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SE ESSE ARQUIVO FOSSE MEU

                                            Bruno Henrique Santana Rezende*

        Todos nós gostamos de guardar papéis velhos, fotos, móveis ou objetos
sem uso em casa. Esta prática é quase unânime na sociedade. Temos a
necessidade de preservar, ou ao menos não descartar, aquilo que contém
certa carga de sentimento relativo a algum fato ou pessoa específica. Tudo isso
pode ser considerado um arquivo.

        Os arquivos, numa concepção mais ampla, surgiram da necessidade de
se reunir, conservar e organizar os documentos que eram produzidos pelo
homem. Assim, a prática de salvaguardar documentos começou a ser
encarada como fundamental para a sociedade. Sem os arquivos, seria difícil
imaginar o progresso da ciência hoje, pois, nunca teríamos como saber até
onde alguém já pesquisou sobre determinado assunto. Viveríamos de uma
história do “disse-me-disse”, ou como dizem por aí, passando de boca em
boca.

        No estado de Sergipe temos uma instituição que guarda esses
documentos tão importantes para nossas vidas. Trata-se do Arquivo Público do
Estado de Sergipe. O APES, quando criado em 16 de junho de 1848,
funcionava como um departamento da Biblioteca Pública Provincial, e tinha
como objetivos guardar documentos do Governo Geral ou Provincial além de
notícias sobre acontecimentos, descobertas científicas e artes, entre outras
coisas.

        Essa condição de “anexo” acabaria em 1923, durante o governo de
Gracho Cardoso, quando o Arquivo público conquista sua independência. Mas,
infelizmente, em 1926 o Arquivo perde novamente sua autonomia e volta a ser
parte da Biblioteca Pública. Este fato durará até 1945, quando o Arquivo
Público é recriado, desta vez, tendo como parte integrante de sua estrutura
uma Biblioteca, uma Mapoteca e um Museu.


*Graduando em História pela Universidade federal de Sergipe, cursando Arquivologia,
ministrada pela Professora Maria Nely Santos. E-mail: bhsrezende@hotmail.com



                                        1
Nessas idas e vindas, criações e incorporações, é importante observar
que em praticamente toda sua história, o APES tem sido tratado de forma
secundária,o nosso Arquivo sempre ocupou um espaço simbólico: os porões.

        Não podemos falar em história de Sergipe sem citarmos a importância
do Arquivo Público. Pois é lá que estão milhares de documentos referentes à
nossa história, que dizem respeito direta ou indiretamente à vida dos
sergipanos. Mas há quem diga que o APES continua nos porões, sendo
tratado, por boa parte dos membros da administração pública estadual, e de
vários setores da sociedade como um simples depósito de papéis.

        Devo frisar que hoje o Arquivo Público do Estado de Sergipe dispõe de
mais de sete fundos (muito ricos) e quatorze coleções, entre públicas e
privadas, além de um grande acervo cartográfico e iconográfico, disponível
para quem quiser ir lá beber do manancial.

        É importante que se fale das imensas dificuldades passadas pelo APES.
Uma delas, ou a maior, é a falta de recursos financeiros, que acarreta na não
modernização necessária, e na dificuldade de contratação de pessoal
qualificado para trabalhar no arquivo. Sem falar na precária situação do prédio,
o Palácio Carvalho Neto, que passou por algumas maquiadasdurante esses
anos.

        Outra grande preocupação é que no nosso Estado não há um legislação
específica para o Arquivo Público nem uma tabela de periodicidade, que
oriente quando determinado documento deve ser recolhido ao APES. Além de
todas essas colocações, é preciso salientar que o último documento recolhido
pelo APES é datado de 1967; são quarenta e cinco anos de documentos sem a
devida preservação e estudo à que lhes servem.

        O nosso Arquivo Público deveria ser carinhosamente apelidado de “O
Guardião”, porque nele se encontram diversas informações que são de
extrema importância histórica para Sergipe, sem falar na carga documental que
retrata e nos faz compreender diversos acontecimentos da história do nosso
Estado.



                                       2
Precisamos, em caráter de urgência, de políticas voltadas para a
preservação do nosso patrimônio material e imaterial, e nessa reivindicação
friso a necessidade de voltarmos nossaatenção para o “palácio amarelo”,
localizado na Praça do Povo, conhecidamente Praça Fausto Cardoso.O
arquivo deve ser reconhecido como nosso, da nossa gente.

      Da mesma forma que cuidamos do que é nosso se faz necessário que
todos: pais, estudantes, professores e governantes, olhem para o Arquivo
Público do Estado de Sergipe de uma forma especial e sempre se perguntem:
“Se esse arquivo fosse meu?”.




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Importância do Arquivo Público de Sergipe para a história do estado

  • 1. SE ESSE ARQUIVO FOSSE MEU Bruno Henrique Santana Rezende* Todos nós gostamos de guardar papéis velhos, fotos, móveis ou objetos sem uso em casa. Esta prática é quase unânime na sociedade. Temos a necessidade de preservar, ou ao menos não descartar, aquilo que contém certa carga de sentimento relativo a algum fato ou pessoa específica. Tudo isso pode ser considerado um arquivo. Os arquivos, numa concepção mais ampla, surgiram da necessidade de se reunir, conservar e organizar os documentos que eram produzidos pelo homem. Assim, a prática de salvaguardar documentos começou a ser encarada como fundamental para a sociedade. Sem os arquivos, seria difícil imaginar o progresso da ciência hoje, pois, nunca teríamos como saber até onde alguém já pesquisou sobre determinado assunto. Viveríamos de uma história do “disse-me-disse”, ou como dizem por aí, passando de boca em boca. No estado de Sergipe temos uma instituição que guarda esses documentos tão importantes para nossas vidas. Trata-se do Arquivo Público do Estado de Sergipe. O APES, quando criado em 16 de junho de 1848, funcionava como um departamento da Biblioteca Pública Provincial, e tinha como objetivos guardar documentos do Governo Geral ou Provincial além de notícias sobre acontecimentos, descobertas científicas e artes, entre outras coisas. Essa condição de “anexo” acabaria em 1923, durante o governo de Gracho Cardoso, quando o Arquivo público conquista sua independência. Mas, infelizmente, em 1926 o Arquivo perde novamente sua autonomia e volta a ser parte da Biblioteca Pública. Este fato durará até 1945, quando o Arquivo Público é recriado, desta vez, tendo como parte integrante de sua estrutura uma Biblioteca, uma Mapoteca e um Museu. *Graduando em História pela Universidade federal de Sergipe, cursando Arquivologia, ministrada pela Professora Maria Nely Santos. E-mail: bhsrezende@hotmail.com 1
  • 2. Nessas idas e vindas, criações e incorporações, é importante observar que em praticamente toda sua história, o APES tem sido tratado de forma secundária,o nosso Arquivo sempre ocupou um espaço simbólico: os porões. Não podemos falar em história de Sergipe sem citarmos a importância do Arquivo Público. Pois é lá que estão milhares de documentos referentes à nossa história, que dizem respeito direta ou indiretamente à vida dos sergipanos. Mas há quem diga que o APES continua nos porões, sendo tratado, por boa parte dos membros da administração pública estadual, e de vários setores da sociedade como um simples depósito de papéis. Devo frisar que hoje o Arquivo Público do Estado de Sergipe dispõe de mais de sete fundos (muito ricos) e quatorze coleções, entre públicas e privadas, além de um grande acervo cartográfico e iconográfico, disponível para quem quiser ir lá beber do manancial. É importante que se fale das imensas dificuldades passadas pelo APES. Uma delas, ou a maior, é a falta de recursos financeiros, que acarreta na não modernização necessária, e na dificuldade de contratação de pessoal qualificado para trabalhar no arquivo. Sem falar na precária situação do prédio, o Palácio Carvalho Neto, que passou por algumas maquiadasdurante esses anos. Outra grande preocupação é que no nosso Estado não há um legislação específica para o Arquivo Público nem uma tabela de periodicidade, que oriente quando determinado documento deve ser recolhido ao APES. Além de todas essas colocações, é preciso salientar que o último documento recolhido pelo APES é datado de 1967; são quarenta e cinco anos de documentos sem a devida preservação e estudo à que lhes servem. O nosso Arquivo Público deveria ser carinhosamente apelidado de “O Guardião”, porque nele se encontram diversas informações que são de extrema importância histórica para Sergipe, sem falar na carga documental que retrata e nos faz compreender diversos acontecimentos da história do nosso Estado. 2
  • 3. Precisamos, em caráter de urgência, de políticas voltadas para a preservação do nosso patrimônio material e imaterial, e nessa reivindicação friso a necessidade de voltarmos nossaatenção para o “palácio amarelo”, localizado na Praça do Povo, conhecidamente Praça Fausto Cardoso.O arquivo deve ser reconhecido como nosso, da nossa gente. Da mesma forma que cuidamos do que é nosso se faz necessário que todos: pais, estudantes, professores e governantes, olhem para o Arquivo Público do Estado de Sergipe de uma forma especial e sempre se perguntem: “Se esse arquivo fosse meu?”. 3