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Hanseníase
Fios
  que
 tecem
infinitas
Histórias
São Paulo/2008
                                      C   réditos:
                                 Heleida Nobrega Metello




                 D   ivisão Técnica
        de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
No ano de 2006

                                   fez 800 anos que

                            São Francisco abraçou o leproso.


                              Este abraço mudou sua vida.




Dia 20 de janeiro de 2006
Desde então,
       a partir de 2006,
 os franciscanos iniciaram
uma campanha estadual (SP)
  que está se estendendo
 ao resto do país para ajudar
na Eliminação da Hanseníase.
Mesmo que há 129 anos o
agente causador tenha sido
descoberto,    até    hoje    a
hanseníase é vista com um ar
de mistério, uma vez que para
muitos não é clara a explicação
e o entendimento de como se
dá a sua disseminação, o seu
contágio.

Eis porque devemos levar em
conta a complexidade que o
tema traz para o paciente e/ou
família em que muitas vezes
sequer conseguem pronunciar
a palavra H A N S E N Í A S E
corretamente.


Fonte: tese de doutorado de Zoika Bakirtzief (1994).   Fonte:http://www.paho.org/images/AD/DPC/CD/familia1.jpg
Ora, não estamos aqui
   justamente porque
  escolhemos o homem
como princípio, meio e fim
    no nosso campo
  de vida profissional?
Então   voltemos   ao     passado,   à
origem da palavra HOMEM, até para
confirmar o dito de Guimarães Rosa:


“Toda língua são rastros de velho
mistério",   ou melhor:    a essência
das coisas e a ligação que tudo tem
com um passado remoto... que as
palavras, inclusive, são rastros de
velho mistério.
Perseguir as pistas que o passado deixou nas
                                                       palavras é uma das melhores formas de
                                                       reencontrar               nossas            heranças             e      fazer        um
                                                       exercício de reflexão sobre quem somos, homo
                                                       sapiens e homo loquens*,seres que concretizam
                                                       na linguagem o seu saber.

                                                       Saber             lembra              sabor,             dois           conceitos
                                                       etimologicamente vinculados. O ser humano
                                                       que saboreia a realidade é mais sábio, é mais
                                                       humano. E ser humano é ser aquele que sabe
                                                       ter nascido do húmus, da terra.
     Fonte: PALAVRA PUXA PALAVRA:

 À LUZ DA ETIMOLOGIA - II / Gabriel Perissé



•O homo sapiens tornar-se-ia no homo loquens, inventando uma linguagem para exteriorizar as suas necessidades,as suas ideias e os seus desejos,
diferenciando-se dos animais pela utilização de um sistema de comunicação progressivo e aberto que pode transmitir-se e enriquecer-se de geração em geração
Nesse palavra-puxa-palavra, o ser humano
                                             descobre que é mais humano quando
                                           pratica a humildade, virtude que nada tem
                                             de rebaixamento, mas que significa a
                                            qualidade de quem emerge do húmus,
                                             do barro, e mantém os pés no chão.


                                                  Geologicamente o húmus
                                                 é a parte mais fértil da terra.
                                             Assim, a humildade é para nossa vida
                                                   uma graça de fertilidade

Fonte: http://ointercessor.blogspot.com/
                                                  que faz brotar a vida nova.
Então...
     se uma palavra puxa a outra
      e, se escolhemos o homem
  como foco de atenção na nossa vida
  profissional, obviamente temos por
  obrigação incorporar o exercício da
    humildade em nosso cotidiano,
para que possamos também ver o ‘outro’
     no Programa de Hanseníase,
    desprendidos de nós mesmos.


    Só assim conseguiremos vê-lo
         no contexto global.
    Só assim, poderemos perceber
        o quanto essa doença
        se esconde por detrás
     de uma mancha insensível.
É algo relativo ao passado e futuro,
   como bem dizia Alberto Caieiro

       E hoje, estamos aqui
 justamente para falar do passado,
      uma vez que cabe a nós,
       um futuro promissor,
principalmente no que se refere ao




   fazemos o que nos cabe fazer
    como profissional de saúde.
Uma oportunidade
  para que possamos
pensar, trocar e somar
    a diversidade e
    complexidade
  do olhar, da escuta
       e do tato
 que o trabalho junto
    ao Programa de
      Hanseníase
    exige de cada
      um de nós.
Houve um tempo,

       um tempo longo demais,

            e com certeza,

        não é esse que vocês

            vivem agora,

       que eu , a HANSENÍASE,

      era denominada de LEPRA.


      Vale dizer que esse tempo

    que durou séculos e séculos...

        sequer poderia pensar

          em olhar nos olhos

     de cada um, como faço hoje,

        mesmo que, por vezes,

             timidamente.

É desse tempo que vou falar para vocês:
É muito difícil afirmar a época do aparecimento de uma doença com
base em textos antigos, por dados fragmentados e suposições de
tradutores dos mesmos, o assunto se torna confuso e gera uma série de
falsas interpretações.

Esse é o caso da Hanseníase, muito já se escreveu sobre sua origem e
existência, por outro lado, muitos desses escritos são citações de fontes
descrevendo a moléstia sem os seus aspectos peculiares.

Apesar disso, há referências bastante claras com relação à Hanseníase
em livros muito antigos.

Ao que parece, essa doença já era conhecida na Índia em 1500 a.C., e no
Regveda Samhita ( um dos primeiros livros sagrados da Índia ), a
Hanseníase é denominada de KUSHTA.

Contudo, na China, referências muito antigas sobre essa doença, como
aquela que é feita em um dos tratados médicos chineses mais antigos, o
Nei Ching Su Wen ,dão conta de descrições compatíveis com pacientes
portadores de Hanseníase, por volta de 2600 A.C .

                  http://www.geocities.com/hanseniase/Historico/historico.html
Num estudo sobre a etimologia da palavra lepra, Abraão Rotberg,

médico responsável pela mudança do nome lepra para hanseníase

    no Brasil, afirma que os significados de cunho degradante

     imputados ao termo têm sua origem no século III a.C.,

  quando 70 judeus, traduzindo a Torá, os Neviim e os Ketuvin

 para o grego, que mais tarde viriam a se transformar na Bíblia,

 denominaram o Tsara’ath hebraico, que abrangeu um conjunto

         de enfermidades de ‘caráter visual semelhante’.
Com base nessa ‘aparência’
                                                         deu-se início ao processo de
                                                     segregação dos ‘enfermos de lepra‘.


                                                                 Isso ocorreu durante
                                                                      a Idade Média
                                                                e inspirada no terceiro
                                                                    livro de Moisés,
                                                                    datado em cerca
                                                                    de 1445 a.C. O


                                                                      LEVÍTICO
                                                                (que lida com assuntos
                                                      relacionados à pureza, santidade,
                                                           etc... na vida cotidiana)


Fonte: Curi, Luciano Marcos, “Defender os sãos e consolar os lázaros”: Lepra e isolamento no Brasil 1935 a 1976
A Bíblia acabou se
    transformando numa fonte de
   confusão quanto à existência da
Hanseníase entre os judeus na época
  do êxodo, uma vez que esse termo
 “tsaraath”, no hebraico, significava
  uma condição anormal da pele dos
indivíduos,das roupas, ou das casas,
   que necessitava de purificação.



      Segundo o Livro Sagrado,
o “tsaraath” na pele dos judeus seriam
    “manchas brancas deprimidas
      em que os pelos também
        se tornavam brancos”.

        Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
Na tradução grega,
      a palavra “tsaraath”
   foi traduzida como lepra e
   “lepros”em grego, significa
      “algo que descama”.



         A palavra lepra
 também foi usada pelos gregos
para designar doenças escamosas
      do tipo da Psoríase.


     A Hanseníase mesmo,
 eles chamavam de Elefantíase.



         Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
Os ‘leprosos’
  sempre figuraram
   na lista dos que
    carregavam o




     Talvez sejam
    os mais antigos
alvos desta incessante
‘reclassificação social’.
O termo
           ESTIGMA vem desde
              a Antiguidade:


          na Grécia Antiga,
              era a marca
      que identificava os traidores.


     “Os gregos criaram o termo estigma para
     se referirem a sinais corporais com os
     quais se procurava evidenciar alguma
     coisa de extraordinário ou mau sobre o
     status moral de quem os apresentava.”
     (Goffman, 1978, p. 11).




        Em Roma, era utilizada
       para diferenciar as pessoas
        de baixa qualidade social.

     Fonte: Prof. Carlos Roberto Bacilo, Ciências Penais/UFPR
/discriminaçãohttp://www.unb.br/acs/unbagencia/ag0503-17.htm
O estigma, uma vez fixado
        em uma cultura,
  permanece incorporado aos
      sentimentos e modos
     de pensar de um grupo,
   mesmo quando a condição
que o gerou deixou de existir. [...]

  E, mesmo quando os 'outros'
não percebem os sinais da lepra,
       o ‘leproso’, sabedor
  de sua condição de portador
 de um atributo estigmatizante,
      assume essa condição.

     (Ornellas, 1997, p. 62)


         Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
Em relação
                                                 ao medo da rejeição –
                                                manifestado pelo desejo
                                                  de se isolar e sumir –
                                                      e da solidão,
                                                  vários entrevistados
                                                   de Oliveira (1990)
                                                 se revelaram indignos
                                                     de poder viver
                                                  com outras pessoas,
                                                 revelando o seu próprio
                                              preconceito quanto à doença.


                                           (Oliveira, 1990)




Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
Resumindo


   Goffman refere que
     ‘por definição’,
 acreditamos que alguém
 com um estigma são seja
 completamente humano.


      Com base nisso,
         não é raro
  fazermos discriminações,
      através das quais
efetivamente, e sem pensar,
    acabamos reduzindo
 suas chances de vida (...)”



      (Goffman, Erving. Op. Cit.;p.11.)
Segundo a historiadora Yara Nogueira,
              um dos principais responsáveis pela criação
              do estigma que cerca a hanseníase é a Bíblia,

           "A postura estabelecida acerca da ‘lepra’
  teve tal influência que acabou por extrapolar seu tempo,
                  chegando até a época atual.




Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em São Paulo",
             defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1995, 492p.
“Eterno
 é tudo aquilo que vive
uma fração de segundos,
   mas com tamanha
      intensidade,
     que se petrifica
    e nenhuma força
       o resgata"




       (Carlos Drummond)
Corpos calcinados, recobertos por cinzas durante séculos...
                 (foto de autor no Flickr)

http://interata.squarespace.com/jornal-de-viagem/?currentPage=2
Fonte: pesquisadores do Instituto Pasteur (França) entrevista de Reinaldo José Lopes
             Folha de São Paulo, maio de 2005 - (www.sciencemag.org),
O momento em que ocorreu a primeira infecção
             ainda não pode ser estimado com exatidão:

                          algo entre 5.000 e 50 mil anos atrás,
                                dizem os pesquisadores.




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               fonte: pesquisadores franceses, Instituto Pasteur, entrevista à Folha de São Paulo, maio de 2005
A ‘LEPRA’,
apontada como uma das doenças
  mais antigas da humanidade,
    desde os tempos bíblicos,
   aterrorizou reis, mendigos,
     plebeus, imperadores
      e populações inteiras
  nos quatro cantos do mundo.

       Independentemente
da época e da região geográfica,
      foi sempre associada
     ao pecado, à imundície
    e ao castigo dos deuses,
   e os doentes, submetidos
       às mais cruéis formas
    de isolamento, execração
       e até de extermínio.



Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em
       São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
“A   ‘morte’

          antes

     da morte,

         como os

   antigos egípcios


denominavam.”

          fonte: John Farrow, no livro “Damião, o leproso” - (biografia romanceada, lançada em 1937)
Balduíno IV
                                                                              (1161-1185),
                                                                                o rei cristão
                                                                              de Jerusalém,
                                                                            retratado no filme
                                                                               "Cruzadas",
                                                                             ficou marcado
                                                                               pela doença
                                                                            desde a infância
                                                                               e sua morte
                                                                         chegou a desestabilizar
                                                                             o reino cruzado
                                                                               na Palestina.




        Da Reportagem LOCAL São Paulo,
sexta-feira, 13 de maio de 2005 - – Folha Ciência-   (Reinaldo   José Lopes, jornalista da Folha de São Paulo, maio de 2005)
Segundo Dr. Marcos Virmond
                                   (diretor do Instituto “Dr. Lauro de
                                          Souza Lima” – Bauru)
                                       é uma fama injustificada:

                                             "Graças aos defeitos
                                          do genoma, é muito difícil
                                            acontecer a infecção."

                                          É preciso viver em condições
                                            precárias e apertadas,
                                           perto de muitas pessoas
                                          com alta carga da bactéria
                                                   no corpo.

                                        São condições comuns
                                    nas metrópoles do mundo antigo
                                        e no Terceiro Mundo.

  Estigma do mal na história tem pouco fundamento: Da Reportagem Local –
São Paulo, 13 de maio de 2005 – Folha Ciência – Reinaldo José Lopes, jornalista
“ Num determinado momento, todos os doentes

                     contaminados’ por doenças que eles

        não sabiam identificar e com aparência desprezível

   eram reunidos na praça central das cidades medievais.”




Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle
                da Hanseníase/ SP Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
A Idade Média
        trouxe à luz
      o termo ‘LEPRAE'
       que significa
 o 'chagádo', o 'pútredo',
         o 'marcado
     por uma doença‘.

             ‘LEPRAE,’
          não era então,
         só a hanseníase.

    Ela estava incluída
   nas demais doenças
consideradas contagiosas,
 ‘impuras’ e impossíveis
  de serem classificadas.
                                                                www.paginas.terra.com.br



Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
        Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
Em vários lugares da Europa,

                                                                 o doente de ‘lepra’

                                                                       tinha de usar

                                                               vestimentas especiais

                                                                 e símbolos visíveis

                                                        de sua condição de excluído.




YARA Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em
       São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
RITO DE EXCLUSÃO
                                        Um historiador suíço

       que fez um estudo dos documentos medievais desta época,

cita a existência de um rito de Exclusão em seu livro “FRANCISCUS”

                 escrito em alemão, (não traduzido para o português):


 Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
         Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
O ritual denominado
                                                                    “Separatio Leprosarium, “

                                                                    caracterizou-se por ser
                                                                  uma cerimônia semelhante
                                                                     às celebradas em favor
                                                                dos mortos no ocidente cristão.

                                                                       O bispo ou abade
                                                                      vinha paramentado,
                                                                         missal na mão,
                                                                  com as antífonas, as orações
                                                                     da missa de exéquias.

                                                                          ”Não havia missa ,
                                                                         apenas o cerimonial,
                                                                          para o qual o povo
                                                                        era convidado a assistir.

                                                              Fontes : *
   * A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ ano de 2005 – - autores: Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazar
•VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP
                                  Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
Distante...
        o bispo lia as antífonas
         da missa de exéquias,
       isto é, o rito dos mortos.


            Em seguida,
      ele chamava um acólito
   e trazia sobre um batizeiro,
     uma bandeja contendo
       um punhado de terra.


        Terra! Não água benta
          ou óleo da unção.



Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
        Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
TERRA!
         O enfermo era coberto com um véu negro,
       sendo a TERRA derramada sobre a sua cabeça,
             como representação de sua morte.

Ao término da solenidade a autoridade eclesiástica dizia:
 “Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo
   e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus.”
   Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
Após isso o Padre abençoava os sinos, as luvas
        e a caixa de esmolas que o leproso deveria carregar
        para que assim fossem reconhecidos pela sociedade.

               Então, o padre lia a lista de proibições,
        onde o leproso estava proibido de tocar os alimentos,
                     de entrar nos moinhos, etc.

 Depois desta macabra cerimônia, os leprosos eram banidos...


           fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques (apresentação).
           As doenças tem História. Editora Terramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140

Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
Outras citações
                                                            especificam cajado
                                                              com um sininho,
                                                        o qual deveria ser tocado
                                                       sempre que um ‘ser humano’
                                                              se aproximasse,
                                                           para que pudesse fugir
                                                             de sua presença,
                                                        livrar-se da contaminação.




Foto de Sebastião Salgado

           fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques(apresentação ).
            As doenças tem História. EditoraTerramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140 -
RITUAL DA EXCLUSÃO:
Sombras a vagar sem identidade, sem endereço...
A partir daí,
     as notas
  que cantariam
     a música
   de sua vida
   não seriam
  mais alegres
    e sonoras.

      Seriam
   melancólicas
como as que ecoam
  na mortificação.
Todo o ritual era feito
                                                             com a plena convicção
                                                        de que, eliminando as pestes,
                                                            as doenças contagiosas,
                                                              estavam purificando
                                                        e criando o sadio da existência
                                                               para aquele lugar.



                                                                Erradicar o doente
                                                                do convívio social,
                                                                expulsar para fora
                                                             das muralhas significava:
                                                             salvar a sociedade.


Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle
               da Hanseníase/ SP- Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
Há um tempo que começa,
 e há um tempo em que acaba.

Começa aqui a nossa passagem...
Zoica Bakirtzief
No Brasil,
                                                                               foi introduzida
                                                                                por europeus
                                                                                 e africanos

                                                                              Junto com o bacilo
                                                                                  aportou o




                                                                        e a memória mítica
                                                                  da doença, reproduzindo inclusive,
                                                                     “padrões de comportamento
                                                                          semelhantes aos
                                                                        da Europa Medieval”


“Fonte: Monteiro, Yara Nogueira, Tese de doutorado, resumo, São Paulo; 1995
Tal qual na época medieval,
    o contato aqui no Brasil
        era considerado
      contagioso, proibido.


    Isso pode ser confirmado
nos incontáveis textos bíblicos,
históricos e literários que falam
       sobre a   LEPRA

  Todos apresentam doentes
      cobertos de feridas
    e deformidades físicas,
     obrigando-os sempre
     a ficar fora dos muros
  que circundam as cidades.
LEPRA, MORFÉIA,
  MAL DE SÃO LÁZARO,
   GAFEIRA, COTENO,
      MACUTENO,
CAMUNHENGUE e OUTROS...

       são denominações
    que aludem diretamente
a uma época onde dispensava-se
      qualquer tratamento
     ao portador desse mal.

    Esses termos referem-se
   não exatamente à doença,
             mas à




       a que foram alvos
   os ‘leprosos’ no passado.
Incluindo ainda
  a associação desse mal
 ao pecado e à impureza,
     essas referências
acabaram por se perpetuar
    através dos tempos
        e deixaram...
Nas primeiras décadas de 1900,

     no Estado de São Paulo,
à semelhança dos relatos bíblicos,
    eles não podiam trabalhar
       e, sem subsistência,
     saiam a pé ou a cavalo
          para mendigar.

  Levavam uma vida nômade
       em acampamentos
      na beira das estradas
     ou periferia da cidade.

        Viviam da caridade.

       A caridade era feita a
             distância.

       Esmolas e alimentos:
A opção era por moedas
    ao invés de cédulas,
 uma vez que era mais fácil
 arremessá-las sem precisar
     se aproximar tanto.

Como medida de segurança,
  era necessário manter
uns três metros de distância.

   Havia inclusive o temor
    quanto aos ventos.

   Quando havia um grupo
 de ‘leprosos’ mendigando
      era conveniente
observar o ‘rumo dos ares’...
Assistência
 Nessa época eram ‘assistidos’
  por senhoras da sociedade.

  Prática preconizada,
       naquela época,
  para garantir o status social.

 Ou, pelo espírito de abnegação
   inerente a alguns poucos
personagens que se destacaram
    na trajetória social
     da história da doença.
Freqüentavam eventos religiosos
    O mais procurado era
 o de Pirapora do Bom Jesus,
     centro de romarias
  às margens do rio Tietê
     na Grande São Paulo.

Já na capital, tinham por hábito
     perambular pelas ruas
    Santo Antonio, Augusta,
    Consolação, assim como
     pelo Largo do Arouche
  como da Penha, Belenzinho
          e Santana...

 “alarmando suas populações
  e constituindo uma ameaça
      à saúde pública”. *


       fonte: palavras textuais de Flávio Maurano,   um dos médicos defensores do modelo isolacionista.
Nestas décadas,
   o Brasil teria um total
 de cinqüenta mil leprosos
   segundo um trabalho
  de Souza Araújo (1933)
    publicado na Revista
      Médica-Cirurgica
         do Brasil.

         De acordo
      com os estudos,
  deveriam ser internados
     76% dos doentes,
e para isso o país precisava
de um total de 43 leprosários



 Anotação manuscrita de Gustavo Capanema, deputado federal
No Real Gabinete Português de Leitura,
    no Arquivo Nacional e na Biblioteca Nacional
      foram pesquisados livros, índices, ofícios
  e fotografias sobre administração de leprosários
      e artigos sobre o tratamento da doença.

  Na Biblioteca Nacional foram encontradas duas
 referências interessantes na seção de Iconografia.

    Uma delas era o Projeto da leprosaria-modelo
 nos campos de Santo Ângelo: estado de São Paulo,
  e nele consta que o trabalho havia sido viabilizado
  pela união da Associação Protetora dos Morféticos
e da Santa Casa, com o apoio do governo de S.Paulo.

      O documento apresenta plantas internas
  e fachadas das diversas instalações, habitações
 dos internos e dos funcionários, em escala 1:100.


                                             Vicente Saul Moreira dos Santos
   Pesquisador do ILA Global Project on the History of Leprosy da International Leprosy Association, vinculado a Unit for
         the History of Medicine da Oxford University, Caixa Postal 3263, 20001-970 Rio de Janeiro — RJ Brasil,
• Em 1916 , Emílio ribas, contrário ao isolamento insular
  utilizado até então, propõe a criação de asilos-colônia,
  próximos às cidades, em zonas salubres e de recursos
  fáceis, estabelecendo o plano que serviu de base ao
  controle da hanseníase no Estado de São Paulo; os campos
  de Santo Angelo foram escolhidos para a instalação do
  primeiro hospital modelo. A inauguração do Sanatório de
  Santo Angelo em 1928 e a efetivação da legislação vigente
  por Aguiar Pupo em 1929 e 1930 precederam a criação, em
  1935, do então denominado “Departamento da Profilaxia
  da Lepra (DPL).




  *Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) –
                           Ver. Saude públ, S.Paulo – 13:281-98. 1979, página 281
No período de 1920 a 1930
                                                        quase dobra o número de doentes


                                                       Dermatologistas e infectologistas estudam a
                                                        melhor política de tratamento para impedir
                                                         que a população sadia seja contaminada.

                                                                         O Brasil opta pelo
                                                               isolamento compulsório (1921)


                                                           Para garantir a construção desse modelo
                                                               são criados dois departamentos:

                                                          1º- Departamento da Profilaxia da Lepra
                                                                (DPL) - para cuidar exclusivamente da
                                                                hanseníase (1935)*

                                                          2º- para as demais doenças.

Fonte: Monteiro, Yara Nogueira /   tese de doutorado

                                                           *Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) – Ver. Saude públ, S.Paulo –
Estado de São Paulo




Asilos   Dispensários     Preventórios
Para a manutenção do modelo profilático,
 surgiram os Asilos ou Hospitais-Colônia
         no Estado de São Paulo:




•   1928 - Santo Ângelo (Santa Casa) - Jundiapeba -
     Mogi das Cruzes - 348 alqueires - (Hosp. “Dr.
    Arnaldo Pezzuti Cavalcanti”)

•   1931 - Padre Bento – Gopouva – Guarulhos – 23
    alqueires –
      (Complexo Hospitalar “Padre Bento” )

•   1931 –Pirapitingui – Itu – 600 alqueires
     (Hospital “Dr.Francisco Ribeiro Arantes”)

•   1932 – Cocais – Casa Branca – 300 alqueires ( o 1º
    a ser desativado) –
       ( Hospital Psiquiátrico)

•   1933 – Aimorés – Bauru – 400 alqueires “ -
    ( Instituto “Lauro de Souza Lima)
• É fato que a manutenção dos abrigos e hospitais
  dos lázaros ficou por um longo período a cargo
  das ordens religiosas.


• Desde o Império, as autoridades declaravam que
  não tinham como arcar sozinhas com as
  despesas, acionando entidades particulares na
  manutenção e criação de abrigos.


•    Este foi o caso, por exemplo, dos abrigos para
    crianças pobres e abandonadas (que tinham
    família mas estavam pelo menos em tese, sob a
    responsabilidade do Juizado de Órfãos).


• Essa prática perdurou por mais tempo, pois o
  próprio ministro Capanema determinou que a
  construção, manutenção e administração dos
  preventórios que cuidavam e recebiam as
  crianças filhas de leprosos ficariam a cargo de
  entidades     particulares,    principalmente   da
  Federação das Sociedades de Assistência aos
  Lázaros e Defesa contra a Lepra
http://www.leprosyhistory.org,http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000400019&lng=pt&nrm=iso
Com a internação compulsória a
         assistência passa a ser de responsabilidade
         das Caixas Beneficentes dos Asilos-Colônia,
com o intuito, inclusive, de tirá-la das mãos das beneméritas
       senhoras da sociedade, as quais discordavam
       da política isolacionista adotada pelo governo.

            Fonte: Monteiro, Yara Nogueira /   tese de doutorado
Chaulmoogra               A utilização dos óleos chalmúgricos
única alternativa de ‘tratamento’   na antiga farmacopéia hindu e
                                    chinesa era preconizada para
                                    doenças de pele, especialmente
                                    para a hanseníase.

                                    Seu uso na medicina ayurveda, na
                                    Índia, remonta há mais de 2.000
                                    anos e é relacionado à lenda que
                                    conta a cura da hanseníase do
                                    príncipe Rama (de Benares) e da
                                    princesa Piya pelos frutos da árvore
                                    kalav.



                                    Foi o primeiro tratamento no Brasil
                                         e extremamente doloroso.
tinha poder absoluto,
até para capturar fugitivos
     e novos doentes
 com guardas sanitários,
    muitos dos quais,
    munidos de armas.

 Os então asilos-colônia
     tinham muros,
    cerca de arames,
   portões trancados
 e vigilância constante.
Política Policialesca

   • O Estado adotava uma política
        de saúde policialesca,
    com o isolamento compulsório
       reforçando o estigma.




           • Os filhos sadios
  eram separados institucionalmente
   dos pais, perdendo desta forma
o contato com o mundo exterior
              e a sua identidade como
                cidadãos.
O importante para os idealizadores
                                                         da Campanha de Combate à Lepra
                                                             era que o mundo dos “sãos”
                                                         estava a salvo, livre do contágio,
                                                          livre das deformidades temidas,
                                                                da ameaça aos nobres
                                                                traços do ser humano,
                                                        da incapacidade para o trabalho...

                                                            Assim eles se expressavam
                                                          nos jornais da época em relação
                                                           aos filhos sadios dos enfermos:



                                                               “O filho do lázaro,
                                                         que hoje brinca despreocupado
                                                    ao lado do teu filho, talvez traga consigo
                                                            o germe do mal terrível.

                                                    Trabalha, pois, em prol do “Preventório”,
                                                    a fim de resguardar dos perigos da lepra
                                                           aqueles que te são caros .”



                                                                  Diário de Tarde. Florianópolis, 08/12/1936,
                                                                              ano II, nº. 413, p. 4.
Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política 6, 1/2005, pp. 45-57.
                 - A lepra no Brasil: representações e práticas de poder
Há bem pouco nasceste e já te vais...
 Nem eu nem tua mãe te deu um beijo
 Como é triste o destino que praguejo:
Ter um filho e vê-lo órfão tendo os pais.



 Não nos verás... não te veremos mais
   E na dor não verá o teu gracejo
  Quem te esperava no maior festejo
 Entre alegrias que se tornam ais (...)




         moço poeta,Leprosário do Amazonas, Vila
    Belisário Pena, escreveu por ocasião em que seu
     filho foi levado para o Preventário de Manaus,
                logo após o seu nascimento


                                                      Fonte: Revista de Combate à Lepra, Ano VII, março de 1942, p.42
“Talvez estivéssemos ou quem sabe...
ainda estejamos a milhas luz do amor...“
*   fotógrafo, em Marrocos, Floresta de cedros de IFRAME - Azrou
“Neste período,

   todo e qualquer

pensamento divergente,

  era absolutamente

     silenciado.”
O número de doentes
     era considerado
cada vez mais apavorante.

São Paulo passou a exercer
    a prática de internar
     todos os doentes,
   mesmo os de forma
     não contagiantes.

     Distinguiu-se dos
      demais Estados
  que apenas internavam
 os portadores da doença
   de forma multibacilar
      (ou contagiante),
    como por exemplo,
o Estado do Rio de Janeiro
        que tratavam
      os demais casos
     em ambulatórios.
• Recolhimento maciço
dos doentes e/ou suspeitos.



• A ‘caça’ era levada a efeito
       com a utilização
 de ambulâncias e guardas,
instalando-se um verdadeiro
  terror dentre a população
  marcada por esse destino.
A partir de 193 0 ,
   o número de doentes
      foi considerado
 cada vez mais apavorante.

São Paulo passou a exercer
 a prática de internar todos
         os doentes,
    mesmo os de forma
     não contagiantes.

     Distinguiu-se dos
      demais Estados
  que apenas internavam
 os portadores da doença
   de forma multibacilar
      (ou contagiante),
    como por exemplo,
o Estado do Rio de Janeiro
        que tratavam
      os demais casos
     em ambulatórios.
• Recolhimento maciço
dos doentes e/ou suspeitos.



• A ‘caça’ era levada a efeito
       com a utilização
 de ambulâncias e guardas,
instalando-se um verdadeiro
  terror dentre a população
  marcada por esse destino.
Reportagem
                            -João Guimarães Rosa-

           O trem estacou, na manhã fria,
       num lugar deserto, sem casa de estação:
              a parada do Leprosário...

         Um homem saltou, sem despedidas,
             deixou o baú à beira da linha,
         e foi andando. Ninguém lhe acenou...

        Todos os passageiros olharam ao redor,
        com medo de que o homem que saltara
            tivesse viajado ao lado deles...

        Gravado no dorso do bauzinho humilde,
         não havia nome ou etiqueta de hotel:
só uma estampa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro...

              O trem se pôs logo em marcha apressada,
             e no apito rouco da locomotiva
       gritava o impudor de uma nota de alívio...

             Eu quis chamar o homem,
              para lhe dar um sorriso,
      mas ele ia já longe, sem se voltar nunca,
como quem não tem frente, como quem só tem costas...
Moradores do antigo Sanatório Padre Bento, em Guarulhos (SP), onde pessoas com hanseníase eram confinadas.
                  A foto foi tirada de uma revista editada pelos próprios moradores do local


                                                                            Revista Padre Bento / Divulgação
Fuga ou refúgio

    Alguns que possuíam
   uma situação privilegiada
 passaram a viver escondidos
em casa pela família
         ou tentaram ir
     para outros Estados
    como o Rio de Janeiro
  que não adotava a mesma
    política de tratamento.

      Alguns partiram
    para outros países.

         Obviamente,
 tratava-se de uma minoria.
1940 – “Naquela época era o Dr. G. Fez
                                                                     exame, tudo, fez exame. Aí foram embora e
                                                                     depois de muito tempo ainda voltou já com a
                                                                     ambulância para pegar nós. Foram lá colher
                                                                     material, tudo, não é? (...) A ambulância era
                                                                     fechada, tipo de uma melancia: tipo de uma
                                                                     melancia só com uma venezianazinha assim
                                                                     do lado, só. Tudo fechado. Para não sair,
                                                                     decerto (...).

                                                                        Aquela coisa da doença! A doença era um
                                                                     bicho! (...)

                                                                         Tinham avisado:

                                                                      – Nós vamos buscar vocês tal dia! (...)
                                                                      – Sim, mas nós vamos levar nossas coisas!
                                                                          – Não, não! Como vocês estão vocês
                                                                     embarcam no carro!
                                                                      – Não! Mas tem que levar roupa!
                                                                      – Não leve nada daí!

                                                                        Aí meu pai ainda pegou o documento da
                                                                     casa e guardou, não é? Guardou no bolso.

                                                                       Foi só o que aproveitou. O resto foi botado
                                                                     fogo na casa. Queimaram, não é? (...).”
                                                                                 Depoimento oral concedido pelo egresso G. B.,
Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política       em 22 de janeiro de 2002, internado compulsoriamente no
6, 1/2005, pp. 45-57. “A lepra no Brasil: representações e práticas de       o Hospital Colônia Santa Teresa em dezembro de 1940
poder”
1941
O Serviço Nacional da Lepra     ,
    passa a dar as diretrizes
para o controle da doença no país.
Completava-se o modelo isolacionista,
   no qual o doente ‘caçado’ sabia :

              • que ao entrar no asilo-colônia estaria
                sendo arrebatado da família, amigos,
                  casa, escola, trabalho, passado e
                   qualquer projeto para o futuro;

               • que da noite para o dia seria banido
                  de seus direitos como cidadão
                       e tão somente a cura
                  (na ocasião vista praticamente
                 como algo remoto e improvável ),
                       poderia transportá-lo
                       novamente à liberdade;

                 • que passaria a ser considerado
                  como um morto para a sociedade
                          – morto civil -
Hoje, a “hanseníase que tem cura”
                    encurtou distâncias físicas,
         mas ainda há grandes distâncias a serem vencidas.

Fonte: http://www.morhan.org.br/det_noticias.cfm?id_noticia=70
Marcos ReY (1925-1999)
           “Aos 16 anos, em 1941,
Edmundo Nonato foi ‘alcançado’ pela política
   de internação compulsória que existiu
  no Brasil até 1967 e passou os melhores
  anos da sua adolescência confinado em
        asilos-colônia que, na época,
      eram chamados de "leprosários",
      mas na prática eram campos de
          concentração sanitários.

   Quatro anos depois, Edmundo Nonato
     fugiu - sim, fugiu - e se refugiou
       no Rio de Janeiro, por medo
    de retornar ao confinamento.(...)”

  “Marcos Rey, escritor, cronista, roteirista
 de cinema e autor de obras infanto-juvenis
        era o pseudônimo do cidadão
          Edmundo Nonato.”
                                                         Artigo sobre biografia de Marcos Rey,
                                                escrita por Carlos Maranhão - revista Veja (1/07/2004)
As seqüelas da hanseníase
  não impediram que Edmundo Nonato
         se tornasse Marcos Rey,
 escritor, cronista, roteirista de cinema
    e autor de obras infanto-juvenis.

  Suas mãos parcialmente imobilizadas
        não o impediram de ser
        um exímio datilógrafo.

       O sofrimento da juventude
      não tirou dele o humor ferino,
           o gosto pelas farras,
      pela companhia dos amigos.

 Mas até sua morte, em 1999, de câncer,
    Marcos Rey manteve em segredo
      o fato de ter sido um paciente
              de hanseníase.

  Só compartilhou esse segredo com os
parentes mais próximos e com sua esposa.
Bacurau
 Bacurau", nascido em Manicoré – AM,
      em 9 de dezembro de 1939,
contraiu hanseníase aos 6 anos de idade.

     Em razão do preconceito,
  jamais foi aceito em alguma escola.

Autodidata tornou-se professor primário
  da Secretaria de Educação do Acre.

    Francisco Augusto Vieira Nunes,
            o "Bacurau",

    fundou em 6 de julho de 1981,
   o Movimento de Reintegração das
  Pessoas Atingidas pela Hanseníase



           - MORHAN -
  (Organização Não Governamental).
A sina de Leopoldo Cunha
“Foram tantas
        as histórias contadas,
quanto as vidas que ficaram caladas...”
Um
      ...à mercê de mentes
que se consideravam poderosas
e superiores ao homem comum,
passível de contrair uma doença
       como a hanseníase.

   Um objeto,
sujeito a viver à margem da vida
      às custas da caridade.


     Um sujeito-objeto...
Advento da Sulfona

      1942


    esperança
de um novo tempo
No entanto, a realidade permanece no isolamento.
Década de 60:

• Os asilos-colônia passam a ser
   denominados de Sanatórios .


• O profissional assistente social
       é admitido no DPL,
     mas prevalece ainda
   a prática assistencialista.


     • Ênfase no trabalho de
        educação sanitária
através de um grupo profissional:
      enfermeiro, educador
        e assistente social
Constatações da ineficácia
               da política adotada :



-   cadeia de transmissão
    não interrompida

- desagregação familiar

- perda do vinculo empregatício

- perda da auto-estima

-   perda da esperança
    de um futuro...
Advento
 da Clofazimina

       1962


Novas perspectivas
para o tratamento
Final do período
 da Internação
compulsória no
      Brasil
    - 1962 -
               
 • Reforma da estrutura
da Secretaria da Saúde/SP

        • Ênfase
ao tratamento ambulatorial

    • concretização
 da abertura dos portões
     dos Sanatórios
 no Estado de São Paulo –
          1967
A grande maioria dos doentes
        deixa o sanatório
praticamente da mesma maneira
que entrou: ‘compulsoriamente’.
“Como se pudesse
 rasgar o papel
   do passado
 e se apresentar
  ao presente”.
1970 - Prof. Dr. Abrahão Rotberg –
com o intuito de minimizar o estigma,
    propõe uma nova terminologia,
   substituindo a infamante palavra
‘lepra’ por HANSENÍASE e derivados.


    Uma homenagem ao médico
      e botânico norueguês
  Gerhard Henrik Armauer Hansen
       (Bergen 1841 - 1912)
  que em 1874 descobriu (isolou)
     o Mycobacterium Leprae –
“Nesse período dois Congressos Brasileiros de Higiene (1968
e 1970) concordaram com o novo nome para substituir
“lepra”,” por ser vantajoso para a educação sanitária do
ponto de vista psicológico, facilitando as medidas
preventivas e aliviando o estigma.

Conseqüentemente três serviços estaduais de saúde, as
cadeiras de dermatologia e muitas de neurologia e medicina
preventiva de 27 escolas médicas do Brasil passaram a
adotar a fórmula educativa “hanseníase”, antigamente
“lepra”,   objetivando   a    eliminação   gradativa    do
estigmatizante termo “lepra”.**
• 1976 - decreto-lei

   Dr. Paulo de Almeida
Machado – Ministro da Saúde,
  determina que todos os
   documentos oficiais
  mudem a terminologia
        de “lepra”
    para Hanseníase
        e derivados,
   como “lepromatosa”
   para Wirchowiana”,etc.
Advento da Rifampicina
          1976
concretização da CURA
Nova nomenclatura
     Trouxe vantagens sociais,
contudo, trabalhar com Hanseníase
    não descarta a possibilidade
          de nos deparamos
  com situações constrangedoras.
     Fantasmas ainda se fazem
        presentes assustando
      e marginalizando doentes
 e familiares, criando preconceitos
        e chamando a atenção
       não para a Hanseníase,
     uma doença que tem cura,
        mas para uma doença
 carregada de imagens negativas
     associadas à palavra ‘LEPRA’
• Nenhum resultado positivo pode advir
da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir
  ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas
 de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima
            ao significado pejorativo da palavra lepra.

       • Assim, a responsabilidade dos profissionais
 de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada
      apenas no compromisso regulamentado por lei
           e sim, numa causa muito mais antiga:
              o respeito à pessoa humana.
• Nenhum resultado positivo pode advir
da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir
  ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas
 de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima
            ao significado pejorativo da palavra lepra.

       • Assim, a responsabilidade dos profissionais
 de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada
      apenas no compromisso regulamentado por lei
           e sim, numa causa muito mais antiga:
              o respeito à pessoa humana.
1995 - 29 de março
( Lei nº 9.010 – DO Brasília – DF)

             No Brasil,
      a nova nomenclatura
     para eliminar o estigma
        que acompanhava
  a palavra lepra e aos doentes,
torna-se oficial na administração
  pública por lei, assinada pelo
 presidente Fernando Henrique
Cardoso e pelo então Ministro de
     Saúde Prof. Adib Jatene.
-      Esquema terapêutico


                                                                                    POLIQUIMIOTERAPIA
                                                                                           (PQT)
                                                                                               Recomendado pela OMS,
                                                                                                    em 1982.

                                                                                                 No Brasil, oficialmente
                                                                                                  pelo Ministério de Saúde,
                                                                                                       em 1989

                                                                                  O esquema foi considerado eficaz,
                                                                                     tendo resolvido o problema da
                                                                                   resistência secundária à dapsona,
                                                                                    reduzido o tempo de tratamento
                                                                                  e aumentado a adesão de pacientes.

   Fonte: Marcelo Grossi Araújo Professor Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG)
PQT
   Perspectiva de cura rápida,
  elemento facilitador para as
intervenções sociais necessárias
     e concepção do doente
       como ser integral.


        Desmistificação
     do risco de contágio
    e idéia de isolamento,
         minimizando
   os efeitos devastadores
  que acompanham há séculos:
          o estigma,
       a discriminação
       e o preconceito.
A HANSENÍASE tem CURA e a pessoa por ela atingida tem um rosto.
No entanto, não pode ser desconsiderado o fato de que é uma doença
  com inúmeras interfaces, razão pela qual exige atenção integral.

   Atenção integral, ou melhor, ações diversificadas e integradas,
  como estratégia, para oportunizar à pessoa, melhor aceitação do
   diagnóstico, envolvimento e compromisso quanto ao tratamento
             e, principalmente...   credibilidade na cura.
AÇÃO INTEGRAL


     (...) O girassol
   se volta para o sol
    onde ele estiver.

  Mesmo que o sol esteja
 escondido pelas nuvens,
     lá está o girassol
        dando costas
       à obscuridade
        das sombras
        e buscando,
   convicto e decidido,
  estar sempre de frente
para o sol. (...)


                           “Códigos da Vida”, de Legrand, editora Soler editora
É assim com a
       hanseníase:

    O lado oculto da ‘mancha’
mesmo desaparecida através da cura,
    pode ainda deixar rastros ...

   Como a moeda, tem dois lados:
   quando um lado está exposto,
       o outro está oculto.

Por detrás da doença está o homem
      que carrega no oculto
         a sua dor moral .

      Nem sempre, sozinho,
consegue virar-se em direção ao sol.

       Hanseníase
      é muito mais
     que uma mancha!
A PQT trouxe em seu bojo:


    • a premissa do cuidado
  multidisciplinar com o paciente;

    • o estreitamento do vínculo
     do paciente com o serviço,
   melhorando os níveis de adesão
   ao tratamento e possibilitando
diagnósticos precoces e intervenções
       nos estados reacionais;

 • o trabalho contínuo na educação
e prevenção de incapacidades físicas.




                 Marcelo Grossi Araújo - professor Assistente da Faculdade de Medicina
             da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG)
                      http://www.anaisdedermatologia.org.br/artigo.php?artigo_id=30
Foto: Sebastião Salgado




   “Cuidar do Ser é prestar atenção ao sopro que o anima.”

                                                  Yves Leloup
Se estivermos dispostos a olhar, escutar, sentir e tatear
    o que está ao redor em nosso campo de rotina;
  se conseguirmos desenvolver uma ação compatível
        com aquilo que escolhemos fazer na vida,
          teremos a oportunidade de constatar:
             que nada é impossível de mudar!
Quantos espelhos a natureza nos oferece ?

  Quantas oportunidades a vida nos dá ?
                                            HNM
Quem não aprecia as borboletas ?
“Para
    amar
     uma
 borboleta
  também
precisamos
 gostar de
  algumas
 lagartas.”



Antoine de Saint-Exupéry
Como disse no início, eu sou a Hanseníase
                                e, por anos e anos... fui vista
                               como uma lagarta que arrastou
                                a infelicidade pelo mundo e,
                                   como se não bastasse,
                                   ainda fui enclausurada
                            num casulo sem portas, nem janelas...


                            Contudo, se vocês tiverem paciência


              a da            e se dispuserem a cuidar de mim,



  O   b rig                    talvez eu possa me transformar
                                    numa linda borboleta,
                              voar com minhas próprias asas,
Heleida Nobrega Metello             e ter a ‘vida’ de volta.

    2 de julho de 2008
São Paulo/2008
                                      C   réditos:
                                 Heleida Nobrega Metello




                 D   ivisão Técnica
        de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
"Caminho nestas praias entre a areia e a espuma.
A maré alta apagará as marcas dos meus pés e o vento dissipará a espuma,
            mas o mar e a praia permanecerão para sempre."
                               Khalil Gibran

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Hanseníase

  • 2. Fios que tecem infinitas Histórias
  • 3. São Paulo/2008 C réditos: Heleida Nobrega Metello D ivisão Técnica de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
  • 4. No ano de 2006 fez 800 anos que São Francisco abraçou o leproso. Este abraço mudou sua vida. Dia 20 de janeiro de 2006
  • 5. Desde então, a partir de 2006, os franciscanos iniciaram uma campanha estadual (SP) que está se estendendo ao resto do país para ajudar na Eliminação da Hanseníase.
  • 6. Mesmo que há 129 anos o agente causador tenha sido descoberto, até hoje a hanseníase é vista com um ar de mistério, uma vez que para muitos não é clara a explicação e o entendimento de como se dá a sua disseminação, o seu contágio. Eis porque devemos levar em conta a complexidade que o tema traz para o paciente e/ou família em que muitas vezes sequer conseguem pronunciar a palavra H A N S E N Í A S E corretamente. Fonte: tese de doutorado de Zoika Bakirtzief (1994). Fonte:http://www.paho.org/images/AD/DPC/CD/familia1.jpg
  • 7. Ora, não estamos aqui justamente porque escolhemos o homem como princípio, meio e fim no nosso campo de vida profissional?
  • 8. Então voltemos ao passado, à origem da palavra HOMEM, até para confirmar o dito de Guimarães Rosa: “Toda língua são rastros de velho mistério", ou melhor: a essência das coisas e a ligação que tudo tem com um passado remoto... que as palavras, inclusive, são rastros de velho mistério.
  • 9.
  • 10. Perseguir as pistas que o passado deixou nas palavras é uma das melhores formas de reencontrar nossas heranças e fazer um exercício de reflexão sobre quem somos, homo sapiens e homo loquens*,seres que concretizam na linguagem o seu saber. Saber lembra sabor, dois conceitos etimologicamente vinculados. O ser humano que saboreia a realidade é mais sábio, é mais humano. E ser humano é ser aquele que sabe ter nascido do húmus, da terra. Fonte: PALAVRA PUXA PALAVRA: À LUZ DA ETIMOLOGIA - II / Gabriel Perissé •O homo sapiens tornar-se-ia no homo loquens, inventando uma linguagem para exteriorizar as suas necessidades,as suas ideias e os seus desejos, diferenciando-se dos animais pela utilização de um sistema de comunicação progressivo e aberto que pode transmitir-se e enriquecer-se de geração em geração
  • 11. Nesse palavra-puxa-palavra, o ser humano descobre que é mais humano quando pratica a humildade, virtude que nada tem de rebaixamento, mas que significa a qualidade de quem emerge do húmus, do barro, e mantém os pés no chão. Geologicamente o húmus é a parte mais fértil da terra. Assim, a humildade é para nossa vida uma graça de fertilidade Fonte: http://ointercessor.blogspot.com/ que faz brotar a vida nova.
  • 12. Então... se uma palavra puxa a outra e, se escolhemos o homem como foco de atenção na nossa vida profissional, obviamente temos por obrigação incorporar o exercício da humildade em nosso cotidiano, para que possamos também ver o ‘outro’ no Programa de Hanseníase, desprendidos de nós mesmos. Só assim conseguiremos vê-lo no contexto global. Só assim, poderemos perceber o quanto essa doença se esconde por detrás de uma mancha insensível.
  • 13.
  • 14. É algo relativo ao passado e futuro, como bem dizia Alberto Caieiro E hoje, estamos aqui justamente para falar do passado, uma vez que cabe a nós, um futuro promissor, principalmente no que se refere ao fazemos o que nos cabe fazer como profissional de saúde.
  • 15. Uma oportunidade para que possamos pensar, trocar e somar a diversidade e complexidade do olhar, da escuta e do tato que o trabalho junto ao Programa de Hanseníase exige de cada um de nós.
  • 16.
  • 17. Houve um tempo, um tempo longo demais, e com certeza, não é esse que vocês vivem agora, que eu , a HANSENÍASE, era denominada de LEPRA. Vale dizer que esse tempo que durou séculos e séculos... sequer poderia pensar em olhar nos olhos de cada um, como faço hoje, mesmo que, por vezes, timidamente. É desse tempo que vou falar para vocês:
  • 18. É muito difícil afirmar a época do aparecimento de uma doença com base em textos antigos, por dados fragmentados e suposições de tradutores dos mesmos, o assunto se torna confuso e gera uma série de falsas interpretações. Esse é o caso da Hanseníase, muito já se escreveu sobre sua origem e existência, por outro lado, muitos desses escritos são citações de fontes descrevendo a moléstia sem os seus aspectos peculiares. Apesar disso, há referências bastante claras com relação à Hanseníase em livros muito antigos. Ao que parece, essa doença já era conhecida na Índia em 1500 a.C., e no Regveda Samhita ( um dos primeiros livros sagrados da Índia ), a Hanseníase é denominada de KUSHTA. Contudo, na China, referências muito antigas sobre essa doença, como aquela que é feita em um dos tratados médicos chineses mais antigos, o Nei Ching Su Wen ,dão conta de descrições compatíveis com pacientes portadores de Hanseníase, por volta de 2600 A.C . http://www.geocities.com/hanseniase/Historico/historico.html
  • 19. Num estudo sobre a etimologia da palavra lepra, Abraão Rotberg, médico responsável pela mudança do nome lepra para hanseníase no Brasil, afirma que os significados de cunho degradante imputados ao termo têm sua origem no século III a.C., quando 70 judeus, traduzindo a Torá, os Neviim e os Ketuvin para o grego, que mais tarde viriam a se transformar na Bíblia, denominaram o Tsara’ath hebraico, que abrangeu um conjunto de enfermidades de ‘caráter visual semelhante’.
  • 20. Com base nessa ‘aparência’ deu-se início ao processo de segregação dos ‘enfermos de lepra‘. Isso ocorreu durante a Idade Média e inspirada no terceiro livro de Moisés, datado em cerca de 1445 a.C. O LEVÍTICO (que lida com assuntos relacionados à pureza, santidade, etc... na vida cotidiana) Fonte: Curi, Luciano Marcos, “Defender os sãos e consolar os lázaros”: Lepra e isolamento no Brasil 1935 a 1976
  • 21. A Bíblia acabou se transformando numa fonte de confusão quanto à existência da Hanseníase entre os judeus na época do êxodo, uma vez que esse termo “tsaraath”, no hebraico, significava uma condição anormal da pele dos indivíduos,das roupas, ou das casas, que necessitava de purificação. Segundo o Livro Sagrado, o “tsaraath” na pele dos judeus seriam “manchas brancas deprimidas em que os pelos também se tornavam brancos”. Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
  • 22. Na tradução grega, a palavra “tsaraath” foi traduzida como lepra e “lepros”em grego, significa “algo que descama”. A palavra lepra também foi usada pelos gregos para designar doenças escamosas do tipo da Psoríase. A Hanseníase mesmo, eles chamavam de Elefantíase. Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
  • 23.
  • 24.
  • 25. Os ‘leprosos’ sempre figuraram na lista dos que carregavam o Talvez sejam os mais antigos alvos desta incessante ‘reclassificação social’.
  • 26. O termo ESTIGMA vem desde a Antiguidade: na Grécia Antiga, era a marca que identificava os traidores. “Os gregos criaram o termo estigma para se referirem a sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentava.” (Goffman, 1978, p. 11). Em Roma, era utilizada para diferenciar as pessoas de baixa qualidade social. Fonte: Prof. Carlos Roberto Bacilo, Ciências Penais/UFPR /discriminaçãohttp://www.unb.br/acs/unbagencia/ag0503-17.htm
  • 27.
  • 28. O estigma, uma vez fixado em uma cultura, permanece incorporado aos sentimentos e modos de pensar de um grupo, mesmo quando a condição que o gerou deixou de existir. [...] E, mesmo quando os 'outros' não percebem os sinais da lepra, o ‘leproso’, sabedor de sua condição de portador de um atributo estigmatizante, assume essa condição. (Ornellas, 1997, p. 62) Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
  • 29.
  • 30. Em relação ao medo da rejeição – manifestado pelo desejo de se isolar e sumir – e da solidão, vários entrevistados de Oliveira (1990) se revelaram indignos de poder viver com outras pessoas, revelando o seu próprio preconceito quanto à doença. (Oliveira, 1990) Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
  • 31. Resumindo Goffman refere que ‘por definição’, acreditamos que alguém com um estigma são seja completamente humano. Com base nisso, não é raro fazermos discriminações, através das quais efetivamente, e sem pensar, acabamos reduzindo suas chances de vida (...)” (Goffman, Erving. Op. Cit.;p.11.)
  • 32. Segundo a historiadora Yara Nogueira, um dos principais responsáveis pela criação do estigma que cerca a hanseníase é a Bíblia, "A postura estabelecida acerca da ‘lepra’ teve tal influência que acabou por extrapolar seu tempo, chegando até a época atual. Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1995, 492p.
  • 33.
  • 34. “Eterno é tudo aquilo que vive uma fração de segundos, mas com tamanha intensidade, que se petrifica e nenhuma força o resgata" (Carlos Drummond)
  • 35. Corpos calcinados, recobertos por cinzas durante séculos... (foto de autor no Flickr) http://interata.squarespace.com/jornal-de-viagem/?currentPage=2
  • 36. Fonte: pesquisadores do Instituto Pasteur (França) entrevista de Reinaldo José Lopes Folha de São Paulo, maio de 2005 - (www.sciencemag.org),
  • 37. O momento em que ocorreu a primeira infecção ainda não pode ser estimado com exatidão: algo entre 5.000 e 50 mil anos atrás, dizem os pesquisadores. 250px-M_leprae_ziehl_nielsen2 fonte: pesquisadores franceses, Instituto Pasteur, entrevista à Folha de São Paulo, maio de 2005
  • 38. A ‘LEPRA’, apontada como uma das doenças mais antigas da humanidade, desde os tempos bíblicos, aterrorizou reis, mendigos, plebeus, imperadores e populações inteiras nos quatro cantos do mundo. Independentemente da época e da região geográfica, foi sempre associada ao pecado, à imundície e ao castigo dos deuses, e os doentes, submetidos às mais cruéis formas de isolamento, execração e até de extermínio. Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
  • 39. “A ‘morte’ antes da morte, como os antigos egípcios denominavam.” fonte: John Farrow, no livro “Damião, o leproso” - (biografia romanceada, lançada em 1937)
  • 40. Balduíno IV (1161-1185), o rei cristão de Jerusalém, retratado no filme "Cruzadas", ficou marcado pela doença desde a infância e sua morte chegou a desestabilizar o reino cruzado na Palestina. Da Reportagem LOCAL São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 2005 - – Folha Ciência- (Reinaldo José Lopes, jornalista da Folha de São Paulo, maio de 2005)
  • 41. Segundo Dr. Marcos Virmond (diretor do Instituto “Dr. Lauro de Souza Lima” – Bauru) é uma fama injustificada: "Graças aos defeitos do genoma, é muito difícil acontecer a infecção." É preciso viver em condições precárias e apertadas, perto de muitas pessoas com alta carga da bactéria no corpo. São condições comuns nas metrópoles do mundo antigo e no Terceiro Mundo. Estigma do mal na história tem pouco fundamento: Da Reportagem Local – São Paulo, 13 de maio de 2005 – Folha Ciência – Reinaldo José Lopes, jornalista
  • 42.
  • 43. “ Num determinado momento, todos os doentes contaminados’ por doenças que eles não sabiam identificar e com aparência desprezível eram reunidos na praça central das cidades medievais.” Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 44. A Idade Média trouxe à luz o termo ‘LEPRAE' que significa o 'chagádo', o 'pútredo', o 'marcado por uma doença‘. ‘LEPRAE,’ não era então, só a hanseníase. Ela estava incluída nas demais doenças consideradas contagiosas, ‘impuras’ e impossíveis de serem classificadas. www.paginas.terra.com.br Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 45. Em vários lugares da Europa, o doente de ‘lepra’ tinha de usar vestimentas especiais e símbolos visíveis de sua condição de excluído. YARA Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
  • 46. RITO DE EXCLUSÃO Um historiador suíço que fez um estudo dos documentos medievais desta época, cita a existência de um rito de Exclusão em seu livro “FRANCISCUS” escrito em alemão, (não traduzido para o português): Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 47. O ritual denominado “Separatio Leprosarium, “ caracterizou-se por ser uma cerimônia semelhante às celebradas em favor dos mortos no ocidente cristão. O bispo ou abade vinha paramentado, missal na mão, com as antífonas, as orações da missa de exéquias. ”Não havia missa , apenas o cerimonial, para o qual o povo era convidado a assistir. Fontes : * * A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ ano de 2005 – - autores: Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazar •VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 48. Distante... o bispo lia as antífonas da missa de exéquias, isto é, o rito dos mortos. Em seguida, ele chamava um acólito e trazia sobre um batizeiro, uma bandeja contendo um punhado de terra. Terra! Não água benta ou óleo da unção. Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 49. TERRA! O enfermo era coberto com um véu negro, sendo a TERRA derramada sobre a sua cabeça, como representação de sua morte. Ao término da solenidade a autoridade eclesiástica dizia: “Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus.” Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
  • 50. Após isso o Padre abençoava os sinos, as luvas e a caixa de esmolas que o leproso deveria carregar para que assim fossem reconhecidos pela sociedade. Então, o padre lia a lista de proibições, onde o leproso estava proibido de tocar os alimentos, de entrar nos moinhos, etc. Depois desta macabra cerimônia, os leprosos eram banidos... fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques (apresentação). As doenças tem História. Editora Terramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140 Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
  • 51.
  • 52. Outras citações especificam cajado com um sininho, o qual deveria ser tocado sempre que um ‘ser humano’ se aproximasse, para que pudesse fugir de sua presença, livrar-se da contaminação. Foto de Sebastião Salgado fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques(apresentação ). As doenças tem História. EditoraTerramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140 -
  • 53. RITUAL DA EXCLUSÃO: Sombras a vagar sem identidade, sem endereço...
  • 54. A partir daí, as notas que cantariam a música de sua vida não seriam mais alegres e sonoras. Seriam melancólicas como as que ecoam na mortificação.
  • 55.
  • 56. Todo o ritual era feito com a plena convicção de que, eliminando as pestes, as doenças contagiosas, estavam purificando e criando o sadio da existência para aquele lugar. Erradicar o doente do convívio social, expulsar para fora das muralhas significava: salvar a sociedade. Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP- Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
  • 57.
  • 58. Há um tempo que começa, e há um tempo em que acaba. Começa aqui a nossa passagem...
  • 60.
  • 61. No Brasil, foi introduzida por europeus e africanos Junto com o bacilo aportou o e a memória mítica da doença, reproduzindo inclusive, “padrões de comportamento semelhantes aos da Europa Medieval” “Fonte: Monteiro, Yara Nogueira, Tese de doutorado, resumo, São Paulo; 1995
  • 62. Tal qual na época medieval, o contato aqui no Brasil era considerado contagioso, proibido. Isso pode ser confirmado nos incontáveis textos bíblicos, históricos e literários que falam sobre a LEPRA Todos apresentam doentes cobertos de feridas e deformidades físicas, obrigando-os sempre a ficar fora dos muros que circundam as cidades.
  • 63. LEPRA, MORFÉIA, MAL DE SÃO LÁZARO, GAFEIRA, COTENO, MACUTENO, CAMUNHENGUE e OUTROS... são denominações que aludem diretamente a uma época onde dispensava-se qualquer tratamento ao portador desse mal. Esses termos referem-se não exatamente à doença, mas à a que foram alvos os ‘leprosos’ no passado.
  • 64. Incluindo ainda a associação desse mal ao pecado e à impureza, essas referências acabaram por se perpetuar através dos tempos e deixaram...
  • 65.
  • 66.
  • 67. Nas primeiras décadas de 1900, no Estado de São Paulo, à semelhança dos relatos bíblicos, eles não podiam trabalhar e, sem subsistência, saiam a pé ou a cavalo para mendigar. Levavam uma vida nômade em acampamentos na beira das estradas ou periferia da cidade. Viviam da caridade. A caridade era feita a distância. Esmolas e alimentos:
  • 68. A opção era por moedas ao invés de cédulas, uma vez que era mais fácil arremessá-las sem precisar se aproximar tanto. Como medida de segurança, era necessário manter uns três metros de distância. Havia inclusive o temor quanto aos ventos. Quando havia um grupo de ‘leprosos’ mendigando era conveniente observar o ‘rumo dos ares’...
  • 69. Assistência Nessa época eram ‘assistidos’ por senhoras da sociedade. Prática preconizada, naquela época, para garantir o status social. Ou, pelo espírito de abnegação inerente a alguns poucos personagens que se destacaram na trajetória social da história da doença.
  • 70. Freqüentavam eventos religiosos O mais procurado era o de Pirapora do Bom Jesus, centro de romarias às margens do rio Tietê na Grande São Paulo. Já na capital, tinham por hábito perambular pelas ruas Santo Antonio, Augusta, Consolação, assim como pelo Largo do Arouche como da Penha, Belenzinho e Santana... “alarmando suas populações e constituindo uma ameaça à saúde pública”. * fonte: palavras textuais de Flávio Maurano, um dos médicos defensores do modelo isolacionista.
  • 71. Nestas décadas, o Brasil teria um total de cinqüenta mil leprosos segundo um trabalho de Souza Araújo (1933) publicado na Revista Médica-Cirurgica do Brasil. De acordo com os estudos, deveriam ser internados 76% dos doentes, e para isso o país precisava de um total de 43 leprosários Anotação manuscrita de Gustavo Capanema, deputado federal
  • 72. No Real Gabinete Português de Leitura, no Arquivo Nacional e na Biblioteca Nacional foram pesquisados livros, índices, ofícios e fotografias sobre administração de leprosários e artigos sobre o tratamento da doença. Na Biblioteca Nacional foram encontradas duas referências interessantes na seção de Iconografia. Uma delas era o Projeto da leprosaria-modelo nos campos de Santo Ângelo: estado de São Paulo, e nele consta que o trabalho havia sido viabilizado pela união da Associação Protetora dos Morféticos e da Santa Casa, com o apoio do governo de S.Paulo. O documento apresenta plantas internas e fachadas das diversas instalações, habitações dos internos e dos funcionários, em escala 1:100. Vicente Saul Moreira dos Santos Pesquisador do ILA Global Project on the History of Leprosy da International Leprosy Association, vinculado a Unit for the History of Medicine da Oxford University, Caixa Postal 3263, 20001-970 Rio de Janeiro — RJ Brasil,
  • 73. • Em 1916 , Emílio ribas, contrário ao isolamento insular utilizado até então, propõe a criação de asilos-colônia, próximos às cidades, em zonas salubres e de recursos fáceis, estabelecendo o plano que serviu de base ao controle da hanseníase no Estado de São Paulo; os campos de Santo Angelo foram escolhidos para a instalação do primeiro hospital modelo. A inauguração do Sanatório de Santo Angelo em 1928 e a efetivação da legislação vigente por Aguiar Pupo em 1929 e 1930 precederam a criação, em 1935, do então denominado “Departamento da Profilaxia da Lepra (DPL). *Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) – Ver. Saude públ, S.Paulo – 13:281-98. 1979, página 281
  • 74. No período de 1920 a 1930 quase dobra o número de doentes Dermatologistas e infectologistas estudam a melhor política de tratamento para impedir que a população sadia seja contaminada. O Brasil opta pelo isolamento compulsório (1921) Para garantir a construção desse modelo são criados dois departamentos: 1º- Departamento da Profilaxia da Lepra (DPL) - para cuidar exclusivamente da hanseníase (1935)* 2º- para as demais doenças. Fonte: Monteiro, Yara Nogueira / tese de doutorado *Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) – Ver. Saude públ, S.Paulo –
  • 75. Estado de São Paulo Asilos Dispensários Preventórios
  • 76. Para a manutenção do modelo profilático, surgiram os Asilos ou Hospitais-Colônia no Estado de São Paulo: • 1928 - Santo Ângelo (Santa Casa) - Jundiapeba - Mogi das Cruzes - 348 alqueires - (Hosp. “Dr. Arnaldo Pezzuti Cavalcanti”) • 1931 - Padre Bento – Gopouva – Guarulhos – 23 alqueires – (Complexo Hospitalar “Padre Bento” ) • 1931 –Pirapitingui – Itu – 600 alqueires (Hospital “Dr.Francisco Ribeiro Arantes”) • 1932 – Cocais – Casa Branca – 300 alqueires ( o 1º a ser desativado) – ( Hospital Psiquiátrico) • 1933 – Aimorés – Bauru – 400 alqueires “ - ( Instituto “Lauro de Souza Lima)
  • 77. • É fato que a manutenção dos abrigos e hospitais dos lázaros ficou por um longo período a cargo das ordens religiosas. • Desde o Império, as autoridades declaravam que não tinham como arcar sozinhas com as despesas, acionando entidades particulares na manutenção e criação de abrigos. • Este foi o caso, por exemplo, dos abrigos para crianças pobres e abandonadas (que tinham família mas estavam pelo menos em tese, sob a responsabilidade do Juizado de Órfãos). • Essa prática perdurou por mais tempo, pois o próprio ministro Capanema determinou que a construção, manutenção e administração dos preventórios que cuidavam e recebiam as crianças filhas de leprosos ficariam a cargo de entidades particulares, principalmente da Federação das Sociedades de Assistência aos Lázaros e Defesa contra a Lepra http://www.leprosyhistory.org,http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000400019&lng=pt&nrm=iso
  • 78. Com a internação compulsória a assistência passa a ser de responsabilidade das Caixas Beneficentes dos Asilos-Colônia, com o intuito, inclusive, de tirá-la das mãos das beneméritas senhoras da sociedade, as quais discordavam da política isolacionista adotada pelo governo. Fonte: Monteiro, Yara Nogueira / tese de doutorado
  • 79.
  • 80. Chaulmoogra A utilização dos óleos chalmúgricos única alternativa de ‘tratamento’ na antiga farmacopéia hindu e chinesa era preconizada para doenças de pele, especialmente para a hanseníase. Seu uso na medicina ayurveda, na Índia, remonta há mais de 2.000 anos e é relacionado à lenda que conta a cura da hanseníase do príncipe Rama (de Benares) e da princesa Piya pelos frutos da árvore kalav. Foi o primeiro tratamento no Brasil e extremamente doloroso.
  • 81. tinha poder absoluto, até para capturar fugitivos e novos doentes com guardas sanitários, muitos dos quais, munidos de armas. Os então asilos-colônia tinham muros, cerca de arames, portões trancados e vigilância constante.
  • 82. Política Policialesca • O Estado adotava uma política de saúde policialesca, com o isolamento compulsório reforçando o estigma. • Os filhos sadios eram separados institucionalmente dos pais, perdendo desta forma o contato com o mundo exterior e a sua identidade como cidadãos.
  • 83. O importante para os idealizadores da Campanha de Combate à Lepra era que o mundo dos “sãos” estava a salvo, livre do contágio, livre das deformidades temidas, da ameaça aos nobres traços do ser humano, da incapacidade para o trabalho... Assim eles se expressavam nos jornais da época em relação aos filhos sadios dos enfermos: “O filho do lázaro, que hoje brinca despreocupado ao lado do teu filho, talvez traga consigo o germe do mal terrível. Trabalha, pois, em prol do “Preventório”, a fim de resguardar dos perigos da lepra aqueles que te são caros .” Diário de Tarde. Florianópolis, 08/12/1936, ano II, nº. 413, p. 4. Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política 6, 1/2005, pp. 45-57. - A lepra no Brasil: representações e práticas de poder
  • 84. Há bem pouco nasceste e já te vais... Nem eu nem tua mãe te deu um beijo Como é triste o destino que praguejo: Ter um filho e vê-lo órfão tendo os pais. Não nos verás... não te veremos mais E na dor não verá o teu gracejo Quem te esperava no maior festejo Entre alegrias que se tornam ais (...) moço poeta,Leprosário do Amazonas, Vila Belisário Pena, escreveu por ocasião em que seu filho foi levado para o Preventário de Manaus, logo após o seu nascimento Fonte: Revista de Combate à Lepra, Ano VII, março de 1942, p.42
  • 85. “Talvez estivéssemos ou quem sabe... ainda estejamos a milhas luz do amor...“ * fotógrafo, em Marrocos, Floresta de cedros de IFRAME - Azrou
  • 86. “Neste período, todo e qualquer pensamento divergente, era absolutamente silenciado.”
  • 87. O número de doentes era considerado cada vez mais apavorante. São Paulo passou a exercer a prática de internar todos os doentes, mesmo os de forma não contagiantes. Distinguiu-se dos demais Estados que apenas internavam os portadores da doença de forma multibacilar (ou contagiante), como por exemplo, o Estado do Rio de Janeiro que tratavam os demais casos em ambulatórios.
  • 88. • Recolhimento maciço dos doentes e/ou suspeitos. • A ‘caça’ era levada a efeito com a utilização de ambulâncias e guardas, instalando-se um verdadeiro terror dentre a população marcada por esse destino.
  • 89. A partir de 193 0 , o número de doentes foi considerado cada vez mais apavorante. São Paulo passou a exercer a prática de internar todos os doentes, mesmo os de forma não contagiantes. Distinguiu-se dos demais Estados que apenas internavam os portadores da doença de forma multibacilar (ou contagiante), como por exemplo, o Estado do Rio de Janeiro que tratavam os demais casos em ambulatórios.
  • 90. • Recolhimento maciço dos doentes e/ou suspeitos. • A ‘caça’ era levada a efeito com a utilização de ambulâncias e guardas, instalando-se um verdadeiro terror dentre a população marcada por esse destino.
  • 91. Reportagem -João Guimarães Rosa- O trem estacou, na manhã fria, num lugar deserto, sem casa de estação: a parada do Leprosário... Um homem saltou, sem despedidas, deixou o baú à beira da linha, e foi andando. Ninguém lhe acenou... Todos os passageiros olharam ao redor, com medo de que o homem que saltara tivesse viajado ao lado deles... Gravado no dorso do bauzinho humilde, não havia nome ou etiqueta de hotel: só uma estampa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro... O trem se pôs logo em marcha apressada, e no apito rouco da locomotiva gritava o impudor de uma nota de alívio... Eu quis chamar o homem, para lhe dar um sorriso, mas ele ia já longe, sem se voltar nunca, como quem não tem frente, como quem só tem costas...
  • 92. Moradores do antigo Sanatório Padre Bento, em Guarulhos (SP), onde pessoas com hanseníase eram confinadas. A foto foi tirada de uma revista editada pelos próprios moradores do local Revista Padre Bento / Divulgação
  • 93.
  • 94. Fuga ou refúgio Alguns que possuíam uma situação privilegiada passaram a viver escondidos em casa pela família ou tentaram ir para outros Estados como o Rio de Janeiro que não adotava a mesma política de tratamento. Alguns partiram para outros países. Obviamente, tratava-se de uma minoria.
  • 95. 1940 – “Naquela época era o Dr. G. Fez exame, tudo, fez exame. Aí foram embora e depois de muito tempo ainda voltou já com a ambulância para pegar nós. Foram lá colher material, tudo, não é? (...) A ambulância era fechada, tipo de uma melancia: tipo de uma melancia só com uma venezianazinha assim do lado, só. Tudo fechado. Para não sair, decerto (...). Aquela coisa da doença! A doença era um bicho! (...) Tinham avisado: – Nós vamos buscar vocês tal dia! (...) – Sim, mas nós vamos levar nossas coisas! – Não, não! Como vocês estão vocês embarcam no carro! – Não! Mas tem que levar roupa! – Não leve nada daí! Aí meu pai ainda pegou o documento da casa e guardou, não é? Guardou no bolso. Foi só o que aproveitou. O resto foi botado fogo na casa. Queimaram, não é? (...).” Depoimento oral concedido pelo egresso G. B., Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política em 22 de janeiro de 2002, internado compulsoriamente no 6, 1/2005, pp. 45-57. “A lepra no Brasil: representações e práticas de o Hospital Colônia Santa Teresa em dezembro de 1940 poder”
  • 96. 1941 O Serviço Nacional da Lepra , passa a dar as diretrizes para o controle da doença no país.
  • 97. Completava-se o modelo isolacionista, no qual o doente ‘caçado’ sabia : • que ao entrar no asilo-colônia estaria sendo arrebatado da família, amigos, casa, escola, trabalho, passado e qualquer projeto para o futuro; • que da noite para o dia seria banido de seus direitos como cidadão e tão somente a cura (na ocasião vista praticamente como algo remoto e improvável ), poderia transportá-lo novamente à liberdade; • que passaria a ser considerado como um morto para a sociedade – morto civil -
  • 98. Hoje, a “hanseníase que tem cura” encurtou distâncias físicas, mas ainda há grandes distâncias a serem vencidas. Fonte: http://www.morhan.org.br/det_noticias.cfm?id_noticia=70
  • 99. Marcos ReY (1925-1999) “Aos 16 anos, em 1941, Edmundo Nonato foi ‘alcançado’ pela política de internação compulsória que existiu no Brasil até 1967 e passou os melhores anos da sua adolescência confinado em asilos-colônia que, na época, eram chamados de "leprosários", mas na prática eram campos de concentração sanitários. Quatro anos depois, Edmundo Nonato fugiu - sim, fugiu - e se refugiou no Rio de Janeiro, por medo de retornar ao confinamento.(...)” “Marcos Rey, escritor, cronista, roteirista de cinema e autor de obras infanto-juvenis era o pseudônimo do cidadão Edmundo Nonato.” Artigo sobre biografia de Marcos Rey, escrita por Carlos Maranhão - revista Veja (1/07/2004)
  • 100.
  • 101. As seqüelas da hanseníase não impediram que Edmundo Nonato se tornasse Marcos Rey, escritor, cronista, roteirista de cinema e autor de obras infanto-juvenis. Suas mãos parcialmente imobilizadas não o impediram de ser um exímio datilógrafo. O sofrimento da juventude não tirou dele o humor ferino, o gosto pelas farras, pela companhia dos amigos. Mas até sua morte, em 1999, de câncer, Marcos Rey manteve em segredo o fato de ter sido um paciente de hanseníase. Só compartilhou esse segredo com os parentes mais próximos e com sua esposa.
  • 102. Bacurau Bacurau", nascido em Manicoré – AM, em 9 de dezembro de 1939, contraiu hanseníase aos 6 anos de idade. Em razão do preconceito, jamais foi aceito em alguma escola. Autodidata tornou-se professor primário da Secretaria de Educação do Acre. Francisco Augusto Vieira Nunes, o "Bacurau", fundou em 6 de julho de 1981, o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase - MORHAN - (Organização Não Governamental).
  • 103.
  • 104. A sina de Leopoldo Cunha
  • 105.
  • 106.
  • 107.
  • 108.
  • 109.
  • 110.
  • 111. “Foram tantas as histórias contadas, quanto as vidas que ficaram caladas...”
  • 112. Um ...à mercê de mentes que se consideravam poderosas e superiores ao homem comum, passível de contrair uma doença como a hanseníase. Um objeto, sujeito a viver à margem da vida às custas da caridade. Um sujeito-objeto...
  • 113. Advento da Sulfona 1942 esperança de um novo tempo
  • 114. No entanto, a realidade permanece no isolamento.
  • 115. Década de 60: • Os asilos-colônia passam a ser denominados de Sanatórios . • O profissional assistente social é admitido no DPL, mas prevalece ainda a prática assistencialista. • Ênfase no trabalho de educação sanitária através de um grupo profissional: enfermeiro, educador e assistente social
  • 116. Constatações da ineficácia da política adotada : - cadeia de transmissão não interrompida - desagregação familiar - perda do vinculo empregatício - perda da auto-estima - perda da esperança de um futuro...
  • 117. Advento da Clofazimina 1962 Novas perspectivas para o tratamento
  • 118. Final do período da Internação compulsória no Brasil - 1962 -     • Reforma da estrutura da Secretaria da Saúde/SP • Ênfase ao tratamento ambulatorial • concretização da abertura dos portões dos Sanatórios no Estado de São Paulo – 1967
  • 119. A grande maioria dos doentes deixa o sanatório praticamente da mesma maneira que entrou: ‘compulsoriamente’.
  • 120.
  • 121. “Como se pudesse rasgar o papel do passado e se apresentar ao presente”.
  • 122. 1970 - Prof. Dr. Abrahão Rotberg – com o intuito de minimizar o estigma, propõe uma nova terminologia, substituindo a infamante palavra ‘lepra’ por HANSENÍASE e derivados. Uma homenagem ao médico e botânico norueguês Gerhard Henrik Armauer Hansen (Bergen 1841 - 1912) que em 1874 descobriu (isolou) o Mycobacterium Leprae –
  • 123. “Nesse período dois Congressos Brasileiros de Higiene (1968 e 1970) concordaram com o novo nome para substituir “lepra”,” por ser vantajoso para a educação sanitária do ponto de vista psicológico, facilitando as medidas preventivas e aliviando o estigma. Conseqüentemente três serviços estaduais de saúde, as cadeiras de dermatologia e muitas de neurologia e medicina preventiva de 27 escolas médicas do Brasil passaram a adotar a fórmula educativa “hanseníase”, antigamente “lepra”, objetivando a eliminação gradativa do estigmatizante termo “lepra”.**
  • 124. • 1976 - decreto-lei Dr. Paulo de Almeida Machado – Ministro da Saúde, determina que todos os documentos oficiais mudem a terminologia de “lepra” para Hanseníase e derivados, como “lepromatosa” para Wirchowiana”,etc.
  • 125. Advento da Rifampicina 1976 concretização da CURA
  • 126. Nova nomenclatura Trouxe vantagens sociais, contudo, trabalhar com Hanseníase não descarta a possibilidade de nos deparamos com situações constrangedoras. Fantasmas ainda se fazem presentes assustando e marginalizando doentes e familiares, criando preconceitos e chamando a atenção não para a Hanseníase, uma doença que tem cura, mas para uma doença carregada de imagens negativas associadas à palavra ‘LEPRA’
  • 127. • Nenhum resultado positivo pode advir da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima ao significado pejorativo da palavra lepra. • Assim, a responsabilidade dos profissionais de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada apenas no compromisso regulamentado por lei e sim, numa causa muito mais antiga: o respeito à pessoa humana.
  • 128. • Nenhum resultado positivo pode advir da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima ao significado pejorativo da palavra lepra. • Assim, a responsabilidade dos profissionais de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada apenas no compromisso regulamentado por lei e sim, numa causa muito mais antiga: o respeito à pessoa humana.
  • 129. 1995 - 29 de março ( Lei nº 9.010 – DO Brasília – DF) No Brasil, a nova nomenclatura para eliminar o estigma que acompanhava a palavra lepra e aos doentes, torna-se oficial na administração pública por lei, assinada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo então Ministro de Saúde Prof. Adib Jatene.
  • 130.
  • 131. - Esquema terapêutico POLIQUIMIOTERAPIA (PQT) Recomendado pela OMS, em 1982. No Brasil, oficialmente pelo Ministério de Saúde, em 1989 O esquema foi considerado eficaz, tendo resolvido o problema da resistência secundária à dapsona, reduzido o tempo de tratamento e aumentado a adesão de pacientes.  Fonte: Marcelo Grossi Araújo Professor Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG)
  • 132. PQT Perspectiva de cura rápida, elemento facilitador para as intervenções sociais necessárias e concepção do doente como ser integral. Desmistificação do risco de contágio e idéia de isolamento, minimizando os efeitos devastadores que acompanham há séculos: o estigma, a discriminação e o preconceito.
  • 133.
  • 134. A HANSENÍASE tem CURA e a pessoa por ela atingida tem um rosto. No entanto, não pode ser desconsiderado o fato de que é uma doença com inúmeras interfaces, razão pela qual exige atenção integral. Atenção integral, ou melhor, ações diversificadas e integradas, como estratégia, para oportunizar à pessoa, melhor aceitação do diagnóstico, envolvimento e compromisso quanto ao tratamento e, principalmente... credibilidade na cura.
  • 135.
  • 136. AÇÃO INTEGRAL (...) O girassol se volta para o sol onde ele estiver. Mesmo que o sol esteja escondido pelas nuvens, lá está o girassol dando costas à obscuridade das sombras e buscando, convicto e decidido, estar sempre de frente para o sol. (...) “Códigos da Vida”, de Legrand, editora Soler editora
  • 137. É assim com a hanseníase: O lado oculto da ‘mancha’ mesmo desaparecida através da cura, pode ainda deixar rastros ... Como a moeda, tem dois lados: quando um lado está exposto, o outro está oculto. Por detrás da doença está o homem que carrega no oculto a sua dor moral . Nem sempre, sozinho, consegue virar-se em direção ao sol. Hanseníase é muito mais que uma mancha!
  • 138. A PQT trouxe em seu bojo: • a premissa do cuidado multidisciplinar com o paciente; • o estreitamento do vínculo do paciente com o serviço, melhorando os níveis de adesão ao tratamento e possibilitando diagnósticos precoces e intervenções nos estados reacionais; • o trabalho contínuo na educação e prevenção de incapacidades físicas. Marcelo Grossi Araújo - professor Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG) http://www.anaisdedermatologia.org.br/artigo.php?artigo_id=30
  • 139. Foto: Sebastião Salgado “Cuidar do Ser é prestar atenção ao sopro que o anima.” Yves Leloup
  • 140. Se estivermos dispostos a olhar, escutar, sentir e tatear o que está ao redor em nosso campo de rotina; se conseguirmos desenvolver uma ação compatível com aquilo que escolhemos fazer na vida, teremos a oportunidade de constatar: que nada é impossível de mudar!
  • 141. Quantos espelhos a natureza nos oferece ? Quantas oportunidades a vida nos dá ? HNM
  • 142.
  • 143. Quem não aprecia as borboletas ?
  • 144. “Para amar uma borboleta também precisamos gostar de algumas lagartas.” Antoine de Saint-Exupéry
  • 145. Como disse no início, eu sou a Hanseníase e, por anos e anos... fui vista como uma lagarta que arrastou a infelicidade pelo mundo e, como se não bastasse, ainda fui enclausurada num casulo sem portas, nem janelas... Contudo, se vocês tiverem paciência a da e se dispuserem a cuidar de mim, O b rig talvez eu possa me transformar numa linda borboleta, voar com minhas próprias asas, Heleida Nobrega Metello e ter a ‘vida’ de volta. 2 de julho de 2008
  • 146.
  • 147. São Paulo/2008 C réditos: Heleida Nobrega Metello D ivisão Técnica de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
  • 148. "Caminho nestas praias entre a areia e a espuma. A maré alta apagará as marcas dos meus pés e o vento dissipará a espuma, mas o mar e a praia permanecerão para sempre." Khalil Gibran