1. Roberto Burle Marx transplantou as diretrizes do cubismo e do
abstracionismo geométrico para a organização de seus jardins de
plantas nativas brasileiras. Com isso, correspondeu aos anseios antro-
pofágicos de sua época modernista: devorar as influências estrangeiras
para apropriar-se delas, transformando-as ao gosto local. Com 180
itens – entre pinturas, fotografias e projetos –, a exposição comemora-
tiva do centenário de Burle Marx, atualmente em cartaz no MAM-SP,
é uma excelente oportunidade de conferir como ele fez de seu paisa-
gismo tropical uma linguagem moderna e internacional. Em Brasília,
duas instalações interativas mostram como a mesma flora brasileira
e a geometria que conduziram a arte de Burle
Marx hoje influenciam as pesquisas de ponta
que o mexicano Miguel Chevalier realiza com
sistemas generativos e arte interativa.
“Jardim é ordem. É impulso ordenado”,
escreveu Burle Marx, para quem o jardim era
um modo de organizar e compor a pintura,
utilizando materiais menos convencionais.
A ordem determinada pelas formas geométri-
cas aparece cedo em Burle Marx: é visível
desde as pinturas em óleo sobre tela dos anos
iniciais até o traçado do calçadão da orla
carioca, do Aeroporto Santos Dumont ao
Posto 6, em Copacabana.“As pessoas passam a
compreender melhor o paisagista ao conhecer
o artista plástico. São mídias diferentes, mas
existe uma unidade”, afirma Lauro Cavalcanti,
curador da exposição, que depois segue para
Recife, Brasília, Estados Unidos, França e Itália.
Chevalier, um pioneiro no uso da arte
digital, também apresenta uma proposta de
ordenação da natureza e reconhece identidade
comum com Burle Marx.“Sua destreza
cromática e formal mostra grande interesse
pelo cubismo, como ocorre na minha “Fractal
Flowers”, um jardim virtual em que as flores
são levadas ao extremo de sua geometrização.
As calçadas do Rio de Janeiro são como uma
prefiguração do pixel.A justaposição desses
mosaicos cria uma vibração, como nas
telas dos computadores”, afirma o artista,
que se inspirou na “luxúria da flora brasileira”
para criar seus jardins virtuais interativos.
Colaborou Fernanda Assef