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A dança como meio de expressão de tradições no candomblé ketu 
Luana Montalvão - UFMS 
RESUMO 
A fim de desenvolver um estudo aprofundado sobre a religião afro-brasileira, 
mais precisamente o candomblé de Ketu, a proposta é extrair 
elementos estéticos de um culto que possui suas raízes em solos africanos, 
portanto necessitamos entender as etapas que o levaram a chegar ao que é 
hoje. 
O período em que os negros africanos foram trazidos em regime de 
escravidão para o Brasil é de grande importância no contexto histórico-cultural, 
pois acaba sendo o ponto de partida para a criação de uma nova religião, onde 
vários deuses são cultuados, com inúmeros símbolos, danças e músicas que 
buscam resgatar a fé de uma nação abalada pelo sistema. A princípio pouco 
difundida e muito repreendida, o candomblé passou a ganhar forças em seus 
praticantes e simpatizantes, que além da dedicação para com a religião 
também buscam o fortalecimento da cultura e resgate das tradições negras, o 
fim do racismo, o preconceito e a intolerância religiosa. 
Palavras-chave: Candomblé, dança, cultura, religião, Orixás
A dança como meio de expressão de tradições no candomblé ketu 
A religião dos orixás é de grande importância no contexto histórico-cultural 
brasileiro, pois proporcionou, mesmo que em condições de extrema submissão, 
a adaptação do negro escravo em solos brasileiros gerando uma grande 
miscelânea entre cultura, língua e crenças existentes nas diversas regiões da 
África. Por volta do século XVI, os negros bantos oriundos principalmente da 
África do Sul desembarcaram na costa do nordeste brasileiro, para um regime 
e condições muitas vezes sub-humanas, com jornadas de trabalho de mais de 
doze horas nas lavouras e plantações. Já no século XVII, as regiões de Congo, 
Angola e outras eram as responsáveis pelo fornecimento de escravos para o 
Brasil. Durante todo o período escravista era comum a convivência dentro das 
senzalas entre pessoas oriundas de regiões distintas, ocasionando conflitos e 
discussões a respeito da identidade religiosa, visto que cada etnia era 
responsável pelo culto a um orixá. Gerando a união de forças por um ideal 
religioso afro-brasileiro, impulsionada pela negação da imposição da crença 
cristã, como atos que provam a vontade de estabelecer a fé cristã sobre os 
negros, como o batismo forçado para “salvação da alma”. Como podemos ver 
em Pierre Verger: 
As circunstâncias em nenhum dos casos eram favoráveis ao 
estabelecimento de um espirito de compreensão e respeito 
para as convicções religiosas das comunidades nativas. Onde 
o Islã estava interessado, a conversão era um dever sagrado, e 
para o traficante de escravos era mais satisfatório e digno de 
louvor proclamar que ele estava desempenhando uma tarefa 
piedosa, resgatando a alma dos negros dos abismos 
impenetráveis da idolatria. Os católicos acrescentaram que era 
seu dever ajudar os negros a livrarem-se de cair nas garras dos 
hereges, e os protestantes felicitavam-se por deixá-los livres do 
abismo. Mas todos concordavam que o animismo era uma 
religião desprezível (apud BARRETI FILHO, 2010, p. 69). 
Os primeiros registros das casas de candomblé datam por volta do ano 
de 1800, no estado da Bahia, momento que uniu em um só culto dezessete 
orixás, lembrando que em seu país de origem, não eram somente os
dezessete, mas sim mais de duzentos deuses, variando conforme a região. O 
culto no Brasil passa a ser algo novo, segregado as escondidas, por muito 
tempo era considerada uma religião do populacho, pessoas humildes, pobres 
de cultura e de dinheiro, e após muito tempo que foi tomando cada vez mais 
espaço, se difundindo nas outras regiões do país e ganhando espaço nas 
outras camadas sociais. 
São feitas adaptações nos cânticos, danças, normas, preceitos e 
introdução de instrumentos musicais, até os dias de hoje. Uma das principais 
dificuldades encontradas nos cultos em épocas atuais é manter a tradição. 
Visto que os valores culturais mudaram significativamente gerando outros 
interesses não originais do candomblé. Contudo a manutenção do culto em 
determinados lugares tenta preservar ao máximo as doutrinas, passadas de 
geração para geração, difundindo os ensinamentos por forma da oralidade. 
O Candomblé conta com uma abundância em elementos estéticos, 
visuais, audiovisuais e conceituais, podendo transcender as barreiras do 
místico, do espiritual, fazendo com que se torne um estilo de vida, pessoas que 
abdicam de família, filhos, amigos e carreira profissional com o único propósito 
de louvar e servir ao seu próprio Orixá. 
A crença do Candomblé consiste em 16 deuses, que dançam para que a 
harmonia se estabeleça no universo e na vida das pessoas, cada um 
representando uma força da natureza, refletindo no Aiyê, a Terra, seu 
temperamento e seu humor. A dança é praticamente a essência do culto, sendo 
ela a responsável por aproximar o sobrenatural do humano, o espiritual do 
material, traduzindo sentimentos humanos em seres divinos. O presente texto 
objetiva demonstrar como a estética da religião afro-brasileira pode ser 
expressa artisticamente através dos movimentos corporais. 
A dança dentro da religião é uma questão de suma importância, pois é a 
característica que marca as grandes celebrações e toda harmonia ritualística, 
com aspectos que nos remetem a imaginar o porquê de tais movimentos ou 
gestualidade. Visto anteriormente que a crença no candomblé se constitui em 
divindades que possuem o domínio sobre elementos naturais, a cadência 
rítmica é guiada por composições de performance referentes a algo que teria 
acontecido quando aquela determinada divindade viveu sobre a terra, 
narrativas sobre guerras, criação, nascimento, atos que demonstram as
qualidades ou defeitos do orixá, podem relatar também mitos que o relacionam 
com os demais deuses. As cantigas, ou orikis, são entoadas no dialeto iorubá, 
determinado pelos sons dos instrumentos de percussão, os atabaques, do 
dicionário [sm (ár aT-Tabaq) Folc. Membranofônio de percussão direta usado 
nas danças e cerimônias, religiosas ou profanas, afro-brasileiras.] Consiste em 
um tubo de madeira, aberto em uma das extremidades e na outra coberto com 
couro, é tocado com as mãos ou nas cerimônias de candomblé com varinhas 
de marmelo (Cydonia Oblonga Mill), denominadas aguidavis. Dentro do 
cerimonial as cantigas são executadas conforme a ocasião ou necessidade 
durante o rito. Além desses instrumentos, no culto foram introduzidos a 
utilização do Gã, ou Agogô, compõe-se de duas até 4 campânulas de ferro, ou 
dois cones ocos e sem base, de tamanhos diferentes, de folhas de flandres, 
ligados entre si por vértices, extrai-se o som deles batendo com um aguidavi. E 
parecido com ele tem-se também o Alácorô, que ao invés de ser unido por um 
vértice, é unido com uma corrente, e para extrair o som devemos bater um no 
outro. Temos também o Adjá, ou Adjarin, quepode ser de uma, duas ou três 
sinetas, e o cabo é do mesmo material que pode ser de bronze, metal dourado 
ou prateado, utilizado para evocar os orixás nos iniciados. 
Durante as cerimonias, a sequencia dos cânticos e do bailado é 
denominado xirê, onde seguem uma ordem hierárquica, dançando em roda, no 
sentido anti-horário, de acordo com a importância de cada orixá. Depois de 
entoadas as cantigas do xirê, os orixás são evocados nas pessoas iniciadas, e 
a partir deste momento, aquele que faz parte da comunidade como iniciado na 
religião dos orixás, “recebe” e passa a dançar especificamente a dança de seu 
“santo”. A ordem que o xirê segue, é cantando para os seguintes orixás, em 
média, cinco cantigas entoadas para cada um deles. 
Ogum: Possui personalidade forte, sendo considerado um guerreiro, inventor 
das ferramentas, por isso todo metal é considerado elemento de Ogum. Seu 
sincretismo é com São Jorge ou Santo Antônio, dependendo da região. 
Oxossi / Odé: Irmão de Ogum é o Orixá responsável pela fartura, pois é quem 
vai a caça para trazer a comida para sua família. Sincretizado com São 
Sebastião ou São Jorge, dependendo da região. 
Omolu: Orixá responsável pelas doenças e pela cura. Possui o corpo coberto
de palhas, pois esconde os sinais causados pela varíola. Equivale a São 
Lázaro. 
Ossain: Caracterizado como o senhor da medicina, conhecedor de todos os 
benefícios e malefícios das plantas. 
Oxumare: Representado por uma serpente, a própria dualidade do ser. 
Acredita-se que ele passa metade do ano com características masculinas, e a 
outra metado com características femininas. Quando surge um arco-íris no céu, 
diz-se que é Oxumare vindo a Terra, para fazer uma ligação com os seres 
humanos. É sincretizado com São Bartolomeu. 
Nanã: É a mais velha de todas as Yiabás (Orixás femininos), a anciã. Seu 
domínio é a lama, o lodo e os charcos. 
Oxum: É sincretizada em alguns lugares com Nossa Senhora da Glória e em 
outros com Nossa Senhora Aparecida. É a deusa da beleza e do ouro, e seu 
domínio é toda água doce existente na terra, principalmente rios e cachoeiras 
de águas transparentes. 
Obá: Também é uma guerreira, porém não tão bela assim. Contam as lendas 
que Obá era apaixonada por Xangô, e por isso cortou a própria orelha para 
servir ao amado, acreditando que ele se apaixonaria por ela, mas ocorreu o 
contrário, Xango teve de Obá uma repulsa muito grande. 
Yewá: A própria transformação. Assim como Oxumare é representada por uma 
cobra. Encantadora e de beleza rara e exótica. 
Yansã / Iansã / Oyá: É uma bela mulher, guerreira, responsável pelos raios e 
tempestades. É sincretizada com Santa Bárbara. 
Xangô: Foi Rei na cidade de Oyó, na África, o inventor do dinheiro, em moedas 
de cobre. Muito bonito e charmoso, sempre rodeado de belas mulheres. O 
Deus do fogo e do trovão. É igualado a São Pedro ou São João Batista. 
Yemanjá / Iemanjá / Iemonjá: É o orixá das águas salgadas, sincretizada com 
Nossa Senhora da Conceição ou Navegantes. É vista como uma sereia, o 
grande útero da Terra, a geradora dos outros Orixás. É muito vaidosa e bonita. 
Além dos Orixás citados acima, antes do inicio das cerimonias canta-se para 
Exu. Algumas casas possuem também a tradição de cantar para Logunedé. E 
uma vez por ano são entoadas cantigas para Oxoguian e Oxolufan.
REFERÊNCIAS 
BARRETI FILHO, Aulo - Dos Yorubá ao candomblé kétu. São Paulo, Editora da 
universidade de São paulo 2010 
OLIVEIRA, Altair B. - Cantando para os orixás. Rio de Janeiro, Pallas, 2009 
OXALÁ, Adilson de - Igbadu: A cabaça da existência. Rio de Janeiro: Pallas , 
2001
Artes Visuais: questões de disciplinaridade ou de indisciplinaridade? (Segundo)1 
Marcos Antônio Bessa-Oliveira – IESF-Funlec2 
GT 1 - Práticas pedagógicas e pesquisa no ensino de Arte 
Resumo: Como fora proposto no trabalho apresentado e publicado nos Anais da 
primeira edição do “Seminário: Diálogos Visuais e Culturais no Cenário da Pesquisa 
em MS” – realizado no ano de 2011 – este trabalho, com o mesmo título daquele, 
ARTES VISUAIS: QUESTÕES DE DISCIPLINARIDADE OU DE 
INDISCIPLINARIDADE, dá continuidade as discussões sobre a problemática de 
disciplinaridade ou indisciplinaridade (that's the question) no ensino de Artes Visuais 
no Brasil. Ainda a título de explicação: naquele trabalho a discussão era tomada de 
um ponto de vista mais amplo; baseados em autores culturalistas estrangeiros. De 
certa forma, ainda que me valendo daqueles mesmos autores da primeira parte do 
ensaio, agora essa segunda edição toma como referencial teórico-crítico autores 
brasileiros que fizeram discussões pertinentes à minha temática: disciplinaridade X 
indisciplinaridade. Partindo dessa breve contextualização do trabalho, este ensaio 
propõe uma reflexão acerca das problemáticas do ensino de Artes Visuais serem 
muito disciplinares nas academias. Ora o referencial teórico é formal e estruturante, 
ora é libertário e sem fundamentação. Nesse sentido, este trabalho vem trazer mais 
uma contribuição acerca das formulações teóricas dos Estudos de Cultura (portanto, 
pós-colonais) para pensar novas proposições para o ensino de Artes Visuais. 
Palavras-chave: Ensino; Pesquisa; Diálogos; Artes Visuais. 
Maria Elisa Cevasco na “oitava lição” do seu livro Dez lições sobre estudos 
culturais (2008) aponta quatro diferentes perspectivas possíveis das quais se podem 
estudar a cultura pelos postulados teórico-críticos dos Estudos Culturais. Postulados 
1 Quando este trabalho começou a tomar corpo, lá na escrita de minha monografia do curso de Artes 
Visuais – ano 2009 – na UFMS, não imaginava que renderia tanto. Uma monografia, um livro e 
artigos. Tudo isso deve-se ao fato que a questão me incomoda até então. Neste sentido, justifico a 
divisão em partes deste trabalho: “Primeiro”, “Segundo” e “Terceiro” – “Artes Visuais: questões de 
disciplinaridade ou de indisciplinaridade?” – considerando que a conversa se prolongou além do que 
se esperava. Portanto, na primeira parte, o “Primeiro”, trata de uma visada mais ampla dos Estudos 
Culturais; nesta segunda parte, o “Segundo”, trata da questão dos Estudos Culturais X o Ensino de 
Artes Visuais em nível nacional e, finalmente, o “Terceiro” – que pretendo divulgar em breve, 
acreditando que teremos fôlego para tanto – tratará dos Estudos Culturais como possibilidade para as 
práticas artísticas de modo local. 
2 Professor e Coordenador dos cursos de Artes Visuais-Licenciatura e Turismo do IESF-FUNLEC em 
Campo Grande, MS. Mestre em Linguagens pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado em Estudos 
de Linguagens – PPG-MEL/CCHS/UFMS, foi bolsista CAPES, tendo como título do projeto de 
pesquisa “Clarice Lispector entre a pintura e a escritura de Água viva: um recorte comparativo-biográfico- 
cultural”, orientado pelo Prof. Dr. Edgar Cézar Nolasco. Graduado em Artes Visuais – 
Licenciatura – Habilitação em Artes Plásticas – UFMS onde foi bolsista do CNPq durante os quatro 
anos do curso. Coordenador do NECC-ENTREVISTAS: intelectuais em foco e membro do NECC – 
Núcleo de Estudos Culturais Comparados – UFMS. É autor de alguns artigos e livros sobre a 
temática.
que vou me valer aqui para tentar pensar uma forma de a disciplina de Artes Visuais 
valer-se dos Estudos Culturais como provável metodologia para o ensino e refletir a 
produção das Artes Visuais. (Entenda-se disciplina, Artes Visuais ou Estudos 
Culturais, como áreas epistemológicas do ensino) Apesar de nas “lições” de 
Cevasco referirem-se como perspectivas diferentes para se estudar a literatura, aqui 
penso-as como possibilidades para estudar em Artes a relação entre cultura e 
Estudos Culturais; quero entender que a literatura, as Artes de modo geral, são 
produtos de culturas, por isso, prefiro pensar em conjuntos de produção cultural. 
Estudar a cultura de um determinado sujeito social pela literatura, já é uma 
máxima que há tempos os letrados adotam como praxis. Todavia, como venho 
dizendo, faz-se sempre privilegiando as características formais dessa produção 
cultural e, literalmente, assassinando o provável sujeito que tinha por trás dela. 
Nesse sentido, os Estudos Culturais vêm propor desmarginalizar as outras tantas 
produções culturais que até bem pouco tempo na sociedade serviram, nada mais 
nada menos, como adornos de supostas “culturas” menores para os ambientes 
elitistas das culturas maiores. Partindo disso, sugiro para o campo das Artes Visuais 
– professores e artistas – que sejam pensadas primeiro em nível artístico-cultural 
social como a literatura e as outras diversas Artes. 
“Pode-se olhar a relação do ponto de vista histórico [...]”3 visando a privilegiar 
os estudos realizados pelos já consagrados pensadores culturalistas: Raymond 
Williams, Richard Hoggart, Edward P. Thompson e Stuart Hall, um pouco mais tarde, 
lembrando apenas dos fundadores da disciplina. “Pode-se considerar as mudanças 
que a nova disciplina trouxe para os estudos literários”4 como já afirmei em outro 
momento explicando a abertura que a Teoria Literária fez a Literatura Comparada, 
etc. “Pode-se, ainda, pensar os estudos de cultura como extensão do campo dos 
estudos literários”5 se levado em conta os estudos de quem acredita que os Estudos 
Culturais servem apenas para estudar a cultura social pela produção literária. 
Finalmente, é possível, ainda, na contemporaneidade, “[...] pensar os estudos de 
cultura como a disciplina que vem para “discutir” o valor da literatura”6; confessando 
meu partidarismo às Artes Visuais, é a perspectiva de que gosto mais, porque vem, 
3 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 
4 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 
5 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 
6 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138.
ao longo dos anos, pós-implantação dos Estudos Culturais no Brasil, acreditando os 
tradicionalistas letrados e literatos que é intenção primeira dos Estudos Culturais. 
Crê-se erroneamente numa destruição das altas culturas, pelos Estudos Culturais, 
valorizando as baixas culturas. 
As perspectivas apresentadas dão-nos possibilidades de vislumbrar diferentes 
direções a tomar ao resolver fazer abordagens críticas enviesadas pelos Estudos 
Culturais. Mesmo a de cunho histórico, que a meu ver é a mais fácil delas e 
largamente aplicada – não como leituras culturalistas, mas como leituras de culturas 
no plural – pelos professores e artistas visuais, pode-se tirar proveito nos trabalhos 
crítico-artísticos. Mas entendo, a partir disso tudo, que os Estudos Culturais não 
surgem nem com a intenção de simplesmente incomodar e muito menos validar os 
discursos tradicionais que imperam nas leituras feitas de cima para baixo. Valendo-me 
da “lição” de Cevasco, “[...] os estudos de cultura teriam vindo para deselitizar a 
cultura e celebrar o popular, o mais das vezes apoiados em um antiintelectualismo 
de longa tradição na produção cultural [...]”7, tanto na Grã-Bretanha, onde fora 
pensado, como no resto do mundo, por onde foi adaptado ao passar, como vemos 
hoje no Brasil. 
Nesse sentido, é possível dizer que os Estudos Culturais é um “câncer” para os 
cânones dos Estudos Literários, mas é um tratamento para os outros Estudos e 
produções artístico-culturais marginalizados ao longo de muitos séculos na história 
da humanidade. Penso nisso, considerando que a proposta de cultura comum para 
os Estudos Culturais é o pilar/base que deve estruturar toda sua fundamentação 
teórico-prática “[...] uma cultura em comum seria aquela continuamente redefinida 
pela prática de todos os seus membros, e não uma na qual o que tem valor cultural é 
produzido por poucos e vivido passivamente pela maioria”.8 É compreensível que 
não se trata de apenas defender os humilhados e ofendidos, a cultura em comum 
pensada por Williams vem contra qualquer tipo de binarismo. 
Para se conseguir essa postura, que também demanda uma mudança 
sociocultural da sociedade, pelos postulados defendidos nos Estudos Culturais, têm-se 
que ponderar criticamente as expansões dos meios de comunicação de massa e 
da indústria cultural: televisão, rádio, internet, etc., uma vez que deles também 
7 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 
8 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 139.
partem, além de consumos exacerbados, vários canais de informação e formação 
para esses sujeitos culturais. 
As formas de organizar a prática crítica dos estudos culturais, as suas teorias, se 
transformam em “construções” tão mutáveis, múltiplas e transitórias quanto as formas da 
cultura pós-moderna que almejam explicar e às quais querem se opor. É como se os 
estudos culturais assumissem a forma da cultura que estudam, em vez de descrevê-las e 
criticá-la.9 
Para as Artes Visuais, de modo geral, seria um achado a adoção de tal postura 
crítica: ajustar-se àquela produção ou aluno culturais aos quais fossem estudar, ao 
invés de simplesmente descrevê-los ou criticá-los no pior sentido do termo, ao dizer 
que isso presta e aquilo não; que estes alunos não passam de marginais e que 
aqueles das escolas elitizadas não o são. Adotar uma nova postura crítica demanda 
o envolvimento intelectual do sujeito supostamente detentor do saber, o crítico, o 
artista, o professor. Não basta, como é claro nos Estudos Literários, adotar uma 
moda teórica com a finalidade de suceder a anterior. As produções vão se 
alternando e alterando ao longo dos tempos, assim como os sujeitos sociais que a 
produzem, mas nem por isso podem ser lidos acriticamente assentada em uma 
crítica “ficcional”. 
Do meu ponto de vista este ainda não parece ser o problema das Artes Visuais. 
Ou seja, se nos Estudos Literários a “transitoriedade” teórico-crítica é um problema, 
nos Estudos de Artes Visuais a insistência imperante de um ranço teórico-crítico 
histórico e estético são a nossa problemática com reflexos para a disciplinaridade da 
área de Artes Visuais. Talvez o trânsito teórico-crítico mais aberto desses sujeitos – 
professores e artistas – proporcionar-nos-ia leituras menos rancorosas de nossas 
produções artístico-culturais. 
Nessa altura vale lembrar que o mundo concreto existe, quer o signifiquemos ou não. O 
fato de que só temos acesso a esse mundo por meio da linguagem não quer dizer que 
tudo seja apenas linguagem e não haja nada fora do texto [ou da produção artística].10 
É preciso lembrar que existe sempre um sujeito, provavelmente de carne e osso, por 
trás desses artefatos culturais. Ainda quero poder acreditar nisso. Antes de objetos, 
as obras de arte são práticas culturais, o que elas representam não são objetos, é 
uma coisa óbvia: A “Mona Lisa” não existe, “A criação do mundo” do teto da Capela 
também não; então, antes de objetos, os quadros, as pinturas, por exemplo, são 
práticas artísticas culturais desenvolvidas por sujeito socioculturais que, querendo ou 
9 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 145. 
10 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 146.
não, a história já se encarregou de falar de sua importância. Mas não é possível 
mais é servirmos de parâmetros para julgar isto ou aquilo com sentido de valor na 
contemporaneidade. 
Nesse sentido, é compreensível que professores e artistas, cada vez mais, 
devem se valer de outros postulados e relações teórico-críticos, ainda que de novos 
ou velhos referenciais. O que dever ser feito de forma diferente, é como se valer 
desses novos e velhos postulados. Em uma sala de aula, em uma galeria ou museu 
de Artes Visuais, temos sujeitos de várias classes sociais que, por conseguinte, 
ainda são de culturas diferenciadas. As percepções desses sujeitos sobre os 
diferentes trabalhos artísticos se darão de forma diferenciadas considerando essas 
relações, igualmente distintos se dão os seus entendimentos do mundo e da cultura 
do outro e de si próprios. Mas o que não quer dizer que seja inferior ou superior que 
a dos outros sujeitos letrados; é, no mínimo, diferente. 
Como venho dizendo no decorrer deste texto, os Estudos Culturais desde sua 
criação, defende uma postura política do crítico frente aos seus objetos de estudo. 
Na contemporaneidade, essa postura tornou-se ainda mais cobrada e questionada 
devido ao adentramento de novos postulados teóricos nas disciplinas que se voltam 
para questões mais localizadas a uma determinada cultural local. Porém, sem o 
sentido de local que busca o universal. Nesse sentido, na sua “nona lição”, Maria 
Elisa Cevasco vai observar que os Estudos Culturais como “[...] disciplina deve ter 
efeito prático, onde possa fazer diferença em termos de conscientização e ação 
políticas”,11 além do que “a linguagem é clara e chama à ação e à expansão da 
disciplina para um público não-especializado, em cujo contexto ela deve ter uma 
utilidade”.12 
Uma das questões observada pela crítica, ressaltada neste trabalho, é a 
importância prática, socialmente dizendo, do atuante culturalista. É imprescindível, 
dessa colocação de Cevasco, a preocupação com o ganho sociocultural que o 
sujeito terá a partir da intervenção do intelectual cultural. Já a outra questão, e que 
está intrinsecamente ligada a anterior, é a utilização da disciplina como prática 
analítica sociocultural. Nos Estudos Culturais a postura crítica do intelectual não 
deve servir para um endeusamento do crítico como um sujeito letrado e especial 
11 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158. 
12 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158.
frente ao seu objeto ou prática culturais. O que também não pode servir como uma 
explicação para um possível empobrecimento teórico-crítico intelectual. 
Nas Artes Visuais esse empobrecimento se dá quando os professores 
baseiam-se exclusivamente nos velhos e conhecidos manuais e referenciais 
tradicionais formulados pela suposta elite pensante que é a minoria dominante; já 
nas produções artístico-plásticas dá-se quando o referencial artístico-histórico é 
obviedade na produção artística segunda que é vista como cópia mal feita e 
inacabada da primeira. Essas relações nas Artes Visuais – pelo ensino ou pela 
plástica – dão-se pelo empobrecimento intelectual, desanimo profissional e 
comodismo institucional forçado pelo sistema de ensino e de produção de 
professores e artistas.13 
A instituição dos Estudos Culturais como possibilidades teórico-críticas 
demandam a adequação da teoria à produção cultural que se quer analisar, que 
imediatamente, necessita o reconhecimento da identidade sociocultural daquele 
sujeito que se encontra totalmente imerso e envolto na produção. Pois, como bem 
mostra as duas seguintes passagens de Stuart Hall, o conceito de identidade é tão 
transitório e desunificado que impossibilita leituras tradicionais a partir delas: 
A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente 
em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas 
culturais que nos rodeiam. É definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito 
assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são 
unificadas ao redor de um “eu” coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, 
empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identidades estão sendo 
continuamente deslocadas.14 
E ainda continua o autor: 
A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao 
invés disso, à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se 
multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de 
identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos 
temporariamente.15 
Apenas a partir do reconhecimento dessa diferença cultural o intelectual, professores 
e artistas culturalistas vão poder interferir com sua leitura na resposta sobre 
determinada prática cultural. Antes disso, corre-se o risco de privilegiar mais ou 
13 Sobre essa questão vale conferir o livro: BESSA-OLIVEIRA, Marcos Antônio. Ensino de Artes x 
Estudos Culturais: para além dos muros da escola. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2010; 
Onde trato a temática do ensino como falta de interesses de forma mais ampla e clara. 
14 HALL. A identidade cultural na pós-modernidade, p. 12-13. 
15 HALL. A identidade cultural na pós-modernidade, p. 13.
menos, um ou outro, e cair em binarismos tradicionais, retomando as velhas formas 
de discriminação histórico-social – de raça, gênero e classe. 
Ao negar com veemência qualquer tipo de determinação ou restrição, essa formulação 
deixa de reconhecer um fato básico da vida social: identidades, produtos culturais, 
modos de vida não são construídos em condições livres, e essas condições apresentam 
limites e exercem pressões que não desaparecem só porque intelectuais escolhem não 
enxergar. Ao não reconhecer os fatos, a teoria perde em pelo menos duas frentes: deixa 
de descrever o que existe, condenando-se à irrelevância, e de reconhecer a natureza da 
prática que descreve, arriscando-se a fazer asserções errôneas e, ainda pior, jogar água 
no moinho do que pretendia opor.16 
É possível afirmar, a partir do que expõe Maria Elisa Cevasco, que as produções 
culturais, principalmente as que são constituídas nas bases culturais menos 
favorecidas, são formuladas entre grandes pressões socioeconômicas e políticas – e 
o que é pior, de um poder econômico e político hegemônico, que é eleito pela 
maioria desfavorecida, que deveria protegê-los – que acaba por sufocá-los. 
Deste prisma até aqui esboçado, posso afirmar que o cânone intelectual 
brasileiro entende os avanços dos Estudos Culturais como “ervas daninha” na 
lavoura. Posto que “[...] reduplicam as características do tempo na medida em que 
se apresentam como mais uma mercadoria, se oferecendo como uma forma 
diferente, cheia de novidade, de estudar cultura”,17 fato que assusta a tradição. Por 
outro lado, os Estudos Culturais sinalizam para esta mesma tradição canônica, 
disciplinar e acadêmica, que não existe nenhuma teoria exclusivista e hegemônica, 
ao menos no plano territorial brasileiro, que dê conta de nossa “diversidade” 
artístico-intelectual e das nossas diferenças sociais e culturais. 
Na décima “lição” das Dez lições sobre estudos culturais, bem como no texto 
“A indisciplina Estudos Culturais” de Beatriz Resende e, pode ser percebido também 
nos textos “O espaço nômade do saber”, “Teoria em cris e” e “O não-lugar da 
literatura” de Eneida Maria de Souza – que como já disse antes embasam minhas 
formulações nesta parte do texto –, uma inter-relação entre eles na abordagem da 
temática Estudos Culturais. Ou seja, todos os textos agora tratam da (in)disciplina 
culturalista refletindo seus postulados nos campos teóricos disciplinares brasileiros. 
Nesse sentido, entendo que é preferível tratar deles tentando manter um diálogo 
entre as ideias formuladas neles pelas autoras. Mesmo tendo total consciência que 
16 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 165. 
17 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 166.
nem sempre Cevasco, Resende e Souza concordam com as abordagens feitas por 
cada qual. 
Sendo assim, Resende incita a provocação no início de seu texto de que há 
“[...] a necessidade do reconhecimento do tempo e do espaço de onde falamos”; 18 e, 
Cevasco e Souza partem, cada uma a seu modo, suas reflexões a partir de questões 
ocorridas em ABRALIC’s diferentes, mas, que a meu ver, caminham para 
questionamentos que vão desembocar em questões parecidas: estudar cultura 
brasileira é o estudar Literatura Comparada? E, estudar Literatura Comparada é o 
mesmo que estudar Estudos Culturais? Pensando nisso, como é possível estudar 
melhor as produções culturais – principalmente a artística – brasileiras? E, ainda, 
adaptando a questão: como se pode estudar/ensinar e praticar/estudar melhor as 
Artes Visuais na contemporaneidade brasileira? Tenho certeza de que não são os 
cursos de Histórias da Arte que saem numa cavalgada quixotiana, desde o 
Renascimento passando por todos os ismos da história, que nunca chegam à 
produção contemporânea. 
Em 1946, o crítico Antonio Candido19 dissera que estudar Literatura Brasileira 
era o mesmo que estudar Literatura Comparada. Essa assertiva do crítico foi 
discutida no Seminário da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura 
Comparada – realizado no ano de 1986. Doze anos depois (1998), a temática 
central do seminário girava em torno da discussão – Literatura Comparada = 
Estudos Culturais?.20 Desta questão que se formulava, entende-se que a crítica 
pretendia não só discutir a introdução de novos postulados teóricos oriundos do 
estrangeiro no Brasil, mas antes, tratava-se, a meu ver de 
Reconhecermos nossa posição peculiar na era das mudanças globais, situada daquele 
lado do mundo onde estão, fundamentalmente, os que pagam os custos, implica em 
mantermos nossa capacidade crítica, função que resta ao intelectual. 
Identificado o tempo e o espaço global de onde falamos, a tarefa seguinte é dispormos a 
enfrentar o debate inevitável dentro da chamada academia, nos espaços consagrados 
de produção do saber, de elaboração dos cânones e definições de disciplinas.21 
A elaboração de Resende coloca-nos, literalmente a todos, na parede para que 
tenhamos a competência crítica de assumir uma postura. Seja pensando nas Letras 
18 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 9. 
19 Biografia do autor. 
20 Sobre a história desse e de outros Seminários da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura 
Comparada – valer conferir o site: www.abralic.org.br. 
21 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 10-11.
ou nas Artes Visuais temos que def inir um lado de atuação: críticos x acríticos? Você 
vai prestar constar ou um desfavor à sociedade? 
Nesse sentido, penso como certas as palavras de Candido, considerando que 
tratar a cultura brasileira a partir de nossas produções artístico-literárias – um dos 
objetos de estudos naquela época da disciplina de Literatura Comparada –, e que 
aqui encampo as produções artístico-culturais em geral, pode ser o mesmo que 
estudar Estudos Culturais. Mesmo que no período entre meados dos anos de 1940 
ainda prevalecesse entre os estudiosos de Literatura Comparada uma dicotomia 
crítica entre Cópia X Modelo para se pensar a produção artístico-cultural brasileira. 
Já tal afirmativa mostra que as leituras críticas já não se apegavam meramente ao 
texto literário. Logo, havia uma expansão das análises críticas as quais 
consideravam outros quesitos como forma de leituras literárias, a exemplo: contextos 
sócio-históricos, relações pessoais culturais, identidades, inter-relações culturais, 
etc. Talvez deve-se essa abertura exatamente ao que gerava a dúvida da época: 
Literatura Comparada = Estudos Culturais? Como mostra Eneida Maria de Souza: 
Embora nossa formação acadêmica tenha sido sempre pautada por inclinações mais 
teóricas e reflexivas, a perspectiva analítica comparativista tem o mérito de ampliar essa 
visão. Ao trazer para o palco do debate a pergunta sobre o lugar que ocupa na tradição 
da cultura nacional — minada, desde os primórdios, de ideias e importações estrangeiras 
—, a literatura comparada procura se nutrir desse heteróclito tecido cultural.22 
É curioso pensar em um trabalho que já está tratando da relação Artes Visuais X 
Estudos Culturais, observar que ainda nem existe uma disciplina denominada de 
Artes Comparadas nos departamentos de Artes Visuais pelo país! 
Com base no exposto, pode-se afirmar que os Estudos Culturais já se faziam 
presentes no Brasil exatamente na mesma época em que eram formuladas suas 
bases na Inglaterra por seu representante maior Raymond Williams. No Brasil, 
parece haver um consenso crítico, independente da vertente que concorde ou não 
com a ideia de que a literatura brasileira é galho da literatura portuguesa, que a 
entrada pela porta da frente dos Estudos Culturais aqui se deu no Seminário da 
ABRALIC de 1998. 
Como muitos outros países, o Brasil teve formas de estudos culturais bem antes de a 
disciplina se transformar em mais uma grife acadêmica a ser exportada pelo mundo 
anglo-saxão. Mas a data oficial de seu reconhecimento institucional no país pode ser 
1998, ano em que a Associação Brasileira de Literatura Comparada, Abralic, que reúne 
22 SOUZA. “O espaço nômade do saber”, p. 41.
professores e pesquisadores da área, escolheu para seu congresso bianual o tema 
“Literatura Comparada = Estudos Culturais?”.23 
Nesse sentido, vale uma indagação: e em Artes Visuais quais eram os seus 
aborrecimentos teórico-críticos e artísticos a ser pensados? 
Acredito nessa possibilidade relacional entre o que se produzia de crítica 
literária aqui no Brasil com o que pensava Williams na Inglaterra, em meados da 
década de 1950, sobra a criação de um estudo de cultura, levando-se em conta que 
ambas as reflexões teóricas se davam na intenção de formular um estudo voltado 
para a compreensão e a reformulação do que se formulava ser as culturas 
“menores”. Mas com uma diferença: na Inglaterra, valeu-se da classe trabalhadora 
para se discutir o conceito de cultura elitista, enquanto no Brasil partiu-se da 
literatura nacional e, que agora, proponho que se parta das produções artístico-culturais 
do ensino e da produção em Artes Visuais. Tendo sempre em mente, é 
claro, que no Brasil o processo de repensar as questões culturais se deu a partir da 
tentativa de resolver o dualismo entre cópia e modelo – dependências culturais –, 
enquanto na Inglaterra a questão pertinente era se fazer “conhecer” as culturas e 
suas práticas populares. Questão que se fez rachar em grupos os estudos 
brasileiros. 
A primeira coisa que me agrada nos Estudos Culturais é apresentarem-se como estudos. 
Instala-se, imediatamente, uma provisoriedade, uma abertura, que me parece 
indispensável em um momento de questionamentos, de necessariamente assumirmos as 
dúvidas que vivemos diante do século que se inicia.24 
Provisoriedade e abertura que se tornam itens de confrontos para os literatos mais 
tradicionais contra os Estudos Culturais. 
Maria Elisa Cevasco “partilha” da ideia da produção artístico-cultural brasileira 
como subtração da europeia por considerar que essa condição de colonizador é fato 
consumado, mas nem por isso, defende a questão como solução para pensar a 
nossa produção cultural: 
23 CEVASCO. “Estudos culturais no Brasil”, p. 173. 
24 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 11.
No caso da crítica-cultural, que mais de perto interessa à exposição de uma pista 
possível para o desenvolvimento dos estudos culturais no Brasil, essa dialética entre as 
peculiaridades do Brasil e a história do capitalismo na sua dinâmica internacional foi 
explicitada pelo próprio Roberto Schwarz. [Atravessada pela crítica culturalista sabemos 
que um tema definidor da cultura brasileira se desenvolve em torno da dualidade 
nacional/estrangeiro, onde o nacional é sempre, para usar outra fórmula do crítico, por 
subtração.25 (Grifo meu) 
Talvez, arrisco um palpite, essa porção mais ácida de Cevasco que considera a 
subtração cultural brasileira, mas não uma solução crítica deve-se à sua porção 
marxista de percepção do mundo capitalista. 
Já Eneida Maria de Souza, estudiosa que defende a tendência crítica nacional 
“a favor da cópia”, nos vê sem remorsos nenhum com sentido de traição a um 
modelo. Entendo que a título de subversão crítica, Souza coopta aos Estudos 
Culturais para movimentar os debates26 crítico-intelectuais empoeirados nos 
departamentos institucionais: 
Essa prática, voltada para o exame particular do texto, para os detalhes de construção e 
as minúcias de efeitos de linguagem, continua a ser um de nossos grandes trunfos. Com 
a retomada de pesquisas inseridas num projeto mais abrangente e em perspectivas — 
em que se diminui o valor profundidade analítica e se concentra no olhar horizontal e em 
superfície —, ampliam-se os horizontes da leitura textual, atingindo-se dimensões de 
natureza cultural. 
A abordagem intercultural revitalizada pela pesquisa comparativista [atravessada pela 
crítica culturalista] encontra na prática tradutória, inaugurada pelos ensaístas e poetas 
paulistas, uma das formas mais convincentes para que sejam redimensionadas essas 
relações. A tradição das literaturas nacionais se enriquece diante da possibilidade de 
trair modelos e de repensar origens.27 (Grifo meu) 
Aproveito a passagem de Eneida de Souza para chamar a atenção dos atuais e 
futuros professores e artistas visuais ao termo prática tradutória: referendado pela 
autora, é necessário explicar que toda teoria antes de ser aplicada como 
epistemologia do saber, deve ser “traduzida” para a cultura local antes de ser 
repassada. Faz-se necessária essa explicação considerando que “alguns poucos” 
podem não conseguir fazer uma “tradução” das discussões e formulações que 
proponho pelas Letras (Estudos Culturais) para pensá-las nas Artes Visuais. 
Posto isso, mesmo com a dicotomia existente nas vertentes de Estudos 
Culturais no Brasil, percebe-se que ambos os Estudos, tanto o inglês quanto o 
brasileiro, têm a mesma preocupação e “[...] o desejo de intervenção para mudar a 
sociedade, e de uma intervenção prática”,28 mesmo que cada vertente quisesse, nas 
25 
26 C.f. SOUZA. “A teoria em crise”, p. 67-78. 
27 SOUZA. “O espaço nômade do saber”, p. 43. 
28 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158.
suas respectivas diferenças, fazer alterações no modo de pensar a sociedade, como 
já venho afirmando ao longo de quase todo este trabalho; além de romper com os 
limites disciplinares tradicionais: 
Interessa-me a ruptura inicial com a burocrática investigação universitária organizada em 
disciplinas, caudatária do modelo de vida de conventos, fechados ao mundo e divididos 
em celas. Mesmo a pesquisa que hoje se pretende interdisciplinar, ou transdisciplinar, 
permanece frequentemente tributária das disciplinas, divisões do saber sacralizado de 
que o professor se faz zelador.29 
Mas como bem observa Williams, os Estudos Culturais, por ele antes pensados, têm 
entre seus objetivos, dos quais gostaria que fosse retirado algum proveito – pelo 
professor e artista – para pensarem o ensino e a produção em Artes Visuais: 
[...] levar o melhor que se pode produzir em termos de trabalho intelectual até pessoas 
para quem esse trabalho não é um modo de vida, ou um emprego, mas uma questão de 
alto interesse para que entendam as pressões que sofrem, pressões de todos os tipos, 
das mais pessoais às mais amplamente políticas – se estivermos preparados para 
assumir esse tipo de trabalho e revisar os programas e a disciplina da melhor maneira 
possível, nos locais que permitam esse tipo de troca, então os estudos culturais têm um 
futuro efetivamente notável.30 
Quero entender o desejo de Williams capaz de ser pensado seja nas Letras, seja 
nas Artes Visuais. Uma vez que as teorias também circulam e devem ser 
modificáveis ao longo dos tempos e pelos locais por onde elas passam. 
Na esteira de Raymond Williams, penso que vale as discussões entre os 
diferentes discursos teórico-críticos brasileiros se a intenção for a de enriquecer o 
discurso crítico-cultural brasileiro acerca de podermos pensar e ensinar melhor as 
questões culturais nacionais. Caso contrário, e o que de fato não dá mais para se 
fazer com nossas produções artístico-culturais é simplesmente classificá-las de 
modelos ou cópias; importadas ou nacionais; local ou universal; bom ou ruim; presta 
ou não presta, tendo sempre como parâmetros e pano de fundo as produções 
artísticas internacionais, as estético-formais e, o que é pior a meu ver, a inexistência 
por trás delas de um sujeito autoral. 
[...] o papel de intelectual, de crítico, de questionador, quando aliado ao de fruidor e de 
analista da textualidade, pode despertar no teórico da literatura [entenda-se da cultura] 
uma atração pelo campo mais do que interdisciplinar dos Estudos Culturais. 
Quando, além disso, o que se propõe é o natural e inevitável cruzamento realizado pelo 
comparativismo, seja como for que seja entendido, o terreno se torna inevitavelmente 
fértil para os Estudos Culturais, ou Estudos de Cultura, [...].31 
29 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 12. 
30 WILLIAMS, apud CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 156. 
31 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 23-24.
Afinal, parece ser um consenso crítico brasileiro ainda não saber resolver e 
responder a questões duplicadas entre nacional/universal que, inclusive, podem ser 
encontradas em certas manifestações atuais. 
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29.
INVESTIGAÇÕES REFLEXIVAS SOBRE A CULTURA NO ESPAÇO DA ARTE 
Profa Ma. Aline Sesti Cerutti 
Curso de Artes Visuais/Universidade Federal de Mato Grosso do Sul 
GT1 Arte e Cultura 
Resumo: 
A arte é um campo específico de produção simbólica expressiva e em um contexto 
sóciocultural realiza diálogos profícuos com os elementos da cultura. 
A partir de experiências vivenciadas no Curso de Artes Visuais/UFMS, através da 
orientação das pesquisas, dos estágios e de análises documentais, foi possível 
elaborar o relato contemplando investigações reflexivas sobre a cultura no espaço da 
arte. A ideia principal das discussões propostas está estruturada em torno dos 
conceitos culturais considerados importantes na leitura e compreensão do contexto 
histórico-cultural presente tanto no trato das temáticas étnicas culturais, quanto da 
arte contemporânea. Nesta última, foram citadas algumas obras observadas na 8a 
Bienal do MERCOSUL: Geopoéticas (RS, 2011) que interagem com as reflexões no 
texto. Alguns conceitos culturais são apresentados no trabalho, como forma de 
fomentar reflexões sobre a formação das identidades, os processos interculturais, as 
mestiçagens e hibridismos, a etnicidade, dentre outros. 
Palavras-chave: conceitos culturais, temáticas étnicas, ensino de arte. 
Introdução 
Cultura pode ser compreendida como a construção participativa dos indivíduos 
num sistema geral de formas simbólicas. Geertz (1989, p.4) concorda com Max 
Weber quando diz que “o homem é um animal amarrado a teias de significados que 
ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e suas análises. (...) 
como uma ciência interpretativa, à procura do significado”. 
É um campo de conhecimento multidimensional que interage com as outras 
ciências como a antropologia, a sociologia, a história, a arte. Segundo Fernando 
Hernandez (2000, p.53) “o olhar da produção artística é um olhar cultural”. 
É necessário ao produzir, pesquisar ou ensinar arte, considerar aspectos mais 
profundos do que os que aparecem no meramente visual, é olhar a arte de uma 
época como produto de uma complexa rede de relações sócio-culturais. 
Os ambientes educativos no ensino de arte, em escolas ou nos museus, 
tornaram-se espaços profícuos de diálogos reflexivos entre a arte e a cultura. Os 
mediadores dessa tarefa são o professor de Artes, o produtor cultural e o artista, 
propositores do diálogo interativo com a sociedade, que intervêm dessa forma, na 
reprodução ou ressignificação de ideias, valores e representações sócioculturais. 
Como professora das disciplinas Fundamentos da Cultura e Cultura Brasileira e 
Estágio no Curso de Artes Visuais- Licenciatura e Bacharelado/UFMS, a autora do
2 
presente trabalho tem sempre a oportunidade de entrar em contato com os 
acadêmicos, realizar orientação de pesquisas, conhecer referências curriculares e 
outros documentos com a finalidade de acompanhar o processo de ensino de arte 
nos estágios nas escolas públicas de MS. Interagir com obras de arte em espaços 
como no ano de 2011 na Bienal de Arte do MERCOSUL, intitulada Ensaios de 
Geopoética1, possibilita experiências para ampliar os referenciais e diálogos entre a 
arte e cultura. Algumas obras integram texto, tornando-se exemplos reflexivos. 
O relato discute os conceitos culturais aplicados às temáticas étnicas culturais 
(Africanidades e Povos indígenas) e à arte contemporânea, no ensino de arte. 
1. Conceitos Culturais nos diálogos com as temáticas étnicas culturais 
Esta reflexão poderia ser iniciada com os seguintes questionamentos: Que 
imagens os mediadores estão discutindo nos ambientes educativos? Enfocam a 
história, a arte e a cultura de que povos? As discussões conceituais contribuem para 
reflexão crítica e ressignificações sócioculturais? 
Estas questões remetem a “velhos discursos”, porém não menos importantes 
que outrora, que continuam pertinentes nas reflexões sobre o ensino de arte. 
As imagens no ensino de arte são na sua grande maioria as obras de arte, no 
entanto, outras que compõem a cultura visual como os quadrinhos, a publicidade, a 
ilustração são pouco citadas. A seleção das mesmas fica a cargo do professor de 
Artes que, nas escolas estaduais de Mato Grosso do Sul, recebe orientações através 
dos Referenciais Curriculares elaborados pela Secretaria de Educação do 
Estado/SED/MS. O conteúdo de História da Arte aparece nos documentos oficiais 
como um eixo norteador. Ele é delineado no título principal de conteúdos para os 
semestres do 1o ao 5o ano no Referencial Curricular do Ensino Fundamental2. 
Observe-se o exemplo no 1o bimestre do 1O ano: 
Explorando possibilidades com artes visuais, música e teatro, por meio da 
História da Arte internacional e nacional com ênfase na cultura de Mato 
Grosso do Sul, fazendo uso de: ponto, linha e formas, Cores primárias e 
secundárias, desenho, canções infantis, música popular e erudita, cultura 
popular, linguagem teatral, cultura afro-brasileira, indígena e demais etnias 
(SED, 2012, p. 133). 
1 Bienal de Arte do MERCOSUL: Ensaios de Geopoética . Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/ 
Acesso: 20/04/2012. 
2 Secretaria de Estado de Educação/SED/MS. Referenciais Curriculares do Ensino Fundamental. Disponível em: 
http://intra.sed.ms.gov.br/portal/Arquivos/Publicos/referencial_curricular_completo_ensino_fundamental_VERSAO 
_PRELIMINAR.pdf. Acesso em: 10/03/2012.
3 
A orientação para o ensino de arte tem o enfoque de uma grande área (artes 
visuais, música e teatro), onde se deve trabalhar de um lado com a “História da Arte 
nacional e internacional”, e apenas isso já contemplaria as produções de diferentes 
povos, mas também foi enfatizado o trabalho com a “arte da cultura de Mato Grosso 
do Sul”. Além disso, consta no final da citação a “cultura afro-brasileira, indígena e 
demais etnias3”, o que levanta questões reflexivas. A primeira é de como ainda se 
apresenta uma dicotomia da arte/história da arte e da cultura ao se tratar da arte. 
Como se fosse possível compreender a arte sem conhecer o contexto sóciocultural 
em que foi produzida. Há que se dizer, no entanto, que é possível discutir conceitos 
culturais sem que eles sejam relacionados à arte. E, a segunda é sobre a construção 
etnocêntrica ou eurocentrismo histórico no ensino de arte, privilegiando o 
conhecimento sobre a arte e a cultura de alguns povos e silenciando ou distorcendo o 
de outros como, os indígenas e os afrodescendentes. Justificando assim, de forma 
enfática, o trato da cultura dessas etnias no currículo. Isto se deve também à 
promulgação da Lei No 11645/20084, que torna obrigatória a História e Cultura Afro-brasileira 
e Indígena no currículo, em especial na disciplina de Artes. 
Comparando os dados do Referencial aos resultados das pesquisas realizadas 
pelos acadêmicos5 do Curso de Artes Visuais, sobre o estudo das Africanidades e o 
dos Povos Indígenas nas instituições públicas de MS, é possível concluir que há uma 
produção de conhecimento bem generosa sobre essas duas temáticas, acessível aos 
professores, incluindo ótimos sites e bibliografias nas escolas, elaborados pelo 
Ministério da Educação e Cultura/MEC. 
Com relação às Africanidades, as pesquisas nas escolas revelam que os 
professores têm conhecimento sobre a Lei e acesso a vários materiais didáticos 
sobre o tema, trabalham muito sob a forma de projetos, relacionados a datas do 
calendário escolar, porém não citam suas referências bibliográficas e imagéticas na 
pesquisa. 
3 No Referencial Estadual (2012) as temáticas “Cultura afro-brasileira, indígena e demais etnias” são abordadas 
em todos os bimestres do 1o ao 5o ano, do ensino fundamental, desaparecem nos anos que se seguem e voltam 
no 2o bimestre do 7o ano. 
4 Lei No 11.645, de 10 de março de 2008, altera a Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, para incluir no currículo 
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. 
5 SANTOS, Tiago Nelson dos. Arte Africana Tradicional e Afro-brasileira: contexto histórico e cultural, avanços no 
ensino fundamental. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. 
BOLDORI, Aveline Karen Tenório. Aplicabilidade da Lei 11.645 de 10 de março de 2008. A Cultura Indígena na 
Escola. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. 
BARROS, Lívia de Oliveira. Aproximações antropológicas em arte: culturas em diálogo. Trabalho de Conclusão de 
Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011.
4 
Deve-se saber, por exemplo, que o estudo da História Africana Tradicional é 
fundamental para se compreender as influências na cultura afro-brasileira. Para tanto, 
Serrano (2008, p.16) diz que é necessário a “interconexão de diversas disciplinas e 
de campo de conhecimento. Ao lado da História, a contribuição da geografia, da 
sociologia, da ciência política e marcadamente da antropologia”. Esses estudos não 
se remetem mais à questão biológica ou racial, mas à questão cultural, uma ligação 
que dá voz e visibilidade ao passado e presente desses povos. 
Com relação aos povos indígenas, os professores afirmaram conhecer a Lei, 
porém apresentaram muita dificuldade em relatar suas experiências sobre o tema e 
não citaram referências. Tratam em geral sobre a arte Kadiwéu e Terena em MS. 
Dessa forma, fica a dúvida sobre a qualidade do repertório imagético, das referencias 
e mediações culturais relacionadas às discussões sobre as temáticas étnicas 
culturais. 
Luciano (2006, p.31) chama a atenção para a diversidade cultural dos povos 
indígenas, “constitui-se como uma sociedade única, na medida em que se organiza a 
partir de uma cosmologia particular própria que baseia e fundamenta toda a vida 
social, cultural, econômica e religiosa do grupo”. 
Para compreendermos a arte e a cultura afro-brasileira e indígena é necessário 
perceber as particularidades e a complexidade existentes na produção simbólica 
dessas etnias em diferentes contextos histórico-culturais, incluindo mediações e 
reflexões críticas sobre os conceitos culturais básicos. Assim será possível discutir, 
por exemplo, sobre construção e ressignificação das identidades e tradições, 
processo de mestiçagem e reetinização no Brasil, dentre outros, que revelam 
representações e estereótipos sobre estes povos ao longo da história. 
Há que se compreender que os discursos relacionados à construção de uma 
nação brasileira mestiça que permearam os anos 30 até os 70 do século XX, 
valorizando a mestiçagem como identidade étnica cultural nacional marcada pela 
integração das três etnias (o branco, o negro e o índio), passam por transformações 
no Brasil contemporâneo. Segundo Sergio Costa (2001) há um processo de 
pluralização cultural e política, buscando-se a etnicidade nas identidades, fase de 
reconstrução de raízes culturais étnicas pelos grupos socioculturais. Etnicidade 
presente nos discursos dos afrodescendentes nas comunidades quilombolas e na dos 
povos indígenas. Esta nova visão se deve também à reorganização das comunidades
5 
étnicas, à ressignificação das tradições e à reconstrução das identidades na 
sociedade brasileira, conquistas políticas como ações afirmativas governamentais. 
Segundo Hall, a identidade não pode ser vista como uma coisa acabada, mas 
sim como identificação. Um processo em andamento construindo biografias ao longo 
da vida. Vários “eus” fragmentados numa unidade são constantemente reestruturado 
e sempre pressupõe relação com o outro. 
A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já está dentro 
de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é “preenchida” a 
partir de nosso exterior, pelas formas através das quais nos imaginamos ser 
vistos por outros (HALL, 2006, p.39). 
Há que se reconhecer as especificidades étnicas culturais, os pontos de 
resistência, as ressignificações e a reinvenção das tradições compreendida como: 
A tradição é um elemento vital da cultura, mas ela nada tem a ver com a 
mera resistência das velhas formas. Está muito mais relacionada às formas 
de associação e articulação dos elementos (HALL, 2008, pág. 243). 
Segundo Stuart Hall, a cultura deve ser compreendida de forma dinâmica 
fortalecendo identidades, não no sentido de homogeneizar, mas de compreender a 
convivência das diversidades e o entrecruzamento das culturas, criando novas formas, 
bem como os hibridismos culturais. 
Canclini (2006, p. XXV) discorre sobre os processos de hibridização, no sentido 
de que estes ocorrem em condições históricas e sociais específicas, em meio a 
sistemas de produção e consumo e assim, “não basta descrever misturas 
interculturais é preciso lhes dar poder explicativo, situando-os em relações de 
causalidade e ter a consciência critica dos limites, do que não se deixa ou não quer 
ou não pode ser hibridado”. Os conceitos culturais aplicados às temáticas étnicas 
culturais são pertinentes para compreensão das representações e ressignificações no 
mundo contemporâneo. 
2. Conceitos culturais nos diálogos da Arte Contemporânea no ensino de arte 
Na contemporaneidade, as fronteiras cada vez mais porosas, a facilidade de 
comunicação com o uso da internet, os comércios transnacionais, a migração de 
pessoas e mercadorias favorecem a interculturalidade. 
Enquanto os termos “multiculturalidade” e “pluriculturalidade” significam a 
coexistência e mútuo entendimento de diferentes culturas na mesma 
sociedade, e o termo “interculturalidade” significa a interação entre as 
diferentes culturas. Isto deveria ser o objetivo da educação interessada no 
desenvolvimento cultural (BARBOSA, 1998, p.14).
6 
Os processos multiculturais e interculturais favorecem o acesso à diversidade de 
acervos visuais e culturais, dando visibilidade a povos pouco vistos ou excluídos da 
História da Arte. 
A História da Arte tornou-se o grande eixo articulador dos conhecimentos no 
Referencial Curricular do Ensino Fundamental. Porém a partir do 6o até o 9o ano, há 
uma ênfase na História da Arte, estabelecida por períodos artísticos, como se pode 
observar no segundo bimestre do 6 o ano: 
Conhecimento e expressão da arte internacional e nacional com ênfase na 
cultura de Mato Grosso do Sul, por meio da História da Arte e elementos das 
linguagens visuais, musicais e teatrais: Arte Egípcia e Grega (SED, 2012, p. 
151). 
E dessa forma, a Arte Moderna só vai ser tratada, segundo o documento, no 4o 
bimestre do 8o ano e a Arte Contemporânea, no 3o bimestre do 9o ano. As obras de 
arte contemporâneas deveriam dialogar entre si e com outras de outros tempos, 
dando visibilidade para a estética da América Latina, da África, da Ásia, dos povos 
indígenas e outros, percebendo similitudes e particularidades das culturas e épocas. 
Levando a discussão para os museus e galerias, Barbosa (2005) exemplifica 
exposições de obras organizadas em salas onde o tempo histórico foi ressaltado por 
comparações entre artistas e não por cronologia e sequencialidade. 
Nus de Marlene Dumas dialogam com nus de Matisse, levando-nos a refletir 
sobre as diferenças de representação do corpo da mulher definido por ela 
própria e a representação da mulher como “o outro” sob o olhar masculino. 
Serota define sua abordagem como aquela que desenha paralelos entre 
períodos, explora relações entre artistas (BARBOSA, 2005, p.107). 
Barbosa (2005) enfatiza a recepção pelo apreciador e a leitura dos campos de 
sentido da arte como fundamentais para sua compreensão, e diálogos entre as 
poéticas, como no exemplo dado na obra de Marlene Dumas, artista contemporânea 
africana e Matisse, artista europeu modernista. 
Democratizar o espaço da arte, promover o diálogo entre as culturas, não 
significa a defesa de guetos culturais, nem preferência por esta ou aquela cultura. A 
ideia é ampliar os referenciais e possibilitar aos estudantes o pensamento crítico a 
partir de diversos pontos de vista, culturais e étnicos, importantes na formação das 
identidades. 
Na perspectiva de Banks (2001, p.315), o estudo da diversidade étnica e 
cultural não deve apoiar o etnocentrismo nem o nacionalismo. A identidade 
étnica pessoal e o conhecimento de outras identidades étnicas é essencial 
para a compreensão e o sentimento de bem-estar pessoal que possa 
promover a compreensão intergrupal e internacional (CAO, M. In BARBOSA, 
2005, p. 201).
7 
O debate com os conceitos culturais deve ser considerado importante para 
compreensão das imagens da cultura visual, bem como as obras de arte, presentes 
na produção, pesquisa e ensino de arte. São exemplos algumas obras vistas na 
Bienal do MERCOSUL intitulada Geopoética/2011, realizada no Rio Grande do Sul. 
Segundo seus organizadores, a exposição propôs explorar alternativas às ideias 
convencionais de Nação, questionando as retóricas visuais e signos culturais (mapa, 
bandeira, hino, passaporte), discutindo sobre a transterritorialidade e as estratégias 
de autoafirmação da identidade cultural, propondo alternativas à cidadania. De 
algumas obras serão apontados alguns conceitos culturais que podem ser discutidos, 
começando-se pelos artistas Jean François Boclé e Bernanrdo Oyarzún6 
Fig. 1 e 2. Jean François Boclé – 
Consommons racial! [Consumo racial!]. 2005/2011 
Produtos comerciais de diversos países 
Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/235 
O artista caribenho Jean François Boclé, reside na Europa. Com a instalação 
intitulada “Consommons racial!”, dialoga sobre as imagens dos afrodescendentes e 
dos povos indígenas nos rótulos de produtos alimentícios e de limpeza. A obra 
desvela comunidades “invisibilizadas”, cuja publicidade reforça estereótipos de certas 
etnias na função de empregados domésticos, produzindo identidades nacionais. 
O artista Bernardo Oyarzún (Chile), etnia Mapuche, com a obra intitulada 
Cosmética, propõe a reflexão crítica sobre a própria crise de identidade, de origem 
chileno-mestiça, em relação aos cânones sociais, políticos e estéticos, que imperam 
no mercado de consumo. Segundo o artista, ele discute a “autoexposição como 
resultado exploratório de um americanismo vivido em carne própria”. 
6 BOCLÉ, François e OYARZÚN, Bernardo. Bienal DO MERCOSUL: Ensaios de Geopoética. Disponível em: 
http://www.bienalmercosul.art.br/ Acesso em: 03, mar.2012.
8 
Fig. 3. Oyarzún- Chile 
Cosmética. Vídeo. 2008 
Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/21 
Conceitos e temáticas culturais estão presentes na arte tanto do passado como 
do presente. As visualidades estão condicionadas ao contexto histórico-cultural e 
dominar os conceitos possibilita dar sentido à visualidade. 
A obra de Regina Silveira intitulada “To be continued ”, aborda as identidades 
culturais fragmentadas e interculturais, produtos da geopolítica. Ela é composta por 
peças de um quebra-cabeça gigante, que não se encaixam e representam imagens 
estereotipadas e fragmentadas da América Latina, como por exemplo, Che Guevara, 
Carlos Gardel, a Virgem de Guadalupe, os mariachis, as igrejas coloniais, as culturas 
indígenas pré-colombinas, as frutas tropicais, Carmem Miranda, militarismos e outros. 
Fig.4. To be continued... (Latin American puzzle) [Para ser continuado... (quebra-cabeça latinoamericano)]. 
1998. Vinil adesivo sobre espuma. 40 x 50 cm, 110 peças. 
Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/261 
Silveira7(2012) diz que o quebra-cabeça formado de narrativas abertas e 
caóticas “misturam diferentes geografias, épocas e culturas. Uma obra (quase diria 
‘turística’) que revela o olhar precário do ‘outro’ estrangeiro, que conhece apenas, 
quando muito, estereótipos da nossa cultura e paisagens”. 
Questionando as próprias identidades, Barthélémy Toguo, com a obra “The New 
World clímax”. O artista nascido em Camarões vive na França e observa que, embora 
7SILVEIRA, Regina. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/261 Acesso em: 13/04/2012.
9 
as fronteiras físicas sejam delimitadas politicamente, as fronteiras culturais 
encontram-se cada vez mais porosas, produzem hibridismos e transculturalidade. 
Fig. 5. Barthélémy Toguo 
The New World climax [O clímax do Novo Mundo]. 
2001/2011. 
Instalação com carimbos de madeira, mesas e xilografias. 
Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/218 
A obra de Toguo representa carimbos e gravuras do visto de imigração. “Os 
carimbos têm a forma e a materialidade das talhas típicas africanas que os turistas 
costumam comprar como souvenirs”8. 
Sardelich (2006, p.467) diz que para se compreender a arte é preciso ampliar a 
leitura das imagens, para além do racionalismo de tendência formalista. Trata-se de 
uma abordagem multirreferencial e transdisciplinar, para compreensão crítica da 
cultura visual nos ambientes de aprendizagem, problematizando as representações 
sociais sexistas, de gênero, de classe, e outras presentes nas imagens dos livros, dos 
outdoors, da televisão, dos postais, dos brinquedos, das obras de arte etc. 
Nos estudos de cultura visual, Sardelich (2006, 454) vê a cultura como via de 
mediação visual, refere-se “a valores e identidades construídos e comunicados pela 
cultura, como também à natureza conflituosa desse visual devido aos seus 
mecanismos de inclusão e exclusão de processos identitários”. Concorda com 
Mirzoeff (2003, p. 20) que considera a visualização como uma estratégia para 
compreender o mundo contemporâneo. Diz que é possível “plasmar a vida em 
imagens ou visualizar a existência, pois o visual é um “lugar sempre desafiante de 
interação social e definição em termos de classe, gênero, identidade sexual e racial”. 
Percebe-se dessa forma os processos culturais engendrados com a arte formando 
significações. 
Considerações finais 
Os diálogos culturais e visuais no ensino de arte, a partir da leitura cultural e dos 
conceitos culturais, favorecem a percepção e a reflexão crítica sobre o que estas 
8 TOGUO, B. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/218 Acesso em: 13/04/2012.
10 
imagens dizem ou calam sobre os indivíduos e quais representações, interesses e 
papéis sociais vêm a ser reiterados, ressignificados ou excluídos nas visualidades. 
REFERÊNCIAS 
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São Paulo: Editora Cortez, 2005. 
BRASIL, Ministério da Educação. Lei No 11.645, de 10 de março de 2008. Disponível 
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso 
em: 12 mai. 2012. 
BARROS, Lívia de Oliveira. Aproximações antropológicas em arte: culturas em 
diálogo. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 
2011. 
BOLDORI, Aveline Karen Tenório. Aplicabilidade da Lei 11.645 de 10 de março de 
2008. A Cultura Indígena na Escola. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação 
em Artes Visuais. UFMS. 2011. 
CAO, Mariàn López F. Lugar do outro na Educação Artística-olhar como eixo 
articulador da experiência: uma proposta didática. In BARBOSA. A. Mae. 
Arte/Educação Contemporânea: Consonâncias Internacionais. São Paulo: Editora 
Cortez, 2005. 
COSTA, Sergio. A mestiçagem e seus contrários etnicidade e nacionalidade no Brasil 
contemporâneo. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 13(1): 143-158, maio, 
2001. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v13n1/v13n1a10.pdf Acesso em: 3 
fev.2012. 
GEERTZ, Cliford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989. 
HALL, Stuart. A Identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Ed. DP&A, 
2006. 
_________ Da diáspora: identidades e mestiçagens culturais. Belo Horizonte: UFMG, 
2003. 
LUCIANO, Gersem dos Santos. O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os 
povos indígenas no Brasil de hoje. Brasília. Ministério da Educação, Secretaria de 
Educação Continuada. Alfabetização e Diversidade; LACED/Museu Nacional, 2006. 
SARDELICH Maria Emilia. Leitura de imagens, cultura visual e prática educativa. 
Cadernos de Pesquisa, v. 36, n. 128, p. 451-472. Departamento de Educação da 
Universidade Estadual de Feira de Santana – BA. Maio/ago. 2006. Disponível em: 
http://www.scielo.br/pdf/cp/v36n128/v36n128a09.pdf. Acesso em: 10 mar. 2012. 
MINISTÉRIO DA CULTURA. 8 Bienal do MERCOSUL: Ensaios de Geopoéticas. 
Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/. RS. 2011. Acesso em: 20 mar. 
2012.
11 
REFERENCIAIS CURRICULARES DO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO/SED/MS. 
Disponível em: 
http://intra.sed.ms.gov.br/portal/Arquivos/Publicos/referencial_curricular_completo_en 
sino_fundamental_VERSAO_PRELIMINAR.pdf. Acesso em: 10 mai. 2012. 
SANTOS, Tiago Nelson dos. Arte Africana Tradicional e Afro-brasileira: contexto 
histórico e cultural, avanços no ensino fundamental. Trabalho de Conclusão de Curso 
de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. 
SERRANO, Carlos. WALDMAN, Maurício. Memória D”África: A temática em sala de 
aula. São Paulo: Ed. Cortez, 2008.
MERCADO E CONSUMO EM ROMERO BRITTO 
Renata Damus – IESF/Funlec 
GT 3 – Pesquisa em arte e poéticas contemporâneas 
RESUMO 
O trabalho ora apresentado partiu de uma proposta sugerida pelo Professor Marcos 
Antônio de Oliveira, Coordenador dos cursos de Artes Visuais Licenciatura e 
Turismo do Instituto de Ensino Superior da FUNLEC, para ser apresentada na 
defesa da proposta de Mestrado de Estudos de Linguagens da UFMS, neste ano de 
2012. Portanto, é um trabalho em fase de pesquisa, ainda incompleto, tem a 
pretensão de discutir a produção de Romero Britto, a partir de uma visão pós-modernista. 
A produção artística de Britto sempre foi motivo de divergência entre a 
crítica especializada e público que consome suas obras. Para elucidar essa questão 
– se o que Romero Britto produz é arte ou prática de marketing –, faz-se necessário 
analisar o tema a partir dos aspectos que são atribuídos a esta cultura da pós-modernidade, 
principalmente aqueles que se referem à produção de imagens e à 
sociedade do consumo. Para auxiliar nesta reflexão, serão buscadas referências em 
Jean Baudrillard (1995), Zygmunt Bauman (1999), Nestor Garcia Canclini (2008), 
Mike Featherstone (1995) e Fredric Jameson (1985), entre outros. Além da pesquisa 
bibliográfica, será efetuada uma breve leitura de uma de suas obras, intitulada 
Carmen Miranda, com o intuito de verificar a relação existente entre a linguagem 
visual das obras de Romero Britto e a cultura da pós-modernidade. 
Palavras-chave: Romero Britto; Pós-Modernidade; Sociedade do Consumo. 
INTRODUÇÃO 
Pesquisar sobre Romero Britto não é uma das tarefas mais fáceis. São 
poucos os estudos sobre ele ou suas obras, e as dissertações e teses encontradas 
nos mecanismos de busca da internet ligam Romero Britto à publicidade. Mas o que 
ele faz pode ser considerado arte ou apenas prática de marketing? 
Essa questão foi a força motriz para o início dessa pesquisa, ainda 
inacabada: como Romero Britto pode ter se tornado esse fenômeno cultural pop se o 
que ele faz não é considerado arte pela crítica especializada. 
Analisando superficialmente os trabalhos de Romero Britto encontramos, na 
maioria das vezes, temas ou objetos simples em grandes dimensões, pintados com
2 
cores fortes, misturando traços infantis, quase geométricos, e texturas visuais. No 
início de sua carreira, flores, corações, coqueiros, peixes e elementos da cultura 
popular pernambucana foram exaustivamente retratados. Com essa linguagem 
simples, Romero Britto consegue transpor os limites da expressão artística, levando 
suas formas multicoloridas para a publicidade, aplicando-as em produtos como 
sandálias, caixas de sabão em pó, veículos automotivos, bebidas alcóolicas, entre 
outros bens de consumo. 
As obras criadas por Romero Britto trazem elementos da cultura popular 
com recursos de composição gráfica e linguagem publicitária gerando uma arte 
híbrida, assim como ocorreu à época do surgimento da Pop Art nos anos 1950, o 
que segundo Néstor Garcia Canclini, em seu livro Culturas Híbridas (2008), 
caracteriza a questão dos hibridismos próprios da arte pós-moderna e da 
glocalização (global + local) da cultura da contemporaneidade. Geralmente, essas 
características são bem absorvidas pelos meios massivos e com ressalvas pela 
crítica especializada. 
Mesmo apresentando um tipo de linguagem aceita pela maioria do público, 
teóricos e críticos de arte, os mesmos que consagraram Andy Warhol, Roy 
Liechstenstein e Claes Oldenburg como ícones da Pop Art, por vezes consideram a 
produção de Britto como artificial e de mau gosto artístico. Não raro encontrar 
afirmações de que o que Romero Britto produz é puro entretenimento, entretanto o 
público ignora as críticas negativas e o transforma em sucesso profissional e 
comercial, como é possível ver através de seu extenso currículo. 
A crítica, em especial a brasileira, não considera suas obras como arte: 
Para Agnaldo Farias, crítico de arte, curador independente e professor da 
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo-FAU-USP, o que Romero Britto faz não é 
arte, porque não provoca inquietação. Ele considera-o mais um ilustrador publicitário 
que um artista de fato. 
Já o jornalista e membro da Academia Pernambucana de Letras, José de 
Souza Alencar, diz que seus quadros ficam bem decorando quartos infantis. 
Aloísio Magalhães, diretor do Museu de Arte Moderna do Recife, acha que 
Britto “dilui uma série de influências coloristas do imaginário da arte pop. Faz isso
3 
com competência, é certo, mas criando um trabalho que já nasce inerte, porque se 
instrumentaliza em se adequar ao senso comum da cultura de massa” (LEAL, 2003). 
Paulo Herkenhoff, um dos principais críticos de arte e curadores do Brasil, 
indagado sobre o que acha da pintura de Romero Britto, reage com ironia: “Nem me 
faça esta pergunta. Eu lido com arte”. 
Segundo Cristiana Tejo, crítica, curadora e coordenadora do Departamento 
de Artes Visuais da Fundação Joaquim Nabuco, no Recife, citada por Monachesi 
(2006), o circuito que legitima os trabalhos de Romero Britto é formado por 
‘celebridades’– políticas e de entretenimento – e, como a maioria das pessoas não 
detém um olhar crítico sobre a arte, acaba consumindo os valores que são 
divulgados e validados por esse circuito através da mídia. 
Diante dessa informação, é impossível não refletir sobre como a mídia tem o 
poder de influenciar o grande público nos dias de hoje, fazendo-o acreditar que 
estão consumindo arte: 
A publicidade constitui um dos pontos estratégicos de semelhante processo. 
(...) Transforma o objeto em acontecimento. (....) O agente publicitário de 
sucesso é mestre de nova arte - a arte de tornar verdadeiras as coisas ao 
afirmar que o são"(BAUDRILLARD, 1995, pág. 134-135). 
Para entender o porquê dessa divergência entre público e crítica, faz-se 
necessário compreender a situação atual da cultura e da arte e como a sociedade 
reage frente às mudanças socioculturais ocorridas no período. Para tanto, é preciso 
adentrar a discussão no assunto pós-modernidade. 
CONSIDERAÇÕES SOBRE PÓS-MODERNIDADE 
Na tentativa de melhor definir a época atual e suas características, outros 
termos também são utilizados, além de pós-modernidade: hipermodernidade, 
capitalismo tardio, sociedade de consumo, sociedade do espetáculo, modernização, 
sociedade pós-industrial, sociedade da mídia ou capitalismo multinacional, entre 
outros. O que encontramos em comum é a concordância de que acontecimentos 
recentes na sociedade moderna, como o advento da internet, a saturação de 
informações e imagens, a ausência de valores, o imediatismo, o aumento do
4 
consumo e a globalização de mercadorias e culturas, transformou a sociedade atual, 
seus valores e identidades. 
Para entendermos um pouco mais sobre o assunto, veremos a seguir o que 
alguns teóricos dizem a respeito: 
Segundo Fredric Jameson (1985, pág. 17), o conceito de pós-modernidade 
não é apenas mais um termo para a descrição de um determinado estilo. É também 
um conceito de periodização cuja principal função é estabelecer relação entre o 
nascimento de novos traços formais na vida cultural com um novo tipo de vida social 
e uma nova ordem econômica, consequência do crescimento econômico do pós-guerra 
nos Estados Unidos, no final dos anos 1940 e começo dos 1950. 
Para Jameson (1985, pág. 17), ainda, nesta nova fase do capitalismo, é 
possível perceber um rompimento da fronteira invisível existente entre a cultura 
erudita e a cultura popular (a dita cultura de massa). Como ele mesmo tenta nos 
explicar, vivemos em um tempo onde é possível ter interesse tanto em preservar a 
cultura qualificada e de elite contra o cerco de porcarias e bobagens que vemos na 
TV, nas revistas de fofoca e coisas do gênero, quanto admirar e estudar a cultura 
kitsch, os pastiches, os filmes B, esse universo de gêneros padronizados, “a ponto 
de ficar cada vez mais difícil discernir a linha entre arte erudita e formas comerciais”. 
Nesta nova reformulação de valores proposta pela indústria cultural, a 
cultura produzida pelas massas é transformada em imagens-símbolos e estas são 
reintroduzidas na sociedade com novos apelos para o consumo da própria massa, 
possibilitando, dessa maneira, a oportunidade dos seus antigos detentores de se 
inserir no atual mundo globalizado. 
A mídia, na contemporaneidade, é quem exerce a condição de agente 
operacional dessa globalização, reforçando ou transformando a realidade através da 
exacerbação das imagens. Isso acaba gerando uma confusão entre realidade e 
imagens, que faz com que o público seja induzido a acreditar que aquelas 
representações largamente difundidas fazem parte de sua realidade, transformando 
tudo em espetáculo. 
Através da importância que é dada à imagem, a vida é transformada em 
espetáculo e, para se adquirir algum sucesso, é preciso integrar-se ao meio. O
5 
público, para fazer parte desse seleto grupo, se torna mero consumidor, atraído 
pelas imagens criadas e difundidas pela comunicação de massa. 
O consumo surge como modo ativo de relação, como modo de atividade 
sistemática e de resposta global, que serve de base a todo nosso sistema 
cultural [...] Raros são os objetos que se oferecem isolados, sem o contexto 
de objetos que os exprimam. Transformou-se a relação do consumidor ao 
objeto: já não se refere a tal objeto na sua utilidade específica, mas ao 
conjunto de objetos na sua significação total (BAUDRILLARD, 1995, pág. 
17) 
Nessa citação, Baudrillard nos mostra que o consumo que está presente no 
nosso dia-a-dia é um consumo de imagens, de signos, de coisas que remetem a 
associações imaginárias e simbólicas que fazem com que os consumidores atuais 
estejam interessados mais no significado que esse produto possa ter do que na 
própria funcionalidade da mercadoria. 
Nessa lógica consumista, as imagens difundidas pela mídia 
incessantemente, tornam os objetos e os produtos atraentes a tal ponto que as 
pessoas sentem necessidade de tê-los. O processo inverteu a relação de consumo, 
fazendo o público acreditar que desejam algo que não necessariamente precisam. A 
compra transcendeu a relação puramente comercial. 
Sobre isso, Bauman nos lembra que o consumo sempre existiu, só o papel 
da sociedade é que mudou. Se no passado nossos antepassados se perguntavam 
se deveriam trabalhar para viver ou viver para trabalhar, hoje em dia as coisas 
mudaram tanto que “o dilema sobre o qual se cogita hoje em dia é se é necessário 
consumir para viver ou se o homem vive para poder consumir” (BAUMAN, 1999, p. 
89). 
Na atualidade, esse dilema ainda é reforçado pelo sentimento vazio que 
esse consumismo produz. Hoje em dia, o que mais interessa é a sensação do novo, 
enquanto o novo ainda é sonho de consumo. Depois que este é adquirido, gera uma 
satisfação imediata e logo volta a sensação de insatisfação e o desejo por outra 
novidade. De acordo com a ideia de Bauman, o que importa na sociedade atual é o 
desejo: desejo de ter, desejo pela novidade e desejo de consumir. 
Featherstone (1995, pág. 35), em sua opinião, afirma que essa busca pelo 
novo se deve pelo fato das pessoas compreenderem que todas as coisas que são
6 
adquiridas transmitem mensagens. Na cultura do consumo, o indivíduo tem 
consciência que se comunica de várias formas, além das convencionais como fala e 
escrita, e até mesmo os bens que possui podem ser interpretados e classificados 
pelas outras pessoas, transmitindo a mensagem que é uma pessoa com ou sem 
estilo ou que tem bom ou mau gosto. 
Isso acaba se tornado um ciclo muito bem explorado pela publicidade 
através da mídia: o consumidor pós-moderno é seduzido pela associação entre a 
mercadoria e a imagem que ele representa, e produtos como automóveis, 
eletrodomésticos, bebidas ou até mesmo uma simples caixa de sabão em pó se 
transformam em símbolos de beleza, sedução, auto realização e, até mesmo, 
qualidade de vida. 
Então voltamos para a questão Romero Britto, o que nos remete à máxima 
Tostines1: será que Romero Britto faz sucesso e vende porque está na mídia ou está 
na mídia porque faz sucesso e vende? Será que o artista pode ser considerado um 
representante da cultura pós-modernista ou ele é apenas um marqueteiro que 
realiza obras pensando unicamente na indústria cultural? 
LEITURA DE CARMEN MIRANDA 
Para adentrarmos na discussão sobre a relação entre as obras de Romero 
Britto, mercado e consumo, e se seus trabalhos podem ou não serem considerados 
arte ou apenas representações estéticas para fins publicitários, será realizada uma 
breve leitura de uma de suas obras, Carmem Miranda, de 2007. Esta não é sua 
primeira, nem a última, nem a obra de maior destaque. É apenas mais uma dentre 
várias com o mesmo estilo e uso de cores. 
Este acrílico sobre tela, com dimensão de 108 X 139 cm, reproduz a imagem 
de uma figura feminina, coberta por um vestido rodado com saias em babados, 
colar, brincos e pulseiras de contas, braços levantados simulando movimento, com 
uma bandeja cheia de frutas tropicais no topo da cabeça, o que nos remete 
1 Slogan publicitário criado por Enio Mainardi para Biscoitos Tostines: “Vende mais porque é 
fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?”
7 
imediatamente à imagem de Carmen Miranda, cantora e atriz luso-brasileira, ícone 
internacional dos anos 1930. 
A imagem da figura feminina é entrecortada por linhas pretas e, cada um dos 
módulos formados por esses recortes, foi preenchido aleatoriamente com cores 
quentes e vibrantes como amarelo, magenta, vermelho, vermelho escuro, três 
tonalidades de laranja, e duas de rosa; para contrabalancear, o artista utiliza 
também cores frias e sóbrias como o azul ciano, azul escuro, dois tons de verde, 
violeta, roxo, ocre e marrom. Além das cores, formas geométricas e figuras 
orgânicas foram sobrepostas aos módulos formando texturas visuais; em pelo 
menos três dessas texturas é possível identificar parte da assinatura que Romero 
Britto utiliza em seus trabalhos. 
Pelo título da obra, Romero Britto teve a clara intenção de ligar esse trabalho 
à cantora que se tornou famosa no momento em que o samba “desceu do morro” e 
passou a ser considerado o maior representante da música nacional (CORRÊA, 
2009, pág. 45). Semioticamente, podemos entender uma ligação implícita da figura 
de Carmen a ele próprio, hoje em dia um dos artistas brasileiros mais conhecidos 
internacionalmente e que, assim como a própria Carmen, renegada pelos críticos e 
por uma parcela do povo brasileiro. 
Se considerarmos a biografia de ambos, a ligação entre Carmen e Romero 
Britto vai além: tanto a cantora quanto o artista, tiveram o início de seu 
reconhecimento internacional dos Estados Unidos e ambos ligados diretamente aos 
interesses da indústria cultural. 
Analisando um texto de Luiz Zanin, publicado em 9 de fevereiro de 2009, no 
Caderno Cultura do Jornal O Estado de São Paulo, na ocasião do centenário do 
nascimento de Carmen Miranda, curiosamente é possível apenas trocar alguns 
nomes e palavras e temos a impressão de falarmos sobre Romero Britto: 
Mesmo reinterpretando constantemente esses clichês (ou talvez por isso 
mesmo), Carmen tornou-se uma das atrizes mais bem pagas de Hollywood, 
tendo contracenado com bambas da época como Betty Grable, Dom 
Ameche, Groucho Marx, Jerry Lewis e Dean Martin. Carmen tentou livrar-se 
desse estereótipo, mas nunca conseguiu. Afinal, ele é que lhe trouxe fama e 
dinheiro, muito dinheiro, aliás. (ZANIN, 2009)
8 
Mesmo reinterpretando constantemente esses clichês (ou talvez por isso 
mesmo), Britto tornou-se um dos artistas mais bem pagos do Brasil, tendo 
retratado bambas da época como Madonna, Michael Jackson, Arnold 
Schwarzenegger, Bill Clinton e a presidente Dilma Roussef. Britto tentou 
livrar-se desse estilo, mas nunca conseguiu. Afinal, ele é que lhe trouxe 
fama e dinheiro, muito dinheiro, aliás. (Livre reformulação da autora) 
Em outra possível leitura da obra, tanto as cores quanto a imagem da figura 
feminina sorrindo, podem ser relacionados à brasilidade e a alegria do nosso país 
vista no exterior. 
Segundo Corrêa (2009), Carmen ficou conhecida pela indumentária de 
baiana usada em muitos de seus filmes hollywoodianos. A primeira vez que Carmen 
surgiu cantando “O que é que a baiana tem?” vestida como uma baiana com uma 
cesta de frutas presa à cabeça foi no filme brasileiro Banana da terra, de 1939. 
Segundo Green (2000 apud CORRÊA, 2009, pág. 46) “seu modo de atuar era uma 
imitação exagerada das tradições das mulheres afro-brasileiras dos mercados da 
Bahia”. 
Com sua incorporação da baiana, a artista, além de criar sua maior 
personagem, pode ter contribuído para afirmar a importância destas 
mulheres na cena urbana do Rio de Janeiro. Com sua “interferência” no 
modelo tradicional de baianas, Carmen o atualizou e, pouco tempo mais 
tarde, o “universalizou” – assim como fez com a baianidade do jovem 
Caymmi. Talvez a consequência mais importante da incorporação estética 
feita por Carmen tenha sido a de transformar a baiana em ícone da cultura 
de massa (CORRÊA, 2009, pág. 52). 
Bignami (2005, apud KAJIHARA, 2008, pág. 31) esclarece que “na época, a 
grande maioria da população era ainda analfabeta e o rádio era uma das poucas 
formas de relacionamento do indivíduo com a sociedade, daí a sua força na criação 
de um universo simbólico da nação”. Assim, acabou que a imagem que Carmem 
Miranda transmitida através de seus filmes acabou sendo considerado um símbolo 
da nação brasileira. 
Portanto, a imagem estereotipada da Carmen na pintura de Romero Britto, 
de fácil interpretação e assimilação, remete automaticamente à imagem do Brasil e 
da mulher brasileira no exterior: o de um povo alegre, feliz, colorido e festeiro. 
A adoção de imagens de fácil compreensão, que Romero Britto faz nessa e 
em praticamente todas as suas obras, o aproxima mais facilmente do grande
9 
público/consumidor. Essa escolha (intuitiva ou proposital) facilita a ligação entre as 
obras e o grande público sem conhecimento prévio de arte. A imagem se torna 
signo, de modo a se tornar um objeto de consumo. E o consumidor percebe este 
objeto não pela função que cumpre, mas pelo que significa para ele ao adquiri-lo. A 
partir das visões de Baudrillard e Jameson, em relação às imagens e a sociedade, 
compreender a força da imagem é fundamental para compreender a sociedade na 
pós-modernidade. 
MERCADO E CONSUMO EM ROMERO BRITTO 
A estética vista na obra Carmen Miranda é uma constante na produção de 
Romero Britto, podendo ser vista em praticamente todas as suas criações. A 
utilização das cores chamativas e das figuras de simples identificação, pois além de 
lembrar o Brasil com seu multicolorido, atrai a atenção do público e desperta 
sentimentos como felicidade, alegria e ânimo, justamente os mesmos que a 
publicidade quer desencadear para atrair os consumidores para seus produtos. 
Assim como Andy Warhol, que se deixou fascinar pelo conceito da 
publicidade, de Claes Oldenburg, que viu nos objetos do dia-a-dia sua fonte de 
inspiração e de Roy Liechtenstein, com a exploração dos quadrinhos e das imagens 
populares, Romero Britto também explora imagens de fácil entendimento e de 
personalidades da mídia. Em sua defesa quanto à representação desse tipo de 
linguagem em seus trabalhos, Britto afirma que “aquilo que as pessoas buscam na 
arte é a felicidade”, dando a entender como felicidade o consumo desses objetos 
(OLIVEIRA, 2008). 
Quando a publicidade consegue, através de formas criativas e inusitadas, 
refletir os valores, sonhos e fantasias do consumidor, e o cativa pelo valor 
percebido do produto que apresenta, pode-se dizer que o objetivo principal 
é alcançado, pois o que sensibiliza o público é a viabilização de trocas 
emocionais, despertando sentimentos a partir da trilha sonora de um 
comercial de TV ou do texto do anúncio veiculado na revista. Esse ato de 
tocar as pessoas, de emocionar ou fazer sorrir, é o que proporciona o 
posicionamento ideal do produto na mente dos consumidores, criando 
fidelidade e reconhecimento (LIMA, 2010). 
No caso da combinação do trabalho de Romero Britto e a publicidade, é 
gerada uma identificação e aproximação das imagens de arte com o público, que as
10 
reconhece nos produtos e cria uma espécie de confiança e segurança de consumo. 
Várias são as marcas que licenciaram obras de Romero para reprodução em seus 
produtos: por exemplo Absolut Vodka, marca sueca de bebida alcóolica que, além 
de Britto, já se ligou a outros artistas como Andy Warhol, Keith Haring, Kenny 
Scharf, entre outros; também já se ligaram ao artista marcas como Omo, Campari, 
Rosa Chá, Pepsi Cola, Disney, IBM e outras interessadas em cultura popular que 
incorporaram as imagens criadas por Britto em seus projetos especiais. 
CONCLUSÃO 
Como já foi dito no início dessa fala, este trabalho ainda não está finalizado. 
Muita pesquisa e muita análise precisam ser realizadas para que seja possível emitir 
uma opinião sobre o assunto. 
É evidente que o sucesso profissional desse artista se deve à linguagem 
popular que ele utiliza. Ao pintar, ele transporta para tela representações de imagens 
reais e imaginárias que podem ser consumidas e absorvidas por qualquer pessoa de 
todas as faixas etárias. É dessa maneira que ele consegue aproximar sua arte da 
publicidade. Na contemporaneidade, as pessoas são o que consomem, são imagens 
e produtos. 
Por ora, acreditamos haver a necessidade do meio acadêmico ver com 
interesse e analisar criticamente o trabalho executado por Romero Britto, pois ainda 
há muita polêmica sobre o assunto. Nada é por acaso. Assim como aconteceu com 
os artistas do Modernismo, que foram rechaçados pela crítica no início do século 
XX, talvez, no futuro, Romero Britto possa ser visto como um autêntico artista que 
conseguiu retratar de uma maneira peculiar, esse período conturbado, bombardeado 
por imagens e informações da atual sociedade do consumo. Talvez, no futuro. 
REFERÊNCIAS: 
BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Coleção Arte e Comunicação. 
Portugal, Lisboa: Edições 70, 1995. 
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: 
Jorge Zahar, 1999.
11 
CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da 
modernidade. 4 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. 
CORRÊA, Gustavo Borges. Baianas e drags: tramas visuais em Carmen 
Miranda. Concinnitas: arte, cultura e pensamento/Jorge Luiz Cruz, ano 10, volume 
2, número 15, dez. 2009, pág. 42-59 
FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. São Paulo: 
Studio Nobel, 1995. 
JAMESON, Fredric. Pós-Modernidade e Sociedade de Consumo. In: Novos 
Estudos CEBRAP. São Paulo, nº. 12, p. 16-26, junho de 1985. 
KAJIHARA, Kelly Akemi. A imagem do Brasil no exterior: análise do material de 
divulgação oficial da Embratur desde 1966 até os dias atuais [Trabalho de 
conclusão de curso]. São Paulo: USP/ECA, Departamento de Relações Públicas, 
Propaganda e Turismo, Dez. 2008. Disponível em: < 
http://www.dadosefatos.turismo.gov. 
br/export/sites/default/dadosefatos/espaco_academico/premio_mtur/downloads_pre 
mio_FGV/Graduaxo-1x_Lugar-A_Imagem_do _Brasil _no_Exterior.pdf>. Acesso em: 
17 abr. 2012. 
LEAL, Weudosn Barros. Romero Brito entre os dólares e a crítica. Revista 
Continente, Ano III, n. 28, Abr./2003, pag. 88-89. Disponível em: 
<http://www.revistacontinente. com.br>. Acesso em: 14 Mar. 2012. 
LIMA, Juliana. Romero Britto: O Uso de Imagens de arte como motivação para o 
consumo. 5 Ago. 2010. Disponível em: <http://www.closetonline.com.br/coluna/ 
22/Romero+Britto- 
+O+Uso+de+Imagens+de+arte+como+motivação+para+o+consumo >. Acessado 
em: 17 abr. 2012. 
OLIVEIRA, Solange Ribeiro de. A literatura e as outras artes, hoje: o texto pop e 
a poesia brasileira contemporânea. São Paulo: Universidade Estadual Paulista- 
UNESP, Revista de Letras, v.48, n.1, p.101-115, jan./jun. 2008, pág. 101-115. 
ZANIN, Luiz. Carmen tutti-fruti no cinema. Caderno Cultura. O Estado de São 
Paulo, 9 fev. 2009. Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/luiz-zanin/carmen-tutti- 
fruti-no-cinema/>. Acessado em: 17 abr. 2012.
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  • 5. A dança como meio de expressão de tradições no candomblé ketu Luana Montalvão - UFMS RESUMO A fim de desenvolver um estudo aprofundado sobre a religião afro-brasileira, mais precisamente o candomblé de Ketu, a proposta é extrair elementos estéticos de um culto que possui suas raízes em solos africanos, portanto necessitamos entender as etapas que o levaram a chegar ao que é hoje. O período em que os negros africanos foram trazidos em regime de escravidão para o Brasil é de grande importância no contexto histórico-cultural, pois acaba sendo o ponto de partida para a criação de uma nova religião, onde vários deuses são cultuados, com inúmeros símbolos, danças e músicas que buscam resgatar a fé de uma nação abalada pelo sistema. A princípio pouco difundida e muito repreendida, o candomblé passou a ganhar forças em seus praticantes e simpatizantes, que além da dedicação para com a religião também buscam o fortalecimento da cultura e resgate das tradições negras, o fim do racismo, o preconceito e a intolerância religiosa. Palavras-chave: Candomblé, dança, cultura, religião, Orixás
  • 6. A dança como meio de expressão de tradições no candomblé ketu A religião dos orixás é de grande importância no contexto histórico-cultural brasileiro, pois proporcionou, mesmo que em condições de extrema submissão, a adaptação do negro escravo em solos brasileiros gerando uma grande miscelânea entre cultura, língua e crenças existentes nas diversas regiões da África. Por volta do século XVI, os negros bantos oriundos principalmente da África do Sul desembarcaram na costa do nordeste brasileiro, para um regime e condições muitas vezes sub-humanas, com jornadas de trabalho de mais de doze horas nas lavouras e plantações. Já no século XVII, as regiões de Congo, Angola e outras eram as responsáveis pelo fornecimento de escravos para o Brasil. Durante todo o período escravista era comum a convivência dentro das senzalas entre pessoas oriundas de regiões distintas, ocasionando conflitos e discussões a respeito da identidade religiosa, visto que cada etnia era responsável pelo culto a um orixá. Gerando a união de forças por um ideal religioso afro-brasileiro, impulsionada pela negação da imposição da crença cristã, como atos que provam a vontade de estabelecer a fé cristã sobre os negros, como o batismo forçado para “salvação da alma”. Como podemos ver em Pierre Verger: As circunstâncias em nenhum dos casos eram favoráveis ao estabelecimento de um espirito de compreensão e respeito para as convicções religiosas das comunidades nativas. Onde o Islã estava interessado, a conversão era um dever sagrado, e para o traficante de escravos era mais satisfatório e digno de louvor proclamar que ele estava desempenhando uma tarefa piedosa, resgatando a alma dos negros dos abismos impenetráveis da idolatria. Os católicos acrescentaram que era seu dever ajudar os negros a livrarem-se de cair nas garras dos hereges, e os protestantes felicitavam-se por deixá-los livres do abismo. Mas todos concordavam que o animismo era uma religião desprezível (apud BARRETI FILHO, 2010, p. 69). Os primeiros registros das casas de candomblé datam por volta do ano de 1800, no estado da Bahia, momento que uniu em um só culto dezessete orixás, lembrando que em seu país de origem, não eram somente os
  • 7. dezessete, mas sim mais de duzentos deuses, variando conforme a região. O culto no Brasil passa a ser algo novo, segregado as escondidas, por muito tempo era considerada uma religião do populacho, pessoas humildes, pobres de cultura e de dinheiro, e após muito tempo que foi tomando cada vez mais espaço, se difundindo nas outras regiões do país e ganhando espaço nas outras camadas sociais. São feitas adaptações nos cânticos, danças, normas, preceitos e introdução de instrumentos musicais, até os dias de hoje. Uma das principais dificuldades encontradas nos cultos em épocas atuais é manter a tradição. Visto que os valores culturais mudaram significativamente gerando outros interesses não originais do candomblé. Contudo a manutenção do culto em determinados lugares tenta preservar ao máximo as doutrinas, passadas de geração para geração, difundindo os ensinamentos por forma da oralidade. O Candomblé conta com uma abundância em elementos estéticos, visuais, audiovisuais e conceituais, podendo transcender as barreiras do místico, do espiritual, fazendo com que se torne um estilo de vida, pessoas que abdicam de família, filhos, amigos e carreira profissional com o único propósito de louvar e servir ao seu próprio Orixá. A crença do Candomblé consiste em 16 deuses, que dançam para que a harmonia se estabeleça no universo e na vida das pessoas, cada um representando uma força da natureza, refletindo no Aiyê, a Terra, seu temperamento e seu humor. A dança é praticamente a essência do culto, sendo ela a responsável por aproximar o sobrenatural do humano, o espiritual do material, traduzindo sentimentos humanos em seres divinos. O presente texto objetiva demonstrar como a estética da religião afro-brasileira pode ser expressa artisticamente através dos movimentos corporais. A dança dentro da religião é uma questão de suma importância, pois é a característica que marca as grandes celebrações e toda harmonia ritualística, com aspectos que nos remetem a imaginar o porquê de tais movimentos ou gestualidade. Visto anteriormente que a crença no candomblé se constitui em divindades que possuem o domínio sobre elementos naturais, a cadência rítmica é guiada por composições de performance referentes a algo que teria acontecido quando aquela determinada divindade viveu sobre a terra, narrativas sobre guerras, criação, nascimento, atos que demonstram as
  • 8. qualidades ou defeitos do orixá, podem relatar também mitos que o relacionam com os demais deuses. As cantigas, ou orikis, são entoadas no dialeto iorubá, determinado pelos sons dos instrumentos de percussão, os atabaques, do dicionário [sm (ár aT-Tabaq) Folc. Membranofônio de percussão direta usado nas danças e cerimônias, religiosas ou profanas, afro-brasileiras.] Consiste em um tubo de madeira, aberto em uma das extremidades e na outra coberto com couro, é tocado com as mãos ou nas cerimônias de candomblé com varinhas de marmelo (Cydonia Oblonga Mill), denominadas aguidavis. Dentro do cerimonial as cantigas são executadas conforme a ocasião ou necessidade durante o rito. Além desses instrumentos, no culto foram introduzidos a utilização do Gã, ou Agogô, compõe-se de duas até 4 campânulas de ferro, ou dois cones ocos e sem base, de tamanhos diferentes, de folhas de flandres, ligados entre si por vértices, extrai-se o som deles batendo com um aguidavi. E parecido com ele tem-se também o Alácorô, que ao invés de ser unido por um vértice, é unido com uma corrente, e para extrair o som devemos bater um no outro. Temos também o Adjá, ou Adjarin, quepode ser de uma, duas ou três sinetas, e o cabo é do mesmo material que pode ser de bronze, metal dourado ou prateado, utilizado para evocar os orixás nos iniciados. Durante as cerimonias, a sequencia dos cânticos e do bailado é denominado xirê, onde seguem uma ordem hierárquica, dançando em roda, no sentido anti-horário, de acordo com a importância de cada orixá. Depois de entoadas as cantigas do xirê, os orixás são evocados nas pessoas iniciadas, e a partir deste momento, aquele que faz parte da comunidade como iniciado na religião dos orixás, “recebe” e passa a dançar especificamente a dança de seu “santo”. A ordem que o xirê segue, é cantando para os seguintes orixás, em média, cinco cantigas entoadas para cada um deles. Ogum: Possui personalidade forte, sendo considerado um guerreiro, inventor das ferramentas, por isso todo metal é considerado elemento de Ogum. Seu sincretismo é com São Jorge ou Santo Antônio, dependendo da região. Oxossi / Odé: Irmão de Ogum é o Orixá responsável pela fartura, pois é quem vai a caça para trazer a comida para sua família. Sincretizado com São Sebastião ou São Jorge, dependendo da região. Omolu: Orixá responsável pelas doenças e pela cura. Possui o corpo coberto
  • 9. de palhas, pois esconde os sinais causados pela varíola. Equivale a São Lázaro. Ossain: Caracterizado como o senhor da medicina, conhecedor de todos os benefícios e malefícios das plantas. Oxumare: Representado por uma serpente, a própria dualidade do ser. Acredita-se que ele passa metade do ano com características masculinas, e a outra metado com características femininas. Quando surge um arco-íris no céu, diz-se que é Oxumare vindo a Terra, para fazer uma ligação com os seres humanos. É sincretizado com São Bartolomeu. Nanã: É a mais velha de todas as Yiabás (Orixás femininos), a anciã. Seu domínio é a lama, o lodo e os charcos. Oxum: É sincretizada em alguns lugares com Nossa Senhora da Glória e em outros com Nossa Senhora Aparecida. É a deusa da beleza e do ouro, e seu domínio é toda água doce existente na terra, principalmente rios e cachoeiras de águas transparentes. Obá: Também é uma guerreira, porém não tão bela assim. Contam as lendas que Obá era apaixonada por Xangô, e por isso cortou a própria orelha para servir ao amado, acreditando que ele se apaixonaria por ela, mas ocorreu o contrário, Xango teve de Obá uma repulsa muito grande. Yewá: A própria transformação. Assim como Oxumare é representada por uma cobra. Encantadora e de beleza rara e exótica. Yansã / Iansã / Oyá: É uma bela mulher, guerreira, responsável pelos raios e tempestades. É sincretizada com Santa Bárbara. Xangô: Foi Rei na cidade de Oyó, na África, o inventor do dinheiro, em moedas de cobre. Muito bonito e charmoso, sempre rodeado de belas mulheres. O Deus do fogo e do trovão. É igualado a São Pedro ou São João Batista. Yemanjá / Iemanjá / Iemonjá: É o orixá das águas salgadas, sincretizada com Nossa Senhora da Conceição ou Navegantes. É vista como uma sereia, o grande útero da Terra, a geradora dos outros Orixás. É muito vaidosa e bonita. Além dos Orixás citados acima, antes do inicio das cerimonias canta-se para Exu. Algumas casas possuem também a tradição de cantar para Logunedé. E uma vez por ano são entoadas cantigas para Oxoguian e Oxolufan.
  • 10. REFERÊNCIAS BARRETI FILHO, Aulo - Dos Yorubá ao candomblé kétu. São Paulo, Editora da universidade de São paulo 2010 OLIVEIRA, Altair B. - Cantando para os orixás. Rio de Janeiro, Pallas, 2009 OXALÁ, Adilson de - Igbadu: A cabaça da existência. Rio de Janeiro: Pallas , 2001
  • 11. Artes Visuais: questões de disciplinaridade ou de indisciplinaridade? (Segundo)1 Marcos Antônio Bessa-Oliveira – IESF-Funlec2 GT 1 - Práticas pedagógicas e pesquisa no ensino de Arte Resumo: Como fora proposto no trabalho apresentado e publicado nos Anais da primeira edição do “Seminário: Diálogos Visuais e Culturais no Cenário da Pesquisa em MS” – realizado no ano de 2011 – este trabalho, com o mesmo título daquele, ARTES VISUAIS: QUESTÕES DE DISCIPLINARIDADE OU DE INDISCIPLINARIDADE, dá continuidade as discussões sobre a problemática de disciplinaridade ou indisciplinaridade (that's the question) no ensino de Artes Visuais no Brasil. Ainda a título de explicação: naquele trabalho a discussão era tomada de um ponto de vista mais amplo; baseados em autores culturalistas estrangeiros. De certa forma, ainda que me valendo daqueles mesmos autores da primeira parte do ensaio, agora essa segunda edição toma como referencial teórico-crítico autores brasileiros que fizeram discussões pertinentes à minha temática: disciplinaridade X indisciplinaridade. Partindo dessa breve contextualização do trabalho, este ensaio propõe uma reflexão acerca das problemáticas do ensino de Artes Visuais serem muito disciplinares nas academias. Ora o referencial teórico é formal e estruturante, ora é libertário e sem fundamentação. Nesse sentido, este trabalho vem trazer mais uma contribuição acerca das formulações teóricas dos Estudos de Cultura (portanto, pós-colonais) para pensar novas proposições para o ensino de Artes Visuais. Palavras-chave: Ensino; Pesquisa; Diálogos; Artes Visuais. Maria Elisa Cevasco na “oitava lição” do seu livro Dez lições sobre estudos culturais (2008) aponta quatro diferentes perspectivas possíveis das quais se podem estudar a cultura pelos postulados teórico-críticos dos Estudos Culturais. Postulados 1 Quando este trabalho começou a tomar corpo, lá na escrita de minha monografia do curso de Artes Visuais – ano 2009 – na UFMS, não imaginava que renderia tanto. Uma monografia, um livro e artigos. Tudo isso deve-se ao fato que a questão me incomoda até então. Neste sentido, justifico a divisão em partes deste trabalho: “Primeiro”, “Segundo” e “Terceiro” – “Artes Visuais: questões de disciplinaridade ou de indisciplinaridade?” – considerando que a conversa se prolongou além do que se esperava. Portanto, na primeira parte, o “Primeiro”, trata de uma visada mais ampla dos Estudos Culturais; nesta segunda parte, o “Segundo”, trata da questão dos Estudos Culturais X o Ensino de Artes Visuais em nível nacional e, finalmente, o “Terceiro” – que pretendo divulgar em breve, acreditando que teremos fôlego para tanto – tratará dos Estudos Culturais como possibilidade para as práticas artísticas de modo local. 2 Professor e Coordenador dos cursos de Artes Visuais-Licenciatura e Turismo do IESF-FUNLEC em Campo Grande, MS. Mestre em Linguagens pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado em Estudos de Linguagens – PPG-MEL/CCHS/UFMS, foi bolsista CAPES, tendo como título do projeto de pesquisa “Clarice Lispector entre a pintura e a escritura de Água viva: um recorte comparativo-biográfico- cultural”, orientado pelo Prof. Dr. Edgar Cézar Nolasco. Graduado em Artes Visuais – Licenciatura – Habilitação em Artes Plásticas – UFMS onde foi bolsista do CNPq durante os quatro anos do curso. Coordenador do NECC-ENTREVISTAS: intelectuais em foco e membro do NECC – Núcleo de Estudos Culturais Comparados – UFMS. É autor de alguns artigos e livros sobre a temática.
  • 12. que vou me valer aqui para tentar pensar uma forma de a disciplina de Artes Visuais valer-se dos Estudos Culturais como provável metodologia para o ensino e refletir a produção das Artes Visuais. (Entenda-se disciplina, Artes Visuais ou Estudos Culturais, como áreas epistemológicas do ensino) Apesar de nas “lições” de Cevasco referirem-se como perspectivas diferentes para se estudar a literatura, aqui penso-as como possibilidades para estudar em Artes a relação entre cultura e Estudos Culturais; quero entender que a literatura, as Artes de modo geral, são produtos de culturas, por isso, prefiro pensar em conjuntos de produção cultural. Estudar a cultura de um determinado sujeito social pela literatura, já é uma máxima que há tempos os letrados adotam como praxis. Todavia, como venho dizendo, faz-se sempre privilegiando as características formais dessa produção cultural e, literalmente, assassinando o provável sujeito que tinha por trás dela. Nesse sentido, os Estudos Culturais vêm propor desmarginalizar as outras tantas produções culturais que até bem pouco tempo na sociedade serviram, nada mais nada menos, como adornos de supostas “culturas” menores para os ambientes elitistas das culturas maiores. Partindo disso, sugiro para o campo das Artes Visuais – professores e artistas – que sejam pensadas primeiro em nível artístico-cultural social como a literatura e as outras diversas Artes. “Pode-se olhar a relação do ponto de vista histórico [...]”3 visando a privilegiar os estudos realizados pelos já consagrados pensadores culturalistas: Raymond Williams, Richard Hoggart, Edward P. Thompson e Stuart Hall, um pouco mais tarde, lembrando apenas dos fundadores da disciplina. “Pode-se considerar as mudanças que a nova disciplina trouxe para os estudos literários”4 como já afirmei em outro momento explicando a abertura que a Teoria Literária fez a Literatura Comparada, etc. “Pode-se, ainda, pensar os estudos de cultura como extensão do campo dos estudos literários”5 se levado em conta os estudos de quem acredita que os Estudos Culturais servem apenas para estudar a cultura social pela produção literária. Finalmente, é possível, ainda, na contemporaneidade, “[...] pensar os estudos de cultura como a disciplina que vem para “discutir” o valor da literatura”6; confessando meu partidarismo às Artes Visuais, é a perspectiva de que gosto mais, porque vem, 3 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 4 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 5 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 6 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138.
  • 13. ao longo dos anos, pós-implantação dos Estudos Culturais no Brasil, acreditando os tradicionalistas letrados e literatos que é intenção primeira dos Estudos Culturais. Crê-se erroneamente numa destruição das altas culturas, pelos Estudos Culturais, valorizando as baixas culturas. As perspectivas apresentadas dão-nos possibilidades de vislumbrar diferentes direções a tomar ao resolver fazer abordagens críticas enviesadas pelos Estudos Culturais. Mesmo a de cunho histórico, que a meu ver é a mais fácil delas e largamente aplicada – não como leituras culturalistas, mas como leituras de culturas no plural – pelos professores e artistas visuais, pode-se tirar proveito nos trabalhos crítico-artísticos. Mas entendo, a partir disso tudo, que os Estudos Culturais não surgem nem com a intenção de simplesmente incomodar e muito menos validar os discursos tradicionais que imperam nas leituras feitas de cima para baixo. Valendo-me da “lição” de Cevasco, “[...] os estudos de cultura teriam vindo para deselitizar a cultura e celebrar o popular, o mais das vezes apoiados em um antiintelectualismo de longa tradição na produção cultural [...]”7, tanto na Grã-Bretanha, onde fora pensado, como no resto do mundo, por onde foi adaptado ao passar, como vemos hoje no Brasil. Nesse sentido, é possível dizer que os Estudos Culturais é um “câncer” para os cânones dos Estudos Literários, mas é um tratamento para os outros Estudos e produções artístico-culturais marginalizados ao longo de muitos séculos na história da humanidade. Penso nisso, considerando que a proposta de cultura comum para os Estudos Culturais é o pilar/base que deve estruturar toda sua fundamentação teórico-prática “[...] uma cultura em comum seria aquela continuamente redefinida pela prática de todos os seus membros, e não uma na qual o que tem valor cultural é produzido por poucos e vivido passivamente pela maioria”.8 É compreensível que não se trata de apenas defender os humilhados e ofendidos, a cultura em comum pensada por Williams vem contra qualquer tipo de binarismo. Para se conseguir essa postura, que também demanda uma mudança sociocultural da sociedade, pelos postulados defendidos nos Estudos Culturais, têm-se que ponderar criticamente as expansões dos meios de comunicação de massa e da indústria cultural: televisão, rádio, internet, etc., uma vez que deles também 7 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 138. 8 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 139.
  • 14. partem, além de consumos exacerbados, vários canais de informação e formação para esses sujeitos culturais. As formas de organizar a prática crítica dos estudos culturais, as suas teorias, se transformam em “construções” tão mutáveis, múltiplas e transitórias quanto as formas da cultura pós-moderna que almejam explicar e às quais querem se opor. É como se os estudos culturais assumissem a forma da cultura que estudam, em vez de descrevê-las e criticá-la.9 Para as Artes Visuais, de modo geral, seria um achado a adoção de tal postura crítica: ajustar-se àquela produção ou aluno culturais aos quais fossem estudar, ao invés de simplesmente descrevê-los ou criticá-los no pior sentido do termo, ao dizer que isso presta e aquilo não; que estes alunos não passam de marginais e que aqueles das escolas elitizadas não o são. Adotar uma nova postura crítica demanda o envolvimento intelectual do sujeito supostamente detentor do saber, o crítico, o artista, o professor. Não basta, como é claro nos Estudos Literários, adotar uma moda teórica com a finalidade de suceder a anterior. As produções vão se alternando e alterando ao longo dos tempos, assim como os sujeitos sociais que a produzem, mas nem por isso podem ser lidos acriticamente assentada em uma crítica “ficcional”. Do meu ponto de vista este ainda não parece ser o problema das Artes Visuais. Ou seja, se nos Estudos Literários a “transitoriedade” teórico-crítica é um problema, nos Estudos de Artes Visuais a insistência imperante de um ranço teórico-crítico histórico e estético são a nossa problemática com reflexos para a disciplinaridade da área de Artes Visuais. Talvez o trânsito teórico-crítico mais aberto desses sujeitos – professores e artistas – proporcionar-nos-ia leituras menos rancorosas de nossas produções artístico-culturais. Nessa altura vale lembrar que o mundo concreto existe, quer o signifiquemos ou não. O fato de que só temos acesso a esse mundo por meio da linguagem não quer dizer que tudo seja apenas linguagem e não haja nada fora do texto [ou da produção artística].10 É preciso lembrar que existe sempre um sujeito, provavelmente de carne e osso, por trás desses artefatos culturais. Ainda quero poder acreditar nisso. Antes de objetos, as obras de arte são práticas culturais, o que elas representam não são objetos, é uma coisa óbvia: A “Mona Lisa” não existe, “A criação do mundo” do teto da Capela também não; então, antes de objetos, os quadros, as pinturas, por exemplo, são práticas artísticas culturais desenvolvidas por sujeito socioculturais que, querendo ou 9 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 145. 10 CEVASCO. “Estudos literários x estudos culturais”, p. 146.
  • 15. não, a história já se encarregou de falar de sua importância. Mas não é possível mais é servirmos de parâmetros para julgar isto ou aquilo com sentido de valor na contemporaneidade. Nesse sentido, é compreensível que professores e artistas, cada vez mais, devem se valer de outros postulados e relações teórico-críticos, ainda que de novos ou velhos referenciais. O que dever ser feito de forma diferente, é como se valer desses novos e velhos postulados. Em uma sala de aula, em uma galeria ou museu de Artes Visuais, temos sujeitos de várias classes sociais que, por conseguinte, ainda são de culturas diferenciadas. As percepções desses sujeitos sobre os diferentes trabalhos artísticos se darão de forma diferenciadas considerando essas relações, igualmente distintos se dão os seus entendimentos do mundo e da cultura do outro e de si próprios. Mas o que não quer dizer que seja inferior ou superior que a dos outros sujeitos letrados; é, no mínimo, diferente. Como venho dizendo no decorrer deste texto, os Estudos Culturais desde sua criação, defende uma postura política do crítico frente aos seus objetos de estudo. Na contemporaneidade, essa postura tornou-se ainda mais cobrada e questionada devido ao adentramento de novos postulados teóricos nas disciplinas que se voltam para questões mais localizadas a uma determinada cultural local. Porém, sem o sentido de local que busca o universal. Nesse sentido, na sua “nona lição”, Maria Elisa Cevasco vai observar que os Estudos Culturais como “[...] disciplina deve ter efeito prático, onde possa fazer diferença em termos de conscientização e ação políticas”,11 além do que “a linguagem é clara e chama à ação e à expansão da disciplina para um público não-especializado, em cujo contexto ela deve ter uma utilidade”.12 Uma das questões observada pela crítica, ressaltada neste trabalho, é a importância prática, socialmente dizendo, do atuante culturalista. É imprescindível, dessa colocação de Cevasco, a preocupação com o ganho sociocultural que o sujeito terá a partir da intervenção do intelectual cultural. Já a outra questão, e que está intrinsecamente ligada a anterior, é a utilização da disciplina como prática analítica sociocultural. Nos Estudos Culturais a postura crítica do intelectual não deve servir para um endeusamento do crítico como um sujeito letrado e especial 11 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158. 12 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158.
  • 16. frente ao seu objeto ou prática culturais. O que também não pode servir como uma explicação para um possível empobrecimento teórico-crítico intelectual. Nas Artes Visuais esse empobrecimento se dá quando os professores baseiam-se exclusivamente nos velhos e conhecidos manuais e referenciais tradicionais formulados pela suposta elite pensante que é a minoria dominante; já nas produções artístico-plásticas dá-se quando o referencial artístico-histórico é obviedade na produção artística segunda que é vista como cópia mal feita e inacabada da primeira. Essas relações nas Artes Visuais – pelo ensino ou pela plástica – dão-se pelo empobrecimento intelectual, desanimo profissional e comodismo institucional forçado pelo sistema de ensino e de produção de professores e artistas.13 A instituição dos Estudos Culturais como possibilidades teórico-críticas demandam a adequação da teoria à produção cultural que se quer analisar, que imediatamente, necessita o reconhecimento da identidade sociocultural daquele sujeito que se encontra totalmente imerso e envolto na produção. Pois, como bem mostra as duas seguintes passagens de Stuart Hall, o conceito de identidade é tão transitório e desunificado que impossibilita leituras tradicionais a partir delas: A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. É definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identidades estão sendo continuamente deslocadas.14 E ainda continua o autor: A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente.15 Apenas a partir do reconhecimento dessa diferença cultural o intelectual, professores e artistas culturalistas vão poder interferir com sua leitura na resposta sobre determinada prática cultural. Antes disso, corre-se o risco de privilegiar mais ou 13 Sobre essa questão vale conferir o livro: BESSA-OLIVEIRA, Marcos Antônio. Ensino de Artes x Estudos Culturais: para além dos muros da escola. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2010; Onde trato a temática do ensino como falta de interesses de forma mais ampla e clara. 14 HALL. A identidade cultural na pós-modernidade, p. 12-13. 15 HALL. A identidade cultural na pós-modernidade, p. 13.
  • 17. menos, um ou outro, e cair em binarismos tradicionais, retomando as velhas formas de discriminação histórico-social – de raça, gênero e classe. Ao negar com veemência qualquer tipo de determinação ou restrição, essa formulação deixa de reconhecer um fato básico da vida social: identidades, produtos culturais, modos de vida não são construídos em condições livres, e essas condições apresentam limites e exercem pressões que não desaparecem só porque intelectuais escolhem não enxergar. Ao não reconhecer os fatos, a teoria perde em pelo menos duas frentes: deixa de descrever o que existe, condenando-se à irrelevância, e de reconhecer a natureza da prática que descreve, arriscando-se a fazer asserções errôneas e, ainda pior, jogar água no moinho do que pretendia opor.16 É possível afirmar, a partir do que expõe Maria Elisa Cevasco, que as produções culturais, principalmente as que são constituídas nas bases culturais menos favorecidas, são formuladas entre grandes pressões socioeconômicas e políticas – e o que é pior, de um poder econômico e político hegemônico, que é eleito pela maioria desfavorecida, que deveria protegê-los – que acaba por sufocá-los. Deste prisma até aqui esboçado, posso afirmar que o cânone intelectual brasileiro entende os avanços dos Estudos Culturais como “ervas daninha” na lavoura. Posto que “[...] reduplicam as características do tempo na medida em que se apresentam como mais uma mercadoria, se oferecendo como uma forma diferente, cheia de novidade, de estudar cultura”,17 fato que assusta a tradição. Por outro lado, os Estudos Culturais sinalizam para esta mesma tradição canônica, disciplinar e acadêmica, que não existe nenhuma teoria exclusivista e hegemônica, ao menos no plano territorial brasileiro, que dê conta de nossa “diversidade” artístico-intelectual e das nossas diferenças sociais e culturais. Na décima “lição” das Dez lições sobre estudos culturais, bem como no texto “A indisciplina Estudos Culturais” de Beatriz Resende e, pode ser percebido também nos textos “O espaço nômade do saber”, “Teoria em cris e” e “O não-lugar da literatura” de Eneida Maria de Souza – que como já disse antes embasam minhas formulações nesta parte do texto –, uma inter-relação entre eles na abordagem da temática Estudos Culturais. Ou seja, todos os textos agora tratam da (in)disciplina culturalista refletindo seus postulados nos campos teóricos disciplinares brasileiros. Nesse sentido, entendo que é preferível tratar deles tentando manter um diálogo entre as ideias formuladas neles pelas autoras. Mesmo tendo total consciência que 16 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 165. 17 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 166.
  • 18. nem sempre Cevasco, Resende e Souza concordam com as abordagens feitas por cada qual. Sendo assim, Resende incita a provocação no início de seu texto de que há “[...] a necessidade do reconhecimento do tempo e do espaço de onde falamos”; 18 e, Cevasco e Souza partem, cada uma a seu modo, suas reflexões a partir de questões ocorridas em ABRALIC’s diferentes, mas, que a meu ver, caminham para questionamentos que vão desembocar em questões parecidas: estudar cultura brasileira é o estudar Literatura Comparada? E, estudar Literatura Comparada é o mesmo que estudar Estudos Culturais? Pensando nisso, como é possível estudar melhor as produções culturais – principalmente a artística – brasileiras? E, ainda, adaptando a questão: como se pode estudar/ensinar e praticar/estudar melhor as Artes Visuais na contemporaneidade brasileira? Tenho certeza de que não são os cursos de Histórias da Arte que saem numa cavalgada quixotiana, desde o Renascimento passando por todos os ismos da história, que nunca chegam à produção contemporânea. Em 1946, o crítico Antonio Candido19 dissera que estudar Literatura Brasileira era o mesmo que estudar Literatura Comparada. Essa assertiva do crítico foi discutida no Seminário da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura Comparada – realizado no ano de 1986. Doze anos depois (1998), a temática central do seminário girava em torno da discussão – Literatura Comparada = Estudos Culturais?.20 Desta questão que se formulava, entende-se que a crítica pretendia não só discutir a introdução de novos postulados teóricos oriundos do estrangeiro no Brasil, mas antes, tratava-se, a meu ver de Reconhecermos nossa posição peculiar na era das mudanças globais, situada daquele lado do mundo onde estão, fundamentalmente, os que pagam os custos, implica em mantermos nossa capacidade crítica, função que resta ao intelectual. Identificado o tempo e o espaço global de onde falamos, a tarefa seguinte é dispormos a enfrentar o debate inevitável dentro da chamada academia, nos espaços consagrados de produção do saber, de elaboração dos cânones e definições de disciplinas.21 A elaboração de Resende coloca-nos, literalmente a todos, na parede para que tenhamos a competência crítica de assumir uma postura. Seja pensando nas Letras 18 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 9. 19 Biografia do autor. 20 Sobre a história desse e de outros Seminários da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura Comparada – valer conferir o site: www.abralic.org.br. 21 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 10-11.
  • 19. ou nas Artes Visuais temos que def inir um lado de atuação: críticos x acríticos? Você vai prestar constar ou um desfavor à sociedade? Nesse sentido, penso como certas as palavras de Candido, considerando que tratar a cultura brasileira a partir de nossas produções artístico-literárias – um dos objetos de estudos naquela época da disciplina de Literatura Comparada –, e que aqui encampo as produções artístico-culturais em geral, pode ser o mesmo que estudar Estudos Culturais. Mesmo que no período entre meados dos anos de 1940 ainda prevalecesse entre os estudiosos de Literatura Comparada uma dicotomia crítica entre Cópia X Modelo para se pensar a produção artístico-cultural brasileira. Já tal afirmativa mostra que as leituras críticas já não se apegavam meramente ao texto literário. Logo, havia uma expansão das análises críticas as quais consideravam outros quesitos como forma de leituras literárias, a exemplo: contextos sócio-históricos, relações pessoais culturais, identidades, inter-relações culturais, etc. Talvez deve-se essa abertura exatamente ao que gerava a dúvida da época: Literatura Comparada = Estudos Culturais? Como mostra Eneida Maria de Souza: Embora nossa formação acadêmica tenha sido sempre pautada por inclinações mais teóricas e reflexivas, a perspectiva analítica comparativista tem o mérito de ampliar essa visão. Ao trazer para o palco do debate a pergunta sobre o lugar que ocupa na tradição da cultura nacional — minada, desde os primórdios, de ideias e importações estrangeiras —, a literatura comparada procura se nutrir desse heteróclito tecido cultural.22 É curioso pensar em um trabalho que já está tratando da relação Artes Visuais X Estudos Culturais, observar que ainda nem existe uma disciplina denominada de Artes Comparadas nos departamentos de Artes Visuais pelo país! Com base no exposto, pode-se afirmar que os Estudos Culturais já se faziam presentes no Brasil exatamente na mesma época em que eram formuladas suas bases na Inglaterra por seu representante maior Raymond Williams. No Brasil, parece haver um consenso crítico, independente da vertente que concorde ou não com a ideia de que a literatura brasileira é galho da literatura portuguesa, que a entrada pela porta da frente dos Estudos Culturais aqui se deu no Seminário da ABRALIC de 1998. Como muitos outros países, o Brasil teve formas de estudos culturais bem antes de a disciplina se transformar em mais uma grife acadêmica a ser exportada pelo mundo anglo-saxão. Mas a data oficial de seu reconhecimento institucional no país pode ser 1998, ano em que a Associação Brasileira de Literatura Comparada, Abralic, que reúne 22 SOUZA. “O espaço nômade do saber”, p. 41.
  • 20. professores e pesquisadores da área, escolheu para seu congresso bianual o tema “Literatura Comparada = Estudos Culturais?”.23 Nesse sentido, vale uma indagação: e em Artes Visuais quais eram os seus aborrecimentos teórico-críticos e artísticos a ser pensados? Acredito nessa possibilidade relacional entre o que se produzia de crítica literária aqui no Brasil com o que pensava Williams na Inglaterra, em meados da década de 1950, sobra a criação de um estudo de cultura, levando-se em conta que ambas as reflexões teóricas se davam na intenção de formular um estudo voltado para a compreensão e a reformulação do que se formulava ser as culturas “menores”. Mas com uma diferença: na Inglaterra, valeu-se da classe trabalhadora para se discutir o conceito de cultura elitista, enquanto no Brasil partiu-se da literatura nacional e, que agora, proponho que se parta das produções artístico-culturais do ensino e da produção em Artes Visuais. Tendo sempre em mente, é claro, que no Brasil o processo de repensar as questões culturais se deu a partir da tentativa de resolver o dualismo entre cópia e modelo – dependências culturais –, enquanto na Inglaterra a questão pertinente era se fazer “conhecer” as culturas e suas práticas populares. Questão que se fez rachar em grupos os estudos brasileiros. A primeira coisa que me agrada nos Estudos Culturais é apresentarem-se como estudos. Instala-se, imediatamente, uma provisoriedade, uma abertura, que me parece indispensável em um momento de questionamentos, de necessariamente assumirmos as dúvidas que vivemos diante do século que se inicia.24 Provisoriedade e abertura que se tornam itens de confrontos para os literatos mais tradicionais contra os Estudos Culturais. Maria Elisa Cevasco “partilha” da ideia da produção artístico-cultural brasileira como subtração da europeia por considerar que essa condição de colonizador é fato consumado, mas nem por isso, defende a questão como solução para pensar a nossa produção cultural: 23 CEVASCO. “Estudos culturais no Brasil”, p. 173. 24 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 11.
  • 21. No caso da crítica-cultural, que mais de perto interessa à exposição de uma pista possível para o desenvolvimento dos estudos culturais no Brasil, essa dialética entre as peculiaridades do Brasil e a história do capitalismo na sua dinâmica internacional foi explicitada pelo próprio Roberto Schwarz. [Atravessada pela crítica culturalista sabemos que um tema definidor da cultura brasileira se desenvolve em torno da dualidade nacional/estrangeiro, onde o nacional é sempre, para usar outra fórmula do crítico, por subtração.25 (Grifo meu) Talvez, arrisco um palpite, essa porção mais ácida de Cevasco que considera a subtração cultural brasileira, mas não uma solução crítica deve-se à sua porção marxista de percepção do mundo capitalista. Já Eneida Maria de Souza, estudiosa que defende a tendência crítica nacional “a favor da cópia”, nos vê sem remorsos nenhum com sentido de traição a um modelo. Entendo que a título de subversão crítica, Souza coopta aos Estudos Culturais para movimentar os debates26 crítico-intelectuais empoeirados nos departamentos institucionais: Essa prática, voltada para o exame particular do texto, para os detalhes de construção e as minúcias de efeitos de linguagem, continua a ser um de nossos grandes trunfos. Com a retomada de pesquisas inseridas num projeto mais abrangente e em perspectivas — em que se diminui o valor profundidade analítica e se concentra no olhar horizontal e em superfície —, ampliam-se os horizontes da leitura textual, atingindo-se dimensões de natureza cultural. A abordagem intercultural revitalizada pela pesquisa comparativista [atravessada pela crítica culturalista] encontra na prática tradutória, inaugurada pelos ensaístas e poetas paulistas, uma das formas mais convincentes para que sejam redimensionadas essas relações. A tradição das literaturas nacionais se enriquece diante da possibilidade de trair modelos e de repensar origens.27 (Grifo meu) Aproveito a passagem de Eneida de Souza para chamar a atenção dos atuais e futuros professores e artistas visuais ao termo prática tradutória: referendado pela autora, é necessário explicar que toda teoria antes de ser aplicada como epistemologia do saber, deve ser “traduzida” para a cultura local antes de ser repassada. Faz-se necessária essa explicação considerando que “alguns poucos” podem não conseguir fazer uma “tradução” das discussões e formulações que proponho pelas Letras (Estudos Culturais) para pensá-las nas Artes Visuais. Posto isso, mesmo com a dicotomia existente nas vertentes de Estudos Culturais no Brasil, percebe-se que ambos os Estudos, tanto o inglês quanto o brasileiro, têm a mesma preocupação e “[...] o desejo de intervenção para mudar a sociedade, e de uma intervenção prática”,28 mesmo que cada vertente quisesse, nas 25 26 C.f. SOUZA. “A teoria em crise”, p. 67-78. 27 SOUZA. “O espaço nômade do saber”, p. 43. 28 CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 158.
  • 22. suas respectivas diferenças, fazer alterações no modo de pensar a sociedade, como já venho afirmando ao longo de quase todo este trabalho; além de romper com os limites disciplinares tradicionais: Interessa-me a ruptura inicial com a burocrática investigação universitária organizada em disciplinas, caudatária do modelo de vida de conventos, fechados ao mundo e divididos em celas. Mesmo a pesquisa que hoje se pretende interdisciplinar, ou transdisciplinar, permanece frequentemente tributária das disciplinas, divisões do saber sacralizado de que o professor se faz zelador.29 Mas como bem observa Williams, os Estudos Culturais, por ele antes pensados, têm entre seus objetivos, dos quais gostaria que fosse retirado algum proveito – pelo professor e artista – para pensarem o ensino e a produção em Artes Visuais: [...] levar o melhor que se pode produzir em termos de trabalho intelectual até pessoas para quem esse trabalho não é um modo de vida, ou um emprego, mas uma questão de alto interesse para que entendam as pressões que sofrem, pressões de todos os tipos, das mais pessoais às mais amplamente políticas – se estivermos preparados para assumir esse tipo de trabalho e revisar os programas e a disciplina da melhor maneira possível, nos locais que permitam esse tipo de troca, então os estudos culturais têm um futuro efetivamente notável.30 Quero entender o desejo de Williams capaz de ser pensado seja nas Letras, seja nas Artes Visuais. Uma vez que as teorias também circulam e devem ser modificáveis ao longo dos tempos e pelos locais por onde elas passam. Na esteira de Raymond Williams, penso que vale as discussões entre os diferentes discursos teórico-críticos brasileiros se a intenção for a de enriquecer o discurso crítico-cultural brasileiro acerca de podermos pensar e ensinar melhor as questões culturais nacionais. Caso contrário, e o que de fato não dá mais para se fazer com nossas produções artístico-culturais é simplesmente classificá-las de modelos ou cópias; importadas ou nacionais; local ou universal; bom ou ruim; presta ou não presta, tendo sempre como parâmetros e pano de fundo as produções artísticas internacionais, as estético-formais e, o que é pior a meu ver, a inexistência por trás delas de um sujeito autoral. [...] o papel de intelectual, de crítico, de questionador, quando aliado ao de fruidor e de analista da textualidade, pode despertar no teórico da literatura [entenda-se da cultura] uma atração pelo campo mais do que interdisciplinar dos Estudos Culturais. Quando, além disso, o que se propõe é o natural e inevitável cruzamento realizado pelo comparativismo, seja como for que seja entendido, o terreno se torna inevitavelmente fértil para os Estudos Culturais, ou Estudos de Cultura, [...].31 29 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 12. 30 WILLIAMS, apud CEVASCO. “Estudos culturais contemporâneos”, p. 156. 31 RESENDE. “A indisciplina dos Estudos Culturais”, p. 23-24.
  • 23. Afinal, parece ser um consenso crítico brasileiro ainda não saber resolver e responder a questões duplicadas entre nacional/universal que, inclusive, podem ser encontradas em certas manifestações atuais. Referências BESSA-OLIVEIRA. Marcos Antônio. Ensino de Artes X Estudos Culturais: para além dos muros da escola. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2010. _____. Paragens, passagens e passeios: movimentos de geovisualocalizações das artes visuais. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2011. BESSA-OLIVEIRA, Marcos Antônio; TORCHI-CHACAROSQUI, Gicelma da Fonseca (Orgs.). Misturas e diversidades: reflexões diversas sobre arte e cultura contemporâneas. São Carlos, SP: Pedro & João Editores, 2012. ANTONIO CANDIDO – Cronologia, Bibliografia do Autor, Bibliografia sobre o Autor, Artigos e Entrevistas – http://www.pacc.ufrj.br/literaria/candido.html – acesso em: 17 de março de 2010. CEVASCO, Maria Elisa. Oitava Lição – Estudos literários x estudos culturais. In: _____. Dez lições sobre estudos culturais. São Paulo: Boitempo Editorial, 2008, p. 138-154. _____. Nona Lição – Estudos culturais contemporâneos. In: _____. Dez lições sobre estudos culturais. São Paulo: Boitempo Editorial, 2008, p. 155-172. _____. Décima Lição – Estudos culturais no Brasil. In: _____. Dez lições sobre estudos culturais. São Paulo: Boitempo Editorial, 2008, p. 173-188. CEVASCO, Maria Elisa. A crítica cultural marxista. In: Cadernos de Estudos Culturais: Crítica Contemporânea. v. 2, n. 3. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2010, p. 71-79. CHALMERS, F. Graham. Seis anos depois de Celebrando o pluralismo: transculturas visuais, educação e multiculturalismo crítico. Tradução de Belidson Dias. In: BARBOSA, Ana Mae. (Org.). Arte/educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005, p. 245-263.
  • 24. CUNHA, Eneida Leal. A emergência da cultura e da crítica cultural. In: Cadernos de Estudos Culturais: Literatura Comparada Hoje. v. 1, n. 2. Campo Grande, MS. Ed. UFMS, 2009, p. 73-82. GOMES, Renato Cordeiro. Babel-cosmópolis: um imperativo digital?. In: Cadernos de Estudos Culturais: Estudos Culturais. v. 1, n. 1. Campo Grande, MS. Ed. UFMS, 2009, p. 73-87. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 9. Ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. HATTNHER, Álvaro. Pós-modernismo e cultura popular: algumas observações. In: Cadernos de Estudos Culturais: Crítica Contemporânea. v. 2, n. 3. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2010, p. 9-14. JAMESON, Fredric. Espaço e imagem: teorias do pós-moderno e outros ensaios de Fredric Jameson. 4.ed. organização e tradução de Ana Lúcia Almeida Gazzola. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2006. LOPES, Denilson. Notas sobre crítica e paisagens transculturais. In: Cadernos de Estudos Culturais: Crítica Contemporânea. v. 2, n. 3. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2010, p. 21-28. MELENDI, Maria Angélica. Contra o formalismo (outra vez?) – algumas anotações sobre a crítica de artes em Belo Horizonte. In: Cadernos de Estudos Culturais: Crítica Contemporânea. v. 2, n. 3. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2010, p. 63-70. NELSON, Cary, TREICHLER, Paula A., & GROSSBERG, Lawrence. Estudos Culturais: uma introdução. In: SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995, p. 7-38. (Coleção estudos culturais em educação) RESENDE, Beatriz. A indisciplina dos Estudos Culturais. In: _____. Apontamentos de crítica cultural. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2002, p. 9-54. SANTIAGO, Silviano. Destino: globalização. Atalho: nacionalismo. Recurso: cordialidade. In: Cadernos de Estudos Culturais: Estudos Culturais. v. 1, n. 1. Campo Grande, MS. Ed. UFMS, 2009, p. 89-104. SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.) e Tradução. O que é, afinal, Estudos Culturais?.3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. (Estudos Culturais, 2)
  • 25. SILVA, Tomaz Tadeu da. (Org.). Alienígenas na sala de aula. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. (Coleção estudos culturais em educação) SOUZA, Eneida Maria de. O espaço nômade do saber. In: _____. Crítica cult. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, p. 39-47. _____. A teoria em crise. In: _____. Crítica cult. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, p. 67-78. _____. O não-lugar da literatura. In: _____. Crítica cult. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002, p. 79-88. SOUZA, Eneida Maria de. Babel multiculturalista. In: Cadernos de Estudos Culturais: Estudos Culturais. v. 1, n. 1. Campo Grande, MS. Ed. UFMS, 2009, p. 17- 29.
  • 26. INVESTIGAÇÕES REFLEXIVAS SOBRE A CULTURA NO ESPAÇO DA ARTE Profa Ma. Aline Sesti Cerutti Curso de Artes Visuais/Universidade Federal de Mato Grosso do Sul GT1 Arte e Cultura Resumo: A arte é um campo específico de produção simbólica expressiva e em um contexto sóciocultural realiza diálogos profícuos com os elementos da cultura. A partir de experiências vivenciadas no Curso de Artes Visuais/UFMS, através da orientação das pesquisas, dos estágios e de análises documentais, foi possível elaborar o relato contemplando investigações reflexivas sobre a cultura no espaço da arte. A ideia principal das discussões propostas está estruturada em torno dos conceitos culturais considerados importantes na leitura e compreensão do contexto histórico-cultural presente tanto no trato das temáticas étnicas culturais, quanto da arte contemporânea. Nesta última, foram citadas algumas obras observadas na 8a Bienal do MERCOSUL: Geopoéticas (RS, 2011) que interagem com as reflexões no texto. Alguns conceitos culturais são apresentados no trabalho, como forma de fomentar reflexões sobre a formação das identidades, os processos interculturais, as mestiçagens e hibridismos, a etnicidade, dentre outros. Palavras-chave: conceitos culturais, temáticas étnicas, ensino de arte. Introdução Cultura pode ser compreendida como a construção participativa dos indivíduos num sistema geral de formas simbólicas. Geertz (1989, p.4) concorda com Max Weber quando diz que “o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e suas análises. (...) como uma ciência interpretativa, à procura do significado”. É um campo de conhecimento multidimensional que interage com as outras ciências como a antropologia, a sociologia, a história, a arte. Segundo Fernando Hernandez (2000, p.53) “o olhar da produção artística é um olhar cultural”. É necessário ao produzir, pesquisar ou ensinar arte, considerar aspectos mais profundos do que os que aparecem no meramente visual, é olhar a arte de uma época como produto de uma complexa rede de relações sócio-culturais. Os ambientes educativos no ensino de arte, em escolas ou nos museus, tornaram-se espaços profícuos de diálogos reflexivos entre a arte e a cultura. Os mediadores dessa tarefa são o professor de Artes, o produtor cultural e o artista, propositores do diálogo interativo com a sociedade, que intervêm dessa forma, na reprodução ou ressignificação de ideias, valores e representações sócioculturais. Como professora das disciplinas Fundamentos da Cultura e Cultura Brasileira e Estágio no Curso de Artes Visuais- Licenciatura e Bacharelado/UFMS, a autora do
  • 27. 2 presente trabalho tem sempre a oportunidade de entrar em contato com os acadêmicos, realizar orientação de pesquisas, conhecer referências curriculares e outros documentos com a finalidade de acompanhar o processo de ensino de arte nos estágios nas escolas públicas de MS. Interagir com obras de arte em espaços como no ano de 2011 na Bienal de Arte do MERCOSUL, intitulada Ensaios de Geopoética1, possibilita experiências para ampliar os referenciais e diálogos entre a arte e cultura. Algumas obras integram texto, tornando-se exemplos reflexivos. O relato discute os conceitos culturais aplicados às temáticas étnicas culturais (Africanidades e Povos indígenas) e à arte contemporânea, no ensino de arte. 1. Conceitos Culturais nos diálogos com as temáticas étnicas culturais Esta reflexão poderia ser iniciada com os seguintes questionamentos: Que imagens os mediadores estão discutindo nos ambientes educativos? Enfocam a história, a arte e a cultura de que povos? As discussões conceituais contribuem para reflexão crítica e ressignificações sócioculturais? Estas questões remetem a “velhos discursos”, porém não menos importantes que outrora, que continuam pertinentes nas reflexões sobre o ensino de arte. As imagens no ensino de arte são na sua grande maioria as obras de arte, no entanto, outras que compõem a cultura visual como os quadrinhos, a publicidade, a ilustração são pouco citadas. A seleção das mesmas fica a cargo do professor de Artes que, nas escolas estaduais de Mato Grosso do Sul, recebe orientações através dos Referenciais Curriculares elaborados pela Secretaria de Educação do Estado/SED/MS. O conteúdo de História da Arte aparece nos documentos oficiais como um eixo norteador. Ele é delineado no título principal de conteúdos para os semestres do 1o ao 5o ano no Referencial Curricular do Ensino Fundamental2. Observe-se o exemplo no 1o bimestre do 1O ano: Explorando possibilidades com artes visuais, música e teatro, por meio da História da Arte internacional e nacional com ênfase na cultura de Mato Grosso do Sul, fazendo uso de: ponto, linha e formas, Cores primárias e secundárias, desenho, canções infantis, música popular e erudita, cultura popular, linguagem teatral, cultura afro-brasileira, indígena e demais etnias (SED, 2012, p. 133). 1 Bienal de Arte do MERCOSUL: Ensaios de Geopoética . Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/ Acesso: 20/04/2012. 2 Secretaria de Estado de Educação/SED/MS. Referenciais Curriculares do Ensino Fundamental. Disponível em: http://intra.sed.ms.gov.br/portal/Arquivos/Publicos/referencial_curricular_completo_ensino_fundamental_VERSAO _PRELIMINAR.pdf. Acesso em: 10/03/2012.
  • 28. 3 A orientação para o ensino de arte tem o enfoque de uma grande área (artes visuais, música e teatro), onde se deve trabalhar de um lado com a “História da Arte nacional e internacional”, e apenas isso já contemplaria as produções de diferentes povos, mas também foi enfatizado o trabalho com a “arte da cultura de Mato Grosso do Sul”. Além disso, consta no final da citação a “cultura afro-brasileira, indígena e demais etnias3”, o que levanta questões reflexivas. A primeira é de como ainda se apresenta uma dicotomia da arte/história da arte e da cultura ao se tratar da arte. Como se fosse possível compreender a arte sem conhecer o contexto sóciocultural em que foi produzida. Há que se dizer, no entanto, que é possível discutir conceitos culturais sem que eles sejam relacionados à arte. E, a segunda é sobre a construção etnocêntrica ou eurocentrismo histórico no ensino de arte, privilegiando o conhecimento sobre a arte e a cultura de alguns povos e silenciando ou distorcendo o de outros como, os indígenas e os afrodescendentes. Justificando assim, de forma enfática, o trato da cultura dessas etnias no currículo. Isto se deve também à promulgação da Lei No 11645/20084, que torna obrigatória a História e Cultura Afro-brasileira e Indígena no currículo, em especial na disciplina de Artes. Comparando os dados do Referencial aos resultados das pesquisas realizadas pelos acadêmicos5 do Curso de Artes Visuais, sobre o estudo das Africanidades e o dos Povos Indígenas nas instituições públicas de MS, é possível concluir que há uma produção de conhecimento bem generosa sobre essas duas temáticas, acessível aos professores, incluindo ótimos sites e bibliografias nas escolas, elaborados pelo Ministério da Educação e Cultura/MEC. Com relação às Africanidades, as pesquisas nas escolas revelam que os professores têm conhecimento sobre a Lei e acesso a vários materiais didáticos sobre o tema, trabalham muito sob a forma de projetos, relacionados a datas do calendário escolar, porém não citam suas referências bibliográficas e imagéticas na pesquisa. 3 No Referencial Estadual (2012) as temáticas “Cultura afro-brasileira, indígena e demais etnias” são abordadas em todos os bimestres do 1o ao 5o ano, do ensino fundamental, desaparecem nos anos que se seguem e voltam no 2o bimestre do 7o ano. 4 Lei No 11.645, de 10 de março de 2008, altera a Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. 5 SANTOS, Tiago Nelson dos. Arte Africana Tradicional e Afro-brasileira: contexto histórico e cultural, avanços no ensino fundamental. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. BOLDORI, Aveline Karen Tenório. Aplicabilidade da Lei 11.645 de 10 de março de 2008. A Cultura Indígena na Escola. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. BARROS, Lívia de Oliveira. Aproximações antropológicas em arte: culturas em diálogo. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011.
  • 29. 4 Deve-se saber, por exemplo, que o estudo da História Africana Tradicional é fundamental para se compreender as influências na cultura afro-brasileira. Para tanto, Serrano (2008, p.16) diz que é necessário a “interconexão de diversas disciplinas e de campo de conhecimento. Ao lado da História, a contribuição da geografia, da sociologia, da ciência política e marcadamente da antropologia”. Esses estudos não se remetem mais à questão biológica ou racial, mas à questão cultural, uma ligação que dá voz e visibilidade ao passado e presente desses povos. Com relação aos povos indígenas, os professores afirmaram conhecer a Lei, porém apresentaram muita dificuldade em relatar suas experiências sobre o tema e não citaram referências. Tratam em geral sobre a arte Kadiwéu e Terena em MS. Dessa forma, fica a dúvida sobre a qualidade do repertório imagético, das referencias e mediações culturais relacionadas às discussões sobre as temáticas étnicas culturais. Luciano (2006, p.31) chama a atenção para a diversidade cultural dos povos indígenas, “constitui-se como uma sociedade única, na medida em que se organiza a partir de uma cosmologia particular própria que baseia e fundamenta toda a vida social, cultural, econômica e religiosa do grupo”. Para compreendermos a arte e a cultura afro-brasileira e indígena é necessário perceber as particularidades e a complexidade existentes na produção simbólica dessas etnias em diferentes contextos histórico-culturais, incluindo mediações e reflexões críticas sobre os conceitos culturais básicos. Assim será possível discutir, por exemplo, sobre construção e ressignificação das identidades e tradições, processo de mestiçagem e reetinização no Brasil, dentre outros, que revelam representações e estereótipos sobre estes povos ao longo da história. Há que se compreender que os discursos relacionados à construção de uma nação brasileira mestiça que permearam os anos 30 até os 70 do século XX, valorizando a mestiçagem como identidade étnica cultural nacional marcada pela integração das três etnias (o branco, o negro e o índio), passam por transformações no Brasil contemporâneo. Segundo Sergio Costa (2001) há um processo de pluralização cultural e política, buscando-se a etnicidade nas identidades, fase de reconstrução de raízes culturais étnicas pelos grupos socioculturais. Etnicidade presente nos discursos dos afrodescendentes nas comunidades quilombolas e na dos povos indígenas. Esta nova visão se deve também à reorganização das comunidades
  • 30. 5 étnicas, à ressignificação das tradições e à reconstrução das identidades na sociedade brasileira, conquistas políticas como ações afirmativas governamentais. Segundo Hall, a identidade não pode ser vista como uma coisa acabada, mas sim como identificação. Um processo em andamento construindo biografias ao longo da vida. Vários “eus” fragmentados numa unidade são constantemente reestruturado e sempre pressupõe relação com o outro. A identidade surge não tanto da plenitude da identidade que já está dentro de nós como indivíduos, mas de uma falta de inteireza que é “preenchida” a partir de nosso exterior, pelas formas através das quais nos imaginamos ser vistos por outros (HALL, 2006, p.39). Há que se reconhecer as especificidades étnicas culturais, os pontos de resistência, as ressignificações e a reinvenção das tradições compreendida como: A tradição é um elemento vital da cultura, mas ela nada tem a ver com a mera resistência das velhas formas. Está muito mais relacionada às formas de associação e articulação dos elementos (HALL, 2008, pág. 243). Segundo Stuart Hall, a cultura deve ser compreendida de forma dinâmica fortalecendo identidades, não no sentido de homogeneizar, mas de compreender a convivência das diversidades e o entrecruzamento das culturas, criando novas formas, bem como os hibridismos culturais. Canclini (2006, p. XXV) discorre sobre os processos de hibridização, no sentido de que estes ocorrem em condições históricas e sociais específicas, em meio a sistemas de produção e consumo e assim, “não basta descrever misturas interculturais é preciso lhes dar poder explicativo, situando-os em relações de causalidade e ter a consciência critica dos limites, do que não se deixa ou não quer ou não pode ser hibridado”. Os conceitos culturais aplicados às temáticas étnicas culturais são pertinentes para compreensão das representações e ressignificações no mundo contemporâneo. 2. Conceitos culturais nos diálogos da Arte Contemporânea no ensino de arte Na contemporaneidade, as fronteiras cada vez mais porosas, a facilidade de comunicação com o uso da internet, os comércios transnacionais, a migração de pessoas e mercadorias favorecem a interculturalidade. Enquanto os termos “multiculturalidade” e “pluriculturalidade” significam a coexistência e mútuo entendimento de diferentes culturas na mesma sociedade, e o termo “interculturalidade” significa a interação entre as diferentes culturas. Isto deveria ser o objetivo da educação interessada no desenvolvimento cultural (BARBOSA, 1998, p.14).
  • 31. 6 Os processos multiculturais e interculturais favorecem o acesso à diversidade de acervos visuais e culturais, dando visibilidade a povos pouco vistos ou excluídos da História da Arte. A História da Arte tornou-se o grande eixo articulador dos conhecimentos no Referencial Curricular do Ensino Fundamental. Porém a partir do 6o até o 9o ano, há uma ênfase na História da Arte, estabelecida por períodos artísticos, como se pode observar no segundo bimestre do 6 o ano: Conhecimento e expressão da arte internacional e nacional com ênfase na cultura de Mato Grosso do Sul, por meio da História da Arte e elementos das linguagens visuais, musicais e teatrais: Arte Egípcia e Grega (SED, 2012, p. 151). E dessa forma, a Arte Moderna só vai ser tratada, segundo o documento, no 4o bimestre do 8o ano e a Arte Contemporânea, no 3o bimestre do 9o ano. As obras de arte contemporâneas deveriam dialogar entre si e com outras de outros tempos, dando visibilidade para a estética da América Latina, da África, da Ásia, dos povos indígenas e outros, percebendo similitudes e particularidades das culturas e épocas. Levando a discussão para os museus e galerias, Barbosa (2005) exemplifica exposições de obras organizadas em salas onde o tempo histórico foi ressaltado por comparações entre artistas e não por cronologia e sequencialidade. Nus de Marlene Dumas dialogam com nus de Matisse, levando-nos a refletir sobre as diferenças de representação do corpo da mulher definido por ela própria e a representação da mulher como “o outro” sob o olhar masculino. Serota define sua abordagem como aquela que desenha paralelos entre períodos, explora relações entre artistas (BARBOSA, 2005, p.107). Barbosa (2005) enfatiza a recepção pelo apreciador e a leitura dos campos de sentido da arte como fundamentais para sua compreensão, e diálogos entre as poéticas, como no exemplo dado na obra de Marlene Dumas, artista contemporânea africana e Matisse, artista europeu modernista. Democratizar o espaço da arte, promover o diálogo entre as culturas, não significa a defesa de guetos culturais, nem preferência por esta ou aquela cultura. A ideia é ampliar os referenciais e possibilitar aos estudantes o pensamento crítico a partir de diversos pontos de vista, culturais e étnicos, importantes na formação das identidades. Na perspectiva de Banks (2001, p.315), o estudo da diversidade étnica e cultural não deve apoiar o etnocentrismo nem o nacionalismo. A identidade étnica pessoal e o conhecimento de outras identidades étnicas é essencial para a compreensão e o sentimento de bem-estar pessoal que possa promover a compreensão intergrupal e internacional (CAO, M. In BARBOSA, 2005, p. 201).
  • 32. 7 O debate com os conceitos culturais deve ser considerado importante para compreensão das imagens da cultura visual, bem como as obras de arte, presentes na produção, pesquisa e ensino de arte. São exemplos algumas obras vistas na Bienal do MERCOSUL intitulada Geopoética/2011, realizada no Rio Grande do Sul. Segundo seus organizadores, a exposição propôs explorar alternativas às ideias convencionais de Nação, questionando as retóricas visuais e signos culturais (mapa, bandeira, hino, passaporte), discutindo sobre a transterritorialidade e as estratégias de autoafirmação da identidade cultural, propondo alternativas à cidadania. De algumas obras serão apontados alguns conceitos culturais que podem ser discutidos, começando-se pelos artistas Jean François Boclé e Bernanrdo Oyarzún6 Fig. 1 e 2. Jean François Boclé – Consommons racial! [Consumo racial!]. 2005/2011 Produtos comerciais de diversos países Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/235 O artista caribenho Jean François Boclé, reside na Europa. Com a instalação intitulada “Consommons racial!”, dialoga sobre as imagens dos afrodescendentes e dos povos indígenas nos rótulos de produtos alimentícios e de limpeza. A obra desvela comunidades “invisibilizadas”, cuja publicidade reforça estereótipos de certas etnias na função de empregados domésticos, produzindo identidades nacionais. O artista Bernardo Oyarzún (Chile), etnia Mapuche, com a obra intitulada Cosmética, propõe a reflexão crítica sobre a própria crise de identidade, de origem chileno-mestiça, em relação aos cânones sociais, políticos e estéticos, que imperam no mercado de consumo. Segundo o artista, ele discute a “autoexposição como resultado exploratório de um americanismo vivido em carne própria”. 6 BOCLÉ, François e OYARZÚN, Bernardo. Bienal DO MERCOSUL: Ensaios de Geopoética. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/ Acesso em: 03, mar.2012.
  • 33. 8 Fig. 3. Oyarzún- Chile Cosmética. Vídeo. 2008 Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/21 Conceitos e temáticas culturais estão presentes na arte tanto do passado como do presente. As visualidades estão condicionadas ao contexto histórico-cultural e dominar os conceitos possibilita dar sentido à visualidade. A obra de Regina Silveira intitulada “To be continued ”, aborda as identidades culturais fragmentadas e interculturais, produtos da geopolítica. Ela é composta por peças de um quebra-cabeça gigante, que não se encaixam e representam imagens estereotipadas e fragmentadas da América Latina, como por exemplo, Che Guevara, Carlos Gardel, a Virgem de Guadalupe, os mariachis, as igrejas coloniais, as culturas indígenas pré-colombinas, as frutas tropicais, Carmem Miranda, militarismos e outros. Fig.4. To be continued... (Latin American puzzle) [Para ser continuado... (quebra-cabeça latinoamericano)]. 1998. Vinil adesivo sobre espuma. 40 x 50 cm, 110 peças. Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/261 Silveira7(2012) diz que o quebra-cabeça formado de narrativas abertas e caóticas “misturam diferentes geografias, épocas e culturas. Uma obra (quase diria ‘turística’) que revela o olhar precário do ‘outro’ estrangeiro, que conhece apenas, quando muito, estereótipos da nossa cultura e paisagens”. Questionando as próprias identidades, Barthélémy Toguo, com a obra “The New World clímax”. O artista nascido em Camarões vive na França e observa que, embora 7SILVEIRA, Regina. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/261 Acesso em: 13/04/2012.
  • 34. 9 as fronteiras físicas sejam delimitadas politicamente, as fronteiras culturais encontram-se cada vez mais porosas, produzem hibridismos e transculturalidade. Fig. 5. Barthélémy Toguo The New World climax [O clímax do Novo Mundo]. 2001/2011. Instalação com carimbos de madeira, mesas e xilografias. Fonte: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/218 A obra de Toguo representa carimbos e gravuras do visto de imigração. “Os carimbos têm a forma e a materialidade das talhas típicas africanas que os turistas costumam comprar como souvenirs”8. Sardelich (2006, p.467) diz que para se compreender a arte é preciso ampliar a leitura das imagens, para além do racionalismo de tendência formalista. Trata-se de uma abordagem multirreferencial e transdisciplinar, para compreensão crítica da cultura visual nos ambientes de aprendizagem, problematizando as representações sociais sexistas, de gênero, de classe, e outras presentes nas imagens dos livros, dos outdoors, da televisão, dos postais, dos brinquedos, das obras de arte etc. Nos estudos de cultura visual, Sardelich (2006, 454) vê a cultura como via de mediação visual, refere-se “a valores e identidades construídos e comunicados pela cultura, como também à natureza conflituosa desse visual devido aos seus mecanismos de inclusão e exclusão de processos identitários”. Concorda com Mirzoeff (2003, p. 20) que considera a visualização como uma estratégia para compreender o mundo contemporâneo. Diz que é possível “plasmar a vida em imagens ou visualizar a existência, pois o visual é um “lugar sempre desafiante de interação social e definição em termos de classe, gênero, identidade sexual e racial”. Percebe-se dessa forma os processos culturais engendrados com a arte formando significações. Considerações finais Os diálogos culturais e visuais no ensino de arte, a partir da leitura cultural e dos conceitos culturais, favorecem a percepção e a reflexão crítica sobre o que estas 8 TOGUO, B. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/artista/218 Acesso em: 13/04/2012.
  • 35. 10 imagens dizem ou calam sobre os indivíduos e quais representações, interesses e papéis sociais vêm a ser reiterados, ressignificados ou excluídos nas visualidades. REFERÊNCIAS BARBOSA, A. Mae. Arte/Educação Contemporânea: Consonâncias Internacionais. São Paulo: Editora Cortez, 2005. BRASIL, Ministério da Educação. Lei No 11.645, de 10 de março de 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso em: 12 mai. 2012. BARROS, Lívia de Oliveira. Aproximações antropológicas em arte: culturas em diálogo. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. BOLDORI, Aveline Karen Tenório. Aplicabilidade da Lei 11.645 de 10 de março de 2008. A Cultura Indígena na Escola. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. CAO, Mariàn López F. Lugar do outro na Educação Artística-olhar como eixo articulador da experiência: uma proposta didática. In BARBOSA. A. Mae. Arte/Educação Contemporânea: Consonâncias Internacionais. São Paulo: Editora Cortez, 2005. COSTA, Sergio. A mestiçagem e seus contrários etnicidade e nacionalidade no Brasil contemporâneo. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 13(1): 143-158, maio, 2001. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v13n1/v13n1a10.pdf Acesso em: 3 fev.2012. GEERTZ, Cliford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989. HALL, Stuart. A Identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Ed. DP&A, 2006. _________ Da diáspora: identidades e mestiçagens culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003. LUCIANO, Gersem dos Santos. O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje. Brasília. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada. Alfabetização e Diversidade; LACED/Museu Nacional, 2006. SARDELICH Maria Emilia. Leitura de imagens, cultura visual e prática educativa. Cadernos de Pesquisa, v. 36, n. 128, p. 451-472. Departamento de Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana – BA. Maio/ago. 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/v36n128/v36n128a09.pdf. Acesso em: 10 mar. 2012. MINISTÉRIO DA CULTURA. 8 Bienal do MERCOSUL: Ensaios de Geopoéticas. Disponível em: http://www.bienalmercosul.art.br/. RS. 2011. Acesso em: 20 mar. 2012.
  • 36. 11 REFERENCIAIS CURRICULARES DO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO/SED/MS. Disponível em: http://intra.sed.ms.gov.br/portal/Arquivos/Publicos/referencial_curricular_completo_en sino_fundamental_VERSAO_PRELIMINAR.pdf. Acesso em: 10 mai. 2012. SANTOS, Tiago Nelson dos. Arte Africana Tradicional e Afro-brasileira: contexto histórico e cultural, avanços no ensino fundamental. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Artes Visuais. UFMS. 2011. SERRANO, Carlos. WALDMAN, Maurício. Memória D”África: A temática em sala de aula. São Paulo: Ed. Cortez, 2008.
  • 37. MERCADO E CONSUMO EM ROMERO BRITTO Renata Damus – IESF/Funlec GT 3 – Pesquisa em arte e poéticas contemporâneas RESUMO O trabalho ora apresentado partiu de uma proposta sugerida pelo Professor Marcos Antônio de Oliveira, Coordenador dos cursos de Artes Visuais Licenciatura e Turismo do Instituto de Ensino Superior da FUNLEC, para ser apresentada na defesa da proposta de Mestrado de Estudos de Linguagens da UFMS, neste ano de 2012. Portanto, é um trabalho em fase de pesquisa, ainda incompleto, tem a pretensão de discutir a produção de Romero Britto, a partir de uma visão pós-modernista. A produção artística de Britto sempre foi motivo de divergência entre a crítica especializada e público que consome suas obras. Para elucidar essa questão – se o que Romero Britto produz é arte ou prática de marketing –, faz-se necessário analisar o tema a partir dos aspectos que são atribuídos a esta cultura da pós-modernidade, principalmente aqueles que se referem à produção de imagens e à sociedade do consumo. Para auxiliar nesta reflexão, serão buscadas referências em Jean Baudrillard (1995), Zygmunt Bauman (1999), Nestor Garcia Canclini (2008), Mike Featherstone (1995) e Fredric Jameson (1985), entre outros. Além da pesquisa bibliográfica, será efetuada uma breve leitura de uma de suas obras, intitulada Carmen Miranda, com o intuito de verificar a relação existente entre a linguagem visual das obras de Romero Britto e a cultura da pós-modernidade. Palavras-chave: Romero Britto; Pós-Modernidade; Sociedade do Consumo. INTRODUÇÃO Pesquisar sobre Romero Britto não é uma das tarefas mais fáceis. São poucos os estudos sobre ele ou suas obras, e as dissertações e teses encontradas nos mecanismos de busca da internet ligam Romero Britto à publicidade. Mas o que ele faz pode ser considerado arte ou apenas prática de marketing? Essa questão foi a força motriz para o início dessa pesquisa, ainda inacabada: como Romero Britto pode ter se tornado esse fenômeno cultural pop se o que ele faz não é considerado arte pela crítica especializada. Analisando superficialmente os trabalhos de Romero Britto encontramos, na maioria das vezes, temas ou objetos simples em grandes dimensões, pintados com
  • 38. 2 cores fortes, misturando traços infantis, quase geométricos, e texturas visuais. No início de sua carreira, flores, corações, coqueiros, peixes e elementos da cultura popular pernambucana foram exaustivamente retratados. Com essa linguagem simples, Romero Britto consegue transpor os limites da expressão artística, levando suas formas multicoloridas para a publicidade, aplicando-as em produtos como sandálias, caixas de sabão em pó, veículos automotivos, bebidas alcóolicas, entre outros bens de consumo. As obras criadas por Romero Britto trazem elementos da cultura popular com recursos de composição gráfica e linguagem publicitária gerando uma arte híbrida, assim como ocorreu à época do surgimento da Pop Art nos anos 1950, o que segundo Néstor Garcia Canclini, em seu livro Culturas Híbridas (2008), caracteriza a questão dos hibridismos próprios da arte pós-moderna e da glocalização (global + local) da cultura da contemporaneidade. Geralmente, essas características são bem absorvidas pelos meios massivos e com ressalvas pela crítica especializada. Mesmo apresentando um tipo de linguagem aceita pela maioria do público, teóricos e críticos de arte, os mesmos que consagraram Andy Warhol, Roy Liechstenstein e Claes Oldenburg como ícones da Pop Art, por vezes consideram a produção de Britto como artificial e de mau gosto artístico. Não raro encontrar afirmações de que o que Romero Britto produz é puro entretenimento, entretanto o público ignora as críticas negativas e o transforma em sucesso profissional e comercial, como é possível ver através de seu extenso currículo. A crítica, em especial a brasileira, não considera suas obras como arte: Para Agnaldo Farias, crítico de arte, curador independente e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo-FAU-USP, o que Romero Britto faz não é arte, porque não provoca inquietação. Ele considera-o mais um ilustrador publicitário que um artista de fato. Já o jornalista e membro da Academia Pernambucana de Letras, José de Souza Alencar, diz que seus quadros ficam bem decorando quartos infantis. Aloísio Magalhães, diretor do Museu de Arte Moderna do Recife, acha que Britto “dilui uma série de influências coloristas do imaginário da arte pop. Faz isso
  • 39. 3 com competência, é certo, mas criando um trabalho que já nasce inerte, porque se instrumentaliza em se adequar ao senso comum da cultura de massa” (LEAL, 2003). Paulo Herkenhoff, um dos principais críticos de arte e curadores do Brasil, indagado sobre o que acha da pintura de Romero Britto, reage com ironia: “Nem me faça esta pergunta. Eu lido com arte”. Segundo Cristiana Tejo, crítica, curadora e coordenadora do Departamento de Artes Visuais da Fundação Joaquim Nabuco, no Recife, citada por Monachesi (2006), o circuito que legitima os trabalhos de Romero Britto é formado por ‘celebridades’– políticas e de entretenimento – e, como a maioria das pessoas não detém um olhar crítico sobre a arte, acaba consumindo os valores que são divulgados e validados por esse circuito através da mídia. Diante dessa informação, é impossível não refletir sobre como a mídia tem o poder de influenciar o grande público nos dias de hoje, fazendo-o acreditar que estão consumindo arte: A publicidade constitui um dos pontos estratégicos de semelhante processo. (...) Transforma o objeto em acontecimento. (....) O agente publicitário de sucesso é mestre de nova arte - a arte de tornar verdadeiras as coisas ao afirmar que o são"(BAUDRILLARD, 1995, pág. 134-135). Para entender o porquê dessa divergência entre público e crítica, faz-se necessário compreender a situação atual da cultura e da arte e como a sociedade reage frente às mudanças socioculturais ocorridas no período. Para tanto, é preciso adentrar a discussão no assunto pós-modernidade. CONSIDERAÇÕES SOBRE PÓS-MODERNIDADE Na tentativa de melhor definir a época atual e suas características, outros termos também são utilizados, além de pós-modernidade: hipermodernidade, capitalismo tardio, sociedade de consumo, sociedade do espetáculo, modernização, sociedade pós-industrial, sociedade da mídia ou capitalismo multinacional, entre outros. O que encontramos em comum é a concordância de que acontecimentos recentes na sociedade moderna, como o advento da internet, a saturação de informações e imagens, a ausência de valores, o imediatismo, o aumento do
  • 40. 4 consumo e a globalização de mercadorias e culturas, transformou a sociedade atual, seus valores e identidades. Para entendermos um pouco mais sobre o assunto, veremos a seguir o que alguns teóricos dizem a respeito: Segundo Fredric Jameson (1985, pág. 17), o conceito de pós-modernidade não é apenas mais um termo para a descrição de um determinado estilo. É também um conceito de periodização cuja principal função é estabelecer relação entre o nascimento de novos traços formais na vida cultural com um novo tipo de vida social e uma nova ordem econômica, consequência do crescimento econômico do pós-guerra nos Estados Unidos, no final dos anos 1940 e começo dos 1950. Para Jameson (1985, pág. 17), ainda, nesta nova fase do capitalismo, é possível perceber um rompimento da fronteira invisível existente entre a cultura erudita e a cultura popular (a dita cultura de massa). Como ele mesmo tenta nos explicar, vivemos em um tempo onde é possível ter interesse tanto em preservar a cultura qualificada e de elite contra o cerco de porcarias e bobagens que vemos na TV, nas revistas de fofoca e coisas do gênero, quanto admirar e estudar a cultura kitsch, os pastiches, os filmes B, esse universo de gêneros padronizados, “a ponto de ficar cada vez mais difícil discernir a linha entre arte erudita e formas comerciais”. Nesta nova reformulação de valores proposta pela indústria cultural, a cultura produzida pelas massas é transformada em imagens-símbolos e estas são reintroduzidas na sociedade com novos apelos para o consumo da própria massa, possibilitando, dessa maneira, a oportunidade dos seus antigos detentores de se inserir no atual mundo globalizado. A mídia, na contemporaneidade, é quem exerce a condição de agente operacional dessa globalização, reforçando ou transformando a realidade através da exacerbação das imagens. Isso acaba gerando uma confusão entre realidade e imagens, que faz com que o público seja induzido a acreditar que aquelas representações largamente difundidas fazem parte de sua realidade, transformando tudo em espetáculo. Através da importância que é dada à imagem, a vida é transformada em espetáculo e, para se adquirir algum sucesso, é preciso integrar-se ao meio. O
  • 41. 5 público, para fazer parte desse seleto grupo, se torna mero consumidor, atraído pelas imagens criadas e difundidas pela comunicação de massa. O consumo surge como modo ativo de relação, como modo de atividade sistemática e de resposta global, que serve de base a todo nosso sistema cultural [...] Raros são os objetos que se oferecem isolados, sem o contexto de objetos que os exprimam. Transformou-se a relação do consumidor ao objeto: já não se refere a tal objeto na sua utilidade específica, mas ao conjunto de objetos na sua significação total (BAUDRILLARD, 1995, pág. 17) Nessa citação, Baudrillard nos mostra que o consumo que está presente no nosso dia-a-dia é um consumo de imagens, de signos, de coisas que remetem a associações imaginárias e simbólicas que fazem com que os consumidores atuais estejam interessados mais no significado que esse produto possa ter do que na própria funcionalidade da mercadoria. Nessa lógica consumista, as imagens difundidas pela mídia incessantemente, tornam os objetos e os produtos atraentes a tal ponto que as pessoas sentem necessidade de tê-los. O processo inverteu a relação de consumo, fazendo o público acreditar que desejam algo que não necessariamente precisam. A compra transcendeu a relação puramente comercial. Sobre isso, Bauman nos lembra que o consumo sempre existiu, só o papel da sociedade é que mudou. Se no passado nossos antepassados se perguntavam se deveriam trabalhar para viver ou viver para trabalhar, hoje em dia as coisas mudaram tanto que “o dilema sobre o qual se cogita hoje em dia é se é necessário consumir para viver ou se o homem vive para poder consumir” (BAUMAN, 1999, p. 89). Na atualidade, esse dilema ainda é reforçado pelo sentimento vazio que esse consumismo produz. Hoje em dia, o que mais interessa é a sensação do novo, enquanto o novo ainda é sonho de consumo. Depois que este é adquirido, gera uma satisfação imediata e logo volta a sensação de insatisfação e o desejo por outra novidade. De acordo com a ideia de Bauman, o que importa na sociedade atual é o desejo: desejo de ter, desejo pela novidade e desejo de consumir. Featherstone (1995, pág. 35), em sua opinião, afirma que essa busca pelo novo se deve pelo fato das pessoas compreenderem que todas as coisas que são
  • 42. 6 adquiridas transmitem mensagens. Na cultura do consumo, o indivíduo tem consciência que se comunica de várias formas, além das convencionais como fala e escrita, e até mesmo os bens que possui podem ser interpretados e classificados pelas outras pessoas, transmitindo a mensagem que é uma pessoa com ou sem estilo ou que tem bom ou mau gosto. Isso acaba se tornado um ciclo muito bem explorado pela publicidade através da mídia: o consumidor pós-moderno é seduzido pela associação entre a mercadoria e a imagem que ele representa, e produtos como automóveis, eletrodomésticos, bebidas ou até mesmo uma simples caixa de sabão em pó se transformam em símbolos de beleza, sedução, auto realização e, até mesmo, qualidade de vida. Então voltamos para a questão Romero Britto, o que nos remete à máxima Tostines1: será que Romero Britto faz sucesso e vende porque está na mídia ou está na mídia porque faz sucesso e vende? Será que o artista pode ser considerado um representante da cultura pós-modernista ou ele é apenas um marqueteiro que realiza obras pensando unicamente na indústria cultural? LEITURA DE CARMEN MIRANDA Para adentrarmos na discussão sobre a relação entre as obras de Romero Britto, mercado e consumo, e se seus trabalhos podem ou não serem considerados arte ou apenas representações estéticas para fins publicitários, será realizada uma breve leitura de uma de suas obras, Carmem Miranda, de 2007. Esta não é sua primeira, nem a última, nem a obra de maior destaque. É apenas mais uma dentre várias com o mesmo estilo e uso de cores. Este acrílico sobre tela, com dimensão de 108 X 139 cm, reproduz a imagem de uma figura feminina, coberta por um vestido rodado com saias em babados, colar, brincos e pulseiras de contas, braços levantados simulando movimento, com uma bandeja cheia de frutas tropicais no topo da cabeça, o que nos remete 1 Slogan publicitário criado por Enio Mainardi para Biscoitos Tostines: “Vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais?”
  • 43. 7 imediatamente à imagem de Carmen Miranda, cantora e atriz luso-brasileira, ícone internacional dos anos 1930. A imagem da figura feminina é entrecortada por linhas pretas e, cada um dos módulos formados por esses recortes, foi preenchido aleatoriamente com cores quentes e vibrantes como amarelo, magenta, vermelho, vermelho escuro, três tonalidades de laranja, e duas de rosa; para contrabalancear, o artista utiliza também cores frias e sóbrias como o azul ciano, azul escuro, dois tons de verde, violeta, roxo, ocre e marrom. Além das cores, formas geométricas e figuras orgânicas foram sobrepostas aos módulos formando texturas visuais; em pelo menos três dessas texturas é possível identificar parte da assinatura que Romero Britto utiliza em seus trabalhos. Pelo título da obra, Romero Britto teve a clara intenção de ligar esse trabalho à cantora que se tornou famosa no momento em que o samba “desceu do morro” e passou a ser considerado o maior representante da música nacional (CORRÊA, 2009, pág. 45). Semioticamente, podemos entender uma ligação implícita da figura de Carmen a ele próprio, hoje em dia um dos artistas brasileiros mais conhecidos internacionalmente e que, assim como a própria Carmen, renegada pelos críticos e por uma parcela do povo brasileiro. Se considerarmos a biografia de ambos, a ligação entre Carmen e Romero Britto vai além: tanto a cantora quanto o artista, tiveram o início de seu reconhecimento internacional dos Estados Unidos e ambos ligados diretamente aos interesses da indústria cultural. Analisando um texto de Luiz Zanin, publicado em 9 de fevereiro de 2009, no Caderno Cultura do Jornal O Estado de São Paulo, na ocasião do centenário do nascimento de Carmen Miranda, curiosamente é possível apenas trocar alguns nomes e palavras e temos a impressão de falarmos sobre Romero Britto: Mesmo reinterpretando constantemente esses clichês (ou talvez por isso mesmo), Carmen tornou-se uma das atrizes mais bem pagas de Hollywood, tendo contracenado com bambas da época como Betty Grable, Dom Ameche, Groucho Marx, Jerry Lewis e Dean Martin. Carmen tentou livrar-se desse estereótipo, mas nunca conseguiu. Afinal, ele é que lhe trouxe fama e dinheiro, muito dinheiro, aliás. (ZANIN, 2009)
  • 44. 8 Mesmo reinterpretando constantemente esses clichês (ou talvez por isso mesmo), Britto tornou-se um dos artistas mais bem pagos do Brasil, tendo retratado bambas da época como Madonna, Michael Jackson, Arnold Schwarzenegger, Bill Clinton e a presidente Dilma Roussef. Britto tentou livrar-se desse estilo, mas nunca conseguiu. Afinal, ele é que lhe trouxe fama e dinheiro, muito dinheiro, aliás. (Livre reformulação da autora) Em outra possível leitura da obra, tanto as cores quanto a imagem da figura feminina sorrindo, podem ser relacionados à brasilidade e a alegria do nosso país vista no exterior. Segundo Corrêa (2009), Carmen ficou conhecida pela indumentária de baiana usada em muitos de seus filmes hollywoodianos. A primeira vez que Carmen surgiu cantando “O que é que a baiana tem?” vestida como uma baiana com uma cesta de frutas presa à cabeça foi no filme brasileiro Banana da terra, de 1939. Segundo Green (2000 apud CORRÊA, 2009, pág. 46) “seu modo de atuar era uma imitação exagerada das tradições das mulheres afro-brasileiras dos mercados da Bahia”. Com sua incorporação da baiana, a artista, além de criar sua maior personagem, pode ter contribuído para afirmar a importância destas mulheres na cena urbana do Rio de Janeiro. Com sua “interferência” no modelo tradicional de baianas, Carmen o atualizou e, pouco tempo mais tarde, o “universalizou” – assim como fez com a baianidade do jovem Caymmi. Talvez a consequência mais importante da incorporação estética feita por Carmen tenha sido a de transformar a baiana em ícone da cultura de massa (CORRÊA, 2009, pág. 52). Bignami (2005, apud KAJIHARA, 2008, pág. 31) esclarece que “na época, a grande maioria da população era ainda analfabeta e o rádio era uma das poucas formas de relacionamento do indivíduo com a sociedade, daí a sua força na criação de um universo simbólico da nação”. Assim, acabou que a imagem que Carmem Miranda transmitida através de seus filmes acabou sendo considerado um símbolo da nação brasileira. Portanto, a imagem estereotipada da Carmen na pintura de Romero Britto, de fácil interpretação e assimilação, remete automaticamente à imagem do Brasil e da mulher brasileira no exterior: o de um povo alegre, feliz, colorido e festeiro. A adoção de imagens de fácil compreensão, que Romero Britto faz nessa e em praticamente todas as suas obras, o aproxima mais facilmente do grande
  • 45. 9 público/consumidor. Essa escolha (intuitiva ou proposital) facilita a ligação entre as obras e o grande público sem conhecimento prévio de arte. A imagem se torna signo, de modo a se tornar um objeto de consumo. E o consumidor percebe este objeto não pela função que cumpre, mas pelo que significa para ele ao adquiri-lo. A partir das visões de Baudrillard e Jameson, em relação às imagens e a sociedade, compreender a força da imagem é fundamental para compreender a sociedade na pós-modernidade. MERCADO E CONSUMO EM ROMERO BRITTO A estética vista na obra Carmen Miranda é uma constante na produção de Romero Britto, podendo ser vista em praticamente todas as suas criações. A utilização das cores chamativas e das figuras de simples identificação, pois além de lembrar o Brasil com seu multicolorido, atrai a atenção do público e desperta sentimentos como felicidade, alegria e ânimo, justamente os mesmos que a publicidade quer desencadear para atrair os consumidores para seus produtos. Assim como Andy Warhol, que se deixou fascinar pelo conceito da publicidade, de Claes Oldenburg, que viu nos objetos do dia-a-dia sua fonte de inspiração e de Roy Liechtenstein, com a exploração dos quadrinhos e das imagens populares, Romero Britto também explora imagens de fácil entendimento e de personalidades da mídia. Em sua defesa quanto à representação desse tipo de linguagem em seus trabalhos, Britto afirma que “aquilo que as pessoas buscam na arte é a felicidade”, dando a entender como felicidade o consumo desses objetos (OLIVEIRA, 2008). Quando a publicidade consegue, através de formas criativas e inusitadas, refletir os valores, sonhos e fantasias do consumidor, e o cativa pelo valor percebido do produto que apresenta, pode-se dizer que o objetivo principal é alcançado, pois o que sensibiliza o público é a viabilização de trocas emocionais, despertando sentimentos a partir da trilha sonora de um comercial de TV ou do texto do anúncio veiculado na revista. Esse ato de tocar as pessoas, de emocionar ou fazer sorrir, é o que proporciona o posicionamento ideal do produto na mente dos consumidores, criando fidelidade e reconhecimento (LIMA, 2010). No caso da combinação do trabalho de Romero Britto e a publicidade, é gerada uma identificação e aproximação das imagens de arte com o público, que as
  • 46. 10 reconhece nos produtos e cria uma espécie de confiança e segurança de consumo. Várias são as marcas que licenciaram obras de Romero para reprodução em seus produtos: por exemplo Absolut Vodka, marca sueca de bebida alcóolica que, além de Britto, já se ligou a outros artistas como Andy Warhol, Keith Haring, Kenny Scharf, entre outros; também já se ligaram ao artista marcas como Omo, Campari, Rosa Chá, Pepsi Cola, Disney, IBM e outras interessadas em cultura popular que incorporaram as imagens criadas por Britto em seus projetos especiais. CONCLUSÃO Como já foi dito no início dessa fala, este trabalho ainda não está finalizado. Muita pesquisa e muita análise precisam ser realizadas para que seja possível emitir uma opinião sobre o assunto. É evidente que o sucesso profissional desse artista se deve à linguagem popular que ele utiliza. Ao pintar, ele transporta para tela representações de imagens reais e imaginárias que podem ser consumidas e absorvidas por qualquer pessoa de todas as faixas etárias. É dessa maneira que ele consegue aproximar sua arte da publicidade. Na contemporaneidade, as pessoas são o que consomem, são imagens e produtos. Por ora, acreditamos haver a necessidade do meio acadêmico ver com interesse e analisar criticamente o trabalho executado por Romero Britto, pois ainda há muita polêmica sobre o assunto. Nada é por acaso. Assim como aconteceu com os artistas do Modernismo, que foram rechaçados pela crítica no início do século XX, talvez, no futuro, Romero Britto possa ser visto como um autêntico artista que conseguiu retratar de uma maneira peculiar, esse período conturbado, bombardeado por imagens e informações da atual sociedade do consumo. Talvez, no futuro. REFERÊNCIAS: BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Coleção Arte e Comunicação. Portugal, Lisboa: Edições 70, 1995. BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.
  • 47. 11 CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. 4 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. CORRÊA, Gustavo Borges. Baianas e drags: tramas visuais em Carmen Miranda. Concinnitas: arte, cultura e pensamento/Jorge Luiz Cruz, ano 10, volume 2, número 15, dez. 2009, pág. 42-59 FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. São Paulo: Studio Nobel, 1995. JAMESON, Fredric. Pós-Modernidade e Sociedade de Consumo. In: Novos Estudos CEBRAP. São Paulo, nº. 12, p. 16-26, junho de 1985. KAJIHARA, Kelly Akemi. A imagem do Brasil no exterior: análise do material de divulgação oficial da Embratur desde 1966 até os dias atuais [Trabalho de conclusão de curso]. São Paulo: USP/ECA, Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo, Dez. 2008. Disponível em: < http://www.dadosefatos.turismo.gov. br/export/sites/default/dadosefatos/espaco_academico/premio_mtur/downloads_pre mio_FGV/Graduaxo-1x_Lugar-A_Imagem_do _Brasil _no_Exterior.pdf>. Acesso em: 17 abr. 2012. LEAL, Weudosn Barros. Romero Brito entre os dólares e a crítica. Revista Continente, Ano III, n. 28, Abr./2003, pag. 88-89. Disponível em: <http://www.revistacontinente. com.br>. Acesso em: 14 Mar. 2012. LIMA, Juliana. Romero Britto: O Uso de Imagens de arte como motivação para o consumo. 5 Ago. 2010. Disponível em: <http://www.closetonline.com.br/coluna/ 22/Romero+Britto- +O+Uso+de+Imagens+de+arte+como+motivação+para+o+consumo >. Acessado em: 17 abr. 2012. OLIVEIRA, Solange Ribeiro de. A literatura e as outras artes, hoje: o texto pop e a poesia brasileira contemporânea. São Paulo: Universidade Estadual Paulista- UNESP, Revista de Letras, v.48, n.1, p.101-115, jan./jun. 2008, pág. 101-115. ZANIN, Luiz. Carmen tutti-fruti no cinema. Caderno Cultura. O Estado de São Paulo, 9 fev. 2009. Disponível em: <http://blogs.estadao.com.br/luiz-zanin/carmen-tutti- fruti-no-cinema/>. Acessado em: 17 abr. 2012.