1. 1 INTRODUÇÃO
No cenário das ciencias da saúde, observa-se uma tendencia em delimitar as fronteiras
entre aquilo que é normal e patológico. Consoante a isso, presencia-se movimentos que
anseiam em reunir sintomas característicos que classificam determinadas patologias, como
por exemplo a utilização do CID (Codigo de Internacional de doença), bem como, mais
recente, a elaboração do novo DSM (Diagnoticos de Saude Mental) que já esta em sua 5ª
edição. Esta pratica se mantém, devido a diversidade de saberes científicos que acabam
apresentando determinada compreensão de normal e patológico, com o intuito de subsidiar
suas práticas.
Nesse contexto, pensar os conceitos de normal e patológico requer um debate
articulado de caráter reflexivo, pois para compreende-los é necessário abordar diferentes
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OS CONCEITOS DE NORMAL E PATOLÓGICO: ENTRE UMA DIMENSÃO
CIENTÍFICA E UMA DIMENSÃO DO EXISTIR HUMANO
Rosana Rossattoa
, Rafael Wolski de Oliveirab
, Adriel Marangoni c
, Yasmin Fedrizzi Scola d
,
Adriana de Zorzi e
, Julia Jacobid
a
Licenciatura em Filosofia (UCS). Acadêmica de Psicologia (FSG); rosana_rossatto@hotmail.com
b
Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS). Docente do curso de graduação em Psicologia (FSG);
rafael.wolski@fsg.br
c
Acadêmico de Psicologia (FSG). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG);
d
Acadêmica de Psicologia (FSG). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG);
e
Acadêmica de Psicologia (FSG). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG);
f
Acadêmica de Psicologia (FSG). Faculdade da Serra Gaúcha (FSG);
Informações de Submissão
Autor Correspondente Rosana Rossatto,
endereço: Rua Os Dezoito do Forte, 2366
- Caxias do Sul - RS - CEP: 95020-472
Resumo
O presente artigo tem por intuito apresentar um dialogo reflexivo
acerca dos conceitos de normal e patológico, construídos ao longo de
diferentes períodos históricos. Para tratar dessas concepções se
buscou como teóricos, respectivamente, o psiquiatra e filósofo
francês Georges Canguilhem e Michel Foucault. Desse modo,
mediante a um estudo bibliográfico, buscou-se nas obras, O Normal
e o Patológico e a História da Loucura e outros escritos de Foucault,
promover um debate articulado a partir dos estudos historiográficos
sobre o normal e o patológico, propostos pelos autores, bem como
suas próprias compreensões de tais conceitos. Nessa direção, um
estudo conceitual transcende o sentido e significado das palavras,
oferecendo, dessa maneira, subsídios para se pensar as implicações
das vicissitudes de normal e patológico no campo da psicologia.
Palavras-chave:
Normal. Patológico. Normatização.
Poder.
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aspectos, sejam eles de cunho filosófico, histórico, social ou político. Para tanto, com o intuito
de buscar pensamentos que sirvam de material histórico para pensar o presente, realizou-se
um estudo da obra, O Normal e o Patólogico (2012) de Georges Canguilhem, a qual o autor
acessa diferentes momentos históricos a partir de diferentes autores, promovendo uma
discussão de caráter filosófico acerca das concepções de normal e patológico. Ademais,
utilizou-se de fragmentos de obras do filósofo francês Michel Foucault, tendo como maior
relevância sua clássica obra, História da Loucura. Aqui, é possível acessar aspectos
relevantes a diferentes contextos históricos que acabam determinando o que se caracteriza
como normal e patológico.
Nesse sentido, o objetivo do trabalho é propor uma discussão articulada entre tais
concepções, possibilitando uma reflexão ampla dos conceitos valendo-se de dimensões
históricas, sociais e política, bem como científica.
Nesta direção, o trabalho esta estruturado em dois capítulos. Num primeiro momento
apresenta-se os conceitos de normal e patológico contruídos historicamente, estudo realizado
por Canguilhem. O autor demarca as alternâncias de tais concepções em conformidade com
os discursos das ciencias medicas, que se utilizam de critérios para construção dos conceitos
que subsidiarão suas praticas. Indo além, apresenta-se as perspectivas em torno do normal e
patológico pensadas pelo Canguilhem. No segundo capítulo, expõe-se o discurso da loucura
analisado por Foucault em diferentes momentos históricos, o qual legitima as alternâncias
deste conceito que se corrobora frente a uma relação entre poder e saber.
2 O Normal e o patológico:uma construção histórica.
"A loucura é diagnosticada pelos sãos, que não se submetem a diagnóstico. Há um limite em que a razão deixa
de ser razão, e a loucura ainda é razoável. Somos lúcidos na medida em que perdemos a riqueza da imaginação.
(Carlos Drumond de Andrade).
Ao pensar as concepções de normal e patológico, Canguilhem (2012) propõe um
resgate de aspectos históricos. Assim, referindo-se a Hipócrates, filósofo grego, situa a doença
como resultado de conflitos entre forças internas, sendo o próprio organismo responsável para
o reestabelecimento do equilíbrio destas forças que se encontram em desordem. Desse modo,
o médico se torna o aliado da natureza orgânica do indivíduo, trabalhando para o processo de
cura.
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A natureza (physis), tanto no homem como fora dele, é harmonia e equlibrio. A
perturbação desse equilibrio, dessa harmonia, é a doença. Nesse caso, a doença não
está em alguma parte do homem. Está e, todo o homem e é toda dele. As
circunstâncias externas são ocasiões, e não causas. O que está em equilíbrio no
homem, e cuja perturbação causa a doença, são quatro humores, cuja fluidez é
precisamente capaz de suportar variações e oscilações, e cujas qualidades são
agrupadas duas a duas, segundo seu constraste (quente, frio, úmido, seco). A doença
não é somente desequlíbrio ou desarmonia; ela é também, e talvez sobretudo, o
esforço que a natureza exerce no homem para obter um novo equilíbrio
(CANGUILHEM, 2012, p. 10)
Nesse sentido, a partir dos pressupostos encontrados na Grécia antiga, Canguilhem
(2012) oferece uma compreensão quantitativa da doença, pois adoecer implica em um
desequilibrio interno, a uma desarmonia evidente no organismo. Trata-se de uma falta ou
execesso de possíveis substâncias, o que ocasionaria o adoecimento.
Indo de encontro com a abordagem hipocrática, canguilhem apresenta a perspectiva da
medicina egípicia e oriental. Esta expõe o adoecimento como uma variação qualitativa no
organismo, relacionando a doença ao aparecimento de parasitas no corpo, acreditava-se que a
“doença entra e sai do homem como por uma porta” (Canguilhem, 2012, p. 09). Ou seja,
pregava-se que o organismo adoecia devido a fatores externos. Assim, tanto elementos
externos tinham a capacidade de adoecer, bem como curar. Daí, justificam-se o uso de drogas
e ritos em busca da cura.
A partir dos estudos de Canguilhem (2012), reconhece-se duas compreensões distintas
da dicotomia saúde-doença. Na visão grega, hipocrática, a doença passa a ser algo dinâmico e
intrínsico. Nesta dimensão, não há intervenção externa, pois o organismo estabelece suas
próprias estratégias para aquisição do equilibrio. Assim, o potencial da cura é orgânico.
Portanto, neste contexto, os conflitos entre saúde-doença poderia ser vista como algo normal.
Em oposiçao a esta concepção, situada no Egito, tem-se a ideia de doença como algo
extrínseco. Ou seja, a doença é algo externo ao organismo, existe parasitas ou ações
sobrenaturais que acabam levando ao adoecimento. Aqui, a doença passa a ser concebida
como algo anormal, necessitando de auxílio externo para ser reinstaurada. Assim, o autor
conclui, “a doença difere da saúde, o patológico, do normal, como uma qualidade difere da
outra, quer pela presença ou ausência de um princípio definido, quer pela reestruturação da
totalidade orgânica” (Canguilhem, 2012, p. 11). Nesta direção, Canguilhem avança em sua
reconstrução histórica, possibiltando o reconhecimento destas abordagens extrínseco/intríseco
frente a compreensão saude-doença, em outros momentos históricos.
No período que compreende a Idade Média é possível reconhecer uma compreensão
de doença correlta a ideia de elementos externos que acabam implicando no adoecimento do
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organismo. No entanto, neste contexto, o indivíduo além da doença assume a culpa pela sua
enfermidade, pois as variantes são outras, doença/pecado e saúde/salvação. Desse modo, a
doença estava associada ao erro, ao pecado que acarreta a uma punição. Sendo assim, a
manutenção da saúde implica em não pecar, buscando a salvação. Nesta dimensão, é possível
reconhecer uma norma aplicada para obtenção da salvação e da saúde.
Indo além, Canguilhem (2012) apresenta o inicio da perspecitva moderna, expondo o
movimento de Comte e Bernard em resgatar a concepção de doença como algo intrínsico, sem
desconsiderar a possibilidade de agentes externos. Ressalva-se, que nesse período Pasteur
contribui para tal compreensão tendo comprovado a existência de microorganismos
provedores de doença. Assim, a partir de uma sustentação científica e não mais mística,
conclui-se que elementos externos podem provocar enfermidades. Para tanto, o cientista se
aproxima das ideias disseminadas pelo positivismo de Augusto Comte. Este influenciado
pelas ideias de Broussais, propagava a ideia de uma clínica experimental e mensurável, aonde
as variaveis são controladas para que possa haver uma intervenção posterior.
Faz-se necessário ressaltar que Broussais explicita como elemento fundamental para
vida a exicitação,
o homem só existe pela excitação exercida sobre seus orgãos pelos meios dos quais
é obrigado a viver(...)aplicar a doutrina fisiológica a patologia é pesquisar o modo
como essa ‘excitação pode se desviar do estado normal e contituir um estado
anormal ou doentio’ (CANGUILHEM, 2012, p. 22).
Neste contexto, patologia e fisologia se aproximam, sendo a doença entendida a partir
da fisiologia. Aqui, a patologia passa a ser algo apropriável para ciência. Desse modo, a
intervenção se baseia na restituição daquilo que esta alterado. Sendo que, esta implica em
falta ou excesso de algum elemento no organismo. Como afirma o autor, “a distinção entre o
normal e o fisiológico e o anormal ou patológico seria, portanto, uma simples distinção
quantitativa, se nos prendermos aos termos excesso ou falta” (Cangulhem, 2012, p. 23). Desse
modo, a patologia seria o desvio do normal, sendo que o normal, para Boussais, seria o
funcionamento dos orgãos de maneira uniforme e regular. Nesta dimensão, o normal é
entendido como normativo, conexo a algum valor.
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2.1 O normal e o patológico: uma compreensão do existir humano.
A partir da reconstrução histórica das concepções de normal e patológico, Canguilhem
(2012) afirma que antes de situar o que é de ordem normal, é mister pensar e construir uma
compreensão sobre a própria vida. Conforme o autor, é preciso reconhecer a vida em
constante devir, ou seja, viver implica em uma polaridade dinâmica. Sendo que, este
movimento remete à oscilação do organismo entre momentos distintos por definição.
Ademais, é preciso compreender esta oscilação como um acontecimento que faz parte da
existência da condição humana. Ou seja, não implica em situar um polo que seja negativo e
outro positivo, mas entender esta dinamicidade inerente ao curso do existir humano.
É por referência a polaridade dinâmica da vida que se podem chamar de normais
determinados tipos ou funções. Se exitem normas biológicas, é porque a vida, sendo
não apenas submissão ao meio mas também instituição de seu próprio meio,
estebelece, por isso mesmo , valores, não apenas no meio, mas também no próprio
organismo. É o que chamamos de normatividade biológica (CANGUILHEM, 2012,
p.165)
Diante disso, para Canguilhem (2012) no momento em que se apreende a vida como
polarizada, bem como o normal entendido como uma inclinação do orgão em alcançar novas
constantes que potencializem o funcionamento desse, a doença passa a ser assinalada como a
incapacidade do corpo de se colocar de maneira normativa. Contudo, este entendimento não
direciona a doença como resultante de desordem. Trata-se de vincular a doença a determinada
normatividade. Portanto para o autor, a ausência de normalidade não induz ao anormal. Aqui,
o patológico passa ser normal, pois a condição de estar vivo implicaria a possibilidade do
adoecer. Assim, saúde e doença implicam em uma norma de vida.
Não é absurdo considerar o estado patológico como normal, na medida em que
exprime uma relação com a normatividade da vida. Seria absurdo, porém, considerar
esse normal idêntico ao normal fisiológico, pois trata-se de normas diferentes. Não é
a ausência de normalidade que constitui o anormal. Não existe absolutamente vida
sem normas de vida, e o estado mórbido é sempre uma certa maneira de viver
(CANGUILHEM, 2012, p. 165)
Nesta direção, o autor infere a doença como um processo de construção valorativa.
Trata-se de um conceito edificado a partir de uma conjuntura de ideias justificadas por
valores. Assim, a doença refere-se a inadequação e a saúde ao adequado. Portanto, a norma
que possibilita a caracterização de determinada doença não é de ordem do natural, mas
construída em conformidade com determinados valores. Conforme Canguilhem (2012), por
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vezes, acontecimentos que fogem do habitual, por exemplo a mutação na dimensão da
biologia, necessariamente não pode ser considerada negativa, pois sugere-se a ideia de uma
evolução no sentido de garantir a vida. Com isso, não subjaz uma compreensão de patológico
como um desvio da norma, mas se trata de uma norma distinta, valorizada como inferior.
Neste contexto, emerge a medicina que por meio de uma operação de valores converte
os conceitos em ideais normativos de sua prática. Utilizando-se de critérios que delimitam
uma linha divisória entre aquilo que passa a ser normal ou anormal. Sendo que, para o estado
anormal é atribuído uma valoração negativa, ruim. Desse modo, este termo é
fundamentalmente valorativo não infere apenas uma diferença, subjaz a ideia de uma
“diferença ruim”. Aqui, reconhece-se a medicina como sendo moral, pois sua atividade
implica em estabelecer valores em relação aos quais a saúde e a doença serão discriminadas.
Para Canguilhem (2012), o conteúdo do estado patológico não pode ser deduzido de
maneira lógica ou analógica, do conteúdo da saúde, pois o estar doente implica uma nova
extensão da vida. Trata-se, de uma estrutura singular, individual alterada. As reações
patológicas nunca se apresentam no indivíduo normal da mesma forma e nas condições, pois
patológico implica uma relação com um meio novo, mais limitado, já que o doente não
consegue responder às exigencias do meio normal anterior. Portanto, para o autor o estado de
saúde implica na capacidade do indivíduo em relacionar-se normativamente com o meio, ou
seja, de criar normas vitais para segurança e continuidade da existência.
Nesta direção, é importante destacar dois conceitos estabelecidos por Canguilhem o da
normatividade e o da normalidade. O primeiro, implica na capacidade do indivíduo em
organizar-se em seu meio e compor normas para sua existênca. O segundo, subjaz uma ideia
de julgmento em torno da adequação a uma norma de funcionamento dita como mais
apropriada. Nesta perspectiva, a vida passa a ser um valor para o indivíduo que zela pela sua
manutenção, assim a medicina seria apenas uma extensão desse valor. Aqui, o próprio
indivíduo é capaz de realizar um julgamento de sua doença. Ou seja, a generalização do que é
patológico torna-se algo de grande imprecisão.
3. Os conceitos de “normal” e “patológico” em uma perspectiva foucaultiana.
Ao pensar os conceitos de normal e patológico é de extrema relevancia apresentar as
considerações do filosófo frances Michel Foucault, pois este levantou importantes discussões
para o entendimento daquilo que é considerado normal ou anormal. Aluno de Georges
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Canguilhem, propõe uma reflexão histórica sobre a visão da norma, tendo como
fundamentação a análise do contexto socio-histórico de produção da chamada “loucura”.
Nesta direção, Foucault (2004) salienta que com Broussais emerge os primeiros
pressupostos que fundamentaram e reorganizaram a medicina no século XIX, e assim, as
concepções de normal e patológico. Ou seja, a prática médica anterior a este período aludia
em uma regra de vida, acompanhavam-se práticas de isolamento, quarentena, que implicavam
na manutenção da saúde. Consoante a isso, a partir do século XIX a medicina “regula-se mais
pela normalidade do que pela saúde; é em relação a um tipo de funcionamento ou de estrutura
orgânica que ela forma seus conceitos e prescreve suas intervenções”(Foucault, 1998, p. 39).
Nesse sentido, para o pensador os conceitos de normalidade e anormalidade,
correlacionam-se a complexos mecanismos disciplinadores, tendo por objetivo impor aos
indivíduos certos modelos de comportamento vistos como adequados. Contudo, os indivíduos
se tornam disciplinados, sendo categorizados como normais quando assumem posturas
impostas como adequadas, ao contrário recebem o estigma de anormais. Desse modo,
segundo Foucault estamos inseridos em uma sociedade disciplinar que determina o que é de
ordem normal ou anormal. Daí. Justifica-se a loucura como produção social e não uma
condição irrelutável de certos sujeitos. Ou seja, o conceito de loucura varia segundo os
critérios legitimados em diferentes contextos sociais e históricos.
Desse modo, no trajeto histórico presente na maioria de seus escritos, Foucault
assinala, as diferenças que marcaram a passagem do período renascentista, que compreende o
século XV e XVI, para a chamada idade clássica e em seguida as que marcaram a passagem
da idade clássica para moderna. Nesse sentido, é possível reonhecer que pensar a loucura
requer uma reflexão sobre as relações de poder e saber nos diferentes contextos histórico-
social.
Com isso, em sua obra clássica História da loucura, Foucault começa falar sobre o
estigma imposto sobre os leprosos no final da Idade Média. Desse modo, os leprosos, os
portadores de doenças venerias e os loucos ameaçavam a sociedade, assim deveriam ser
banidos do convívio social. No que compreende ao período da renascença, emerge o navio
conhecido como “nau do louco”. Aqui, embarcavam pessoas que, simbolicamente, partiam
em direção a fortuna ou a revelação dos seus destinos. No entanto, tratava-se de um
mecanismo de afastamento do “louco” da visibilidade social, proporcionando mais segurança
para a população. Como salienta o autor, “A navegação entrega ao homem à certeza de sua
sorte” (Foucault, 1997, p.03). Aqui, o louco passa ser errante que parte em busca de sua sorte.
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O ponto de chegada do percurso histórico realizado pelo filósofo esta na acensão de
um novo tipo de sociedade. Trata-se da sociedade industrial que traz consigo o advento do
capitalismo, bem como a ascensão da burguesia. Neste contexto, as relações de poder são
marcadas pela vigilância, controle e correção. Nota -se que esse mecanismo de
afastamento do louco, é um exemplo claro de como a organização social coordena a vida
pessoal dos individuos, restringindo a liberdade e controlando comportamentos. Porém como
a sociedade consegue transmitir suas regras de tal modo que influencie os individuos que nela
vivem?
A sociedade e suas divisões está marcada pelo surgimento de instituições. Para que
exista uma instituição se faz necessária adoção de certas regras. A existencia de regras e
organização, são a principal característica de qualquer institucionalização. No contexto social,
observa-se a constituição de um número expressivo de instituições, como por exemplo: a
familia, a escola, o trabalho, as penitenciárias, etc. As instituições além de estabelecer suas
regras e condições buscam a participação efetiva dos individuos no funcionamento do que foi
estabelecido, gerando assim uma complementariedade, visto que regras são feitas para
individuos e permeiam suas vidas de modo expressivo.
Como consequencia da interação entre indivíduos e instituições temos a norma como
um conjunto complexo de regras que visa certo controle social. Neste caso, observa-se a
necessidade de normas que se apliquem para um grande número de pessoas e como
consequencia a existencia dos individuos se torna fortemente associada a existência das
normas. Esse processo é sutil de tal forma que parece natural, para a maioria das pessoas
delimitar os objetivos de vida conforme os limites estabelecidos pela disciplina social.
A finalidade ultima desse mecanismo é fixar o individuo a uma norma integrá-lo em
um esquema de normalização, mas ao mesmo tempo em que produz o normal a
disciplina produz o anormal. É possivel situar o retardado mental como individuo
inadequado a disciplina escolar; o delinquente à disciplina policial; (SILVA, 2008,
p. 146)
Indo além, o filósofo afirma a existência de um poder exercido sobre o indivíduo, que
busca controlar a vida em um sentido amplo (nascimento, morte, doença). Este denomina-se o
Biopoder. Sugeram-se estatísticas sobre mortalidade ou natalidade, inquietações que as
ciencias humanas aparecem como operadoras ideias de resoluções de problemas. Desse modo,
há um interdito na vida das pessoas que afirma como garantir a vida e sua expressão de
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maneira mais adequada, fortalecendo a ideia de uma possível delimitção daquilo que é da
ordem do normal e patológico.
4 CONCLUSÃO
Ao pensar a construção histórica dos conceitos de normal e patológico propostos por
Ganguilhem e Foucault, reconhece-se a importância desse olhar para história que oferece
subsídios para se estar pensando o presente e assim, a prática dos psicologos. Sendo que, esta
tarefa se mostra essencial na atualidade, pois observa-se um número crescente de
nomenclaturas que acabam ditando diferentes patologias, movimento que se destaca na mídia,
bem como na atenção popular. Nota-se que aumenta os indices de individuos portadores de
alguma patologia, pois a compreensão de doença acaba variando entre um desvio orgânico,
fisiológico ou a uma dificuldade de adaptação social. Então, para o contento das industrias
farmaceuticas, sugere-se intervenções medicamentosas ou um treinamento adaptativo para
inserção social.
Ademais, com Canguilhem e Foucault é possível reconhecer uma negação do caráter
científico da psicopatologia, para os autores qualquer experiência que tenhamos não significa
que seja determinada cientificamente. Nesse sentido, como futuros psicológos é importante
compreender o ser humano não como uma coleção de substâncias ou de estruturas psíquicas
ou mecanismos, mas como algo que emerge, em ebulição, como EXISTENTE.
Ainda nessa perspectiva, é importante perceber que buscar por uma compreensão dos
conceitos de normal e patológico, gera diferentes e diverosos questionamentos. Assim,
observa-se inquietações realacionadas à evolução dos conceitos, bem como entenimento de
diferentes autores, ou a influência das ciências médicas em sua organização. O importante é
que sua problematização, mostra-se essencial para a ciência psicologica. Através deste
diálogo reflexivo é que podemos assumir uma posição autêntica, contrário a um caráter
superficial em assuntos que apresentam importantes para uma efetiva tranformação da
realidade.
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6 REFERÊNCIAS
FOUCUALT, M. A História da Loucura na Idade Clássica. São Paulo: Perspectiva, 1997.
_____________. Arqueologia das Ciências e História dos sistemas de Pensamento. Rio de
Janeiro: Forense Unversitária, 2000.
_____________. O Nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
_____________. Microfísica do Poder. São Paulo: Graal, 2012.
SILVA, M.M. A Saúde Mental e a Fabricação da Normalidade: uma Crítica aos
Excessos do Ideal Normalizador a Partir das Obras de Foucault e Canguilhem. Interação
em Psicologia: Curitiba, 2008.
CANGUILHEM, G. O Normal e O Patológico. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 2012.
PAULUS. J. “Você é normal?”, Artigo. Revista Mente Cérebro. Ed. 240. São Paulo: Janeiro
2013.