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CONTRATOS EM REGIME DE EMPREITADA GLOBAL NA MODALIDADE
EPC – ENGINEERING, PROCUREMENT AND CONSTRUCTION:
ASPECTOS CONTRATUAIS APLICADOS AO SETOR ELÉTRICO
Gustavo Buffara Bueno1
Mauro Lauria Reis
Pedro Frederico Nodari
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objetivo apresentar, de forma breve ao leitor.
alguns aspectos importantes dos contratos em regime de EPC, mais
precisamente naqueles assinados pelas concessionárias do setor elétrico
brasileiro.
Nesta espécie de contrato, uma empresa é contratada não só para fazer
a obra, mas também projetá-la e adquirir os materiais necessários. O grande
número de obrigações e responsabilidades faz com que a fase pré-contratual, e
toda a elaboração do contrato, sejam de suma importância ao equilíbrio da
relação firmada entre as partes. Não se pode esquecer que o equilíbrio das
relações contratuais é um dos princípios do Direito Civil Brasileiro.
Assim, no primeiro capítulo serão estudados os conceitos e
características do contrato de empreitada e do contrato EPC.
No segundo capítulo, será estudada a aplicabilidade dos contratos EPC
às obras do setor elétrico brasileiro já que, atualmente, grande parte dos
contratos assinados entre concessionárias que irão prestar o serviço de
fornecimento de energia elétrica e as empreiteiras responsáveis pela
construção das linhas de transmissão e subestações – infraestrutura
necessária à prestação do serviço – é assinada sob o regime de EPC.
No terceiro capítulo, serão abordadas algumas características
específicas dos contratos de construção de linhas de transmissão e
subestações, bem como algumas cláusulas importantes nesta espécie de
contrato.
A conclusão deste trabalho mostrará a importância da fase de
elaboração do contrato, principalmente da divisão de responsabilidades, já que
o objeto contratual, normalmente, são obras complexas e com alto custo
financeiro.
I. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO EPC
1
Por Gustavo Buffara Bueno (gbuffara@bbadv.adv.br), Mauro Lauria Reis
(mauroreis@bbadv.adv.br) e Pedro Frederico Nodari (pedronodari@bbadv.adv.br),
respectivamente sócio e advogados associados do Buffara Bueno & Bacaltchuc Advogados,
com sede na Avenida Almirante Barroso, nº 63, sala 1109, Centro, Rio de Janeiro/RJ, CEP
22290-160.
2
1.1. Contrato de Empreitada: O contrato nada mais é que um acordo
firmado entre duas ou mais partes, uma espécie de negócio jurídico no qual é
necessária a manifestação de vontade de todas as partes nele envolvidas.
Para que seja válido, segundo a lei civil brasileira2
, é necessário (i) que as
partes que o celebram sejam capazes, (ii) que seu objeto seja lícito, possível, e
determinado (ou determinável), e (iii) que sua forma esteja prescrita ou, pelo
menos, não seja vedada pela lei.
O Código Civil Brasileiro, no seu Título VI, elenca diversas espécies de
contrato, como os de compra e venda, e o de locação. Entre essas espécies,
está o contrato de empreitada, previsto nos artigos 610 a 626. Na lição de
Silvio Rodrigues:
Através do contrato de empreitada, uma das partes – o
empreiteiro – se compromete a executar determinada obra,
pessoalmente ou por meio de terceiros, em troca de certa
remuneração fixa a ser paga pelo outro contratante – dono
da obra -, de acordo com o dono da obra, e sem relação de
subordinação3
.
Os contratos de empreitada são utilizados, principalmente, para
formalizar acordos de construção, e servem de base para a formação do
chamado contrato de “EPC”, como será visto adiante.
No presente trabalho interessam-nos especialmente as construções que
envolvem obras de grande porte, voltadas para a infraestrutura do setor elétrico
do país. Nestes, os valores costumam ser expressivos, a complexidade na
consecução das obras é alta, e há interesse direto da Administração Pública na
sua conclusão.
Tome-se como exemplo a construção de uma subestação e de uma
linha de transmissão para gerar e fornecer energia elétrica para determinada
região, abrangendo dez municípios. Os custos atingem a soma de milhões de
reais, e há um interesse da Administração Pública de que a obra seja concluída
no prazo contratual.
Na prática, diante da necessidade da geração e do fornecimento de
energia, e após a edição da Lei nº 8.666/93 – Lei das Licitações – a
Administração Pública inicia uma licitação, isto é, abre a todas as empresas
interessadas a possibilidade de prestar o serviço para determinada região.
Empresas, ou até consórcios, participam da concorrência, e aquela que, grosso
modo, melhor atender aos requisitos escolhidos, vence a licitação.
Ato contínuo, é assinado um Contrato de Concessão, no qual a
Administração Pública concede ao vencedor o direito de prestar o serviço.
A concessionária, em troca da exploração financeira do fornecimento de
energia aos dez municípios, deve prestar o serviço com qualidade, isto é, o
2
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 09
de Fevereiro de 2015.
3
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade.
30ª Ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2006, p. 245.
3
serviço deve ser contínuo, e chegar a todos os moradores da região. Deve-se
levar em consideração, por exemplo, o aumento no número de habitantes
locais, ou o aumento de consumo de energia em determinadas épocas do ano.
Nada disso justifica a queda na qualidade da prestação do serviço: a
administração pública tem a prerrogativa de aplicar sanções à concessionária4
.
Outro exemplo interessante, mesmo que fora do setor elétrico, ocorre
quando a Administração Pública prioriza a construção de uma estrada de
ligação entre dois ou mais Municípios. Essa construção envolve uma grande
soma de recursos, e há um interesse público na conclusão da obra no tempo
determinado.
Aberta a licitação, diversas empresas apresentam suas propostas, e a
vencedora ganha o direito de construir e explorar o direito de utilização da
estrada, normalmente através de cobrança de tarifas dos usuários nos
pedágios. A qualidade da estrada deve ser garantida pela concessionária pelo
tempo que durar o contrato de concessão.
Diversos são os exemplos, pois este procedimento obedece às regras
determinadas não só pela Lei das Licitações, mas também pela Lei nº 8.987/95
(Lei de Concessões Públicas), que dispõe sobre o regime de concessão e
permissão da prestação de serviços públicos.
Cumpre esclarecer que o advento das duas leis supracitadas,
juntamente com outras medidas, fez parte de um processo de desestatização
pelo qual passou o Brasil durante a década de 1990. Isto porque, até então, a
maioria dos serviços considerados essenciais era prestada pelo próprio Estado,
por meio das empresas estatais. Fornecimento de energia elétrica, gás,
telecomunicações, são exemplos de serviços que tiveram sua prestação
delegada a particulares.
Neste sentido, o Estado delegou a função, mas se cercou de regras
tanto para a escolha da empresa particular que irá prestar o serviço (Lei
8.666/93 - Licitações), quanto para a concessão do direito (Lei 8.987/95 –
Concessões Públicas). Pode-se afirmar que passou de prestador direto para
fiscalizador e regulador da prestação dos serviços públicos.
1.2. Contrato de Engineering e EPC: Devido aos custos elevados e à
alta complexidade desse tipo de obra, é comum que a concessionária que irá
prestar o serviço contrate uma empreiteira para construir a infraestrutura
necessária. Sobre essa questão, cumpre citar lição de Gómez et alli5
:
4
Em Junho de 2012 a Administração Pública, representada pela ANEEL, multou a CHESF
(Companhia Hidroelétrica do São Francisco) em R$ 32,2 milhões de Reais por um blecaute
que atingiu 8 estados do Nordeste no mês de Fevereiro de 2010. A fundamentação da multa
foi o não cumprimento de um plano de modernização e atualização das cadeias de proteção de
linhas de transmissão do sistema de energia.
5
GÓMEZ, Luiz Alberto, COELHO, Christianne C. S. Reinisch, DUCLÓS FILHO, Elo Ortiz,
Xavier, Sayonara M. T. Contratos EPC Turnkey. 1ª Ed. Florianópolis: Visual Books, 2006, p. 2.
4
A aprovação do Regime de Concessão de Serviços Públicos,
instituído através da Lei 8.987 de 1995, assim como a criação
de regimes especiais de autorização para exploração de
instalações de geração de energia elétrica pelo setor privado,
na modalidade de produção independente de energia elétrica
(...) deram lugar à negociação de contratos de construção de
grandes obras de engenharia, geralmente sob o regime da
empreitada global.
Tais características refletiram nos contratos assinados entre a
concessionária vencedora e a empreiteira responsável. O conjunto de
obrigações assumidas pela empreiteira ultrapassava o escopo previsto no
Código Civil Brasileiro, mais precisamente no capítulo destinado aos contratos
de empreitada.
Desenvolveu-se, dentro das relações contratuais empresariais e sem
previsão legal, uma nova espécie de contrato, o de engineering que, segundo
Caio Mário, tem por objeto a assistência técnica especializada em engenharia6
.
Cumpre citar que a doutrina brasileira não é majoritária quanto à
natureza jurídica deste contrato. Orlando Gomes sustenta que: “o contrato de
engineering é considerado um contrato atípico da espécie contrato misto, no
entendimento que resulta da justaposição de prestações características de
vários contratos típicos”7
. No mesmo sentido, Caio Mário o classifica como uma
nova modalidade de contrato8
.
O Enunciado nº 34 da I Jornada de Direito Comercial9
, traz a seguinte
observação:
“34. Com exceção da garantia contida no artigo 618 do Código
Civil, os demais artigos referentes, em especial, ao contrato de
empreitada (arts. 610 a 626) aplicar-se-ão somente de forma
subsidiária às condições contratuais acordadas pelas partes de
contratos complexos de engenharia e construção, tais como
EPC, EPC-M e Aliança.”
Em sentido inverso, Fabio Ulhoa Coelho afirma que engineering:
6
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Contratos. 18ª Ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2014, p. 558.
7
GOMES, Orlando. Contratos. 26ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.579.
8
Não por acaso, na obra “Instituições de Direito Civil”, volume III, o conceito de contrato de
engineering encontra-se no capítulo destinado às novas modalidades de contrato, enquanto o
conceito do contrato de empreitada encontra-se na parte destinada às espécies clássicas de
contrato, previstas no Código Civil. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. Cit.
9
A I Jornada de Direito Comercial ocorreu no período de 22 a 24 de outubro de 2012, em
Brasília-DF, com a participação de 172 juristas, entre professores especialmente convidados,
magistrados federais e estaduais, membros do Ministério Público, advogados, defensores
públicos, procuradores de entidades públicas, os quais apresentaram um total de 250
proposições de enunciados interpretativos da legislação de Direito Comercial.
5
É a empreitada de grande porte (...), que normalmente
compreende tanto o projeto como a execução e está associado
a duas outras obrigações contraídas pelo empreiteiro:
financiamento da obra e prestação de serviços de assessoria
técnica na implantação de seu uso10
.
Seguindo o mesmo entendimento, Luiz Olavo Baptista11
assim leciona:
Os contratos EPC apresentam características que nos
permitem qualificá-los como sendo contratos de empreitada.
Com efeito, o objeto do contrato é fazer uma obra por conta de
alguém, portanto, similar ao da empreitada; o objeto das
obrigações do Construtor EPC é o mesmo da obrigação do
empreiteiro, ou seja, uma obrigação de fazer, a obrigação do
dono da obra, de pagar, também coincide. Finalmente, o objeto
da prestação do empreiteiro é a obra e a do dono da obra é o
preço contratado.
Acrescenta ainda o autor que “[…] olhando sob o prisma econômico, o
contrato visa adquirir uma obra que será feita por alguém, mediante
retribuição”.
Filiamo-nos à corrente que entende ser o contrato de engineering uma
espécie de contrato de empreitada. Em ambos, há o dono da obra pagando um
preço para o empreiteiro construir.
Segundo o Código Civil, em seu artigo 610, o empreiteiro pode contribuir
para a obra apenas com seu trabalho ou também fornecendo os materiais. É
desse ponto que parte o contrato de engineering, isto é, a empreiteira que
construirá a obra será responsável pela construção, administração e compra
dos materiais.
Não há um instituto novo; há um contrato clássico adaptado à
complexidade das grandes obras de infraestrutura necessárias ao
desenvolvimento do país.
As regras aplicáveis às empreiteiras aplicam-se a essa modalidade,
apesar das diferenças nos respectivos objetos da prestação. O que define a
empreitada e a distinguiu de outros contratos são certas qualidades havidas
como essenciais pelo legislador. Essas incluem a relação jurídica e econômica
entre o dono da obra e o empreiteiro, a existência de um objeto da obrigação,
que é o dever de fazer, e para a prestação que é a obra.
Nessa toada, o caráter comutativo, sinalagmático, consensual, e de
execução continuada completa o quadro de características do contrato de
empreitada que também estão presentes no contrato de engineering.
10
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009-2010, p. 285.
11
BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011, p. 38.
6
Cumpre ressaltar que a expressão “Contratos EPC – Engineering,
Procurement and Construction”, foi convencionada pelo mercado, e nada mais
é do que uma representação do escopo de obrigações da empreiteira, a quem
são imputadas as obrigações pelo projeto da obra, pela aquisição dos recursos
humanos e materiais necessários, e pela construção em si. Atualmente,
contrato de engineering e contrato EPC são espécies que se confundem.
Dirimida a controvérsia, cumpre também citar uma das características
desta nova espécie de empreitada: o aumento das obrigações do empreiteiro
(ou “epcista”, conforme nomenclatura de mercado). Se o Código Civil,
conforme visto acima, prevê que o empreiteiro pode colaborar apenas
executando a obra ou também fornecendo o material, nos contratos celebrados
entre as concessionárias e as empreiteiras, estas contribuem com (i) as
atividades de engenharia (daí a classificação como “contratos de engineering”),
(ii) administração de compras e (iii) construção propriamente dita12
.
Além do aumento das obrigações do empreiteiro, é nítida a menor
participação da concessionária na construção do empreendimento que vai
possibilitar a exploração do serviço.
1.3. Contratos “Turn Key”: Não de pode deixar de mencionar os
contratos turn key, que são vistos por alguns como um tipo de EPC em que as
obrigações da contratada seriam mais extensas. Como quase todos os
modelos desenvolvidos pela prática nos negócios, ele tem algumas
características comuns que configuram e confirmam a modalidade, e outras
dependentes de condições específicas da obra ou dos interesses das partes.
Gómez et alli13
observam que nos contratos de EPC turn key:
[...] os empreiteiros vão assumir responsabilidade de completar
e/ou desenvolver os projetos incompletos desde o momento em
que foi fechado o contrato. Porém, como geralmente ocorre em
grandes projetos de engenharia, a dona e o consultor têm
preparado o projeto básico e um conjunto de especificações
técnicas, e a transmissão de responsabilidades para o
empreiteiro ocorre nesse ponto.
Nesse contrato, o construtor contratado tem a seu cargo a entrega da
obra apta a funcionar sem mais formalidades – daí a expressão turn key, que
se refere a acionar uma chave para dar partida na produção, por exemplo,
entregar a obra de uma subestação e respectivas linhas de transmissão aptas
12
Daniel S. C. Chen esclarece que “na língua inglesa, o contrato de engineering é conhecido
como Contrato de EPC. A sigla EPC significa Engineering, Procurement and Construction, isto
é, engenharia, gestão de compras e construção”. CHEN, Daniel Shem Cheng. Contrato de
engineering. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 104, set 2012. Disponível em:
<http://www.ambito-juridico.com.br/site>. Acesso em 11 de Fevereiro de 2015.
13
GÓMEZ, op cit, p. 66.
7
a transmitir energia e conectadas com o sistema integrado nacional de
transmissão de energia.
Os contratos turn key em geral têm características similares às dos
contratos EPC, mas, na prática, o que os distingue é a obra, objeto das
prestações do construtor contratado.
Especificamente, a obra em si é mais complexa e de maior vulto, e
deverá ser entregue pronta para operar – que também reflete no prazo
contratual sendo mais longo devido aos períodos de testes – como seu nome
indica mediante um giro numa chave.
Essa modalidade é amplamente aplicada no setor elétrico, pois neste
setor as obras têm uma função diretamente produtiva. Por exemplo, a
construção de uma usina hidroelétrica pode ser formalizada por um contrato
turn key quando o objeto do contrato é a sua entrega com as obras civis
(barragens) completas e com os equipamentos destinados à produção
(turbinas geradoras, subestação, cabos elétricos, transformadores, etc)
instalados, testados e prontos a gerar a energia.
Um exemplo de aplicação do contrato turn key foi a construção da Usina
Nuclear Angra 114
, primeira usina nuclear brasileira, que entrou em operação
comercial em 1985 e gera energia suficiente para suprir uma cidade de 1
milhão de habitantes.
A aplicabilidade dos contratos EPC e turn key nos contratos que
envolvem as obras no setor elétrico brasileiro será aprofundada no próximo
capítulo.
II. APLICABILIDADE DOS CONTRATOS EPC ÀS OBRAS NO SETOR
ELÉTRICO BRASILEIRO
Conforma já citado acima, nas décadas de 70 e 80 era comum que a
Administração Pública prestasse diretamente serviços considerados
essenciais. Para tal, contratava diretamente as empreiteiras responsáveis pela
construção do empreendimento, que depois seria administrado por uma
empresa estatal.
Daniel S. C. Chen esclarece que o contrato de engineering começou a
ser desenvolvido no Brasil “nos anos 1960 e 1970 com o intuito protecionista
para desenvolver a infraestrutura nacional, mediante a construção de grandes
obras como hidrelétricas, pontes e aeroportos”15
.
Em 1997, foi editado o Programa Nacional de Desestatização (Lei nº
9.491), que tinha, como um de seus objetivos fundamentais, “reordenar a
posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada
atividades indevidamente exploradas pelo setor público”16
.
Uma das atividades que teve sua exploração transferida ao setor privado
foi a de geração e fornecimento de energia elétrica. O Estado, que antes
14
Disponível em <www.ipea.com.br>. Acesso em 20 de Fevereiro de 2015.
15
Ibid, p. 3.
16
Lei n. 9.491, de 9 de setembro de 1997. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Aceso
em 12 de Fevereiro de 2015.
8
gastava para construir a infraestrutura e para fornecer o serviço, mediante a
cobrança de taxas, passou a ser mero fiscalizador e regulador (através das
agências reguladoras, no caso, a ANEEL – Agência Nacional de Energia
Elétrica17
).
A responsabilidade pela obra e pelo fornecimento durante o prazo
previsto no contrato de concessão (30 anos, por exemplo) passou a ser das
concessionárias, que passaram a contratar empreiteiras para fazer as obras de
infraestrutura – subestações e linhas de transmissão.
Considerando que estas obras são de alta complexidade, e necessitam
da participação de especialidades econômicas, administrativas, contábeis,
diversas engenharias e, enfim, jurídicas, o contrato EPC consegue abarcar
todas as contribuições multidisciplinares.
O fato de o contrato EPC ter sido criado e aperfeiçoado através da
prática contratual empresarial, além de possuir uma mínima previsão legal –na
legislação brasileira os artigos conferidos ao contrato de empreitada, no Código
Civil – permite que o mesmo seja perfeitamente adaptado a qualquer projeto de
obra no setor elétrico.
Lie Uema do Carmo18
demonstra, em sua tese de doutorado, o albergue
da estrutura contratual de um EPC com relação à complexidade das grandes
obras de infraestrutura:
O programa do contrato de construção, na maior parte dos
desenhos contratuais adotados, mas especialmente naqueles
de design-build e design-manage, revela-se um intrincado e
articulado conjunto de módulos ou partes: as obrigações, os
direitos, as responsabilidades das partes são longamente
especificados, em detalhes; as declarações e garantias são
igualmente tratadas em minúcias. As cláusulas do contrato auto
referenciam-se. O instrumento contratual incorpora inúmeros
outros documentos.
No próximo capítulo, iremos citar algumas das cláusulas padrão dos
contratos EPC, e o tratamento legal nas disposições dos contratos de
empreitadas contidas no Código Civil Brasileiro.
III. ASPECTOS CONTRATUAIS
Conforme explicitado acima, o Contrato EPC tem sido utilizado na
construção de infraestrutura de fornecimento de energia elétrica do país, mais
precisamente na construção de linhas de transmissão e subestações. Assim,
ao se elaborar um contrato entre concessionária e empreiteira, algumas
questões devem ser apreciadas.
17
Instituída pela Lei nº 9.427/96. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 de
Fevereiro de 2015.
18
CARMO, Lie Uema do. Contratos de Construção de Grandes Obras. 2012. Tese (Doutorado
em Direito Comercial)-Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 13.
9
A seguir, elencamos três pontos importantes, que requerem atenção no
momento anterior à elaboração do Contrato:
a) Clima e Solo. Essas obras, normalmente, passam por longos trechos
com características geográficas peculiares. Variações de clima e solo são
comuns, e tornam a obra mais complexa e, por consequência mais arriscada.
É comum, por exemplo, a passagem de linhas de transmissão por
trechos de florestas densas, rios, mangues, etc. Os diferentes tipos de solo
encontrados ao longo de uma linha de transmissão representam grande
dificuldade e, por consequência, um custo maior para a obra. Esses custos
devem ser corretamente orçados pela empreiteira, aumentando a importância
da fase de projetos.
Um projeto mal feito pode resultar num custo maior e não previsto, além
de uma extensão do prazo. Assim, as responsabilidades de uma parte e de
outra devem estar bem determinadas no contrato, de forma que, deparada com
uma condição climática adversa e imprevisível para o local, a empreiteira não
incorra em prejuízos que denotem o desequilíbrio econômico financeiro do
contrato.
b) Aspectos Ambientais. Outra questão que merece atenção é a
legislação ambiental19
. No Brasil existem, por exemplo, diversas restrições e
regras para a supressão de algumas espécies de vegetação. Da mesma forma,
uma espécie de animal em extinção pode gerar a alteração de trajeto da linha
de transmissão, aumentando os custos da obra20
.
Essas variáveis devem ser previstas pela empreiteira, e suas
consequências apreciadas no contrato. Deparada com uma restrição ambiental
não prevista no projeto inicial, e que denote a alteração do traçado da linha de
transmissão, ou o aumento do prazo da obra durante sua execução, as
responsabilidades devem estar claramente previstas no contrato.
c) Direitos de Propriedade. Por fim, outro tema que merece atenção é
a presença de propriedades particulares no trecho da obra. Neste caso, o
contrato deve prever de quem será a responsabilidade pela negociação com os
proprietários, para que a empreiteira possa ter o direito de ir e vir no local, e a
19
A Lei n. 9.605 de 1998 dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e a Lei 12.651 de 2012 (Código Florestal) são
algumas das mais importantes fontes legais do direito ambiental brasileiro. As Resoluções do
CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e as Leis Ambientais Estaduais e Municipais
também devem ser consideradas pela empreiteira.
20
No Rio de Janeiro, a construção de um arco rodoviário foi comprometida pela presença, em
certo trecho do trajeto, de uma espécie de anfíbio que tinha, naquele local, seu único habitat. A
alteração do trajeto aumentou o prazo da obra e consequentemente, seu custo. Na ocasião, foi
construído um viaduto. “Perereca em extinção é protegida por viaduto” Disponível em
<http://blog-rodoviario.blogspot.com.br>. “Lula volta a reclamar da 'perereca' que atrasa obras”.
Disponível em <http://oglobo.globo.com/politica>. Todos com acesso em 15 de fevereiro de
2015.
10
concessionária tenha o direito de manter, ali, uma parte de seu
empreendimento – através dos institutos de direito administrativo da servidão.
O proprietário pode negar este direito, e, neste caso, uma das soluções
é desviar o traçado da linha de transmissão, o que representa custos extras à
obra. Mais uma vez, nota-se a importância de um contrato bem detalhado
sobre as responsabilidades frente à situações imprevistas.
Citadas estas três importantes questões, que devem ser detalhadamente
observadas nos contratos EPC, cumpre também mencionar especificidades
nas demais cláusulas contratuais. Por isso, estão elencadas abaixo algumas
cláusulas que geram potenciais controvérsias durante a execução do contrato.
Antes, cumpre citar lição de Gómez et alli21
, sobre a importância da boa
elaboração do contrato:
Antes de ser definida a contratação da execução do
empreendimento pelo mecanismo EPC – turn key, devem ser
levadas em consideração várias particularidades desse
processo, desde o momento da concepção até a entrega por
parte da contratada, passando pelos processos de gestão dos
contratos, pagamento e modificação das especificações
iniciais.
3.1. Obrigações das Partes. Como visto nos capítulos I e II deste
artigo, uma das características do contrato EPC é o aumento das
responsabilidades do empreiteiro.
O ideal é que tanto as obrigações do contratado quanto do contratante
estejam previstas com riqueza de detalhes no contrato. Da mesma forma, é de
suma importância que as cláusulas não sejam por demais genéricas. Assim,
por mais que isto torne a cláusula extensa, esta deve prever quase que
exaustivamente todas as obrigações das partes.
Um bom exemplo é a responsabilidade pela negociação e liberação das
áreas situadas em propriedades particulares para a realização da obra, na
hipótese do traçado da linha de transmissão passar por dentro de uma
fazenda, por exemplo.
Quando a cláusula que prevê as obrigações da contratante determina,
como uma de suas responsabilidades, a liberação das áreas, sem especificar
se esta liberação diz respeito aos órgãos públicos, proprietários, qualquer
negativa de acesso à empreiteira pode justificar a paralisação da obra até que
a contratante solucione o problema – a título de exemplo, embargos fundiários
ou entraves na desapropriação parcial ou total.
Muitas vezes, a negativa do proprietário está atrelada a uma
contraprestação. Impõe-se à empreiteira, como condição para a entrada na
propriedade, a realização de benfeitorias, como criação de estradas de acesso,
reformas nos acessos já existentes, etc.
21
GÓMEZ, op cit, p. 65.
11
A realização de benfeitorias demanda tempo e dinheiro não previstos
pela empreiteira. Não se pode dizer que a área está liberada, pois há uma
condição para a entrada. Por outro lado, não se trata de um embargo judicial
ou administrativo.
Surge, portanto, a controvérsia: a responsabilidade pela realização das
benfeitorias é da contratada, que tem a obrigação de construir e, portanto, de
transportar seus funcionários e materiais ao local, ou da contratante, que é a
responsável pela liberação da área?
Este é um breve exemplo que ocorre nas grandes obras de
infraestrutura, e que deve ser, se possível, dirimido previamente através de um
detalhamento das cláusulas de obrigações.
Especial atenção deve ser concedida à obrigação de buscar a emissão
da licença para início da obra, junto aos órgãos públicos (normalmente
chamada de licença de instalação). É comum que, nos contratos EPC para
construção de linhas de transmissão, esta responsabilidade seja da
concessionária, que mantém relação contratual direta com a administração
pública.
Neste caso, a concessionária deve cumprir os prazos previstos tanto no
contrato de concessão quanto no contrato EPC. A empreiteira, quando orça os
custos da obra, o faz com base nos prazos e condições do contrato de
concessão. Qualquer variação posterior pode comprometer o orçamento, e, por
consequência, o equilíbrio contratual.
Isto porque, conforme já citado, as regiões por onde passam as linhas
de transmissão têm características climáticas peculiares, que podem interferir
gravemente no ritmo de produção da obra.
Supondo que a empreiteira tenha feito seus estudos e chegado à
conclusão que, em determinado trecho, entre os meses de Novembro e
Fevereiro, o regime de chuvas faça com que o solo fique alagado,
impossibilitando a entrada de veículos e a fundação das torres.
Ora, neste caso, a empreiteira irá planejar-se para iniciar a obra no mês
de Março, concentrando esforços para finalizar a obra – ou a maior parte dela –
até o mês de Novembro, quando o solo novamente irá ficar alagado.
Caso a concessionária não tenha conseguido a emissão da licença para
iniciar a obra no mês de Março, todo o cronograma da empreiteira ficará
comprometido, o que poderá significar atraso na finalização e aumento nos
custos.
3.2. Prazo. O fornecimento de energia elétrica é um serviço essencial.
Quando a Agência Nacional de Energia Elétrica abre uma licitação para
escolher a empresa que será responsável por este serviço para determinada
área, já há, provavelmente, uma demanda local (podemos ser, inclusive, um
evento futuro e certo, como a realização da Copa do Mundo de 2014 e as
Olimpíadas de 2016).
12
Assim, o prazo previsto no contrato de concessão e, por consequência,
no contrato EPC assinado entre a concessionária e a empreiteira, tem que ser
respeitado, sob pena de imposição de multas pela ANEEL.
Duas questões são de suma importância na cláusula que prevê o prazo
da obra:
(i) O prazo em si, que deve ser previsto pela empreiteira após estudos e
projetos, dentro do limite imposto no contrato de concessão. Deve-se ter em
conta que é a empreiteira que deve fazer os estudos de solo e definir o prazo
que levará para executar a obra;
(ii) As situações que justificam a prorrogação do prazo, e a
responsabilidade pelos custos durante esta prorrogação, inclusive pelo
pagamento de possíveis multas impostas pelo poder público. A obra pode
atrasar por diversos motivos, e nem sempre por culpa da empreiteira.
Deparando-se com uma destas situações, contratante e contratada devem
recorrer imediatamente ao contrato, e este deve determinar de quem será o
custo. Desta forma, o atraso não se prolonga em uma discussão
extracontratual.
3.3. Preço. Da mesma forma que o prazo, o custo da obra pode sofrer
variações ao longo da execução. Desvios causados por questões ambientais
ou arqueológicas, negociações com proprietários, são motivos que aumentam
os gastos. A cláusula do preço da obra deve, portanto, prever:
(i) Quais as situações que justificam a alteração do preço da obra; e
(ii) A forma com que será feita esta alteração. O ideal é que qualquer
acréscimo de preço seja feito mediante a assinatura de um Termo Aditivo ao
Contrato.
O preço do contrato está diretamente vinculado também ao prazo.
Assim, caso a concessionária prorrogue o prazo da obra, por causas alheias à
vontade da empreiteira, esta terá direito ao acréscimo no preço, pois a maior
permanência das equipes em campo denota alteração no custo inicialmente
previsto.
3.4. Subcontratação. Como já foi dito acima, normalmente os contratos
EPC são utilizados para grandes obras de infraestrutura. Tratando-se
precisamente de linhas de transmissão e subestações, o escopo de obrigações
é muito abrangente, o que justifica a subcontratação, pela empreiteira, de
empresas especializadas em atividades específicas.
A reposição ambiental é um exemplo de atividade que, normalmente,
não está no rol de atividades da empreiteira, justificando a contratação de uma
terceira empresa que preste tal serviço. Outro exemplo é o fornecimento de
transformadores de energia, que muitas vezes é feito por empresas
estrangeiras especializadas.
Assim, a possibilidade de subcontratação de terceiros deve estar
prevista no contrato, bem como a responsabilidade pela gerência desta
13
subcontratação (que normalmente é da própria empreiteira) e a possibilidade
de faturamento direto, isto é, a contratante paga diretamente à subcontratada
pelo serviço, diminuindo a carga tributária da operação.
3.5. Cláusula de força maior e caso fortuito. O Código Civil Brasileiro,
em seu artigo 393, determina que “o devedor não responde pelos prejuízos
resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver
por eles responsabilizado”22
. O mesmo Codex prevê, no artigo 625, que o
empreiteiro poderá suspender a obra “por culpa do dono, ou por motivo de
força maior”.
Necessário, portanto, entender o conceito e a aplicabilidade destes dois
institutos. Entende-se como “força maior” e “caso fortuito”, o fato imprevisível
ou difícil de prever que gera uma ou mais consequências inevitáveis. A
ocorrência de uma tempestade atípica na região onde está sendo feita a obra,
e a consequente interdição do trecho de uma estrada, por exemplo, justificam a
aplicação da cláusula de caso fortuito ou força maior.
José dos Santos Carvalho Filho23
leciona que o caso fortuito “decorre de
eventos da natureza, como catástrofes, ciclones, tempestades anormais”,
enquanto a força maior “é resultado de um fato causado, de alguma forma, pela
vontade humana, como é o clássico exemplo da greve”. O autor ressalta que a
lei não faz distinção entre os dois institutos, e que “ocorrendo tais situações,
rompe-se o equilíbrio contratual, porque uma das partes passa a sofrer um
encargo extremamente oneroso, não tendo dado causa para tanto”24
.
Na prática, recomenda-se prever, no contrato, condições à aplicabilidade
destes institutos, ou, pelo menos, restringir o rol de eventos que podem ser
classificados como tal. Por exemplo: a empreiteira é contratada para construir
uma linha de transmissão numa região onde, por característica, é comum
chover todos os dias em determinada estação do ano.
Sendo um contrato EPC, presume-se que a empreiteira, em seus
estudos para formação do projeto inicial, tomou ciência desta especificidade
climática, e fez seu planejamento com base nesta informação.
Assim, esta empreiteira não poderá, no futuro, requerer um acréscimo
de prazo e/ou preço contratual alegando motivo de caso fortuito/força maior,
qual seja, a ocorrência de chuvas intermitentes interferindo no ritmo de
produção. Ainda que seja um evento da natureza, este não é imprevisível, pois
o regime de chuvas é característico da região.
Nestes casos, o ônus de provar a imprevisibilidade, caso haja, e a
onerosidade excessiva, é da empreiteira.
Por esta razão, a redação genérica da cláusula de caso fortuito e força
maior, remetendo aos ditames do Código Civil, pode causar discussões
(“claims”) entre as partes, prejudicando o bom andamento da obra.
22
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 09
de Fevereiro de 2015.
23
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 232.
24
Ibid, p. 232.
14
É ideal que a cláusula faça menções expressas ao regime climático e
demais características geográficas locais. E mais: cada contrato deve conter
uma cláusula de caso fortuito e força maior específica, adequada às
características sui generis da região onde a obra será executada.
O contrato pode ser complementado por anexos onde constem gráficos
emitidos por órgãos oficiais (no Brasil, o INMET – Instituto Nacional de
Metereologia -, por exemplo), registrando o regime de chuvas na região. Tal
diligência, repita-se, evita futuros desentendimentos entre as partes.
3.6. Resolução de conflitos. Arbitragem. Opção do “dispute
boards”. A Lei nº 9.307/96, que dispõe sobre arbitragem, em seu artigo 1º
determina que, “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da
arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”25
.
Considerando que um contrato EPC cumpre com os requisitos acima,
uma cláusula arbitral normalmente é usada devido à complexidade e alta
tecnicidade que futuros litígios possam trazer, além da celeridade,
confidencialidade, agilidade e árbitros especializados, características inerentes
de uma arbitragem.
A eleição de um foro, isto é, a opção pelo Poder Judiciário, estaria
aquém de qualquer demanda contenciosa envolvendo contratos EPC, devido à
não especialização e a não familiaridade dos juízes com essas causas
complexas, sem considerar ainda a conhecida morosidade das decisões que
afetam os tribunais do Brasil, sobrecarregados de processos.
Há também o costume de se usar o instituto da peritagem em contratos
EPC. Geralmente, se o pleito contratual (“claim”) não extrapolar um limite
financeiro estipulado pelas partes no contrato, a causa será decidida por um
perito escolhido em comum acordo entre as partes. Caso o litígio ultrapasse o
valor limite estipulado, a causa será decidia pela via da arbitragem. As
decisões dos peritos não serão necessariamente vinculantes, porém auxiliam
de sobremaneira uma melhor composição entre as partes a um custo menor e
podem evitar que a arbitragem seja acionada.
Já o instituto do “dispute board”, de acordo com a DRBF26
, é um comitê
formado por profissionais experientes e imparciais, contratado antes do início
de um projeto de construção para acompanhar o progresso da execução da
obra, encorajando as partes a evitar disputas e assistindo-as na solução
daquelas que não puderem ser evitadas, visando à sua solução definitiva27
.
A fim de evitar que divergências surgidas ao longo da execução do
contrato, o “dispute board” (DB) oferece mecanismos de solução de
controvérsias assim que estas surgem, evitando que a conclusão da obra seja
afetada. Esta junta tem a função de mediar as divergências entre as partes que
25
Lei nº 9.307 de 23 de Setembro de 1996. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>.
Acesso em 15 de Fevereiro de 2015.
26
Dispute Resolution Board Foundation (organização estadunidense criada com o intuito de
promover o Dispute Board como meio de evitar conflitos durante a execução de contratos de
construção).
27
Este conceito é uma adaptação do que é oferecido na Seção 1, item 1.1, do DRBF Practices
and Procedures Manual, divulgado pela Dispute Resolution Board Foundation (www.drb.org).
15
surjam ao longo da execução do contrato, assim como, a emissão de um
laudo/parecer técnico, recomendando uma melhor resolução da controvérsia a
uma ou ambas as partes.
Geralmente, uma junta de DB é formada por dois engenheiros e um
advogado. Essa composição fortalece um melhor entendimento entre as
partes, pois duas especialidades trazem melhores pontos de vista e
acompanhamento contratual, facilitando uma composição de conflitos.
O custo de implementar uma junta de DB é muito menor se comparado à
instalação de uma arbitragem ou a um fatídico processo judicial. A própria
velocidade com que se alcança uma solução é um fator importante de
economia, além de reduzir os desgastes de um acúmulo de litígio ao final de
um contrato EPC.
Outro ponto interessante é a flexibilidade que um DB pode ser instituído,
ajustando-se às necessidades das partes e às peculiaridades de cada contrato
EPC.
Para incrementar as chances de sucesso, Antonio Fernando Mello
Marcondes28
propõe que o “DB aja como efetivo mediador, antes de atuar
realmente como órgão de recomendação técnica ou de adjudicação de
soluções”.
Semelhante à opção pela arbitragem, o rito de um DB pode ser previsto
livremente entre as partes, porém, de modo geral, as partes preveem que um
DB será contratado para acompanhamento da obra. A cláusula contratual
poderá conter o detalhamento do regulamento a ser seguido pelo DB e pelas
partes, ou pode simplesmente remeter a um regulamento disponibilizado por
uma entidade especializada.
No Brasil, o que se vê é a parca utilização deste instituto em contratos
complexos, como o EPC, onde possuem grande guarida. Trata-se de mais uma
grande ferramenta a ter seu uso incentivado e desenvolvido, demonstrando a
grande gama de benefícios conforme exposto acima.
CONCLUSÃO
De todo exposto, conclui-se que o contrato EPC foi criado diante da
necessidade do mercado em ter um modelo contratual onde o empreiteiro se
responsabilizasse por todas as fases da obra, desde seu projeto, passando
pela gestão de compras, até a construção em si.
No Brasil, tal modelo de contrato adequou-se à relação firmada entre as
concessionárias do serviço público de fornecimento de energia e as
empreiteiras, responsáveis pela construção da infraestrutura necessária à
prestação do serviço.
O rol de obrigações da empreiteira, no entanto, é extenso, e por tal
razão, recomenda-se que o contrato seja o mais detalhado possível, de forma
que os direitos e deveres das partes estejam bem definidos. Por se tratar de
um contrato que envolve alto investimento financeiro, é de suma importância
28
MARCONDES, Antônio Fernando Mello. Os Dispute Boards e os Contratos de Construção. in
BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011, p. 127.
16
que as responsabilidades sejam claramente previstas, bem como as hipóteses
e condições para aditivos de preço e prazo.
Em se tratando de um serviço essencial, qual seja, o fornecimento de
energia elétrica, um contrato bem específico evita lides onerosas e demoradas
evita o prejuízo ao maior interessado: o consumidor.
17
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora,
2011.
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>.
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2012.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
CHEN, Daniel Shem Cheng. Contrato de engineering. In: Âmbito Jurídico, Rio
Grande, XV, n. 104, set 2012. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site>.
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009-
2010.
GÓMEZ, Luiz Alberto, COELHO, Christianne C. S. Reinisch, DUCLÓS FILHO,
Elo Ortiz, Xavier, Sayonara M. T. Contratos EPC Turnkey. Florianópolis: Visual
Books, 2006.
GOMES, Orlando. Contratos. 26ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
MARCONDES, Antônio Fernando Mello. Os Dispute Boards e os Contratos de
Construção. in BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo:
Lex Editora, 2011.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Contratos. 18ª Ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2014.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Dos Contratos e das Declarações
Unilaterais de Vontade. 30ª Ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2006.

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CONTRATOS EM REGIME DE EMPREITADA GLOBAL NA MODALIDADE EPC - ENGINEERING, PROCUREMENT AND CONSTRUCTION: ASPECTOS CONTRATUAIS APLICADOS AO SETOR ELÉTRICO

  • 1. CONTRATOS EM REGIME DE EMPREITADA GLOBAL NA MODALIDADE EPC – ENGINEERING, PROCUREMENT AND CONSTRUCTION: ASPECTOS CONTRATUAIS APLICADOS AO SETOR ELÉTRICO Gustavo Buffara Bueno1 Mauro Lauria Reis Pedro Frederico Nodari INTRODUÇÃO O presente artigo tem por objetivo apresentar, de forma breve ao leitor. alguns aspectos importantes dos contratos em regime de EPC, mais precisamente naqueles assinados pelas concessionárias do setor elétrico brasileiro. Nesta espécie de contrato, uma empresa é contratada não só para fazer a obra, mas também projetá-la e adquirir os materiais necessários. O grande número de obrigações e responsabilidades faz com que a fase pré-contratual, e toda a elaboração do contrato, sejam de suma importância ao equilíbrio da relação firmada entre as partes. Não se pode esquecer que o equilíbrio das relações contratuais é um dos princípios do Direito Civil Brasileiro. Assim, no primeiro capítulo serão estudados os conceitos e características do contrato de empreitada e do contrato EPC. No segundo capítulo, será estudada a aplicabilidade dos contratos EPC às obras do setor elétrico brasileiro já que, atualmente, grande parte dos contratos assinados entre concessionárias que irão prestar o serviço de fornecimento de energia elétrica e as empreiteiras responsáveis pela construção das linhas de transmissão e subestações – infraestrutura necessária à prestação do serviço – é assinada sob o regime de EPC. No terceiro capítulo, serão abordadas algumas características específicas dos contratos de construção de linhas de transmissão e subestações, bem como algumas cláusulas importantes nesta espécie de contrato. A conclusão deste trabalho mostrará a importância da fase de elaboração do contrato, principalmente da divisão de responsabilidades, já que o objeto contratual, normalmente, são obras complexas e com alto custo financeiro. I. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO EPC 1 Por Gustavo Buffara Bueno (gbuffara@bbadv.adv.br), Mauro Lauria Reis (mauroreis@bbadv.adv.br) e Pedro Frederico Nodari (pedronodari@bbadv.adv.br), respectivamente sócio e advogados associados do Buffara Bueno & Bacaltchuc Advogados, com sede na Avenida Almirante Barroso, nº 63, sala 1109, Centro, Rio de Janeiro/RJ, CEP 22290-160.
  • 2. 2 1.1. Contrato de Empreitada: O contrato nada mais é que um acordo firmado entre duas ou mais partes, uma espécie de negócio jurídico no qual é necessária a manifestação de vontade de todas as partes nele envolvidas. Para que seja válido, segundo a lei civil brasileira2 , é necessário (i) que as partes que o celebram sejam capazes, (ii) que seu objeto seja lícito, possível, e determinado (ou determinável), e (iii) que sua forma esteja prescrita ou, pelo menos, não seja vedada pela lei. O Código Civil Brasileiro, no seu Título VI, elenca diversas espécies de contrato, como os de compra e venda, e o de locação. Entre essas espécies, está o contrato de empreitada, previsto nos artigos 610 a 626. Na lição de Silvio Rodrigues: Através do contrato de empreitada, uma das partes – o empreiteiro – se compromete a executar determinada obra, pessoalmente ou por meio de terceiros, em troca de certa remuneração fixa a ser paga pelo outro contratante – dono da obra -, de acordo com o dono da obra, e sem relação de subordinação3 . Os contratos de empreitada são utilizados, principalmente, para formalizar acordos de construção, e servem de base para a formação do chamado contrato de “EPC”, como será visto adiante. No presente trabalho interessam-nos especialmente as construções que envolvem obras de grande porte, voltadas para a infraestrutura do setor elétrico do país. Nestes, os valores costumam ser expressivos, a complexidade na consecução das obras é alta, e há interesse direto da Administração Pública na sua conclusão. Tome-se como exemplo a construção de uma subestação e de uma linha de transmissão para gerar e fornecer energia elétrica para determinada região, abrangendo dez municípios. Os custos atingem a soma de milhões de reais, e há um interesse da Administração Pública de que a obra seja concluída no prazo contratual. Na prática, diante da necessidade da geração e do fornecimento de energia, e após a edição da Lei nº 8.666/93 – Lei das Licitações – a Administração Pública inicia uma licitação, isto é, abre a todas as empresas interessadas a possibilidade de prestar o serviço para determinada região. Empresas, ou até consórcios, participam da concorrência, e aquela que, grosso modo, melhor atender aos requisitos escolhidos, vence a licitação. Ato contínuo, é assinado um Contrato de Concessão, no qual a Administração Pública concede ao vencedor o direito de prestar o serviço. A concessionária, em troca da exploração financeira do fornecimento de energia aos dez municípios, deve prestar o serviço com qualidade, isto é, o 2 BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 09 de Fevereiro de 2015. 3 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade. 30ª Ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2006, p. 245.
  • 3. 3 serviço deve ser contínuo, e chegar a todos os moradores da região. Deve-se levar em consideração, por exemplo, o aumento no número de habitantes locais, ou o aumento de consumo de energia em determinadas épocas do ano. Nada disso justifica a queda na qualidade da prestação do serviço: a administração pública tem a prerrogativa de aplicar sanções à concessionária4 . Outro exemplo interessante, mesmo que fora do setor elétrico, ocorre quando a Administração Pública prioriza a construção de uma estrada de ligação entre dois ou mais Municípios. Essa construção envolve uma grande soma de recursos, e há um interesse público na conclusão da obra no tempo determinado. Aberta a licitação, diversas empresas apresentam suas propostas, e a vencedora ganha o direito de construir e explorar o direito de utilização da estrada, normalmente através de cobrança de tarifas dos usuários nos pedágios. A qualidade da estrada deve ser garantida pela concessionária pelo tempo que durar o contrato de concessão. Diversos são os exemplos, pois este procedimento obedece às regras determinadas não só pela Lei das Licitações, mas também pela Lei nº 8.987/95 (Lei de Concessões Públicas), que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos. Cumpre esclarecer que o advento das duas leis supracitadas, juntamente com outras medidas, fez parte de um processo de desestatização pelo qual passou o Brasil durante a década de 1990. Isto porque, até então, a maioria dos serviços considerados essenciais era prestada pelo próprio Estado, por meio das empresas estatais. Fornecimento de energia elétrica, gás, telecomunicações, são exemplos de serviços que tiveram sua prestação delegada a particulares. Neste sentido, o Estado delegou a função, mas se cercou de regras tanto para a escolha da empresa particular que irá prestar o serviço (Lei 8.666/93 - Licitações), quanto para a concessão do direito (Lei 8.987/95 – Concessões Públicas). Pode-se afirmar que passou de prestador direto para fiscalizador e regulador da prestação dos serviços públicos. 1.2. Contrato de Engineering e EPC: Devido aos custos elevados e à alta complexidade desse tipo de obra, é comum que a concessionária que irá prestar o serviço contrate uma empreiteira para construir a infraestrutura necessária. Sobre essa questão, cumpre citar lição de Gómez et alli5 : 4 Em Junho de 2012 a Administração Pública, representada pela ANEEL, multou a CHESF (Companhia Hidroelétrica do São Francisco) em R$ 32,2 milhões de Reais por um blecaute que atingiu 8 estados do Nordeste no mês de Fevereiro de 2010. A fundamentação da multa foi o não cumprimento de um plano de modernização e atualização das cadeias de proteção de linhas de transmissão do sistema de energia. 5 GÓMEZ, Luiz Alberto, COELHO, Christianne C. S. Reinisch, DUCLÓS FILHO, Elo Ortiz, Xavier, Sayonara M. T. Contratos EPC Turnkey. 1ª Ed. Florianópolis: Visual Books, 2006, p. 2.
  • 4. 4 A aprovação do Regime de Concessão de Serviços Públicos, instituído através da Lei 8.987 de 1995, assim como a criação de regimes especiais de autorização para exploração de instalações de geração de energia elétrica pelo setor privado, na modalidade de produção independente de energia elétrica (...) deram lugar à negociação de contratos de construção de grandes obras de engenharia, geralmente sob o regime da empreitada global. Tais características refletiram nos contratos assinados entre a concessionária vencedora e a empreiteira responsável. O conjunto de obrigações assumidas pela empreiteira ultrapassava o escopo previsto no Código Civil Brasileiro, mais precisamente no capítulo destinado aos contratos de empreitada. Desenvolveu-se, dentro das relações contratuais empresariais e sem previsão legal, uma nova espécie de contrato, o de engineering que, segundo Caio Mário, tem por objeto a assistência técnica especializada em engenharia6 . Cumpre citar que a doutrina brasileira não é majoritária quanto à natureza jurídica deste contrato. Orlando Gomes sustenta que: “o contrato de engineering é considerado um contrato atípico da espécie contrato misto, no entendimento que resulta da justaposição de prestações características de vários contratos típicos”7 . No mesmo sentido, Caio Mário o classifica como uma nova modalidade de contrato8 . O Enunciado nº 34 da I Jornada de Direito Comercial9 , traz a seguinte observação: “34. Com exceção da garantia contida no artigo 618 do Código Civil, os demais artigos referentes, em especial, ao contrato de empreitada (arts. 610 a 626) aplicar-se-ão somente de forma subsidiária às condições contratuais acordadas pelas partes de contratos complexos de engenharia e construção, tais como EPC, EPC-M e Aliança.” Em sentido inverso, Fabio Ulhoa Coelho afirma que engineering: 6 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Contratos. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 558. 7 GOMES, Orlando. Contratos. 26ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.579. 8 Não por acaso, na obra “Instituições de Direito Civil”, volume III, o conceito de contrato de engineering encontra-se no capítulo destinado às novas modalidades de contrato, enquanto o conceito do contrato de empreitada encontra-se na parte destinada às espécies clássicas de contrato, previstas no Código Civil. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. Cit. 9 A I Jornada de Direito Comercial ocorreu no período de 22 a 24 de outubro de 2012, em Brasília-DF, com a participação de 172 juristas, entre professores especialmente convidados, magistrados federais e estaduais, membros do Ministério Público, advogados, defensores públicos, procuradores de entidades públicas, os quais apresentaram um total de 250 proposições de enunciados interpretativos da legislação de Direito Comercial.
  • 5. 5 É a empreitada de grande porte (...), que normalmente compreende tanto o projeto como a execução e está associado a duas outras obrigações contraídas pelo empreiteiro: financiamento da obra e prestação de serviços de assessoria técnica na implantação de seu uso10 . Seguindo o mesmo entendimento, Luiz Olavo Baptista11 assim leciona: Os contratos EPC apresentam características que nos permitem qualificá-los como sendo contratos de empreitada. Com efeito, o objeto do contrato é fazer uma obra por conta de alguém, portanto, similar ao da empreitada; o objeto das obrigações do Construtor EPC é o mesmo da obrigação do empreiteiro, ou seja, uma obrigação de fazer, a obrigação do dono da obra, de pagar, também coincide. Finalmente, o objeto da prestação do empreiteiro é a obra e a do dono da obra é o preço contratado. Acrescenta ainda o autor que “[…] olhando sob o prisma econômico, o contrato visa adquirir uma obra que será feita por alguém, mediante retribuição”. Filiamo-nos à corrente que entende ser o contrato de engineering uma espécie de contrato de empreitada. Em ambos, há o dono da obra pagando um preço para o empreiteiro construir. Segundo o Código Civil, em seu artigo 610, o empreiteiro pode contribuir para a obra apenas com seu trabalho ou também fornecendo os materiais. É desse ponto que parte o contrato de engineering, isto é, a empreiteira que construirá a obra será responsável pela construção, administração e compra dos materiais. Não há um instituto novo; há um contrato clássico adaptado à complexidade das grandes obras de infraestrutura necessárias ao desenvolvimento do país. As regras aplicáveis às empreiteiras aplicam-se a essa modalidade, apesar das diferenças nos respectivos objetos da prestação. O que define a empreitada e a distinguiu de outros contratos são certas qualidades havidas como essenciais pelo legislador. Essas incluem a relação jurídica e econômica entre o dono da obra e o empreiteiro, a existência de um objeto da obrigação, que é o dever de fazer, e para a prestação que é a obra. Nessa toada, o caráter comutativo, sinalagmático, consensual, e de execução continuada completa o quadro de características do contrato de empreitada que também estão presentes no contrato de engineering. 10 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009-2010, p. 285. 11 BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011, p. 38.
  • 6. 6 Cumpre ressaltar que a expressão “Contratos EPC – Engineering, Procurement and Construction”, foi convencionada pelo mercado, e nada mais é do que uma representação do escopo de obrigações da empreiteira, a quem são imputadas as obrigações pelo projeto da obra, pela aquisição dos recursos humanos e materiais necessários, e pela construção em si. Atualmente, contrato de engineering e contrato EPC são espécies que se confundem. Dirimida a controvérsia, cumpre também citar uma das características desta nova espécie de empreitada: o aumento das obrigações do empreiteiro (ou “epcista”, conforme nomenclatura de mercado). Se o Código Civil, conforme visto acima, prevê que o empreiteiro pode colaborar apenas executando a obra ou também fornecendo o material, nos contratos celebrados entre as concessionárias e as empreiteiras, estas contribuem com (i) as atividades de engenharia (daí a classificação como “contratos de engineering”), (ii) administração de compras e (iii) construção propriamente dita12 . Além do aumento das obrigações do empreiteiro, é nítida a menor participação da concessionária na construção do empreendimento que vai possibilitar a exploração do serviço. 1.3. Contratos “Turn Key”: Não de pode deixar de mencionar os contratos turn key, que são vistos por alguns como um tipo de EPC em que as obrigações da contratada seriam mais extensas. Como quase todos os modelos desenvolvidos pela prática nos negócios, ele tem algumas características comuns que configuram e confirmam a modalidade, e outras dependentes de condições específicas da obra ou dos interesses das partes. Gómez et alli13 observam que nos contratos de EPC turn key: [...] os empreiteiros vão assumir responsabilidade de completar e/ou desenvolver os projetos incompletos desde o momento em que foi fechado o contrato. Porém, como geralmente ocorre em grandes projetos de engenharia, a dona e o consultor têm preparado o projeto básico e um conjunto de especificações técnicas, e a transmissão de responsabilidades para o empreiteiro ocorre nesse ponto. Nesse contrato, o construtor contratado tem a seu cargo a entrega da obra apta a funcionar sem mais formalidades – daí a expressão turn key, que se refere a acionar uma chave para dar partida na produção, por exemplo, entregar a obra de uma subestação e respectivas linhas de transmissão aptas 12 Daniel S. C. Chen esclarece que “na língua inglesa, o contrato de engineering é conhecido como Contrato de EPC. A sigla EPC significa Engineering, Procurement and Construction, isto é, engenharia, gestão de compras e construção”. CHEN, Daniel Shem Cheng. Contrato de engineering. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 104, set 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site>. Acesso em 11 de Fevereiro de 2015. 13 GÓMEZ, op cit, p. 66.
  • 7. 7 a transmitir energia e conectadas com o sistema integrado nacional de transmissão de energia. Os contratos turn key em geral têm características similares às dos contratos EPC, mas, na prática, o que os distingue é a obra, objeto das prestações do construtor contratado. Especificamente, a obra em si é mais complexa e de maior vulto, e deverá ser entregue pronta para operar – que também reflete no prazo contratual sendo mais longo devido aos períodos de testes – como seu nome indica mediante um giro numa chave. Essa modalidade é amplamente aplicada no setor elétrico, pois neste setor as obras têm uma função diretamente produtiva. Por exemplo, a construção de uma usina hidroelétrica pode ser formalizada por um contrato turn key quando o objeto do contrato é a sua entrega com as obras civis (barragens) completas e com os equipamentos destinados à produção (turbinas geradoras, subestação, cabos elétricos, transformadores, etc) instalados, testados e prontos a gerar a energia. Um exemplo de aplicação do contrato turn key foi a construção da Usina Nuclear Angra 114 , primeira usina nuclear brasileira, que entrou em operação comercial em 1985 e gera energia suficiente para suprir uma cidade de 1 milhão de habitantes. A aplicabilidade dos contratos EPC e turn key nos contratos que envolvem as obras no setor elétrico brasileiro será aprofundada no próximo capítulo. II. APLICABILIDADE DOS CONTRATOS EPC ÀS OBRAS NO SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO Conforma já citado acima, nas décadas de 70 e 80 era comum que a Administração Pública prestasse diretamente serviços considerados essenciais. Para tal, contratava diretamente as empreiteiras responsáveis pela construção do empreendimento, que depois seria administrado por uma empresa estatal. Daniel S. C. Chen esclarece que o contrato de engineering começou a ser desenvolvido no Brasil “nos anos 1960 e 1970 com o intuito protecionista para desenvolver a infraestrutura nacional, mediante a construção de grandes obras como hidrelétricas, pontes e aeroportos”15 . Em 1997, foi editado o Programa Nacional de Desestatização (Lei nº 9.491), que tinha, como um de seus objetivos fundamentais, “reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público”16 . Uma das atividades que teve sua exploração transferida ao setor privado foi a de geração e fornecimento de energia elétrica. O Estado, que antes 14 Disponível em <www.ipea.com.br>. Acesso em 20 de Fevereiro de 2015. 15 Ibid, p. 3. 16 Lei n. 9.491, de 9 de setembro de 1997. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Aceso em 12 de Fevereiro de 2015.
  • 8. 8 gastava para construir a infraestrutura e para fornecer o serviço, mediante a cobrança de taxas, passou a ser mero fiscalizador e regulador (através das agências reguladoras, no caso, a ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica17 ). A responsabilidade pela obra e pelo fornecimento durante o prazo previsto no contrato de concessão (30 anos, por exemplo) passou a ser das concessionárias, que passaram a contratar empreiteiras para fazer as obras de infraestrutura – subestações e linhas de transmissão. Considerando que estas obras são de alta complexidade, e necessitam da participação de especialidades econômicas, administrativas, contábeis, diversas engenharias e, enfim, jurídicas, o contrato EPC consegue abarcar todas as contribuições multidisciplinares. O fato de o contrato EPC ter sido criado e aperfeiçoado através da prática contratual empresarial, além de possuir uma mínima previsão legal –na legislação brasileira os artigos conferidos ao contrato de empreitada, no Código Civil – permite que o mesmo seja perfeitamente adaptado a qualquer projeto de obra no setor elétrico. Lie Uema do Carmo18 demonstra, em sua tese de doutorado, o albergue da estrutura contratual de um EPC com relação à complexidade das grandes obras de infraestrutura: O programa do contrato de construção, na maior parte dos desenhos contratuais adotados, mas especialmente naqueles de design-build e design-manage, revela-se um intrincado e articulado conjunto de módulos ou partes: as obrigações, os direitos, as responsabilidades das partes são longamente especificados, em detalhes; as declarações e garantias são igualmente tratadas em minúcias. As cláusulas do contrato auto referenciam-se. O instrumento contratual incorpora inúmeros outros documentos. No próximo capítulo, iremos citar algumas das cláusulas padrão dos contratos EPC, e o tratamento legal nas disposições dos contratos de empreitadas contidas no Código Civil Brasileiro. III. ASPECTOS CONTRATUAIS Conforme explicitado acima, o Contrato EPC tem sido utilizado na construção de infraestrutura de fornecimento de energia elétrica do país, mais precisamente na construção de linhas de transmissão e subestações. Assim, ao se elaborar um contrato entre concessionária e empreiteira, algumas questões devem ser apreciadas. 17 Instituída pela Lei nº 9.427/96. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 de Fevereiro de 2015. 18 CARMO, Lie Uema do. Contratos de Construção de Grandes Obras. 2012. Tese (Doutorado em Direito Comercial)-Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012, p. 13.
  • 9. 9 A seguir, elencamos três pontos importantes, que requerem atenção no momento anterior à elaboração do Contrato: a) Clima e Solo. Essas obras, normalmente, passam por longos trechos com características geográficas peculiares. Variações de clima e solo são comuns, e tornam a obra mais complexa e, por consequência mais arriscada. É comum, por exemplo, a passagem de linhas de transmissão por trechos de florestas densas, rios, mangues, etc. Os diferentes tipos de solo encontrados ao longo de uma linha de transmissão representam grande dificuldade e, por consequência, um custo maior para a obra. Esses custos devem ser corretamente orçados pela empreiteira, aumentando a importância da fase de projetos. Um projeto mal feito pode resultar num custo maior e não previsto, além de uma extensão do prazo. Assim, as responsabilidades de uma parte e de outra devem estar bem determinadas no contrato, de forma que, deparada com uma condição climática adversa e imprevisível para o local, a empreiteira não incorra em prejuízos que denotem o desequilíbrio econômico financeiro do contrato. b) Aspectos Ambientais. Outra questão que merece atenção é a legislação ambiental19 . No Brasil existem, por exemplo, diversas restrições e regras para a supressão de algumas espécies de vegetação. Da mesma forma, uma espécie de animal em extinção pode gerar a alteração de trajeto da linha de transmissão, aumentando os custos da obra20 . Essas variáveis devem ser previstas pela empreiteira, e suas consequências apreciadas no contrato. Deparada com uma restrição ambiental não prevista no projeto inicial, e que denote a alteração do traçado da linha de transmissão, ou o aumento do prazo da obra durante sua execução, as responsabilidades devem estar claramente previstas no contrato. c) Direitos de Propriedade. Por fim, outro tema que merece atenção é a presença de propriedades particulares no trecho da obra. Neste caso, o contrato deve prever de quem será a responsabilidade pela negociação com os proprietários, para que a empreiteira possa ter o direito de ir e vir no local, e a 19 A Lei n. 9.605 de 1998 dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e a Lei 12.651 de 2012 (Código Florestal) são algumas das mais importantes fontes legais do direito ambiental brasileiro. As Resoluções do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e as Leis Ambientais Estaduais e Municipais também devem ser consideradas pela empreiteira. 20 No Rio de Janeiro, a construção de um arco rodoviário foi comprometida pela presença, em certo trecho do trajeto, de uma espécie de anfíbio que tinha, naquele local, seu único habitat. A alteração do trajeto aumentou o prazo da obra e consequentemente, seu custo. Na ocasião, foi construído um viaduto. “Perereca em extinção é protegida por viaduto” Disponível em <http://blog-rodoviario.blogspot.com.br>. “Lula volta a reclamar da 'perereca' que atrasa obras”. Disponível em <http://oglobo.globo.com/politica>. Todos com acesso em 15 de fevereiro de 2015.
  • 10. 10 concessionária tenha o direito de manter, ali, uma parte de seu empreendimento – através dos institutos de direito administrativo da servidão. O proprietário pode negar este direito, e, neste caso, uma das soluções é desviar o traçado da linha de transmissão, o que representa custos extras à obra. Mais uma vez, nota-se a importância de um contrato bem detalhado sobre as responsabilidades frente à situações imprevistas. Citadas estas três importantes questões, que devem ser detalhadamente observadas nos contratos EPC, cumpre também mencionar especificidades nas demais cláusulas contratuais. Por isso, estão elencadas abaixo algumas cláusulas que geram potenciais controvérsias durante a execução do contrato. Antes, cumpre citar lição de Gómez et alli21 , sobre a importância da boa elaboração do contrato: Antes de ser definida a contratação da execução do empreendimento pelo mecanismo EPC – turn key, devem ser levadas em consideração várias particularidades desse processo, desde o momento da concepção até a entrega por parte da contratada, passando pelos processos de gestão dos contratos, pagamento e modificação das especificações iniciais. 3.1. Obrigações das Partes. Como visto nos capítulos I e II deste artigo, uma das características do contrato EPC é o aumento das responsabilidades do empreiteiro. O ideal é que tanto as obrigações do contratado quanto do contratante estejam previstas com riqueza de detalhes no contrato. Da mesma forma, é de suma importância que as cláusulas não sejam por demais genéricas. Assim, por mais que isto torne a cláusula extensa, esta deve prever quase que exaustivamente todas as obrigações das partes. Um bom exemplo é a responsabilidade pela negociação e liberação das áreas situadas em propriedades particulares para a realização da obra, na hipótese do traçado da linha de transmissão passar por dentro de uma fazenda, por exemplo. Quando a cláusula que prevê as obrigações da contratante determina, como uma de suas responsabilidades, a liberação das áreas, sem especificar se esta liberação diz respeito aos órgãos públicos, proprietários, qualquer negativa de acesso à empreiteira pode justificar a paralisação da obra até que a contratante solucione o problema – a título de exemplo, embargos fundiários ou entraves na desapropriação parcial ou total. Muitas vezes, a negativa do proprietário está atrelada a uma contraprestação. Impõe-se à empreiteira, como condição para a entrada na propriedade, a realização de benfeitorias, como criação de estradas de acesso, reformas nos acessos já existentes, etc. 21 GÓMEZ, op cit, p. 65.
  • 11. 11 A realização de benfeitorias demanda tempo e dinheiro não previstos pela empreiteira. Não se pode dizer que a área está liberada, pois há uma condição para a entrada. Por outro lado, não se trata de um embargo judicial ou administrativo. Surge, portanto, a controvérsia: a responsabilidade pela realização das benfeitorias é da contratada, que tem a obrigação de construir e, portanto, de transportar seus funcionários e materiais ao local, ou da contratante, que é a responsável pela liberação da área? Este é um breve exemplo que ocorre nas grandes obras de infraestrutura, e que deve ser, se possível, dirimido previamente através de um detalhamento das cláusulas de obrigações. Especial atenção deve ser concedida à obrigação de buscar a emissão da licença para início da obra, junto aos órgãos públicos (normalmente chamada de licença de instalação). É comum que, nos contratos EPC para construção de linhas de transmissão, esta responsabilidade seja da concessionária, que mantém relação contratual direta com a administração pública. Neste caso, a concessionária deve cumprir os prazos previstos tanto no contrato de concessão quanto no contrato EPC. A empreiteira, quando orça os custos da obra, o faz com base nos prazos e condições do contrato de concessão. Qualquer variação posterior pode comprometer o orçamento, e, por consequência, o equilíbrio contratual. Isto porque, conforme já citado, as regiões por onde passam as linhas de transmissão têm características climáticas peculiares, que podem interferir gravemente no ritmo de produção da obra. Supondo que a empreiteira tenha feito seus estudos e chegado à conclusão que, em determinado trecho, entre os meses de Novembro e Fevereiro, o regime de chuvas faça com que o solo fique alagado, impossibilitando a entrada de veículos e a fundação das torres. Ora, neste caso, a empreiteira irá planejar-se para iniciar a obra no mês de Março, concentrando esforços para finalizar a obra – ou a maior parte dela – até o mês de Novembro, quando o solo novamente irá ficar alagado. Caso a concessionária não tenha conseguido a emissão da licença para iniciar a obra no mês de Março, todo o cronograma da empreiteira ficará comprometido, o que poderá significar atraso na finalização e aumento nos custos. 3.2. Prazo. O fornecimento de energia elétrica é um serviço essencial. Quando a Agência Nacional de Energia Elétrica abre uma licitação para escolher a empresa que será responsável por este serviço para determinada área, já há, provavelmente, uma demanda local (podemos ser, inclusive, um evento futuro e certo, como a realização da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016).
  • 12. 12 Assim, o prazo previsto no contrato de concessão e, por consequência, no contrato EPC assinado entre a concessionária e a empreiteira, tem que ser respeitado, sob pena de imposição de multas pela ANEEL. Duas questões são de suma importância na cláusula que prevê o prazo da obra: (i) O prazo em si, que deve ser previsto pela empreiteira após estudos e projetos, dentro do limite imposto no contrato de concessão. Deve-se ter em conta que é a empreiteira que deve fazer os estudos de solo e definir o prazo que levará para executar a obra; (ii) As situações que justificam a prorrogação do prazo, e a responsabilidade pelos custos durante esta prorrogação, inclusive pelo pagamento de possíveis multas impostas pelo poder público. A obra pode atrasar por diversos motivos, e nem sempre por culpa da empreiteira. Deparando-se com uma destas situações, contratante e contratada devem recorrer imediatamente ao contrato, e este deve determinar de quem será o custo. Desta forma, o atraso não se prolonga em uma discussão extracontratual. 3.3. Preço. Da mesma forma que o prazo, o custo da obra pode sofrer variações ao longo da execução. Desvios causados por questões ambientais ou arqueológicas, negociações com proprietários, são motivos que aumentam os gastos. A cláusula do preço da obra deve, portanto, prever: (i) Quais as situações que justificam a alteração do preço da obra; e (ii) A forma com que será feita esta alteração. O ideal é que qualquer acréscimo de preço seja feito mediante a assinatura de um Termo Aditivo ao Contrato. O preço do contrato está diretamente vinculado também ao prazo. Assim, caso a concessionária prorrogue o prazo da obra, por causas alheias à vontade da empreiteira, esta terá direito ao acréscimo no preço, pois a maior permanência das equipes em campo denota alteração no custo inicialmente previsto. 3.4. Subcontratação. Como já foi dito acima, normalmente os contratos EPC são utilizados para grandes obras de infraestrutura. Tratando-se precisamente de linhas de transmissão e subestações, o escopo de obrigações é muito abrangente, o que justifica a subcontratação, pela empreiteira, de empresas especializadas em atividades específicas. A reposição ambiental é um exemplo de atividade que, normalmente, não está no rol de atividades da empreiteira, justificando a contratação de uma terceira empresa que preste tal serviço. Outro exemplo é o fornecimento de transformadores de energia, que muitas vezes é feito por empresas estrangeiras especializadas. Assim, a possibilidade de subcontratação de terceiros deve estar prevista no contrato, bem como a responsabilidade pela gerência desta
  • 13. 13 subcontratação (que normalmente é da própria empreiteira) e a possibilidade de faturamento direto, isto é, a contratante paga diretamente à subcontratada pelo serviço, diminuindo a carga tributária da operação. 3.5. Cláusula de força maior e caso fortuito. O Código Civil Brasileiro, em seu artigo 393, determina que “o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”22 . O mesmo Codex prevê, no artigo 625, que o empreiteiro poderá suspender a obra “por culpa do dono, ou por motivo de força maior”. Necessário, portanto, entender o conceito e a aplicabilidade destes dois institutos. Entende-se como “força maior” e “caso fortuito”, o fato imprevisível ou difícil de prever que gera uma ou mais consequências inevitáveis. A ocorrência de uma tempestade atípica na região onde está sendo feita a obra, e a consequente interdição do trecho de uma estrada, por exemplo, justificam a aplicação da cláusula de caso fortuito ou força maior. José dos Santos Carvalho Filho23 leciona que o caso fortuito “decorre de eventos da natureza, como catástrofes, ciclones, tempestades anormais”, enquanto a força maior “é resultado de um fato causado, de alguma forma, pela vontade humana, como é o clássico exemplo da greve”. O autor ressalta que a lei não faz distinção entre os dois institutos, e que “ocorrendo tais situações, rompe-se o equilíbrio contratual, porque uma das partes passa a sofrer um encargo extremamente oneroso, não tendo dado causa para tanto”24 . Na prática, recomenda-se prever, no contrato, condições à aplicabilidade destes institutos, ou, pelo menos, restringir o rol de eventos que podem ser classificados como tal. Por exemplo: a empreiteira é contratada para construir uma linha de transmissão numa região onde, por característica, é comum chover todos os dias em determinada estação do ano. Sendo um contrato EPC, presume-se que a empreiteira, em seus estudos para formação do projeto inicial, tomou ciência desta especificidade climática, e fez seu planejamento com base nesta informação. Assim, esta empreiteira não poderá, no futuro, requerer um acréscimo de prazo e/ou preço contratual alegando motivo de caso fortuito/força maior, qual seja, a ocorrência de chuvas intermitentes interferindo no ritmo de produção. Ainda que seja um evento da natureza, este não é imprevisível, pois o regime de chuvas é característico da região. Nestes casos, o ônus de provar a imprevisibilidade, caso haja, e a onerosidade excessiva, é da empreiteira. Por esta razão, a redação genérica da cláusula de caso fortuito e força maior, remetendo aos ditames do Código Civil, pode causar discussões (“claims”) entre as partes, prejudicando o bom andamento da obra. 22 BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 09 de Fevereiro de 2015. 23 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 232. 24 Ibid, p. 232.
  • 14. 14 É ideal que a cláusula faça menções expressas ao regime climático e demais características geográficas locais. E mais: cada contrato deve conter uma cláusula de caso fortuito e força maior específica, adequada às características sui generis da região onde a obra será executada. O contrato pode ser complementado por anexos onde constem gráficos emitidos por órgãos oficiais (no Brasil, o INMET – Instituto Nacional de Metereologia -, por exemplo), registrando o regime de chuvas na região. Tal diligência, repita-se, evita futuros desentendimentos entre as partes. 3.6. Resolução de conflitos. Arbitragem. Opção do “dispute boards”. A Lei nº 9.307/96, que dispõe sobre arbitragem, em seu artigo 1º determina que, “as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”25 . Considerando que um contrato EPC cumpre com os requisitos acima, uma cláusula arbitral normalmente é usada devido à complexidade e alta tecnicidade que futuros litígios possam trazer, além da celeridade, confidencialidade, agilidade e árbitros especializados, características inerentes de uma arbitragem. A eleição de um foro, isto é, a opção pelo Poder Judiciário, estaria aquém de qualquer demanda contenciosa envolvendo contratos EPC, devido à não especialização e a não familiaridade dos juízes com essas causas complexas, sem considerar ainda a conhecida morosidade das decisões que afetam os tribunais do Brasil, sobrecarregados de processos. Há também o costume de se usar o instituto da peritagem em contratos EPC. Geralmente, se o pleito contratual (“claim”) não extrapolar um limite financeiro estipulado pelas partes no contrato, a causa será decidida por um perito escolhido em comum acordo entre as partes. Caso o litígio ultrapasse o valor limite estipulado, a causa será decidia pela via da arbitragem. As decisões dos peritos não serão necessariamente vinculantes, porém auxiliam de sobremaneira uma melhor composição entre as partes a um custo menor e podem evitar que a arbitragem seja acionada. Já o instituto do “dispute board”, de acordo com a DRBF26 , é um comitê formado por profissionais experientes e imparciais, contratado antes do início de um projeto de construção para acompanhar o progresso da execução da obra, encorajando as partes a evitar disputas e assistindo-as na solução daquelas que não puderem ser evitadas, visando à sua solução definitiva27 . A fim de evitar que divergências surgidas ao longo da execução do contrato, o “dispute board” (DB) oferece mecanismos de solução de controvérsias assim que estas surgem, evitando que a conclusão da obra seja afetada. Esta junta tem a função de mediar as divergências entre as partes que 25 Lei nº 9.307 de 23 de Setembro de 1996. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 15 de Fevereiro de 2015. 26 Dispute Resolution Board Foundation (organização estadunidense criada com o intuito de promover o Dispute Board como meio de evitar conflitos durante a execução de contratos de construção). 27 Este conceito é uma adaptação do que é oferecido na Seção 1, item 1.1, do DRBF Practices and Procedures Manual, divulgado pela Dispute Resolution Board Foundation (www.drb.org).
  • 15. 15 surjam ao longo da execução do contrato, assim como, a emissão de um laudo/parecer técnico, recomendando uma melhor resolução da controvérsia a uma ou ambas as partes. Geralmente, uma junta de DB é formada por dois engenheiros e um advogado. Essa composição fortalece um melhor entendimento entre as partes, pois duas especialidades trazem melhores pontos de vista e acompanhamento contratual, facilitando uma composição de conflitos. O custo de implementar uma junta de DB é muito menor se comparado à instalação de uma arbitragem ou a um fatídico processo judicial. A própria velocidade com que se alcança uma solução é um fator importante de economia, além de reduzir os desgastes de um acúmulo de litígio ao final de um contrato EPC. Outro ponto interessante é a flexibilidade que um DB pode ser instituído, ajustando-se às necessidades das partes e às peculiaridades de cada contrato EPC. Para incrementar as chances de sucesso, Antonio Fernando Mello Marcondes28 propõe que o “DB aja como efetivo mediador, antes de atuar realmente como órgão de recomendação técnica ou de adjudicação de soluções”. Semelhante à opção pela arbitragem, o rito de um DB pode ser previsto livremente entre as partes, porém, de modo geral, as partes preveem que um DB será contratado para acompanhamento da obra. A cláusula contratual poderá conter o detalhamento do regulamento a ser seguido pelo DB e pelas partes, ou pode simplesmente remeter a um regulamento disponibilizado por uma entidade especializada. No Brasil, o que se vê é a parca utilização deste instituto em contratos complexos, como o EPC, onde possuem grande guarida. Trata-se de mais uma grande ferramenta a ter seu uso incentivado e desenvolvido, demonstrando a grande gama de benefícios conforme exposto acima. CONCLUSÃO De todo exposto, conclui-se que o contrato EPC foi criado diante da necessidade do mercado em ter um modelo contratual onde o empreiteiro se responsabilizasse por todas as fases da obra, desde seu projeto, passando pela gestão de compras, até a construção em si. No Brasil, tal modelo de contrato adequou-se à relação firmada entre as concessionárias do serviço público de fornecimento de energia e as empreiteiras, responsáveis pela construção da infraestrutura necessária à prestação do serviço. O rol de obrigações da empreiteira, no entanto, é extenso, e por tal razão, recomenda-se que o contrato seja o mais detalhado possível, de forma que os direitos e deveres das partes estejam bem definidos. Por se tratar de um contrato que envolve alto investimento financeiro, é de suma importância 28 MARCONDES, Antônio Fernando Mello. Os Dispute Boards e os Contratos de Construção. in BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011, p. 127.
  • 16. 16 que as responsabilidades sejam claramente previstas, bem como as hipóteses e condições para aditivos de preço e prazo. Em se tratando de um serviço essencial, qual seja, o fornecimento de energia elétrica, um contrato bem específico evita lides onerosas e demoradas evita o prejuízo ao maior interessado: o consumidor.
  • 17. 17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011. BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. CARMO, Lie Uema do. Contratos de Construção de Grandes Obras. 2012. Tese (Doutorado em Direito Comercial)-Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. CHEN, Daniel Shem Cheng. Contrato de engineering. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 104, set 2012. Disponível em: <http://www.ambito- juridico.com.br/site>. COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Civil. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009- 2010. GÓMEZ, Luiz Alberto, COELHO, Christianne C. S. Reinisch, DUCLÓS FILHO, Elo Ortiz, Xavier, Sayonara M. T. Contratos EPC Turnkey. Florianópolis: Visual Books, 2006. GOMES, Orlando. Contratos. 26ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. MARCONDES, Antônio Fernando Mello. Os Dispute Boards e os Contratos de Construção. in BAPTISTA, Luiz Olavo. Construção Civil e Direito. São Paulo: Lex Editora, 2011. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Contratos. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Dos Contratos e das Declarações Unilaterais de Vontade. 30ª Ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2006.