A corrupção na saúde pública brasileira é sistêmica e generalizada, conforme revelado pelo escândalo em São Francisco de Itabapoana, no Rio de Janeiro, onde prefeito e secretários desviaram milhões de reais em verbas do SUS.
1. Product: OGlobo PubDate: 01-04-2012 Zone: Nacional Edition: 1 Page: PAGINA_F User: Schinaid Time: 03-31-2012 10:22 Color: K
6 Domingo, 1 de abril de 2012
O GLOBO
OPINIÃO
Corrupção na Saúde é sistêmica
V
istos só pelos números, os índices de A malversação de verbas do SUS não é exclu- ríodo, se perderam pelos desvãos de negocia- cessos de controle financeiro, de pessoal e de
atendimento médico pelo SUS em São sividade de São Francisco de Itabapoana. O tas arranjadas por agentes públicos, maus em- procedimentos efetivamente realizados (na
Francisco de Itabapoana indicariam episódio no pequeno município fluminense se- presários e atravessadores de influência para maioria dos casos comprovados de assalto a
que o pequeno município do Norte gue um protocolo de ações criminosas. Nele, o drenar dinheiro do Erário. Pior: o valor estima- verbas da Saúde, registram-se superfatura-
Fluminense, penúltimo no ranking do IDH do programa de saúde pública do do da roubalheira corresponde mento de preços, licitações viciadas e disso-
Estado do Rio, estaria promovendo uma revo- país torna-se refém de quadri- apenas a processos sobre frau- nâncias entre serviço prestado à população e
lução no seu sistema de saúde. Com uma popu- lhas organizadas para tirar pro- des identificadas pelo Ministério prestação de contas ao Ministério da Saúde,
lação de 41 mil habitantes, a prefeitura chegou veito da frouxidão dos mecanis- Antes de da Saúde. Num sistema que não como no episódio de Itabapoana).
a apresentar ao Ministério da Saúde planilhas mos oficiais de fiscalização dos prima pelo zelo no controle de re- A questão dos ralos da corrupção e do
registrando a realização de 40 mil exames men- repasses de verbas e de gerenci- destinar mais passes, é de se imaginar a exten- mau gerenciamento deve pautar qualquer
sais de rotina (sangue e urina) — quase 100% amento da aplicação do dinheiro são real da sangria. discussão sobre a criação de novas fontes
da população, percentual superior, por exem- repassado aos parceiros (esta- verbas a uma O próprio sistema, pela dimen- de financiamento para o setor. Por princí-
plo, ao de campanhas de vacinação. dos e municípios) da União. são e falta de estrutura, estimula pio, é simpática a ideia de se destinar mais
Mas, dissecados pela Polícia Federal, os su- Levantamento do governo fe- área viciada, os desvios. Entre os principais verbas para cuidar da saúde da população,
postos indicadores de primeiro mundo revela- deral mostra que, entre 2002 e agentes da corrupção no SUS mas desde que os dutos das fraudes sejam
ram-se o resultado de uma sangria de verbas 2011, a Saúde perdeu um orça- deve-se saneá-la aparecem prefeitos, secretários previamente lacrados. Pôr mais dinheiro
públicas. Em vez de curar doenças, repasses mento paralelo de R$ 2,3 bilhões, de Saúde, estaduais e munici- nesse buraco não resolverá os graves pro-
do governo federal, através do SUS, engorda- dinheiro que escorreu para bol- pais, e clínicas particulares con- blemas encontrados na ponta do atendi-
vam contas privadas. A drenagem era coman- sos privados por dutos que nu- veniadas. Os bilhões escorrem mento aos pacientes na rede pública e con-
dada, segundo a PF, pelo prefeito Beto Azeve- trem a corrupção. De acordo com dados do por tubos marcados por falta — ou no mínimo veniada. Apenas engordará ainda mais os
do, preso sob acusação de chefiar uma quadri- Tribunal de Contas da União, o setor responde falhas — de protocolos de defesa contra mal- esquemas que se especializaram em avan-
lha que, desde 2009, embolsou R$ 3 milhões. por um terço dos recursos federais que, no pe- versações, por deficiências graves nos pro- çar sobre os repasses oficiais.
Cristina recorre à tática do ‘inimigo externo’
A
Argentina está hoje muito melhor ajudada pela valorização das commodities anunciou planos de enviar um navio de guer- quais pretende explorar a partir de 2016. En-
que em 1982, quando o general Le- agrícolas de exportação, mas seu governo ra às águas territoriais das Malvinas. E conse- quanto isso, Cristina Kirchner denuncia que
opoldo Gualtieri, líder de uma fe- perde credibilidade diante da falta de um pro- guiu, em dezembro, que o Mercosul passasse os ingleses estão “depredando nossos recur-
roz e desgastada ditadura, decidiu jeto nacional, do estilo casuísti- a impedir que barcos com ban- sos naturais, nosso petróleo, nossa pesca.”
investir no sentimento nacionalista e tirou co de administrar, da venda de deira das ilhas atraquem em O caminho do confronto, típico do modo
do baú uma guerra contra a Grã-Bretanha uma imagem que não corres- seus portos. Em recente cúpula kirchnerista de governar, não levará a nada.
pela posse das ilhas Malvinas/Falklands. A ponde à realidade. Se a inflação Mobilização sobre segurança nuclear, em A posição tradicional da Grã-Bretanha em re-
ditadura, no fundo, não acreditava que Lon- sobe, faz-se uma intervenção no Seul, o chanceler argentino, lação às ilhas é só dialogar sobre soberania
dres fosse lutar pelas ilhas, mas cometeu instituto nacional de estatísti- sobre Malvinas Héctor Timerman, acusou a se assim o desejarem os cerca de 3 mil habi-
um erro terrível, que custou a vida a 650 cas e muda-se o índice; se a im- Grã-Bretanha de enviar um sub- tantes das Malvinas, que sempre manifestam
soldados argentinos e 255 britânicos. Os in- prensa noticia erros e escânda- não resolve marino capaz de transportar ar- a vontade de continuar sob domínio britâni-
gleses retomaram o território, em seu po- los no governo, punem-se os ve- mas nucleares ao Atlântico Sul, co.
der desde 1833, e a ditadura, desmoraliza- ículos de comunicação com per- problemas o que levou o representante bri- O truque do inimigo externo só dá resulta-
da, caiu no ano seguinte. seguição implacável; se as con- tânico na reunião, o vice-premi- do num primeiro momento. Logo, a realida-
Amanhã, completam-se 30 anos da invasão tas nacionais não fecham, no- domésticos er Nick Clegg, a um veemente de se impõe, como no caso da dura derrota
das ilhas pela Argentina. Os tempos são ou- meia-se um feitor para bloquear desmentido. sofrida pelos argentinos em 1982. Em rela-
tros, mas a política do país vizinho, mesmo na importações, inclusive de paí- A busca de petróleo por em- ção aos problemas internos, o mais indica-
democracia, não perde o cacoete de recorrer ses do Mercosul, como o Brasil. presas britânicas nas águas ter- do é investir na governança para enfrentá-
ao “inimigo externo” para camuflar proble- A Argentina apresentou à ONU uma queixa ritoriais das Malvinas concorre para acirrar los e, na medida do possível, resolvê-los.
mas domésticos. É o que ocorre com a presi- contra o que chamou de militarização britâ- os ânimos. Uma delas descobriu uma área Não adianta empurrá-los para as águas gela-
dente Cristina Kirchner. A Argentina cresce, nica do Atlântico Sul, depois que Londres com reservas de 350 milhões de barris, as das do Atlântico Sul.
Como se a história fosse outra
Cavalcante
RODRIGO BOTERO MONTOYA disso, os EUA reduziram sua depen-
C
dência do petróleo importado, de-
om a chegada da primavera vido ao aumento da produção inter-
no Hemisfério Norte come- na e queda no consumo. Em 2011, a
çam a brotar indícios tênu- produção diária de petróleo foi de
es, mas positivos de uma re- cerca de 10,3 milhões de barris, a
cuperação da atividade econômica maior desde os anos 80. Enquanto
dos EUA. A criação de emprego re- em 2005 as importações represen-
gistra uma tendência favorável. O se- taram 60% do consumo, em 2011 es-
tor industrial recupera fôlego. O sa- sa proporção foi de apenas 45%. Os
neamento do setor bancário melho- avanços tecnológicos facilitam a
ra as perspectivas de crescimento extração de “gás de xisto”, o que
do crédito. Os consumidores des- tem ajudado a reduzir o preço des-
pertam de sua le- se combustível.
targia e se prepa- As perspectivas
ram para comprar para explorar a
automóveis, bens Candidatos republicanos disponibilidade
de consumo durá- abundante de gás
veis e novas mora- fingem ser excedente do
dias. Alasca e a instala-
Note-se que a re- herdeiros de Reagan, ção de fábricas de
cuperação ainda é compressão de
frágil. Poderia ser e fazem de conta que gás permitiriam
abortada, com a aos EUA se con-
ocorrência de um Bush não existiu verter em um ex-
colapso financei- portador de gás li-
ro na Europa, ou quefeito.
uma explosão ge- Crescimento do
opolítica no Oriente Médio. Embo- PIB, estimado em 1,7% este ano, es-
ra os riscos não possam ser excluí- tá abaixo do crescimento potencial
dos, a probabilidade de isso acon- da economia americana. Embora
tecer diminuiu nos últimos meses. esse ritmo de crescimento seja in-
Os mercados financeiros saudaram suficiente para induzir uma forte
o recente acordo entre a Grécia e a redução do desemprego, não pode
União Europeia para evitar uma ser descrito como um comporta-
traumática declaração de morató- mento recessivo de demanda agre-
ria da dívida externa por parte das gada.
autoridades de Atenas. A reviravolta nos indicadores eco-
No setor de energia também se nômicos e a gradual melhoria que
observa uma melhoria, não obstan- vem ocorrendo na confiança do con-
te o aumento do preço da gasolina, sumidor afetam o panorama eleitoral.
que teve origem nas oscilações do Um ano atrás, as circunstâncias pare- viabilizar a reeleição de Barack Oba- ções primárias conflitivas, fingindo Party vão dificultar que prevaleçam
mercado global de petróleo. Por um ciam propícias para que os republica- ma. A fadiga com a guerra se agregava ser os herdeiros de Ronald Reagan, e na campanha presidencial.
lado, as temperaturas amenas do nos pudessem alcançar a meta que se ao pessimismo econômico. fazendo de conta que George W. Bush
inverno reduziram a demanda de tornou o objetivo central, e quase ex- Agora, os pré-candidatos republi- não existiu. As posições extremistas RODRIGO BOTERO MONTOYA é economista
combustível para calefação. Além clusivo, de sua agenda partidária: in- canos estão se desgastando em elei- que lhes foram impostas pelo Tea e foi ministro da Fazenda da Colômbia.
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