3. São Paulo/2008
C réditos:
Heleida Nobrega Metello
D ivisão Técnica
de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
4. No ano de 2006
fez 800 anos que
São Francisco abraçou o leproso.
Este abraço mudou sua vida.
Dia 20 de janeiro de 2006
5. Desde então,
a partir de 2006,
os franciscanos iniciaram
uma campanha estadual (SP)
que está se estendendo
ao resto do país para ajudar
na Eliminação da Hanseníase.
6. Mesmo que há 129 anos o
agente causador tenha sido
descoberto, até hoje a
hanseníase é vista com um ar
de mistério, uma vez que para
muitos não é clara a explicação
e o entendimento de como se
dá a sua disseminação, o seu
contágio.
Eis porque devemos levar em
conta a complexidade que o
tema traz para o paciente e/ou
família em que muitas vezes
sequer conseguem pronunciar
a palavra H A N S E N Í A S E
corretamente.
Fonte: tese de doutorado de Zoika Bakirtzief (1994). Fonte:http://www.paho.org/images/AD/DPC/CD/familia1.jpg
7. Ora, não estamos aqui
justamente porque
escolhemos o homem
como princípio, meio e fim
no nosso campo
de vida profissional?
8. Então voltemos ao passado, à
origem da palavra HOMEM, até para
confirmar o dito de Guimarães Rosa:
“Toda língua são rastros de velho
mistério", ou melhor: a essência
das coisas e a ligação que tudo tem
com um passado remoto... que as
palavras, inclusive, são rastros de
velho mistério.
9.
10. Perseguir as pistas que o passado deixou nas
palavras é uma das melhores formas de
reencontrar nossas heranças e fazer um
exercício de reflexão sobre quem somos, homo
sapiens e homo loquens*,seres que concretizam
na linguagem o seu saber.
Saber lembra sabor, dois conceitos
etimologicamente vinculados. O ser humano
que saboreia a realidade é mais sábio, é mais
humano. E ser humano é ser aquele que sabe
ter nascido do húmus, da terra.
Fonte: PALAVRA PUXA PALAVRA:
À LUZ DA ETIMOLOGIA - II / Gabriel Perissé
•O homo sapiens tornar-se-ia no homo loquens, inventando uma linguagem para exteriorizar as suas necessidades,as suas ideias e os seus desejos,
diferenciando-se dos animais pela utilização de um sistema de comunicação progressivo e aberto que pode transmitir-se e enriquecer-se de geração em geração
11. Nesse palavra-puxa-palavra, o ser humano
descobre que é mais humano quando
pratica a humildade, virtude que nada tem
de rebaixamento, mas que significa a
qualidade de quem emerge do húmus,
do barro, e mantém os pés no chão.
Geologicamente o húmus
é a parte mais fértil da terra.
Assim, a humildade é para nossa vida
uma graça de fertilidade
Fonte: http://ointercessor.blogspot.com/
que faz brotar a vida nova.
12. Então...
se uma palavra puxa a outra
e, se escolhemos o homem
como foco de atenção na nossa vida
profissional, obviamente temos por
obrigação incorporar o exercício da
humildade em nosso cotidiano,
para que possamos também ver o ‘outro’
no Programa de Hanseníase,
desprendidos de nós mesmos.
Só assim conseguiremos vê-lo
no contexto global.
Só assim, poderemos perceber
o quanto essa doença
se esconde por detrás
de uma mancha insensível.
13.
14. É algo relativo ao passado e futuro,
como bem dizia Alberto Caieiro
E hoje, estamos aqui
justamente para falar do passado,
uma vez que cabe a nós,
um futuro promissor,
principalmente no que se refere ao
fazemos o que nos cabe fazer
como profissional de saúde.
15. Uma oportunidade
para que possamos
pensar, trocar e somar
a diversidade e
complexidade
do olhar, da escuta
e do tato
que o trabalho junto
ao Programa de
Hanseníase
exige de cada
um de nós.
16.
17. Houve um tempo,
um tempo longo demais,
e com certeza,
não é esse que vocês
vivem agora,
que eu , a HANSENÍASE,
era denominada de LEPRA.
Vale dizer que esse tempo
que durou séculos e séculos...
sequer poderia pensar
em olhar nos olhos
de cada um, como faço hoje,
mesmo que, por vezes,
timidamente.
É desse tempo que vou falar para vocês:
18. É muito difícil afirmar a época do aparecimento de uma doença com
base em textos antigos, por dados fragmentados e suposições de
tradutores dos mesmos, o assunto se torna confuso e gera uma série de
falsas interpretações.
Esse é o caso da Hanseníase, muito já se escreveu sobre sua origem e
existência, por outro lado, muitos desses escritos são citações de fontes
descrevendo a moléstia sem os seus aspectos peculiares.
Apesar disso, há referências bastante claras com relação à Hanseníase
em livros muito antigos.
Ao que parece, essa doença já era conhecida na Índia em 1500 a.C., e no
Regveda Samhita ( um dos primeiros livros sagrados da Índia ), a
Hanseníase é denominada de KUSHTA.
Contudo, na China, referências muito antigas sobre essa doença, como
aquela que é feita em um dos tratados médicos chineses mais antigos, o
Nei Ching Su Wen ,dão conta de descrições compatíveis com pacientes
portadores de Hanseníase, por volta de 2600 A.C .
http://www.geocities.com/hanseniase/Historico/historico.html
19. Num estudo sobre a etimologia da palavra lepra, Abraão Rotberg,
médico responsável pela mudança do nome lepra para hanseníase
no Brasil, afirma que os significados de cunho degradante
imputados ao termo têm sua origem no século III a.C.,
quando 70 judeus, traduzindo a Torá, os Neviim e os Ketuvin
para o grego, que mais tarde viriam a se transformar na Bíblia,
denominaram o Tsara’ath hebraico, que abrangeu um conjunto
de enfermidades de ‘caráter visual semelhante’.
20. Com base nessa ‘aparência’
deu-se início ao processo de
segregação dos ‘enfermos de lepra‘.
Isso ocorreu durante
a Idade Média
e inspirada no terceiro
livro de Moisés,
datado em cerca
de 1445 a.C. O
LEVÍTICO
(que lida com assuntos
relacionados à pureza, santidade,
etc... na vida cotidiana)
Fonte: Curi, Luciano Marcos, “Defender os sãos e consolar os lázaros”: Lepra e isolamento no Brasil 1935 a 1976
21. A Bíblia acabou se
transformando numa fonte de
confusão quanto à existência da
Hanseníase entre os judeus na época
do êxodo, uma vez que esse termo
“tsaraath”, no hebraico, significava
uma condição anormal da pele dos
indivíduos,das roupas, ou das casas,
que necessitava de purificação.
Segundo o Livro Sagrado,
o “tsaraath” na pele dos judeus seriam
“manchas brancas deprimidas
em que os pelos também
se tornavam brancos”.
Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
22. Na tradução grega,
a palavra “tsaraath”
foi traduzida como lepra e
“lepros”em grego, significa
“algo que descama”.
A palavra lepra
também foi usada pelos gregos
para designar doenças escamosas
do tipo da Psoríase.
A Hanseníase mesmo,
eles chamavam de Elefantíase.
Fonte: Cássio Ghidella - hansenólogo
23.
24.
25. Os ‘leprosos’
sempre figuraram
na lista dos que
carregavam o
Talvez sejam
os mais antigos
alvos desta incessante
‘reclassificação social’.
26. O termo
ESTIGMA vem desde
a Antiguidade:
na Grécia Antiga,
era a marca
que identificava os traidores.
“Os gregos criaram o termo estigma para
se referirem a sinais corporais com os
quais se procurava evidenciar alguma
coisa de extraordinário ou mau sobre o
status moral de quem os apresentava.”
(Goffman, 1978, p. 11).
Em Roma, era utilizada
para diferenciar as pessoas
de baixa qualidade social.
Fonte: Prof. Carlos Roberto Bacilo, Ciências Penais/UFPR
/discriminaçãohttp://www.unb.br/acs/unbagencia/ag0503-17.htm
27.
28. O estigma, uma vez fixado
em uma cultura,
permanece incorporado aos
sentimentos e modos
de pensar de um grupo,
mesmo quando a condição
que o gerou deixou de existir. [...]
E, mesmo quando os 'outros'
não percebem os sinais da lepra,
o ‘leproso’, sabedor
de sua condição de portador
de um atributo estigmatizante,
assume essa condição.
(Ornellas, 1997, p. 62)
Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
29.
30. Em relação
ao medo da rejeição –
manifestado pelo desejo
de se isolar e sumir –
e da solidão,
vários entrevistados
de Oliveira (1990)
se revelaram indignos
de poder viver
com outras pessoas,
revelando o seu próprio
preconceito quanto à doença.
(Oliveira, 1990)
Fonte: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php (pesquisa, setembro de 2007)
31. Resumindo
Goffman refere que
‘por definição’,
acreditamos que alguém
com um estigma são seja
completamente humano.
Com base nisso,
não é raro
fazermos discriminações,
através das quais
efetivamente, e sem pensar,
acabamos reduzindo
suas chances de vida (...)”
(Goffman, Erving. Op. Cit.;p.11.)
32. Segundo a historiadora Yara Nogueira,
um dos principais responsáveis pela criação
do estigma que cerca a hanseníase é a Bíblia,
"A postura estabelecida acerca da ‘lepra’
teve tal influência que acabou por extrapolar seu tempo,
chegando até a época atual.
Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em São Paulo",
defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1995, 492p.
33.
34. “Eterno
é tudo aquilo que vive
uma fração de segundos,
mas com tamanha
intensidade,
que se petrifica
e nenhuma força
o resgata"
(Carlos Drummond)
35. Corpos calcinados, recobertos por cinzas durante séculos...
(foto de autor no Flickr)
http://interata.squarespace.com/jornal-de-viagem/?currentPage=2
36. Fonte: pesquisadores do Instituto Pasteur (França) entrevista de Reinaldo José Lopes
Folha de São Paulo, maio de 2005 - (www.sciencemag.org),
37. O momento em que ocorreu a primeira infecção
ainda não pode ser estimado com exatidão:
algo entre 5.000 e 50 mil anos atrás,
dizem os pesquisadores.
250px-M_leprae_ziehl_nielsen2
fonte: pesquisadores franceses, Instituto Pasteur, entrevista à Folha de São Paulo, maio de 2005
38. A ‘LEPRA’,
apontada como uma das doenças
mais antigas da humanidade,
desde os tempos bíblicos,
aterrorizou reis, mendigos,
plebeus, imperadores
e populações inteiras
nos quatro cantos do mundo.
Independentemente
da época e da região geográfica,
foi sempre associada
ao pecado, à imundície
e ao castigo dos deuses,
e os doentes, submetidos
às mais cruéis formas
de isolamento, execração
e até de extermínio.
Yara Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em
São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
39. “A ‘morte’
antes
da morte,
como os
antigos egípcios
denominavam.”
fonte: John Farrow, no livro “Damião, o leproso” - (biografia romanceada, lançada em 1937)
40. Balduíno IV
(1161-1185),
o rei cristão
de Jerusalém,
retratado no filme
"Cruzadas",
ficou marcado
pela doença
desde a infância
e sua morte
chegou a desestabilizar
o reino cruzado
na Palestina.
Da Reportagem LOCAL São Paulo,
sexta-feira, 13 de maio de 2005 - – Folha Ciência- (Reinaldo José Lopes, jornalista da Folha de São Paulo, maio de 2005)
41. Segundo Dr. Marcos Virmond
(diretor do Instituto “Dr. Lauro de
Souza Lima” – Bauru)
é uma fama injustificada:
"Graças aos defeitos
do genoma, é muito difícil
acontecer a infecção."
É preciso viver em condições
precárias e apertadas,
perto de muitas pessoas
com alta carga da bactéria
no corpo.
São condições comuns
nas metrópoles do mundo antigo
e no Terceiro Mundo.
Estigma do mal na história tem pouco fundamento: Da Reportagem Local –
São Paulo, 13 de maio de 2005 – Folha Ciência – Reinaldo José Lopes, jornalista
42.
43. “ Num determinado momento, todos os doentes
contaminados’ por doenças que eles
não sabiam identificar e com aparência desprezível
eram reunidos na praça central das cidades medievais.”
Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle
da Hanseníase/ SP Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
44. A Idade Média
trouxe à luz
o termo ‘LEPRAE'
que significa
o 'chagádo', o 'pútredo',
o 'marcado
por uma doença‘.
‘LEPRAE,’
não era então,
só a hanseníase.
Ela estava incluída
nas demais doenças
consideradas contagiosas,
‘impuras’ e impossíveis
de serem classificadas.
www.paginas.terra.com.br
Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
45. Em vários lugares da Europa,
o doente de ‘lepra’
tinha de usar
vestimentas especiais
e símbolos visíveis
de sua condição de excluído.
YARA Nogueira Monteiro, autora da tese de doutorado "Da Maldição Divina à Exclusão Social: um Estudo da Hanseníase em
São Paulo", defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
46. RITO DE EXCLUSÃO
Um historiador suíço
que fez um estudo dos documentos medievais desta época,
cita a existência de um rito de Exclusão em seu livro “FRANCISCUS”
escrito em alemão, (não traduzido para o português):
Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
47. O ritual denominado
“Separatio Leprosarium, “
caracterizou-se por ser
uma cerimônia semelhante
às celebradas em favor
dos mortos no ocidente cristão.
O bispo ou abade
vinha paramentado,
missal na mão,
com as antífonas, as orações
da missa de exéquias.
”Não havia missa ,
apenas o cerimonial,
para o qual o povo
era convidado a assistir.
Fontes : *
* A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ ano de 2005 – - autores: Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazar
•VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle da Hanseníase/ SP
Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
48. Distante...
o bispo lia as antífonas
da missa de exéquias,
isto é, o rito dos mortos.
Em seguida,
ele chamava um acólito
e trazia sobre um batizeiro,
uma bandeja contendo
um punhado de terra.
Terra! Não água benta
ou óleo da unção.
Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de
Controle da Hanseníase/ SP - Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
49. TERRA!
O enfermo era coberto com um véu negro,
sendo a TERRA derramada sobre a sua cabeça,
como representação de sua morte.
Ao término da solenidade a autoridade eclesiástica dizia:
“Meu amigo, é sinal de que estás morto para o mundo
e por isso tem paciência e louva em tudo a Deus.”
Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
50. Após isso o Padre abençoava os sinos, as luvas
e a caixa de esmolas que o leproso deveria carregar
para que assim fossem reconhecidos pela sociedade.
Então, o padre lia a lista de proibições,
onde o leproso estava proibido de tocar os alimentos,
de entrar nos moinhos, etc.
Depois desta macabra cerimônia, os leprosos eram banidos...
fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques (apresentação).
As doenças tem História. Editora Terramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140
Fonte: A lepra no Brasil: representações e práticas de poder/ 2005 - Débora Michels Mattos e Sandro Kobol Fornazari
51.
52. Outras citações
especificam cajado
com um sininho,
o qual deveria ser tocado
sempre que um ‘ser humano’
se aproximasse,
para que pudesse fugir
de sua presença,
livrar-se da contaminação.
Foto de Sebastião Salgado
fonte: Béniac, Françoise. O medo da lepra. In: LE GOFF, Jacques(apresentação ).
As doenças tem História. EditoraTerramar, Lisboa, 2ª edição, 1997 (pp.139/140 -
54. A partir daí,
as notas
que cantariam
a música
de sua vida
não seriam
mais alegres
e sonoras.
Seriam
melancólicas
como as que ecoam
na mortificação.
55.
56. Todo o ritual era feito
com a plena convicção
de que, eliminando as pestes,
as doenças contagiosas,
estavam purificando
e criando o sadio da existência
para aquele lugar.
Erradicar o doente
do convívio social,
expulsar para fora
das muralhas significava:
salvar a sociedade.
Fonte: VITÓRIO MAZZUCO, frei franciscano, palestra proferida XVIII Encontro Estadual de Avaliação das Ações de Controle
da Hanseníase/ SP- Divisão Técnica de Hanseníase/CCD/CVE/SES-SP - setembro de 2006
57.
58. Há um tempo que começa,
e há um tempo em que acaba.
Começa aqui a nossa passagem...
61. No Brasil,
foi introduzida
por europeus
e africanos
Junto com o bacilo
aportou o
e a memória mítica
da doença, reproduzindo inclusive,
“padrões de comportamento
semelhantes aos
da Europa Medieval”
“Fonte: Monteiro, Yara Nogueira, Tese de doutorado, resumo, São Paulo; 1995
62. Tal qual na época medieval,
o contato aqui no Brasil
era considerado
contagioso, proibido.
Isso pode ser confirmado
nos incontáveis textos bíblicos,
históricos e literários que falam
sobre a LEPRA
Todos apresentam doentes
cobertos de feridas
e deformidades físicas,
obrigando-os sempre
a ficar fora dos muros
que circundam as cidades.
63. LEPRA, MORFÉIA,
MAL DE SÃO LÁZARO,
GAFEIRA, COTENO,
MACUTENO,
CAMUNHENGUE e OUTROS...
são denominações
que aludem diretamente
a uma época onde dispensava-se
qualquer tratamento
ao portador desse mal.
Esses termos referem-se
não exatamente à doença,
mas à
a que foram alvos
os ‘leprosos’ no passado.
64. Incluindo ainda
a associação desse mal
ao pecado e à impureza,
essas referências
acabaram por se perpetuar
através dos tempos
e deixaram...
65.
66.
67. Nas primeiras décadas de 1900,
no Estado de São Paulo,
à semelhança dos relatos bíblicos,
eles não podiam trabalhar
e, sem subsistência,
saiam a pé ou a cavalo
para mendigar.
Levavam uma vida nômade
em acampamentos
na beira das estradas
ou periferia da cidade.
Viviam da caridade.
A caridade era feita a
distância.
Esmolas e alimentos:
68. A opção era por moedas
ao invés de cédulas,
uma vez que era mais fácil
arremessá-las sem precisar
se aproximar tanto.
Como medida de segurança,
era necessário manter
uns três metros de distância.
Havia inclusive o temor
quanto aos ventos.
Quando havia um grupo
de ‘leprosos’ mendigando
era conveniente
observar o ‘rumo dos ares’...
69. Assistência
Nessa época eram ‘assistidos’
por senhoras da sociedade.
Prática preconizada,
naquela época,
para garantir o status social.
Ou, pelo espírito de abnegação
inerente a alguns poucos
personagens que se destacaram
na trajetória social
da história da doença.
70. Freqüentavam eventos religiosos
O mais procurado era
o de Pirapora do Bom Jesus,
centro de romarias
às margens do rio Tietê
na Grande São Paulo.
Já na capital, tinham por hábito
perambular pelas ruas
Santo Antonio, Augusta,
Consolação, assim como
pelo Largo do Arouche
como da Penha, Belenzinho
e Santana...
“alarmando suas populações
e constituindo uma ameaça
à saúde pública”. *
fonte: palavras textuais de Flávio Maurano, um dos médicos defensores do modelo isolacionista.
71. Nestas décadas,
o Brasil teria um total
de cinqüenta mil leprosos
segundo um trabalho
de Souza Araújo (1933)
publicado na Revista
Médica-Cirurgica
do Brasil.
De acordo
com os estudos,
deveriam ser internados
76% dos doentes,
e para isso o país precisava
de um total de 43 leprosários
Anotação manuscrita de Gustavo Capanema, deputado federal
72. No Real Gabinete Português de Leitura,
no Arquivo Nacional e na Biblioteca Nacional
foram pesquisados livros, índices, ofícios
e fotografias sobre administração de leprosários
e artigos sobre o tratamento da doença.
Na Biblioteca Nacional foram encontradas duas
referências interessantes na seção de Iconografia.
Uma delas era o Projeto da leprosaria-modelo
nos campos de Santo Ângelo: estado de São Paulo,
e nele consta que o trabalho havia sido viabilizado
pela união da Associação Protetora dos Morféticos
e da Santa Casa, com o apoio do governo de S.Paulo.
O documento apresenta plantas internas
e fachadas das diversas instalações, habitações
dos internos e dos funcionários, em escala 1:100.
Vicente Saul Moreira dos Santos
Pesquisador do ILA Global Project on the History of Leprosy da International Leprosy Association, vinculado a Unit for
the History of Medicine da Oxford University, Caixa Postal 3263, 20001-970 Rio de Janeiro — RJ Brasil,
73. • Em 1916 , Emílio ribas, contrário ao isolamento insular
utilizado até então, propõe a criação de asilos-colônia,
próximos às cidades, em zonas salubres e de recursos
fáceis, estabelecendo o plano que serviu de base ao
controle da hanseníase no Estado de São Paulo; os campos
de Santo Angelo foram escolhidos para a instalação do
primeiro hospital modelo. A inauguração do Sanatório de
Santo Angelo em 1928 e a efetivação da legislação vigente
por Aguiar Pupo em 1929 e 1930 precederam a criação, em
1935, do então denominado “Departamento da Profilaxia
da Lepra (DPL).
*Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) –
Ver. Saude públ, S.Paulo – 13:281-98. 1979, página 281
74. No período de 1920 a 1930
quase dobra o número de doentes
Dermatologistas e infectologistas estudam a
melhor política de tratamento para impedir
que a população sadia seja contaminada.
O Brasil opta pelo
isolamento compulsório (1921)
Para garantir a construção desse modelo
são criados dois departamentos:
1º- Departamento da Profilaxia da Lepra
(DPL) - para cuidar exclusivamente da
hanseníase (1935)*
2º- para as demais doenças.
Fonte: Monteiro, Yara Nogueira / tese de doutorado
*Lombardi, Clovis – Situação da Endemia da Hanseníase no Município de São Paulo, Brasil (1976 – 1977) – Ver. Saude públ, S.Paulo –
75. Estado de São Paulo
Asilos Dispensários Preventórios
76. Para a manutenção do modelo profilático,
surgiram os Asilos ou Hospitais-Colônia
no Estado de São Paulo:
• 1928 - Santo Ângelo (Santa Casa) - Jundiapeba -
Mogi das Cruzes - 348 alqueires - (Hosp. “Dr.
Arnaldo Pezzuti Cavalcanti”)
• 1931 - Padre Bento – Gopouva – Guarulhos – 23
alqueires –
(Complexo Hospitalar “Padre Bento” )
• 1931 –Pirapitingui – Itu – 600 alqueires
(Hospital “Dr.Francisco Ribeiro Arantes”)
• 1932 – Cocais – Casa Branca – 300 alqueires ( o 1º
a ser desativado) –
( Hospital Psiquiátrico)
• 1933 – Aimorés – Bauru – 400 alqueires “ -
( Instituto “Lauro de Souza Lima)
77. • É fato que a manutenção dos abrigos e hospitais
dos lázaros ficou por um longo período a cargo
das ordens religiosas.
• Desde o Império, as autoridades declaravam que
não tinham como arcar sozinhas com as
despesas, acionando entidades particulares na
manutenção e criação de abrigos.
• Este foi o caso, por exemplo, dos abrigos para
crianças pobres e abandonadas (que tinham
família mas estavam pelo menos em tese, sob a
responsabilidade do Juizado de Órfãos).
• Essa prática perdurou por mais tempo, pois o
próprio ministro Capanema determinou que a
construção, manutenção e administração dos
preventórios que cuidavam e recebiam as
crianças filhas de leprosos ficariam a cargo de
entidades particulares, principalmente da
Federação das Sociedades de Assistência aos
Lázaros e Defesa contra a Lepra
http://www.leprosyhistory.org,http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000400019&lng=pt&nrm=iso
78. Com a internação compulsória a
assistência passa a ser de responsabilidade
das Caixas Beneficentes dos Asilos-Colônia,
com o intuito, inclusive, de tirá-la das mãos das beneméritas
senhoras da sociedade, as quais discordavam
da política isolacionista adotada pelo governo.
Fonte: Monteiro, Yara Nogueira / tese de doutorado
79.
80. Chaulmoogra A utilização dos óleos chalmúgricos
única alternativa de ‘tratamento’ na antiga farmacopéia hindu e
chinesa era preconizada para
doenças de pele, especialmente
para a hanseníase.
Seu uso na medicina ayurveda, na
Índia, remonta há mais de 2.000
anos e é relacionado à lenda que
conta a cura da hanseníase do
príncipe Rama (de Benares) e da
princesa Piya pelos frutos da árvore
kalav.
Foi o primeiro tratamento no Brasil
e extremamente doloroso.
81. tinha poder absoluto,
até para capturar fugitivos
e novos doentes
com guardas sanitários,
muitos dos quais,
munidos de armas.
Os então asilos-colônia
tinham muros,
cerca de arames,
portões trancados
e vigilância constante.
82. Política Policialesca
• O Estado adotava uma política
de saúde policialesca,
com o isolamento compulsório
reforçando o estigma.
• Os filhos sadios
eram separados institucionalmente
dos pais, perdendo desta forma
o contato com o mundo exterior
e a sua identidade como
cidadãos.
83. O importante para os idealizadores
da Campanha de Combate à Lepra
era que o mundo dos “sãos”
estava a salvo, livre do contágio,
livre das deformidades temidas,
da ameaça aos nobres
traços do ser humano,
da incapacidade para o trabalho...
Assim eles se expressavam
nos jornais da época em relação
aos filhos sadios dos enfermos:
“O filho do lázaro,
que hoje brinca despreocupado
ao lado do teu filho, talvez traga consigo
o germe do mal terrível.
Trabalha, pois, em prol do “Preventório”,
a fim de resguardar dos perigos da lepra
aqueles que te são caros .”
Diário de Tarde. Florianópolis, 08/12/1936,
ano II, nº. 413, p. 4.
Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política 6, 1/2005, pp. 45-57.
- A lepra no Brasil: representações e práticas de poder
84. Há bem pouco nasceste e já te vais...
Nem eu nem tua mãe te deu um beijo
Como é triste o destino que praguejo:
Ter um filho e vê-lo órfão tendo os pais.
Não nos verás... não te veremos mais
E na dor não verá o teu gracejo
Quem te esperava no maior festejo
Entre alegrias que se tornam ais (...)
moço poeta,Leprosário do Amazonas, Vila
Belisário Pena, escreveu por ocasião em que seu
filho foi levado para o Preventário de Manaus,
logo após o seu nascimento
Fonte: Revista de Combate à Lepra, Ano VII, março de 1942, p.42
85. “Talvez estivéssemos ou quem sabe...
ainda estejamos a milhas luz do amor...“
* fotógrafo, em Marrocos, Floresta de cedros de IFRAME - Azrou
86. “Neste período,
todo e qualquer
pensamento divergente,
era absolutamente
silenciado.”
87. O número de doentes
era considerado
cada vez mais apavorante.
São Paulo passou a exercer
a prática de internar
todos os doentes,
mesmo os de forma
não contagiantes.
Distinguiu-se dos
demais Estados
que apenas internavam
os portadores da doença
de forma multibacilar
(ou contagiante),
como por exemplo,
o Estado do Rio de Janeiro
que tratavam
os demais casos
em ambulatórios.
88. • Recolhimento maciço
dos doentes e/ou suspeitos.
• A ‘caça’ era levada a efeito
com a utilização
de ambulâncias e guardas,
instalando-se um verdadeiro
terror dentre a população
marcada por esse destino.
89. A partir de 193 0 ,
o número de doentes
foi considerado
cada vez mais apavorante.
São Paulo passou a exercer
a prática de internar todos
os doentes,
mesmo os de forma
não contagiantes.
Distinguiu-se dos
demais Estados
que apenas internavam
os portadores da doença
de forma multibacilar
(ou contagiante),
como por exemplo,
o Estado do Rio de Janeiro
que tratavam
os demais casos
em ambulatórios.
90. • Recolhimento maciço
dos doentes e/ou suspeitos.
• A ‘caça’ era levada a efeito
com a utilização
de ambulâncias e guardas,
instalando-se um verdadeiro
terror dentre a população
marcada por esse destino.
91. Reportagem
-João Guimarães Rosa-
O trem estacou, na manhã fria,
num lugar deserto, sem casa de estação:
a parada do Leprosário...
Um homem saltou, sem despedidas,
deixou o baú à beira da linha,
e foi andando. Ninguém lhe acenou...
Todos os passageiros olharam ao redor,
com medo de que o homem que saltara
tivesse viajado ao lado deles...
Gravado no dorso do bauzinho humilde,
não havia nome ou etiqueta de hotel:
só uma estampa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro...
O trem se pôs logo em marcha apressada,
e no apito rouco da locomotiva
gritava o impudor de uma nota de alívio...
Eu quis chamar o homem,
para lhe dar um sorriso,
mas ele ia já longe, sem se voltar nunca,
como quem não tem frente, como quem só tem costas...
92. Moradores do antigo Sanatório Padre Bento, em Guarulhos (SP), onde pessoas com hanseníase eram confinadas.
A foto foi tirada de uma revista editada pelos próprios moradores do local
Revista Padre Bento / Divulgação
93.
94. Fuga ou refúgio
Alguns que possuíam
uma situação privilegiada
passaram a viver escondidos
em casa pela família
ou tentaram ir
para outros Estados
como o Rio de Janeiro
que não adotava a mesma
política de tratamento.
Alguns partiram
para outros países.
Obviamente,
tratava-se de uma minoria.
95. 1940 – “Naquela época era o Dr. G. Fez
exame, tudo, fez exame. Aí foram embora e
depois de muito tempo ainda voltou já com a
ambulância para pegar nós. Foram lá colher
material, tudo, não é? (...) A ambulância era
fechada, tipo de uma melancia: tipo de uma
melancia só com uma venezianazinha assim
do lado, só. Tudo fechado. Para não sair,
decerto (...).
Aquela coisa da doença! A doença era um
bicho! (...)
Tinham avisado:
– Nós vamos buscar vocês tal dia! (...)
– Sim, mas nós vamos levar nossas coisas!
– Não, não! Como vocês estão vocês
embarcam no carro!
– Não! Mas tem que levar roupa!
– Não leve nada daí!
Aí meu pai ainda pegou o documento da
casa e guardou, não é? Guardou no bolso.
Foi só o que aproveitou. O resto foi botado
fogo na casa. Queimaram, não é? (...).”
Depoimento oral concedido pelo egresso G. B.,
Mattos, D.M. e Fornazari, S.K. Cadernos de Ética e Filosofia Política em 22 de janeiro de 2002, internado compulsoriamente no
6, 1/2005, pp. 45-57. “A lepra no Brasil: representações e práticas de o Hospital Colônia Santa Teresa em dezembro de 1940
poder”
96. 1941
O Serviço Nacional da Lepra ,
passa a dar as diretrizes
para o controle da doença no país.
97. Completava-se o modelo isolacionista,
no qual o doente ‘caçado’ sabia :
• que ao entrar no asilo-colônia estaria
sendo arrebatado da família, amigos,
casa, escola, trabalho, passado e
qualquer projeto para o futuro;
• que da noite para o dia seria banido
de seus direitos como cidadão
e tão somente a cura
(na ocasião vista praticamente
como algo remoto e improvável ),
poderia transportá-lo
novamente à liberdade;
• que passaria a ser considerado
como um morto para a sociedade
– morto civil -
98. Hoje, a “hanseníase que tem cura”
encurtou distâncias físicas,
mas ainda há grandes distâncias a serem vencidas.
Fonte: http://www.morhan.org.br/det_noticias.cfm?id_noticia=70
99. Marcos ReY (1925-1999)
“Aos 16 anos, em 1941,
Edmundo Nonato foi ‘alcançado’ pela política
de internação compulsória que existiu
no Brasil até 1967 e passou os melhores
anos da sua adolescência confinado em
asilos-colônia que, na época,
eram chamados de "leprosários",
mas na prática eram campos de
concentração sanitários.
Quatro anos depois, Edmundo Nonato
fugiu - sim, fugiu - e se refugiou
no Rio de Janeiro, por medo
de retornar ao confinamento.(...)”
“Marcos Rey, escritor, cronista, roteirista
de cinema e autor de obras infanto-juvenis
era o pseudônimo do cidadão
Edmundo Nonato.”
Artigo sobre biografia de Marcos Rey,
escrita por Carlos Maranhão - revista Veja (1/07/2004)
100.
101. As seqüelas da hanseníase
não impediram que Edmundo Nonato
se tornasse Marcos Rey,
escritor, cronista, roteirista de cinema
e autor de obras infanto-juvenis.
Suas mãos parcialmente imobilizadas
não o impediram de ser
um exímio datilógrafo.
O sofrimento da juventude
não tirou dele o humor ferino,
o gosto pelas farras,
pela companhia dos amigos.
Mas até sua morte, em 1999, de câncer,
Marcos Rey manteve em segredo
o fato de ter sido um paciente
de hanseníase.
Só compartilhou esse segredo com os
parentes mais próximos e com sua esposa.
102. Bacurau
Bacurau", nascido em Manicoré – AM,
em 9 de dezembro de 1939,
contraiu hanseníase aos 6 anos de idade.
Em razão do preconceito,
jamais foi aceito em alguma escola.
Autodidata tornou-se professor primário
da Secretaria de Educação do Acre.
Francisco Augusto Vieira Nunes,
o "Bacurau",
fundou em 6 de julho de 1981,
o Movimento de Reintegração das
Pessoas Atingidas pela Hanseníase
- MORHAN -
(Organização Não Governamental).
111. “Foram tantas
as histórias contadas,
quanto as vidas que ficaram caladas...”
112. Um
...à mercê de mentes
que se consideravam poderosas
e superiores ao homem comum,
passível de contrair uma doença
como a hanseníase.
Um objeto,
sujeito a viver à margem da vida
às custas da caridade.
Um sujeito-objeto...
115. Década de 60:
• Os asilos-colônia passam a ser
denominados de Sanatórios .
• O profissional assistente social
é admitido no DPL,
mas prevalece ainda
a prática assistencialista.
• Ênfase no trabalho de
educação sanitária
através de um grupo profissional:
enfermeiro, educador
e assistente social
116. Constatações da ineficácia
da política adotada :
- cadeia de transmissão
não interrompida
- desagregação familiar
- perda do vinculo empregatício
- perda da auto-estima
- perda da esperança
de um futuro...
118. Final do período
da Internação
compulsória no
Brasil
- 1962 -
• Reforma da estrutura
da Secretaria da Saúde/SP
• Ênfase
ao tratamento ambulatorial
• concretização
da abertura dos portões
dos Sanatórios
no Estado de São Paulo –
1967
119. A grande maioria dos doentes
deixa o sanatório
praticamente da mesma maneira
que entrou: ‘compulsoriamente’.
120.
121. “Como se pudesse
rasgar o papel
do passado
e se apresentar
ao presente”.
122. 1970 - Prof. Dr. Abrahão Rotberg –
com o intuito de minimizar o estigma,
propõe uma nova terminologia,
substituindo a infamante palavra
‘lepra’ por HANSENÍASE e derivados.
Uma homenagem ao médico
e botânico norueguês
Gerhard Henrik Armauer Hansen
(Bergen 1841 - 1912)
que em 1874 descobriu (isolou)
o Mycobacterium Leprae –
123. “Nesse período dois Congressos Brasileiros de Higiene (1968
e 1970) concordaram com o novo nome para substituir
“lepra”,” por ser vantajoso para a educação sanitária do
ponto de vista psicológico, facilitando as medidas
preventivas e aliviando o estigma.
Conseqüentemente três serviços estaduais de saúde, as
cadeiras de dermatologia e muitas de neurologia e medicina
preventiva de 27 escolas médicas do Brasil passaram a
adotar a fórmula educativa “hanseníase”, antigamente
“lepra”, objetivando a eliminação gradativa do
estigmatizante termo “lepra”.**
124. • 1976 - decreto-lei
Dr. Paulo de Almeida
Machado – Ministro da Saúde,
determina que todos os
documentos oficiais
mudem a terminologia
de “lepra”
para Hanseníase
e derivados,
como “lepromatosa”
para Wirchowiana”,etc.
126. Nova nomenclatura
Trouxe vantagens sociais,
contudo, trabalhar com Hanseníase
não descarta a possibilidade
de nos deparamos
com situações constrangedoras.
Fantasmas ainda se fazem
presentes assustando
e marginalizando doentes
e familiares, criando preconceitos
e chamando a atenção
não para a Hanseníase,
uma doença que tem cura,
mas para uma doença
carregada de imagens negativas
associadas à palavra ‘LEPRA’
127. • Nenhum resultado positivo pode advir
da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir
ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas
de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima
ao significado pejorativo da palavra lepra.
• Assim, a responsabilidade dos profissionais
de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada
apenas no compromisso regulamentado por lei
e sim, numa causa muito mais antiga:
o respeito à pessoa humana.
128. • Nenhum resultado positivo pode advir
da terminologia hanseníase se a postura profissional transmitir
ou perpassar palavras ou atitudes que sejam decodificadas
de tal forma que a associação de idéias chegue mais próxima
ao significado pejorativo da palavra lepra.
• Assim, a responsabilidade dos profissionais
de saúde em relação à hanseníase não deve estar ancorada
apenas no compromisso regulamentado por lei
e sim, numa causa muito mais antiga:
o respeito à pessoa humana.
129. 1995 - 29 de março
( Lei nº 9.010 – DO Brasília – DF)
No Brasil,
a nova nomenclatura
para eliminar o estigma
que acompanhava
a palavra lepra e aos doentes,
torna-se oficial na administração
pública por lei, assinada pelo
presidente Fernando Henrique
Cardoso e pelo então Ministro de
Saúde Prof. Adib Jatene.
130.
131. - Esquema terapêutico
POLIQUIMIOTERAPIA
(PQT)
Recomendado pela OMS,
em 1982.
No Brasil, oficialmente
pelo Ministério de Saúde,
em 1989
O esquema foi considerado eficaz,
tendo resolvido o problema da
resistência secundária à dapsona,
reduzido o tempo de tratamento
e aumentado a adesão de pacientes.
Fonte: Marcelo Grossi Araújo Professor Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG)
132. PQT
Perspectiva de cura rápida,
elemento facilitador para as
intervenções sociais necessárias
e concepção do doente
como ser integral.
Desmistificação
do risco de contágio
e idéia de isolamento,
minimizando
os efeitos devastadores
que acompanham há séculos:
o estigma,
a discriminação
e o preconceito.
133.
134. A HANSENÍASE tem CURA e a pessoa por ela atingida tem um rosto.
No entanto, não pode ser desconsiderado o fato de que é uma doença
com inúmeras interfaces, razão pela qual exige atenção integral.
Atenção integral, ou melhor, ações diversificadas e integradas,
como estratégia, para oportunizar à pessoa, melhor aceitação do
diagnóstico, envolvimento e compromisso quanto ao tratamento
e, principalmente... credibilidade na cura.
135.
136. AÇÃO INTEGRAL
(...) O girassol
se volta para o sol
onde ele estiver.
Mesmo que o sol esteja
escondido pelas nuvens,
lá está o girassol
dando costas
à obscuridade
das sombras
e buscando,
convicto e decidido,
estar sempre de frente
para o sol. (...)
“Códigos da Vida”, de Legrand, editora Soler editora
137. É assim com a
hanseníase:
O lado oculto da ‘mancha’
mesmo desaparecida através da cura,
pode ainda deixar rastros ...
Como a moeda, tem dois lados:
quando um lado está exposto,
o outro está oculto.
Por detrás da doença está o homem
que carrega no oculto
a sua dor moral .
Nem sempre, sozinho,
consegue virar-se em direção ao sol.
Hanseníase
é muito mais
que uma mancha!
138. A PQT trouxe em seu bojo:
• a premissa do cuidado
multidisciplinar com o paciente;
• o estreitamento do vínculo
do paciente com o serviço,
melhorando os níveis de adesão
ao tratamento e possibilitando
diagnósticos precoces e intervenções
nos estados reacionais;
• o trabalho contínuo na educação
e prevenção de incapacidades físicas.
Marcelo Grossi Araújo - professor Assistente da Faculdade de Medicina
da Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Dermatologia - UFMG (MG)
http://www.anaisdedermatologia.org.br/artigo.php?artigo_id=30
139. Foto: Sebastião Salgado
“Cuidar do Ser é prestar atenção ao sopro que o anima.”
Yves Leloup
140. Se estivermos dispostos a olhar, escutar, sentir e tatear
o que está ao redor em nosso campo de rotina;
se conseguirmos desenvolver uma ação compatível
com aquilo que escolhemos fazer na vida,
teremos a oportunidade de constatar:
que nada é impossível de mudar!
141. Quantos espelhos a natureza nos oferece ?
Quantas oportunidades a vida nos dá ?
HNM
144. “Para
amar
uma
borboleta
também
precisamos
gostar de
algumas
lagartas.”
Antoine de Saint-Exupéry
145. Como disse no início, eu sou a Hanseníase
e, por anos e anos... fui vista
como uma lagarta que arrastou
a infelicidade pelo mundo e,
como se não bastasse,
ainda fui enclausurada
num casulo sem portas, nem janelas...
Contudo, se vocês tiverem paciência
a da e se dispuserem a cuidar de mim,
O b rig talvez eu possa me transformar
numa linda borboleta,
voar com minhas próprias asas,
Heleida Nobrega Metello e ter a ‘vida’ de volta.
2 de julho de 2008
146.
147. São Paulo/2008
C réditos:
Heleida Nobrega Metello
D ivisão Técnica
de Hanseníase/CVE/CCD/SES-SP
148. "Caminho nestas praias entre a areia e a espuma.
A maré alta apagará as marcas dos meus pés e o vento dissipará a espuma,
mas o mar e a praia permanecerão para sempre."
Khalil Gibran