se fundamentaram nesse contexto, foco na doença, no conhecimento
  • 22. 13 especializado em partes em detrimento do todo, na atenção verticalizada e hierarquizada entre outras (3). Esse processo de transformação nos hospitais teve como importante expoente Phillippe Pinel que em 1793 passou a dirigir o Hospital de Bicêtre na França. Após retirar da instituição os que não eram especificamente enfermos, ele iniciou a separação dos doentes de acordo com as enfermidades. Tal processo permitiu a identificação, observação, descrição e classificação das patologias. Pinel dedicou-se principalmente a loucura, que denominou alienação mental sendo considerado o fundador da psiquiatria. O conceito de alienação está relacionado a alguém fora da realidade, fora de si, sem controle das suas vontades e desejos. Nesse sentido o conceito de alienação mental nasce associado a ideia de periculosidade, sendo que o alienado supostamente não tem discernimento entre o erro e realidade. Desta forma o alienado tinha que ser mantido isolado da sociedade, institucionalizado para que fosse observado, diagnosticado e recebesse o tratamento com ordem e disciplina para que a mente desregrada pudesse se organizar novamente (4,6). No entanto o hospital psiquiátrico criado por Pinel não se configurou como lugar de tratamento e de cuidado das pessoas com sofrimento mental como proposto. Logo os asilos em todo o mundo ficaram superlotados de internos. Havia dificuldades em estabelecer limites entre sanidade e loucura e surgiram as primeiras críticas ao modelo asilar que ainda cumpriam sua função de segregação de segmentos marginalizados da população e era cenário de constantes denúncias de violência, maus-tratos, violação de direitos humanos (4). Uma primeira tentativa de resgatar o potencial terapêutico da instituição psiquiátrica ocorreu com a proposta das colônias de alienados, localizadas em áreas agrícolas, onde os alienados eram submetidos ao trabalho terapêutico. O trabalho era considerado importante prática terapêutica que estimulava a vontade e a energia, consolidando a resistência cerebral e fazendo desaparecer os sintomas psíquicos. No entanto, da ideia de uma aldeia de pessoas livres, com sua própria história e cultura,
  • 23. 14 nasceram instituições asilares de recuperação pelo trabalho e as colônias se mostraram semelhantes aos asilos tradicionais (5). As duas Grandes Guerras Mundiais, promoveram uma reflexão na sociedade sobre a natureza humana, tanto em aspectos de crueldade como solidariedade, promovendo condições históricas para outro período de transformações psiquiátricas. Após a segunda Guerra, a sociedade dirigiu seus olhares para os hospícios e perceberam que as condições de vida oferecida aos pacientes psiquiátricos eram semelhantes as vidas das vítimas dos campos de concentração, com ausência absoluta de dignidade humana. Surgiram então as primeiras experiências das reformas psiquiátricas pelo mundo (5). No contexto pós-guerra os soldados ingleses precisavam ser tratados em suas enfermidades para trabalharem no projeto de reconstrução nacional. No entanto, havia uma grande quantidade de pessoas que demandavam cuidados e em contrapartida, uma oferta muito escassa de profissionais para atendê-los. Nesse contexto, Main, Bion e Reichman iniciaram no Hospital Monthfield (Inglaterra) uma prática terapêutica utilizando o potencial dos próprios pacientes no tratamento. Organizavam reuniões em que os pacientes discutiam as dificuldades, projetos, planos de cada um. Realizavam assembleias em que eram elaboradas propostas de trabalho em que todos, pacientes e funcionários eram envolvidos. Nesse contexto surgiu a expressão psicossocial, a partir de um livro de James L. Hallidy intitulado Psychosocial Meidicien, publicado em Londres no ano de 1948. Em 1959 Maxwell Jones passou a organizar grupos de discussão e grupos operativos trazendo maior sistematização e dinâmica ao processo. Ele propôs que os internos deviam participar ativamente de todas as atividades disponíveis e entendia que a função terapêutica deveria ser assumida por todos, técnicos, familiares, pacientes. Dessa forma seriam organizadas comunidades terapêuticas que visava a mudança nas relações de cuidado, opondo-se a hierarquização ou verticalização dos papéis e buscando uma relação horizontal e democrática no processo terapêutico (3).
  • 24. 15 Na França, Tosquelles propôs uma experiência semelhante a comunidade terapêutica. Também visava a experiência de coletivo terapêutico com a perspectiva de que o hospital tinha a função terapêutica e que os pacientes e técnicos deviam lutar contra a violência institucional e a verticalidade nas relações interinstitucionais. A então concebida Psicoterapia Institucional propôs a transversalidade, com encontro e ao mesmo tempo confronto de papéis profissionais e institucionais para problematizar as hierarquias e hegemonias. Resgatou a noção de trabalho terapêutico como importante atividade que oferecia possibilidades de participação e responsabilização dos internos (3). Estas propostas foram importantes porque possibilitaram pela primeira vez que a voz do paciente fosse ouvida e o reconhecimento do seu potencial de participar ativamente sobre o próprio tratamento. Contudo ficaram restritas ao modelo hospitalocêntrico, considerando essa instituição de cura. Os pacientes permaneciam segregados da sociedade, afastados das suas famílias e dos seus territórios. Outras propostas buscaram romper o modelo hospitalocêntrico e forcaram na comunidade, visando reduzir a ocorrência de enfermidades mentais ou a necessidade de internação. Com estas propostas podem ser apontadas a psiquiatria de setor e a psiquiatria preventiva norte-americana (5). No final dos anos 50 e inícios dos anos 60, A Psiquiatria de Setor apontou a necessidade de se adotar medidas de continuidade terapêutica após a alta hospitalar visando evitar a reinternação ou prevenir a internação de novos casos. Foram então criados na França os Centros de Saúde Mental (CSM) que foram espalhados pelas regiões sendo organizados de acordo com a distribuição populacional, inaugurando o conceito de regionalização na assistência psiquiátrica (6). A criação dos CSM trouxe outra importante mudança nas práticas de cuidado, sendo que o tratamento passou a ser responsabilidade de uma equipe multiprofissional, não apenas do médico psiquiatra. Enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais começaram a serem protagonistas no contexto de política de saúde mental. A equipe que acompanhava o paciente
  • 25. 16 internado, continuava o tratamento quando o mesmo recebia alta. Da mesma forma, o paciente que estava sendo acompanhado no CSM, quando precisava de internação, também era acompanhado pela mesma equipe. Começou-se a ser valorizado o vínculo como importante ferramenta terapêutica (6). No mesmo período, estava surgindo nos Estados Unidos a Psiquiatria Preventiva tendo como seu fundador Gerald Caplan. Ele entendia que as doenças mentais seguiam uma linearidade na evolução, sendo que poderiam ser prevenidas se detectadas precocemente. Nessa perspectiva poderia ser realizada a prevenção nos três níveis. A prevenção primária corresponderia as intervenções nas condições etiológicas da doença mental, seja de origem individual ou do meio. A prevenção secundária poderia ser realizada a partir das intervenções visando diagnóstico e tratamento precoce da doença mental. E por fim, a prevenção terciária seriam as estratégias de readaptação do paciente a vida social, após a estabilização dos sintomas (6). A Psiquiatria Preventiva consolidou-se como uma proposta de saúde mental comunitária, sendo que as equipes de saúde mental identificavam e interviam em crises individuais, familiares e sociais. O conceito de crise foi estratégico nesse movimento visto que consideravam que encarar novos obstáculos e conflitos poderia promover saúde, se a pessoa fosse assistida e recebesse apoio adequado durante tais situações de crise (5). Na Psiquiatria Preventiva surgiu o termo desvio, apropriado pelas ciências sociais, para se referir a comportamento desadaptado a norma social estabelecida, referindo-se ao anormal e pré-patológico. O conceito de desinstitucionalização também surgiu neste contexto e nomeava as medidas de desospitalização dos pacientes. Foram implantados nos EUA vários centros de saúde mental, oficinas, lares, hospital-dia, hospital-noite, enfermarias e leitos em hospitais gerais e outros com objetivo de tornar o hospital psiquiátrico um recurso obsoleto que fosse caindo em desuso na medida que a incidência de doenças mentais reduzisse em decorrência das ações preventivas e os serviços comunitários em saúde ampliassem a
  • 26. 17 competência e efetividade em tratar as doenças em regime extra-hospitalar (5). No entanto, os resultados foram diferentes do esperado, ocorrendo aumento importante da demanda psiquiátrica nos EUA, tanto dos serviços extra-hospitalares como nos hospitais psiquiátrico e os serviços comunitários acabaram por se transformarem em grande captadores e encaminhadores de pacientes para os hospitais psiquiátricos (3). Durante este período, na Inglaterra surgiu um outro movimento também questionando o modelo tradicional de cuidado aqueles que estavam em sofrimento psíquico. A Antipsiquiatria teve como precursor Ronald Cooper e considerava que a experiência patológica não ocorre entre corpo ou mente doente, mas nas relações estabelecidas entre ele e a sociedade. Concebia que o hospital psiquiátrico apenas reproduzia e radicalizava as estruturas opressoras e patogênicas da organização social manifestadas principalmente pela família. Como o conceito de doença mental era rejeitado, questionava-se então a terapêutica como foco no tratamento da doença e se propunha que a pessoa deveria vivenciar a experiência, que por si só já era terapêutica e auxiliaria na sua organização interior. Ao terapeuta cabia auxilia-lo a pessoa a vivenciar e superar este processo, acompanhando e protegendo inclusive da violência da própria psiquiatria (3). Paralelamente na Itália, Franco Basaglia iniciou o movimento denominado Psiquiatria Democrática. Sua experiência mais rica e radical aconteceu no hospital Psiquiátrico de Trieste e inspirou outros movimentos pelo mundo. Basaglia buscava a superação da prática psiquiátrica institucional original, visando a modificação do aparato manicomial não só como estrutura física, mas também como conjunto de saberes e práticas cientificas, sociais, legislativas e jurídicas que fundamentavam a existência de um lugar de isolamento, segregação e patologização da experiência humana (3). Basaglia iniciou o fechamento de pavilhões e enfermarias psiquiátricas. Foram criados os modelos substitutivos que vislumbraram
  • 27. 18 tomar o lugar das instituições psiquiátricas clássicas, não sendo paralelos, simultâneos ou alternativo as mesmas (3). Os substitutos também denominados Centros de Saúde Mental (CSM), foram organizados de forma regionalizada na Cidade de Trieste. Mas diferentemente dos anteriores propostos, estes centros não davam continuidade ao tratamento após alta hospitalar ou reintegravam os pacientes ao manicômio quando eram situações consideradas graves e de difícil manejo em regime externo. Os CSM foram organizados levando em consideração o conceito de “tomada de responsabilidade”, passando a assumir a integralidade do cuidado em saúde mental em cada território. Atuavam reconstruindo as formas como a sociedade lidavam com as pessoas em sofrimento mental, restabelecendo o lugar social da loucura que tradicionalmente estava relacionado ao erro, periculosidade, insensatez e incapacidade (5). Outras estratégias utilizadas nesse processo diziam respeito as possibilidades de inclusão social, por meio de criação de cooperativas de trabalho, construção de residências para ex-internos do hospital e outras formas de participação e produção social (grupos musicais e de teatro, produção de vídeos, oficinas de trabalho entre outras (4). A proposta italiana rompeu com as experiências anteriores principalmente no que diz respeito a desinstitucionalização, sendo que finalmente concretizou a substituição do hospital psiquiátrico por outros serviços com base territorial. Promoveu a construção de um novo modelo de atenção assistencial. As práticas terapêuticas comuns dos manicômios foram substituídas pelas práticas de cuidado no território, colocando a doença em parênteses e se ocupando do indivíduo em sua totalidade, considerando suas relações com sofrimento, seu contexto social, sua subjetividade. Surge a noção de trabalho em base territorial, ou seja, que se desenvolve no cotidiano da cidade, nos bairros, nos locais onde as pessoas vivem, trabalham e ser relacionam (3–6).
  • 28. 19 A experiência de Trieste desencadeou o processo de mudança em toda Itália, onde em 13 de maio de 1978 foi aprovada a Lei 180, conhecida como Lei da Reforma Italiana ou Lei Basaglia. Essa lei prescreveu a extinção dos manicômios em território nacional e determinou a construção dos serviços substitutivos (4). O Brasil também conta com tristes momentos na história pelo modo como tratar pessoas com sofrimento psíquico. Em 1841 foi inaugurado o primeiro hospital psiquiátrico brasileiro e da América Latina, denominado Hospício de Pedro II (HPII) no Rio de Janeiro. A estrutura era inspirada no estilo neoclássico, provido de espaços suntuosos, decoração luxuosa e ficou conhecido como o “Palácio dos Loucos”. A amplidão dos espaços, a disciplina, os passeios supervisionados, a separação por classes sociais e diagnósticos, as constantes vigilâncias representam o nascimento da psiquiatria no Brasil. Anteriormente a criação do HPII, os doentes mentais considerados perigosos eram internados no Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia, mas não recebiam assistência médica nem de enfermagem, tendo a internação apenas como papel de exclusão social (7). Posteriormente foram construídos inúmeros outros hospitais psiquiátricos em todas as capitais brasileiras. Durante o período de 1960 até 1980 muitos desses hospitais eram financiados pelo INPS (Instituto Nacional de Previdência Social) sendo considerados negócios rentáveis pois podiam ter centenas e até milhares de pacientes internados com pouquíssimos funcionários, péssimas condições sanitárias e anulação dos direitos de cidadania de seus internos. Assim como ocorreu mundialmente, no Brasil também houveram numerosas experiências de transformações a assistência as pessoas com sofrimento psíquico anteriores a Reforma, mas que não romperam o paradigma hospitalocêntrico (6). O movimento da Reforma Psiquiátrica brasileira tem início no processo que foi denominado crise de DINSAM (Divisão Nacional de Saúde Mental). Este instituto havia realizado o último concurso em 1956/1957 e a partir de 1974 estava com déficits de funcionários. Foram então contratados bolsistas, que eram profissionais graduados ou estudantes e trabalhavam
  • 29. 20 como médicos, psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais. No entanto, os profissionais vivenciaram nas instituições situações precárias de trabalho, e constantes ameaças e violências contra aos pacientes. Eram frequentes as denúncias de agressão, estupro, trabalho escravo e mortes (3). Essa crise foi iniciada com a denúncia de três bolsistas que registraram no livro de ocorrência de plantão as irregularidades da unidade hospitalar (Centro Psiquiátrico Dom Pedro II). Esse ato repercutiu e mobilizou apoio de profissionais de outras unidades, do Movimento de Renovação Médica (REME) e do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES). Decorrente dessa situação foram organizados o Núcleo de Saúde Mental do Sindicado Médico e o Núcleo de Saúde Mental do CEBES sendo promovidas sucessivas reuniões, assembleias e greves que mobilizaram profissionais de saúde mental e demais entidades da sociedade civil. Nesse contexto foi criado o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) no Rio de Janeiro que teve importante papel no processo da reforma psiquiátrica (3). O MTSM organiza-se como movimento plural sendo composto não apenas por trabalhadores da saúde, mas também por associações de familiares, sindicalistas e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas. O MTSM se configurava como um espaço de debate e luta visando transformações na assistência psiquiátrica. Reivindicavam a regularização dos bolsistas, aumento salarial, redução do número excessivo de consulta por turno de trabalho, a humanização da assistência. Criticavam a cronificação do manicômio, a falta de recurso nas unidades e a precariedade do trabalho que refletia na qualidade da assistência oferecida aos pacientes. O movimento cresceu por todo o país nos anos seguintes e ampliou as pautas de discussão denunciando a violência dos manicômios e a mercantilização da loucura (7). Em 1978 aconteceu um importante evento que influenciou o pensamento crítico do MTSM. O I Congresso Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições foi realizado no Rio de Janeiro e possibilitou a vinda ao Brasil dos principais mentores da Rede de Alternativas a Psiquiatria, tais
  • 30. 21 como do movimento da Psiquiatria Democrática Italiana, da Antipsiquiatria, sendo que compareceram ao evento Frango Basaglia, Robert Castel, Felix Guattari, Erwing Goffman, dentre outros. Ocorreram inúmeros debates e polêmicas durante e posteriormente Basaglia seguiu fazendo conferências em universidades, sindicatos e associações. Suas ideias e críticas foram incorporadas e inspiraram os movimentos do MTSM (6). Dessa forma nos encontros para discussões em Saúde Mental que acontecem nos anos subsequentes surgiram a crítica ao modelo asilar dos grandes hospitais psiquiátricos, as necessidades de mudanças nas diretrizes legais para assistência psiquiátrica, as possibilidades alternativas para o tratamento de pessoas com transtornos mentais. Permaneceram as denúncias sobre as barbaridades ocorridas nas instituições psiquiátricas e deflagram-se discussões sobre os direitos humanos dos pacientes psiquiátricos. Criticou-se o modelo assistencial hospitalocêntrico sendo considerado como ineficiente, cronificador e estigmatizante (5). Em 1980 foi criada a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso Nacional para apurar as distorções na assistência psiquiátrica brasileira e discutir a legislação penal e civil relacionada a pessoas com sofrimento psíquico. Teve também como objetivo de vincular os movimentos populares que lutavam pela liberdade de organização e participação nas políticas como também pela democratização da ordem econômica e social (5). Em 1986 ocorreu a VIII Conferência Nacional de Saúde que pela primeira vez teve caráter de consulta e participação social, sendo aberta ao público. Foi discutida uma nova concepção de saúde como direito do cidadão e dever do estado. Foram definidos princípios como universalização do acesso a saúde, descentralização, democratização. Ampliou-se o conceito de saúde sendo considerado como sinônimo de qualidade de vida e o Estado foi responsabilizado como agente promotor de políticas de bem- estar social. Neste evento decide-se pela implantação da Reforma Sanitária e criação de um sistema único e público de saúde (SUS). No campo da Saúde Mental foram realizadas discussões sobre a participação de
  • 31. 22 pacientes e ex-pacientes psiquiátricos para formular e executar políticas de assistência em saúde mental (5,7). Em 1987 ocorreu no Rio de Janeiro a I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM) e em São Paulo ocorreu o II Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental. Foram discutidos a priorização dos serviços extra-hospitalares e multiprofissionais como oposição ao modelo hospitalocêntrico, a participação da população na construção de novas políticas de saúde mental e estratégias de desinstitucionalização transferindo o centro da atenção da instituição para a comunidade (8,9). O processo de desinstitucionalização brasileira foi orientado tendo como referencial teórico-conceitual a tradição basagliana, que inspirou a reorganização do sistema de serviços e ações em saúde mental, sendo orientado pelo lema “por uma sociedade sem manicômios”. Esse processo repercutiu em mudanças no âmbito assistencial, cultural e na ação jurídica política (7) . No âmbito assistencial surgem novas modalidades de atenção que passaram representar alternativas ao modelo psiquiátrico tradicional. Em 1987 foi inaugurado o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) na cidade de São Paulo que tinha como objetivo ser um filtro entre o hospital e a comunidade, oferecendo acolhimento às pessoas que sofriam de transtornos psiquiátricos e promover a sua inserção social. Tinha também como objetivo a construção de uma rede de serviços preferencialmente comunitária (3) . Em 1988 com a promulgação da Constituição Nacional e a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) sendo os princípios básicos discutidos na VII Conferência em Saúde e estabelecendo condições institucionais para a implantação de novas políticas de saúde, oferendo subsídios para estabelecimentos de novas legislações em saúde mental. A saúde foi oficializada como direito do cidadão e dever do estado e os municípios foram responsabilizados por velar pela situação de saúde das pessoas. Foi nesse
  • 32. 23 princípio que se fundamentou a experiência em Santos que iniciou a construção de um sistema de saúde mental a partir da desconstrução do hospital psiquiátrico (8). Dessa forma, o processo da Reforma psiquiátrica teve repercussão nacional em 03 de maio 1989 após a intervenção da Secretaria de Saúde de Santos (SP) na Casa de Saúde Anchieta dos Santos. Neste hospital psiquiátrico privado foram constatadas ações de maus-tratos e mortes de pacientes e neste dia uma legião de profissionais de saúde adentrou o hospício para cuidar dos pacientes, alterando toda ordem institucional: celas fortes foram fechadas, a aplicação de eletrochoques foi proibida, alguns pacientes começaram a sair do hospital e famílias foram convocadas para participar das altas. As enfermarias foram reorganizadas de maneira que dignificasse a vida das pessoas. Os internos foram agrupados em enfermarias segundo sua localidade de origem e quando a equipe técnica e os pacientes estavam integrados eles saiam do hospital para fundar os Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS). Esses núcleos eram fundados com trabalho prévio de mobilização dos moradores locais realizando reuniões em centros comunitários, sindicatos e igrejas no quais se mostravam vídeos da intervenção e discutia-se sobre a necessidade de conviver com as pessoas internadas no Hospital. Além dos NAPS foram criados Prontos-socorros Psiquiátricos, o Núcleo de Trabalho, as cooperativas, a moradia para os pacientes crônicos sem contato familiar, o Centro de Valorização da Criança e do Adolescente (CVC) e o Núcleo de Artes TAM ex-clientes. A intervenção iniciou-se em 1989, mas apenas em 1994 o hospital foi finalmente fechado e tinha-se um sistema de saúde mental substitutivo funcionando (8). A experiência de Santos foi um marco na Reforma Psiquiátrica que avançou pelo Brasil iniciando a implantação de um novo sistema psiquiátrico que substituiria o modelo manicomial. Em outros estados também foram criados cooperativas, associações, instituições de residencialidade e os Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), que eram regionalizados e tinham como objetivo acolher e promover atendimento 24 horas para pessoas egressas de hospitais psiquiátricos (8, 9).
  • 33. 24 Essa experiência em Santos repercutiu no campo jurídico-político, sendo que em 1989 o deputado Paulo Delgado apresentou o projeto de Lei 3.651/89 que propunha a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país, privilegiando o modelo de assistência em Saúde Mental com base comunitária. No entanto, apenas doze anos depois de tramitação no Congresso a Lei Paulo Delgado foi sancionada. Ocorreu, porém, a aprovação de um substitutivo do Projeto de Lei original, que apresentou modificação importantes no texto normativo. Assim a Lei Federal 10.216 redirecionou a assistência em saúde mental, dispôs sobre direitos das pessoas com transtornos mentais e privilegiou o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária. Todavia o texto legal não deixou claro quais seriam as alternativas para extinção progressiva dos manicômios (8,10). Em 1990, foi realizada a II Conferência Nacional de Saúde Mental no qual foi assinado a Declaração de Caracas, documento que marca a reforma da saúde mental nas Américas. O Brasil se comprometeu com reestruturação do modelo assistencial em Saúde Mental, priorizando o atendimento realizados na comunidade visando a reabilitação e reinserção social. Neste mesmo ano foram elaboradas as primeiras normas federais que regulamentavam a implantação dos serviços de atenção diária baseadas nas experiencias do CAPS e do NAPS e estabeleciam critérios de classificação e fiscalização de hospitais psiquiátricos (11). A década de 90 foi marcada por movimento intenso na área política e de normativas para saúde mental, com respaldo da Declaração de Caracas e dos relatórios da I e II Conferências Nacionais da Saúde Mental foram estabelecidos programas intersetoriais para pessoas com sofrimento psíquico, visando a integralidade do cuidado, tendo as práticas terapêuticas que consideravam o indivíduo em sua totalidade, não apenas focada nos sintomas. Foram também estabelecidos programas de capacitação de recursos humanos, apoio técnico, ações de supervisão, controle e avaliação da rede assistencial (3).
  • 34. 25 A realização da III Conferência Nacional de Saúde mental ocorreu logo após a promulgação da lei 10.216 sendo realizada no mesmo ano em Brasília. Esse evento contou com a participação dos movimentos sociais, de usuários, familiares e durante o processo de realização e no teor das deliberações condensadas no Relatório Final a Reforma psiquiátrica foi enfim, consolidada como política de governo, sendo pactuadas democraticamente os princípios, diretrizes e estratégias para mudança da atenção em saúde mental no Brasil. O CAPS passou a assumir papel estratégico para mudança do modelo de assistência. Foi também discutida a necessidade da construção de uma política de saúde mental pra os usuários de álcool e outras drogas e se estabeleceu o controle social como garantia do avanço da Reforma Psiquiátrica no Brasil (8). A partir de 2002 inúmeras normativas foram discutidas e implantadas promovendo paulatinamente a reorganização dos Serviços de Saúde Mental, criando novos equipamentos e dispositivos, consolidando a ideia de que as intervenções devem ser realizadas prioritariamente nos serviços comunitários de saúde, sempre visando a reinserção social do indivíduo em seu convívio social e familiar. As intervenções se deslocaram dos hospitais psiquiátricos, para as comunidades, da doença, para a pessoa em sua totalidade, das ações individuais para as ações coletivas (9,12). Destaca-se em 2002 a promulgação da Portaria 336 do Ministério da Saúde que cria oficialmente os CAPS, ampliando seu funcionamento e complexidade. O CAPS surgiu para substituir o hospital, tendo a missão de oferecer atendimento diuturno as pessoas com transtornos mentais severos e persistentes no território, devendo oferecer cuidados clínicos e de reabilitação psicossocial, favorecendo o exercício e a inclusão social dos usuários e de suas famílias (13). Os CAPS são, portanto, instituições destinadas a acolher crianças, adolescentes e adultos em sofrimento psíquico severo e/ou persistentes, com grave comprometimento psíquico, incluindo os transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas (álcool e outras drogas). Para ser
  • 35. 26 atendido nesse serviço para o indivíduo procurar espontaneamente o CAPS ou pode ser encaminhado por qualquer outra instituição (14) . Os CAPS podem oferecer diferente tipos de atividades terapêuticas, indo além do uso de consultas e distribuição de medicamentos. Algumas atividades são realizadas em grupo, outras individualmente. São promovidas também atividades direcionadas a família e a comunidade. Alguns exemplos de atividades terapêuticas oferecidas são psicoterapia individual ou em grupo, oficinas terapêuticas, atividades comunitárias, atividades artísticas, atividades de lazer, atividade de ensino, orientação e acompanhamento do uso de medicamento, atendimento domiciliar e aos familiares, entre outras (14). O tratamento nos CAPS, no entanto não deve ser realizado de forma que o usuário permaneça a maior parte do tempo realizando atividades internas no serviço. As atividades também devem ser desenvolvidas fora do serviço, como parte de uma estratégia de reabilitação psicossocial, podendo ser iniciada ou articulada no CAPS, mas sendo realizadas na comunidade, no trabalho ou na vida social (14). Os CAPS são pontos estratégicos na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), tanto no que ser refere a atenção direta ao usuário visando a promoção do protagonismo, autonomia e vida comunitária, quando na ordenação do cuidado, devendo trabalhar em conjunto com os outros serviços, articulando os recursos e serviços existentes no território e em outras redes (15). Nessa perspectiva o CAPS opera no território compreendido não como espaço geográfico, mas território de pessoas, instituições, cenários de referência nos quais se desenvolvem a vida cotidiana dos usuários e familiares. O território é apreendido como lugar de cuidado, promotor de vida e a ação do CAPS nesse local tem a missão de garantir o exercício da cidadania e a inclusão de usuários e de familiares (14).
  • 36. 27 Os CAPS podem ser classificados em CAPS I, CAPS II, CAPS III e CAPS IV definidos por ordem crescente de porte/complexidade e abrangência populacional. Além destes há ainda os CAPS Infantil (CAPSi) e os CAPS Álcool e Drogas (CAPS AD), os quais se destinam respectivamente ao atendimento de crianças e adolescentes e de pacientes com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas (13,16). O CAPS tem o caráter de serviço aberto e comunitário e atualmente são substitutivos ao modelo asilar e a implantação desse serviço em todo país demonstra um importante avanço na Reforma Psiquiátrica Brasileira, no entanto não é sinônimo de mudança pragmática da atenção em saúde mental. Para isso é necessário que o processo de mudança inclua quatro dimensões. A primeira se refere ao campo epistemológico ou teórico- conceitual, sendo questionado os saberes e conceitos dentro da ciência e psiquiatria clássica, tais como isolamento, neutralidade, tratamento moral, anormalidade, doença e cura. A segunda diz respeito as mudanças técnicos-assistências que buscam construir novos espaços de sociabilidade, troca e produção de subjetividade. A terceira relaciona-se com as questões jurídicas-políticas sobre a discussão e redefinição das legislações que envolvem os doentes mentais e as novas possibilidades de inserção social. Por fim a quarta requer uma mudança sociocultural que se refere nas transformações da relação da sociedade com a doença mental que é influenciada pelos conceitos construídos historicamente (3). Esse conjunto de modificações alicerça um novo modelo de atenção em saúde mental denominado psicossocial. 1.2.Práticas de cuidado em saúde mental As reestruturações da atenção em saúde mental no Brasil preconizada pelo Movimento da Reforma Psiquiátrica transcendem a oferta de novos serviços ou reestruturação de modelos assistência. Implicam em mudanças de ordem política, ideológica, ética e das concepções de clínica e
  • 37. 28 reabilitação (17). Demarcam a configuração de dois modos diferentes de conceber e produzir práticas de cuidado aos indivíduos que apresentam sofrimento psíquico, sendo eles o modo psicossocial e o modo asilar ou manicomial. O modo asilar é o modo dominante, que historicamente foi caracterizado por práticas enclausurantes, medicalizadores e centrado em ação sobre a doença mental. Por outro lado, o modo psicossocial se contrapõe e vai se construindo por meio de críticas ao paradigma psiquiátrico tradicional e pela efetivação de novas formas de intervenção e da criação de novos equipamentos e dispositivos para o cuidado ao sujeito em sofrimento psíquico. O modo psicossocial configura-se como sinônimo de extra-asilar ou não-asilar e está se organizando em função das ações e conhecimentos acumulados pelo processo da Reforma Psiquiátrica que caracterizam o campo de Atenção Psicossocial (18,19). Esse dois modos básicos (asilar e psicossocial) que compõe as práticas em saúde mental são caracterizado considerando quatro dimensões: a) concepção de objeto e dos meios de trabalho; b) concepção das formas de organização do dispositivo institucional; c) concepção das formas de relacionamento com a clientela; d) concepção dos efeitos típicos em termos terapêuticos e éticos (19). Em relação a concepção do objeto e dos meios de trabalho o modo asilar apresenta ênfase nas determinações orgânicas da doença, focando no processo de doença-cura, utilizando como importante meio de intervenção os medicamentos. O foco das práticas é o organismo, sendo que o indivíduo não é percebido na sua totalidade, sua subjetividade desejante é ignorada e ele é passivo em todo processo de cuidado. A relação estabelecida entre profissionais de saúde e o indivíduo em sofrimento é hierárquica, sendo que cabe ao indivíduo em tratamento aceitar as intervenções do profissionais detentores do saber (19). No modo asilar as práticas de cuidado são centradas no indivíduo, pois ele é percebido como centro do problema. Portanto, a participação ou intervenções com sua família ou em seu contexto social não se fazem necessárias. Muito pelo contrário, o indivíduo deve ser isolado ou exilado do
  • 38. 29 seu meio familiar e social, sendo que as práticas de cuidado devem ocorrer em hospital fechado (19). Sobre os meios de trabalho, no modo asilar encontra-se os recursos multiprofissionais, no entanto a organização do trabalho é fragmentada. As práticas de cuidado são encadeadas como a produção de mercadorias, sendo que o psiquiatra comumente iniciava o processo realizando o diagnóstico e definindo o que deve ser realizado pelos outros especialistas. O médico é o principal protagonista do processo de cuidado. Os profissionais não conversavam em atividades em comum, sendo que o prontuário é considerado o instrumento de interconexão dos profissionais da equipe (19). O modo psicossocial no que se refere a concepções do objeto e dos meios de trabalho considera como determinantes no processo de adoecimento além dos aspectos biológicos, fatores políticos, sociais, culturais e psicológicos. Os meios de intervenção além da medicação, incluem psicoterapias, laborterapias, socioterapias e um conjunto de dispositivos de reintegração social (19). Contempla-se o indivíduo em sua totalidade, não apenas a sua doença, mas também como suas relações interpessoais e seu contexto sociais influenciam no seu processo de adoecimento. O indivíduo não é percebido como o único problemático, sendo que a família e o grupo social devem participar ativamente no processo terapêutico. As decisões sobre o processo terapêutico são centralizados no indivíduo que participa ativamente e é protagonista no seu tratamento (19). Os meios de tratamento no modo psicossocial consideram o contínuo saúde-doença psíquica e visam reposicionar o sujeito nesse processo de tal modo que ele não apenas sofra os efeitos dessa situações, mas se reconheça como agente implicado nesse sofrimento e também com agente da possibilidade de mudanças (19).
  • 39. 30 O meio de trabalho característico do modo psicossocial é a equipe interprofissional que busca formas de intercâmbio das visões teórica- técnicas e das suas práticas, buscando a superação do modelo “linha de montagem”. O objeto das práticas em saúde mental é ampliado, não sendo mais doença cura, mas entendido como existência-sofrimento. Com essa nova percepção são incorporadas novas práticas que visam além da cura, ampliar as novas possibilidades do indivíduo promovendo novas formas de sociabilidade que se distanciam da produção em série do cuidado do modo asilar (19). Os dispositivos institucionais do modo psicossocial são territorializados e extra-hospitalares de atenção, substitutivos ao manicômio. A ênfase no modo psicossocial é a reinserção social e recuperação da cidadania. Propõe ampliação e diversificação da visão dos problemas e das possibilidades de solução. Tem como metas principais a desospitalização, desmedicalização e a inserção da subjetividade e dos aspectos socioculturais no processo terapêutico (19). Em relação as formas de organização institucional no modo asilar os organogramas são piramidais ou verticais sendo que o fluxo do poder institucional vem do ápice para a base, no qual poucos determinam e a maioria obedece. Há espaços fechados para os usuários e a população geral. O poder decisório e de coordenação são concentrados nas mesmas pessoas. É enfatizado a estratificação do poder e do saber, tanto no âmbito pessoal da instituição como na relação com o usuário e a população, sendo que o usuário é passivo nas intervenções (19). No modo psicossocial o organograma deve ser horizontal e a equipe, os usuários, família e comunidade tem poder decisório. As decisões são tomadas por meio do diálogo em conjunto. A participação, a autogestão e a interdisplinaridade do modo psicossocial se opõem ao estratificação e interdição institucionais, heterogestão e disciplina das especialidade do modo asilar (19).
  • 40. 31 Sobre as formas do relacionamento com a clientela o modo asilar se caracteriza por uma diferenciação entre doentes e sadios. O hospital é considerado como lugar depositário para enviar os problemáticos, separando os da sociedade. Internamente ocorre a separação entre equipe e pacientes, não havendo espaço para o diálogo, cabendo ao interno imobilidade e mutismo (19). No modo psicossocial o relacionamento entre as instituições e a clientela é caraterizado pela pelo dialogo, sendo que a instituição funciona como ponto de fala e escuta da população. O cuidado não é centralizado no hospital, mas é compartilhado entre os dispositivos que compõem a rede de atenção psicossocial e tem como base o território. A interlocução, livre trânsito do usuário e da população, territorialização, integralidade são atributos do modo psicossocial se contrapondo a imobilidade, mutismo e estratificação da atenção que caracterizam o modo asilar (19). Sobre a concepção dos efeitos típicos em termos terapêuticos e éticos no modo asilar busca-se a remoção dos sintomas e tem como consequências a cronificação asilar ou excesso no uso de medicamentos. No modo psicossocial também se busca a redução dos sintomas, no entanto esse não é o único objetivo do processo terapêutico. A ações visam também o reposicionamento do sujeito na sua relação com o adoecimento e nas suas relações sociais. As práticas precisam ser individualizadas, respeitando as singularidades, para atender as demandas daquele sujeito especificamente, de acordo com o seu contexto social (19). Ao considerar o paradigma asilar como dominante no campo da saúde mental, a transição paradigmática para o psicossocial se dá por meio de transformações significativas nos parâmetros acima propostos. Dessa forma, a transformação ou revolução paradigmática prevê mudanças radicais que superem as concepções teóricas, técnicas, éticas e práticas do paradigma asilar e as substituam por concepções e práticas do paradigma psicossocial (18).
  • 41. 32 1.3.Uma nova proposa de clínica A reforma da prática clínica em saúde mental propôs mudança na oferta do tratamento, substituindo o modelo hospitalar por serviços de atenção psicossocial com base territorial. Ampliou-se a concepção sobre o processo saúde-doença e alguns determinantes que anteriormente eram negados pela psiquiatria clássica, ingressaram na oferta de tratamento aos sujeitos em sofrimento psíquico (20). A clínica tradicional se apoia no modelo biomédico, sendo embasada em uma percepção fragmentada do ser humano, tendo como foco de suas práticas em saúde exclusivamente a doença, que demandava uma intervenção médica e era dissociada dos aspectos da vida social que não eram considerados no processo de cuidado. O paciente era reduzido ao seu diagnóstico, sendo ignorados outros aspectos relacionados ao seu contexto ou sua percepção sobre seu processo de adoecimento. Buscava-se a padronização e aplicação de protocolos, não se observando a singularidade do sujeito. Tal modo de se fazer a clínica se apoiava no conceito de que saúde era a ausência de doença (20). O modelo biomédico foi utilizado na clínica como instrumento de controle social, onde fenômenos históricos e sociais foram enquadrados na perspectiva de fenômenos naturais. Com a evolução da clínica tradicional estes fatores ambientais/sanitários foram incluídos como eliciadores de doenças, mas ainda eram desconsiderados fatores históricos, psicológicos, socioeconômicos que estão relacionados ao processo de saúde e doença (20). No entanto com a ampliação da concepção de saúde não apenas como ausência de doença, mas como bem estar biopsicossocial e uma vida de qualidade, a forma de se fazer a clínica também demandou mudanças, sendo que as práticas deveriam se comprometer a cuidar, proteger, tratar, recuperar, promover, enfim produzir saúde (21). Esta nova concepção de saúde exige a construção de novas práticas e saberes, sendo que a clínica passa por um processo de transformação, fazendo-se necessário sua reformulação e ampliação e fomentando uma
  • 42. 33 nova proposta de um novo modo de se fazer, um modelo de clínica ampliada, com foco no sujeito e seu contexto, visando além da patologia a compreensão da integralidade. Busca ampliar seu objeto de estudo e intervenção, surgindo de uma clínica do sujeito que compreende a enfermidade como uma parcela do problema enfrentado pelo indivíduo, parcela que não pode ser dissociada de elementos subjetivos, sociais e históricos. A necessidade de transformar a clínica advém da singularidade de cada sujeito sendo que fatores do contexto em que o sujeito está inserido podem atuar de forma direta ou indireta na manifestação e manutenção do processo saúde-doença (22,23). Propõe-se uma nova perspectiva de sujeito, considerado como coproduzido dialeticamente pela tensão constante forças externas e internas, sendo que o sujeito singular surge como região de contato do interno com o externo. A região de forças predominantemente Imanentes ao Sujeito (particular, interno), estaria dividida entre três planos: a Estrutura Biológica, o Desejo e o Interesse. A região de Forças predominante Transcendentes ao Sujeito (Externa, Universal) seria constituída por dois grandes planos: Necessidades Sociais e Instituições. A Região de Síntese entre o Sujeito e seu contexto resultaria na formação de compromisso, na constituição e gestão de Contratos e Projetos (24). Considerando cada Sujeito como Singular e dialeticamente coproduzido por forças universais e particulares, propõe se um modelo de clínica como um encontro desses Sujeitos coproduzidos marcado pela força de instituição externa aos dois Sujeitos: A Instituição Saúde (25). Neste contexto o profissional de saúde também é entendido como Sujeito coproduzido e está inserido numa Instituição de Saúde e munido de Saberes específicos. Dessa forma também está “tensionado” por forças Universais e Particulares que o constituem (25). O Sujeito Demandante de Intervenção também é coproduzido dialeticamente. Quando ele procura o cuidado é porque está sobre algum tensionamento no seu equilíbrio singular constitutivo, independente da presença ou da ausência de classificação diagnóstica (25).
  • 43. 34 A clínica então é uma interação complexa entre Sujeitos sendo que apesar de todas as proteções institucionais a clínica efetivamente é um encontro entre dois Sujeitos singulares. Essa é a perspectiva da clínica ampliada cuja proposta não é negar a patologia existente, mas negar a preponderância de qualquer elemento a priori. O elemento mais importante em cada momento define-se na singularidade dos Sujeitos e instituições imersos na relação (25). A clínica ampliada é construída na prática de um saber ético, de profunda responsabilidade sobre a saúde dos usuários e dos serviços. É uma forma de clínica que garante uma visão singular sobre a problemática enfrentada pelo usuário e a produção de intervenções de caráter intersetorial (26). Esta nova forma de produzir saúde propõe a horizontalização dos processos de trabalho e a adoção de práticas integrais frente as necessidades dos usuários dos serviços. Faz necessário a promoção de espaços de diálogos e troca de conhecimentos entre os diferentes núcleos profissionais, sendo que isso é fundamental para a implantação da lógica do trabalho em redes de produção de saúde (27). Assume-se uma responsabilidade muito maior do que tratar o doente ou a doença. Trata-se de reconhecer um compromisso com o Sujeito e sua capacidade de produção da sua própria vida. Trata-se de uma clínica que se abre para perceber e ajudar o Sujeito doente a construir sua percepção sobre a vida e o adoecimento. Para isso a própria clínica precisa se perceber enquanto instrumento de uma instituição muito forte (instituição médica), manipulando saberes e classificações diagnósticas de grande repercussão para os Sujeitos que se submetem a ela e deve desenvolver a competência de utilizar os poderes que possui e desenvolve na relação terapêutica a favor da autonomia dos Sujeitos (25). Ressalta-se que é ampliação, não é uma troca. Propõe a invenção da saúde que inclui uma intervenção técnica, mas está relacionada a noção de reprodução social do paciente, a produção de novas formas de vida. Está noção é influenciada pela perspectiva de cidadania ativa e de protagonismo,
  • 44. 35 partindo da concepção do paciente como uma pessoa com direitos que teve ser incentivada ao protagonismo e cidadania. O objeto da Clínica do Sujeito inclui a doença, o contexto e o próprio sujeito (23). Não se propõe, portanto, que a clínica abra mão de seus poderes de intervenção (simbólicos e teóricos), pois isso inviabiliza a terapêutica. Propõe-se que os poderes sejam reconhecidos com seus limites e riscos e utilizados a favor dos Sujeitos e não apenas a favor dela mesma. A clínica pode ser então uma afirmação de liberdade, uma liberdade concreta e singular, construída a partir de uma postura crítica ou ao menos a partir de uma postura mais atenta aos riscos de cumplicidades com tiranias (25). Pretende-se a discussão dos saberes biomédicos e o protagonismo dos Sujeitos Singulares, aceitando ou não os caminhos terapêuticos que os saberes propõem. Quando se discute a clínica, se discute o poder, o poder do saber que é alicerçado nos tratados sobre doença e fisiologia padrão que tornam a clínica possível. Com a ampliação da clínica intenta ir além desde campo de certezas e regularidades para abarcar a imprevisibilidade da vida cotidiana. Deve-se reconhecer os limites dos saberes em relação a singularidade do Sujeito para ir além de uma certa classificação de doenças e compreender o Sujeito que não será apreendido por um diagnóstico (25). Na relação entre doença e Sujeito, há, portanto, muitas posições possíveis. Desde aquelas em que a doença ocupa grandes espaços na existência, até outras em que a enfermidade é transitória e fugaz. Por outro lado, doenças semelhantes do ponto de vista classificatório podem incidir de forma diferenciada conforme a história e os recurso subjetivos e materiais de cada Sujeito. Os serviços de saúde devem ter plasticidade suficiente para dar conta desta variedade (23). A ampliação da clínica trabalha os danos e os benefícios gerados pelas práticas de saúde e prevê que as equipes de diferentes especialidades compartilhando a responsabilidades com os usuários e seu entorno. O serviço de saúde não deixa de acolher a queixa do usuário mesmo que a fala pareça não ter relação direta para a diagnóstico e tratamento pois essa escuta auxilia o próprio usuário a descobrir os motivos de seus adoecimento
  • 45. 36 (28). Dessa forma a prática da clínica ampliada acontece através da escuta, sendo que o trabalhador e o usuário buscam juntos os motivos pelos quais ele adoeceu e como se sente com os sintomas, para compreender a doença e se responsabilizar na produção da saúde. É importante estar atento para os afetos entre os trabalhadores e usuários e buscar a autonomia da pessoa diante do seu tratamento considerando cada caso de forma única e singular (28). A clínica ampliada propõe então que o profissional de saúde desenvolva a capacidade de ajudar as pessoas, não só a combater as doenças, mas a transformar-se de forma que a doença, mesmo sendo um limite, não a impeça de viver outras coisas na sua vida. A clínica ampliada foi oficializada como diretriz teórica e prática dos cuidados no processo saúde/doença por meio da Política Nacional de Humanização (PNH). A adoção desse novo conceito de clínica visa promover a mudança na forma da atenção e na gestão dos processos de trabalho em saúde visando alinhar aos princípios e diretrizes do SUS (21). A PNH busca pôr em prática princípios do SUS no cotidiano dos serviços de saúde, produzindo mudanças nos modos de gerir e cuidar. Estimula a comunicação entre gestores, trabalhadores e usuários para construir processos coletivos de enfrentamento de relações de poder, trabalho e afeto que muitas vezes produzem atitudes e práticas desumanizadoras que inibem a autonomia e a corresponsabilidade dos profissionais de saúde em seu trabalho e dos usuários no cuidado de si. A PNH também é conhecida como HumanizaSUS e aposta na inclusão de trabalhadores, usuários e gestores na produção e gestão do cuidado e dos processos de trabalho (27). Humanizar traduz-se na inclusão das diferenças nos processos de gestão e de cuidado, sendo que tais mudanças só podem ser construídas de forma coletiva e compartilhada. É necessário incluir para estimular a produção de novos modos de cuidar e novas formas de organizar o trabalho. Propõe-se a inclusão dos trabalhadores na gestão para que eles reinventem
  • 46. 37 seus processos de trabalho e sejam agentes ativos das mudanças no serviço de saúde. A inclusão de usuários e suas redes sociofamiliares nos processos de cuidado é fundamental para a ampliação da corresponsabilização no cuidado de si (27). Para que ocorram mudanças nas formas de produzir saúde é necessário que seja promovida a ampliação da autonomia e a vontade das pessoas envolvidas que compartilham responsabilidades, sendo necessário reconhecer o papel de cada um no processo de mudança. O SUS humanizado reconhece cada pessoas como cidadã de direitos e valoriza e incentiva sua atuação na produção de saúde (27). A PNH é orientada pelo princípio de transversalidade, sendo que deve estar presente e inserida em todas as políticas e programas do SUS. Busca- se transformar as relações de trabalho a partir da ampliação do grau de contato e da comunicação entre as pessoas e grupos, tirando-os do isolamento e das relações de poder hierarquizadas. Transversalizar é reconhecer que as diferentes especialidades e práticas de saúde podem conversar com a experiência daquele que é assistido. Juntos os saberes podem produzir saúde de forma mais responsável (27). Aposta na indissociabilidade entre os modos de produzir saúde e os modos de gerir os processos de trabalho, entre a atenção e a gestão, entre clínica e política, entre produção de saúde e produção de subjetividade. Tem por objetivo provocar inovações nas práticas gerenciais e nas práticas de produção de saúde, propondo para os diferentes coletivos/equipes implicados nestas práticas o desafio de superar limites e experimentar novas formas de organização e novos modos de produção e circulação de poder (28). Considera-se, portanto, que as decisões da gestão interferem diretamente na atenção à saúde. Por isso trabalhadores e usuários devem buscar conhecer como funciona a gestão dos serviços e da rede de saúde e participar ativamente do processo de tomada de decisão nas organizações de saúde e nas ações de saúde coletiva. O cuidado e a assistência em saúde não se restringem às responsabilidades da equipe de saúde, pois o
  • 47. 38 usuário e sua rede sociofamiliar devem também se corresponsabilizar pelo cuidado de si nos tratamentos, assumindo posição protagonista com relação a sua saúde e dos seus familiares (27). O SUS tem como um de seus princípios a participação social na perspectiva de democratizar a gestão da saúde. Entende-se, portanto, que participação social não pode estar restrita a essas instâncias formalizadas para a participação cidadã em saúde. Ela deve ser valorizada e incentivada no dia-a-dia dos serviços do SUS, nos quais a participação tem sido ampliada gradativamente (28). Uma gestão mais compartilhada e mais democrática dos serviços de saúde, no cotidiano das práticas de saúde, envolve as relações, a clínica, os encontros entre usuários, sua família e rede social com trabalhadores e equipes de saúde, demandam alterações nos modos de organização do trabalho em saúde. Ou seja, é necessário que se alterem os processos de definição das tarefas, responsabilidades e encargos assumidos pelos trabalhadores (28). Para realização dos objetivos da saúde (produzir saúde, garantir a realização profissional e pessoal dos trabalhadores, reproduzir o SUS como política democrática e solidária) é necessário incluir trabalhadores, gestores e usuários dos serviços de saúde em um pacto de corresponsabilidade (28). A PNH propõe a tríplice inclusão que se configura com a inclusão de sujeitos, coletivos e a perturbação que estas inclusões produzem nos processos de gestão. Assim, mudanças nos modos de cuidar e de se fazer gestão decorreriam da produção de plano e ação comum entre sujeitos guiados pelo pressuposto ético de produzir saúde com o outro (28). A inclusão de novos sujeitos nos processos de gestão traria como efeito a ampliação da implicação e corresponsabilização do cuidado, uma vez que as definições, na forma da produção de tarefas, seriam coletivas, ou seja, derivadas de pactos entre os sujeitos e não de imposições sobre eles. De outra parte, maior implicação e uma produção mais compartilhada de responsabilidades resultaria em mais e melhor produção de saúde, uma vez que a vontade de fazer estaria ampliada, reafirmando pressupostos éticos no
  • 48. 39 fazer da saúde (28). Alguns sãos os dispositivos da PNH que funcionam para modificar as práticas de produção de saúde, envolvendo coletivos e visando promover mudanças nos modelos de atenção e gestão. Entende-se por dispositivos a atualização das diretrizes de uma política em arranjos de processos de trabalho. Entre estes dispositivos destaca-se neste estudo o Projeto Terapêutico Singular (PTS), como um instrumento de organização e sistematização do cuidado construído entre equipe de saúde e usuário, considerando singularidades do sujeito e complexidade de cada caso. (21). A herança das revoluções na Saúde Mental (Reforma Psiquiátrica), experimentando a proposta de que o sujeito é construção permanente e que pode produzir “margens de manobra”, também foi incorporada no Projeto Terapêutico Singular. No Projeto Terapêutico Singular tem implícito uma certa crença de que a pessoa tem grande poder de mudar a sua relação com a vida e com a própria doença. À equipe cabe exercitar uma abertura para o imprevisível e para o novo e lidar com a possível ansiedade que essa proposta traz. Nas situações em que só se enxergavam certezas, podem-se ver possibilidades. Nas situações em que se enxergavam apenas igualdades, podem-se encontrar, a partir dos esforços do Projeto Terapêutico Singular, grandes diferenças. Nas situações em que se imaginava haver pouco o que fazer, pode-se encontrar muito trabalho. As possibilidades descortinadas por este tipo de abordagem têm que ser trabalhadas cuidadosamente pela equipe para evitar atropelamentos. O caminho do usuário ou do coletivo é somente dele, e é ele que dirá se e quando quer ir, negociando ou rejeitando as ofertas da equipe de saúde (29). 1.4.Projeto Terapêutico Singular O novo modelo de atenção aos pacientes psiquiátricos propõe mudança na terapêutica, sendo necessário o desenvolvimento de novas práticas de cuidado. Como substitutivo ao modelo asilar, foi proposto o
  • 49. 40 modelo psicossocial que tem como cerne o protagonismo do usuário nos processos terapêuticos. Com este novo olhar sobre a saúde, foi viabilizadaa apropriação do Projeto Terapêutico Singular (PTS) como ferramenta na promoção do cuidado integral em saúde mental nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) (30). A concepção de projeto terapêutico está em processo de construção no Brasil ao longo dos últimos anos, junto com a história do SUS, do movimento sanitário e da reforma psiquiátrica (25). O termo projeto terapêutico singular (PTS), também já foi denominado como projeto terapêutico individual (PTI) que era definido como um conjunto de atendimentos organizados pela equipe de saúde no qual o cuidado era articulado com o usuário. A construção do PTI já se dava de forma compartilhada, com base no diálogo e troca de saberes, buscando práticas centradas nos usuários e promovendo a decisão conjunta dos objetivos e ações no processo terapêutico (31). As ações organizadas pelo PTI eram realizadas considerando a singularidade do usuário, sendo que os atendimentos eram realizados de forma individual de acordo com as necessidades de cada sujeito (14). A emergência do termo Projeto Terapêutico Singular apoia-se na ideia de que o projeto terapêutico pode ser utilizado não só para indivíduos, mas também para coletivos. O singular substitui o individual, considerando que nas novas práticas de saúde é importante a compreensão não só o indivíduo, mas também do seu o contexto social, levando em considerando que cada usuário tem uma história única, que foi construída no seu seio familiar e na sua comunidade e não é passível de reprodutibilidade (32) . No Brasil, a configuração mais próxima do que atualmente é conceituado PTS na saúde mental surge no início dos 1990 durante o movimento antimanicomial em Santos (SP). Influenciados pela Reforma Psiquiátrica Italiana os envolvidos naquele contexto buscavam além da mudança do lócus de intervenção com a criação dos serviços substitutivos ao manicômio, a construção de novas práticas de cuidado em saúde (31). A ampliação da percepção da complexidade da problemática dos
  • 50. 41 sujeitos que anteriormente eram depositados nos manicômios demandou a produção de novas respostas. A problematização e o redimensionamento das concepções e práticas do processo terapêutico provocaram a organização de novos dispositivos e arranjos. As intervenções não tinham mais como único foco a cura, mas a emancipação do sujeito e produção de vida, considerando sua singularidade e uma perspectiva ampliada de saúde, que supera a ausência de doenças, sendo conceituada como bem estar físico, psíquico e social (33). Os projetos terapêuticos construídos na experiência de Santos eram elaborados incorporando a liberdade e singularização dos processos terapêuticos. Buscava-se que essa construção fosse realizada em conjunto com os usuários e familiares promovendo a contratualização em conjunto das ações e a corresponsabilização nas práticas de cuidado. O cuidado era entendido e operacionalizado como processo, diferenciando-se da lógica de “linha de montagem”, onde são elencados e sequenciados procedimentos. Os projetos terapêuticos que orientavam o cuidado poderiam então ser construídos, reconstruídos, repensados e redimensionados na relação equipe-usuário-família. Eram acompanhados por uma dupla referência formada por um trabalhador universitário e um auxiliar de enfermagem e eram construídos alicerçados no diálogo, escuta e visando o fortalecimento do vínculo (33). Atualmente os Projetos Terapêuticos Singulares norteiam o planejamento e a organização das ações em saúde mental sendo central como dispositivo de cuidado, ressaltando a percepção do sujeito como protagonista no seu processo terapêutico (34). Propõe uma estratégia de cuidado personalizada, que respeita a particularidades de cada pessoa, orientando as práticas dentro da unidade de saúde e fora dela (26). A dimensão singular é a essência do PTS, é o que determina a ação de saúde oferecida para alcançar os objetivo de criar produtos de saúde: cuidar, melhorar a qualidade de vida dos usuários, ampliar o entendimento e a apropriação do processo saúde-doença entre outros (35,36). Ademais como indica o termo “projeto” trata-se de uma discussão prospectiva e não
  • 51. 42 retrospectiva, conforme acontecia tradicionalmente na discussão de casos em medicina. A noção de projetualidade não se refere apenas como plano com a organizações de atividades e ações centradas para resolução de um dado problema. Refere a capacidade de lançar um olhar para o futuro, provocando a reflexão, ampliando as possibilidades e elaboração de novas realidades (37). No cuidado em saúde os PTS podem ser utilizados como arranjo, como dispositivo ou ainda como estratégia de gestão do trabalho das equipes em saúde. Como dispositivo ele é capaz de promover a reflexão sobre as práticas entre os profissionais e enquanto arranjo auxilia a desenhar novas formas de organizar a gestão e o processo de trabalho (31). A construção do PTS deve ser coletiva, sendo que demanda a participação dos envolvidos: usuários, familiares e equipe de saúde. Este processo visa compreender o sujeito em sua complexidade considerando os aspectos biológicos, psicológicos, socioeconômicos e culturais. (14,38). As ações devem favorecer a participação ativa do usuário e familiares, promovendo autonomia e compartilhamento de informações e saberes (14). Promove-se a discussão sobre uma situação de interesse comum e pactua- se ações, formalizando compromissos e dividindo-se responsabilidades entres os sujeitos envolvidos (14,26). O desenvolvimento dos projetos terapêuticos devem ser orientados pelos segundos eixos: a centralidade da ação na pessoa; a relação de parceria terapeuta-cliente; o deslocamento do lócus da ação da instituição para o território e para as situações da vida real; ênfase no sujeito em seu contexto; construção compartilhada; estabelecimento de contrato de trabalho com percursos a serem desenvolvidos em um tempo predeterminado e a utilização de avalições periódicas conjuntas para redirecionamento do projeto (39). O PTS enquanto dispositivo de cuidado, se desenvolve em quatro momentos. Inicialmente é realizado o diagnóstico com a avaliação/problematização dos aspectos orgânicos, psicológicos e sociais,
  • 52. 43 buscando uma conclusão, ainda que provisória, a respeito dos riscos e da vulnerabilidade do usuário. Neste momento busca-se entender como o sujeito se relaciona com a situação do adoecimento. Tenta-se compreender os desejos e os interesses, assim como o trabalho, a cultura, a família e a rede social. É necessário lançar um olhar muito além dos problemas, buscando as potencialidades. Nesse encontro se produz um consenso operativo sobre os hipóteses e problemas relevantes na perspectiva da equipe e do usuário (26). Posteriormente são realizadas a definição das metas. A equipe, o usuário e as pessoas envolvidas trabalham e negociam propostas de curto, médio e longo prazo. Após a definição das metas é feita a divisão de responsabilidades. Neste momento são definidas as tarefas de cada um com clareza. Por fim a reavaliação, momento em que se discutirá a evolução e serão realizadas correções dos rumos tomados (26). A formulação e operacionalização do PTS inclui a realização de três movimentos, sobrepostos e articulados: a coprodução da problematização, a coprodução de projeto e a cogestão/avaliação do processo. A coprodução da problematização diz respeito ao acesso dos sujeitos a singularidade do caso, sendo que a equipe deve reconhecer a capacidade e o poder das pessoas de interferirem na sua própria relação com a vida e com a doença. Deve-se promover construção do vínculo e discussão conjunta sobre a situação-problema, suas hipóteses explicativas e possíveis soluções. A coprodução pressupõe o fazer junto e não pelo outro, buscando soluções com e não para o outro em processo de troca de saberes, corresponsabilização e construção de um cuidado coletivo. Devem conciliar as práticas de planejamento com o sentido de projetualidade e estimular a participação ativa dos envolvidos. As estratégias de intervenção são construídas conjuntamente para que produzam novas respostas para as problemáticas levantadas e além disso, promovam novas formas de vida. Por fim, a cogestão/avaliação deve ser organizada de forma que a equipe- usuário-família pactuem juntamente com as ações desenhadas, os prazos para execução e as definições de papeis e o prazo de reavaliação (40) .
  • 53. 44 Para elaboração e acompanhamentos dos projetos terapêuticos os profissionais dos CAPS podem ser organizar em Equipes de Referência, ou utilizar um Profissional de Referência, sendo que este(s) servidor(es) da saúde serão responsáveis por acompanhar o sujeito desde o início do tratamento até a alta naquela instituição (40,41). O dispositivo Profissional de Referência pressupõe a existência de responsabilização e vínculo entre população usuária e profissional visando a condução de uma terapêutica efetiva em saúde mental e a construção de um PTS que atenda as reais necessidades do usuário. Não é o mesmo que ser responsável pelo caso, mas é o profissional que articula e monitora o processo, devendo estar informado do andamento de todas as ações planejadas no PTS. Ele assume a gestão da clínica e do cuidado do projeto terapêutico em andamento. É aquele profissional que o usuário e a família procuram em caso de necessidade. Pode ser qualquer componente da equipe, independente da formação (40,41). O PTS é uma possibilidade de realização da Clínica Ampliada, sendo que se caracteriza por práticas de cuidado interdisciplinar e pela percepção do usuário como um ser complexo e autônomo. A construção do vínculo estável entre profissional de saúde e usuário é fundamental para a realização da Clínica Ampliada que se compromete a promover ações visando o respeito a singularidade do sujeito em adoecimento e tem como princípios a responsabilização sobre estes usuários dos serviços de saúde e um compromisso ético profundo. Neste contexto reconhece os limites dos conhecimentos dos profissionais de saúde e das tecnologias por eles empregadas e estimula a busca por outros conhecimentos em diferentes setores construindo a intersetorialidade (41). Dessa forma, a partir do reconhecimento da importância do PTS faz se necessários estudos contínuos sobre a construção, implementação e reconstrução desde dispositivo, identificando fatores que facilitam e dificultam este processo, sendo necessário ampliar o debate cientifico desde norteador do cuidado nos serviços de atenção psicossocial em saúde mental.
  • 54. 45 2. JUSTIFICATIVA Com base no exposto na seção anterior, percebe-se que as mudanças de saberes e práticas propostos pela Reforma Psiquiátrica são relativamente recentes e a apropriação do projeto terapêutico singular para nortear o cuidado em saúde mental auxilia na efetivação de pressupostos propostos tais como a construção compartilhada do cuidado, a corresponsabilização, a relação horizontal com valorização dos saberes da equipe, usuários e familiares, o protagonismo do usuário como cerne nesse processo. Considerando a importância que o PTS tem atualmente na gestão dessas novas formas de cuidado faz-se necessário ampliar a compreensão de como está ocorrendo a sua construção e operacionalização nos diferentes CAPS. Importante se faz também apreender as múltiplas perspectivas dos sujeitos envolvidos neste processo (equipe-usuário-família), possibilitar esta compreensão, visando conhecer como está se dando a construção, implementação e reconstrução, identificando fatores que facilitam e dificultam este processo no CAPS ADi III. Com isso espera-se contribuir para ampliação do conhecimento sobre como estão sendo organizados os processos terapêuticos neste novo cenário dos serviços substitutivos.
  • 55. 46 3. OBJETIVOS • Objetivo Geral Descrever e analisar o processo de construção e operacionalização do Projeto Terapêutico Singular em um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras drogas Infanto-Juvenil (CAPS ADi III) de Aparecida de Goiânia. • Objetivos Específicos: • Conhecer as finalidades do processo terapêutico no CAPS ADi III a partir das concepções dos usuários, familiares e trabalhadores. • Idenditicar como as ações e intervenções do processo terapêutico no CAPS Adisão definidas e conduzidas. • Descrever como os diferentes sujeitos envolvidos no processo terapêutico (usuários, familiares, trabalhadores) compreendem o Projeto Terapêutico Singular (PTS). • Identificar fatores facilitadores e dificultadores no processo de levantamento e concretização das metas estabelecidas no PTS.
  • 56. 47 4. MÉTODO (S) 4.1.Delineamento do estudo O estudo foi uma pesquisa exploratório-descritiva, de abordagem qualitativa. A abordagem qualitativa foi escolhida por ser tratar da busca a compreensão de um fenômeno que não se reduz os aspectos objetivos passíveis de quantificação. Os elementos centrais da pesquisa são conjuntos de saberes e práticas de usuários, familiares e trabalhadores sobre a construção e condução de projetos terapêuticos no CAPS ADi III. A pesquisa qualitativa responde a questões da realidade que não podem ser quantificadas, contemplando o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, que corresponde a um espaço das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à quantificação de variáveis (42,43). As abordagens qualitativas não tem a finalidade de estabelecer leis que levem a generalização, pois os dados advindos desse tipo de pesquisa visam a compreensão mais aprofundado de certos acontecimentos sociais (42,43). No campo da saúde/doença as abordagens qualitativas promovem a reflexão de como se dão as relações entre o saber teórico e as práticas desenvolvidas dentro dos serviços de saúde. Tais reflexões podem suscitar mudanças e transformações nas dinâmicas institucionais e nos processos terapêuticos (44). 4.2.Cenário do estudo O Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil - Álcool e outras drogas (CAPS ADi III) onde foi realizado a pesquisa atende crianças e adolescentes que fazem uso de drogas. Ele está localizado em Aparecida de
  • 57. 48 Goiânia e é o único do Centro-Oeste tipo III que é especifico dessa demanda e está em funcionamento desde 2013. Além do CAPS ADi, estão localizados nesta cidade outros três: • CAPSi II: Oferece atendimento de segunda a sexta, das 07:00 as 19:00 horas a crianças e adolescentes com transtornos mentais. • CAPS AD III: Oferece atendimento 24 horas para adultos que apresentam transtornos decorrentes do uso de álcool e/ou outras drogas. CAPS III Bem-me-quer: Oferece atendimento 24 horas para adultos com transtornos mentais.Os CAPS tipo III são localizados em municípios com população superior a 200.00 habitantes (13,14). O município em que está localizado o CAPS que será cenário desde estudo conta no momento com população estimada de 590,146 habitantes, segundo do IBGE, sendo o segundo município mais populoso do estado (45). O CAPS III constitui um serviço de atenção contínua, durante 24 horas diariamente. Este serviço deve se responsabilizar por organizar a demanda da rede cuidados em saúde mental, coordenar as atividades de supervisão de unidades hospitalares psiquiátricas e capacitar as equipes de atenção básica, serviços e programas de saúde mental no âmbito do seu território (13,14). O atendimento no CAPS é porta-aberta, ou seja, não é necessário nenhum encaminhamento ou regulação para ser inserido no Serviço. As modalidades de atendimento oferecidas nesta Unidade são: • Atendimentos em grupos ou individuais: Nesta modalidade o usuário ou familiar comparecem a unidade apenas para atendimentos específicos que duram entre 30 minutos a 1 hora. •Acolhimento diurno: É caracterizado quando o usuário permanece no serviço por um tempo mínimo de 4 horas e máximo de 9 horas, sendo que o mesmo participa de todas atividades ofertadas durante este período, sendo oferecidas as refeições durante este intervalo. Essa modalidade visa o afastamento dos usuários de situações conflituosas e o manejo e situações de crise decorrente do uso de álcool e outras drogas
  • 58. 49 • Acolhimento noturno: O acolhimento noturno tem como objetivo o afastamento do usuário de situações conflituosas e o manejo de crises desencadeadas pelo uso de álcool e outras drogas. Tais situações podem envolver rupturas familiares, comunitárias, limites de comunicação e/ou impossibilidade de convivência. Esta modalidade de atendimento não deve exceder 14 dias nos quais devem ser organizadas e operacionalizadas ações que visem o resgate e o redimensionamento das relações interpessoais e o convívio familiar e comunitário. O usuário permanece diuturnamente na unidade. No entanto, como CAPS é porta aberta, é acordado com o usuário que ele pode encerrar o acolhimento a qualquer momento. A unidade conta hoje com leitos doze leitos para acolhimento noturno. No CAPS ADI III são realizadas as seguintes atividades: 1. Atendimentos individuais tais como: 1.1 Atendimento psicoterápico para usuários e familiares. 1.2 Consultas médicas com clínico geral e psiquiatra, 1.3 Consultas de enfermagem onde são identificados problemas de saúde e estabelecidas condutas da enfermagem mais adequadas para tais situações. 1.4 Orientações sobre medicamentos com farmacêutica. 1.5 Orientações sobre inserção em cursos profissionalizantes, atividades esportivas e programas sociais com a assistente social. 2. Visitas e atendimentos domiciliares. 3. Busca ativa realizada por contato telefônico com objetivo de convidar adolescentes que evadiram ao tratamento a retornar as atividades no CAPS. 4. Atendimentos em grupos: As atividades em grupo acontecem diariamente, sendo que acontecem grupos no período nos dois períodos (matutino e vespertino). Participam dos grupos adolescentes que estão em acolhimento noturno, adolescentes que estão em acolhimento diurno e aqueles adolescentes que vem especificamente para participar dessas atividades. Os grupos são desenvolvidos pelos seguintes profissionais: psiquiatra, clínico geral, assistente social, enfermeiro, farmacêutico e psicólogo.
  • 59. 50 Reuniões de equipe.Atualmente a equipe que trabalha no CAPS ADi III é composta pelos seguintes profissionais: duas cozinheiras, duas auxiliares de higienização, duas assistentes administrativos, três psicólogas, três assistentes sociais, oito enfermeiros, uma farmacêutica, duas gestoras (psicóloga e enfermeira), um clínico geral, uma psiquiatra e 11 técnicos de enfermagem. O quadro de funcionário é composto por concursados, comissionados e credenciados. Os usuários em sua maioria, são adolescentes, que fazem uso de múltiplas drogas. Vivem em contexto de vulnerabilidade social, residem na periferia, evadiram da escola e tem opções restritas de lazer e cultura. 4.3.Amostra Populacional: A amostra da pesquisa foi composta por três grupos de sujeitos contemplando os aqueles que participam dos processos que envolvem o Projeto Terapêutico Singular, sendo eles usuários, familiares e trabalhadores. Abaixo estão relacionados a quantidade de sujeitos de cada grupo e os critérios de inclusão e exclusão utilizados no estudo. • Sete usuários participaram da pesquisa. Os critérios de inclusão foram: adolescentes (compreendido entre 12 anos e 17 anos e 11 meses), de ambos os sexos, que fazem uso de álcool e outras drogas, que estavam frequentando o CAPS ADi III, com regularidade, de acordo com as atividades acordadas no seu PTS, que aceitaram participar da pesquisa e que os responsáveis autorizaram sua participação. Foi apresentado aos responsáveis Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (anexo 4) e aos adolescentes o Termo de Assentimento (anexo 2). O critério de exclusão foi o adolescente ter alguma limitação cognitiva que prejudicasse a compreensão das perguntas realizadas na entrevista. • Sete familiares participaram da pesquisa. Os critérios de inclusão foram: familiares de adolescentes que frequentavam as atividades no CAPS ADi III no período da pesquisa, que aceitaram participar e autorizaram a participação dos adolescentes. O critério de exclusão foi o