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História, imagem e narrativas
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“O Voto de saias”: breve análise das imagens veiculadas na Revista do
Globo (1930-1934)



                                                                                         Mônica Karawejczyk
                                                                                     Mestranda, PUCRS/IFCH.
                                                                                      monicaka@terra.com.br




Resumo: Os temas da cidadania, da participação política e da inclusão social são, hoje, questões que suscitam
muitas discussões e preocupações na sociedade, sendo um assunto cada vez mais em voga nos meios de
comunicação. Por acreditar que a questão do sufrágio é uma faceta importante da participação feminina no
espaço público e uma conquista recente – pouco mais de 70 anos – é que se deu a proposta deste ensaio, ou seja,
de se perceber como a história do sufrágio feminino foi contada na Revista do Globo de Porto Alegre. Para
alcançar este intento vamos centrar a análise nas imagens veiculadas, sobre este tema, entre os anos de 1930 a
1934. Isso será feito levando-se em conta as propostas metodológicas de Roland Barthes, Boris Kossoy e Ana
Maria Mauad.

Palavras-chave: Sufrágio feminino, Revista do Globo, imprensa, fotografia, charge.
História, imagem e narrativas
                                                        o
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        A proposta deste ensaio é através de uma leitura das imagens veiculadas na Revista do
Globo1, tentar perceber como o sufrágio feminino foi percebido, discutido e veiculado neste
periódico. Para alcançar este intento vamos centrar a análise nos exemplares que foram
publicados entre os anos de 1930 a 1934.

        Escolheu-se este tema porque a cidadania, a participação política e a inclusão social
são, hoje, questões que suscitam muitas discussões e preocupações na sociedade, sendo um
assunto cada vez mais em voga nos meios de comunicação. Por acreditar que a questão do
sufrágio é uma faceta importante da participação feminina no espaço público e uma conquista
recente – pouco mais de 70 anos – é que se deu a proposta deste ensaio.

        Esta revista foi escolhida por ter sido um importante periódico quinzenal e de
informação geral, destinada tanto ao público masculino como feminino, editada em Porto
Alegre pela Livraria do Globo. A Revista do Globo também é considerada uma das principais
representantes do jornalismo informativo moderno na década de 1930, sendo a principal
publicação do seu gênero no sul do país, com uma reconhecida qualidade gráfica e um grande
espaço dado à reportagem fotográfica, baseada na cobertura da vida social.2

        Quer deixar-se claro que este trabalho não tem o objetivo de resgatar a imagem da
mulher veiculada pela revista, mas somente a abordagem que esta faz da conquista dos
direitos políticos pelas mulheres.


O Sufrágio Feminino

        A exclusão das mulheres da vida política se deu praticamente em todos os países
ocidentais até os primeiros decênios do século passado. O direito da mulher de escolher os
seus representantes políticos foi encarado com desconfiança, pois poderia pôr em risco a
família, desagregando-a. A mulher, ao obter o direito a participar mais ativamente da vida
política do seu país, estaria subvertendo a ordem natural e universal dos sexos ao intrometer-


1
  O levantamento da fonte foi feito no Arquivo Histórico de Porto Alegre Moisés Vellinho, no Museu da
Brigada Militar, no Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa, as imagens da revista foram captadas
na Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul e no site da faculdade de letras da PUCRS (
http://www.ipct.pucrs.br/letras onde tem-se toda a coleção da Revista do Globo digitalizada).
2
  Conforme nos informa RÜDIGER, Francisco. Tendências do Jornalismo. Porto Alegre: Editora da UFRGS,
1993, p. 61.

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se no mundo público masculino, desorganizando a vida doméstica e maculando a imagem do
‘anjo do lar’.

        Os movimentos feministas, do século XIX e início do século XX, buscavam a
transformação da condição da mulher na sociedade através, principalmente, da luta pela
participação na cena eleitoral. Geneviéve Fraisse e Michelle Perrot, na obra História das
mulheres no Ocidente, afirmam que o século XIX é muitas vezes pintado como um século
sombrio, triste, opressivo e austero para as mulheres, mas que isso não passa de uma
representação, pois “esse século assinala o nascimento do feminismo, palavra emblemática
que tanta designa importantes mudanças estruturais (trabalho assalariado, autonomia do
individuo civil, direito à instrução) como o aparecimento coletivo das mulheres na cena
política”.3

         Para essas autoras o melhor seria denominar o século XIX como o momento histórico
em que vida das mulheres se alterou, ou seja, o momento em que a “perspectiva de vida das
mulheres se altera: tempo de modernidade em que se torna possível uma posição de sujeito,
indivíduo de corpo inteiro e actriz política, futura cidadã”.4 Nesse sentido, Anne-Marie
Käppeli, no capítulo intitulado “Cenas Feministas”, da mesma obra, nos diz que “o direito ao
sufrágio tornou-se na viragem do século o eixo principal da luta feminista”.5

        A inserção de grandes massas nos mecanismos da vida política é um fato bastante
recente: excetuados os Estados Unidos, o sufrágio universal e a igualdade do voto só foram
conquistados, de uma maneira geral, nos primeiros decênios do século XX.6

        Branca Alves e Jacqueline Pitanguy também nos apontam que o século XIX se
caracterizou por duas frentes de luta do operariado, a saber, a luta por melhores condições de
trabalho e a luta pelos direitos de cidadania, aí incluída a reivindicação do direito de votar e
ser votado, sem o critério censitário. Desse modo, o sufrágio universal surge como uma das
principais conquistas dos homens da classe trabalhadora no final do século XIX, mas ela não
incluía o sufrágio feminino, “esta foi uma luta específica que abrangeu mulheres de todas as

3
  FRAISSE, Geneviéve; PERROT, Michelle. Ordens e Liberdades. In: DUBY, G, PERROT, M. (org). História
das Mulheres no Ocidente. Vol. 4. Porto: Edições Afrontamento, 1998, p. 9.
4
  Idem, Ibidem, loc. cit.
5
  KÄPPELI, Anne-Marie. Cenas Feministas. In: Idem, Ibidem, p. 556.
6
   O Estado do Wyoming nos EUA estabelece o sufrágio feminino em 1869. Citamos alguns países como
exemplos: Inglaterra em 1918 com caráter restritivo, Espanha em 1931, Uruguai em 1934, França em 1944,
Itália em 1945, Suíça em 1971 e Portugal em 1976.

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classes, foi uma luta longa, demandando enorme capacidade de organização e uma infinita
paciência. Prolongou-se, nos Estados Unidos e na Inglaterra, por 7 décadas. No Brasil, por 40
anos, a contar da Constituinte de 1891”.7

        Segundo Céli Pinto, o movimento feminista no Brasil pode ser dividido em dois
momentos, da virada do século XIX para o século XX até 1932, quando as mulheres
brasileiras ganharam o direito de votar e o movimento praticamente se extingue no Brasil
vindo a renascer somente na década de 60, mais especificamente pós-1968.

        Para a autora

                este longo período de tempo que se estende de 1932 até as primeiras
                manifestações nos anos 1970, foi um momento de refluxo do movimento
                feminista. O movimento liderado por Bertha Lutz8 ainda tentou algumas
                intervenções no período pós-1930 e na breve experiência constitucional
                interrompida com o golpe de 1937, após este ano o movimento praticamente
                morre.9

        Céli Pinto ainda nos diz que as lutas e manifestações esparsas das mulheres até a
metade do século XIX cederam lugar à “uma campanha mais orgânica pelos direitos políticos
de votarem e de serem votadas. O movimento sufragista se espalhou pela Europa e pelos
Estados Unidos, construindo a primeira voga de feminismo organizado no mundo”.10 A
historiadora estadunidense June Hahner, no seu livro A Mulher no Brasil, aponta que o voto
feminino, no Brasil, foi um movimento da classe média por direitos políticos, recebendo
claras influências dos Estados Unidos e da Europa, mas que “nunca foi uma tentativa de
revolucionar o papel da mulher na sociedade ou mesmo a própria sociedade. Muitas das
participantes do movimento eram graduadas em direito. A lei serviu como caminho
tradicional para o sucesso político e aceitação na elite, e algumas mulheres seguiram esse
caminho também”.11

        Hahner ainda assinala, em outra de suas obras, que quanto mais as mulheres se
afastassem de seus papéis domésticos “pondo o pé para fora de casa de modo que dificilmente

7
  ALVES, B.; PITANGUY, J. O Que é Feminismo. São Paulo: Brasiliense, 1984, p. 44.
8
   A paulista Bertha Lutz é uma das pioneiras da luta pelo voto feminino e pela igualdade de direitos entre
homens e mulheres no Brasil, luta que travou desde 1918. Em 1919, junto com outras mulheres, criou a Liga
para a Emancipação Intelectual da Mulher, que foi o embrião da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino.
Foi a segunda mulher a ingressar no serviço público brasileiro. Em 1936, ela assumiu o mandato de deputada
federal na vaga deixada pelo titular Cândido Mendes.
9
  PINTO, Céli. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003, p.10.
10
   PINTO, op. cit., p. 13.
11
   HAHNER, June. A Mulher no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 99.

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seriam encarados como uma extensão de suas funções maternais, mais oposição masculina
elas encontravam”.12 O advento da República em 1889 não apenas fortaleceu o desejo
feminista por direitos políticos, mas também deu às mulheres argumentos adicionais em favor
do sufrágio e fez surgir uma pergunta “a implantação da república abriria um novo mundo de
possibilidades também para as mulheres?”13

        Com a primeira Constituição republicana brasileira de 189114 passaram a ter direito ao
voto os cidadãos maiores de 21 anos que se alistassem na forma da lei. A resistência
masculina ao sufrágio feminino mostrou-se difícil de conter, pois segundo a autora

                 a oposição ao sufrágio feminino no Brasil baseou-se na suposta nobreza,
                 pureza e domesticidade das mulheres [...]. A mulher deveria ser um anjo
                 confortador, companheira amorosa de seu homem e a deusa do lar, mas nunca
                 sua adversária ou rival na luta cotidiana da vida. Para os positivistas, a mulher
                 constituía a parte moral da sociedade, a base da família, que por sua vez era a
                 pedra fundamental da nação.15

        Mas conforme o século XX progredia, mais mulheres da classe superior e da classe
média reivindicavam direitos comparáveis aos de seus maridos e irmãos, principalmente
quanto ao acesso aos cargos profissionais e ao voto, contudo elas “não reivindicavam
importantes mudanças nas relações familiares. Nem o voto nem o título universitário
impediriam uma mulher de realizar seus deveres domésticos”.16

        Com este movimento mais moderado em favor dos direitos das mulheres e a obtenção
do sufrágio feminino em vários países da Europa, após a Primeira Guerra Mundial, passou a
ser quase elegante a defesa do voto feminino em alguns círculos da elite brasileira. As
mulheres brasileiras que ocupavam cargos públicos de alto nível17 começaram a liderar uma
campanha pelo sufrágio. Porém, por serem ligadas à elite, elas defenderam mudanças menos



12
   Idem. A Mulher Brasileira e suas lutas sociais e políticas: 1850-1937. São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 77. A
autora refere-se neste trecho as profissões que as mulheres exerciam e que eram consideradas como uma
extensão do seu papel doméstico, destaque para o de professoras e de enfermeiras.
13
   Id.m, Ibidem, p. 80.
14
   Segundo o artigo 70 da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de Fevereiro de 1891.
Disponível em: <http://www.casaruibarbosa.gov.br/expo/const_pdf.htm >. Acesso em 19. Nov. 2005.
15
   HAHNER, op. cit., p. 85.
16
   Idem, Ibidem, p. 94.
17
   June Hahner cita os nomes de Maria José de Castro Rebelo, trabalhando no Ministério do Exterior (1917);
Bertha Lutz com uma alta colocação no Museu Nacional no Rio de Janeiro (1919); Myrthes de Campos, a
primeira advogada admitida nos tribunais brasileiros. Como se pode acompanhar no capitulo oito intitulado
“Organizando-se para o sufrágio feminino.”

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drásticas nos papéis e atitudes da mulher do que as suas antecessoras no final do século
XIX.18

         Hahner ainda enfatiza que

                No Brasil, talvez mais do que em algumas outras nações latino-americanas,
                vários membros da elite, especialmente no Rio e em São Paulo, enviaram suas
                filhas para a Universidade e para profissões, e muitas dessas mulheres
                tornaram-se sufragistas. O sufrágio feminino não foi apenas um movimento da
                classe média brasileira. Pode ser que as sufragistas brasileiras desfrutassem de
                laços próximos com a elite política, o que teria facilitado a obtenção do voto
                feminino no Brasil mais cedo do que na maioria dos países latino-americanos.19

         Mas deve-se salientar que a campanha pelo sufrágio feminino no Brasil não esteve
ligada a nenhum partido político ou a um outro movimento social. Com o ambíguo artigo da
constituição ainda em voga, que considerava aptos a votar os “cidadãos brasileiros”, muitas
mulheres tentaram se alistar para exercer esse direito. Como explicita Rachel Soihet, ao
comentar que a Assembléia Constituinte que aprovou a lei, “optou por uma fórmula vaga,
imprecisa” e que “a partir dessa ambigüidade, a advogada Myrthes de Campos, primeira
mulher aceita na Ordem dos Advogados, requer seu alistamento eleitoral, argumentando que a
Constituição não negava este direito às mulheres”.20

         Foi nos anos trinta que as mulheres brasileiras tiveram a sua inserção na cena eleitoral
e somente após a Revolução de 30.           Getúlio Vargas, assumindo a chefia do Governo
Provisório, designou, pelo decreto n°19.459, de 6 de dezembro de 1930, uma subcomissão
legislativa para estudar e propor a reforma da lei e do processo eleitorais. Uma das reformas
propostas era estender o direito de voto às mulheres, o que se efetivou em 1932, com o
Código Eleitoral Provisório que garantiu o direito de voto às mulheres, porém com restrições,
elas só poderiam votar com a autorização dos maridos ou, se solteiras e viúvas, se
comprovassem terem renda própria21. Mas mesmo assim as mulheres puderam, enfim,
participar da eleição dos deputados constituintes (1933) e escolher seus próprios




18
   Idem, Ibidem, p. 96-102.
19
   Idem, Ibidem, p. 110-111.
20
    SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres. Revista Brasileira de
Educação. Rio de Janeiro, n° 15, pp. 97-117, set.out.nov.dez. 2000, p. 99.
21
   Essas restrições caem com a nova constituição brasileira promulgada em 1934.

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representantes para a feitura da nova Constituição do Brasil22, que determinou no artigo de
número 108 quem seriam doravante os eleitores do país:

                  Art 108 - São eleitores os brasileiros de um e de outro sexo, maiores de 18
                 anos, que se alistarem na forma da lei.

        Tentou-se acima fazer uma breve retrospectiva do tema do sufrágio feminino e das
suas repercussões na sociedade brasileira nos primeiros anos do século XX. A seguir
apresentamos a Revista do Globo e a análise do material encontrado.


A Revista do Globo

          O nascimento da Revista do Globo ocorreu em 1929. Com o apoio dos sócios da
Livraria do Globo, a revista saiu em cinco de janeiro de 1929 e circularia até 1967 de forma
ininterrupta, num total de 942 exemplares. A revista era quinzenal e composta em sistema
tipográfico, variando o número de suas páginas entre 48 (nos seus anos iniciais) e 70 páginas
(na década de 50 e 60). O formato da revista era de 20,5 x 27 cm.23 Nos seus primeiros anos a
Revista do Globo não trazia suas páginas internas numeradas, somente a partir do número 16
de 23/08/1933 é que há numeração nas páginas.24

        Como informa Francisco Rüdiger no seu livro Tendências do jornalismo

                 A Revista do Globo foi criada no vazio deixado pelo fracasso das publicações
                 anteriores do gênero, devido à falta de sustentação econômica. Porém, a capital
                 exigia uma nova revista, as elites viam nela uma necessidade cultural e havia o
                 estímulo do próprio governador Getulio Vargas. [...] A Livraria do Globo,
                 fundada no final do século passado, no espaço de poucos anos tornara-se a
                 maior casa editorial do sul do Brasil. Nesse período, colocou-se a serviço da
                 imprensa porto-alegrense durante várias vezes, graças ao seu moderno parque




22
   A constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934 foi consultada no site
<www.presidencia.gov.br> . Acesso em 01.jun.2005. Grifo meu.
23
   Estas informações foram retiradas do artigo de: HAUSSEN, Doris F.; DUVAL, Adriana R. O Rádio nas
páginas da Revista do Globo (1929/1967). Revista Famecos. Porto Alegre, n°14, abril de 2001, p. 130-132. E das
dissertações de DALMAZ, Mateus. A Imagem de Hitler e da Alemanha na Revista do Globo de Porto Alegre
(1933-1945). 2001. Dissertação (Mestrado em História) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul, Porto Alegre, p. 21-71. E também da dissertação de DULAC, Elaine Beatriz Ferreira. Beleza, Sedução e
Juventude: A Revista do Globo ensinando Feminilidade. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) –
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, p. 11-50.
24
   Desse modo todas as indicações de páginas encontradas nos trechos retirados da revista, até a data
mencionada, foram aferidas pela autora.

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                 gráfico. Em 1929, finalmente lançou sua própria revista, que reuniu a nata da
                 intelectualidade local, sob a direção de Mansueto Bernardi.25

        O Brasil estava vivendo uma nova fase de desenvolvimento econômico, na qual o
principal aspecto era o processo de industrialização verificado a partir de 1930. Edgard
Carone, ao analisar a economia da República Nova, assinala que após a crise de 1929 (que
atingiu todos as formas produtivas), a indústria nacional não só se recuperou como, também,
conheceu um progresso até então nunca visto, tudo isso “graças à necessidade de ser
abastecido o mercado interno” e que “a quebra do domínio oligárquico do café fez com que
ascendessem ao poder novos grupos, não só agrários, mas também de classe média”.26

        Assim, a revista surge neste contexto em que, segundo Rüdiger,

                 houve uma expansão das atividades comerciais e do mercado interno que
                 fomentou o desenvolvimento das modernas empresas jornalísticas, aumentando
                 o público leitor e, de verdade, criando o negócio da publicidade, que
                 progressivamente se tornou a primeira fonte de financiamento do jornalismo.27

        A intenção da revista já é dada a conhecer no seu primeiro editorial onde, Mansueto
Bernardi, fixa os objetivos, trata da escolha do nome e do posicionamento político desse novo
quinzenário brasileiro, acompanhemos o que saiu nesta primeira edição:

                 A Revista do Globo [...] ambicionava ser um aparelho de recepção e
                 transmissão, no Estado, de todas as ondas notáveis do pensamento
                 contemporâneo. [...] Fora de partidos e acima de partidos, nesta faze auspiciosa
                 de apaziguamento das paixões, de audazes iniciativas publicas e particulares,
                 de ventilação dos espíritos, de transmutação de valores, a Revista do Globo
                 quer construir qualitativamente para o Rio Grande do Sul.28

         Não demorou muito para que a revista se tornasse a principal publicação do seu
gênero no sul do País e como informa Elizabeth Torresini

                 A julgar pelo sucesso inicial, seus criadores não se equivocaram ao criar uma
                 revista “fora e acima de partidos”. O Rio Grande do Sul vive um período de
                 intenso apaziguamento, de coalizão, em que não seria bem-sucedida
                 empresarialmente uma revista que não seguisse a tendência do momento. Seu



25
   RÜDIGER, op. cit., p. 61.
26
   CARONE, Edgard. A República Nova (1930-1937). São Paulo: Difel, 1982, p. 5 e 7.
27
   RÜDIGER, op. cit., p. 63.
28
   Revista do Globo, ano I, n. 1, 5 de janeiro de 1929, p. 3. Em todas as citações retiradas das páginas da revista
manteve-se a grafia original da revista.

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                sucesso, como parte de uma empresa, depende das vendas e da aceitação do
                público em geral.29

        Nos seus 38 anos a revista passou por diversas fases, sendo que se pode destacar, para
o período desta pesquisa (1930-1934), a troca de diretores da revista (Mansueto Bernardi,
Octavio Tavares e Érico Veríssimo) e a mudança dada na ênfase do conteúdo da revista, o que
pode ser notada a partir das mudanças ocorridas nos subtítulos da mesma, que nos seus
primeiros anos se autodenominava “Quinzenário de Cultura e Vida Social - Espelho Fiel da
Vida Social e Literária do Rio Grande do Sul”, passando, a partir do número seis de 1933, a se
denominar “Magazine de Atualidade Mundial”.

        No editorial comemorativo do quinto aniversário da revista tem-se uma retrospectiva
da trajetória da revista até o momento, e já adiantando as mudanças que ocorreram a partir de
abril de 1933. Acompanhemos um trecho retirado do editorial intitulado “Mais um ano...”

                Com este numero entra o nosso quinzenario no seu quinto ano de vida. Nascida
                em meio da indiferença ambiente, recebida por muitos com pessimismo, e
                tendo a perturbar-lhe a marcha essa lenda de que as revistas no Rio Grande não
                podem ter vida longa – a REVISTA DO GLOBO se tem mantido até hoje sem
                vacilações nem esmorecimentos, graças ao esforço tenaz e continuado dos
                editores e ao auxilio decidido de um punhado de leitores.
                Esperamos – dentro deste ano que se inicia – imprimir uma feição inteiramente
                nova ao nosso quinzenario: aumentando-lhe o formato e o numero de páginas,
                dotando-o de novas secções e de varios outros melhoramentos, tanto na parte
                redatorial como na parte grafica

        A revista manteve praticamente o mesmo preço no período em que foi analisada. Dos
108 exemplares analisados, o seu preço oscilou de 2$000 (ano de 1930), baixando para 1$000
(quando se tornou semanal por um breve período) e finalmente estabilizando o seu valor em
1$500 até o final de 1934.30 Como nos informa Mateus Dalmáz esse era “um preço acessível,
se considerados, por exemplo, os valores de um ingresso de cinema (entre 1$000 e 3$000), de
uma dúzia de ovos (entre 1$000 e 2$000) e dos ganhos de um professor estadual da capital
(cerca de 563$859)”.31




29
   TORRESINI, Elizabeth W. R. Editora Globo: uma aventura editorial nos anos 30 e 40. 1988. Dissertação
(Mestrado em história da cultura brasileira) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, p. 84.
30
   Exceção feita às edições especiais de fim de ano que eram de 2$000. Informações retiradas das capas das
revistas consultadas.
31
   DALMÁZ, op. cit., p. 41.

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História, imagem e narrativas
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         A tiragem da revista é informada como sendo em torno de 10 mil exemplares, como
se pode verificar na própria Revista do Globo no exemplar 17 de 27 de agosto de 1932, onde
um reclame publicitário explicita:

                Leia sempre e procure divulgar entre seus amigos e conhecidos a “Revista do
                Globo”, a qual não é somente a unica revista no genero no Rio Grande mas
                uma das unicas do extremo sul do Brasil. Só com o apoio unanime dos gaúchos
                é que nosso quinzenario poderá continuar a viver e a oferecer aos seus leitores
                edições cada vez melhores e mais interessantes.
                A “Revista do Globo” aparece duas vezes por mês, mais ou menos nos dias 15
                e 30 e é vendida no balcão da Livraria do Globo, em vários postos de vendas e
                em diversos locais da capital e nas ruas.
                “Revista do Globo” – Redação e Gerencia – Andradas 1416 – 2° Andar.
                Tiragem 10.000 exemplares – Secção de Publicidade – Encarregado Jean
                Ryff.32

        A Revista do Globo encerrou as suas atividades em 1967 quando, nas palavras de Elvo
Clemente, “as dificuldades financeiras, os embates com a concorrência de outros periódicos,
levaram a Revista do Globo a fechar a última página com a tristeza dos numerosos leitores e
com o pesar das letras rio-grandenses e brasileiras”.33



Breve introdução teórica e análise das fotografias


        O levantamento da fonte foi feito em 108 exemplares da Revista do Globo, entre os
meses outubro de 1930 e dezembro de 1934, no qual se encontraram um total de 12 matérias
referentes à questão do sufrágio feminino. Desse total, tem-se que oito referências são
imagens que tratam diretamente sobre o tema pesquisado, sendo três charges e cinco
conjuntos de fotografias. Dessas imagens, o que mais se destaca são as fotos referentes às
eleições na Europa e no Brasil e as três charges vinculadas no ano de 1931. Neste ensaio nos
deteremos nessas fotografias e nas charges.

        Devemos agora nos indagar sobre a validade de se trabalhar com imagens como
fontes. Qual é o potencial de uma imagem como informação? Se só contamos com as imagens
e algumas legendas qual a melhor maneira de extrairmos delas as informações que elas
calam? Imobilizadas eternamente em um gesto congelado no tempo? Como nos indica


32
  Revista do Globo, ano IV, n. 17, 27/08/1932, p. 2.
33
  CLEMENTE, Elvo. As revistas da Livraria do Globo. Continente SulSur .Revista do Instituto Estadual do
Livro, Porto Alegre, ano 1, n° 2, novembro de 1996, p. 131.

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Miriam Moreira Leite ao relembrar, e contestar, a célebre frase de Roland Barthes “até que
ponto uma imagem vale mais de mil palavras?”34 Como interpretar essas imagens? Se
levarmos em conta que a imagem nos traz tantas, ou mais, indagações e dúvidas do que o
documento escrito, qual a melhor maneira de “interrogá-lo” para que nos forneça as respostas
para as nossas perguntas, para o nosso problema de pesquisa enfim? Concordamos com Ana
Maria Mauad quando ela diz que “a imagem não fala por si só; é necessário que as perguntas
sejam feitas”.35

        Leite indica que há, pelo menos duas diferentes tendências historiográficas, uma que
considera as imagens como uma leitura fácil e direta e outra que a considera tal qual o
documento escrito, ou seja, que “são representações que aguardam um leitor que as decifre”.36
Boris Kossoy também salienta este ponto, pois para ele “o documento fotográfico é uma
representação a partir do real, uma representação onde se tem registrado um aspecto
selecionado     daquele    real,   organizado     cultural,   técnica    e   esteticamente,    portanto
                    37
ideologicamente”. E é desta perspectiva que as imagens fotográficas, e também os desenhos
das charges, serão tratadas nas análises que se seguem.

        Assim, o que temos como fonte são as mensagens fotográficas veiculadas por uma
revista ilustrada nos primeiros anos da década de trinta. Procuramos identificar os sinais que
estas imagens podem trazer para melhor esclarecer a nossa indagação: qual foi a perspectiva
da Revista do Globo sobre o voto feminino? É isso que tentaremos identificar na nossa
análise. Desse modo, seguimos a orientação de Ana Maria Mauad e inicialmente organizamos
o nosso corpus fotográfico em função de um tema – o sufrágio feminino.

        Boris Kossoy ainda assinala que

                quaisquer que sejam os conteúdos das imagens devemos considerá-las sempre
                como [...] fontes de informação decisivas para seu respectivo emprego nas
                diferentes vertentes de investigação histórica [...]. As imagens fotográficas [...]
                nos mostram um fragmento selecionado da aparência das coisas, das pessoas,




34
   LEITE, Miriam M. Retratos de Família. Leitura da Fotografia Histórica. São Paulo: EDUSP, 2001, p. 23.
35
   MAUAD, Ana Maria. Fotografia e História – possibilidades de análise. In: CIAVATTA, Maria; ALVES, Nilda
( Orgs.). A Leitura de Imagens na Pesquisa Social. História, Comunicação e Educação. São Paulo: Cortez
Editora, 2004, p. 26.
36
   LEITE, op. cit., p. 23.
37
   KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002, p. 59.

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                 dos fatos, tal como foram (estética/ideologicamente) congelados num dado
                 momento de sua existência/ocorrência.38

        Este autor ainda indica que “a imagem fotográfica fornece provas, indícios, funciona
sempre como documento iconográfico acerca de uma dada realidade. Trata-se de um
testemunho que contem evidências sobre algo”.39 Podemos considerar que a imagem
fotográfica é ao mesmo tempo ícone e índice, como diz Philippe Dubois40, pois guarda uma
marca, um traço, um rastro do real, que deixou suas marcas no papel fotográfico, nas páginas
da revista; e, por isso mesmo traz em si a idéia de semelhança com o real, se confundindo
mesmo no senso comum, com o real, seu referente.

        Tratando especificadamente da fotografia jornalística tem-se o texto de Roland
Barthes A mensagem fotográfica, onde o autor aponta para o que ele chama de “paradoxo
fotográfico” e para o cuidado que devemos ter ao analisar as imagens.Barthes trata a
fotografia dentro de um duplo modo de ver, a maneira objetiva da denotação e a função
subjetiva dada ao leitor, ou a conotação. Para ele devemos cuidar na análise da mensagem
fotográfica ambos os aspectos, o da denotação pura e simples que a fotografia nos passa num
primeiro momento e para a conotação, que é “a imposição de um sentido segundo a
mensagem fotográfica propriamente dita, [e que] elabora-se nos diferentes níveis de produção
da fotografia (escolha, processamento técnico, enquadramento, diagramação)”.41

        Analisemos uma das primeiras menções ao voto feminino, encontrada nas páginas da
Revista do Globo. Esta aconteceu no ano de 1931, e trata-se de uma foto na parte superior da
página 31, do exemplar de número 27 de 21 de novembro. Esta página traz um total de cinco
fotos, na seção “Veja esta”. A foto que nos interessa é a primeira que tem o formato
retangular e ocupa o canto superior esquerdo da página. Ela mostra um homem com um
carrinho de bebê, na rua, parado, fumando um cachimbo, trajando um sobretudo e um chapéu.




38
   KOSSOY, op. cit. p. 21
39
   Idem, Ibidem, p. 33.
40
   DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. São Paulo: Papirus, 1993. O autor explora essas idéias
no capítulo: “Da verossimilhança ao índice: pequena retrospectiva histórica sobre a questão do realismo na
fotografia.”
41
   BARTHES, Roland. O Óbvio e o Obtuso. Ensaios Críticos III. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1990,
p. 15.

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                                            -Veja esta -
                            Fonte: Revista do Globo, ano III, n.27 de 21.nov.31, p.31.



           A primeira vista, poderíamos nos perguntar o que um homem parado fumando um
cachimbo tem a ver com a questão do voto? Mas aí temos a legenda da fotografia que diz:
“As maravilhas do feminismo...O paciente pae de familia, segurando o carrinho que contem
uma futura eleitora, espera pacientemente pela esposa que foi votar...” Temos aqui,
claramente, um exemplo do que Barthes explicita quando diz que “na maioria das vezes o
texto limita-se a ampliar um conjunto de conotações já incluídas na fotografia; mas por vezes,
também o texto produz (inventa) um significado inteiramente novo, que é, de certo modo,
projetado retroativamente na imagem, a ponto de nela parecer denotado.”42

           Neste caso, a palavra dá um significado diferente a mensagem fotográfica, inventando
mesmo uma “história” para a imagem, e como bem salienta Kossoy: “por meio da
composição imagem-texto, um conteúdo transferido de contexto: um novo documento é
criado a partir do original visando gerar uma diferente compreensão dos fatos, os quais
passam a ter uma nova trama, uma nova realidade, uma outra verdade. Mais uma ficção
documental.”43




42
     BARTHES, op. cit., p. 21.
43
     KOSSOY, op. cit., p. 55.

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         No ano de 1931, além desta fotografia temos três charges que tratam da questão do
voto feminino. Comecemos com a primeira menção ao sufrágio feminino que saiu na Revista
do Globo, nos anos que escolhemos para essa pesquisa.Trata-se de um conjunto de seis
quadros de charges, ocupando a página inteira, intitulada Reforma Eleitoral – Voto Feminino,
localizada na metade final da revista no mês de outubro de 1931. Para termos subsídios para
trabalharmos com este tipo de material consultou-se o artigo de Maria Inês Ghilardi,
intitulado O humor na charge jornalística e o livro de Onici Flôres A Leitura da Charge.

        Antes de qualquer coisa temos que nos perguntar o que é considerado como uma
charge. Onici Flôres nos diz que “a charge é um texto usualmente publicado em jornais sendo
via de regra constituído por quadro único. A ilustração mostra os pormenores caracterizadores
de personagens, situações, ambientes, objetos. Os comentários relativos à situação
representada aparecem por escrito”.44Assim devemos dar atenção a tudo o que aparece nestes
desenhos, pois, muitas vezes, a expressão icônica pode nos dizer muito mais do que a escrita.

        Tanto Ghilardi quanto Flôres apontam para a melhor abordagem a se utilizar para que
se possa captar o sentido da charge, pois como aponta Flôres:

                a charge é um interessante objeto de estudo por aquilo que mostra e diz de nós
                mesmos e do mundo em que vivemos, contribuindo, além disso, para moldar o
                imaginário coletivo [...], o conteúdo da charge desnuda a reação ao status quo
                [e é um] tipo de texto sui-generis que mostra e conta, ao mesmo tempo, os
                conflitos sociais. [...] Sua temática, em geral, versa sobre o cotidiano - questões
                sociais que afligem, irritam, desgostam, confundem. 45

        Ghilardi, ao trabalhar com a charge, indica que ela

                pode causar impacto comparável ao de um bom texto crítico. E, ainda, contém
                as emoções que envolvem os fatos, enquanto as reportagens tratam apenas de
                comunicá-los. [...] além de transmitir informações, de forma rápida e sucinta,
                com criatividade e uma imprescindível dose de humor, a charge revela uma
                leitura crítica do mundo atual.46

        Essa autora conclui que o estudo da charge é mais uma das maneiras de se observar
como a realidade é (ou foi) interpretada pela sociedade que pretende retratar, uma vez que ela
só faz sentido se o destinatário da charge compartilha dos mesmos valores de quem desenhou

44
   FLÔRES, Onici. A Leitura da Charge. Canoas: Ed. Ulbra, 2002, p. 14.
45
   FLÔRES, op. cit., p. 11.
46
   GHILARDI, Maria Inês. O Humor na Charge Jornalística. Comunicarte. Campinas, v. 12, n° 20, 1995/1996,
p. 87.

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a mesma, isto é, a charge pode “propiciar um retrato, mesmo que não completo e detalhado,
da época e do mundo atual”.47

        Ghilardi descreve, segundo a sua percepção, qual seria a maneira mais correta para se
estudar uma charge.Para ela

                é necessário o conhecimento do assunto tratado, das pessoas nela representadas
                e do contexto, pois ela leva em conta o fato noticiado ao qual se vincula. [...] A
                caracterização do ambiente, dos personagens, e as marcas simbolizando o tema
                são suportes necessários à interpretação adequada.48

        Onici Flôres ainda assinala que

                na charge, articulam-se as relações entre autor, narrador e personagens na
                mesma vinheta [...]. Ela apresenta com que uma tirada conclusiva, uma réplica
                a respeito de um dado evento social, supostamente público e notório,
                envolvendo quem assina, quem narra e as personagens, ou seja, reunindo
                instâncias discursivas textuais e extratextuais.49

        Levando-se em consideração o que essas autoras explicitam sobre os cuidados
metodológicos para se trabalhar com as charges, é que procuramos fazer a análise que agora
se segue.

        A edição de número 24 de 10 de Outubro dedicou uma página inteira à charge
referente ao voto feminino, como já mencionado acima. A página aparece assinada pela
alcunha de Nery. Apresenta cinco quadros contendo desenhos e textos e, um desenho de uma
senhora idosa atrás da montagem dos quadros, com a legenda “Voto em separado”. Todos os
quadros versam sobre a questão do voto feminino, mostrando os (pré)conceitos da época.
Vamos analisá-los mais detalhadamente.




47
   GHILARDI, op. cit., p. 92.
48
   GHILARDI, Ibidem, p. 87-88.
49
   FLÔRES, Ibidem, p. 14.

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                                    - Reforma Eleitoral Voto Feminino -
                             Fonte: Revista do Globo, ano III, n.24 de 10.out.1931, p. 37.

        O primeiro quadro50 mostra um casal com a seguinte legenda: ‘Justamente por você
ser meu marido, o meu voto seria suspeito, vou da lo ao Juca’. O que nos diz essa charge?
Além da obviedade da frase, onde supostamente a mulher aparece como uma feminista
consciente de seus direitos, o que mais chama a atenção neste quadro é a forma como a
mulher está vestida. O que a distingue do homem é somente a saia (indumentária
exclusivamente feminina neste caso) e os cabelos mais longos. Até mesmo a flor na lapela,
que poderia parecer a primeira vista uma concessão feita ao seu sexo é mostrada nos quadros
dois e cinco, enfeitando o paletó do malandro. Também chama a atenção que a mulher está
carregando uma pasta e não uma bolsa, como seria de se esperar. Quais os questionamentos
que essa charge leva ao leitor?

        Ao mostrar uma mulher quase que masculinizada e acrescentando a fala à
personagem, essa charge passa a idéia de que as feministas além de serem quase homens (não
se comportarem, nem se parecerem com mulheres) também são incoerentes, observe-se o

50
  Para fins de melhor entendimento da análise das charges mostradas nesta página, foi arbitrada, pela autora, a
numeração dos quadros no sentido horário, começando na parte de cima da folha à esquerda.

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rosto do homem, que apresenta um “ar” de consternação, como se houvesse ouvido alguma
besteira.

        O segundo e o quinto quadro apresentam a estilização de um malandro, que está se
aproveitando das mulheres para ‘viver bem’. Isso nos é sugerido tanto pelo texto quanto pela
postura do homem nestes quadros. O homem aparece bem vestido, fumando um cigarro, com
uma flor na lapela (símbolos de elegância). Em contraste com ele se tem, no quinto quadro,
um homem mal vestido, com a barba por fazer, sem gravata, com remendos na roupa e, com a
clara sugestão, que um e outro se conhecem e talvez sejam até comparsas. O que temos nesta
charge? A típica figura do malandro, do aproveitador que está se dando bem as custas da
ingenuidade da mulher. Acompanhemos o diálogo entre os personagens do quinto quadro, o
mais humilde comenta: ‘Egate! Que elegância!’ E escuta a réplica: ‘ É que agora eu sou cabo
eleitoral de uma mulher linda e generosa!’, ou seja, o direito ao voto ainda não conquistado,
(lembremo-nos que estas charges datam de outubro de 1931), seria mais uma maneira das
mulheres serem enganadas pelos homens mais espertos e sagazes, uma vez que elas não
teriam a capacidade de defesa contra esses tipos. Seria uma maneira de alertar os pais para o
perigo de se conceder o voto a mulher? Provavelmente sim.

        O terceiro quadro mostra uma cena doméstica, um homem mais idoso sentado numa
poltrona na sala de sua casa, lendo o seu jornal, atrás aparece uma moça e um homem mais
jovem de pé, na frente da poltrona. Este jovem parece estar muito contrariado, nota-se isso
tanto pelas feições do seu rosto, que se mostram contraídas, quanto pela posição das suas
mãos, apertadas uma contra a outra e a frente do corpo. O diálogo é esclarecedor, o homem
mais jovem diz: ‘Venho lhe pedir a mão de sua filha.’ Qual é a resposta do pai? ‘Posso lh’a
conceder, mas sem o direito do voto. Nas próximas eleições ele será meu!’ A mulher aparece
neste desenho apenas de forma figurativa, não lhe é dada nenhuma fala, ela encontra-se
parada atrás da poltrona do pai, apenas observando a cena.

        O que nos sugere este desenho? Que a mulher não teria a capacidade de escolher os
seus próprios candidatos, sendo totalmente influenciada pelos homens da família, no caso o
pai e o futuro marido. Esta charge procura mostrar que o homem, de um modo geral, exerceria
uma clara influência sobre a mulher, evidenciando o caráter patriarcal da sociedade da época.

        No quarto quadro temos a figura de um homem sentado com as mãos no rosto.
Propositalmente ou não, o quadro cinco está colocado de tal maneira que esconde o rosto

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deste homem. Coincidência? Ou uma maneira sutil de mostrar que o homem não deve
demonstrar sentimentos em público? Mesmo num desenho? A escrita neste quadro mostra
uma lamentação deste homem, a saber: ‘Minha mulher fugiu com o meu cabo eleitoral. Sou
um homem derrotado nas próximas eleições!’ O que isso pode indicar? Que o mais
importante para ele não seria ter perdido a mulher, mas sim o voto certo que ela lhe daria? Ou
que mais importante que a mulher seria o cabo eleitoral? Parece que este homem está
lamentando mais a perda dos votos, que supostamente teria com o trabalho do seu cabo
eleitoral, do que o fato de ter sido abandonado pela mulher.

        Esse conjunto de desenhos tem, como tema central, a questão da concessão de voto às
mulheres. Temos aqui referenciados vários argumentos para negar o acesso feminino a esse
direito. Como a questão de que as mulheres não saberiam o que fazer ou em que votar, sendo
influenciadas por seus pais e maridos, ou que seriam enganadas por espertalhões que usariam
da falácia para lhes aplicar algum golpe. Desse modo o que se sugere nestas charges é que a
mulher ainda não estaria preparada para exercer o voto.

        Encontramos outro conjunto de charges no exemplar de número 25 de 24 de outubro.
Do mesmo modo que no número anterior é dedicada uma página inteira a essas charges e é
também assinada por Nery.          Trata-se de um conjunto de seis quadros, com o título de
“Profissões Femininas de 1932”. Todos os quadros contêm desenhos de mulheres em
situações que denotam o despreparo feminino para exercer as ditas profissões. As profissões
mostradas são: varredora de ruas, inspetora de trafego, guarda civil, cabo eleitoral e dois
quadros referem-se a esportes, o futebol e o boxe.




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                                     - Profissões Femininas de 1932 -

                        Fonte: Revista do Globo, ano III, n.25 de 24.out.1931, p. 33.




        O quadro com a legenda ‘Cabo eleitoral’ é o terceiro no sentido horário e mostra uma
mulher encostada numa parede na rua (parece ser uma esquina) numa pose não recomendável
para uma moça de família. A mulher aparece mais uma vez em trajes quase que
completamente masculinos, com exceção da saia e do sapato de salto. Ela traja colete,
gravata, casaca, chapéu masculino e ainda traz uma bengala. Tem nas mãos um cartão,
supostamente um ‘santinho’ do seu candidato. As roupas escondem o seu corpo, são soltas e
disformes em contraste direto com as outras mulheres mostradas nos outros desenhos, que
aparecem com os uniformes ajustados sobre o corpo, como a guarda civil ou a inspetora de
trânsito. Exceção feita à varredora de ruas que também traja roupas disformes e sapatos
masculinos (botinas).

        O tema destas charges é o despreparo feminino para o trabalho fora do lar. Ou a
mulher é mostrada como uma sonsa, como no caso do desenho da varredora de ruas, onde fica


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olhando sem entender a cena que se descortina a sua frente (um poste com um chapéu
feminino) ou como é mostrada nos caso da inspetora de tráfego, onde a mulher em vez de se
preocupar com o trabalho está se enfeitando, vendo-se o mesmo “comportamento” no quadro
que retrata a guarda civil que apenas observa enquanto um ladrão anda tranqüilamente pelas
ruas.

        Outra charge intitulada de “Direitos Femininos” foi veiculada no dia sete de
novembro, no canto inferior direito da página nove.




                                         – Direitos Femininos -
                            Fonte: Revista do Globo, n.26 de 07.nov.1931, p. 9.



        Neste desenho vê-se uma mulher andando na rua e dois homens escondidos a
observando. Abaixo do quadro o diálogo dos dois. Um dos personagens fala: “Estás vendo
esta que vae passando! É uma grande defensora dos direitos da mulher...” Ao que o outro
pergunta: “Ah! Então é uma suffragista?” E a resposta do primeiro é: “Não! É uma
escriptora...”. Como podemos apreciar neste pequeno diálogo entre os personagens desta
charge, mais uma vez o sufrágio feminino é desdenhado pelos homens, essa crítica não está
explicitada no desenho, mas sim nas palavras do diálogo. Assim a mulher conquistaria mais
direitos se restringisse a sua luta ao recinto privado do seu lar, uma vez que o ato de escrever
é solitário e denota uma exclusão do convívio público, pelo menos por um tempo, ao
contrário do que ocorre com as sufragistas que se metiam em reuniões, deixando de lado o
lar.

        Mas voltemos às fotografias encontradas na Revista do Globo. Para analisá-las
procuramos nos basear na metodologia apresentada por Ana Maria Mauad, tanto no capítulo


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Fotografia e História, já citado acima, quanto no artigo Através da imagem: fotografia e
história interfaces, onde a autora evidencia a melhor forma de se trabalhar com as imagens
fotográficas, e que a autora chama de “metodologia histórico-semiótica”. Procuramos levar
também em consideração as noções já trabalhadas para o caso das charges, que consideramos
como complementares para esta análise.

        Assim Mauad salienta que

                a fotografia deve ser concebida como uma mensagem que se organiza a partir
                de dois segmentos: expressão e conteúdo. O primeiro envolve escolhas técnicas
                e estéticas, tais como enquadramento, iluminação, definição da imagem,
                contraste, cor, etc. Já o segundo é determinado pelo conjunto de pessoas,
                objetos, lugares e vivencias que compõem a fotografia.51

        Comecemos pelo item conteúdo. Mauad aponta os tópicos para análise das fotografias
sendo elas: o local, o tema, as pessoas, os objetos retratados, além dos atributos das pessoas e
da paisagem, além do tempo retratado (dia/noite). Quanto ao item expressão, a autora aponta
para o formato ou tamanho da foto, os enquadramentos, o tipo de foto (posada ou instantânea)
e a nitidez. Procuramos seguir essas recomendações nas análises abaixo.

        Sob o título de “As mulheres votam... as ultimas ruidosas eleições da Inglaterra” tem-
se uma página inteira dedicada às eleições na Inglaterra, no primeiro exemplar do ano de
1932. De um total de quatro fotos, três mostram mulheres. As fotografias ocupam toda a
página, deixando apenas um pequeno espaço para as legendas. O formato privilegiado é o
retangular e o quadrado, as fotografias possuem uma boa definição e nitidez, dando a
aparência de serem instantâneas e não posadas. As fotos encontram-se numeradas no sentido
anti-horário, de cima para baixo e da esquerda para a direita. As legendas das fotografias
encontram-se todas juntas no canto esquerdo da página, espremidas entre as fotografias um e
dois, o que não dá uma ênfase maior ao texto. O que chama a atenção nesta página é a
composição de fotografias.




51
  MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: fotografia e história interfaces. Tempo. Rio de Janeiro, vol 1, n.2,
1996, p.73-98. Disponível em <http://www.historia.uff.br/labhoi/publicacoes>Acesso dia 19.05.2006. passim.

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                                         - As mulheres votam... -
                          Fonte: Revista do Globo, ano IV, n.1 de 16.jan.32 p.13.

        A fotografia que ocupa a parte superior da página, mostra um ambiente interno,
provavelmente uma das sessões de votação, deduz-se isso pela presença de uma urna e de dois
senhores parados com papéis dobrados nas mãos, sendo provavelmente as folhas de votação.
Nesta primeira fotografia temos cinco pessoas retratadas, três homens e duas mulheres, dois
homens com roupas que sugerem um uniforme, o outro de casaca e duas religiosas. As
religiosas aparecem em primeiro plano e a legenda traz uma fina ironia: “até as irmãs
religiosas vão dar o seu votinho...”

        A metade de baixo da página é dividida por duas imagens, a da esquerda é de formato
retangular e menor que todas as outras, nos mostra uma mulher bem arrumada, com uma
boina, um sobretudo com gola de peles e luvas, em close, depositando o seu voto na urna.
Aparentemente é uma mulher de posses. A legenda indica: “Uma ‘miss’, no momento em que
deitava a cédula na urna”.

        A terceira fotografia desta página mostra um cenário externo, provavelmente a saída
de um dos locais de votação. Em primeiro plano temos três pessoas, a figura central é uma
senhora bem idosa com uma bengala, sendo amparada por dois homens, à direita por um

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homem mais jovem de uniforme (um guarda talvez) e, do outro, um senhor de mais idade,
trajando, sobretudo e boina. No segundo plano temos a figura de uma senhora com chapéu, e
bem ao fundo, na penumbra do interior do prédio, um homem de perfil e de óculos. A cena
parece armada para dar destaque a senhora idosa, o que é reforçado pela legenda, mais uma
vez irônica: “– Mrs Caroline Merriot, de 106 annos (que horror!) que votou em North
Croydon. Será que poderá votar na proxima vez ?”

        O primeiro plano desta montagem fotográfica é dada pela fotografia de um homem,
bem vestido, com um “ar” sorridente, dando a impressão de estar olhando direto para o leitor.
Sua foto encontra-se na parte direita da página, ocupando a página de cima a baixo e por cima
das fotos um e três. A legenda nos indica de quem é essa imagem “O grande ‘leader’ Mac
Donald, com um sorriso de vencedor.”

        Todas as fotos nos mostram que estamos vendo fotografias tiradas num clima frio,
aparência confirmada pelas roupas pesadas usadas pelas pessoas retratadas. Também vemos
que homens e mulheres votavam nas mesmas sessões eleitorais. A ênfase é dada ao voto
feminino, tanto pelas imagens de mulheres retratadas quanto pelo texto das legendas, o fato de
ser dedicada uma página inteira a esse assunto talvez se tenha dado pelo voto feminino se
constituir uma notícia de interesse para os brasileiros, que estavam discutindo essa questão na
confecção da nova lei eleitoral. Porém o fato de se ter colocado a figura do político
Macdonald, em destaque no primeiro plano da página, e as tiradas irônicas das legendas nos
levam a crer que a questão do sufrágio feminino ainda não se encontrava bem aceita até o
momento (janeiro de 1932).

        O ano de 1933 marca a nova fase da revista, quando ela passa a se denominar
“Magazine de Atualidade Mundial”. Esse também é o ano das eleições dos deputados
constituintes, no mês de maio, quando as mulheres brasileiras puderam enfim participar. No
primeiro semestre do ano, temos basicamente, menções sobre a questão do voto feminino na
Europa (França e Espanha) e as eleições realizadas em 3 de Maio no Brasil. No dia 17 de
Maio de 1933 a edição de número nove apresenta a página 36 dedicada ao tema das eleições
com um conjunto de sete fotografias, sob o título geral de “As Eleções de 3 de Maio” e com o
subtítulo: “Realisaram-se em nossa capital, dentro da maior ordem, as eleições dos deputados
à Constituinte. A nossa pagina fixa alguns flagrantes do pleito.”




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                                       - As Eleções de 3 de Maio -
                       Fonte: Revista do Globo, ano V, n.9 de 17. maio.1933, p. 36.



        De modo diferente das fotografias analisadas anteriormente temos as legendas
embaixo das respectivas fotografias, o que facilita a identificação e a associação do texto à
imagem. As fotografias privilegiam, mais uma vez, o formato retangular, coincidentemente ou
não, as que apresentam mulheres são as que ocupam o menor espaço na composição da
página.52 Das sete fotografias, cinco são de ambientes internos, e duas mostram um ambiente
externo. Mais uma vez tem-se a impressão de serem fotos instantâneas, sem a pretensão de
serem posadas. As fotografias são nítidas e, na composição da página, não se destaca nenhum
dos quadros fotográficos, prevalecendo no centro da página à chamada do título.

        A grande novidade desta eleição foi, sem dúvida, a presença das mulheres votando
neste pleito. A isso não é dado um grande destaque, pois, ao contrário das fotografias três e
quatro, que mostram homens depositando o seu voto na urna, a presença feminina é mostrada
no quadro dois e no quadro cinco. Na segunda fotografia vemos uma senhora bem vestida
saindo de algum lugar, isso nos é mostrado pelo seu gesto congelado de abrir a cortina. A
legenda esclarece “uma eleitora saindo do gabinete secreto onde acaba de escolher uma

52
   Para fins de melhor entendimento aferiu-se o sentido horário, começando a contagem da parte superior à
esquerda, para numerar as fotografias desta página.

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chapa”.Como já nos indicava Barthes a legenda nos leva a uma interpretação diferente do
retratado na imagem, dando uma conotação a essa fotografia que não teria se não fosse a
conjunção da imagem-texto. O quinto quadro retrata uma senhora sorridente, de óculos,
segurando uma bolsa, se não lermos a legenda mais uma vez não saberemos do que se trata, a
legenda indica: “Cousas do tempo. Uma eleitora septuagenaria”.

        Acompanhemos as legendas das outras fotografias:

                1- S. Excia. O Gal. Interventor fotografado quando, em companhia de um filho,
                se dirigia na manha do pleito para a secção em que devia votar.

                3 – Um eclesiastico fotografado no instante em que deixava na urna o envelope
                que continha a chapa com os nomes de seus candidatos.

                4 - S. Excia. O Gal. Franco Ferreira. Comandante da 3ª Região no momento
                em que depositava na urna seu envelope

                6 – Numa secção eleitoral. Os votantes disputam a posse das fichas que lhes
                marcarão a ordem da votação.

                7 – A apuração. Numa das secções apuradoras o dr. Inocencio Borges da Rosa
                procedendo à abertura de uma das urnas.


        No ano de 1934, a única menção ao voto feminino pode ser encontrada no exemplar de
18 de outubro de 193453 na seção “Ecos da Quinzena”. Nesta edição temos na página 32 mais
uma reportagem fotográfica sobre o tema do sufrágio. De um total de 10 fotografias, cinco
têm como mote o pleito eleitoral de 14 de Outubro.

        As fotografias encontram-se numeradas de um a dez no sentido da esquerda para a
direita e de cima para baixo, o que estabelece o caminho proposto para a leitura das
fotografias. A legenda que acompanha as fotografias encontra-se no canto superior direito,
não tendo muito destaque na composição da página.




53
   Só para lembrar, este foi o ano da promulgação da nova Constituição no mês de julho, que ampliou o voto a
todas as mulheres e de novas eleições, para a Câmara de Deputados Estaduais, que ocorreram em outubro.


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                                          - Ecos da Quinzena -
                        Fonte: Revista do Globo, ano V, n.20 de 18.out.1933, p. 32.



        Podemos dividir esta página em quatro partes. Ocupando as duas primeiras partes na
parte superior da página tem-se em foco a chegada de uma “socialite” a Porto Alegre. A
metade inferior da página é composta por seis imagens, as quatro primeiras ocupam dois
terços da metade inferior da página, mostrando uma seqüência de quatro “flagrantes”, o
momento em que os eleitores depositam o seu voto na urna. As imagens que ocupam a parte
inferior da página, as fotografias nove e dez, são apresentadas no mesmo formato e dividindo
o espaço, na parte inferior da página, ao meio. Mas, enquanto a imagem nove apresenta um
ambiente interno com muitas mulheres, a fotografia dez apresenta um ambiente externo, e
uma equipe de remo masculina. O formato privilegiado em toda a composição da página é o
retangular.

        Nesta seqüência de fotografias, as que dizem respeito diretamente ao nosso tema são
as imagens oito e nove, porém será interessante também incluir as imagens cinco a sete, por
tratarem da questão do sufrágio. Todas as cinco fotografias mostram um ambiente interno,
sendo que, as quatro primeiras, apresentam o momento da colocação do voto na urna. Nessas


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temos em primeiro plano o eleitor e a urna, sendo que na foto de número cinco o braço do
homem não se encontra muito nítido, o que pode denotar que essa fotografia foi tirada
enquanto o homem fazia o gesto de levar o braço á abertura da urna. Todas também
apresentam, em segundo plano, vários pessoas, supostamente esperando a sua vez de votar.
Enquanto nas três primeiras imagens temos somente homens retratados, na última fotografia
temos a imagem de uma mulher bem vestida, e pelo menos mais uma mulher aparece no
segundo plano, junto com outros homens. A legenda das fotografias cinco, seis e sete indica
que as pessoas retratadas ali são figuras ilustres: “5- vota o Gal. Flores da Cunha 6- o dr. Raul
Pilla 7- o dr. João Carlos Machado”, já a fotografia oito não mereceu o mesmo destaque
sendo apresentada junto com a imagem nove simplesmente como: “8 e 9 – Aspectos da
secção onde votou o eleitorado feminino.”

        Analisemos a fotografia nove, ela retrata, tanto no primeiro plano quanto no segundo,
várias mulheres bem vestidas num ambiente interno, todas paradas, em ordem, esperando por
alguma coisa, quase todas olham na mesma direção, a saber, para frente. A fotografia é tirada
de um lugar um pouco mais alto, enfatizando o grupo, a aglomeração feminina, pois não
conseguimos definir com clareza os contornos da sala, assim tem-se a impressão de um
grande grupo, sem começo, nem fim. Temos ainda a sensação, ao contemplar essa imagem,
de ordem e calma, impressão essa reforçada tanto pela tranqüilidade dos rostos femininos,
quanto pela pose das mulheres em primeiro plano, paradas segurando as bolsas na frente do
corpo. Sem a legenda para nos trazer a informação de que se trata de uma secção eleitoral, não
seria possível identificar essa fotografia.   O aspecto que se ressalta nesta composição é o
clima de ordem e a de espera. Também podemos destacar, nas fotografias cinco e seis, é que,
provavelmente, ambas foram tiradas a poucos minutos uma da outra, e na mesma secção
eleitoral, nota-se isso quando observamos, no segundo plano, os mesmos “coadjuvantes” e em
quase igual posição.

        A última imagem coletada na revista foi divulgada em 22 de dezembro de 1934, na
edição de número 24. Apesar de não tratar especificadamente da questão do sufrágio
feminino, nos traz, na página 57, uma fotografia das eleições de 14 de outubro de 1934 como
um dos acontecimentos importantes que ocorreram no Rio Grande do Sul. A eleição é
equiparada à visita de Getúlio Vargas ao estado, e também a passagem de um dirigível nos
céus da capital. O que só vem reforçar que as eleições são um momento importante e de
destaque na vida pública dos cidadãos. Esta imagem ocupa a parte superior da página, a

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História, imagem e narrativas
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direita, e mostra um ambiente interno, mais um momento de “flagrante” de um homem no seu
gesto de colocar o seu voto na urna. Apesar de não destacar o sufrágio feminino, considero
válido agregar este “acontecimento culminante” na nossa “coleção” de fotografias.




                              - 1934 e alguns de seus acontecimentos culminantes –
                            Fonte: Revista do Globo, ano VI, n.24 de 22.dez.1934, p.57.

                 Mas a que conclusões podemos chegar depois de analisar essas imagens?
Podemos através da descrição delas finalmente chegar a uma resposta para a nossa pergunta
inicial? Qual seja: podemos perceber qual foi o discurso da Revista do Globo sobre o voto
feminino? Porque como diz Boris Kossoy na “[...] busca do significado do conteúdo; ver,
descrever e constatar não é o suficiente”.54



Considerações Finais


           As imagens veiculadas na Revista do Globo sobre o sufrágio feminino me levam a
acreditar que, até 1932, esse tema era tratado com um certo desdém pela revista. No seu
discurso eu destacaria a maneira como o voto feminino foi tratado nas charges do ano de 1931

54
     KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p. 95.

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História, imagem e narrativas
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mostrando-o como uma forma de desagregar a família e a sociedade, e expondo
explicitamente o despreparo feminino para exercer suas funções cívicas, fora de casa. Nisso
essas imagens se coadunam de maneira admirável com os artigos veiculados na revista e que
aqui não foram expostos, já que a proposta deste ensaio era fazer um exercício de
interpretação das imagens impressas na Revista do Globo.

        Mas, tanto no texto quanto na imagem, o que se destaca era o despreparo feminino
para atuar nesse mundo público e masculino, por excelência. Fala-se de feminismo, mas não
se mostram as imagens de mulheres, talvez para não ocorrerem associações sobre os temas,
lembremo-nos que ao falar de feminismo, na nossa primeira fotografia analisada, temos em
destaque a figura de um homem e não de uma mulher.

        Após a promulgação do Código Eleitoral e, principalmente nos momentos de eleições,
quando a presença feminina já não podia mais ser ignorada (no pleito eleitoral) o que é
enfatizado são as imagens de mulheres idosas e “flagrantes” femininos que não poderiam ser
associados ao tema do sufrágio, como por exemplo, as mulheres esperando todas de pé, numa
sala. Assim se não contássemos com as legendas dessas fotografias não saberíamos do que,
supostamente, estava sendo ali retratado.

        Desse modo, o que pude depreender da análise destas imagens é que o discurso
proferido pela Revista do Globo salienta o despreparo da mulher para exercer um papel no
mundo público. Apesar de não se ter encontrado muitas referências ao tema do sufrágio
feminino, creio que isso pode ser creditado ao enfoque dado por esta revista, que valorizava
mais as questões culturais e sociais do que as questões políticas, deixadas para a imprensa
diária. O que só faz com que as imagens que se encontraram se tornassem mais significativas,
pois resumem as escolhas feitas pelos editores da Revista do Globo, que eram quem definiam
o que deveria ser veiculado na revista. Assim pode-se perceber qual era a forma que esses
editores consideravam como a mais correta de abordar a questão do sufrágio feminino na
revista, salientando a fotorreportagem, em detrimento de longos textos.

        Desse modo, nestes anos iniciais de 1930, a Revista do Globo, tratou o tema do
sufrágio feminino através de suas imagens, escolhidas de maneira a não salientar mulheres
jovens e ativas, lutando pelo seu direito de exercer a sua plena cidadania.Se essas imagens e
esse discurso atingiu o seu público não sei dizer, pois o que estou tentando fazer é uma
releitura desse discurso muitos anos depois da sua veiculação.

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História, imagem e narrativas
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        Não foi possível conseguir informações sobre a produção destas imagens, como o
nome dos fotógrafos responsáveis pela feitura das fotografias, nem mesmo dados como tipo
de máquina, tipos de filme e de lentes utilizados, ou de qualquer outro tipo de equipamentos
que, porventura tenham sido utilizados na confecção das imagens. Porém, levou-se em
consideração a ressalva que Barthes tão bem explicitou no texto “A Mensagem Fotográfica”,
ou seja, de que as escolhas das fotografias para publicação foram feitas, em última instância,
pelos editores da revista, o que já nos dá uma idéia de escolha de determinadas fotografias e
de certos ângulos para dar ênfase ou não ao assunto escolhido e retratado.

        Esbocei neste ensaio uma tentativa de compreender como a Revista do Globo veiculou
o seu discurso sobre o sufrágio feminino. As interpretações apresentadas ao longo dessa
explanação estão longe de serem definitivas, pois a cada vez que inquirimos a nossa fonte,
mais questionamentos são apresentados e novas interpretações podem surgir.

Referências Bibliográficas

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Brasiliense, 1984.

BARTHES, Roland. O Óbvio e o Obtuso. Ensaios Críticos III. Rio de Janeiro: Editora
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Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

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Edições Afrontamento, 1998.


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História, imagem e narrativas
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1988. 169 p. Dissertação (Mestrado em história da cultura brasileira) - Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

Sites consultados:

http://www.historia.uff.br/labhoi/publicacoes
http://www.presidencia.gov.br
http://www.ipct.pucrs.br/letras



http://www.historiaimagem.com.br                                                          56

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Análise das imagens do sufrágio feminino na Revista do Globo (1930-1934

  • 1. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 “O Voto de saias”: breve análise das imagens veiculadas na Revista do Globo (1930-1934) Mônica Karawejczyk Mestranda, PUCRS/IFCH. monicaka@terra.com.br Resumo: Os temas da cidadania, da participação política e da inclusão social são, hoje, questões que suscitam muitas discussões e preocupações na sociedade, sendo um assunto cada vez mais em voga nos meios de comunicação. Por acreditar que a questão do sufrágio é uma faceta importante da participação feminina no espaço público e uma conquista recente – pouco mais de 70 anos – é que se deu a proposta deste ensaio, ou seja, de se perceber como a história do sufrágio feminino foi contada na Revista do Globo de Porto Alegre. Para alcançar este intento vamos centrar a análise nas imagens veiculadas, sobre este tema, entre os anos de 1930 a 1934. Isso será feito levando-se em conta as propostas metodológicas de Roland Barthes, Boris Kossoy e Ana Maria Mauad. Palavras-chave: Sufrágio feminino, Revista do Globo, imprensa, fotografia, charge.
  • 2. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 A proposta deste ensaio é através de uma leitura das imagens veiculadas na Revista do Globo1, tentar perceber como o sufrágio feminino foi percebido, discutido e veiculado neste periódico. Para alcançar este intento vamos centrar a análise nos exemplares que foram publicados entre os anos de 1930 a 1934. Escolheu-se este tema porque a cidadania, a participação política e a inclusão social são, hoje, questões que suscitam muitas discussões e preocupações na sociedade, sendo um assunto cada vez mais em voga nos meios de comunicação. Por acreditar que a questão do sufrágio é uma faceta importante da participação feminina no espaço público e uma conquista recente – pouco mais de 70 anos – é que se deu a proposta deste ensaio. Esta revista foi escolhida por ter sido um importante periódico quinzenal e de informação geral, destinada tanto ao público masculino como feminino, editada em Porto Alegre pela Livraria do Globo. A Revista do Globo também é considerada uma das principais representantes do jornalismo informativo moderno na década de 1930, sendo a principal publicação do seu gênero no sul do país, com uma reconhecida qualidade gráfica e um grande espaço dado à reportagem fotográfica, baseada na cobertura da vida social.2 Quer deixar-se claro que este trabalho não tem o objetivo de resgatar a imagem da mulher veiculada pela revista, mas somente a abordagem que esta faz da conquista dos direitos políticos pelas mulheres. O Sufrágio Feminino A exclusão das mulheres da vida política se deu praticamente em todos os países ocidentais até os primeiros decênios do século passado. O direito da mulher de escolher os seus representantes políticos foi encarado com desconfiança, pois poderia pôr em risco a família, desagregando-a. A mulher, ao obter o direito a participar mais ativamente da vida política do seu país, estaria subvertendo a ordem natural e universal dos sexos ao intrometer- 1 O levantamento da fonte foi feito no Arquivo Histórico de Porto Alegre Moisés Vellinho, no Museu da Brigada Militar, no Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa, as imagens da revista foram captadas na Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul e no site da faculdade de letras da PUCRS ( http://www.ipct.pucrs.br/letras onde tem-se toda a coleção da Revista do Globo digitalizada). 2 Conforme nos informa RÜDIGER, Francisco. Tendências do Jornalismo. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1993, p. 61. http://www.historiaimagem.com.br 27
  • 3. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 se no mundo público masculino, desorganizando a vida doméstica e maculando a imagem do ‘anjo do lar’. Os movimentos feministas, do século XIX e início do século XX, buscavam a transformação da condição da mulher na sociedade através, principalmente, da luta pela participação na cena eleitoral. Geneviéve Fraisse e Michelle Perrot, na obra História das mulheres no Ocidente, afirmam que o século XIX é muitas vezes pintado como um século sombrio, triste, opressivo e austero para as mulheres, mas que isso não passa de uma representação, pois “esse século assinala o nascimento do feminismo, palavra emblemática que tanta designa importantes mudanças estruturais (trabalho assalariado, autonomia do individuo civil, direito à instrução) como o aparecimento coletivo das mulheres na cena política”.3 Para essas autoras o melhor seria denominar o século XIX como o momento histórico em que vida das mulheres se alterou, ou seja, o momento em que a “perspectiva de vida das mulheres se altera: tempo de modernidade em que se torna possível uma posição de sujeito, indivíduo de corpo inteiro e actriz política, futura cidadã”.4 Nesse sentido, Anne-Marie Käppeli, no capítulo intitulado “Cenas Feministas”, da mesma obra, nos diz que “o direito ao sufrágio tornou-se na viragem do século o eixo principal da luta feminista”.5 A inserção de grandes massas nos mecanismos da vida política é um fato bastante recente: excetuados os Estados Unidos, o sufrágio universal e a igualdade do voto só foram conquistados, de uma maneira geral, nos primeiros decênios do século XX.6 Branca Alves e Jacqueline Pitanguy também nos apontam que o século XIX se caracterizou por duas frentes de luta do operariado, a saber, a luta por melhores condições de trabalho e a luta pelos direitos de cidadania, aí incluída a reivindicação do direito de votar e ser votado, sem o critério censitário. Desse modo, o sufrágio universal surge como uma das principais conquistas dos homens da classe trabalhadora no final do século XIX, mas ela não incluía o sufrágio feminino, “esta foi uma luta específica que abrangeu mulheres de todas as 3 FRAISSE, Geneviéve; PERROT, Michelle. Ordens e Liberdades. In: DUBY, G, PERROT, M. (org). História das Mulheres no Ocidente. Vol. 4. Porto: Edições Afrontamento, 1998, p. 9. 4 Idem, Ibidem, loc. cit. 5 KÄPPELI, Anne-Marie. Cenas Feministas. In: Idem, Ibidem, p. 556. 6 O Estado do Wyoming nos EUA estabelece o sufrágio feminino em 1869. Citamos alguns países como exemplos: Inglaterra em 1918 com caráter restritivo, Espanha em 1931, Uruguai em 1934, França em 1944, Itália em 1945, Suíça em 1971 e Portugal em 1976. http://www.historiaimagem.com.br 28
  • 4. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 classes, foi uma luta longa, demandando enorme capacidade de organização e uma infinita paciência. Prolongou-se, nos Estados Unidos e na Inglaterra, por 7 décadas. No Brasil, por 40 anos, a contar da Constituinte de 1891”.7 Segundo Céli Pinto, o movimento feminista no Brasil pode ser dividido em dois momentos, da virada do século XIX para o século XX até 1932, quando as mulheres brasileiras ganharam o direito de votar e o movimento praticamente se extingue no Brasil vindo a renascer somente na década de 60, mais especificamente pós-1968. Para a autora este longo período de tempo que se estende de 1932 até as primeiras manifestações nos anos 1970, foi um momento de refluxo do movimento feminista. O movimento liderado por Bertha Lutz8 ainda tentou algumas intervenções no período pós-1930 e na breve experiência constitucional interrompida com o golpe de 1937, após este ano o movimento praticamente morre.9 Céli Pinto ainda nos diz que as lutas e manifestações esparsas das mulheres até a metade do século XIX cederam lugar à “uma campanha mais orgânica pelos direitos políticos de votarem e de serem votadas. O movimento sufragista se espalhou pela Europa e pelos Estados Unidos, construindo a primeira voga de feminismo organizado no mundo”.10 A historiadora estadunidense June Hahner, no seu livro A Mulher no Brasil, aponta que o voto feminino, no Brasil, foi um movimento da classe média por direitos políticos, recebendo claras influências dos Estados Unidos e da Europa, mas que “nunca foi uma tentativa de revolucionar o papel da mulher na sociedade ou mesmo a própria sociedade. Muitas das participantes do movimento eram graduadas em direito. A lei serviu como caminho tradicional para o sucesso político e aceitação na elite, e algumas mulheres seguiram esse caminho também”.11 Hahner ainda assinala, em outra de suas obras, que quanto mais as mulheres se afastassem de seus papéis domésticos “pondo o pé para fora de casa de modo que dificilmente 7 ALVES, B.; PITANGUY, J. O Que é Feminismo. São Paulo: Brasiliense, 1984, p. 44. 8 A paulista Bertha Lutz é uma das pioneiras da luta pelo voto feminino e pela igualdade de direitos entre homens e mulheres no Brasil, luta que travou desde 1918. Em 1919, junto com outras mulheres, criou a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, que foi o embrião da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Foi a segunda mulher a ingressar no serviço público brasileiro. Em 1936, ela assumiu o mandato de deputada federal na vaga deixada pelo titular Cândido Mendes. 9 PINTO, Céli. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003, p.10. 10 PINTO, op. cit., p. 13. 11 HAHNER, June. A Mulher no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 99. http://www.historiaimagem.com.br 29
  • 5. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 seriam encarados como uma extensão de suas funções maternais, mais oposição masculina elas encontravam”.12 O advento da República em 1889 não apenas fortaleceu o desejo feminista por direitos políticos, mas também deu às mulheres argumentos adicionais em favor do sufrágio e fez surgir uma pergunta “a implantação da república abriria um novo mundo de possibilidades também para as mulheres?”13 Com a primeira Constituição republicana brasileira de 189114 passaram a ter direito ao voto os cidadãos maiores de 21 anos que se alistassem na forma da lei. A resistência masculina ao sufrágio feminino mostrou-se difícil de conter, pois segundo a autora a oposição ao sufrágio feminino no Brasil baseou-se na suposta nobreza, pureza e domesticidade das mulheres [...]. A mulher deveria ser um anjo confortador, companheira amorosa de seu homem e a deusa do lar, mas nunca sua adversária ou rival na luta cotidiana da vida. Para os positivistas, a mulher constituía a parte moral da sociedade, a base da família, que por sua vez era a pedra fundamental da nação.15 Mas conforme o século XX progredia, mais mulheres da classe superior e da classe média reivindicavam direitos comparáveis aos de seus maridos e irmãos, principalmente quanto ao acesso aos cargos profissionais e ao voto, contudo elas “não reivindicavam importantes mudanças nas relações familiares. Nem o voto nem o título universitário impediriam uma mulher de realizar seus deveres domésticos”.16 Com este movimento mais moderado em favor dos direitos das mulheres e a obtenção do sufrágio feminino em vários países da Europa, após a Primeira Guerra Mundial, passou a ser quase elegante a defesa do voto feminino em alguns círculos da elite brasileira. As mulheres brasileiras que ocupavam cargos públicos de alto nível17 começaram a liderar uma campanha pelo sufrágio. Porém, por serem ligadas à elite, elas defenderam mudanças menos 12 Idem. A Mulher Brasileira e suas lutas sociais e políticas: 1850-1937. São Paulo: Brasiliense, 1981, p. 77. A autora refere-se neste trecho as profissões que as mulheres exerciam e que eram consideradas como uma extensão do seu papel doméstico, destaque para o de professoras e de enfermeiras. 13 Id.m, Ibidem, p. 80. 14 Segundo o artigo 70 da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de Fevereiro de 1891. Disponível em: <http://www.casaruibarbosa.gov.br/expo/const_pdf.htm >. Acesso em 19. Nov. 2005. 15 HAHNER, op. cit., p. 85. 16 Idem, Ibidem, p. 94. 17 June Hahner cita os nomes de Maria José de Castro Rebelo, trabalhando no Ministério do Exterior (1917); Bertha Lutz com uma alta colocação no Museu Nacional no Rio de Janeiro (1919); Myrthes de Campos, a primeira advogada admitida nos tribunais brasileiros. Como se pode acompanhar no capitulo oito intitulado “Organizando-se para o sufrágio feminino.” http://www.historiaimagem.com.br 30
  • 6. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 drásticas nos papéis e atitudes da mulher do que as suas antecessoras no final do século XIX.18 Hahner ainda enfatiza que No Brasil, talvez mais do que em algumas outras nações latino-americanas, vários membros da elite, especialmente no Rio e em São Paulo, enviaram suas filhas para a Universidade e para profissões, e muitas dessas mulheres tornaram-se sufragistas. O sufrágio feminino não foi apenas um movimento da classe média brasileira. Pode ser que as sufragistas brasileiras desfrutassem de laços próximos com a elite política, o que teria facilitado a obtenção do voto feminino no Brasil mais cedo do que na maioria dos países latino-americanos.19 Mas deve-se salientar que a campanha pelo sufrágio feminino no Brasil não esteve ligada a nenhum partido político ou a um outro movimento social. Com o ambíguo artigo da constituição ainda em voga, que considerava aptos a votar os “cidadãos brasileiros”, muitas mulheres tentaram se alistar para exercer esse direito. Como explicita Rachel Soihet, ao comentar que a Assembléia Constituinte que aprovou a lei, “optou por uma fórmula vaga, imprecisa” e que “a partir dessa ambigüidade, a advogada Myrthes de Campos, primeira mulher aceita na Ordem dos Advogados, requer seu alistamento eleitoral, argumentando que a Constituição não negava este direito às mulheres”.20 Foi nos anos trinta que as mulheres brasileiras tiveram a sua inserção na cena eleitoral e somente após a Revolução de 30. Getúlio Vargas, assumindo a chefia do Governo Provisório, designou, pelo decreto n°19.459, de 6 de dezembro de 1930, uma subcomissão legislativa para estudar e propor a reforma da lei e do processo eleitorais. Uma das reformas propostas era estender o direito de voto às mulheres, o que se efetivou em 1932, com o Código Eleitoral Provisório que garantiu o direito de voto às mulheres, porém com restrições, elas só poderiam votar com a autorização dos maridos ou, se solteiras e viúvas, se comprovassem terem renda própria21. Mas mesmo assim as mulheres puderam, enfim, participar da eleição dos deputados constituintes (1933) e escolher seus próprios 18 Idem, Ibidem, p. 96-102. 19 Idem, Ibidem, p. 110-111. 20 SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, n° 15, pp. 97-117, set.out.nov.dez. 2000, p. 99. 21 Essas restrições caem com a nova constituição brasileira promulgada em 1934. http://www.historiaimagem.com.br 31
  • 7. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 representantes para a feitura da nova Constituição do Brasil22, que determinou no artigo de número 108 quem seriam doravante os eleitores do país: Art 108 - São eleitores os brasileiros de um e de outro sexo, maiores de 18 anos, que se alistarem na forma da lei. Tentou-se acima fazer uma breve retrospectiva do tema do sufrágio feminino e das suas repercussões na sociedade brasileira nos primeiros anos do século XX. A seguir apresentamos a Revista do Globo e a análise do material encontrado. A Revista do Globo O nascimento da Revista do Globo ocorreu em 1929. Com o apoio dos sócios da Livraria do Globo, a revista saiu em cinco de janeiro de 1929 e circularia até 1967 de forma ininterrupta, num total de 942 exemplares. A revista era quinzenal e composta em sistema tipográfico, variando o número de suas páginas entre 48 (nos seus anos iniciais) e 70 páginas (na década de 50 e 60). O formato da revista era de 20,5 x 27 cm.23 Nos seus primeiros anos a Revista do Globo não trazia suas páginas internas numeradas, somente a partir do número 16 de 23/08/1933 é que há numeração nas páginas.24 Como informa Francisco Rüdiger no seu livro Tendências do jornalismo A Revista do Globo foi criada no vazio deixado pelo fracasso das publicações anteriores do gênero, devido à falta de sustentação econômica. Porém, a capital exigia uma nova revista, as elites viam nela uma necessidade cultural e havia o estímulo do próprio governador Getulio Vargas. [...] A Livraria do Globo, fundada no final do século passado, no espaço de poucos anos tornara-se a maior casa editorial do sul do Brasil. Nesse período, colocou-se a serviço da imprensa porto-alegrense durante várias vezes, graças ao seu moderno parque 22 A constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934 foi consultada no site <www.presidencia.gov.br> . Acesso em 01.jun.2005. Grifo meu. 23 Estas informações foram retiradas do artigo de: HAUSSEN, Doris F.; DUVAL, Adriana R. O Rádio nas páginas da Revista do Globo (1929/1967). Revista Famecos. Porto Alegre, n°14, abril de 2001, p. 130-132. E das dissertações de DALMAZ, Mateus. A Imagem de Hitler e da Alemanha na Revista do Globo de Porto Alegre (1933-1945). 2001. Dissertação (Mestrado em História) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, p. 21-71. E também da dissertação de DULAC, Elaine Beatriz Ferreira. Beleza, Sedução e Juventude: A Revista do Globo ensinando Feminilidade. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, p. 11-50. 24 Desse modo todas as indicações de páginas encontradas nos trechos retirados da revista, até a data mencionada, foram aferidas pela autora. http://www.historiaimagem.com.br 32
  • 8. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 gráfico. Em 1929, finalmente lançou sua própria revista, que reuniu a nata da intelectualidade local, sob a direção de Mansueto Bernardi.25 O Brasil estava vivendo uma nova fase de desenvolvimento econômico, na qual o principal aspecto era o processo de industrialização verificado a partir de 1930. Edgard Carone, ao analisar a economia da República Nova, assinala que após a crise de 1929 (que atingiu todos as formas produtivas), a indústria nacional não só se recuperou como, também, conheceu um progresso até então nunca visto, tudo isso “graças à necessidade de ser abastecido o mercado interno” e que “a quebra do domínio oligárquico do café fez com que ascendessem ao poder novos grupos, não só agrários, mas também de classe média”.26 Assim, a revista surge neste contexto em que, segundo Rüdiger, houve uma expansão das atividades comerciais e do mercado interno que fomentou o desenvolvimento das modernas empresas jornalísticas, aumentando o público leitor e, de verdade, criando o negócio da publicidade, que progressivamente se tornou a primeira fonte de financiamento do jornalismo.27 A intenção da revista já é dada a conhecer no seu primeiro editorial onde, Mansueto Bernardi, fixa os objetivos, trata da escolha do nome e do posicionamento político desse novo quinzenário brasileiro, acompanhemos o que saiu nesta primeira edição: A Revista do Globo [...] ambicionava ser um aparelho de recepção e transmissão, no Estado, de todas as ondas notáveis do pensamento contemporâneo. [...] Fora de partidos e acima de partidos, nesta faze auspiciosa de apaziguamento das paixões, de audazes iniciativas publicas e particulares, de ventilação dos espíritos, de transmutação de valores, a Revista do Globo quer construir qualitativamente para o Rio Grande do Sul.28 Não demorou muito para que a revista se tornasse a principal publicação do seu gênero no sul do País e como informa Elizabeth Torresini A julgar pelo sucesso inicial, seus criadores não se equivocaram ao criar uma revista “fora e acima de partidos”. O Rio Grande do Sul vive um período de intenso apaziguamento, de coalizão, em que não seria bem-sucedida empresarialmente uma revista que não seguisse a tendência do momento. Seu 25 RÜDIGER, op. cit., p. 61. 26 CARONE, Edgard. A República Nova (1930-1937). São Paulo: Difel, 1982, p. 5 e 7. 27 RÜDIGER, op. cit., p. 63. 28 Revista do Globo, ano I, n. 1, 5 de janeiro de 1929, p. 3. Em todas as citações retiradas das páginas da revista manteve-se a grafia original da revista. http://www.historiaimagem.com.br 33
  • 9. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 sucesso, como parte de uma empresa, depende das vendas e da aceitação do público em geral.29 Nos seus 38 anos a revista passou por diversas fases, sendo que se pode destacar, para o período desta pesquisa (1930-1934), a troca de diretores da revista (Mansueto Bernardi, Octavio Tavares e Érico Veríssimo) e a mudança dada na ênfase do conteúdo da revista, o que pode ser notada a partir das mudanças ocorridas nos subtítulos da mesma, que nos seus primeiros anos se autodenominava “Quinzenário de Cultura e Vida Social - Espelho Fiel da Vida Social e Literária do Rio Grande do Sul”, passando, a partir do número seis de 1933, a se denominar “Magazine de Atualidade Mundial”. No editorial comemorativo do quinto aniversário da revista tem-se uma retrospectiva da trajetória da revista até o momento, e já adiantando as mudanças que ocorreram a partir de abril de 1933. Acompanhemos um trecho retirado do editorial intitulado “Mais um ano...” Com este numero entra o nosso quinzenario no seu quinto ano de vida. Nascida em meio da indiferença ambiente, recebida por muitos com pessimismo, e tendo a perturbar-lhe a marcha essa lenda de que as revistas no Rio Grande não podem ter vida longa – a REVISTA DO GLOBO se tem mantido até hoje sem vacilações nem esmorecimentos, graças ao esforço tenaz e continuado dos editores e ao auxilio decidido de um punhado de leitores. Esperamos – dentro deste ano que se inicia – imprimir uma feição inteiramente nova ao nosso quinzenario: aumentando-lhe o formato e o numero de páginas, dotando-o de novas secções e de varios outros melhoramentos, tanto na parte redatorial como na parte grafica A revista manteve praticamente o mesmo preço no período em que foi analisada. Dos 108 exemplares analisados, o seu preço oscilou de 2$000 (ano de 1930), baixando para 1$000 (quando se tornou semanal por um breve período) e finalmente estabilizando o seu valor em 1$500 até o final de 1934.30 Como nos informa Mateus Dalmáz esse era “um preço acessível, se considerados, por exemplo, os valores de um ingresso de cinema (entre 1$000 e 3$000), de uma dúzia de ovos (entre 1$000 e 2$000) e dos ganhos de um professor estadual da capital (cerca de 563$859)”.31 29 TORRESINI, Elizabeth W. R. Editora Globo: uma aventura editorial nos anos 30 e 40. 1988. Dissertação (Mestrado em história da cultura brasileira) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, p. 84. 30 Exceção feita às edições especiais de fim de ano que eram de 2$000. Informações retiradas das capas das revistas consultadas. 31 DALMÁZ, op. cit., p. 41. http://www.historiaimagem.com.br 34
  • 10. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 A tiragem da revista é informada como sendo em torno de 10 mil exemplares, como se pode verificar na própria Revista do Globo no exemplar 17 de 27 de agosto de 1932, onde um reclame publicitário explicita: Leia sempre e procure divulgar entre seus amigos e conhecidos a “Revista do Globo”, a qual não é somente a unica revista no genero no Rio Grande mas uma das unicas do extremo sul do Brasil. Só com o apoio unanime dos gaúchos é que nosso quinzenario poderá continuar a viver e a oferecer aos seus leitores edições cada vez melhores e mais interessantes. A “Revista do Globo” aparece duas vezes por mês, mais ou menos nos dias 15 e 30 e é vendida no balcão da Livraria do Globo, em vários postos de vendas e em diversos locais da capital e nas ruas. “Revista do Globo” – Redação e Gerencia – Andradas 1416 – 2° Andar. Tiragem 10.000 exemplares – Secção de Publicidade – Encarregado Jean Ryff.32 A Revista do Globo encerrou as suas atividades em 1967 quando, nas palavras de Elvo Clemente, “as dificuldades financeiras, os embates com a concorrência de outros periódicos, levaram a Revista do Globo a fechar a última página com a tristeza dos numerosos leitores e com o pesar das letras rio-grandenses e brasileiras”.33 Breve introdução teórica e análise das fotografias O levantamento da fonte foi feito em 108 exemplares da Revista do Globo, entre os meses outubro de 1930 e dezembro de 1934, no qual se encontraram um total de 12 matérias referentes à questão do sufrágio feminino. Desse total, tem-se que oito referências são imagens que tratam diretamente sobre o tema pesquisado, sendo três charges e cinco conjuntos de fotografias. Dessas imagens, o que mais se destaca são as fotos referentes às eleições na Europa e no Brasil e as três charges vinculadas no ano de 1931. Neste ensaio nos deteremos nessas fotografias e nas charges. Devemos agora nos indagar sobre a validade de se trabalhar com imagens como fontes. Qual é o potencial de uma imagem como informação? Se só contamos com as imagens e algumas legendas qual a melhor maneira de extrairmos delas as informações que elas calam? Imobilizadas eternamente em um gesto congelado no tempo? Como nos indica 32 Revista do Globo, ano IV, n. 17, 27/08/1932, p. 2. 33 CLEMENTE, Elvo. As revistas da Livraria do Globo. Continente SulSur .Revista do Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, ano 1, n° 2, novembro de 1996, p. 131. http://www.historiaimagem.com.br 35
  • 11. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 Miriam Moreira Leite ao relembrar, e contestar, a célebre frase de Roland Barthes “até que ponto uma imagem vale mais de mil palavras?”34 Como interpretar essas imagens? Se levarmos em conta que a imagem nos traz tantas, ou mais, indagações e dúvidas do que o documento escrito, qual a melhor maneira de “interrogá-lo” para que nos forneça as respostas para as nossas perguntas, para o nosso problema de pesquisa enfim? Concordamos com Ana Maria Mauad quando ela diz que “a imagem não fala por si só; é necessário que as perguntas sejam feitas”.35 Leite indica que há, pelo menos duas diferentes tendências historiográficas, uma que considera as imagens como uma leitura fácil e direta e outra que a considera tal qual o documento escrito, ou seja, que “são representações que aguardam um leitor que as decifre”.36 Boris Kossoy também salienta este ponto, pois para ele “o documento fotográfico é uma representação a partir do real, uma representação onde se tem registrado um aspecto selecionado daquele real, organizado cultural, técnica e esteticamente, portanto 37 ideologicamente”. E é desta perspectiva que as imagens fotográficas, e também os desenhos das charges, serão tratadas nas análises que se seguem. Assim, o que temos como fonte são as mensagens fotográficas veiculadas por uma revista ilustrada nos primeiros anos da década de trinta. Procuramos identificar os sinais que estas imagens podem trazer para melhor esclarecer a nossa indagação: qual foi a perspectiva da Revista do Globo sobre o voto feminino? É isso que tentaremos identificar na nossa análise. Desse modo, seguimos a orientação de Ana Maria Mauad e inicialmente organizamos o nosso corpus fotográfico em função de um tema – o sufrágio feminino. Boris Kossoy ainda assinala que quaisquer que sejam os conteúdos das imagens devemos considerá-las sempre como [...] fontes de informação decisivas para seu respectivo emprego nas diferentes vertentes de investigação histórica [...]. As imagens fotográficas [...] nos mostram um fragmento selecionado da aparência das coisas, das pessoas, 34 LEITE, Miriam M. Retratos de Família. Leitura da Fotografia Histórica. São Paulo: EDUSP, 2001, p. 23. 35 MAUAD, Ana Maria. Fotografia e História – possibilidades de análise. In: CIAVATTA, Maria; ALVES, Nilda ( Orgs.). A Leitura de Imagens na Pesquisa Social. História, Comunicação e Educação. São Paulo: Cortez Editora, 2004, p. 26. 36 LEITE, op. cit., p. 23. 37 KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002, p. 59. http://www.historiaimagem.com.br 36
  • 12. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 dos fatos, tal como foram (estética/ideologicamente) congelados num dado momento de sua existência/ocorrência.38 Este autor ainda indica que “a imagem fotográfica fornece provas, indícios, funciona sempre como documento iconográfico acerca de uma dada realidade. Trata-se de um testemunho que contem evidências sobre algo”.39 Podemos considerar que a imagem fotográfica é ao mesmo tempo ícone e índice, como diz Philippe Dubois40, pois guarda uma marca, um traço, um rastro do real, que deixou suas marcas no papel fotográfico, nas páginas da revista; e, por isso mesmo traz em si a idéia de semelhança com o real, se confundindo mesmo no senso comum, com o real, seu referente. Tratando especificadamente da fotografia jornalística tem-se o texto de Roland Barthes A mensagem fotográfica, onde o autor aponta para o que ele chama de “paradoxo fotográfico” e para o cuidado que devemos ter ao analisar as imagens.Barthes trata a fotografia dentro de um duplo modo de ver, a maneira objetiva da denotação e a função subjetiva dada ao leitor, ou a conotação. Para ele devemos cuidar na análise da mensagem fotográfica ambos os aspectos, o da denotação pura e simples que a fotografia nos passa num primeiro momento e para a conotação, que é “a imposição de um sentido segundo a mensagem fotográfica propriamente dita, [e que] elabora-se nos diferentes níveis de produção da fotografia (escolha, processamento técnico, enquadramento, diagramação)”.41 Analisemos uma das primeiras menções ao voto feminino, encontrada nas páginas da Revista do Globo. Esta aconteceu no ano de 1931, e trata-se de uma foto na parte superior da página 31, do exemplar de número 27 de 21 de novembro. Esta página traz um total de cinco fotos, na seção “Veja esta”. A foto que nos interessa é a primeira que tem o formato retangular e ocupa o canto superior esquerdo da página. Ela mostra um homem com um carrinho de bebê, na rua, parado, fumando um cachimbo, trajando um sobretudo e um chapéu. 38 KOSSOY, op. cit. p. 21 39 Idem, Ibidem, p. 33. 40 DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. São Paulo: Papirus, 1993. O autor explora essas idéias no capítulo: “Da verossimilhança ao índice: pequena retrospectiva histórica sobre a questão do realismo na fotografia.” 41 BARTHES, Roland. O Óbvio e o Obtuso. Ensaios Críticos III. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1990, p. 15. http://www.historiaimagem.com.br 37
  • 13. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 -Veja esta - Fonte: Revista do Globo, ano III, n.27 de 21.nov.31, p.31. A primeira vista, poderíamos nos perguntar o que um homem parado fumando um cachimbo tem a ver com a questão do voto? Mas aí temos a legenda da fotografia que diz: “As maravilhas do feminismo...O paciente pae de familia, segurando o carrinho que contem uma futura eleitora, espera pacientemente pela esposa que foi votar...” Temos aqui, claramente, um exemplo do que Barthes explicita quando diz que “na maioria das vezes o texto limita-se a ampliar um conjunto de conotações já incluídas na fotografia; mas por vezes, também o texto produz (inventa) um significado inteiramente novo, que é, de certo modo, projetado retroativamente na imagem, a ponto de nela parecer denotado.”42 Neste caso, a palavra dá um significado diferente a mensagem fotográfica, inventando mesmo uma “história” para a imagem, e como bem salienta Kossoy: “por meio da composição imagem-texto, um conteúdo transferido de contexto: um novo documento é criado a partir do original visando gerar uma diferente compreensão dos fatos, os quais passam a ter uma nova trama, uma nova realidade, uma outra verdade. Mais uma ficção documental.”43 42 BARTHES, op. cit., p. 21. 43 KOSSOY, op. cit., p. 55. http://www.historiaimagem.com.br 38
  • 14. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 No ano de 1931, além desta fotografia temos três charges que tratam da questão do voto feminino. Comecemos com a primeira menção ao sufrágio feminino que saiu na Revista do Globo, nos anos que escolhemos para essa pesquisa.Trata-se de um conjunto de seis quadros de charges, ocupando a página inteira, intitulada Reforma Eleitoral – Voto Feminino, localizada na metade final da revista no mês de outubro de 1931. Para termos subsídios para trabalharmos com este tipo de material consultou-se o artigo de Maria Inês Ghilardi, intitulado O humor na charge jornalística e o livro de Onici Flôres A Leitura da Charge. Antes de qualquer coisa temos que nos perguntar o que é considerado como uma charge. Onici Flôres nos diz que “a charge é um texto usualmente publicado em jornais sendo via de regra constituído por quadro único. A ilustração mostra os pormenores caracterizadores de personagens, situações, ambientes, objetos. Os comentários relativos à situação representada aparecem por escrito”.44Assim devemos dar atenção a tudo o que aparece nestes desenhos, pois, muitas vezes, a expressão icônica pode nos dizer muito mais do que a escrita. Tanto Ghilardi quanto Flôres apontam para a melhor abordagem a se utilizar para que se possa captar o sentido da charge, pois como aponta Flôres: a charge é um interessante objeto de estudo por aquilo que mostra e diz de nós mesmos e do mundo em que vivemos, contribuindo, além disso, para moldar o imaginário coletivo [...], o conteúdo da charge desnuda a reação ao status quo [e é um] tipo de texto sui-generis que mostra e conta, ao mesmo tempo, os conflitos sociais. [...] Sua temática, em geral, versa sobre o cotidiano - questões sociais que afligem, irritam, desgostam, confundem. 45 Ghilardi, ao trabalhar com a charge, indica que ela pode causar impacto comparável ao de um bom texto crítico. E, ainda, contém as emoções que envolvem os fatos, enquanto as reportagens tratam apenas de comunicá-los. [...] além de transmitir informações, de forma rápida e sucinta, com criatividade e uma imprescindível dose de humor, a charge revela uma leitura crítica do mundo atual.46 Essa autora conclui que o estudo da charge é mais uma das maneiras de se observar como a realidade é (ou foi) interpretada pela sociedade que pretende retratar, uma vez que ela só faz sentido se o destinatário da charge compartilha dos mesmos valores de quem desenhou 44 FLÔRES, Onici. A Leitura da Charge. Canoas: Ed. Ulbra, 2002, p. 14. 45 FLÔRES, op. cit., p. 11. 46 GHILARDI, Maria Inês. O Humor na Charge Jornalística. Comunicarte. Campinas, v. 12, n° 20, 1995/1996, p. 87. http://www.historiaimagem.com.br 39
  • 15. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 a mesma, isto é, a charge pode “propiciar um retrato, mesmo que não completo e detalhado, da época e do mundo atual”.47 Ghilardi descreve, segundo a sua percepção, qual seria a maneira mais correta para se estudar uma charge.Para ela é necessário o conhecimento do assunto tratado, das pessoas nela representadas e do contexto, pois ela leva em conta o fato noticiado ao qual se vincula. [...] A caracterização do ambiente, dos personagens, e as marcas simbolizando o tema são suportes necessários à interpretação adequada.48 Onici Flôres ainda assinala que na charge, articulam-se as relações entre autor, narrador e personagens na mesma vinheta [...]. Ela apresenta com que uma tirada conclusiva, uma réplica a respeito de um dado evento social, supostamente público e notório, envolvendo quem assina, quem narra e as personagens, ou seja, reunindo instâncias discursivas textuais e extratextuais.49 Levando-se em consideração o que essas autoras explicitam sobre os cuidados metodológicos para se trabalhar com as charges, é que procuramos fazer a análise que agora se segue. A edição de número 24 de 10 de Outubro dedicou uma página inteira à charge referente ao voto feminino, como já mencionado acima. A página aparece assinada pela alcunha de Nery. Apresenta cinco quadros contendo desenhos e textos e, um desenho de uma senhora idosa atrás da montagem dos quadros, com a legenda “Voto em separado”. Todos os quadros versam sobre a questão do voto feminino, mostrando os (pré)conceitos da época. Vamos analisá-los mais detalhadamente. 47 GHILARDI, op. cit., p. 92. 48 GHILARDI, Ibidem, p. 87-88. 49 FLÔRES, Ibidem, p. 14. http://www.historiaimagem.com.br 40
  • 16. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 - Reforma Eleitoral Voto Feminino - Fonte: Revista do Globo, ano III, n.24 de 10.out.1931, p. 37. O primeiro quadro50 mostra um casal com a seguinte legenda: ‘Justamente por você ser meu marido, o meu voto seria suspeito, vou da lo ao Juca’. O que nos diz essa charge? Além da obviedade da frase, onde supostamente a mulher aparece como uma feminista consciente de seus direitos, o que mais chama a atenção neste quadro é a forma como a mulher está vestida. O que a distingue do homem é somente a saia (indumentária exclusivamente feminina neste caso) e os cabelos mais longos. Até mesmo a flor na lapela, que poderia parecer a primeira vista uma concessão feita ao seu sexo é mostrada nos quadros dois e cinco, enfeitando o paletó do malandro. Também chama a atenção que a mulher está carregando uma pasta e não uma bolsa, como seria de se esperar. Quais os questionamentos que essa charge leva ao leitor? Ao mostrar uma mulher quase que masculinizada e acrescentando a fala à personagem, essa charge passa a idéia de que as feministas além de serem quase homens (não se comportarem, nem se parecerem com mulheres) também são incoerentes, observe-se o 50 Para fins de melhor entendimento da análise das charges mostradas nesta página, foi arbitrada, pela autora, a numeração dos quadros no sentido horário, começando na parte de cima da folha à esquerda. http://www.historiaimagem.com.br 41
  • 17. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 rosto do homem, que apresenta um “ar” de consternação, como se houvesse ouvido alguma besteira. O segundo e o quinto quadro apresentam a estilização de um malandro, que está se aproveitando das mulheres para ‘viver bem’. Isso nos é sugerido tanto pelo texto quanto pela postura do homem nestes quadros. O homem aparece bem vestido, fumando um cigarro, com uma flor na lapela (símbolos de elegância). Em contraste com ele se tem, no quinto quadro, um homem mal vestido, com a barba por fazer, sem gravata, com remendos na roupa e, com a clara sugestão, que um e outro se conhecem e talvez sejam até comparsas. O que temos nesta charge? A típica figura do malandro, do aproveitador que está se dando bem as custas da ingenuidade da mulher. Acompanhemos o diálogo entre os personagens do quinto quadro, o mais humilde comenta: ‘Egate! Que elegância!’ E escuta a réplica: ‘ É que agora eu sou cabo eleitoral de uma mulher linda e generosa!’, ou seja, o direito ao voto ainda não conquistado, (lembremo-nos que estas charges datam de outubro de 1931), seria mais uma maneira das mulheres serem enganadas pelos homens mais espertos e sagazes, uma vez que elas não teriam a capacidade de defesa contra esses tipos. Seria uma maneira de alertar os pais para o perigo de se conceder o voto a mulher? Provavelmente sim. O terceiro quadro mostra uma cena doméstica, um homem mais idoso sentado numa poltrona na sala de sua casa, lendo o seu jornal, atrás aparece uma moça e um homem mais jovem de pé, na frente da poltrona. Este jovem parece estar muito contrariado, nota-se isso tanto pelas feições do seu rosto, que se mostram contraídas, quanto pela posição das suas mãos, apertadas uma contra a outra e a frente do corpo. O diálogo é esclarecedor, o homem mais jovem diz: ‘Venho lhe pedir a mão de sua filha.’ Qual é a resposta do pai? ‘Posso lh’a conceder, mas sem o direito do voto. Nas próximas eleições ele será meu!’ A mulher aparece neste desenho apenas de forma figurativa, não lhe é dada nenhuma fala, ela encontra-se parada atrás da poltrona do pai, apenas observando a cena. O que nos sugere este desenho? Que a mulher não teria a capacidade de escolher os seus próprios candidatos, sendo totalmente influenciada pelos homens da família, no caso o pai e o futuro marido. Esta charge procura mostrar que o homem, de um modo geral, exerceria uma clara influência sobre a mulher, evidenciando o caráter patriarcal da sociedade da época. No quarto quadro temos a figura de um homem sentado com as mãos no rosto. Propositalmente ou não, o quadro cinco está colocado de tal maneira que esconde o rosto http://www.historiaimagem.com.br 42
  • 18. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 deste homem. Coincidência? Ou uma maneira sutil de mostrar que o homem não deve demonstrar sentimentos em público? Mesmo num desenho? A escrita neste quadro mostra uma lamentação deste homem, a saber: ‘Minha mulher fugiu com o meu cabo eleitoral. Sou um homem derrotado nas próximas eleições!’ O que isso pode indicar? Que o mais importante para ele não seria ter perdido a mulher, mas sim o voto certo que ela lhe daria? Ou que mais importante que a mulher seria o cabo eleitoral? Parece que este homem está lamentando mais a perda dos votos, que supostamente teria com o trabalho do seu cabo eleitoral, do que o fato de ter sido abandonado pela mulher. Esse conjunto de desenhos tem, como tema central, a questão da concessão de voto às mulheres. Temos aqui referenciados vários argumentos para negar o acesso feminino a esse direito. Como a questão de que as mulheres não saberiam o que fazer ou em que votar, sendo influenciadas por seus pais e maridos, ou que seriam enganadas por espertalhões que usariam da falácia para lhes aplicar algum golpe. Desse modo o que se sugere nestas charges é que a mulher ainda não estaria preparada para exercer o voto. Encontramos outro conjunto de charges no exemplar de número 25 de 24 de outubro. Do mesmo modo que no número anterior é dedicada uma página inteira a essas charges e é também assinada por Nery. Trata-se de um conjunto de seis quadros, com o título de “Profissões Femininas de 1932”. Todos os quadros contêm desenhos de mulheres em situações que denotam o despreparo feminino para exercer as ditas profissões. As profissões mostradas são: varredora de ruas, inspetora de trafego, guarda civil, cabo eleitoral e dois quadros referem-se a esportes, o futebol e o boxe. http://www.historiaimagem.com.br 43
  • 19. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 - Profissões Femininas de 1932 - Fonte: Revista do Globo, ano III, n.25 de 24.out.1931, p. 33. O quadro com a legenda ‘Cabo eleitoral’ é o terceiro no sentido horário e mostra uma mulher encostada numa parede na rua (parece ser uma esquina) numa pose não recomendável para uma moça de família. A mulher aparece mais uma vez em trajes quase que completamente masculinos, com exceção da saia e do sapato de salto. Ela traja colete, gravata, casaca, chapéu masculino e ainda traz uma bengala. Tem nas mãos um cartão, supostamente um ‘santinho’ do seu candidato. As roupas escondem o seu corpo, são soltas e disformes em contraste direto com as outras mulheres mostradas nos outros desenhos, que aparecem com os uniformes ajustados sobre o corpo, como a guarda civil ou a inspetora de trânsito. Exceção feita à varredora de ruas que também traja roupas disformes e sapatos masculinos (botinas). O tema destas charges é o despreparo feminino para o trabalho fora do lar. Ou a mulher é mostrada como uma sonsa, como no caso do desenho da varredora de ruas, onde fica http://www.historiaimagem.com.br 44
  • 20. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 olhando sem entender a cena que se descortina a sua frente (um poste com um chapéu feminino) ou como é mostrada nos caso da inspetora de tráfego, onde a mulher em vez de se preocupar com o trabalho está se enfeitando, vendo-se o mesmo “comportamento” no quadro que retrata a guarda civil que apenas observa enquanto um ladrão anda tranqüilamente pelas ruas. Outra charge intitulada de “Direitos Femininos” foi veiculada no dia sete de novembro, no canto inferior direito da página nove. – Direitos Femininos - Fonte: Revista do Globo, n.26 de 07.nov.1931, p. 9. Neste desenho vê-se uma mulher andando na rua e dois homens escondidos a observando. Abaixo do quadro o diálogo dos dois. Um dos personagens fala: “Estás vendo esta que vae passando! É uma grande defensora dos direitos da mulher...” Ao que o outro pergunta: “Ah! Então é uma suffragista?” E a resposta do primeiro é: “Não! É uma escriptora...”. Como podemos apreciar neste pequeno diálogo entre os personagens desta charge, mais uma vez o sufrágio feminino é desdenhado pelos homens, essa crítica não está explicitada no desenho, mas sim nas palavras do diálogo. Assim a mulher conquistaria mais direitos se restringisse a sua luta ao recinto privado do seu lar, uma vez que o ato de escrever é solitário e denota uma exclusão do convívio público, pelo menos por um tempo, ao contrário do que ocorre com as sufragistas que se metiam em reuniões, deixando de lado o lar. Mas voltemos às fotografias encontradas na Revista do Globo. Para analisá-las procuramos nos basear na metodologia apresentada por Ana Maria Mauad, tanto no capítulo http://www.historiaimagem.com.br 45
  • 21. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 Fotografia e História, já citado acima, quanto no artigo Através da imagem: fotografia e história interfaces, onde a autora evidencia a melhor forma de se trabalhar com as imagens fotográficas, e que a autora chama de “metodologia histórico-semiótica”. Procuramos levar também em consideração as noções já trabalhadas para o caso das charges, que consideramos como complementares para esta análise. Assim Mauad salienta que a fotografia deve ser concebida como uma mensagem que se organiza a partir de dois segmentos: expressão e conteúdo. O primeiro envolve escolhas técnicas e estéticas, tais como enquadramento, iluminação, definição da imagem, contraste, cor, etc. Já o segundo é determinado pelo conjunto de pessoas, objetos, lugares e vivencias que compõem a fotografia.51 Comecemos pelo item conteúdo. Mauad aponta os tópicos para análise das fotografias sendo elas: o local, o tema, as pessoas, os objetos retratados, além dos atributos das pessoas e da paisagem, além do tempo retratado (dia/noite). Quanto ao item expressão, a autora aponta para o formato ou tamanho da foto, os enquadramentos, o tipo de foto (posada ou instantânea) e a nitidez. Procuramos seguir essas recomendações nas análises abaixo. Sob o título de “As mulheres votam... as ultimas ruidosas eleições da Inglaterra” tem- se uma página inteira dedicada às eleições na Inglaterra, no primeiro exemplar do ano de 1932. De um total de quatro fotos, três mostram mulheres. As fotografias ocupam toda a página, deixando apenas um pequeno espaço para as legendas. O formato privilegiado é o retangular e o quadrado, as fotografias possuem uma boa definição e nitidez, dando a aparência de serem instantâneas e não posadas. As fotos encontram-se numeradas no sentido anti-horário, de cima para baixo e da esquerda para a direita. As legendas das fotografias encontram-se todas juntas no canto esquerdo da página, espremidas entre as fotografias um e dois, o que não dá uma ênfase maior ao texto. O que chama a atenção nesta página é a composição de fotografias. 51 MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: fotografia e história interfaces. Tempo. Rio de Janeiro, vol 1, n.2, 1996, p.73-98. Disponível em <http://www.historia.uff.br/labhoi/publicacoes>Acesso dia 19.05.2006. passim. http://www.historiaimagem.com.br 46
  • 22. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 - As mulheres votam... - Fonte: Revista do Globo, ano IV, n.1 de 16.jan.32 p.13. A fotografia que ocupa a parte superior da página, mostra um ambiente interno, provavelmente uma das sessões de votação, deduz-se isso pela presença de uma urna e de dois senhores parados com papéis dobrados nas mãos, sendo provavelmente as folhas de votação. Nesta primeira fotografia temos cinco pessoas retratadas, três homens e duas mulheres, dois homens com roupas que sugerem um uniforme, o outro de casaca e duas religiosas. As religiosas aparecem em primeiro plano e a legenda traz uma fina ironia: “até as irmãs religiosas vão dar o seu votinho...” A metade de baixo da página é dividida por duas imagens, a da esquerda é de formato retangular e menor que todas as outras, nos mostra uma mulher bem arrumada, com uma boina, um sobretudo com gola de peles e luvas, em close, depositando o seu voto na urna. Aparentemente é uma mulher de posses. A legenda indica: “Uma ‘miss’, no momento em que deitava a cédula na urna”. A terceira fotografia desta página mostra um cenário externo, provavelmente a saída de um dos locais de votação. Em primeiro plano temos três pessoas, a figura central é uma senhora bem idosa com uma bengala, sendo amparada por dois homens, à direita por um http://www.historiaimagem.com.br 47
  • 23. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 homem mais jovem de uniforme (um guarda talvez) e, do outro, um senhor de mais idade, trajando, sobretudo e boina. No segundo plano temos a figura de uma senhora com chapéu, e bem ao fundo, na penumbra do interior do prédio, um homem de perfil e de óculos. A cena parece armada para dar destaque a senhora idosa, o que é reforçado pela legenda, mais uma vez irônica: “– Mrs Caroline Merriot, de 106 annos (que horror!) que votou em North Croydon. Será que poderá votar na proxima vez ?” O primeiro plano desta montagem fotográfica é dada pela fotografia de um homem, bem vestido, com um “ar” sorridente, dando a impressão de estar olhando direto para o leitor. Sua foto encontra-se na parte direita da página, ocupando a página de cima a baixo e por cima das fotos um e três. A legenda nos indica de quem é essa imagem “O grande ‘leader’ Mac Donald, com um sorriso de vencedor.” Todas as fotos nos mostram que estamos vendo fotografias tiradas num clima frio, aparência confirmada pelas roupas pesadas usadas pelas pessoas retratadas. Também vemos que homens e mulheres votavam nas mesmas sessões eleitorais. A ênfase é dada ao voto feminino, tanto pelas imagens de mulheres retratadas quanto pelo texto das legendas, o fato de ser dedicada uma página inteira a esse assunto talvez se tenha dado pelo voto feminino se constituir uma notícia de interesse para os brasileiros, que estavam discutindo essa questão na confecção da nova lei eleitoral. Porém o fato de se ter colocado a figura do político Macdonald, em destaque no primeiro plano da página, e as tiradas irônicas das legendas nos levam a crer que a questão do sufrágio feminino ainda não se encontrava bem aceita até o momento (janeiro de 1932). O ano de 1933 marca a nova fase da revista, quando ela passa a se denominar “Magazine de Atualidade Mundial”. Esse também é o ano das eleições dos deputados constituintes, no mês de maio, quando as mulheres brasileiras puderam enfim participar. No primeiro semestre do ano, temos basicamente, menções sobre a questão do voto feminino na Europa (França e Espanha) e as eleições realizadas em 3 de Maio no Brasil. No dia 17 de Maio de 1933 a edição de número nove apresenta a página 36 dedicada ao tema das eleições com um conjunto de sete fotografias, sob o título geral de “As Eleções de 3 de Maio” e com o subtítulo: “Realisaram-se em nossa capital, dentro da maior ordem, as eleições dos deputados à Constituinte. A nossa pagina fixa alguns flagrantes do pleito.” http://www.historiaimagem.com.br 48
  • 24. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 - As Eleções de 3 de Maio - Fonte: Revista do Globo, ano V, n.9 de 17. maio.1933, p. 36. De modo diferente das fotografias analisadas anteriormente temos as legendas embaixo das respectivas fotografias, o que facilita a identificação e a associação do texto à imagem. As fotografias privilegiam, mais uma vez, o formato retangular, coincidentemente ou não, as que apresentam mulheres são as que ocupam o menor espaço na composição da página.52 Das sete fotografias, cinco são de ambientes internos, e duas mostram um ambiente externo. Mais uma vez tem-se a impressão de serem fotos instantâneas, sem a pretensão de serem posadas. As fotografias são nítidas e, na composição da página, não se destaca nenhum dos quadros fotográficos, prevalecendo no centro da página à chamada do título. A grande novidade desta eleição foi, sem dúvida, a presença das mulheres votando neste pleito. A isso não é dado um grande destaque, pois, ao contrário das fotografias três e quatro, que mostram homens depositando o seu voto na urna, a presença feminina é mostrada no quadro dois e no quadro cinco. Na segunda fotografia vemos uma senhora bem vestida saindo de algum lugar, isso nos é mostrado pelo seu gesto congelado de abrir a cortina. A legenda esclarece “uma eleitora saindo do gabinete secreto onde acaba de escolher uma 52 Para fins de melhor entendimento aferiu-se o sentido horário, começando a contagem da parte superior à esquerda, para numerar as fotografias desta página. http://www.historiaimagem.com.br 49
  • 25. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 chapa”.Como já nos indicava Barthes a legenda nos leva a uma interpretação diferente do retratado na imagem, dando uma conotação a essa fotografia que não teria se não fosse a conjunção da imagem-texto. O quinto quadro retrata uma senhora sorridente, de óculos, segurando uma bolsa, se não lermos a legenda mais uma vez não saberemos do que se trata, a legenda indica: “Cousas do tempo. Uma eleitora septuagenaria”. Acompanhemos as legendas das outras fotografias: 1- S. Excia. O Gal. Interventor fotografado quando, em companhia de um filho, se dirigia na manha do pleito para a secção em que devia votar. 3 – Um eclesiastico fotografado no instante em que deixava na urna o envelope que continha a chapa com os nomes de seus candidatos. 4 - S. Excia. O Gal. Franco Ferreira. Comandante da 3ª Região no momento em que depositava na urna seu envelope 6 – Numa secção eleitoral. Os votantes disputam a posse das fichas que lhes marcarão a ordem da votação. 7 – A apuração. Numa das secções apuradoras o dr. Inocencio Borges da Rosa procedendo à abertura de uma das urnas. No ano de 1934, a única menção ao voto feminino pode ser encontrada no exemplar de 18 de outubro de 193453 na seção “Ecos da Quinzena”. Nesta edição temos na página 32 mais uma reportagem fotográfica sobre o tema do sufrágio. De um total de 10 fotografias, cinco têm como mote o pleito eleitoral de 14 de Outubro. As fotografias encontram-se numeradas de um a dez no sentido da esquerda para a direita e de cima para baixo, o que estabelece o caminho proposto para a leitura das fotografias. A legenda que acompanha as fotografias encontra-se no canto superior direito, não tendo muito destaque na composição da página. 53 Só para lembrar, este foi o ano da promulgação da nova Constituição no mês de julho, que ampliou o voto a todas as mulheres e de novas eleições, para a Câmara de Deputados Estaduais, que ocorreram em outubro. http://www.historiaimagem.com.br 50
  • 26. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 - Ecos da Quinzena - Fonte: Revista do Globo, ano V, n.20 de 18.out.1933, p. 32. Podemos dividir esta página em quatro partes. Ocupando as duas primeiras partes na parte superior da página tem-se em foco a chegada de uma “socialite” a Porto Alegre. A metade inferior da página é composta por seis imagens, as quatro primeiras ocupam dois terços da metade inferior da página, mostrando uma seqüência de quatro “flagrantes”, o momento em que os eleitores depositam o seu voto na urna. As imagens que ocupam a parte inferior da página, as fotografias nove e dez, são apresentadas no mesmo formato e dividindo o espaço, na parte inferior da página, ao meio. Mas, enquanto a imagem nove apresenta um ambiente interno com muitas mulheres, a fotografia dez apresenta um ambiente externo, e uma equipe de remo masculina. O formato privilegiado em toda a composição da página é o retangular. Nesta seqüência de fotografias, as que dizem respeito diretamente ao nosso tema são as imagens oito e nove, porém será interessante também incluir as imagens cinco a sete, por tratarem da questão do sufrágio. Todas as cinco fotografias mostram um ambiente interno, sendo que, as quatro primeiras, apresentam o momento da colocação do voto na urna. Nessas http://www.historiaimagem.com.br 51
  • 27. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 temos em primeiro plano o eleitor e a urna, sendo que na foto de número cinco o braço do homem não se encontra muito nítido, o que pode denotar que essa fotografia foi tirada enquanto o homem fazia o gesto de levar o braço á abertura da urna. Todas também apresentam, em segundo plano, vários pessoas, supostamente esperando a sua vez de votar. Enquanto nas três primeiras imagens temos somente homens retratados, na última fotografia temos a imagem de uma mulher bem vestida, e pelo menos mais uma mulher aparece no segundo plano, junto com outros homens. A legenda das fotografias cinco, seis e sete indica que as pessoas retratadas ali são figuras ilustres: “5- vota o Gal. Flores da Cunha 6- o dr. Raul Pilla 7- o dr. João Carlos Machado”, já a fotografia oito não mereceu o mesmo destaque sendo apresentada junto com a imagem nove simplesmente como: “8 e 9 – Aspectos da secção onde votou o eleitorado feminino.” Analisemos a fotografia nove, ela retrata, tanto no primeiro plano quanto no segundo, várias mulheres bem vestidas num ambiente interno, todas paradas, em ordem, esperando por alguma coisa, quase todas olham na mesma direção, a saber, para frente. A fotografia é tirada de um lugar um pouco mais alto, enfatizando o grupo, a aglomeração feminina, pois não conseguimos definir com clareza os contornos da sala, assim tem-se a impressão de um grande grupo, sem começo, nem fim. Temos ainda a sensação, ao contemplar essa imagem, de ordem e calma, impressão essa reforçada tanto pela tranqüilidade dos rostos femininos, quanto pela pose das mulheres em primeiro plano, paradas segurando as bolsas na frente do corpo. Sem a legenda para nos trazer a informação de que se trata de uma secção eleitoral, não seria possível identificar essa fotografia. O aspecto que se ressalta nesta composição é o clima de ordem e a de espera. Também podemos destacar, nas fotografias cinco e seis, é que, provavelmente, ambas foram tiradas a poucos minutos uma da outra, e na mesma secção eleitoral, nota-se isso quando observamos, no segundo plano, os mesmos “coadjuvantes” e em quase igual posição. A última imagem coletada na revista foi divulgada em 22 de dezembro de 1934, na edição de número 24. Apesar de não tratar especificadamente da questão do sufrágio feminino, nos traz, na página 57, uma fotografia das eleições de 14 de outubro de 1934 como um dos acontecimentos importantes que ocorreram no Rio Grande do Sul. A eleição é equiparada à visita de Getúlio Vargas ao estado, e também a passagem de um dirigível nos céus da capital. O que só vem reforçar que as eleições são um momento importante e de destaque na vida pública dos cidadãos. Esta imagem ocupa a parte superior da página, a http://www.historiaimagem.com.br 52
  • 28. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 direita, e mostra um ambiente interno, mais um momento de “flagrante” de um homem no seu gesto de colocar o seu voto na urna. Apesar de não destacar o sufrágio feminino, considero válido agregar este “acontecimento culminante” na nossa “coleção” de fotografias. - 1934 e alguns de seus acontecimentos culminantes – Fonte: Revista do Globo, ano VI, n.24 de 22.dez.1934, p.57. Mas a que conclusões podemos chegar depois de analisar essas imagens? Podemos através da descrição delas finalmente chegar a uma resposta para a nossa pergunta inicial? Qual seja: podemos perceber qual foi o discurso da Revista do Globo sobre o voto feminino? Porque como diz Boris Kossoy na “[...] busca do significado do conteúdo; ver, descrever e constatar não é o suficiente”.54 Considerações Finais As imagens veiculadas na Revista do Globo sobre o sufrágio feminino me levam a acreditar que, até 1932, esse tema era tratado com um certo desdém pela revista. No seu discurso eu destacaria a maneira como o voto feminino foi tratado nas charges do ano de 1931 54 KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p. 95. http://www.historiaimagem.com.br 53
  • 29. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 mostrando-o como uma forma de desagregar a família e a sociedade, e expondo explicitamente o despreparo feminino para exercer suas funções cívicas, fora de casa. Nisso essas imagens se coadunam de maneira admirável com os artigos veiculados na revista e que aqui não foram expostos, já que a proposta deste ensaio era fazer um exercício de interpretação das imagens impressas na Revista do Globo. Mas, tanto no texto quanto na imagem, o que se destaca era o despreparo feminino para atuar nesse mundo público e masculino, por excelência. Fala-se de feminismo, mas não se mostram as imagens de mulheres, talvez para não ocorrerem associações sobre os temas, lembremo-nos que ao falar de feminismo, na nossa primeira fotografia analisada, temos em destaque a figura de um homem e não de uma mulher. Após a promulgação do Código Eleitoral e, principalmente nos momentos de eleições, quando a presença feminina já não podia mais ser ignorada (no pleito eleitoral) o que é enfatizado são as imagens de mulheres idosas e “flagrantes” femininos que não poderiam ser associados ao tema do sufrágio, como por exemplo, as mulheres esperando todas de pé, numa sala. Assim se não contássemos com as legendas dessas fotografias não saberíamos do que, supostamente, estava sendo ali retratado. Desse modo, o que pude depreender da análise destas imagens é que o discurso proferido pela Revista do Globo salienta o despreparo da mulher para exercer um papel no mundo público. Apesar de não se ter encontrado muitas referências ao tema do sufrágio feminino, creio que isso pode ser creditado ao enfoque dado por esta revista, que valorizava mais as questões culturais e sociais do que as questões políticas, deixadas para a imprensa diária. O que só faz com que as imagens que se encontraram se tornassem mais significativas, pois resumem as escolhas feitas pelos editores da Revista do Globo, que eram quem definiam o que deveria ser veiculado na revista. Assim pode-se perceber qual era a forma que esses editores consideravam como a mais correta de abordar a questão do sufrágio feminino na revista, salientando a fotorreportagem, em detrimento de longos textos. Desse modo, nestes anos iniciais de 1930, a Revista do Globo, tratou o tema do sufrágio feminino através de suas imagens, escolhidas de maneira a não salientar mulheres jovens e ativas, lutando pelo seu direito de exercer a sua plena cidadania.Se essas imagens e esse discurso atingiu o seu público não sei dizer, pois o que estou tentando fazer é uma releitura desse discurso muitos anos depois da sua veiculação. http://www.historiaimagem.com.br 54
  • 30. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 Não foi possível conseguir informações sobre a produção destas imagens, como o nome dos fotógrafos responsáveis pela feitura das fotografias, nem mesmo dados como tipo de máquina, tipos de filme e de lentes utilizados, ou de qualquer outro tipo de equipamentos que, porventura tenham sido utilizados na confecção das imagens. Porém, levou-se em consideração a ressalva que Barthes tão bem explicitou no texto “A Mensagem Fotográfica”, ou seja, de que as escolhas das fotografias para publicação foram feitas, em última instância, pelos editores da revista, o que já nos dá uma idéia de escolha de determinadas fotografias e de certos ângulos para dar ênfase ou não ao assunto escolhido e retratado. Esbocei neste ensaio uma tentativa de compreender como a Revista do Globo veiculou o seu discurso sobre o sufrágio feminino. As interpretações apresentadas ao longo dessa explanação estão longe de serem definitivas, pois a cada vez que inquirimos a nossa fonte, mais questionamentos são apresentados e novas interpretações podem surgir. Referências Bibliográficas ALVES, Branca Moreira, PITANGUY, Jacqueline. O que é feminismo? São Paulo: Brasiliense, 1984. BARTHES, Roland. O Óbvio e o Obtuso. Ensaios Críticos III. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1990. CARONE, Edgard. A República Nova (1930-1937). São Paulo: Difel, 1982. CIAVATTA, Maria; ALVES, Nilda (Orgs.). A Leitura de Imagens na Pesquisa Social. História, Comunicação e Educação. São Paulo: Cortez Editora, 2004. CLEMENTE, Elvo. As revistas da Livraria do Globo. Continente SulSur .Revista do Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, ano 1, n° 2, pp. 121-132, novembro de 1996. COLLING, Ana Maria. A Construção da Cidadania da mulher brasileira: Igualdade e Diferença. 2000. 390 f. Tese (Doutorado em Historia) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. DALMÁZ, Mateus. A Imagem de Hitler e da Alemanha na Revista do Globo de Porto Alegre (1933-1945). 2001. 314 f. Dissertação (Mestrado em História) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. São Paulo: Papirus, 1993. DUBY, Georges; PERROT, Michelle (org.). História das Mulheres. Vol. 4 e 5. Porto: Edições Afrontamento, 1998. http://www.historiaimagem.com.br 55
  • 31. História, imagem e narrativas o N 3, ano 2, setembro/2006 – ISSN 1808-9895 DULAC, Elaine Beatriz Ferreira. Beleza, Sedução e Juventude: A Revista do Globo ensinando Feminilidade. 2002. 155 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. FLORES, Onici. A leitura da charge. Canoas: Ed. ULBRA, 2002. GHILARDI, Maria Inês. O Humor na Charge Jornalística. Comunicarte. Campinas, v. 12, n° 20, 1995/1996. HAHNER, June E. A Mulher no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. _______. A mulher brasileira e suas lutas sociais e políticas: 1850-1937. São Paulo: Brasiliense, 1981. HAUSSEN, Doris Fagundes; DUVAL, Adriana Ruschel. O Rádio nas páginas da Revista do Globo (1929/1967). Revista Famecos.Porto Alegre, n°14, pp.130-134, abril de 2001. KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. ______. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002. LEITE, Miriam M. Retratos de Família. Leitura da Fotografia Histórica. São Paulo: EDUSP, 2001. MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: fotografia e história interfaces. Tempo. Rio de Janeiro, vol 1, n.2, 1996. PINTO, Céli R. Uma história do feminismo no Brasil. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003. PORTO, Walter Costa. Dicionário do voto. São Paulo: Editora Giordano, 1995. Verbetes: “Código Eleitoral de 1932”, “Voto da Mulher”. RÜDIGER, Francisco. Tendências do Jornalismo. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 1993. SOIHET, Rachel. A pedagogia da conquista do espaço público pelas mulheres e a militância feminista de Bertha Lutz. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, n° 15, pp. 97-117, set/out/nov/dez.2000. TORRESINI, Elizabeth W. R. Editora Globo: uma aventura editorial nos anos 30 e 40. 1988. 169 p. Dissertação (Mestrado em história da cultura brasileira) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Sites consultados: http://www.historia.uff.br/labhoi/publicacoes http://www.presidencia.gov.br http://www.ipct.pucrs.br/letras http://www.historiaimagem.com.br 56