2. Naquela manhã o céu
estava sombrio, enquanto
esperávamos
ansiosamente. Todos os
homens, mulheres e
crianças do gueto
judeu de
Piotrkow na Polônia
foram arrebanhados
em uma praça.
Espalhou-se a notícia de que estávamos sendo removidos. Meu pai havia
falecido recentemente de tifo, que se alastrara através do gueto
abarrotado. Meu maior medo era que nossa família fosse separada.
"O que quer que aconteça," Isidore, meu irmão mais velho, murmurou
para mim, "não lhes diga a sua idade. Diga que tem dezesseis anos".
Eu era bem alto, para um menino de 11 anos, e assim poderia ser
confundido. Desse jeito eu poderia ser considerado valioso como um
trabalhador.
Um homem da SS aproximou-se, botas estalando nas pedras grossas do
piso. Olhou-me de cima a baixo e perguntou minha idade.
3. "Dezesseis", eu disse. Ele
mandou-me ir à esquerda,
onde já estavam
meus três irmãos e outros
jovens saudáveis.
Minha mãe foi levada
para a direita com
outras mulheres,
crianças,
doentes e velhos.
Murmurei para Isidore, "Por quê?"
Ele não respondeu.
Corri para o lado da minha mãe e disse que queria ficar com ela.
"Não," ela disse com firmeza.
"Vá embora. Não me aborreça. Vá com seus irmãos".
Ela nunca havia falado tão asperamente antes. Mas eu entendi: ela
estava me protegendo. Ela me amava tanto que, apenas esta única vez,
ela fingiu não fazê-lo. Foi a última vez que a vi.
4. Meus irmãos e eu fomos
transportados em um
vagão de gado até a
Alemanha.
Chegamos ao campo de
concentração de Buchenwald
numa noite, semanas
após, e fomos conduzidos a
uma barraca lotada.
No dia seguinte
recebemos uniformes e
números de identificação.
"Não me chamem mais de Herman", eu disse aos meus irmãos.
"Chamem-me 94938".
Colocaram-me para trabalhar no crematório do campo, carregando os
mortos em um elevador manual.
Eu também me sentia como morto. Insensibilizado,
eu me tornara um número.
Logo meus irmãos e eu fomos mandados para Schlieben, um dos
sub-campos de Buchenwald, perto de Berlim.
5. Numa manhã eu pensei que ouvi
a voz de minha mãe.
"Filho" ela disse suave mas
claramente,
"Vou mandar-lhe um anjo".
Então eu acordei. Apenas um
sonho! Um lindo sonho!
Mas nesse lugar não poderia
haver anjos. Havia apenas
trabalho. E fome. E medo.
Poucos dias depois, estava caminhando pelo campo, pelas barracas,
perto da cerca de arame farpado, onde os guardas não podiam enxergar
facilmente. Estava sozinho.
Do outro lado da cerca, eu observei alguém: uma pequena menina com
suaves, quase luminosos cachinhos. Ela estava meio escondida
atrás de uma bétula.
Dei uma olhada em volta, para certificar-me de que ninguém me viu.
Chamei-a suavemente em Alemão. "Você tem algo para comer?"
Ela não entendeu.
6. Aproximei-me mais da
cerca e repeti a pergunta
em Polonês. Ela se
aproximou. Eu estava
magro e raquítico, com
farrapos envolvendo meus
pés, mas a menina parecia
não ter medo. Em seus
olhos eu vi vida.
Ela sacou uma maçã do seu casaco de lã e a jogou sobre a cerca.
Agarrei a fruta e, assim que comecei a fugir, ouvi-a dizer
debilmente, "Virei vê-lo amanhã".
Voltei para o mesmo local, na cerca, na mesma hora, todos os dias.
Ela estava sempre lá, com algo para eu comer - um naco de pão ou,
melhor ainda, uma maçã.
Nós não ousávamos falar ou demorarmos. Sermos pegos significaria
morte para nós dois.
Não sabia nada sobre ela, que parecia uma menina de fazenda, exceto
pelo fato dela entender Polonês. Qual era o seu nome? Por que ela
estava arriscando sua vida por mim?"
7. A esperança estava
naquele pequeno
suprimento, e essa
menina do outro
lado da cerca trouxe-
me um pouco, como
que nutrindo dessa
forma, tal como
o pão e as maçãs.
Cerca de sete meses após, meus irmãos e eu fomos abarrotados num
vagão de carvão e enviados para o campo de Theresiensatdt, na
Tchecoeslováquia.
"Não volte", eu disse para a menina naquele dia. "Estamos partindo".
Voltei-me em direção às barracas e não olhei para trás, nem mesmo
disse adeus para a pequena menina, cujo nome eu nunca soube,
a menina das maçãs.
Permanecemos em Theresienstadt por três meses. A guerra estava
diminuindo e as forças aliadas se aproximando, muito embora meu
destino parecesse estar selado.
8. No dia 10 de maio de
1945 eu estava
destinado a morrer na
câmara de
gás, às 10:00 horas.
No silencioso crepúsculo, tentei me preparar. Tantas vezes a morte
parecera pronta para me receber, mas de alguma forma eu havia
sobrevivido. Agora, tudo estava acabado.
Pensei nos meus pais. Ao menos, pensei, nós estaremos nos reunindo.
Mas, às 08:00 horas ocorreu uma comoção. Ouvi gritos, e vi pessoas
correndo em todas as direções através do campo.
Juntei-me aos meus irmãos.
Tropas russas haviam liberado o campo! Os portões foram abertos.
Todos estavam correndo, então eu corri também. Surpreendentemente,
todos os meus irmãos haviam sobrevivido.
9. No local onde o mal parecia triunfante, a bondade de uma pessoa
salvara a minha vida, dera-me esperança num lugar
onde ela não existia.
Minha mãe havia prometido enviar-me um anjo, e o anjo apareceu.
Eventualmente, encaminhei-me à Inglaterra, onde fui assistido pela
Caridade Judaica. Fui colocado numa hospedaria com outros meninos
que sobreviveram ao Holocausto e treinado em Eletrônica. Depois fui
para os Estados Unidos, para onde meu irmão Sam já havia se mudado.
Servi no Exército durante a Guerra da Coréia, e retornei a Nova Iorque,
após dois anos.
Não tenho certeza
como,
mas sabia que
aquela menina
com as maçãs
tinha sido a chave
da minha
sobrevivência
10. Por volta de agosto de 1957 abri minha própria loja de consertos
eletrônicos. Estava começando a estabelecer-me. Um dia, meu amigo Sid, da
Inglaterra, me telefonou.
"Tenho um encontro. Ela tem uma amiga polonesa. Vamos sair juntos".
Um encontro às cegas? Não, isso não era para mim. Mas Sid continuou insistindo
e, poucos dias após, nos dirigimos ao Bronx para buscar a pessoa do seu encontro
e a sua amiga Roma.
Tenho que admitir, para um encontro às cegas, não foi tão ruim. Roma era
enfermeira em um hospital do Bronx. Ela era gentil e esperta. Bonita, também, com
cabelos castanhos cacheados e olhos verdes amendoados que faiscavam com vida.
Nós quatro nos dirigimos até Coney Island. Roma era uma pessoa com quem era
fácil falar e fácil de se estar junto.
Descobri que ela era igualmente cautelosa com encontros às cegas.
11. Nós dois estávamos apenas fazendo um favor aos nossos amigos. Demos
um passeio na beira da praia, gozando da brisa salgada do Atlântico,
e depois jantamos perto da margem. Não poderia me lembrar de ter tido
momentos melhores.
Voltamos ao carro do Sid, Roma e eu dividimos o assento traseiro.
Como judeus europeus que haviam sobrevivido à guerra, sabíamos que
muita coisa fora deixada sem ser dita entre nós. Ela puxou o assunto,
"Onde você estava", perguntou delicadamente, "durante a guerra?"
"Nos campos de concentração", eu disse. As terríveis memórias ainda
vívidas, a irreparável perda. Tentei esquecer.
Mas jamais se pode esquecer.
Ela concordou. "Minha família se escondeu numa fazenda na Alemanha,
não longe de Berlim", ela me disse. "Meu pai conhecia um padre,
e ele nos deu papéis arianos."
12. Imaginei como ela devia
ter sofrido também, medo, uma constante
companhia. Mesmo assim, aqui estávamos, ambos sobreviventes, num
mundo novo.
"Havia um campo perto da fazenda", Roma continuou. "Eu via um menino
lá e lhe jogava maçãs todos os dias."
Que extraordinária coincidência, que ela tivesse ajudado algum outro
menino. "Como ele era?", perguntei.
"Ele era alto, magro e faminto. Devo tê-lo visto a cada dia,
durante seis meses."
Meu coração estava aos pulos. Não podia acreditar.
Isso não podia ser.
"Ele lhe disse, um dia, para você não voltar porque ele estava saindo
de Schlieben?".
Roma me olhou estupefata. "Sim!".
"Era eu!".
Eu estava para explodir de alegria e susto, inundado com emoções. Não
podia acreditar! Meu anjo.
13. "Não vou deixar você partir", disse a Roma. E, na trazeira do carro,
nesse encontro às cegas, pedi-a em casamento. Não queria esperar.
"Você está louco!", ela disse. Mas convidou-me para conhecer seus pais
no jantar do Shabbat da semana seguinte.
Havia tanto que eu ansiava descobrir sobre Roma, mas as coisas mais
importantes eu sempre soube: sua firmeza, sua bondade. Por muitos
meses, nas piores circunstâncias, ela veio até a cerca e me trouxe
esperança. Não que eu a tivesse encontrado de novo, pois na minha
mente eu jamais a havia deixado partir.
Naquele dia ela disse sim. E eu mantive a minha palavra. Após quase 50
anos de casamento, dois filhos e três netos,
eu jamais a deixara partir.
14. CLIQUE AQUI PARA VER OUTROS SLIDES COM MENSAGENS CRISTÃS.
Créditos:Créditos:
Texto extraído do devocional Vida em Cristo
http://www.iluminalma.com
Autor: Herman Rosenblat, de Miami Beach, Florida.
Música: Tennessee Waltz - Billy Vaughn
Formatação: Ruth
Esta é uma história verdadeira que está sendo transformada num filme,
chamado "A Flor da Cerca" (“Flower of the Fence” em inglês).