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1
Cinthia de Castro Santos
Os meus, os seus... e os nossos?
Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à
atenção básica no município de Belém-PA
Trabalho de conclusão de curso apresentado
como requisito para obtenção do título de
especialista em Saúde Mental, Universidade do
Estado do Pará e Fundação Hospital de
Clínicas Gaspar Vianna.
Área de Concentração: Atenção à Saúde
Mental
Orientador: Prof. Ms. Josie Pereira da Mota
Belém
2014
2
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação(CIP)
Universidade do Estado do Pará
Fundação Pública Hospital de Clínicas Gaspar Vianna
__________________________________________________________________________________
S231o Santos, Cinthia de Castro
Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o papel de um Centro de Atenção
Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no município de Belém-PA / Cinthia de Castro
Santos; Orientador: Ms. Josie Pereira da Mota – 2014
113 f.: il.
Trabalho de Conclusão de Curso (especialização em saúde mental) –
Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna, Belém, 2014.
1. Saúde Mental. 2. Atenção Básica. 3. Centro de Atenção Psicossocial. 4. Apoio
Matricial – metodologia. I. Mota, Josie Pereira da, orient. II. Universidade Federal do Pará. III.
Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. IV. Título.
CDD. 22° ed.: 616.8
__________________________________________________________________________________
3
Cinthia de Castro Santos
Os meus, os seus... e os nossos?
Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à
atenção básica no município de Belém-PA
Trabalho de conclusão de curso apresentado
como requisito para obtenção do título de
especialista em Saúde Mental, Universidade do
Estado do Pará e Fundação Hospital de
Clínicas Gaspar Vianna.
Data de aprovação: 03 / 02 / 2014
Banca Examinadora:
_________________________________ - Orientador
Msc. Josie Pereira da Mota
Secretaria de Estado de Saúde Pública – SESPA e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna -
FHCGV
_________________________________ - Membro titular
Msc. Ingrid Bergma da Silva Oliveira
Universidade do Estado do Pará - UEPA e Universidade da Amazônia - UNAMA
_________________________________ - Membro titular
Msc. Larissa Gonçalves Medeiros
Universidade da Amazônia - UNAMA
_________________________________ - Membro Suplente
Msc. Márcia Roberta de Oliveira Rodrigues
Secretaria de Estado de Saúde Pública - SESPA
4
À Joana (nossa Bá), pelo que
sempre representará para quem
acredita em uma Reforma
Psiquiátrica possível. Com amor e
saudade.
5
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, por compreenderem minha ausência e ainda assim orgulharem-se
dela.
Ao Antonio, pela paciência, compreensão, incentivo, pelas vezes em que foi meus
olhos, braços, pernas e consciência, pelo otimismo, pelo amor para todo o sempre...
À Josie, pelo incentivo, pela troca, pela vontade, pela disposição e pela coragem em
abraçar comigo a causa deste trabalho.
À Ana Gracinda Ignácio Silva e à Maria Auxiliadora Pereira, pelas contribuições
valiosíssimas quando da qualificação do projeto deste trabalho.
Ao Ministério da Saúde e ao Ministério da Educação pelo incentivo e oportunidade à
Educação Permanente.
Ao Departamento de Educação em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde
Pública do Pará, à Coordenação do CAPS Grão Pará e à Gerência de Ensino e
Pesquisa da Hospital de Clínicas Gaspar Vianna por permitirem a realização desta
pesquisa.
A todos os participantes desta pesquisa, pelo reconhecimento do valor da pesquisa
à ciência e à sociedade.
6
“Se você tem uma laranja e troca
com outra pessoa que também tem
uma laranja, cada um fica com uma
laranja. Mas se você tem uma ideia
e troca com outra pessoa que
também tem uma ideia, cada um fica
com duas”.
Confúcio
7
RESUMO
SANTOS, Cinthia de Castro. Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o
papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no
município de Belém-PA. 2014. 113f. Trabalho de Conclusão de Curso (Residência
Multiprofissional em Atenção à Saúde Mental) – Universidade do Estado do Pará e
Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. Belém, Pará, 2014.
Estudo sobre Saúde Mental e Atenção Básica no qual analisou-se o papel de um
Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) no município de Belém-PA em sua relação
com a atenção básica, através do Apoio Matricial. Percorremos brevemente a
história da Reforma Psiquiátrica até a atual Política de Saúde Mental, a Política
Nacional de Atenção Básica em busca do que concerne à trasnversalização dos dois
temas. A atenção básica foi incluída no campo das ações em saúde mental no ano
de 2006, bem como o Apoio Matricial como a via de acesso da saúde mental nos
serviços da atenção básica, através das Equipes de Apoio Matricial às Equipes de
referência. O Apoio Matricial é uma metodologia de trabalho criada por Gestão
Wagner de Souza Campos através do Método Paidéia que visava um novo sistema
de referência entre profissionais e usuários que promovesse e estimulasse maiores
coeficientes de vínculo entre estes. Assim, o Apoio Matricial ou Matriciamento é
definido como um novo jeito de produzir saúde onde duas ou mais equipes criam
propostas de intervenção pedagógico-terapêutica, estabelecendo uma cogestão no
compartilhamento do cuidado. A partir da inclusão da atenção básica como ponto de
gestão dos casos de saúde mental dentro da Rede de Atenção Psicossocial
juntamente com o CAPS, através da Portaria nº 3.088/11 (RAPS), analisamos a
articulação entre estes dois pontos desta rede. O CAPS escolhido para esta
pesquisa era do tipo III (CAPS Grão Pará) e participaram desta pesquisa as
coordenações estadual e municipal de Saúde Mental, a coordenação do CAPS Grão
Pará e a equipe técnica deste. Investigar a situação atual do Apoio Matricial na
saúde mental no estado do Pará e município de Belém, verificar quais as práticas e
ações que estavam relacionadas ao Apoio Matricial que foram indicadas pelos
sujeitos da pesquisa e identificar os desafios e as resoluções que estes profissionais
apontaram para o diálogo com a atenção básica e portanto o Apoio Matricial em
saúde mental norteou a consecução desta pesquisa. Os resultados desta
evidenciaram algumas questões que justificam a falha na rede de amparo à saúde
mental, dimensionaram a necessidade da ampliação da discussão sobre as relações
entre os serviços da RAPS e indicaram razões pelas quais é importante se utilizar o
Apoio Matricial como uma via de estabelecimento de comunicação e diminuição da
distância entre eles para fins também de promoção à saúde mental.
Palavras-chave: Saúde Mental. Atenção Básica. CAPS. Centro de Atenção
Psicossocial. Apoio Matricial
8
ABSTRACT
SANTOS, Cinthia de Castro. Mine, yours... and ours? Analysis on the role of a
Psychosocial Care Center in Matrix Support to primary care in the city of Belém-PA.
2014. 113f. Trabalho de Conclusão de Curso (Residência Multiprofissional em
Atenção à Saúde Mental) – Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de
Clínicas Gaspar Vianna. Belém, Pará, 2014.
Study on Mental Health and Primary Care in which we analyzed the role of a
Psychosocial Care Center (CAPS) in the city of Belém-PA in their relation to primary
care, by Matrix Support. Briefly go through the history of the Reformation to the
current Psychiatric Mental Health Policy, the National Primary Care Policy in relation
to the search mainstreaming of the two themes. Primary care was included in the
field of mental health actions in 2006 as well as the Support Matrix as the access of
mental health into primary care services through the Matrix Teams Support Crew
reference. The Matrix Support is a methodology created by Gastão Wagner de
Souza Campos through the “Paidéia” method aimed at a new referral system
between professionals and users who promote and stimulate greater bond between
these coefficients. Thus, Matrix Support or matricial is defined as a new way to
produce health where two or more teams create proposals for pedagogical-
therapeutic intervention, establishing a co-management in the sharing of care. From
the inclusion of primary care as a point of case management of mental health within
the network of psychosocial care along with CAPS, through Decree No. 3.088/11
(RAPS), we analyzed the relationship between these two points of the network. The
CAPS chosen for this research was the type III (CAPS “Grão Pará”) and participated
in this research state and local coordination of Mental Health, the coordination of
CAPS Grantham and technique of this team. To investigate the current situation
Matrix Support in mental health in the state of Pará in Belém and checking which
practices and actions that were related to Matrix Support that were indicated by the
research subjects and identify the challenges and resolutions that these
professionals pointed to the dialogue with primary care and therefore the Matrix
Support mental health guided the achievement of this research. The results of this
highlighted some issues that justify the failure of the mental health support network,
dimensioned the need to expand the discussion on the relationship between services
RAPS and indicate reasons why it is important to use the Matrix Support as a means
of establishing communication and decreasing the distance between them for the
purpose also to promote mental health.
Keywords: Mental Health. Primary Care. CAPS. Psychosocial Care Center Matrix
Support
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................13 1
2
2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E A CRIAÇÃO DOS
CAPS: Estratégias de reorganização do cuidado em saúde mental .............21
3 A ATENÇÃO BÁSICA E O APOIO MATRICIAL: um desafio............................27
4 APOIO MATRICIAL EM SAÚDE MENTAL: diálogo necessário.......................30
5 CAMINHOS METODOLÓGICOS.........................................................................35
5.1 Tipo de estudo...................................................................................................36
5.2 O campo de pesquisa.........................................................................................37
5.3 Os sujeitos sociais..............................................................................................38
5.4 Primeiros passos no campo de pesquisa.........................................................42
6 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS............................................................................44
6.1 Eixo temático: papel do CAPS da Rede de Atenção Psicossocial.................45
6.2 Eixo temático: importância do Apoio Matricial pelo CAPS na Rede de
Atenção Psicossocial .........................................................................................55
6.3 Eixo temático: processo de implantação da proposta do Apoio Matricial....63
6.4 Eixo temático: processo de trabalho CAPS – Atenção Básica.......................78
6.5 Eixo temático: capacitação profissional para atuação no Apoio
Matricial....................................................................................................................84
6.6 Eixo temático: importância das práticas em saúde mental na atenção
básica........................................................................................................................90
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................95
REFERÊNCIAS..................................................................................................100
APÊNDICES.........................................................................................................104
ANEXOS.............................................................................................................110
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
DESENHO 1 Rede de Atenção Psicossocial na qual o CAPS é o
organizador e porta de entrada
26
DESENHO 2 Cobertura por município dos Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS) ao final de 2022 e ao final de 2011
(parâmetro de 1 CAPS para cada 1000.000 habitantes)
27
DESENHO 3 Rede de Atenção Psicossocial na qual existe um
compartilhamento de cuidados entre os serviços. Em
amarelo estão os Programas Saúde da Família (PSF)
33
GRÁFICO 1 Percentual de respostas por opção para a pergunta: “Foram
criados equipes ou grupos neste CAPS para que essas
ações na atenção básica fossem realizadas?
69
GRÁFICO 2 Percentual de respostas por opção para a pergunta “Você
considera que os técnicos e a gestão deste CAPS estão
preparados para realizar ações de saúde mental junto à
atenção básica? Por quê?
76
GRÁFICO 3 Percentual de respostas por opção para a pergunta “Foi
realizada alguma oficina, curso etc. no intuito de
instrumentalizar o CAPS na operacionalização do apoio
deste à atenção básica? Como foi?
88
11
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa 40
QUADRO 2 Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa após
critérios
41
QUADRO 3 Perfil dos sujeitos que participaram para pesquisa 41
QUADRO 4 Identificação dos sujeitos e quantidade de sujeitos de
acordo com o turno e gestão
44
12
LISTA DE SIGLAS
APS Atenção Primária à Saúde
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
CEP Comitê De Ética Em Pesquisa
CESEM Centro De Saúde Escola Do Marco
CNS Conferência Nacional de Saúde
CNSM Conferência Nacional De Saúde Mental
CNTSM Congresso Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental
DINSAM Divisão Nacional de Saúde Mental
ESF Estratégia Saúde Da Família
FHCGV Fundação Hospital De Clínicas Gaspar Vianna
MNLA Movimento Nacional de Luta Antimanicomial
MTMS Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
NAPS Núcleo de Atenção Psicossocial
NASF Núcleo De Apoio À Saúde Da Família
OMS Organização Mundial De Saúde
PNAB Política Nacional De Atenção Básica
PNH Política Nacional de Humanização
PSF Programa Saúde da Família
RAPS Rede de Atenção Psicossocial
SUS Sistema Único De Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UBS Unidade Básica De Saúde
UEPA Universidade Do Estado Do Pará
13
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa pretendeu discutir a função e a ação do Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS) no Apoio Matricial à atenção básica através da metodologia de
trabalho do Apoio Matricial.
A escolha do objeto de pesquisa partiu de uma inquietação pessoal
acerca da situação em que se encontra atualmente o município de Belém no que diz
respeito à atenção à saúde mental tanto dos usuários dos programas de saúde
mental das unidades de saúde quanto da atenção à política de promoção e
prevenção em saúde mental.
Enquanto residentes em atenção à saúde mental, da Universidade do
Estado do Para (UEPA) em parceria com o Hospital de Clínicas Gaspar Vianna
(FHCGV), observamos nos campos de estágios o que os técnicos que trabalham
nestes serviços comentam a respeito da falta de articulação entre os serviços da
Rede de Atenção Psicossocial. Porém, ao mesmo passo pouco se discute a saúde
mental na atenção básica, uma área tão estratégica quanto os outros pontos da rede
de saúde mental, segundo a proposta da atual Política Nacional de Saúde Mental.
Além disto, era bastante comum a prática de encaminhamentos,
referência e contra referencias entre os serviços, porém feitos de modo muitas vezes
equivocada ou sem a real necessidade.
Na Clínica psiquiátrica do FHCGV, no setor de Emergência – única no
Estado, observamos que muitos casos de procura deste serviço poderiam ter sido
acolhidos em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), através, por exemplo, da
equipe técnica da Estratégia Saúde da Família (ESF) ou mesmo no CAPS nos casos
em que existem no município, pois nos relatos do familiar que trazia o usuário era
possível identificar que o mesmo havia dado indícios, ainda que pequenos, de que
algo não estava bem, sendo ignorado e tendo como consequência a crise que
desencadeou seus sintomas mais graves e portanto a internação.
No CAPS a fala da equipe técnica eram a de que os usuários em pré-alta
se mostravam resistentes a esta quando eram informados que deveriam continuar
seus tratamentos nas UBS. A razão disto, segundo os usuários é o receio da
“desassistência” ao tratamento por parte da equipe técnica da UBS, já que segundo
14
esses usuários não existem psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais e
outros profissionais que fazem parte da equipe técnica do CAPS.
Na UBS (a saber Centro de Saúde Escola do Marco – CESEM) os
usuários do programa de saúde mental em sua maioria estavam há anos sem ao
menos uma reavaliação, fazendo uso do mesmo medicamento desde sua alta de
internação ou entrada neste serviço de saúde. E ainda haviam pessoas que
procuravam a unidade em busca de esclarecimento de sintomas de transtornos mais
graves e crônicos, como a esquizofrenia e não raramente, para tratamento de
sintomas de pânico, ansiedade, depressão, ou em como “suportar” o seu sofrimento
após um evento traumático ou adoecedor – assaltos, perdas, etc.
O procedimento de atenção neste serviço, na grande maioria dos casos,
era: ou manter a situação como estava – no caso dos já usuários do programa de
saúde mental, ou encaminhar para avaliação ou atendimento no CAPS de
abrangência da moradia do usuário. A justificativa para isto sempre estava na ordem
de “um não saber como proceder naquele caso” ou de que todas as ações
relacionadas à saúde mental eram de responsabilidade dos CAPS.
Em todos esses casos entendemos que a falta de articulação entre os
serviços da rede de saúde mental não justificaria sozinho o não funcionamento pleno
da Política atual de Saúde Mental. Seria necessário então um melhor entendimento
pelas equipes técnicas dos serviços de saúde de uma forma geral sobre a condução
de casos em Saúde Mental desde um acompanhamento de alta e manutenção do
tratamento, até mesmo na identificação e prevenção de sintomas e situações que
levariam ao não adoecimento grave do usuário.
Compreendemos que a inserção da atenção básica no campo de atenção
à saúde mental ainda poder estar no nível do estranhamento, no entanto, o
adoecimento mental está presente em qualquer nível de atenção à saúde.
A Declaração de Alma-Ata de 1978 já enunciava que a saúde na atenção
primária é fundamental em qualquer país, pois ela funciona como um “filtro entre a
população geral e a atenção de saúde especializada”, e por isso ela desempenha
um papel importante dentro da estruturação da rede de atenção à saúde mental
(OMS, 2001, p. 58).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2001) os casos de
transtornos mentais na atenção primária de atenção são comuns, mas na maioria
das vezes não são detectados. Os diagnósticos mais encontrados nesses pacientes
15
são a depressão, ansiedade e os transtornos decorrentes do uso e abuso de álcool
e outras drogas que estão geralmente associados a algum tipo de transtorno físico,
e muitas das vezes os profissionais da atenção básica percebem um
comprometimento neste nível mas nem sempre reconhecem e é por isso que esses
profissionais necessitam de treinamentos que podem ser feitos pelos profissionais
especializados em saúde mental dos serviços da rede comunitária do local de
abrangência.
Assim, a proporção entre a qualidade e quantidade da necessidade e do
uso dos serviços especializados em saúde mental dependem muito mais dos
serviços que são prestados à nível de atenção primária.
O manejo e tratamento de transtornos mentais no contexto da atenção
primária é um passo fundamental que possibilita ao maior número possível
de pessoas ter acesso mais fácil e mais rápido aos serviços - é preciso
reconhecer que muitos já estão buscando assistência nesse nível. Isso não
só proporciona uma atenção melhor como também reduz o desperdício
resultante de exames supérfluos e de tratamentos impróprios ou não
específicos (OMS, 2001, s/p)
Após um ano da realização do encontro que deu origem ao relatório de
2001 da OMS, foi realizada a III Conferência em Saúde Mental que deliberou em
relatório novas formas e estratégias de reestruturação da assistência em saúde
mental no Brasil, que incluía a extinção gradual dos hospitais psiquiátricos e portanto
a estruturação de uma rede de serviços articuladas entre si, de bases comunitárias e
territoriais (BRASIL, 2005), juntamente com a promulgação da Lei 10.216/01, esta
que deu início à Política Nacional de Saúde Mental assegurando os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais, considerando um redirecionamento à
assistência destas (BRASIL, 1990-2004).
Foi a partir disto que se viu efetivamente acontecer a Reforma
Psiquiátrica como uma política dentro dos princípios do Sistema Único de Saúde
(SUS), assim descrita no relatório e, portanto, com a possível articulação desta com
a atenção básica, articulação essa na qual os CAPS
[...] tornaram-se, então, a principal estratégia, na política nacional, de
transformação do modelo e de garantia de direitos aos sujeitos em
sofrimento psíquico. São espaços de ofertas de serviços que se diferenciam
16
das estruturas tradicionais e que se orientam pela ampliação do espaço de
participação social do sujeito que sofre, pela democratização das ações,
pela não segregação do adoecimento psíquico e pela valorização da
subjetividade, como base das ações multiprofissionais (TAVARES; SOUSA,
2009, p. 254).
Na concepção de Vasconcelos (2010) embora a principal proposta da
Reforma Psiquiátrica fosse atingir emergencialmente a melhoria dos cuidados aos
portadores de transtornos mentais mais graves e severos - e hoje é possível
perceber grande avanço nesta proposta - estamos vivenciando outras questões
emergenciais que se não olhadas contribuirão para a regressão dos avanços
históricos.
Estas questões que estão se configurando como emergenciais devem ser
pensadas como novos desafios e portanto
[...] há que se perguntar por outros grupos sociais e necessidades que
também requerem atenção e que não constituíram alvo de nossas
prioridades até agora, ou que nossa estratégia ainda não foi capaz de
oferecer suporte suficiente ou adequado (VASCONCELO, 2010, p. 42).
Neste contexto estão também pessoas que vivenciam ou vivenciaram um
tipo de “Violência social - violência cotidiana principalmente nas grandes cidades,
catástrofes – como deslizamento de terra e enchentes e transtornos psiquiátricos
menores – ansiedades, fobias, pânico” (VASCONCELOS, 2010, p. 57-58).
Considerando a necessidade de se ampliar o olhar à saúde na atenção
básica, o Ministério da Saúde em parceria com o Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas/ Departamento de Atenção Básica, a Coordenação
Geral de Saúde Mental e a Coordenação de Gestão da Atenção Básica publicou em
2003 documento no qual orienta que o CAPS não deve ser considerado única
estratégia dentro da rede de serviços de saúde mental e por isto incluiu de forma
definitiva as ações de Saúde Mental como estratégica dentro da Atenção Básica, e
estas ações devem obedecer aos princípios da Reforma Psiquiátrica e do SUS
(BRASIL, 2003).
Dentre as diretrizes consideradas neste documento para a implantação da
saúde mental na atenção básica está a “Organização das ações de saúde mental na
atenção básica” e foi esta que incluiu o “Apoio Matricial da saúde mental às equipes
da atenção básica” definido como “um arranjo organizacional que visa outorgar
17
suporte técnico em áreas específicas às equipes responsáveis pelo desenvolvimento
de ações básicas de saúde para a população” (BRASIL, 2003, p.07).
A principal contribuição do Apoio Matricial é que em se proporcionando a
coresponsabilização dos casos se excluiria a “lógica dos encaminhamentos”, o que
proporcionaria maior resolutividade destes casos pela equipe local (BRASIL, 2003).
Em outras palavras, o Apoio Matricial é um compromisso de coresponsabilização
entre duas equipes pelos casos em saúde de um determinado território.
Segundo Campos e Domitti (2007) o Apoio Matricial ou Matriciamento em
saúde tem como objetivo ser uma retaguarda especializada as equipes de saúde,
dando apoio assistencial e técnico pedagógico a esta, não excluindo mas
complementando o que ele chamou de “sistemas de hierarquização como a
referência, contrareferência protocolos e centros de regulação” (2007, p.399-400).
Assim, na área da Saúde Mental é o CAPS ou outro serviço especializado
em Saúde Mental que assumirá o papel de Equipe de Apoio Matricial nos municípios
onde ele estiver estruturado, porém, nos casos em que ele for insuficiente para
garantir este apoio, poderá ser composta uma equipe em saúde mental e/ou deve-se
pensar na expansão do número de CAPS neste município (BRASIL, 2003).
[...] é fundamental investirmos imediatamente no debate e em experiências-
piloto que mais tarde poderão constituir modelos mais consolidados para a
expansão maciça destes serviços da rede de saúde mental
(VASCONCELOS, 2010, p. 60)
Mota (2012) em seu estudo sobre a atual situação da saúde mental no
Estado do Pará aponta que segundo uma das Diretoras Executivas do Movimento
Paraense da Luta Antimanicomial e trabalhadora da CASA AD de Belém (2012)
Esse processo do CAPS de prestar Apoio Matricial não funciona aqui.
Algumas unidades ainda atendem algumas demandas por iniciativas
individuais de algumas pessoas. Por consequência da falta dessa relação
com a rede de atenção básica e combinando com o fato de que nos CAPS
há aqueles trabalhadores que não querem ter trabalho de lidar com os
casos mais graves acabam por absorver essa demanda que deveria estar
na atenção básica [...] (p. 148)
Consideramos que esta fala regional corrobora com a ideia de
Vasconcelos (2010) quando ele reflete que sem dúvida devemos expandir os
18
programas e estratégias de saúde mental na atenção básica como os serviços
ambulatoriais (aqui um dos dispositivos que ela aponta como de grande valia são os
ambulatórios), mas se consideramos isto por que não considerarmos também a
proposta do Apoio Matricial? Foi este, portanto, o foco deste estudo.
A Política Nacional de saúde mental em 2005 instituiu o CAPS como o
serviço articulador da rede em saúde mental, assim ele deve assumir a
responsabilização compartilhada dos cuidados em saúde mental junto à atenção
básica e não ser o único serviço que presta atendimento nesta área.
“[...] É função, portanto, e por excelência, dos CAPS organizar a rede de
atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios. Os CAPS são
os articuladores estratégicos desta rede e da política de saúde mental num
determinado território” (BRASIL, 2005, s/p).
No entanto, em 2011 foi instituída a Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS), orientando que “[...] a ordenação do cuidado estará sob a responsabilidade
do Centro de Atenção Psicossocial ou da Atenção Básica, garantindo permanente
processo de cogestão e acompanhamento longitudinal do caso (BRASIL, 2011, s/p),
ficando assim entendida a atenção básica com igual valor na articulação nesta rede,
não podendo mais ser considerado o CAPS como o serviço “central”, mas ainda
como estratégico.
Posto isto, questionamos como o Matriciamento em saúde mental feito
pelo CAPS poderia contribuir para a prevenção, promoção e recuperação da saúde
dos usuários dos serviços da atenção básica. Esta problematização motivou a busca
de respostas para as questões que justificaram o estudo sobre o Apoio Matricial e
portanto, esta pesquisa, a saber: a) O que conheciam sobre o Apoio Matricial o
Coordenador (a) e a equipe técnica do CAPS III Grão Pará, o Coordenador (a)
Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará e a Referência Técnica
em Saúde Mental do Município de Belém; b) Quais as práticas realizadas pelo CAPS
na atenção básica apontadas por estes profissionais como ações do Apoio Matricial
e; c) Quais desafios e soluções que estes profissionais apontariam sobre o diálogo
entre o CAPS e atenção básica, e, portanto sobre o Apoio Matricial em saúde
mental.
Deste modo, pesquisar sobre o tema do “Matriciamento em Saúde
Mental” foi necessário e importante porque entendemos que a Reforma Psiquiátrica
19
deve ser pensada para além da gradual extinção e substituição de práticas asilares
pelas práticas comunitárias: ela deve nos levar a criar novas práticas do cuidado e
novos direcionamentos para uma real cuidado da saúde mental, atendendo desde o
primeiro nível de atenção à saúde.
Como exemplo desta necessidade apresentamos dados obtidos no
relatório da OMS apontando que “cerca de 450 milhões de pessoas sofrem
transtornos mentais ou de comportamento, mas apenas uma minoria delas recebe
mesmo o tratamento mais básico” (OMS, 2001 p.02) e dados divulgados pelo
Ministério da Saúde (BRASIL, 2009) que apontam pelo menos 3% da população
com transtornos mentais severos e persistentes e que necessitam de cuidados
contínuos, e mais 9 a 12% (totalizando cerca de 12 a 15% da população geral do
País, em todas as faixas etárias) apresentando transtornos mentais leves que
precisam de cuidados eventuais.
Também segundo este mesmo relatório é comum que pacientes que
buscam atendimento na atenção primária apresentem algum tipo de transtorno
mental ou do comportamento e
“Quase 80% dos usuários encaminhados aos profissionais de saúde mental
não trazem, a priori, uma demanda específica que justifique a necessidade
de uma atenção especializada, portanto “É útil uma avaliação do grau e do
padrão desses transtornos nesse contexto por causa do potencial para
identificar pessoas com distúrbios e proporcionar a atenção necessária
naquele nível” (OMS apud FIGUEIREDO; CAMPOS, 2009, p. 130)
Segundo Boletim da Coordenação de Saúde Mental (BRASIL, 2003) as
equipes de saúde na atenção básica frequentemente encontram em sua prática
cotidiana algum sofrimento psíquico, o que demandaria alguma ação em saúde
mental e por isso estas equipes que trabalham na atenção básica são consideradas
essenciais dentro da rede de cuidados em saúde mental. Isso porque
Existe um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e qualquer
doença, às vezes atuando como entrave à adesão a práticas preventivas ou
de vida mais saudáveis. Poderíamos dizer que todo problema de saúde é
também – e sempre – mental, e que toda saúde mental é também – e
sempre – produção de saúde. Nesse sentido, será sempre importante e
necessária a articulação da saúde mental com a atenção básica (BRASIL,
2003, p. 07)
20
Nesta perspectiva justifico este estudo considerando que a diretriz do
Apoio Matricial como uma das orientações para a implementação da Saúde Mental
na atenção básica nos inclina a reconhecer que as novas práticas do cuidado
deverão estar sempre em discussão para que se possa buscar o aproveitamento, o
melhoramento e o aperfeiçoamento das práticas atuais e que antigas práticas
consideradas fora do contexto atual da Reforma Psiquiátrica e da Política de Saúde
Mental não sejam utilizadas de maneira velada pelo “não saber fazer”.
21
2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E A CRIAÇÃO DOS CAPS:
ESTRATÉGIAS DE REORGANIZAÇÃO DO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL
A Reforma Sanitária e seu engajamento político-social foi o resultado do
movimento sanitarista que na década de 70 trouxe à tona discussões sobre as
políticas de saúde, prestação de serviços, a prática, atenção e gestão dos cuidados
em saúde entre outras (BRASIL, 2005). O resultado destas discussões deu origem
duas décadas depois a um sistema de saúde com novas formas de compreensão da
saúde, o então Sistema Único de Saúde criado pela Lei 8.080 de 19 de setembro de
1990.
Esta lei traz como um de seus princípios a integralidade das ações de
promoção, prevenção e recuperação da saúde que onde não é mais possível pensar
a prática do cuidado em saúde como um lugar: algo estático e espaço
prioritariamente exclusivo para uma determinada demanda pois ela deve ser
“entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos
e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de
complexidade do sistema” (BRASIL, 1990).
Quando o Movimento da Reforma Psiquiátrica chega ao Brasil em
meados da década de 80 se depara com as ideias da Reforma Sanitária e nela um
caminho com os quais os seus objetivos se encontram, já que a primeira orienta
para a extinção gradual de práticas asilares e segregadoras em prol da construção
de novas práticas do cuidado em saúde mental, dentro de uma rede de serviços
comunitários, incluindo ações transversais que visem justamente a integralidade do
cuidado.
Segundo Amarante (1995) a Reforma Psiquiátrica no Brasil tem seu início
demarcado no ano de 1978 quando do episódio conhecido como a “Crise do
DINSAM” (Divisão Nacional de Saúde Mental), um órgão do Ministério da saúde
responsável pelas políticas de saúde mental no Brasil. O que Amarante chamou de
“estopim da reforma psiquiátrica brasileira” aconteceu por conta de uma greve
deflagrada pelos profissionais das quatro unidades do DINSAM-RJ: Centro
Psiquiátrico Pedro II – CPPII, Hospital Pinel, Colônia Juliano Moreira – CJM e
Manicômio Judiciário Heitor Carrilho.
Juntamente com estes profissionais, houve demissão de mais de 200
estagiários e profissionais, quando nestas instituições a grande maioria dos recursos
22
humanos era composta de bolsistas que frequentemente trabalhavam sob as piores
condições entre baixos rendimentos financeiros, precárias condições dos ambientes
em que trabalhava, e ameaças de todo o tipo de violência a eles e aos internos
destas instituições. Disto partiu denúncia registrada em prontuário de três
profissionais do CPPII acerca das situações irregulares e condições precárias e sub-
humanas neste hospital, provocando uma série de discussões à respeito dessa
situação (AMARANTE, 1995).
Foi então que neste mesmo ano 1978 uma “aliança” entre trabalhadores
de saúde mental, membros do movimento sanitarista, membros de conselhos
profissionais, familiares e usuários com historio de longos período de internação em
asilos psiquiátricos deu origem ao primeiro movimento pela luta de melhores
condições, direitos e proteção à pessoas com transtornos mentais: MTSMS -
Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (BRASIL, 2005).
As diretrizes criadas pela 8ª Conferência Nacional de Saúde (8º CNS)
foram um marco importante dentro da história da Reforma Psiquiátrica pois ela
passou a ser pensada dentro da perspectiva da Reforma Sanitária (da organização
da saúde), bem como recebeu status de movimento politizado.
De acordo com Sidrim (2010) em decorrência da organização política da
8ª CNS ocorreu a I Conferência Nacional em Saúde Mental (I CNSM) em 1987 e as
proposições sobre a nova forma de assistência receberam forte influência do
movimento americano de reforma cujo engajamento estava na criação de espaços
extra-hospitalares nos níveis primários e secundários organizados através do
sistema de referência e contrareferência.
Em 1987 (AMARANTE, 1995; BRASIL 2005; SIDRIM, 2010) após o II
Congresso Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental (II CNTSM) e da criação do
Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA) pelo MTSMS é criado no Brasil
na cidade de São Paulo o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e no
município de Santos/SP o primeiro Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS) quando
em 1989 a Casa de Saúde Anchieta é fechada após diversas denúncias de maus
tratos aos internos e assim “É esta intervenção, com repercussão nacional, que
demonstrou de forma inequívoca a possibilidade de construção de uma rede de
cuidados efetivamente substitutiva ao hospital psiquiátrico” (BRASIL, 2005, s/p).
23
Em 1989 o então deputado Paulo Delgado deu entrada ao projeto de lei
que dispunha sobre os direitos e proteção aos portadores de transtornos mentais,
bem como a extinção gradual dos hospitais psiquiátricos.
O Brasil assinou seu compromisso com a reestruturação e reforma
psiquiátrica na chamada Declaração de Caracas de 1990 e novas diretrizes foram
tomadas a partir da II CNSM, e tudo isto deu origem às primeiras legislações
federais sobre uma nova Política de Saúde Mental para criação de serviços de
atenção diária baseadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS, Hospitais-dia
(BRASIL, 2005, s/p).
Para Tavares e Sousa (2009) a Declaração de Caracas de 1990 deve ser
lembrada como um marco histórico da Reforma Psiquiátrica na América Latina, pois
orientou sobre os cuidados aos portadores de transtornos mentais que devem ser
assistidos privilegiadamente na comunidade.
Estes serviços citados tiveram suas diretrizes estabelecidas para se
estruturar demarcadas com a “Portaria nº 224 de 29 de janeiro de 1992” (BRASIL,
1992) que definiu os NAPS/CAPS como dispositivos dentro da reestruturação da
assistência em saúde mental estruturados de acordo com a lógica do território,
responsáveis pelos atendimentos ambulatoriais diários, com atividade individuais e
grupais e composta por equipe multidisciplinar, podendo
[...] constituir-se também em porta de entrada da rede de serviços para as
ações relativas à saúde mental, considerando sua característica de unidade
de saúde local e regionalizada. Atendem também a pacientes referenciados
de outros serviços de saúde, dos serviços de urgência psiquiátrica ou
egressos de internação hospitalar. Deverão estar integrados a uma rede
descentralizada e hierarquizada de cuidados em saúde mental (BRASIL,
1992, s/p)
Após 10 anos do projeto de Lei do Deputado Paulo Delgado, foi aprovada
a “Lei 10.2016 de 06 abril de 2001”, que substituía com algumas modificações o do
projeto original de 1989, dentre elas a reorganização dos serviços de assistência à
saúde mental preconizando: “IX – ser [a pessoa com transtorno mental] tratada,
preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental” (BRASIL, 2001, s/p,
[ ] nosso).
A prática dos cuidados em saúde mental antes da Reforma psiquiátrica
era feita seguindo uma lógica do “Lugar”. No dicionário da língua portuguesa
24
significa “1.Espaço ocupado ou que pode ser ocupado por um corpo; 2. Povoação,
localidade [...]” (AMORA, 2009), e ora, o que vemos na história da Psiquiatria era
exatamente isto: o espaço dos loucos, o lugar da loucura, um espaço “povoado” dos
excluídos, o lugar do saber médico e da prática da cura da doença ou da exclusão
pela impossibilidade da cura, ou do tratamento.
No entanto Vasconcelos (2010) aponta que o atual quadro político da
saúde e da saúde mental no Brasil está sob pena de que todos os seus avanços e
conquistas feitos até hoje possam regredir. Os problemas estruturais ligados à
construção de políticas sociais universais agravam não só a prevalência do
desinvestimento em políticas públicas sociais, a miséria, o uso e abuso de álcool e
outras drogas, por exemplo, gerando novas e crescentes demandas em saúde
mental, como também a precarização dos vínculos de trabalhos no campo da saúde
e que desembocam de forma negativa nos programas e serviços de saúde mental,
dificultando inclusive o maior objetivo da Reforma Psiquiátrica que é a expansão dos
serviços de saúde mental que efetivamente proporcione a gradual extinção dos
hospitais psiquiátricos.
[...] mas estes desafios também podem constituir um estimulo para a
renovação e aprofundamento de nossa estratégia psiquiátrica, se eles forem
devidamente avaliados e se pudermos reavaliar os ajustes táticos e
assistenciais necessários, que possam viabilizar politicamente a
continuidade do processo da reforma (VASCONCELOS, 2010, p. 11).
Com a Reforma Psiquiátrica o pensamento e as ações de cuidado devem
ser diferentes: os serviços especializados ou não devem estar dispostos em uma
ampla rede que conversa entre si e que sejam estruturados a partir das
características sócio, históricas e culturais do “lugar”. É a “lógica do território” – ou
seja, do convívio social na comunidade com suas características populacionais,
demográficas, culturais e etc., que deve estruturar a rede de cuidados nas suas mais
diversas possibilidades do “fazer” e não mais a “lógica do lugar/espaço” que se
ocupa de um cuidado específico.
Aqui utilizo “Território” como um processo, como relação, e como
25
[...] um objeto complexo que deve ser igualmente abordado na perspectiva
de se liberar o conhecimento local, advindo das necessidades locais, das
realidades locais. O conhecimento local expresso nas práticas cotidianas,
heterogêneas, é o conhecimento que contribui na produção de sentidos,
para uma nova semântica do território e de seu viver (YASUI, 2010, p.130).
Yasui (2010) utiliza-se do termo “Estratégia” para definir o percurso da
Reforma Psiquiátrica. A partir da definição de Hoaussis (2001 apud YASUI, 2010, p.
115) “a arte de aplicar com eficácia os recursos de que se dispõe ou de explorar as
condições favoráveis de que porventura se desfrute, visando o alcance de
terminados objetivos”, este autor sugere que a ideia de “estratégia” refere algo em
construção, que condiz com o que ele considera aspecto importante dentro da
Reforma Psiquiátrica que é a mudança do modelo assistencial que se utilizando da
referência local e temporal, com diferentes atores e fazeres, provoca o processo da
transformação.
Foi com a realização da III CNSM, aliada à Lei 10.216/01 que a Política
Nacional de Saúde Mental passou a ter as diretrizes de como deveria ser feita a
gradual extinção dos hospitais psiquiátricos (as requalificações), bem como
deveriam ser estruturados os serviços comunitários (tipos, locos, recursos humanos
entre outros). Foram criados pelo Ministério da Saúde Portarias e Normativas e
também diretrizes do financiamento para esta reestruturação e foi conferido ao
CAPS, pela “Portaria nº 336 de 19 de fevereiro de 2002” o papel de serviço
estratégico na reestruturação da assistência em saúde mental (BRASIL, 2005).
Os CAPS, assumindo um papel estratégico na organização da rede
comunitária de cuidados, farão o direcionamento local das políticas e
programas de Saúde Mental: desenvolvendo projetos terapêuticos e
comunitários, dispensando medicamentos, encaminhando e acompanhando
usuários que moram em residências terapêuticas, assessorando e sendo
retaguarda para o trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde e Equipes
de Saúde da Família no cuidado domiciliar (BRASIL, 2004, p. 12).
Dentro desta perspectiva, Yasui (2010) localiza o CAPS como o principal
meio de implementação da Política atual em Saúde Mental, dentro da construção de
uma rede de serviços estruturada a partir do que chamou de “estratégia de
transformação da assistência”, articulado na diversidade de projetos e localizado no
seu território e portanto
26
Não se limita ou se esgota na implantação de um serviço. O CAPS é meio,
caminho, não fim. É a possibilidade da tessitura, da trama, de um cuidado
que não se faz em apenas um lugar, mas é tecido em uma ampla rede de
alianças que inclui diferentes segmentos sociais, diversos serviços, distintos
atores e cuidadores (YASUI, 2010, p. 115)
Desenho 1 – Rede de Atenção Psicossocial na qual o CAPS é o organizador e porta de entrada.
Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. 2004.
Para Brasil (2005), pensar na tessitura da trama é então trabalhar com
todas as possibilidades de ferramentas. A rede de serviços não deve ser resumida a
um conjunto de serviços: ela deve ser um todo de serviços, recursos humanos e
comunidade, somados aos saberes e fazeres dos mesmos objetivando sempre o
bem comum, e por isso a importância de se tecer esta rede a partir do território que
[...] é a designação não apenas de uma área geográfica, mas das pessoas,
das instituições, das redes e dos cenários nos quais se dão a vida
comunitária. [...] Trabalhar no território significa assim resgatar todos os
saberes e potencialidades dos recursos da comunidade, construindo
coletivamente as soluções, a multiplicidade de trocas entre as pessoas e os
cuidados em saúde mental (BRASIL, 2005, s/p).
O relatório de Gestão 2007-2010 (BRASIL, 2012) aponta que o Brasil
ampliou de forma significativa o serviços de CAPS pelos estados, onde a expansão
regular destes resultou ao final do ano de 2011 em 1.742, sendo 63 CAPS do tipo III,
totalizando 122 serviços habilitados durante o ano.
27
Desenho 2 – Cobertura por município dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) ao final de 2022 e
ao final de 2011 (parâmetro de 1 CAPS para cada 1000.000 habitantes). Fonte: Brasil. Ministério da
Saúde. 2012.
No Pará o ano de 2011 totalizou ao final um número de 49 serviços na
Rede CAPS, sendo 24 CAPS do tipo I, 15 do tipo II, 02 do tipo III e do tipo Infanto-
juvenil, 06 do tipo Álcool e outras drogas (AD) e ainda sem nenhum tipo ADIII,
passando então para a classificação de “boa cobertura” de acordo com os
parâmetros do Ministério da Saúde de cobertura do indicador CAPS/100.000
habitantes (BRASIL, 2012).
3 A ATENÇÃO BÁSICA E O APOIO MATRICIAL: UM DESAFIO
O Sistema Único de Saúde também se preocupou em criar novas
estratégias de cuidado à saúde, desde a sua criação em 1980. Uma destas
estratégias é o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), criada pela “Portaria
GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008” com o objetivo de reforçar a inserção da
Estratégia Saúde da Família (ESF) e ampliar a abrangência da atenção básica
pautada da territorialização e hierarquização das ações em saúde, efetivando a sua
resolutividade. Ele deve ser constituído por profissionais que componham diversas e
interdisciplinares equipes que devem atuar no apoio e em parceria com os
profissionais da equipe da ESF sempre considerando a prática territorializada do
Saúde da Família (BRASIL, 2009).
28
De acordo com o Relatório de Gestão federal 2007-2010 (BRASIL, 2011)
dados de dezembro de 2010 indicavam 1.288 NASF em funcionamento no país, nos
quais 2.349 eram trabalhadores do campo da saúde mental (um total de 31%) e por
esta razão o Caderno do NASF publicado em 2009 dedicou um capítulo específico
sobre Saúde Mental, Álcool e outras drogas, destacando no capítulo introdutório o
Apoio Matricial como estratégia de fundamental importância para a garantia do
cuidado.
A proposta central do NASF é a chamada tecnologia de gestão “Apoio
Matricial”, a qual é complementada pelas equipes de referência. O conceito de Apoio
Matricial foi inicialmente sugerido por Campos (2007) em seu estudo e pesquisa
sobre a reforma das organizações e do trabalho em saúde – chamado “Método
Paidéia”, e posteriormente adotado para as pesquisas em saúde mental, atenção
básica e principalmente adotado nas publicações do Ministério da saúde como na
cartilha do projeto “Humaniza SUS”.
O método Paidéia busca o aperfeiçoamento de pessoas e instituições.
Opera, portanto, diretamente sobre essa terceira instância da polis, isto é,
procura realizar um trabalho sistemático junto aos próprios sujeitos,
ampliando sua capacidade de atuar sobre o mundo que os cerca,
particularmente sobre as instituições e organizações. [...] objetiva aumentar
a capacidade de compreensão e de intervenção das pessoas sobre o
mundo e sobre si mesmas, contribuindo para instituir processos de
construção de sociedades com grau crescente de democracia e de bem-
estar social (CAMPOS, 2006, p.20).
Para Campos (1999, 2007) um novo sistema de referência entre
profissionais e usuários deveria ser pensado de forma que fosse uma norma
organizativa para promoção e estimulação de “maiores coeficientes de vínculo” entre
estes dois personagens e, portanto “A reforma e ampliação da clínica e das práticas
de atenção integral à saúde dependem centralmente da instituição de novos padrões
de relacionamento entre o sujeito/clínico e o sujeito/enfermo” (CAMPOS, 1999,
p.395-396).
Então “O Matriciamento ou Apoio Matricial é um novo modo de produzir
saúde em que duas ou mais equipes, num processo de construção compartilhada,
criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica” (CHIAVERINI, 2011, p.
13).
29
Esta norma organizativa ou modo de produção em saúde deveria ser
composta por equipes básicas de referência em cada serviço, cuja especificidade
seria atribuída de acordo com a unidade a qual estavam ligadas e sua composição
seria essencialmente multiprofissional e atuaria em consonância com o grau de
exigência de cuidado que o caso demandaria (atenção básica, hospitalar,
especialidade e etc.), e atenderiam a uma clientela ou grupo que estariam sob sua
responsabilidade de acordo com a lógica do território (CAMPOS, 1999).
A Equipe de Referência é uma nova forma de organizar as equipes de
saúde nas quais não se enaltecem as especialidades mas sim a interdisciplinaridade
das profissões essenciais e que intervém num mesmo objeto, tornando-se então
corresponsáveis por todas as ações assim dirigidas a ele (CAMPOS, 2007).
As equipes de referência e o Apoio Matricial são considerados arranjos
organizacionais que têm características da transversalidade e corroboram com o
princípio da integralidade do cuidado do SUS. Na atenção básica a Equipe de
Referência é a ESF.
Já a Equipe de Apoio Matricial ou o apoiador matricial é um especialista
que tem um conhecimento e perfil distinto do profissional da Equipe de Referência
que pode contribuir com intervenções e agregar recursos aos da Equipe de
Referência, criar espaços ou possibilidades nos quais ações do Matriciamento sejam
realizadas, compartilhar conhecimentos com a Equipe de Referência para uma
maior resolutividade do caso em questão. O Apoio Matricial então
[...] busca personalizar os sistemas de referência e contra-referência, ao
estimular e facilitar o contato direto entre referência encarregada do caso e
especialista de apoio. Nesse sentido, essa metodologia altera o papel das
Centrais de Regulação, reservando-lhe uma função na urgência, no zelo
pelas normas e protocolos acordados e na divulgação do apoio disponível
(CAMPOS, 2007, p. 401).
Assim, o sistema tradicional de referência e contrarefencia seria pouco
utilizado posto que o usuário mesmo utilizando o Apoio Matricial não deixa de estar
sob os cuidados da Equipe de Referência. Aqui o trabalho consistiria na organização
de um projeto terapêutico sob cogestão (CAMPOS, 1999).
30
Os serviços de referência/especialidades que dão Apoio Matricial passam a
ter dois “usuários” sob sua responsabilidade: “os usuários do serviço” para o
qual ele é referência e “o próprio serviço”. Isso significa que o serviço de
referência/especialidades participa junto com as equipes de referência,
sempre que necessário, da confecção de projetos terapêuticos dos
pacientes que são tratados por ambas as equipes, e ajuda as equipes de
referência a incorporarem conhecimentos para lidar com casos mais simples
(BRASIL, 2004, p. 12).
Campos (1999) criou uma matriz organizacional com as orientações para
o trabalho do Matriciamento e isto deve estar sempre sob conhecimento do
profissional de referência, do profissional que propõe a atividade matricial e do
usuário: em uma linha vertical estariam as equipes de referência e em uma linha
horizontal a Equipe de Apoio Matricial na qual estariam os profissionais
especializados em determinada atividade.
Desta maneira, um professor de educação física, por exemplo, se incluiria
no trabalho interdisciplinar em saúde mental pelo lado matricial, oferecendo
um cardápio de atividades que poderiam ou não ser incluídas no projeto
terapêutico conforme o triplo entendimento acima referido. Um outro
trabalhador que, além de funcionar como referência, trabalhasse também
com uma oficina para reabilitação ocupacional. Esta atividade em grupo, na
oficina, seria ofertada de forma matricial, ou seja, ele receberia pacientes
encaminhados por outros referências, além de alguns de sua própria lista de
clientes (CAMPOS, 1999, p. 398).
O Apoio Matricial como uma metodologia de trabalho complementar
depende que sejam compartilhadas as diretrizes clínicas e sanitárias entre a Equipe
de Referência e a Equipe de Apoio Matricial e ter sempre claro para as duas equipes
que “Essas diretrizes devem prever critérios para acionar o apoio e definir o espectro
de responsabilidade tanto dos diferentes integrantes da Equipe de Referência
quanto dos apoiadores matriciais” (CAMPOS; DOMITTI, 2007, p. 400).
Entre os pressupostos de políticas que a “Portaria GM nº 154 de 24 de janeiro
de 2008” baseou as suas diretrizes estava incluída a Saúde Mental, incluindo
inclusive esta como uma área estratégia de ações do NASF.
4 APOIO MATRICIAL EM SAÚDE MENTAL: DIÁLOGO NECESSÁRIO
De acordo com a IV CNSM
31
Para garantir o atendimento e acompanhamento das pessoas com
transtorno mental, em seu próprio território, propõe-se a obrigatoriedade de
equipes de Saúde Mental na Atenção Primária. Ao mesmo tempo, afirma-se
a estratégia do Matriciamento e a articulação dos serviços em rede como
garantia para a inserção do usuário nos serviços, na perspectiva da
integralidade e conforme sua necessidade. Além disso, propõe-se
implementar o Matriciamento em saúde mental, com equipes intersetoriais
na atenção em saúde, como diretriz da Política de Saúde e com
financiamento das diferentes Políticas Públicas (Educação, Saúde,
Assistência Social e outras) (BRASIL, 2001, p. 22).
Segundo Relatório do Ministério da Saúde (BRASIL, 2007) os indicadores
de saúde mental passaram a fazer parte da atenção básica em 2005, mas foi em
2006 que as políticas dessa área entram em definitivo na Atenção Básica e a
implantação das Equipes de Apoio Matricial e de Referência em saúde mental foram
articuladas com os gestores.
Nesta época várias experiências do Apoio Matricial foram identificadas,
dentre elas Recife/PE e Vale do Jequitinhonha/MG onde foram criados serviços
próprios e equipes próprias para o Apoio Matricial, em Betim/MG por meio das
equipes de saúde mental e Agentes Comunitários da Saúde (ACS) e no Ceará e
Aracajú/SE a partir dos CAPS ou profissionais do CAPS.
A literatura aponta a cidade de Campinas/SP como a experiência pioneira
do Apoio Matricial em Saúde Mental em 2001, através do Programa Paidéia de
Saúde da Família que foi adaptado do Programa Saúde da Família do Ministério da
Saúde, e foi por isso que a atenção básica foi escolhida como área de experiência
neste município
[...] as equipes de saúde mental que existiam nas Unidades Básicas de
Saúde (UBS) foram inseridas na equipe de saúde da família com o papel de
referência à especialidade e apoio à atenção integral da equipe generalista
(BRASIL, 2001, p. 20).
Além do mais, Campinas/SP historicamente tem grande importância
dentro da Reforma Psiquiátrica por ter sido uma das cidades pioneiras na
reestruturação da rede de serviços em saúde mental já que desde 1970 possui
equipes de saúde mental atuando na atenção básica do município e que foram
ampliadas através do Apoio Matricial (FIGUEIREDO e CAMPOS, 2009).
32
Atualmente a Política Nacional de Saúde Mental através do Ministério da
Saúde, considerando a Legislação em saúde mental e suas principais leis, portarias
e decretos, divulgou a “Portaria/GM nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011” que
“Instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para pessoas com sofrimento ou
transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras
drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)” (BRASIL, 2001, s/p).
Aqui além da ampliação da diversidade dos serviços que compõe a Rede
de Atenção Psicossocial, da ratificação dos princípios da Reforma Psiquiátrica e das
considerações feitas na legislação que orienta a Política Nacional de saúde Mental,
aparecem objetivos que são específicos das RAPS entre eles o de “VIII - regular e
organizar as demandas e os fluxos assistenciais da Rede de Atenção Psicossocial”
(BRASIL, 2011, s/p).
Uma das orientações da RAPS é justamente para que todas as ações da
Atenção Básica sejam compartilhadas sempre que possível com outros serviços da
Rede, onde “[...] a ordenação do cuidado estará sob a responsabilidade do Centro
de Atenção Psicossocial ou da Atenção Básica, garantindo permanente processo de
cogestão e acompanhamento longitudinal do caso” (BRASIL, 2011, s/p), o que nos
possibilita afirmar que na saúde mental, o Apoio Matricial seria uma
responsabilização compartilhada entre os serviços ou as equipes de Saúde Mental e
a atenção básica ou outra que esteja no papel de equipe de referência.
Segundo Portaria do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011) quando os
serviços se articulam com serviços especializados dentro da lógica do matricial
(como exemplo, o CAPS) o fluxo de atendimentos se organiza e o processo de
trabalho horizontaliza as especialidades, fazendo com que estas permeiem as ações
de todas as equipes de saúde.
33
Desenho 3 – Rede de Atenção Psicossocial na qual existe um compartilhamento de cuidados entre
os serviços. Em amarelo estão os Programas Saúde da Família (PSF). Fonte: CHIAVERINI. 2011.
De acordo com Sidrim (2010) os CAPS devem criar interfaces com vários
serviços dentro da Rede de Atenção Psicossocial, dentre eles a atenção básica.
Para Bezerra e Dimenstein (2008) a saúde mental é tarefa de uma rede articuladas
de serviços, mas deve contar com os recursos da comunidade para que sejam
criados e utilizados espaços e possibilidades desta para que se tenha uma
verdadeira inclusão das pessoas portadoras de transtornos mentais, como orienta a
Reforma Psiquiátrica. Assim
Muitos casos graves, que necessitariam de acompanhamento mais
intensivo em um dispositivo de saúde mental de maior complexidade,
permanecem na APS [atenção primária em saúde] por questões vinculares,
geográficas e socioeconômicas, o que reforça a importância das ações
locais de saúde mental (BRASIL, 2009, p. 46 [ ] nosso)
Uma destas possibilidades são as equipes que trabalham na atenção
básica, pois não é incomum que encontrem casos de sofrimento mental ou de
transtorno mental já comprovado, acompanhados muitas vezes de falta de
informação e/ou desasistência.
34
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça que o manejo e o
tratamento de transtornos mentais no contexto da APS [Atenção Primária
em Saúde] são passos fundamentais para possibilitar a um maior número
de pessoas o acesso mais facilitado e rápido ao cuidado em saúde mental.
Isso não só proporciona uma atenção de melhor qualidade, como também
reduz exames supérfluos e tratamentos impróprios ou não específicos
(BRASIL,2009, s/p).
Segundo Figueiredo e Campos (2009) a regulação do fluxo de usuários
dos serviços torna-se então responsabilidade compartilhada, pois com o Apoio
Matricial é possível identificar as situações que são da vida cotidiana e que, portanto
podem ser acolhidas pela Equipe de Referência dentro da própria comunidade ou
entorno diferente daquelas que necessitam de um acolhimento especializado em
Saúde Mental que pode ser levada para a própria unidade de saúde ou dependendo
do risco e da gravidade, para um CAPS da região de abrangência.
Com isso, é possível evitar práticas que levam à “psiquiatrização” e à
“medicalização” do sofrimento e, ao mesmo tempo, promover a eqüidade e
o acesso, garantindo coeficientes terapêuticos de acordo com as
vulnerabilidades e potencialidades de cada usuário. Isso favorece a
construção de novos dispositivos de atenção em resposta às diferentes
necessidades dos usuários e a articulação entre os profissionais na
elaboração de projetos terapêuticos pensados para cada situação singular
(FIGUEIREDO; CAMPOS, 2009, p. 130)
Chiaverinni (2011) chama a atenção para que o Matriciamento não seja
confundido com “um encaminhamento ao especialista, como um atendimento por um
profissional em saúde mental ou uma intervenção coletiva realizada apenas pelo
profissional da saúde mental” (p.14) pois a relação do CAPS com a atenção básica
deve ser de integração, posto que as equipes que trabalham na atenção básica
estão mais próximos da comunidade e os CAPS devem prestar apoio e capacitação
para estas equipes (BRASIL, 2004). Para isto o CAPS precisa:
a) conhecer e interagir com as equipes de atenção básica de seu território;
b) estabelecer iniciativas conjuntas de levantamento de dados relevantes
sobre os principais problemas e necessidades de saúde mental no território;
c) realizar Apoio Matricial às equipes da atenção básica, isto é, fornecer-
lhes orientação e supervisão, atender conjuntamente situações mais
complexas, realizar visitas domiciliares acompanhadas das equipes da
atenção básica, atender casos complexos por solicitação da atenção básica;
d) realizar atividades de educação permanente (capacitação, supervisão)
35
sobre saúde mental, em cooperação com as equipes da atenção básica
(BRASIL, 2004, p. 25)
Ballester (2011) refere que a construção das novas práticas em saúde
mental devem contar com tecnologias que sejam apropriadas para o Apoio Matricial:
a interconsulta, a consulta conjunta e a visita domiciliar. Para este autor a reflexão
do compromisso do cuidado de cada um e da equipe dentro do Apoio Matricial e a
interconsulta possibilitaria, à priori, até mesmo um acolhimento das demandas das
equipes e uma diretriz para o cuidado integral e continuado na atenção básica e as
consultas de avaliação ou mesmo a referência para um serviço especializado podem
ser importantes para que a equipe compreenda melhor o problema e o seu papel
enquanto referência em cuidado para determinado usuário.
Já a consulta conjunta pode ser considerada um instrumento de educação
para os participantes, importante instrumento na formação do vínculo entre o usuário
e a equipe que vai cuidá-lo para que ele saiba que continuará sendo atendido por
uma determinada Equipe de Referência mesmo tendo sido “encaminhado” (grifo do
autor) para um especialista, facilitando a adesão deste usuário ao seu tratamento.
Além disto, quanto mais a Equipe de Apoio Matricial se envolve nas ações da
Equipe de Referência, também poderá aprender e apreender os conhecimentos e as
práticas da atenção básica, ao mesmo passo que contribui com no processo de
avaliação e colaboração dos casos.
Por último, a visita domiciliar que é essencialmente uma prática da
atenção básica promoverá com maior efetividade o lado aprendiz da Equipe de
Apoio Matricial “Principalmente na interação entre o conhecimento das famílias e do
território, por um lado, e no apoio ainda que simbólico de alguém com maior
experiência em saúde mental” (BALLESTER, 2011, p. 74).
5 CAMINHOS METODOLÓGICOS
Tendo em vista o objetivo deste trabalho fez-se necessário, assim como
Mota (2012, p. 29), “apreender a estrutura e a dinâmica dos serviços no seu
cotidiano, nas formas que os sujeitos envolvidos se relacionam; seus interesses,
conflitos e as questões vivenciadas através de suas práticas”, bem como
36
compreender as dinâmicas no processo de trabalho entre o CAPS da pesquisa e a
atenção básica do seu território.
O objetivo geral desta pesquisa foi analisar o papel do CAPS e sua
articulação com a atenção básica através do Apoio Matricial. E para a consecução
deste objetivo geral foram traçados alguns objetivos específicos, a saber:
 Investigar a situação atual do Apoio Matricial na saúde mental no estado
do Pará e município de Belém;
 Verificar quais as práticas e ações que estão relacionadas ao Apoio
Matricial que foram indicadas pelo Coordenador (a) e a equipe técnica do
CAPS III Grão Pará, o Coordenador (a) Estadual de Saúde Mental, Álcool
e outras Drogas do Pará e a Referência Técnica em Saúde Mental do
Município de Belém e;
 Identificar os desafios e as resoluções que estes profissionais apontaram
para o diálogo com a atenção básica, e, portanto o Apoio Matricial em
saúde mental.
5.1 TIPO DE ESTUDO
Tratou-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa e descritiva, pois o
objetivo deste trabalho era descrever como o CAPS atua em relação à atenção
básica, cuja via de acesso é o Apoio Matricial. De acordo com Teixeira (2002), este
tipo de pesquisa social possui significados que podem ser investigados, juntamente
com a linguagem e os atores sociais que são considerados matéria prima desta
pesquisa, pois “É o nível dos significados, motivos, aspirações, atitudes, crenças e
valores, que se expressa pela linguagem comum e na vida cotidiana, o objeto da
abordagem qualitativa” (p. 126).
A pesquisa foi realizada a partir de uma perspectiva crítica de análise, que
segundo Mota (2012) busca compreender o fenômeno para além das aparências,
explorando suas vivências e conflitos de uma forma mais aprofundada.
Do ponto de vista metodológico para se alcançar os objetivos propostos
foram utilizadas uma ampla base de dados para se chegar à compreensão da
questão. Partiu-se da compreensão da Política Nacional de Saúde Mental, que
compreende planos, programas e ações, saber: a) Relatórios finais da III e da IV
37
Conferência Nacional de Saúde Mental; b) Portarias nº 224/92, nº 336/02, c) nº
3.088/11; d) Lei 10.216/01, e) além do Boletim informativo sobre Saúde mental e
atenção Básica, f) Manual do CAPS no SUS, g) Relatório de gestão 2007-2010 e h)
Relatório “15 anos após Caracas”. Utilizamos o documento sobre a Política Nacional
de atenção básica, as diretrizes sobre os NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da
Família), bem como a Política Nacional de Humanização (PNH) e a Lei 8.080/90 do
SUS.
Com os resultados desta pesquisa pretendeu-se contribuir na busca de
melhorias dos serviços de saúde, especialmente na área da saúde mental, através,
por exemplo, do incentivo e da oportunidade da educação permanente em saúde.
5.2 O CAMPO DE PESQUISA
A pesquisa foi realizada em um CAPS do tipo III no município de Belém
do Pará. Este é considerado dentro da rede de serviços em saúde mental o
dispositivo substituto ao hospital psiquiátrico, e segundo Brasil (2004), o CAPS III é
um serviço que presta atendimento contínuo, 24h, incluindo feriados e final de
semana, aos portadores de transtornos mentais severos e persistentes, possuindo
no máximo cinco leitos para observação ou repouso.
O acolhimento noturno e a permanência nos fins de semana devem ser
entendidos como mais um recurso terapêutico, visando proporcionar
atenção integral aos usuários dos CAPS e evitar internações psiquiátricas.
Ele poderá ser utilizado nas situações de grave comprometimento psíquico
ou como um recurso necessário para evitar que crises emerjam ou se
aprofundem. O acolhimento noturno deverá atender preferencialmente aos
usuários que estão vinculados a um projeto terapêutico nos CAPS, quando
necessário, e no máximo por sete dias corridos ou dez dias intercalados
durante o prazo de 30 dias (BRASIL, 2004, p. 19).
Nos municípios em que de acordo com a Portaria nº 336/02 é possível
estruturar um CAPS – ou seja, acima de 20.000 habitantes, é ele quem deve ser
responsável pelo Apoio Matricial em Saúde Mental. O CAPS envolvido é o serviço
estruturado para assistência de municípios com mais de 200.000 habitantes e deve
ter entre as suas características “[...] capacidade técnica para desempenhar o papel
de regulador da porta de entrada da rede assistencial no âmbito do seu território
38
e/ou do módulo assistencial [...]”, além de “[...] supervisionar e capacitar as equipes
de atenção básica, serviços e programas de saúde mental no âmbito do seu
território e/ou do módulo assistencial” (BRASIL, 2004, p. 34).
O CAPS Grão Pará foi escolhido para a realização desta pesquisa por
três razões: por ter sido o primeiro CAPS a se reclassificar de básica para alta
complexidade no ano de 2009, passando a ser um serviço de atendimento 24h, 7
dias por semana e como 5 leitos para observação; por ter sido campo de estágio do
Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental e no qual passei dois
meses e; por ter sido o primeiro CAPS a ser implantando no município de Belém,
sob gestão do estado.
A área de abrangência deste CAPS corresponde atualmente aos bairros
Condor, Cremação, Jurunas, Cidade Velha, Campina, Comércio, Nazaré, Reduto,
Batista Campos. Atende pessoas a partir dos 18 anos que chegam ao serviço por
demanda espontânea ou encaminhadas de outros serviços de saúde do SUS ou de
outras instituições.
Com relação à estrutura física, o CAPS III Grão Pará está assim
estruturado:
1º ANDAR: 01 Recepção c/ espera, 01 Consultório, 01 Sala de
atendimento interdisciplinar, 01 Sala de acolhimento, 01 Copa/cozinha, 01 Refeitório,
01 Sala de grupos, 01 Videoteca, 02 Banheiros p/ usuários, 01 Banheiro p/
funcionários, 01 Piscina e 01 Sala p/ guardar estoque de material de limpeza.
2º ANDAR: 01 Sala da direção, 01 Secretaria c/ banheiro, 01 Sala de
Psicologia c/ banheiro, 01 Farmácia c/ banheiro, 01 Sala de espera p/ Farmácia e
psicologia, 01 Quarto de repouso c/ 5 leitos de observação, c/banheiro, contendo
divisória p/masculino e feminino c/ba c/banheiro+ banheiro e 01 Quarto de descanso
para equipe plantonista.
Anexos: 01 Ateliê de oficinas e 01 Sala de apoio com banheiro.
5.3 OS SUJEITOS SOCIAIS
Incialmente foram sujeitos da pesquisa a Coordenadora Estadual de
Saúde Mental, Álcool e outras Drogas da atual gestão, a Coordenadora deste CAPS
39
e a equipe técnica que trabalha no CAPS III Grão Pará, porém com as entrevistas já
em andamento fez-se necessário incluir também como sujeito social a Referência
Técnica em Saúde Mental do Município de Belém.
A equipe técnica aqui foi considerada de acordo com a definição feita por
Brasil (2004, p. 26), a saber “Os profissionais que trabalham nos CAPS possuem
diversas formações e integram uma equipe multiprofissional. É um grupo de
diferentes técnicos de nível superior e de nível médio”. A equipe técnica mínima de
acordo com este autor referido é composta por 2 médicos psiquiatras, 1 enfermeiro
com formação em saúde mental, 5 profissionais de nível superior de outras
categorias profissionais - psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional,
pedagogo ou outro profissional necessário de nível superior e 8 profissionais de
nível médio - técnico e/ou auxiliar de enfermagem, técnico administrativo, técnico
educacional e artesão.
Os sujeitos participantes deveriam estar de acordo com os seguintes
critérios de inclusão: graus de escolaridades ensinos médio e superior, fazer parte
da categoria profissional descrita pelo referencial Brasil (2004) acima, estar em
serviço no período da pesquisa. Os critérios de exclusão foram: grau de
escolaridade ensino fundamental, não estar em serviço por condição de férias,
licença ou cessões, aqueles que manifestaram o desejo de desistir da pesquisa e os
que não desejaram participar.
Para a realização da pesquisa foi realizado em um primeiro momento um
cálculo de amostragem dos sujeitos. Dentro do que propõe um dos critérios de
inclusão, fazia parte da população 71 profissionais que compunham atualmente o
corpo técnico do CAPS Grão Pará onde tínhamos: 36 profissionais do nível médio e
35 profissionais de nível superior, conforme documento cedido pela administração
do CAPS Grão Pará. Com tamanho amostral com erro de 0,01 e como 95% de
confiança, obtivemos uma amostra de tamanho 41.
A partir disto foi realizada uma amostragem Estratificada entre os
profissionais por nível de escolaridade (Médio e Superior), e o número de
profissionais que participariam da pesquisa foi de 21 profissionais de nível médio e
de 20 profissionais de nível superior.
Amostragem estratificada é a técnica normalmente utilizada quando nos
deparamos com uma população que apresenta características heterogêneas e se
quer distinguir subpopulações com características mais homogêneas. Consiste em
40
dividir esta população em subgrupos, denominados de estratos. Estes estratos
apresentam internamente características mais homogêneas do que a população
toda, com respeito às variáveis em estudo e por este motivo devemos escolher
critérios de estratificação que forneça estratos bem homogêneos, assim na
amostragem estratificada proporcional a proporcionalidade do tamanho de cada
estrato da população é mantida na amostra.
Por último e de acordo com a necessidade foi realizada uma amostragem
aleatória utilizando o Aplicativo BioEstat. 5.0. onde foram selecionados os
profissionais que participaram da pesquisa, dispostos no quadro do referido
documento, feito para que cada um dos profissionais tivessem a mesma
probabilidade de participar.
No cálculo de amostras aleatórias simples os indivíduos foram obtidos ao
acaso da população, tendo cada amostra a mesma chance de ser escolhida dentre
todas aquelas possíveis do mesmo tamanho. Os termos aleatório, randômico, casual
e ao acaso são sinônimos. As amostras aleatórias simples podem ser obtidas por
sorteios, em tabelas de números aleatórios e por computador.
Segundo as informações geradas pelo Aplicativo obtivemos valores
aleatórios e sem reposição e foram atribuídos um número para casa profissional da
listagem resultante da amostra estratificada.
O total de 44 sujeitos que a pesquisa se propôs a investigar ficou então
assim distribuído:
Quadro 1 – Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa
(continua)
CARGO CATEGORIA SERVIÇO QUANTIDADE
Coordenadora Estadual
de Saúde Mental, Álcool
e outras Drogas do Pará
Gestão
Secretaria de
Estado de Saúde
do Pará (SESPA)
01
Referência técnica de
Saúde Mental do
município de Belém
Gestão
Secretaria de
Saúde do
Município de
Belém (SESMA)
01
Coordenadora do CAPS
Grão Pará
Gestão CAPS Grão Pará
(estadual)
01
Profissionais da equipe
técnica de nível superior Trabalhador CAPS Grão Pará 20
41
Profissionais da equipe
técnica de nível médio Trabalhador CAPS Grão Pará 21
(conclusão)
No entanto, obedecendo aos critérios de inclusão e exclusão ao final da
pesquisa tivemos o total de 33 sujeitos. É importante dizer que dos 44 sujeitos
selecionados, apenas 04 foram excluídos por não terem aceitado participar da
pesquisa. Assim os entrevistados ficaram distribuídos:
Quadro 2 – Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa após critérios
CARGO CATEGORIA SERVIÇO QUANTIDADE
Coordenadora Estadual
de Saúde Mental, Álcool
e outras Drogas do Pará
Gestão
Secretaria de
Estado de Saúde do
Pará (SESPA)
01
Referência técnica de
Saúde Mental do
município de Belém
Gestão
Secretaria de Saúde
do Município de
Belém (SESMA)
01
Coordenadora do CAPS
Grão Pará
Gestão CAPS Grão Pará
(estadual)
01
Profissionais da equipe
técnica de nível superior Trabalhador CAPS Grão Pará 15
Profissionais da equipe
técnica de nível médio Trabalhador CAPS Grão Pará 15
Vale ressaltar que duas entrevistas que foram registradas com o gravador
foram perdidas pois o instrumento era digital e houve problema técnicos que não
puderam ser recuperadas, e também não houve tempo hábil para que estas
entrevistas pudessem ser refeitas.
Os participantes da pesquisa tinham o seguinte perfil:
Quadro 3 – Perfil dos sujeitos que participaram da pesquisa
(continua)
PERFIL QUANTIDADE (%)
Faixa Etária
De 31 – 40 anos
De 41 – 50 anos
De 51 – 60 anos
10
08
10
36%
28%
36%
Sexo
42
Feminino
Masculino
21
07
75%
25%
PERFIL QUANTIDADE %
Profissão
Psicólogo
Nutricionista
Administrador
Ed. Físico
Pedagoga
Enfermeiro
Assistente Social
Terapeuta Ocupacional
Psiquiatra
Téc. De Enfermagem
Ag. Administrativo
Aux. De Enfermagem
03
02
01
01
01
02
02
02
01
08
03
02
11%
7%
4%
4%
4%
7%
7%
4%
4%
30%
11%
7%
Tempo de serviço no CAPS Grão Pará
De 01 à 04 anos e 11 meses
De 05 à 08 anos e 11 meses
Igual ou maior que 09 anos
11
13
04
39%
47%
14%
(conclusão)
5.4 PRIMEIROS PASSOS NO CAMPO DE PESQUISA
Para a coleta de dados os sujeitos da pesquisa foram convidados a
participar mediante contato direto e presencial. O CAPS Grão Pará funciona em três
turnos então pela prévia aproximação da pesquisadora com o campo da pesquisa
ainda na fase do estágio obrigatório da residência, alguns meses antes da pesquisa
iniciar, a conversa com os profissionais dos turnos da manhã e da tarde foram
otimizadas e as entrevistas marcadas pessoalmente com cada um.
No entanto com o turno da noite como não havia aproximação prévia da
pesquisadora foi necessário um primeiro contato com os agentes administrativos dos
turnos na manhã e da tarde para além de listar os contatos dos sujeitos
selecionados verificar suas disponibilidades para a entrevista de acordo com seus
dias de trabalho no CAPS já que estes obedecem à uma escala que compreende
12h de trabalho, 12h de descanso e 12h de folga. Com estes as entrevistas foram
marcadas via telefone.
43
Os participantes foram informados que a coleta de dados seria realizada
através de entrevistas, que poderiam ser agendada ou não, de acordo com a
conveniência dos sujeitos. Ela ocorreu no próprio CAPS III Grão Pará em dia e hora
marcados pelo participante. Após o aceite, as entrevistas foram marcadas e os
entrevistados foram apresentados ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) – ver apêndices A e B.
De acordo com Turato (2003) a entrevista
[...] é um instrumento precioso de conhecimento interpessoal, facilitando, no
encontro face a face, a apreensão de uma série de fenômenos, de
elementos de identificação e construção do potencial do todo da pessoa do
entrevistado e, de certo modo, também do entrevistador (p. 308)
A entrevista foi do tipo semi-estruturada ou semidirigida, com o apoio de
um roteiro contendo dados de identificação e questões referentes ao tema em
estudo – ver Apêndices C e D. O uso deste tipo de entrevista
[...] dá-se então pelo motivo de que ambos os integrantes da relação têm
momentos para dar alguma direção, representando ganho para reunir os
dados segundo os objetivos propostos (TURATO, 2003, p. 313).
Também foi necessária para a coleta de dados a gravação das
entrevistas, devidamente autorizadas pelos participantes. Quanto aos dados
quantitativos que surgiram na entrevista estes foram analisados segundo a
estatística simples (percentual) e apresentados em gráficos e ou/tabelas.
A análise dos dados qualitativos das entrevistas foi feita a partir de eixos
teóricos que deram suporte ao estudo e que foram identificados, tratados e
organizados de acordo com a semelhança dos dados empíricos que surgiram nas
entrevistas sobre as questões do roteiro previamente organizado.
O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) da Fundação Estadual Pública Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHGCV)
e a pesquisa somente foi realizada após aprovação do mesmo pelo CEP.
Foi garantido o anonimato dos sujeitos e o sigilo dos dados pessoais
confidenciais ou que de alguma forma pudessem provocar constrangimentos ou
prejuízos pessoais, inclusive quando da divulgação dos resultados, embora por
44
conta da posição ocupada (cargo) pelos sujeitos “Gestão” o anonimato total de suas
declarações não pôde ser garantido. Importante dizer que todos os participantes,
sem exceção, foram informados via TCLE (Termo de Consentimento Livre e
esclarecido) e antes de iniciarem suas entrevistas que suas participações eram
voluntárias e que a qualquer tempo poderiam desistir de sua participação na
pesquisa.
Os dados obtidos serão utilizados somente para este estudo, sendo os
mesmos armazenados pela pesquisadora principal durante cinco (5) anos e após
totalmente destruídos (conforme preconiza a Resolução 466/12).
6 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
Neste capítulo apresentaremos a análise qualitativa das entrevistas
realizadas com os técnicos e a coordenação do CAPS GRÃO PARÁ, bem como as
entrevistas realizadas com as coordenações de saúde mental do estado do Pará e
do município de Belém, a partir de seis eixos temáticos e da metodologia citada. A
seguir, os eixos temáticos foram organizados e analisados na seguinte ordem: Eixo
1 – Papel do CAPS da Rede de Atenção Psicossocial; Eixo 2 – Importância do Apoio
Matricial pelo CAPS na Rede de Atenção Psicossocial; Eixo 3 – Processo de
implantação da proposta do Apoio Matricial; Eixo 4 – Processo de trabalho CAPS –
atenção básica; Eixo 5 - Capacitação profissional para atuação no Apoio Matricial e
Eixo 6 – Importância das práticas em saúde mental na atenção básica.
Cada eixo será apresentado de forma que o leitor possa identificar o
referencial teórico utilizado, sempre em relação às entrevistas realizadas através de
trechos das transcrições que corroboram ou não com o referencial. Por questões
éticas os nomes dos entrevistados foram substituídos por letras e, por questões
didáticas, os entrevistados foram divididos de acordo com o turno que trabalham,
onde cada grupo recebeu uma letra diferente e um número de acordo com a
quantidade de entrevistados, ficando assim organizados:
Quadro 4 – Identificação dos sujeitos e quantidade de sujeitos de acordo com o turno e gestão
(continua)
PARTICIPANTES IDENTIFICAÇÃO NÚMERO DE TÉCNICOS
Turno da manhã M 12
45
Turno da tarde T 10
Turno da noite N 06
Gestoras G 03
(conclusão)
Alguns trechos foram transcritos integralmente, outros não foram por uma
preocupação de que pudesse tornar a leitura cansativa ao leitor, então optou-se para
nestas fazer um recorte sem que possa ter acarretado algum prejuízo na
compreensão do leitor e também ao contexto em que foi dito e consequentemente,
ao entrevistado.
6.1 EIXO TEMÁTICO: PAPEL DO CAPS DA REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL
Neste eixo discuti sobre o lugar do CAPS GRÃO PARÁ como o único
CAPS do tipo III (não AD) e as implicações deste lugar aos trabalhadores e
coordenação do CAPS e o conhecimento sobre as legislações que embasam o
funcionamento do CAPS, principalmente sobre o que tange ao Apoio Matricial, e
para a gestão municipal e estadual a discussão será sobre o papel do CAPS (sem
subtipo) de uma forma geral e as legislações.
Para os momentos iniciais da pesquisa havia a necessidade por parte da
pesquisadora em verificar o que os entrevistados conheciam sobre a política em
saúde mental no que tange ao papel do CAPS como apoio em saúde mental na
atenção básica.
Quando perguntada sobre se tinha conhecimento sobre alguma diretriz do
Ministério da Saúde que orienta a ação do CAPS como dispositivo de apoio à
atenção básica, tivemos a seguinte reposta da Coordenação Estadual de Saúde
Mental, Álcool e outras Drogas do Pará, há 01 ano e 06 meses neste cargo (na
época da entrevista):
Bom na verdade essa é uma das funções, vamos dizer assim, “né”? Do
CAPS, os CAPS eles tem um papel no território, que é um papel dentro de
um componente mais especializado mais estratégico mas que é... Em
dentro desse todo implica a possibilidade dele trabalhar no território com
outros dispositivos de atenção de forma articulada e no caso da atenção
básica, pela atenção básica não se caracterizar evidentemente por um
dispositivo com tantas especificidades quanto o próprio CAPS, por exemplo,
não há psiquiatras, não há psicólogos, sempre nesses dispositivos... O
46
papel dele é fundamental no uso... com uso dessa... dessa ferramenta,
dessa estratégia de trabalho, “né”? No acompanhamento de alguns casos,
“né”, no acompanhamento da equipe na possibilidade de discutir e
acompanhar, monitorar, de certa forma, vamos chamar assim, trazer mais
pra perto. Esse é um casamento que se busca na rede mas que ainda não é
uma realidade. (G2, Coordenação Estadual de Saúde Mental, Álcool e
outras Drogas do Pará, Gestor, 2014).
Nesta fala podemos observar que enquanto gestão existe um
entendimento da Política Nacional de Saúde Mental de uma forma atualizada, na
qual se pensa o CAPS como um dispositivos de referência em saúde mental
especializado dentro de um determinado território e que não atua sozinho, que deve
estar articulado com os demais pontos de atenção da rede psicossocial,
principalmente no que diz respeito à cogestão de casos mas que no entanto não
vem acontecendo no Estado e no município de Belém.
Na fala dos técnicos dos CAPS foi possível identificar que em sua maioria
conhecem a Política de Saúde Mental e alguns disseram que conhecem sobre o
Matriciamento, dando ênfase justamente na cogestão, como podemos ver nesta fala:
Sim, conheço através das leis, portarias que a gente lê, estuda que
determina que as unidades básicas de saúde que tenham programas de
saúde mental e que o CAPS também seja uma retaguarda para essas
unidades, eu acredito até, faço uma análise que seja uma retaguarda pros
dois lados, tantos para as unidades com o CAPS, como pro CAPS com as
unidades porque quando eles precisam dentro do programa de uma
consulta especializada eles são enviados pro CAPS pra realizar essa
consulta dentro do CAPS e se aquele paciente que não está evoluindo
dentro do Programa de Saúde Mental eles também encaminham pro CAPS
pra ter um direcionamento, um procedimento mais intensivo, aí eu digo que
todos os dois, que um serve de retaguarda pro outro, porque no momento
que aquele paciente/usuário está bem, está estabilizado ele deve ser
encaminhado pra dar continuidade a esse acompanhamento aí nós
encaminhamos pra unidade, eu vejo assim, unidade e CAPS deveriam
trabalhar juntos em parceria pelo mesmo objetivo, deveriam estar bem
sintonizados. (T6, Técnico do CAPS Grão Pará, 2014).
Estas falas corroboram com o que que diz o Art. 3º da Portaria 3.088/11
sobre o papel da Rede de Atenção Psicossocial: “III - garantir a articulação e
integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o
cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às
urgências” (Brasil, 2011), o que nos leva a afirmar que os gestores e parte dos
técnicos do CAPS Grão Pará tem conhecimento da atual legislação em Saúde
Mental, e analisam criticamente a atual situação da Rede de Atenção Psicossocial
47
no município de Belém onde o que vemos é ainda pontos de atenção trabalhando de
forma isolada uns dos outros.
Entendemos que conhecer sobre a política de saúde mental, suas
legislações e afins deve ser de suma importância para quem trabalha em saúde
mental posto que não é possível entender a dinâmica de seu funcionamento, desde
as primeiras legislações que deram início a reforma psiquiátrica até as atuais
legislações que não só retificam a proposta da reforma mas ampliam seu objetivo
para uma assistência em saúde mental integrada, articulada e diversa em cada um
dos níveis de atenção, dando ênfase à atenção básica e reforçando a atenção aos
grupos vulneráveis (índios, jovens, moradores de rua), e sem isto a saúde mental
continuará sob pena de ser resumida – e muito criticada – como uma política para
acabar com os hospitais psiquiátricos. Trabalhar em saúde mental de maneira alheia
à Política é estar fadado a mecanizar suas ações e corre-se o risco alto de velar
atitudes manicomiais.
No que diz respeito ao papel do CAPS na Rede de Atenção Psicossocial,
ficou claro que as gestoras vêem este papel de maneira distinta. Para a gestora
municipal, há 04 meses neste cargo (na época da entrevista), o CAPS tem o papel
da reinserção social das pessoas com transtorno mental mas entende que esta
visão de CAPS implica em admitir que algum ponto da rede falhou, como podemos
ver neste trecho da entrevista:
[...] Para que eles retornem ao convívio da sociedade, retornem ao convívio
do trabalho, “né”? E até essa palavra “Retornar” pra gente é complicado,
“né”? Enquanto política, enquanto a gente gestora, porque parece assim
que eu deixei, “né”? Que ele saísse desse contexto, então eu não trabalhei
em atenção básica, “né”? Então realmente ele saiu, “né”? Então ele vai ter
que retornar. Então a gente vive realmente trabalhando nisso, de uma
perspectiva de uma reinserção de um retorno às habilidades dele, “né”?
Habilidades da vida diária, no que diz trabalho, no que diz cuidado com o
próprio corpo, no que diz respeito, esse é o tratamento (G1, Referência
Técnica em Saúde Mental do município de Belém, Gestor, 2014).
Já a gestora estadual enfatiza que o CAPS ainda é visto como o ponto
central dentro da rede pois ele é o serviço substitutivo ao hospital psiquiátrico dentro
da rede, foi para este propósito que foi criado e a política de saúde mental durante
muito tempo reforçou este status do CAPS como de fato o centro da rede, muito
mais que um serviço especializado. Para esta gestora o CAPS continua sendo o
48
serviço centro mas suas funções foram ampliadas e hoje é preciso reconhecer que
ele não funciona como fosse um serviço autônomo e alheio:
[...] ele se pretende um substitutivo, evidentemente que durante muito
tempo o foco somente nos CAPS foi muito grande a própria política de certa
forma conduziu, “né”, a uma prática muito centrada dentro dos CAPS, “né”,
ou para os CAPS, na criação de CAPS, na ampliação do número de CAPS
no país inteiro e realmente foi espantoso o crescimento, na medida que os
Hospitais Psiquiátricos iam fechando esperava-se que essa rede
substitutiva se formasse e o CAPS era então o grande foco, o grande apoio,
“né”, dessa rede toda, digamos, o grande peso do cuidado, “né”, de
importância dessa rede de cuidado. De certa forma ainda está centrada nos
CAPS, eu acho que o CAPS ainda é o grande é o grande foco, ainda é o
ponto estratégico da rede como um todo da RAPS, “né”? Da Rede de
Atenção Psicossocial. Então acho que ele tem essa função de ser o
ordenador desse cuidado na saúde mental, “né”? A função básica dele é
essa, por mais que o paciente ele esteja internado por uma questão de
agudização “num” momento que ele precise de um outro dispositivo,
espécie, da espécie hospitalar, do tipo hospitalar, do componente hospitalar,
ele vai precisar do leito pra ficar alguns dias internado, mas ainda assim o
grande cuidador é o CAPS, “né”? Então é o grande ordenador, o CAPS tem
que saber que a pessoa está lá, mesmo quando a pessoa não está em
cuidado no CAPS mesmo quando ela abandonou, mesmo quando ela ainda
nem chegou no CAPS mas no momento da crise o CAPS é uma porta
aberta. Não é o hospital que é a porta aberta é o CAPS que e a porta
aberta, “né”? Claro o hospital também é, mas é inclusive a gente vê muito
bem isso no desenho hoje dos componentes o CAPS aparece como um dos
pontos de urgência e emergência, do componente urgência emergência,
então ele tem uma função que foge do dos moldes hospitalares, do modelo
hospitalocêntrico, e também do modelo atual do hospital das “batas
brancas” e etc... Mas ele tem uma função muito parecida no recebimento no
acolhimento dessa crise. O que ainda não é tão claro para todos os
trabalhadores, “né”? Os trabalhadores ainda tem uma dificuldade muito
grande em aceitar isso e ainda existe uma tendência a ver no CAPS um
processo mais de ambulatório do que propriamente de... de um ponto de
atenção que receba crise, “né”? (G2, Coordenação Estadual de Saúde
Mental, Álcool e outras Drogas do Pará, Gestor, 2014).
Dois pontos importantes chamaram atenção na fala desta gestora e que
consideramos importante discutir neste eixo. O primeiro diz respeito à ampliação de
serviços CAPS no Brasil como um todo, e segundo Mota (2012) à nível de estado do
Pará temos dados que demonstram que o período por exemplo, que compreende o
ano de 2007 à 2010 e cujo um do objetivos da gestão era a “implantação e
ampliação da rede de atenção à saúde mental do estado do Pará,” houve um
aumento significativo no número de CAPS no estado, precisamente um salto de 23
para 56 CAPS implantados, sendo 37 cadastrados pelo Ministério da Saúde (MS),
totalizando 56% de cobertura e passando da avaliação de péssimo para regular nos
parâmetros do MS.
49
Importante destacar que foi também neste período que o CAPS Grão
Pará foi reclassificado para tipo III, e ainda segundo Mota (2012) neste período o
referido CAPS como único com o processo de transição de tipologia mais adiantado
já atendia à crise e dava suporte ao Hospital de Clínicas.
Este é um dado que chamou atenção da pesquisadora nas entrevistas
realizadas pois os técnicos do CAPS Grão Pará confirmaram que este suporte ao
Hospital de Clínicas era realizado sim. Aqui cabe uma análise à respeito desta
“função” do CAPS Grão Pará com leitos de observação e funcionamento 24h pois o
que vemos aqui é uma inversão do que recomendava a política de saúde mental,
tomando como base não só a Lei da Reforma Psiquiátrica (nº 10.216/01, art. 4º) na
qual o hospital é quem deve funcionar como retaguarda para os serviços
substitutivos, no caso em que os serviços extra-hospitalares se mostrarem
insuficientes (BRASIL, 2005), e também a Portaria nº 224/92 que era a atual neste
período de 2007 à 2010 que recomenda: “Em caso de necessidade de continuidade
da internação [após a alta], deve-se considerar os seguintes recursos assistenciais:
hospital-dia, hospital geral e hospital especializado” (BRASIL, 2005, p. 248, [ ]
nosso).
Isto posto, é importante dizer que este suporte ao Hospital de Clínicas
não era consenso entre os trabalhadores do CAPS Grão Pará, já que para a sua
maioria receber pacientes para dar continuidade à internação no CAPS, e até
mesmo receber pacientes fora da sua área de abrangência, significava “um leito à
menos” para os usuários da sua área de abrangência, como podemos ver neste
trecho da entrevista com uma trabalhadora
[...] Então o CAPS antes mesmo de ser III já era referência de um bom
CAPS, que realizava um bom trabalho e por ser o único CAPS III agora o
Grão Pará que tem leito de observação continua mais referência ainda,
porque, por exemplo, quando... Até nisso também tem uma discussão,
quando iniciou o CAPS III que tinha o leito de observação os pacientes que
estavam em situações de quadro mais estável, já estava prontos pra sair da
internação do HC, na gestão passada já tinha sido firmado que eles
poderiam ser acompanhados pelo CAPS, pelo nosso CAPS mesmo não
sendo da área de abrangência porque esse CAPS como era o III seria pra
dar apoio aos outros CAPS que ainda não tinham se transformado em III,
mas foi um acordo que foi feito, não ficou nada estabelecido em portaria em
nada. [E esse acordo ainda existe? - pergunto] Não, não existe porque o
que aconteceu: os próprios funcionários não aceitaram mais, a própria
gestão entendeu que não dava mais pra aceitar porque os leitos daqui
estavam ficando cheios e o que que estava acontecendo era isso, e os
pacientes da casa, nosso usuários quando precisavam não conseguiam
uma vaga e nem acelerava e nem forçava os outros CAPS se
transformarem em III aí aconteceu muitas vezes de os pacientes precisarem
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e nós estarmos com pacientes de outra área de outra, de outro CAPS [do
HC? - pergunto] não, não era do HC, as vezes de outros CAPS e dizer não
pros nosso, aí começou a ter uma nova discussão, aí mudou a gestão aí o
entendimento é: que cada CAPS se transforme em III e consiga mesmo
acompanhar a sua demanda (T6, Técnica do CAPS Grão Pará,
Trabalhadora, 2014).
Aproveitando esta fala de T6, podemos discutir alguns pontos dentro do
que a pesquisadora pretendia saber sobre o papel deste CAPS. Houve respostas
diversas sobre isto, as quais podemos elencar: um primeiro ponto é que o CAPS
Grão Pará na Rede de Atenção Psicossocial continua sendo retaguarda para o
Hospital de Clínicas, como vemos nesta fala: “É como dá um apoio pro Hospital das
Clínicas, ao meu ver entendo que seria isso” (N1, Técnica do CAPS Grão Pará,
Trabalhadora, 2014).
Ou ainda, neste trecho de entrevista:
O nosso papel aqui é de funcionar 24h, dar apoio ao HC, quando o paciente
vai precisar de urgência e emergência vem pra cá e a gente dá o suporte
pra eles. [Como assim? - pergunto] Ele vem medicado né, já com todas as
medicações conferida pelo psiquiatra de lá e aí ele vem pra cá já medicado,
ele não vem em crise, geralmente ele vai pro HC em crise, aí o nosso papel
aqui antes era por bairro né, hoje não, não tem mais isso, então o nosso
apoio também pro município de Belém e funcionar como um gerenciador...
(T1, Técnica do CAPS Grão Pará, Trabalhadora, 2014).
E na fala da coordenadora do CAPS Grão Pará, há 03 anos neste cargo
(na época da entrevista)
É um órgão do estado mas que ele dá apoio ao município tendo como
suporte o atendimento à pacientes em crise branda, “né”? Em crise... E
suporte ao HC e os pacientes de alta, mas que precisam ainda ter um
acompanhamento, mais de perto no caso, vamos dizer assim, de um
acompanhamento de observação e repouso, e aí os pacientes são
recebidos aqui [...] (G3, Coordenadora do CAPS Grão Pará, Gestora, 2014).
Poderíamos provocar novamente a discussão sobre quem presta
retaguarda a quem, mas basta dizer que a atual legislação em saúde mental, a
Portaria 3.088/11 orienta o CAPS a ser retaguarda de um serviço de saúde mental,
se necessário, sem discriminar qual, abrindo precedente para este fazer do CAPS
Grão Pará um serviço de retaguarda também para o HC, como diz no Inciso 4º
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Os meus, os seus... e os nossos análise sobre o papel de um caps no apoio matricial à atenção básica no município de belém-pa

  • 1. 1 Cinthia de Castro Santos Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no município de Belém-PA Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito para obtenção do título de especialista em Saúde Mental, Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. Área de Concentração: Atenção à Saúde Mental Orientador: Prof. Ms. Josie Pereira da Mota Belém 2014
  • 2. 2 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação(CIP) Universidade do Estado do Pará Fundação Pública Hospital de Clínicas Gaspar Vianna __________________________________________________________________________________ S231o Santos, Cinthia de Castro Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no município de Belém-PA / Cinthia de Castro Santos; Orientador: Ms. Josie Pereira da Mota – 2014 113 f.: il. Trabalho de Conclusão de Curso (especialização em saúde mental) – Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna, Belém, 2014. 1. Saúde Mental. 2. Atenção Básica. 3. Centro de Atenção Psicossocial. 4. Apoio Matricial – metodologia. I. Mota, Josie Pereira da, orient. II. Universidade Federal do Pará. III. Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. IV. Título. CDD. 22° ed.: 616.8 __________________________________________________________________________________
  • 3. 3 Cinthia de Castro Santos Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no município de Belém-PA Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito para obtenção do título de especialista em Saúde Mental, Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. Data de aprovação: 03 / 02 / 2014 Banca Examinadora: _________________________________ - Orientador Msc. Josie Pereira da Mota Secretaria de Estado de Saúde Pública – SESPA e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna - FHCGV _________________________________ - Membro titular Msc. Ingrid Bergma da Silva Oliveira Universidade do Estado do Pará - UEPA e Universidade da Amazônia - UNAMA _________________________________ - Membro titular Msc. Larissa Gonçalves Medeiros Universidade da Amazônia - UNAMA _________________________________ - Membro Suplente Msc. Márcia Roberta de Oliveira Rodrigues Secretaria de Estado de Saúde Pública - SESPA
  • 4. 4 À Joana (nossa Bá), pelo que sempre representará para quem acredita em uma Reforma Psiquiátrica possível. Com amor e saudade.
  • 5. 5 AGRADECIMENTOS Aos meus pais, por compreenderem minha ausência e ainda assim orgulharem-se dela. Ao Antonio, pela paciência, compreensão, incentivo, pelas vezes em que foi meus olhos, braços, pernas e consciência, pelo otimismo, pelo amor para todo o sempre... À Josie, pelo incentivo, pela troca, pela vontade, pela disposição e pela coragem em abraçar comigo a causa deste trabalho. À Ana Gracinda Ignácio Silva e à Maria Auxiliadora Pereira, pelas contribuições valiosíssimas quando da qualificação do projeto deste trabalho. Ao Ministério da Saúde e ao Ministério da Educação pelo incentivo e oportunidade à Educação Permanente. Ao Departamento de Educação em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará, à Coordenação do CAPS Grão Pará e à Gerência de Ensino e Pesquisa da Hospital de Clínicas Gaspar Vianna por permitirem a realização desta pesquisa. A todos os participantes desta pesquisa, pelo reconhecimento do valor da pesquisa à ciência e à sociedade.
  • 6. 6 “Se você tem uma laranja e troca com outra pessoa que também tem uma laranja, cada um fica com uma laranja. Mas se você tem uma ideia e troca com outra pessoa que também tem uma ideia, cada um fica com duas”. Confúcio
  • 7. 7 RESUMO SANTOS, Cinthia de Castro. Os meus, os seus... e os nossos? Análise sobre o papel de um Centro de Atenção Psicossocial no Apoio Matricial à atenção básica no município de Belém-PA. 2014. 113f. Trabalho de Conclusão de Curso (Residência Multiprofissional em Atenção à Saúde Mental) – Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. Belém, Pará, 2014. Estudo sobre Saúde Mental e Atenção Básica no qual analisou-se o papel de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) no município de Belém-PA em sua relação com a atenção básica, através do Apoio Matricial. Percorremos brevemente a história da Reforma Psiquiátrica até a atual Política de Saúde Mental, a Política Nacional de Atenção Básica em busca do que concerne à trasnversalização dos dois temas. A atenção básica foi incluída no campo das ações em saúde mental no ano de 2006, bem como o Apoio Matricial como a via de acesso da saúde mental nos serviços da atenção básica, através das Equipes de Apoio Matricial às Equipes de referência. O Apoio Matricial é uma metodologia de trabalho criada por Gestão Wagner de Souza Campos através do Método Paidéia que visava um novo sistema de referência entre profissionais e usuários que promovesse e estimulasse maiores coeficientes de vínculo entre estes. Assim, o Apoio Matricial ou Matriciamento é definido como um novo jeito de produzir saúde onde duas ou mais equipes criam propostas de intervenção pedagógico-terapêutica, estabelecendo uma cogestão no compartilhamento do cuidado. A partir da inclusão da atenção básica como ponto de gestão dos casos de saúde mental dentro da Rede de Atenção Psicossocial juntamente com o CAPS, através da Portaria nº 3.088/11 (RAPS), analisamos a articulação entre estes dois pontos desta rede. O CAPS escolhido para esta pesquisa era do tipo III (CAPS Grão Pará) e participaram desta pesquisa as coordenações estadual e municipal de Saúde Mental, a coordenação do CAPS Grão Pará e a equipe técnica deste. Investigar a situação atual do Apoio Matricial na saúde mental no estado do Pará e município de Belém, verificar quais as práticas e ações que estavam relacionadas ao Apoio Matricial que foram indicadas pelos sujeitos da pesquisa e identificar os desafios e as resoluções que estes profissionais apontaram para o diálogo com a atenção básica e portanto o Apoio Matricial em saúde mental norteou a consecução desta pesquisa. Os resultados desta evidenciaram algumas questões que justificam a falha na rede de amparo à saúde mental, dimensionaram a necessidade da ampliação da discussão sobre as relações entre os serviços da RAPS e indicaram razões pelas quais é importante se utilizar o Apoio Matricial como uma via de estabelecimento de comunicação e diminuição da distância entre eles para fins também de promoção à saúde mental. Palavras-chave: Saúde Mental. Atenção Básica. CAPS. Centro de Atenção Psicossocial. Apoio Matricial
  • 8. 8 ABSTRACT SANTOS, Cinthia de Castro. Mine, yours... and ours? Analysis on the role of a Psychosocial Care Center in Matrix Support to primary care in the city of Belém-PA. 2014. 113f. Trabalho de Conclusão de Curso (Residência Multiprofissional em Atenção à Saúde Mental) – Universidade do Estado do Pará e Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna. Belém, Pará, 2014. Study on Mental Health and Primary Care in which we analyzed the role of a Psychosocial Care Center (CAPS) in the city of Belém-PA in their relation to primary care, by Matrix Support. Briefly go through the history of the Reformation to the current Psychiatric Mental Health Policy, the National Primary Care Policy in relation to the search mainstreaming of the two themes. Primary care was included in the field of mental health actions in 2006 as well as the Support Matrix as the access of mental health into primary care services through the Matrix Teams Support Crew reference. The Matrix Support is a methodology created by Gastão Wagner de Souza Campos through the “Paidéia” method aimed at a new referral system between professionals and users who promote and stimulate greater bond between these coefficients. Thus, Matrix Support or matricial is defined as a new way to produce health where two or more teams create proposals for pedagogical- therapeutic intervention, establishing a co-management in the sharing of care. From the inclusion of primary care as a point of case management of mental health within the network of psychosocial care along with CAPS, through Decree No. 3.088/11 (RAPS), we analyzed the relationship between these two points of the network. The CAPS chosen for this research was the type III (CAPS “Grão Pará”) and participated in this research state and local coordination of Mental Health, the coordination of CAPS Grantham and technique of this team. To investigate the current situation Matrix Support in mental health in the state of Pará in Belém and checking which practices and actions that were related to Matrix Support that were indicated by the research subjects and identify the challenges and resolutions that these professionals pointed to the dialogue with primary care and therefore the Matrix Support mental health guided the achievement of this research. The results of this highlighted some issues that justify the failure of the mental health support network, dimensioned the need to expand the discussion on the relationship between services RAPS and indicate reasons why it is important to use the Matrix Support as a means of establishing communication and decreasing the distance between them for the purpose also to promote mental health. Keywords: Mental Health. Primary Care. CAPS. Psychosocial Care Center Matrix Support
  • 9. 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................13 1 2 2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E A CRIAÇÃO DOS CAPS: Estratégias de reorganização do cuidado em saúde mental .............21 3 A ATENÇÃO BÁSICA E O APOIO MATRICIAL: um desafio............................27 4 APOIO MATRICIAL EM SAÚDE MENTAL: diálogo necessário.......................30 5 CAMINHOS METODOLÓGICOS.........................................................................35 5.1 Tipo de estudo...................................................................................................36 5.2 O campo de pesquisa.........................................................................................37 5.3 Os sujeitos sociais..............................................................................................38 5.4 Primeiros passos no campo de pesquisa.........................................................42 6 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS............................................................................44 6.1 Eixo temático: papel do CAPS da Rede de Atenção Psicossocial.................45 6.2 Eixo temático: importância do Apoio Matricial pelo CAPS na Rede de Atenção Psicossocial .........................................................................................55 6.3 Eixo temático: processo de implantação da proposta do Apoio Matricial....63 6.4 Eixo temático: processo de trabalho CAPS – Atenção Básica.......................78 6.5 Eixo temático: capacitação profissional para atuação no Apoio Matricial....................................................................................................................84 6.6 Eixo temático: importância das práticas em saúde mental na atenção básica........................................................................................................................90 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................95 REFERÊNCIAS..................................................................................................100 APÊNDICES.........................................................................................................104 ANEXOS.............................................................................................................110
  • 10. 10 LISTA DE ILUSTRAÇÕES DESENHO 1 Rede de Atenção Psicossocial na qual o CAPS é o organizador e porta de entrada 26 DESENHO 2 Cobertura por município dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) ao final de 2022 e ao final de 2011 (parâmetro de 1 CAPS para cada 1000.000 habitantes) 27 DESENHO 3 Rede de Atenção Psicossocial na qual existe um compartilhamento de cuidados entre os serviços. Em amarelo estão os Programas Saúde da Família (PSF) 33 GRÁFICO 1 Percentual de respostas por opção para a pergunta: “Foram criados equipes ou grupos neste CAPS para que essas ações na atenção básica fossem realizadas? 69 GRÁFICO 2 Percentual de respostas por opção para a pergunta “Você considera que os técnicos e a gestão deste CAPS estão preparados para realizar ações de saúde mental junto à atenção básica? Por quê? 76 GRÁFICO 3 Percentual de respostas por opção para a pergunta “Foi realizada alguma oficina, curso etc. no intuito de instrumentalizar o CAPS na operacionalização do apoio deste à atenção básica? Como foi? 88
  • 11. 11 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa 40 QUADRO 2 Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa após critérios 41 QUADRO 3 Perfil dos sujeitos que participaram para pesquisa 41 QUADRO 4 Identificação dos sujeitos e quantidade de sujeitos de acordo com o turno e gestão 44
  • 12. 12 LISTA DE SIGLAS APS Atenção Primária à Saúde CAPS Centro de Atenção Psicossocial CEP Comitê De Ética Em Pesquisa CESEM Centro De Saúde Escola Do Marco CNS Conferência Nacional de Saúde CNSM Conferência Nacional De Saúde Mental CNTSM Congresso Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental DINSAM Divisão Nacional de Saúde Mental ESF Estratégia Saúde Da Família FHCGV Fundação Hospital De Clínicas Gaspar Vianna MNLA Movimento Nacional de Luta Antimanicomial MTMS Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental NAPS Núcleo de Atenção Psicossocial NASF Núcleo De Apoio À Saúde Da Família OMS Organização Mundial De Saúde PNAB Política Nacional De Atenção Básica PNH Política Nacional de Humanização PSF Programa Saúde da Família RAPS Rede de Atenção Psicossocial SUS Sistema Único De Saúde TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido UBS Unidade Básica De Saúde UEPA Universidade Do Estado Do Pará
  • 13. 13 INTRODUÇÃO Esta pesquisa pretendeu discutir a função e a ação do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) no Apoio Matricial à atenção básica através da metodologia de trabalho do Apoio Matricial. A escolha do objeto de pesquisa partiu de uma inquietação pessoal acerca da situação em que se encontra atualmente o município de Belém no que diz respeito à atenção à saúde mental tanto dos usuários dos programas de saúde mental das unidades de saúde quanto da atenção à política de promoção e prevenção em saúde mental. Enquanto residentes em atenção à saúde mental, da Universidade do Estado do Para (UEPA) em parceria com o Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV), observamos nos campos de estágios o que os técnicos que trabalham nestes serviços comentam a respeito da falta de articulação entre os serviços da Rede de Atenção Psicossocial. Porém, ao mesmo passo pouco se discute a saúde mental na atenção básica, uma área tão estratégica quanto os outros pontos da rede de saúde mental, segundo a proposta da atual Política Nacional de Saúde Mental. Além disto, era bastante comum a prática de encaminhamentos, referência e contra referencias entre os serviços, porém feitos de modo muitas vezes equivocada ou sem a real necessidade. Na Clínica psiquiátrica do FHCGV, no setor de Emergência – única no Estado, observamos que muitos casos de procura deste serviço poderiam ter sido acolhidos em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), através, por exemplo, da equipe técnica da Estratégia Saúde da Família (ESF) ou mesmo no CAPS nos casos em que existem no município, pois nos relatos do familiar que trazia o usuário era possível identificar que o mesmo havia dado indícios, ainda que pequenos, de que algo não estava bem, sendo ignorado e tendo como consequência a crise que desencadeou seus sintomas mais graves e portanto a internação. No CAPS a fala da equipe técnica eram a de que os usuários em pré-alta se mostravam resistentes a esta quando eram informados que deveriam continuar seus tratamentos nas UBS. A razão disto, segundo os usuários é o receio da “desassistência” ao tratamento por parte da equipe técnica da UBS, já que segundo
  • 14. 14 esses usuários não existem psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais e outros profissionais que fazem parte da equipe técnica do CAPS. Na UBS (a saber Centro de Saúde Escola do Marco – CESEM) os usuários do programa de saúde mental em sua maioria estavam há anos sem ao menos uma reavaliação, fazendo uso do mesmo medicamento desde sua alta de internação ou entrada neste serviço de saúde. E ainda haviam pessoas que procuravam a unidade em busca de esclarecimento de sintomas de transtornos mais graves e crônicos, como a esquizofrenia e não raramente, para tratamento de sintomas de pânico, ansiedade, depressão, ou em como “suportar” o seu sofrimento após um evento traumático ou adoecedor – assaltos, perdas, etc. O procedimento de atenção neste serviço, na grande maioria dos casos, era: ou manter a situação como estava – no caso dos já usuários do programa de saúde mental, ou encaminhar para avaliação ou atendimento no CAPS de abrangência da moradia do usuário. A justificativa para isto sempre estava na ordem de “um não saber como proceder naquele caso” ou de que todas as ações relacionadas à saúde mental eram de responsabilidade dos CAPS. Em todos esses casos entendemos que a falta de articulação entre os serviços da rede de saúde mental não justificaria sozinho o não funcionamento pleno da Política atual de Saúde Mental. Seria necessário então um melhor entendimento pelas equipes técnicas dos serviços de saúde de uma forma geral sobre a condução de casos em Saúde Mental desde um acompanhamento de alta e manutenção do tratamento, até mesmo na identificação e prevenção de sintomas e situações que levariam ao não adoecimento grave do usuário. Compreendemos que a inserção da atenção básica no campo de atenção à saúde mental ainda poder estar no nível do estranhamento, no entanto, o adoecimento mental está presente em qualquer nível de atenção à saúde. A Declaração de Alma-Ata de 1978 já enunciava que a saúde na atenção primária é fundamental em qualquer país, pois ela funciona como um “filtro entre a população geral e a atenção de saúde especializada”, e por isso ela desempenha um papel importante dentro da estruturação da rede de atenção à saúde mental (OMS, 2001, p. 58). Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2001) os casos de transtornos mentais na atenção primária de atenção são comuns, mas na maioria das vezes não são detectados. Os diagnósticos mais encontrados nesses pacientes
  • 15. 15 são a depressão, ansiedade e os transtornos decorrentes do uso e abuso de álcool e outras drogas que estão geralmente associados a algum tipo de transtorno físico, e muitas das vezes os profissionais da atenção básica percebem um comprometimento neste nível mas nem sempre reconhecem e é por isso que esses profissionais necessitam de treinamentos que podem ser feitos pelos profissionais especializados em saúde mental dos serviços da rede comunitária do local de abrangência. Assim, a proporção entre a qualidade e quantidade da necessidade e do uso dos serviços especializados em saúde mental dependem muito mais dos serviços que são prestados à nível de atenção primária. O manejo e tratamento de transtornos mentais no contexto da atenção primária é um passo fundamental que possibilita ao maior número possível de pessoas ter acesso mais fácil e mais rápido aos serviços - é preciso reconhecer que muitos já estão buscando assistência nesse nível. Isso não só proporciona uma atenção melhor como também reduz o desperdício resultante de exames supérfluos e de tratamentos impróprios ou não específicos (OMS, 2001, s/p) Após um ano da realização do encontro que deu origem ao relatório de 2001 da OMS, foi realizada a III Conferência em Saúde Mental que deliberou em relatório novas formas e estratégias de reestruturação da assistência em saúde mental no Brasil, que incluía a extinção gradual dos hospitais psiquiátricos e portanto a estruturação de uma rede de serviços articuladas entre si, de bases comunitárias e territoriais (BRASIL, 2005), juntamente com a promulgação da Lei 10.216/01, esta que deu início à Política Nacional de Saúde Mental assegurando os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, considerando um redirecionamento à assistência destas (BRASIL, 1990-2004). Foi a partir disto que se viu efetivamente acontecer a Reforma Psiquiátrica como uma política dentro dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), assim descrita no relatório e, portanto, com a possível articulação desta com a atenção básica, articulação essa na qual os CAPS [...] tornaram-se, então, a principal estratégia, na política nacional, de transformação do modelo e de garantia de direitos aos sujeitos em sofrimento psíquico. São espaços de ofertas de serviços que se diferenciam
  • 16. 16 das estruturas tradicionais e que se orientam pela ampliação do espaço de participação social do sujeito que sofre, pela democratização das ações, pela não segregação do adoecimento psíquico e pela valorização da subjetividade, como base das ações multiprofissionais (TAVARES; SOUSA, 2009, p. 254). Na concepção de Vasconcelos (2010) embora a principal proposta da Reforma Psiquiátrica fosse atingir emergencialmente a melhoria dos cuidados aos portadores de transtornos mentais mais graves e severos - e hoje é possível perceber grande avanço nesta proposta - estamos vivenciando outras questões emergenciais que se não olhadas contribuirão para a regressão dos avanços históricos. Estas questões que estão se configurando como emergenciais devem ser pensadas como novos desafios e portanto [...] há que se perguntar por outros grupos sociais e necessidades que também requerem atenção e que não constituíram alvo de nossas prioridades até agora, ou que nossa estratégia ainda não foi capaz de oferecer suporte suficiente ou adequado (VASCONCELO, 2010, p. 42). Neste contexto estão também pessoas que vivenciam ou vivenciaram um tipo de “Violência social - violência cotidiana principalmente nas grandes cidades, catástrofes – como deslizamento de terra e enchentes e transtornos psiquiátricos menores – ansiedades, fobias, pânico” (VASCONCELOS, 2010, p. 57-58). Considerando a necessidade de se ampliar o olhar à saúde na atenção básica, o Ministério da Saúde em parceria com o Departamento de Ações Programáticas Estratégicas/ Departamento de Atenção Básica, a Coordenação Geral de Saúde Mental e a Coordenação de Gestão da Atenção Básica publicou em 2003 documento no qual orienta que o CAPS não deve ser considerado única estratégia dentro da rede de serviços de saúde mental e por isto incluiu de forma definitiva as ações de Saúde Mental como estratégica dentro da Atenção Básica, e estas ações devem obedecer aos princípios da Reforma Psiquiátrica e do SUS (BRASIL, 2003). Dentre as diretrizes consideradas neste documento para a implantação da saúde mental na atenção básica está a “Organização das ações de saúde mental na atenção básica” e foi esta que incluiu o “Apoio Matricial da saúde mental às equipes da atenção básica” definido como “um arranjo organizacional que visa outorgar
  • 17. 17 suporte técnico em áreas específicas às equipes responsáveis pelo desenvolvimento de ações básicas de saúde para a população” (BRASIL, 2003, p.07). A principal contribuição do Apoio Matricial é que em se proporcionando a coresponsabilização dos casos se excluiria a “lógica dos encaminhamentos”, o que proporcionaria maior resolutividade destes casos pela equipe local (BRASIL, 2003). Em outras palavras, o Apoio Matricial é um compromisso de coresponsabilização entre duas equipes pelos casos em saúde de um determinado território. Segundo Campos e Domitti (2007) o Apoio Matricial ou Matriciamento em saúde tem como objetivo ser uma retaguarda especializada as equipes de saúde, dando apoio assistencial e técnico pedagógico a esta, não excluindo mas complementando o que ele chamou de “sistemas de hierarquização como a referência, contrareferência protocolos e centros de regulação” (2007, p.399-400). Assim, na área da Saúde Mental é o CAPS ou outro serviço especializado em Saúde Mental que assumirá o papel de Equipe de Apoio Matricial nos municípios onde ele estiver estruturado, porém, nos casos em que ele for insuficiente para garantir este apoio, poderá ser composta uma equipe em saúde mental e/ou deve-se pensar na expansão do número de CAPS neste município (BRASIL, 2003). [...] é fundamental investirmos imediatamente no debate e em experiências- piloto que mais tarde poderão constituir modelos mais consolidados para a expansão maciça destes serviços da rede de saúde mental (VASCONCELOS, 2010, p. 60) Mota (2012) em seu estudo sobre a atual situação da saúde mental no Estado do Pará aponta que segundo uma das Diretoras Executivas do Movimento Paraense da Luta Antimanicomial e trabalhadora da CASA AD de Belém (2012) Esse processo do CAPS de prestar Apoio Matricial não funciona aqui. Algumas unidades ainda atendem algumas demandas por iniciativas individuais de algumas pessoas. Por consequência da falta dessa relação com a rede de atenção básica e combinando com o fato de que nos CAPS há aqueles trabalhadores que não querem ter trabalho de lidar com os casos mais graves acabam por absorver essa demanda que deveria estar na atenção básica [...] (p. 148) Consideramos que esta fala regional corrobora com a ideia de Vasconcelos (2010) quando ele reflete que sem dúvida devemos expandir os
  • 18. 18 programas e estratégias de saúde mental na atenção básica como os serviços ambulatoriais (aqui um dos dispositivos que ela aponta como de grande valia são os ambulatórios), mas se consideramos isto por que não considerarmos também a proposta do Apoio Matricial? Foi este, portanto, o foco deste estudo. A Política Nacional de saúde mental em 2005 instituiu o CAPS como o serviço articulador da rede em saúde mental, assim ele deve assumir a responsabilização compartilhada dos cuidados em saúde mental junto à atenção básica e não ser o único serviço que presta atendimento nesta área. “[...] É função, portanto, e por excelência, dos CAPS organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios. Os CAPS são os articuladores estratégicos desta rede e da política de saúde mental num determinado território” (BRASIL, 2005, s/p). No entanto, em 2011 foi instituída a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), orientando que “[...] a ordenação do cuidado estará sob a responsabilidade do Centro de Atenção Psicossocial ou da Atenção Básica, garantindo permanente processo de cogestão e acompanhamento longitudinal do caso (BRASIL, 2011, s/p), ficando assim entendida a atenção básica com igual valor na articulação nesta rede, não podendo mais ser considerado o CAPS como o serviço “central”, mas ainda como estratégico. Posto isto, questionamos como o Matriciamento em saúde mental feito pelo CAPS poderia contribuir para a prevenção, promoção e recuperação da saúde dos usuários dos serviços da atenção básica. Esta problematização motivou a busca de respostas para as questões que justificaram o estudo sobre o Apoio Matricial e portanto, esta pesquisa, a saber: a) O que conheciam sobre o Apoio Matricial o Coordenador (a) e a equipe técnica do CAPS III Grão Pará, o Coordenador (a) Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará e a Referência Técnica em Saúde Mental do Município de Belém; b) Quais as práticas realizadas pelo CAPS na atenção básica apontadas por estes profissionais como ações do Apoio Matricial e; c) Quais desafios e soluções que estes profissionais apontariam sobre o diálogo entre o CAPS e atenção básica, e, portanto sobre o Apoio Matricial em saúde mental. Deste modo, pesquisar sobre o tema do “Matriciamento em Saúde Mental” foi necessário e importante porque entendemos que a Reforma Psiquiátrica
  • 19. 19 deve ser pensada para além da gradual extinção e substituição de práticas asilares pelas práticas comunitárias: ela deve nos levar a criar novas práticas do cuidado e novos direcionamentos para uma real cuidado da saúde mental, atendendo desde o primeiro nível de atenção à saúde. Como exemplo desta necessidade apresentamos dados obtidos no relatório da OMS apontando que “cerca de 450 milhões de pessoas sofrem transtornos mentais ou de comportamento, mas apenas uma minoria delas recebe mesmo o tratamento mais básico” (OMS, 2001 p.02) e dados divulgados pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2009) que apontam pelo menos 3% da população com transtornos mentais severos e persistentes e que necessitam de cuidados contínuos, e mais 9 a 12% (totalizando cerca de 12 a 15% da população geral do País, em todas as faixas etárias) apresentando transtornos mentais leves que precisam de cuidados eventuais. Também segundo este mesmo relatório é comum que pacientes que buscam atendimento na atenção primária apresentem algum tipo de transtorno mental ou do comportamento e “Quase 80% dos usuários encaminhados aos profissionais de saúde mental não trazem, a priori, uma demanda específica que justifique a necessidade de uma atenção especializada, portanto “É útil uma avaliação do grau e do padrão desses transtornos nesse contexto por causa do potencial para identificar pessoas com distúrbios e proporcionar a atenção necessária naquele nível” (OMS apud FIGUEIREDO; CAMPOS, 2009, p. 130) Segundo Boletim da Coordenação de Saúde Mental (BRASIL, 2003) as equipes de saúde na atenção básica frequentemente encontram em sua prática cotidiana algum sofrimento psíquico, o que demandaria alguma ação em saúde mental e por isso estas equipes que trabalham na atenção básica são consideradas essenciais dentro da rede de cuidados em saúde mental. Isso porque Existe um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e qualquer doença, às vezes atuando como entrave à adesão a práticas preventivas ou de vida mais saudáveis. Poderíamos dizer que todo problema de saúde é também – e sempre – mental, e que toda saúde mental é também – e sempre – produção de saúde. Nesse sentido, será sempre importante e necessária a articulação da saúde mental com a atenção básica (BRASIL, 2003, p. 07)
  • 20. 20 Nesta perspectiva justifico este estudo considerando que a diretriz do Apoio Matricial como uma das orientações para a implementação da Saúde Mental na atenção básica nos inclina a reconhecer que as novas práticas do cuidado deverão estar sempre em discussão para que se possa buscar o aproveitamento, o melhoramento e o aperfeiçoamento das práticas atuais e que antigas práticas consideradas fora do contexto atual da Reforma Psiquiátrica e da Política de Saúde Mental não sejam utilizadas de maneira velada pelo “não saber fazer”.
  • 21. 21 2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL E A CRIAÇÃO DOS CAPS: ESTRATÉGIAS DE REORGANIZAÇÃO DO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL A Reforma Sanitária e seu engajamento político-social foi o resultado do movimento sanitarista que na década de 70 trouxe à tona discussões sobre as políticas de saúde, prestação de serviços, a prática, atenção e gestão dos cuidados em saúde entre outras (BRASIL, 2005). O resultado destas discussões deu origem duas décadas depois a um sistema de saúde com novas formas de compreensão da saúde, o então Sistema Único de Saúde criado pela Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990. Esta lei traz como um de seus princípios a integralidade das ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde que onde não é mais possível pensar a prática do cuidado em saúde como um lugar: algo estático e espaço prioritariamente exclusivo para uma determinada demanda pois ela deve ser “entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema” (BRASIL, 1990). Quando o Movimento da Reforma Psiquiátrica chega ao Brasil em meados da década de 80 se depara com as ideias da Reforma Sanitária e nela um caminho com os quais os seus objetivos se encontram, já que a primeira orienta para a extinção gradual de práticas asilares e segregadoras em prol da construção de novas práticas do cuidado em saúde mental, dentro de uma rede de serviços comunitários, incluindo ações transversais que visem justamente a integralidade do cuidado. Segundo Amarante (1995) a Reforma Psiquiátrica no Brasil tem seu início demarcado no ano de 1978 quando do episódio conhecido como a “Crise do DINSAM” (Divisão Nacional de Saúde Mental), um órgão do Ministério da saúde responsável pelas políticas de saúde mental no Brasil. O que Amarante chamou de “estopim da reforma psiquiátrica brasileira” aconteceu por conta de uma greve deflagrada pelos profissionais das quatro unidades do DINSAM-RJ: Centro Psiquiátrico Pedro II – CPPII, Hospital Pinel, Colônia Juliano Moreira – CJM e Manicômio Judiciário Heitor Carrilho. Juntamente com estes profissionais, houve demissão de mais de 200 estagiários e profissionais, quando nestas instituições a grande maioria dos recursos
  • 22. 22 humanos era composta de bolsistas que frequentemente trabalhavam sob as piores condições entre baixos rendimentos financeiros, precárias condições dos ambientes em que trabalhava, e ameaças de todo o tipo de violência a eles e aos internos destas instituições. Disto partiu denúncia registrada em prontuário de três profissionais do CPPII acerca das situações irregulares e condições precárias e sub- humanas neste hospital, provocando uma série de discussões à respeito dessa situação (AMARANTE, 1995). Foi então que neste mesmo ano 1978 uma “aliança” entre trabalhadores de saúde mental, membros do movimento sanitarista, membros de conselhos profissionais, familiares e usuários com historio de longos período de internação em asilos psiquiátricos deu origem ao primeiro movimento pela luta de melhores condições, direitos e proteção à pessoas com transtornos mentais: MTSMS - Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (BRASIL, 2005). As diretrizes criadas pela 8ª Conferência Nacional de Saúde (8º CNS) foram um marco importante dentro da história da Reforma Psiquiátrica pois ela passou a ser pensada dentro da perspectiva da Reforma Sanitária (da organização da saúde), bem como recebeu status de movimento politizado. De acordo com Sidrim (2010) em decorrência da organização política da 8ª CNS ocorreu a I Conferência Nacional em Saúde Mental (I CNSM) em 1987 e as proposições sobre a nova forma de assistência receberam forte influência do movimento americano de reforma cujo engajamento estava na criação de espaços extra-hospitalares nos níveis primários e secundários organizados através do sistema de referência e contrareferência. Em 1987 (AMARANTE, 1995; BRASIL 2005; SIDRIM, 2010) após o II Congresso Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental (II CNTSM) e da criação do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA) pelo MTSMS é criado no Brasil na cidade de São Paulo o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e no município de Santos/SP o primeiro Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS) quando em 1989 a Casa de Saúde Anchieta é fechada após diversas denúncias de maus tratos aos internos e assim “É esta intervenção, com repercussão nacional, que demonstrou de forma inequívoca a possibilidade de construção de uma rede de cuidados efetivamente substitutiva ao hospital psiquiátrico” (BRASIL, 2005, s/p).
  • 23. 23 Em 1989 o então deputado Paulo Delgado deu entrada ao projeto de lei que dispunha sobre os direitos e proteção aos portadores de transtornos mentais, bem como a extinção gradual dos hospitais psiquiátricos. O Brasil assinou seu compromisso com a reestruturação e reforma psiquiátrica na chamada Declaração de Caracas de 1990 e novas diretrizes foram tomadas a partir da II CNSM, e tudo isto deu origem às primeiras legislações federais sobre uma nova Política de Saúde Mental para criação de serviços de atenção diária baseadas nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS, Hospitais-dia (BRASIL, 2005, s/p). Para Tavares e Sousa (2009) a Declaração de Caracas de 1990 deve ser lembrada como um marco histórico da Reforma Psiquiátrica na América Latina, pois orientou sobre os cuidados aos portadores de transtornos mentais que devem ser assistidos privilegiadamente na comunidade. Estes serviços citados tiveram suas diretrizes estabelecidas para se estruturar demarcadas com a “Portaria nº 224 de 29 de janeiro de 1992” (BRASIL, 1992) que definiu os NAPS/CAPS como dispositivos dentro da reestruturação da assistência em saúde mental estruturados de acordo com a lógica do território, responsáveis pelos atendimentos ambulatoriais diários, com atividade individuais e grupais e composta por equipe multidisciplinar, podendo [...] constituir-se também em porta de entrada da rede de serviços para as ações relativas à saúde mental, considerando sua característica de unidade de saúde local e regionalizada. Atendem também a pacientes referenciados de outros serviços de saúde, dos serviços de urgência psiquiátrica ou egressos de internação hospitalar. Deverão estar integrados a uma rede descentralizada e hierarquizada de cuidados em saúde mental (BRASIL, 1992, s/p) Após 10 anos do projeto de Lei do Deputado Paulo Delgado, foi aprovada a “Lei 10.2016 de 06 abril de 2001”, que substituía com algumas modificações o do projeto original de 1989, dentre elas a reorganização dos serviços de assistência à saúde mental preconizando: “IX – ser [a pessoa com transtorno mental] tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental” (BRASIL, 2001, s/p, [ ] nosso). A prática dos cuidados em saúde mental antes da Reforma psiquiátrica era feita seguindo uma lógica do “Lugar”. No dicionário da língua portuguesa
  • 24. 24 significa “1.Espaço ocupado ou que pode ser ocupado por um corpo; 2. Povoação, localidade [...]” (AMORA, 2009), e ora, o que vemos na história da Psiquiatria era exatamente isto: o espaço dos loucos, o lugar da loucura, um espaço “povoado” dos excluídos, o lugar do saber médico e da prática da cura da doença ou da exclusão pela impossibilidade da cura, ou do tratamento. No entanto Vasconcelos (2010) aponta que o atual quadro político da saúde e da saúde mental no Brasil está sob pena de que todos os seus avanços e conquistas feitos até hoje possam regredir. Os problemas estruturais ligados à construção de políticas sociais universais agravam não só a prevalência do desinvestimento em políticas públicas sociais, a miséria, o uso e abuso de álcool e outras drogas, por exemplo, gerando novas e crescentes demandas em saúde mental, como também a precarização dos vínculos de trabalhos no campo da saúde e que desembocam de forma negativa nos programas e serviços de saúde mental, dificultando inclusive o maior objetivo da Reforma Psiquiátrica que é a expansão dos serviços de saúde mental que efetivamente proporcione a gradual extinção dos hospitais psiquiátricos. [...] mas estes desafios também podem constituir um estimulo para a renovação e aprofundamento de nossa estratégia psiquiátrica, se eles forem devidamente avaliados e se pudermos reavaliar os ajustes táticos e assistenciais necessários, que possam viabilizar politicamente a continuidade do processo da reforma (VASCONCELOS, 2010, p. 11). Com a Reforma Psiquiátrica o pensamento e as ações de cuidado devem ser diferentes: os serviços especializados ou não devem estar dispostos em uma ampla rede que conversa entre si e que sejam estruturados a partir das características sócio, históricas e culturais do “lugar”. É a “lógica do território” – ou seja, do convívio social na comunidade com suas características populacionais, demográficas, culturais e etc., que deve estruturar a rede de cuidados nas suas mais diversas possibilidades do “fazer” e não mais a “lógica do lugar/espaço” que se ocupa de um cuidado específico. Aqui utilizo “Território” como um processo, como relação, e como
  • 25. 25 [...] um objeto complexo que deve ser igualmente abordado na perspectiva de se liberar o conhecimento local, advindo das necessidades locais, das realidades locais. O conhecimento local expresso nas práticas cotidianas, heterogêneas, é o conhecimento que contribui na produção de sentidos, para uma nova semântica do território e de seu viver (YASUI, 2010, p.130). Yasui (2010) utiliza-se do termo “Estratégia” para definir o percurso da Reforma Psiquiátrica. A partir da definição de Hoaussis (2001 apud YASUI, 2010, p. 115) “a arte de aplicar com eficácia os recursos de que se dispõe ou de explorar as condições favoráveis de que porventura se desfrute, visando o alcance de terminados objetivos”, este autor sugere que a ideia de “estratégia” refere algo em construção, que condiz com o que ele considera aspecto importante dentro da Reforma Psiquiátrica que é a mudança do modelo assistencial que se utilizando da referência local e temporal, com diferentes atores e fazeres, provoca o processo da transformação. Foi com a realização da III CNSM, aliada à Lei 10.216/01 que a Política Nacional de Saúde Mental passou a ter as diretrizes de como deveria ser feita a gradual extinção dos hospitais psiquiátricos (as requalificações), bem como deveriam ser estruturados os serviços comunitários (tipos, locos, recursos humanos entre outros). Foram criados pelo Ministério da Saúde Portarias e Normativas e também diretrizes do financiamento para esta reestruturação e foi conferido ao CAPS, pela “Portaria nº 336 de 19 de fevereiro de 2002” o papel de serviço estratégico na reestruturação da assistência em saúde mental (BRASIL, 2005). Os CAPS, assumindo um papel estratégico na organização da rede comunitária de cuidados, farão o direcionamento local das políticas e programas de Saúde Mental: desenvolvendo projetos terapêuticos e comunitários, dispensando medicamentos, encaminhando e acompanhando usuários que moram em residências terapêuticas, assessorando e sendo retaguarda para o trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde e Equipes de Saúde da Família no cuidado domiciliar (BRASIL, 2004, p. 12). Dentro desta perspectiva, Yasui (2010) localiza o CAPS como o principal meio de implementação da Política atual em Saúde Mental, dentro da construção de uma rede de serviços estruturada a partir do que chamou de “estratégia de transformação da assistência”, articulado na diversidade de projetos e localizado no seu território e portanto
  • 26. 26 Não se limita ou se esgota na implantação de um serviço. O CAPS é meio, caminho, não fim. É a possibilidade da tessitura, da trama, de um cuidado que não se faz em apenas um lugar, mas é tecido em uma ampla rede de alianças que inclui diferentes segmentos sociais, diversos serviços, distintos atores e cuidadores (YASUI, 2010, p. 115) Desenho 1 – Rede de Atenção Psicossocial na qual o CAPS é o organizador e porta de entrada. Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. 2004. Para Brasil (2005), pensar na tessitura da trama é então trabalhar com todas as possibilidades de ferramentas. A rede de serviços não deve ser resumida a um conjunto de serviços: ela deve ser um todo de serviços, recursos humanos e comunidade, somados aos saberes e fazeres dos mesmos objetivando sempre o bem comum, e por isso a importância de se tecer esta rede a partir do território que [...] é a designação não apenas de uma área geográfica, mas das pessoas, das instituições, das redes e dos cenários nos quais se dão a vida comunitária. [...] Trabalhar no território significa assim resgatar todos os saberes e potencialidades dos recursos da comunidade, construindo coletivamente as soluções, a multiplicidade de trocas entre as pessoas e os cuidados em saúde mental (BRASIL, 2005, s/p). O relatório de Gestão 2007-2010 (BRASIL, 2012) aponta que o Brasil ampliou de forma significativa o serviços de CAPS pelos estados, onde a expansão regular destes resultou ao final do ano de 2011 em 1.742, sendo 63 CAPS do tipo III, totalizando 122 serviços habilitados durante o ano.
  • 27. 27 Desenho 2 – Cobertura por município dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) ao final de 2022 e ao final de 2011 (parâmetro de 1 CAPS para cada 1000.000 habitantes). Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. 2012. No Pará o ano de 2011 totalizou ao final um número de 49 serviços na Rede CAPS, sendo 24 CAPS do tipo I, 15 do tipo II, 02 do tipo III e do tipo Infanto- juvenil, 06 do tipo Álcool e outras drogas (AD) e ainda sem nenhum tipo ADIII, passando então para a classificação de “boa cobertura” de acordo com os parâmetros do Ministério da Saúde de cobertura do indicador CAPS/100.000 habitantes (BRASIL, 2012). 3 A ATENÇÃO BÁSICA E O APOIO MATRICIAL: UM DESAFIO O Sistema Único de Saúde também se preocupou em criar novas estratégias de cuidado à saúde, desde a sua criação em 1980. Uma destas estratégias é o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), criada pela “Portaria GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008” com o objetivo de reforçar a inserção da Estratégia Saúde da Família (ESF) e ampliar a abrangência da atenção básica pautada da territorialização e hierarquização das ações em saúde, efetivando a sua resolutividade. Ele deve ser constituído por profissionais que componham diversas e interdisciplinares equipes que devem atuar no apoio e em parceria com os profissionais da equipe da ESF sempre considerando a prática territorializada do Saúde da Família (BRASIL, 2009).
  • 28. 28 De acordo com o Relatório de Gestão federal 2007-2010 (BRASIL, 2011) dados de dezembro de 2010 indicavam 1.288 NASF em funcionamento no país, nos quais 2.349 eram trabalhadores do campo da saúde mental (um total de 31%) e por esta razão o Caderno do NASF publicado em 2009 dedicou um capítulo específico sobre Saúde Mental, Álcool e outras drogas, destacando no capítulo introdutório o Apoio Matricial como estratégia de fundamental importância para a garantia do cuidado. A proposta central do NASF é a chamada tecnologia de gestão “Apoio Matricial”, a qual é complementada pelas equipes de referência. O conceito de Apoio Matricial foi inicialmente sugerido por Campos (2007) em seu estudo e pesquisa sobre a reforma das organizações e do trabalho em saúde – chamado “Método Paidéia”, e posteriormente adotado para as pesquisas em saúde mental, atenção básica e principalmente adotado nas publicações do Ministério da saúde como na cartilha do projeto “Humaniza SUS”. O método Paidéia busca o aperfeiçoamento de pessoas e instituições. Opera, portanto, diretamente sobre essa terceira instância da polis, isto é, procura realizar um trabalho sistemático junto aos próprios sujeitos, ampliando sua capacidade de atuar sobre o mundo que os cerca, particularmente sobre as instituições e organizações. [...] objetiva aumentar a capacidade de compreensão e de intervenção das pessoas sobre o mundo e sobre si mesmas, contribuindo para instituir processos de construção de sociedades com grau crescente de democracia e de bem- estar social (CAMPOS, 2006, p.20). Para Campos (1999, 2007) um novo sistema de referência entre profissionais e usuários deveria ser pensado de forma que fosse uma norma organizativa para promoção e estimulação de “maiores coeficientes de vínculo” entre estes dois personagens e, portanto “A reforma e ampliação da clínica e das práticas de atenção integral à saúde dependem centralmente da instituição de novos padrões de relacionamento entre o sujeito/clínico e o sujeito/enfermo” (CAMPOS, 1999, p.395-396). Então “O Matriciamento ou Apoio Matricial é um novo modo de produzir saúde em que duas ou mais equipes, num processo de construção compartilhada, criam uma proposta de intervenção pedagógico-terapêutica” (CHIAVERINI, 2011, p. 13).
  • 29. 29 Esta norma organizativa ou modo de produção em saúde deveria ser composta por equipes básicas de referência em cada serviço, cuja especificidade seria atribuída de acordo com a unidade a qual estavam ligadas e sua composição seria essencialmente multiprofissional e atuaria em consonância com o grau de exigência de cuidado que o caso demandaria (atenção básica, hospitalar, especialidade e etc.), e atenderiam a uma clientela ou grupo que estariam sob sua responsabilidade de acordo com a lógica do território (CAMPOS, 1999). A Equipe de Referência é uma nova forma de organizar as equipes de saúde nas quais não se enaltecem as especialidades mas sim a interdisciplinaridade das profissões essenciais e que intervém num mesmo objeto, tornando-se então corresponsáveis por todas as ações assim dirigidas a ele (CAMPOS, 2007). As equipes de referência e o Apoio Matricial são considerados arranjos organizacionais que têm características da transversalidade e corroboram com o princípio da integralidade do cuidado do SUS. Na atenção básica a Equipe de Referência é a ESF. Já a Equipe de Apoio Matricial ou o apoiador matricial é um especialista que tem um conhecimento e perfil distinto do profissional da Equipe de Referência que pode contribuir com intervenções e agregar recursos aos da Equipe de Referência, criar espaços ou possibilidades nos quais ações do Matriciamento sejam realizadas, compartilhar conhecimentos com a Equipe de Referência para uma maior resolutividade do caso em questão. O Apoio Matricial então [...] busca personalizar os sistemas de referência e contra-referência, ao estimular e facilitar o contato direto entre referência encarregada do caso e especialista de apoio. Nesse sentido, essa metodologia altera o papel das Centrais de Regulação, reservando-lhe uma função na urgência, no zelo pelas normas e protocolos acordados e na divulgação do apoio disponível (CAMPOS, 2007, p. 401). Assim, o sistema tradicional de referência e contrarefencia seria pouco utilizado posto que o usuário mesmo utilizando o Apoio Matricial não deixa de estar sob os cuidados da Equipe de Referência. Aqui o trabalho consistiria na organização de um projeto terapêutico sob cogestão (CAMPOS, 1999).
  • 30. 30 Os serviços de referência/especialidades que dão Apoio Matricial passam a ter dois “usuários” sob sua responsabilidade: “os usuários do serviço” para o qual ele é referência e “o próprio serviço”. Isso significa que o serviço de referência/especialidades participa junto com as equipes de referência, sempre que necessário, da confecção de projetos terapêuticos dos pacientes que são tratados por ambas as equipes, e ajuda as equipes de referência a incorporarem conhecimentos para lidar com casos mais simples (BRASIL, 2004, p. 12). Campos (1999) criou uma matriz organizacional com as orientações para o trabalho do Matriciamento e isto deve estar sempre sob conhecimento do profissional de referência, do profissional que propõe a atividade matricial e do usuário: em uma linha vertical estariam as equipes de referência e em uma linha horizontal a Equipe de Apoio Matricial na qual estariam os profissionais especializados em determinada atividade. Desta maneira, um professor de educação física, por exemplo, se incluiria no trabalho interdisciplinar em saúde mental pelo lado matricial, oferecendo um cardápio de atividades que poderiam ou não ser incluídas no projeto terapêutico conforme o triplo entendimento acima referido. Um outro trabalhador que, além de funcionar como referência, trabalhasse também com uma oficina para reabilitação ocupacional. Esta atividade em grupo, na oficina, seria ofertada de forma matricial, ou seja, ele receberia pacientes encaminhados por outros referências, além de alguns de sua própria lista de clientes (CAMPOS, 1999, p. 398). O Apoio Matricial como uma metodologia de trabalho complementar depende que sejam compartilhadas as diretrizes clínicas e sanitárias entre a Equipe de Referência e a Equipe de Apoio Matricial e ter sempre claro para as duas equipes que “Essas diretrizes devem prever critérios para acionar o apoio e definir o espectro de responsabilidade tanto dos diferentes integrantes da Equipe de Referência quanto dos apoiadores matriciais” (CAMPOS; DOMITTI, 2007, p. 400). Entre os pressupostos de políticas que a “Portaria GM nº 154 de 24 de janeiro de 2008” baseou as suas diretrizes estava incluída a Saúde Mental, incluindo inclusive esta como uma área estratégia de ações do NASF. 4 APOIO MATRICIAL EM SAÚDE MENTAL: DIÁLOGO NECESSÁRIO De acordo com a IV CNSM
  • 31. 31 Para garantir o atendimento e acompanhamento das pessoas com transtorno mental, em seu próprio território, propõe-se a obrigatoriedade de equipes de Saúde Mental na Atenção Primária. Ao mesmo tempo, afirma-se a estratégia do Matriciamento e a articulação dos serviços em rede como garantia para a inserção do usuário nos serviços, na perspectiva da integralidade e conforme sua necessidade. Além disso, propõe-se implementar o Matriciamento em saúde mental, com equipes intersetoriais na atenção em saúde, como diretriz da Política de Saúde e com financiamento das diferentes Políticas Públicas (Educação, Saúde, Assistência Social e outras) (BRASIL, 2001, p. 22). Segundo Relatório do Ministério da Saúde (BRASIL, 2007) os indicadores de saúde mental passaram a fazer parte da atenção básica em 2005, mas foi em 2006 que as políticas dessa área entram em definitivo na Atenção Básica e a implantação das Equipes de Apoio Matricial e de Referência em saúde mental foram articuladas com os gestores. Nesta época várias experiências do Apoio Matricial foram identificadas, dentre elas Recife/PE e Vale do Jequitinhonha/MG onde foram criados serviços próprios e equipes próprias para o Apoio Matricial, em Betim/MG por meio das equipes de saúde mental e Agentes Comunitários da Saúde (ACS) e no Ceará e Aracajú/SE a partir dos CAPS ou profissionais do CAPS. A literatura aponta a cidade de Campinas/SP como a experiência pioneira do Apoio Matricial em Saúde Mental em 2001, através do Programa Paidéia de Saúde da Família que foi adaptado do Programa Saúde da Família do Ministério da Saúde, e foi por isso que a atenção básica foi escolhida como área de experiência neste município [...] as equipes de saúde mental que existiam nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) foram inseridas na equipe de saúde da família com o papel de referência à especialidade e apoio à atenção integral da equipe generalista (BRASIL, 2001, p. 20). Além do mais, Campinas/SP historicamente tem grande importância dentro da Reforma Psiquiátrica por ter sido uma das cidades pioneiras na reestruturação da rede de serviços em saúde mental já que desde 1970 possui equipes de saúde mental atuando na atenção básica do município e que foram ampliadas através do Apoio Matricial (FIGUEIREDO e CAMPOS, 2009).
  • 32. 32 Atualmente a Política Nacional de Saúde Mental através do Ministério da Saúde, considerando a Legislação em saúde mental e suas principais leis, portarias e decretos, divulgou a “Portaria/GM nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011” que “Instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)” (BRASIL, 2001, s/p). Aqui além da ampliação da diversidade dos serviços que compõe a Rede de Atenção Psicossocial, da ratificação dos princípios da Reforma Psiquiátrica e das considerações feitas na legislação que orienta a Política Nacional de saúde Mental, aparecem objetivos que são específicos das RAPS entre eles o de “VIII - regular e organizar as demandas e os fluxos assistenciais da Rede de Atenção Psicossocial” (BRASIL, 2011, s/p). Uma das orientações da RAPS é justamente para que todas as ações da Atenção Básica sejam compartilhadas sempre que possível com outros serviços da Rede, onde “[...] a ordenação do cuidado estará sob a responsabilidade do Centro de Atenção Psicossocial ou da Atenção Básica, garantindo permanente processo de cogestão e acompanhamento longitudinal do caso” (BRASIL, 2011, s/p), o que nos possibilita afirmar que na saúde mental, o Apoio Matricial seria uma responsabilização compartilhada entre os serviços ou as equipes de Saúde Mental e a atenção básica ou outra que esteja no papel de equipe de referência. Segundo Portaria do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011) quando os serviços se articulam com serviços especializados dentro da lógica do matricial (como exemplo, o CAPS) o fluxo de atendimentos se organiza e o processo de trabalho horizontaliza as especialidades, fazendo com que estas permeiem as ações de todas as equipes de saúde.
  • 33. 33 Desenho 3 – Rede de Atenção Psicossocial na qual existe um compartilhamento de cuidados entre os serviços. Em amarelo estão os Programas Saúde da Família (PSF). Fonte: CHIAVERINI. 2011. De acordo com Sidrim (2010) os CAPS devem criar interfaces com vários serviços dentro da Rede de Atenção Psicossocial, dentre eles a atenção básica. Para Bezerra e Dimenstein (2008) a saúde mental é tarefa de uma rede articuladas de serviços, mas deve contar com os recursos da comunidade para que sejam criados e utilizados espaços e possibilidades desta para que se tenha uma verdadeira inclusão das pessoas portadoras de transtornos mentais, como orienta a Reforma Psiquiátrica. Assim Muitos casos graves, que necessitariam de acompanhamento mais intensivo em um dispositivo de saúde mental de maior complexidade, permanecem na APS [atenção primária em saúde] por questões vinculares, geográficas e socioeconômicas, o que reforça a importância das ações locais de saúde mental (BRASIL, 2009, p. 46 [ ] nosso) Uma destas possibilidades são as equipes que trabalham na atenção básica, pois não é incomum que encontrem casos de sofrimento mental ou de transtorno mental já comprovado, acompanhados muitas vezes de falta de informação e/ou desasistência.
  • 34. 34 A Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça que o manejo e o tratamento de transtornos mentais no contexto da APS [Atenção Primária em Saúde] são passos fundamentais para possibilitar a um maior número de pessoas o acesso mais facilitado e rápido ao cuidado em saúde mental. Isso não só proporciona uma atenção de melhor qualidade, como também reduz exames supérfluos e tratamentos impróprios ou não específicos (BRASIL,2009, s/p). Segundo Figueiredo e Campos (2009) a regulação do fluxo de usuários dos serviços torna-se então responsabilidade compartilhada, pois com o Apoio Matricial é possível identificar as situações que são da vida cotidiana e que, portanto podem ser acolhidas pela Equipe de Referência dentro da própria comunidade ou entorno diferente daquelas que necessitam de um acolhimento especializado em Saúde Mental que pode ser levada para a própria unidade de saúde ou dependendo do risco e da gravidade, para um CAPS da região de abrangência. Com isso, é possível evitar práticas que levam à “psiquiatrização” e à “medicalização” do sofrimento e, ao mesmo tempo, promover a eqüidade e o acesso, garantindo coeficientes terapêuticos de acordo com as vulnerabilidades e potencialidades de cada usuário. Isso favorece a construção de novos dispositivos de atenção em resposta às diferentes necessidades dos usuários e a articulação entre os profissionais na elaboração de projetos terapêuticos pensados para cada situação singular (FIGUEIREDO; CAMPOS, 2009, p. 130) Chiaverinni (2011) chama a atenção para que o Matriciamento não seja confundido com “um encaminhamento ao especialista, como um atendimento por um profissional em saúde mental ou uma intervenção coletiva realizada apenas pelo profissional da saúde mental” (p.14) pois a relação do CAPS com a atenção básica deve ser de integração, posto que as equipes que trabalham na atenção básica estão mais próximos da comunidade e os CAPS devem prestar apoio e capacitação para estas equipes (BRASIL, 2004). Para isto o CAPS precisa: a) conhecer e interagir com as equipes de atenção básica de seu território; b) estabelecer iniciativas conjuntas de levantamento de dados relevantes sobre os principais problemas e necessidades de saúde mental no território; c) realizar Apoio Matricial às equipes da atenção básica, isto é, fornecer- lhes orientação e supervisão, atender conjuntamente situações mais complexas, realizar visitas domiciliares acompanhadas das equipes da atenção básica, atender casos complexos por solicitação da atenção básica; d) realizar atividades de educação permanente (capacitação, supervisão)
  • 35. 35 sobre saúde mental, em cooperação com as equipes da atenção básica (BRASIL, 2004, p. 25) Ballester (2011) refere que a construção das novas práticas em saúde mental devem contar com tecnologias que sejam apropriadas para o Apoio Matricial: a interconsulta, a consulta conjunta e a visita domiciliar. Para este autor a reflexão do compromisso do cuidado de cada um e da equipe dentro do Apoio Matricial e a interconsulta possibilitaria, à priori, até mesmo um acolhimento das demandas das equipes e uma diretriz para o cuidado integral e continuado na atenção básica e as consultas de avaliação ou mesmo a referência para um serviço especializado podem ser importantes para que a equipe compreenda melhor o problema e o seu papel enquanto referência em cuidado para determinado usuário. Já a consulta conjunta pode ser considerada um instrumento de educação para os participantes, importante instrumento na formação do vínculo entre o usuário e a equipe que vai cuidá-lo para que ele saiba que continuará sendo atendido por uma determinada Equipe de Referência mesmo tendo sido “encaminhado” (grifo do autor) para um especialista, facilitando a adesão deste usuário ao seu tratamento. Além disto, quanto mais a Equipe de Apoio Matricial se envolve nas ações da Equipe de Referência, também poderá aprender e apreender os conhecimentos e as práticas da atenção básica, ao mesmo passo que contribui com no processo de avaliação e colaboração dos casos. Por último, a visita domiciliar que é essencialmente uma prática da atenção básica promoverá com maior efetividade o lado aprendiz da Equipe de Apoio Matricial “Principalmente na interação entre o conhecimento das famílias e do território, por um lado, e no apoio ainda que simbólico de alguém com maior experiência em saúde mental” (BALLESTER, 2011, p. 74). 5 CAMINHOS METODOLÓGICOS Tendo em vista o objetivo deste trabalho fez-se necessário, assim como Mota (2012, p. 29), “apreender a estrutura e a dinâmica dos serviços no seu cotidiano, nas formas que os sujeitos envolvidos se relacionam; seus interesses, conflitos e as questões vivenciadas através de suas práticas”, bem como
  • 36. 36 compreender as dinâmicas no processo de trabalho entre o CAPS da pesquisa e a atenção básica do seu território. O objetivo geral desta pesquisa foi analisar o papel do CAPS e sua articulação com a atenção básica através do Apoio Matricial. E para a consecução deste objetivo geral foram traçados alguns objetivos específicos, a saber:  Investigar a situação atual do Apoio Matricial na saúde mental no estado do Pará e município de Belém;  Verificar quais as práticas e ações que estão relacionadas ao Apoio Matricial que foram indicadas pelo Coordenador (a) e a equipe técnica do CAPS III Grão Pará, o Coordenador (a) Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará e a Referência Técnica em Saúde Mental do Município de Belém e;  Identificar os desafios e as resoluções que estes profissionais apontaram para o diálogo com a atenção básica, e, portanto o Apoio Matricial em saúde mental. 5.1 TIPO DE ESTUDO Tratou-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa e descritiva, pois o objetivo deste trabalho era descrever como o CAPS atua em relação à atenção básica, cuja via de acesso é o Apoio Matricial. De acordo com Teixeira (2002), este tipo de pesquisa social possui significados que podem ser investigados, juntamente com a linguagem e os atores sociais que são considerados matéria prima desta pesquisa, pois “É o nível dos significados, motivos, aspirações, atitudes, crenças e valores, que se expressa pela linguagem comum e na vida cotidiana, o objeto da abordagem qualitativa” (p. 126). A pesquisa foi realizada a partir de uma perspectiva crítica de análise, que segundo Mota (2012) busca compreender o fenômeno para além das aparências, explorando suas vivências e conflitos de uma forma mais aprofundada. Do ponto de vista metodológico para se alcançar os objetivos propostos foram utilizadas uma ampla base de dados para se chegar à compreensão da questão. Partiu-se da compreensão da Política Nacional de Saúde Mental, que compreende planos, programas e ações, saber: a) Relatórios finais da III e da IV
  • 37. 37 Conferência Nacional de Saúde Mental; b) Portarias nº 224/92, nº 336/02, c) nº 3.088/11; d) Lei 10.216/01, e) além do Boletim informativo sobre Saúde mental e atenção Básica, f) Manual do CAPS no SUS, g) Relatório de gestão 2007-2010 e h) Relatório “15 anos após Caracas”. Utilizamos o documento sobre a Política Nacional de atenção básica, as diretrizes sobre os NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da Família), bem como a Política Nacional de Humanização (PNH) e a Lei 8.080/90 do SUS. Com os resultados desta pesquisa pretendeu-se contribuir na busca de melhorias dos serviços de saúde, especialmente na área da saúde mental, através, por exemplo, do incentivo e da oportunidade da educação permanente em saúde. 5.2 O CAMPO DE PESQUISA A pesquisa foi realizada em um CAPS do tipo III no município de Belém do Pará. Este é considerado dentro da rede de serviços em saúde mental o dispositivo substituto ao hospital psiquiátrico, e segundo Brasil (2004), o CAPS III é um serviço que presta atendimento contínuo, 24h, incluindo feriados e final de semana, aos portadores de transtornos mentais severos e persistentes, possuindo no máximo cinco leitos para observação ou repouso. O acolhimento noturno e a permanência nos fins de semana devem ser entendidos como mais um recurso terapêutico, visando proporcionar atenção integral aos usuários dos CAPS e evitar internações psiquiátricas. Ele poderá ser utilizado nas situações de grave comprometimento psíquico ou como um recurso necessário para evitar que crises emerjam ou se aprofundem. O acolhimento noturno deverá atender preferencialmente aos usuários que estão vinculados a um projeto terapêutico nos CAPS, quando necessário, e no máximo por sete dias corridos ou dez dias intercalados durante o prazo de 30 dias (BRASIL, 2004, p. 19). Nos municípios em que de acordo com a Portaria nº 336/02 é possível estruturar um CAPS – ou seja, acima de 20.000 habitantes, é ele quem deve ser responsável pelo Apoio Matricial em Saúde Mental. O CAPS envolvido é o serviço estruturado para assistência de municípios com mais de 200.000 habitantes e deve ter entre as suas características “[...] capacidade técnica para desempenhar o papel de regulador da porta de entrada da rede assistencial no âmbito do seu território
  • 38. 38 e/ou do módulo assistencial [...]”, além de “[...] supervisionar e capacitar as equipes de atenção básica, serviços e programas de saúde mental no âmbito do seu território e/ou do módulo assistencial” (BRASIL, 2004, p. 34). O CAPS Grão Pará foi escolhido para a realização desta pesquisa por três razões: por ter sido o primeiro CAPS a se reclassificar de básica para alta complexidade no ano de 2009, passando a ser um serviço de atendimento 24h, 7 dias por semana e como 5 leitos para observação; por ter sido campo de estágio do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental e no qual passei dois meses e; por ter sido o primeiro CAPS a ser implantando no município de Belém, sob gestão do estado. A área de abrangência deste CAPS corresponde atualmente aos bairros Condor, Cremação, Jurunas, Cidade Velha, Campina, Comércio, Nazaré, Reduto, Batista Campos. Atende pessoas a partir dos 18 anos que chegam ao serviço por demanda espontânea ou encaminhadas de outros serviços de saúde do SUS ou de outras instituições. Com relação à estrutura física, o CAPS III Grão Pará está assim estruturado: 1º ANDAR: 01 Recepção c/ espera, 01 Consultório, 01 Sala de atendimento interdisciplinar, 01 Sala de acolhimento, 01 Copa/cozinha, 01 Refeitório, 01 Sala de grupos, 01 Videoteca, 02 Banheiros p/ usuários, 01 Banheiro p/ funcionários, 01 Piscina e 01 Sala p/ guardar estoque de material de limpeza. 2º ANDAR: 01 Sala da direção, 01 Secretaria c/ banheiro, 01 Sala de Psicologia c/ banheiro, 01 Farmácia c/ banheiro, 01 Sala de espera p/ Farmácia e psicologia, 01 Quarto de repouso c/ 5 leitos de observação, c/banheiro, contendo divisória p/masculino e feminino c/ba c/banheiro+ banheiro e 01 Quarto de descanso para equipe plantonista. Anexos: 01 Ateliê de oficinas e 01 Sala de apoio com banheiro. 5.3 OS SUJEITOS SOCIAIS Incialmente foram sujeitos da pesquisa a Coordenadora Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas da atual gestão, a Coordenadora deste CAPS
  • 39. 39 e a equipe técnica que trabalha no CAPS III Grão Pará, porém com as entrevistas já em andamento fez-se necessário incluir também como sujeito social a Referência Técnica em Saúde Mental do Município de Belém. A equipe técnica aqui foi considerada de acordo com a definição feita por Brasil (2004, p. 26), a saber “Os profissionais que trabalham nos CAPS possuem diversas formações e integram uma equipe multiprofissional. É um grupo de diferentes técnicos de nível superior e de nível médio”. A equipe técnica mínima de acordo com este autor referido é composta por 2 médicos psiquiatras, 1 enfermeiro com formação em saúde mental, 5 profissionais de nível superior de outras categorias profissionais - psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, pedagogo ou outro profissional necessário de nível superior e 8 profissionais de nível médio - técnico e/ou auxiliar de enfermagem, técnico administrativo, técnico educacional e artesão. Os sujeitos participantes deveriam estar de acordo com os seguintes critérios de inclusão: graus de escolaridades ensinos médio e superior, fazer parte da categoria profissional descrita pelo referencial Brasil (2004) acima, estar em serviço no período da pesquisa. Os critérios de exclusão foram: grau de escolaridade ensino fundamental, não estar em serviço por condição de férias, licença ou cessões, aqueles que manifestaram o desejo de desistir da pesquisa e os que não desejaram participar. Para a realização da pesquisa foi realizado em um primeiro momento um cálculo de amostragem dos sujeitos. Dentro do que propõe um dos critérios de inclusão, fazia parte da população 71 profissionais que compunham atualmente o corpo técnico do CAPS Grão Pará onde tínhamos: 36 profissionais do nível médio e 35 profissionais de nível superior, conforme documento cedido pela administração do CAPS Grão Pará. Com tamanho amostral com erro de 0,01 e como 95% de confiança, obtivemos uma amostra de tamanho 41. A partir disto foi realizada uma amostragem Estratificada entre os profissionais por nível de escolaridade (Médio e Superior), e o número de profissionais que participariam da pesquisa foi de 21 profissionais de nível médio e de 20 profissionais de nível superior. Amostragem estratificada é a técnica normalmente utilizada quando nos deparamos com uma população que apresenta características heterogêneas e se quer distinguir subpopulações com características mais homogêneas. Consiste em
  • 40. 40 dividir esta população em subgrupos, denominados de estratos. Estes estratos apresentam internamente características mais homogêneas do que a população toda, com respeito às variáveis em estudo e por este motivo devemos escolher critérios de estratificação que forneça estratos bem homogêneos, assim na amostragem estratificada proporcional a proporcionalidade do tamanho de cada estrato da população é mantida na amostra. Por último e de acordo com a necessidade foi realizada uma amostragem aleatória utilizando o Aplicativo BioEstat. 5.0. onde foram selecionados os profissionais que participaram da pesquisa, dispostos no quadro do referido documento, feito para que cada um dos profissionais tivessem a mesma probabilidade de participar. No cálculo de amostras aleatórias simples os indivíduos foram obtidos ao acaso da população, tendo cada amostra a mesma chance de ser escolhida dentre todas aquelas possíveis do mesmo tamanho. Os termos aleatório, randômico, casual e ao acaso são sinônimos. As amostras aleatórias simples podem ser obtidas por sorteios, em tabelas de números aleatórios e por computador. Segundo as informações geradas pelo Aplicativo obtivemos valores aleatórios e sem reposição e foram atribuídos um número para casa profissional da listagem resultante da amostra estratificada. O total de 44 sujeitos que a pesquisa se propôs a investigar ficou então assim distribuído: Quadro 1 – Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa (continua) CARGO CATEGORIA SERVIÇO QUANTIDADE Coordenadora Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará Gestão Secretaria de Estado de Saúde do Pará (SESPA) 01 Referência técnica de Saúde Mental do município de Belém Gestão Secretaria de Saúde do Município de Belém (SESMA) 01 Coordenadora do CAPS Grão Pará Gestão CAPS Grão Pará (estadual) 01 Profissionais da equipe técnica de nível superior Trabalhador CAPS Grão Pará 20
  • 41. 41 Profissionais da equipe técnica de nível médio Trabalhador CAPS Grão Pará 21 (conclusão) No entanto, obedecendo aos critérios de inclusão e exclusão ao final da pesquisa tivemos o total de 33 sujeitos. É importante dizer que dos 44 sujeitos selecionados, apenas 04 foram excluídos por não terem aceitado participar da pesquisa. Assim os entrevistados ficaram distribuídos: Quadro 2 – Distribuição dos sujeitos selecionados para pesquisa após critérios CARGO CATEGORIA SERVIÇO QUANTIDADE Coordenadora Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará Gestão Secretaria de Estado de Saúde do Pará (SESPA) 01 Referência técnica de Saúde Mental do município de Belém Gestão Secretaria de Saúde do Município de Belém (SESMA) 01 Coordenadora do CAPS Grão Pará Gestão CAPS Grão Pará (estadual) 01 Profissionais da equipe técnica de nível superior Trabalhador CAPS Grão Pará 15 Profissionais da equipe técnica de nível médio Trabalhador CAPS Grão Pará 15 Vale ressaltar que duas entrevistas que foram registradas com o gravador foram perdidas pois o instrumento era digital e houve problema técnicos que não puderam ser recuperadas, e também não houve tempo hábil para que estas entrevistas pudessem ser refeitas. Os participantes da pesquisa tinham o seguinte perfil: Quadro 3 – Perfil dos sujeitos que participaram da pesquisa (continua) PERFIL QUANTIDADE (%) Faixa Etária De 31 – 40 anos De 41 – 50 anos De 51 – 60 anos 10 08 10 36% 28% 36% Sexo
  • 42. 42 Feminino Masculino 21 07 75% 25% PERFIL QUANTIDADE % Profissão Psicólogo Nutricionista Administrador Ed. Físico Pedagoga Enfermeiro Assistente Social Terapeuta Ocupacional Psiquiatra Téc. De Enfermagem Ag. Administrativo Aux. De Enfermagem 03 02 01 01 01 02 02 02 01 08 03 02 11% 7% 4% 4% 4% 7% 7% 4% 4% 30% 11% 7% Tempo de serviço no CAPS Grão Pará De 01 à 04 anos e 11 meses De 05 à 08 anos e 11 meses Igual ou maior que 09 anos 11 13 04 39% 47% 14% (conclusão) 5.4 PRIMEIROS PASSOS NO CAMPO DE PESQUISA Para a coleta de dados os sujeitos da pesquisa foram convidados a participar mediante contato direto e presencial. O CAPS Grão Pará funciona em três turnos então pela prévia aproximação da pesquisadora com o campo da pesquisa ainda na fase do estágio obrigatório da residência, alguns meses antes da pesquisa iniciar, a conversa com os profissionais dos turnos da manhã e da tarde foram otimizadas e as entrevistas marcadas pessoalmente com cada um. No entanto com o turno da noite como não havia aproximação prévia da pesquisadora foi necessário um primeiro contato com os agentes administrativos dos turnos na manhã e da tarde para além de listar os contatos dos sujeitos selecionados verificar suas disponibilidades para a entrevista de acordo com seus dias de trabalho no CAPS já que estes obedecem à uma escala que compreende 12h de trabalho, 12h de descanso e 12h de folga. Com estes as entrevistas foram marcadas via telefone.
  • 43. 43 Os participantes foram informados que a coleta de dados seria realizada através de entrevistas, que poderiam ser agendada ou não, de acordo com a conveniência dos sujeitos. Ela ocorreu no próprio CAPS III Grão Pará em dia e hora marcados pelo participante. Após o aceite, as entrevistas foram marcadas e os entrevistados foram apresentados ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) – ver apêndices A e B. De acordo com Turato (2003) a entrevista [...] é um instrumento precioso de conhecimento interpessoal, facilitando, no encontro face a face, a apreensão de uma série de fenômenos, de elementos de identificação e construção do potencial do todo da pessoa do entrevistado e, de certo modo, também do entrevistador (p. 308) A entrevista foi do tipo semi-estruturada ou semidirigida, com o apoio de um roteiro contendo dados de identificação e questões referentes ao tema em estudo – ver Apêndices C e D. O uso deste tipo de entrevista [...] dá-se então pelo motivo de que ambos os integrantes da relação têm momentos para dar alguma direção, representando ganho para reunir os dados segundo os objetivos propostos (TURATO, 2003, p. 313). Também foi necessária para a coleta de dados a gravação das entrevistas, devidamente autorizadas pelos participantes. Quanto aos dados quantitativos que surgiram na entrevista estes foram analisados segundo a estatística simples (percentual) e apresentados em gráficos e ou/tabelas. A análise dos dados qualitativos das entrevistas foi feita a partir de eixos teóricos que deram suporte ao estudo e que foram identificados, tratados e organizados de acordo com a semelhança dos dados empíricos que surgiram nas entrevistas sobre as questões do roteiro previamente organizado. O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Fundação Estadual Pública Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHGCV) e a pesquisa somente foi realizada após aprovação do mesmo pelo CEP. Foi garantido o anonimato dos sujeitos e o sigilo dos dados pessoais confidenciais ou que de alguma forma pudessem provocar constrangimentos ou prejuízos pessoais, inclusive quando da divulgação dos resultados, embora por
  • 44. 44 conta da posição ocupada (cargo) pelos sujeitos “Gestão” o anonimato total de suas declarações não pôde ser garantido. Importante dizer que todos os participantes, sem exceção, foram informados via TCLE (Termo de Consentimento Livre e esclarecido) e antes de iniciarem suas entrevistas que suas participações eram voluntárias e que a qualquer tempo poderiam desistir de sua participação na pesquisa. Os dados obtidos serão utilizados somente para este estudo, sendo os mesmos armazenados pela pesquisadora principal durante cinco (5) anos e após totalmente destruídos (conforme preconiza a Resolução 466/12). 6 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS Neste capítulo apresentaremos a análise qualitativa das entrevistas realizadas com os técnicos e a coordenação do CAPS GRÃO PARÁ, bem como as entrevistas realizadas com as coordenações de saúde mental do estado do Pará e do município de Belém, a partir de seis eixos temáticos e da metodologia citada. A seguir, os eixos temáticos foram organizados e analisados na seguinte ordem: Eixo 1 – Papel do CAPS da Rede de Atenção Psicossocial; Eixo 2 – Importância do Apoio Matricial pelo CAPS na Rede de Atenção Psicossocial; Eixo 3 – Processo de implantação da proposta do Apoio Matricial; Eixo 4 – Processo de trabalho CAPS – atenção básica; Eixo 5 - Capacitação profissional para atuação no Apoio Matricial e Eixo 6 – Importância das práticas em saúde mental na atenção básica. Cada eixo será apresentado de forma que o leitor possa identificar o referencial teórico utilizado, sempre em relação às entrevistas realizadas através de trechos das transcrições que corroboram ou não com o referencial. Por questões éticas os nomes dos entrevistados foram substituídos por letras e, por questões didáticas, os entrevistados foram divididos de acordo com o turno que trabalham, onde cada grupo recebeu uma letra diferente e um número de acordo com a quantidade de entrevistados, ficando assim organizados: Quadro 4 – Identificação dos sujeitos e quantidade de sujeitos de acordo com o turno e gestão (continua) PARTICIPANTES IDENTIFICAÇÃO NÚMERO DE TÉCNICOS Turno da manhã M 12
  • 45. 45 Turno da tarde T 10 Turno da noite N 06 Gestoras G 03 (conclusão) Alguns trechos foram transcritos integralmente, outros não foram por uma preocupação de que pudesse tornar a leitura cansativa ao leitor, então optou-se para nestas fazer um recorte sem que possa ter acarretado algum prejuízo na compreensão do leitor e também ao contexto em que foi dito e consequentemente, ao entrevistado. 6.1 EIXO TEMÁTICO: PAPEL DO CAPS DA REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL Neste eixo discuti sobre o lugar do CAPS GRÃO PARÁ como o único CAPS do tipo III (não AD) e as implicações deste lugar aos trabalhadores e coordenação do CAPS e o conhecimento sobre as legislações que embasam o funcionamento do CAPS, principalmente sobre o que tange ao Apoio Matricial, e para a gestão municipal e estadual a discussão será sobre o papel do CAPS (sem subtipo) de uma forma geral e as legislações. Para os momentos iniciais da pesquisa havia a necessidade por parte da pesquisadora em verificar o que os entrevistados conheciam sobre a política em saúde mental no que tange ao papel do CAPS como apoio em saúde mental na atenção básica. Quando perguntada sobre se tinha conhecimento sobre alguma diretriz do Ministério da Saúde que orienta a ação do CAPS como dispositivo de apoio à atenção básica, tivemos a seguinte reposta da Coordenação Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará, há 01 ano e 06 meses neste cargo (na época da entrevista): Bom na verdade essa é uma das funções, vamos dizer assim, “né”? Do CAPS, os CAPS eles tem um papel no território, que é um papel dentro de um componente mais especializado mais estratégico mas que é... Em dentro desse todo implica a possibilidade dele trabalhar no território com outros dispositivos de atenção de forma articulada e no caso da atenção básica, pela atenção básica não se caracterizar evidentemente por um dispositivo com tantas especificidades quanto o próprio CAPS, por exemplo, não há psiquiatras, não há psicólogos, sempre nesses dispositivos... O
  • 46. 46 papel dele é fundamental no uso... com uso dessa... dessa ferramenta, dessa estratégia de trabalho, “né”? No acompanhamento de alguns casos, “né”, no acompanhamento da equipe na possibilidade de discutir e acompanhar, monitorar, de certa forma, vamos chamar assim, trazer mais pra perto. Esse é um casamento que se busca na rede mas que ainda não é uma realidade. (G2, Coordenação Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará, Gestor, 2014). Nesta fala podemos observar que enquanto gestão existe um entendimento da Política Nacional de Saúde Mental de uma forma atualizada, na qual se pensa o CAPS como um dispositivos de referência em saúde mental especializado dentro de um determinado território e que não atua sozinho, que deve estar articulado com os demais pontos de atenção da rede psicossocial, principalmente no que diz respeito à cogestão de casos mas que no entanto não vem acontecendo no Estado e no município de Belém. Na fala dos técnicos dos CAPS foi possível identificar que em sua maioria conhecem a Política de Saúde Mental e alguns disseram que conhecem sobre o Matriciamento, dando ênfase justamente na cogestão, como podemos ver nesta fala: Sim, conheço através das leis, portarias que a gente lê, estuda que determina que as unidades básicas de saúde que tenham programas de saúde mental e que o CAPS também seja uma retaguarda para essas unidades, eu acredito até, faço uma análise que seja uma retaguarda pros dois lados, tantos para as unidades com o CAPS, como pro CAPS com as unidades porque quando eles precisam dentro do programa de uma consulta especializada eles são enviados pro CAPS pra realizar essa consulta dentro do CAPS e se aquele paciente que não está evoluindo dentro do Programa de Saúde Mental eles também encaminham pro CAPS pra ter um direcionamento, um procedimento mais intensivo, aí eu digo que todos os dois, que um serve de retaguarda pro outro, porque no momento que aquele paciente/usuário está bem, está estabilizado ele deve ser encaminhado pra dar continuidade a esse acompanhamento aí nós encaminhamos pra unidade, eu vejo assim, unidade e CAPS deveriam trabalhar juntos em parceria pelo mesmo objetivo, deveriam estar bem sintonizados. (T6, Técnico do CAPS Grão Pará, 2014). Estas falas corroboram com o que que diz o Art. 3º da Portaria 3.088/11 sobre o papel da Rede de Atenção Psicossocial: “III - garantir a articulação e integração dos pontos de atenção das redes de saúde no território, qualificando o cuidado por meio do acolhimento, do acompanhamento contínuo e da atenção às urgências” (Brasil, 2011), o que nos leva a afirmar que os gestores e parte dos técnicos do CAPS Grão Pará tem conhecimento da atual legislação em Saúde Mental, e analisam criticamente a atual situação da Rede de Atenção Psicossocial
  • 47. 47 no município de Belém onde o que vemos é ainda pontos de atenção trabalhando de forma isolada uns dos outros. Entendemos que conhecer sobre a política de saúde mental, suas legislações e afins deve ser de suma importância para quem trabalha em saúde mental posto que não é possível entender a dinâmica de seu funcionamento, desde as primeiras legislações que deram início a reforma psiquiátrica até as atuais legislações que não só retificam a proposta da reforma mas ampliam seu objetivo para uma assistência em saúde mental integrada, articulada e diversa em cada um dos níveis de atenção, dando ênfase à atenção básica e reforçando a atenção aos grupos vulneráveis (índios, jovens, moradores de rua), e sem isto a saúde mental continuará sob pena de ser resumida – e muito criticada – como uma política para acabar com os hospitais psiquiátricos. Trabalhar em saúde mental de maneira alheia à Política é estar fadado a mecanizar suas ações e corre-se o risco alto de velar atitudes manicomiais. No que diz respeito ao papel do CAPS na Rede de Atenção Psicossocial, ficou claro que as gestoras vêem este papel de maneira distinta. Para a gestora municipal, há 04 meses neste cargo (na época da entrevista), o CAPS tem o papel da reinserção social das pessoas com transtorno mental mas entende que esta visão de CAPS implica em admitir que algum ponto da rede falhou, como podemos ver neste trecho da entrevista: [...] Para que eles retornem ao convívio da sociedade, retornem ao convívio do trabalho, “né”? E até essa palavra “Retornar” pra gente é complicado, “né”? Enquanto política, enquanto a gente gestora, porque parece assim que eu deixei, “né”? Que ele saísse desse contexto, então eu não trabalhei em atenção básica, “né”? Então realmente ele saiu, “né”? Então ele vai ter que retornar. Então a gente vive realmente trabalhando nisso, de uma perspectiva de uma reinserção de um retorno às habilidades dele, “né”? Habilidades da vida diária, no que diz trabalho, no que diz cuidado com o próprio corpo, no que diz respeito, esse é o tratamento (G1, Referência Técnica em Saúde Mental do município de Belém, Gestor, 2014). Já a gestora estadual enfatiza que o CAPS ainda é visto como o ponto central dentro da rede pois ele é o serviço substitutivo ao hospital psiquiátrico dentro da rede, foi para este propósito que foi criado e a política de saúde mental durante muito tempo reforçou este status do CAPS como de fato o centro da rede, muito mais que um serviço especializado. Para esta gestora o CAPS continua sendo o
  • 48. 48 serviço centro mas suas funções foram ampliadas e hoje é preciso reconhecer que ele não funciona como fosse um serviço autônomo e alheio: [...] ele se pretende um substitutivo, evidentemente que durante muito tempo o foco somente nos CAPS foi muito grande a própria política de certa forma conduziu, “né”, a uma prática muito centrada dentro dos CAPS, “né”, ou para os CAPS, na criação de CAPS, na ampliação do número de CAPS no país inteiro e realmente foi espantoso o crescimento, na medida que os Hospitais Psiquiátricos iam fechando esperava-se que essa rede substitutiva se formasse e o CAPS era então o grande foco, o grande apoio, “né”, dessa rede toda, digamos, o grande peso do cuidado, “né”, de importância dessa rede de cuidado. De certa forma ainda está centrada nos CAPS, eu acho que o CAPS ainda é o grande é o grande foco, ainda é o ponto estratégico da rede como um todo da RAPS, “né”? Da Rede de Atenção Psicossocial. Então acho que ele tem essa função de ser o ordenador desse cuidado na saúde mental, “né”? A função básica dele é essa, por mais que o paciente ele esteja internado por uma questão de agudização “num” momento que ele precise de um outro dispositivo, espécie, da espécie hospitalar, do tipo hospitalar, do componente hospitalar, ele vai precisar do leito pra ficar alguns dias internado, mas ainda assim o grande cuidador é o CAPS, “né”? Então é o grande ordenador, o CAPS tem que saber que a pessoa está lá, mesmo quando a pessoa não está em cuidado no CAPS mesmo quando ela abandonou, mesmo quando ela ainda nem chegou no CAPS mas no momento da crise o CAPS é uma porta aberta. Não é o hospital que é a porta aberta é o CAPS que e a porta aberta, “né”? Claro o hospital também é, mas é inclusive a gente vê muito bem isso no desenho hoje dos componentes o CAPS aparece como um dos pontos de urgência e emergência, do componente urgência emergência, então ele tem uma função que foge do dos moldes hospitalares, do modelo hospitalocêntrico, e também do modelo atual do hospital das “batas brancas” e etc... Mas ele tem uma função muito parecida no recebimento no acolhimento dessa crise. O que ainda não é tão claro para todos os trabalhadores, “né”? Os trabalhadores ainda tem uma dificuldade muito grande em aceitar isso e ainda existe uma tendência a ver no CAPS um processo mais de ambulatório do que propriamente de... de um ponto de atenção que receba crise, “né”? (G2, Coordenação Estadual de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Pará, Gestor, 2014). Dois pontos importantes chamaram atenção na fala desta gestora e que consideramos importante discutir neste eixo. O primeiro diz respeito à ampliação de serviços CAPS no Brasil como um todo, e segundo Mota (2012) à nível de estado do Pará temos dados que demonstram que o período por exemplo, que compreende o ano de 2007 à 2010 e cujo um do objetivos da gestão era a “implantação e ampliação da rede de atenção à saúde mental do estado do Pará,” houve um aumento significativo no número de CAPS no estado, precisamente um salto de 23 para 56 CAPS implantados, sendo 37 cadastrados pelo Ministério da Saúde (MS), totalizando 56% de cobertura e passando da avaliação de péssimo para regular nos parâmetros do MS.
  • 49. 49 Importante destacar que foi também neste período que o CAPS Grão Pará foi reclassificado para tipo III, e ainda segundo Mota (2012) neste período o referido CAPS como único com o processo de transição de tipologia mais adiantado já atendia à crise e dava suporte ao Hospital de Clínicas. Este é um dado que chamou atenção da pesquisadora nas entrevistas realizadas pois os técnicos do CAPS Grão Pará confirmaram que este suporte ao Hospital de Clínicas era realizado sim. Aqui cabe uma análise à respeito desta “função” do CAPS Grão Pará com leitos de observação e funcionamento 24h pois o que vemos aqui é uma inversão do que recomendava a política de saúde mental, tomando como base não só a Lei da Reforma Psiquiátrica (nº 10.216/01, art. 4º) na qual o hospital é quem deve funcionar como retaguarda para os serviços substitutivos, no caso em que os serviços extra-hospitalares se mostrarem insuficientes (BRASIL, 2005), e também a Portaria nº 224/92 que era a atual neste período de 2007 à 2010 que recomenda: “Em caso de necessidade de continuidade da internação [após a alta], deve-se considerar os seguintes recursos assistenciais: hospital-dia, hospital geral e hospital especializado” (BRASIL, 2005, p. 248, [ ] nosso). Isto posto, é importante dizer que este suporte ao Hospital de Clínicas não era consenso entre os trabalhadores do CAPS Grão Pará, já que para a sua maioria receber pacientes para dar continuidade à internação no CAPS, e até mesmo receber pacientes fora da sua área de abrangência, significava “um leito à menos” para os usuários da sua área de abrangência, como podemos ver neste trecho da entrevista com uma trabalhadora [...] Então o CAPS antes mesmo de ser III já era referência de um bom CAPS, que realizava um bom trabalho e por ser o único CAPS III agora o Grão Pará que tem leito de observação continua mais referência ainda, porque, por exemplo, quando... Até nisso também tem uma discussão, quando iniciou o CAPS III que tinha o leito de observação os pacientes que estavam em situações de quadro mais estável, já estava prontos pra sair da internação do HC, na gestão passada já tinha sido firmado que eles poderiam ser acompanhados pelo CAPS, pelo nosso CAPS mesmo não sendo da área de abrangência porque esse CAPS como era o III seria pra dar apoio aos outros CAPS que ainda não tinham se transformado em III, mas foi um acordo que foi feito, não ficou nada estabelecido em portaria em nada. [E esse acordo ainda existe? - pergunto] Não, não existe porque o que aconteceu: os próprios funcionários não aceitaram mais, a própria gestão entendeu que não dava mais pra aceitar porque os leitos daqui estavam ficando cheios e o que que estava acontecendo era isso, e os pacientes da casa, nosso usuários quando precisavam não conseguiam uma vaga e nem acelerava e nem forçava os outros CAPS se transformarem em III aí aconteceu muitas vezes de os pacientes precisarem
  • 50. 50 e nós estarmos com pacientes de outra área de outra, de outro CAPS [do HC? - pergunto] não, não era do HC, as vezes de outros CAPS e dizer não pros nosso, aí começou a ter uma nova discussão, aí mudou a gestão aí o entendimento é: que cada CAPS se transforme em III e consiga mesmo acompanhar a sua demanda (T6, Técnica do CAPS Grão Pará, Trabalhadora, 2014). Aproveitando esta fala de T6, podemos discutir alguns pontos dentro do que a pesquisadora pretendia saber sobre o papel deste CAPS. Houve respostas diversas sobre isto, as quais podemos elencar: um primeiro ponto é que o CAPS Grão Pará na Rede de Atenção Psicossocial continua sendo retaguarda para o Hospital de Clínicas, como vemos nesta fala: “É como dá um apoio pro Hospital das Clínicas, ao meu ver entendo que seria isso” (N1, Técnica do CAPS Grão Pará, Trabalhadora, 2014). Ou ainda, neste trecho de entrevista: O nosso papel aqui é de funcionar 24h, dar apoio ao HC, quando o paciente vai precisar de urgência e emergência vem pra cá e a gente dá o suporte pra eles. [Como assim? - pergunto] Ele vem medicado né, já com todas as medicações conferida pelo psiquiatra de lá e aí ele vem pra cá já medicado, ele não vem em crise, geralmente ele vai pro HC em crise, aí o nosso papel aqui antes era por bairro né, hoje não, não tem mais isso, então o nosso apoio também pro município de Belém e funcionar como um gerenciador... (T1, Técnica do CAPS Grão Pará, Trabalhadora, 2014). E na fala da coordenadora do CAPS Grão Pará, há 03 anos neste cargo (na época da entrevista) É um órgão do estado mas que ele dá apoio ao município tendo como suporte o atendimento à pacientes em crise branda, “né”? Em crise... E suporte ao HC e os pacientes de alta, mas que precisam ainda ter um acompanhamento, mais de perto no caso, vamos dizer assim, de um acompanhamento de observação e repouso, e aí os pacientes são recebidos aqui [...] (G3, Coordenadora do CAPS Grão Pará, Gestora, 2014). Poderíamos provocar novamente a discussão sobre quem presta retaguarda a quem, mas basta dizer que a atual legislação em saúde mental, a Portaria 3.088/11 orienta o CAPS a ser retaguarda de um serviço de saúde mental, se necessário, sem discriminar qual, abrindo precedente para este fazer do CAPS Grão Pará um serviço de retaguarda também para o HC, como diz no Inciso 4º