O documento discute a educação não formal e sua relação com a educação formal. Primeiro, questiona se a educação não formal está em oposição à educação formal e se é aceita apenas fora da escola. Segundo, relata experiências do autor como educador musical que mostram como os dois tipos de educação podem coexistir. Terceiro, defende que as artes estão diretamente ligadas à aprendizagem não formalizada.
Cartografia ou de como pensar com o corpo vibrátil - Suely Rolnik
Ensaio pesquisa ac a-o italo a. de oliveira - final
1. Ensaio Pesquisa-Ação
Programa de Iniciação Artística - PIÁ
Italo Alenquer de Oliveira
Artista educador - Música
Centro Cultural da Juventude
A EDUCAÇÃO NÃO FORMAL ASSOCIADA
AS INTERLINGUAGENS
São Paulo
Novembro de 2014
2. Introdução
Define-se educação não-formal como “toda atividade educacional
organizada, sistemática, executada fora do quadro do sistema formal para
oferecer tipos selecionados de ensino a determinados subgrupos da
população” (La Belle, 1982:2).
Diante desta definição e da verticalização da educação brasileira
proponho três questões com relação ao tema descrito. A primeira questão: A
educação não formal encontra-se em oposição (negação) a educação
formal? A segunda : Aceita-se a educação não formal apenas no âmbito
extraescolar? E ainda, estão as interlinguagens diretamente relacionadas ao
aprendizado não formalizado?
Estas questões surgiram logo após minha primeira experiência em
sala de aula como educador, através de um estágio oferecido pela UNESP
juntamente à secretaria de ensino de Mogi das Cruzes - SP. Era a
oportunidade de colocar em prática todos os conceitos e práticas recebidos
na universidade.
Considero esta como parte primordial para meu desenvolvimento
como educador. Primeiro por ter a oportunidade de vivenciar a sala de aula, o
ambiente e a organização da escola como uma unidade, segundo para
descobrir o quão distante me encontrava de me adaptar ao modelo de
educação tradicional. Então eu estudava licenciatura em educação musical, e
não enxergava a sala de aula como um ambiente de trabalho futuro.
Surge então a oportunidade de atuação como artista educador no PIÁ
(Programa de Iniciação Artística da secretaria do município de São Paulo).
Um programa que nos proporciona uma clara ampliação nos horizontes como
artista e como educador e mais fortemente as mesmas questões.
Questões que neste ensaio têm o propósito reflexivo acima do
conclusivo, sem a intenção de sedimentar conceitos.
"Leva tempo para chegar a ser jovem."
Pablo Picasso
3. A educação não formal encontra-se em oposição (negação) à educação
formal?
Destaco a afirmativa que inicia este ensaio pois a mesma exprime
clara ambiguidade. Discordo em parte da definição de La Belle, baseado em
minha primeira experiência como educador musical.
Em um projeto de formação de professores da rede municipal de
ensino de Mogi das Cruzes-SP, nós pesquisadores de música atuávamos em
sala de aula em duplas, o professor contratado pelo município e nós
graduandos. Porém, diferentemente do que é proposto no PIÁ, a maioria dos
professores apenas nos observava fazendo anotações, e infelizmente com
pouca participação no desenvolvimento das aulas.
Acreditando que este distanciamento ocorria pela falta de diálogo,
propusemos um debate com os professores e as frases mais recorrentes
eram: “ não estudei música”, “já sou muito velho para aprender música” ou
ainda “ o município não me paga para aprender a ensinar música”.
Sentindo que os professores necessitavam de formação musical,
procurei atrelar as atividades musicais aos seus conteúdos programáticos,
promovendo assim a interdisciplinaridade. Criando musicas que envolviam
números junto ao professor de matemática, fazendo paródias com bichos e
figuras do folclore brasileiro nas aulas de ciências, foram alternativas
adotadas.
Mesmo buscando compartilhar os conteúdos musicais de forma lúdica
e atrativa, ainda estava restrito aos planos de aula dos professores, sem
deixar de mencionar as apresentações nas festividades escolares ligadas as
datas comemorativas, que por vezes interrompiam a continuidade de
determinado aprendizado .
O registro escrito das atividades propostas tornou-se um alternativa
encontrada para a falta de iniciativa dos professores. É interessante perceber
que, formatando os conteúdos em texto semelhante a uma cartilha, ou seja
caracterizando o ensino formal, conseguimos que assim os professores que
não possuíam determinado conhecimento pudessem dar continuidade ao
conteúdo proposto. Nesta situação, o ensino de música informal de maneira
formalizada pôde ser transmitido as crianças.
4. De acordo com a forma de trabalho de cada professor, era nítida a
diferença entre o educador que utilizava o registro das aulas apenas como
um guia, e assim desenvolvia outros conteúdos de acordo com a própria
experiência, e o professor que fazia uso do material escrito apenas como
uma manual de instruções.
Portanto, o ensino formal não anula as experiências não formais , nem
impossibilita que ambas coexistam. Mas não havendo flexibilidade por parte
do educador, é possível que se caracterize uma oposição entre as mesmas.
Aceita-se a educação não formal apenas no âmbito extraescolar ?
Esta questão torna-se complexa a partir do pensamento de que a
educação é um direito da criança, direito este reconhecido pelo estatuto da
criança e do adolescente, particularmente nos átrios 28 e 29 da convenção
dos direitos da infância.
Especialmente no átrio 29 é possível notar a palavra “imbuir” por mais
de duas vezes, como se as crianças não fossem indivíduos igualmente
providos de histórias de vida.
Procurando ainda pelo significado da palavra “imbuir” iremos encontrar
definição semelhante como : infundir , entranhar ou fazer entrar uma ideia
ou um sentimento (AURÉLIO ,1988)
Imbuir respeito ao meio ambiente, aos pais e a própria identidade
cultural da criança acabam tornando-se medidas de caráter emergencial
diante de uma crise educacional estabelecida. Permitir que a criança e o
adolescente a desenvolvam esses conceitos certamente seria uma forma
mais humanizada de aprendizado.
Sendo a educação um direito, e acreditando na importância da
educação não formal, por que razão a mesma não deveria ser garantida aos
jovens tanto no ambiente escolar como em outras situações ?
É possível vislumbrar no PIÁ boa parte desta resposta, e imaginar o
quão importante seria se programas semelhantes proporcionassem esta
vivencia e enriquecida pelo encontro entre artistas, jovens e a comunidade.
5. Estão as interlinguagens diretamente relacionadas ao aprendizado não
formalizado?
Se analisarmos racionalmente sim. Vejamos o exemplo do ensino de
música nas escolas por exemplo. Apenas recentemente o ensino de música
foi implementado à grade curricular.
Uma obrigatoriedade ainda em processo de adaptação, pois é muito
comum encontrar professores de outras linguagens exercendo esta função
de professor de música nas escolas.
Apesar de existir uma forte tradição brasileira no que se diz respeito ao
teatro e a dança, com aporte de metodologias e inúmeros livros sobre jogos
teatrais; como o fichário de Viola Spolin; ambas linguagens recebem menor
atenção das secretarias de ensino. A prova disto é que diferentemente do
ensino de música as mesmas ainda não conquistaram o mesmo espaço à
grade curricular de ensino
Diante disso é possível perceber o quanto o aprendizado não formal
se faz necessário, pois um educador que se vê obrigado a ensinar
determinados conteúdos que não domina, certamente irá recorrer a métodos
não formais de ensino.
Concluindo, a experiência como artista educador no Programa de
Iniciação Artística ( PIÁ ) torna-se transformadora e questionadora. A partir
dos conhecimentos adquiridos na universidade; e da forma como os mesmos
nos eram propostos; pude reavaliar a forma como os transmitia, estando
aberto as outras linguagens e respeitando o tempo e o espaço dos encontros.
6. Referências Bibliográficas
______. Decreto no 99.710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a
Convenção sobre os Direitos da Criança. Diário Oficial da União, Brasília, DF,
22 nov. 1990. Acesso em 10 nov 2014
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 462.
FREIRE, Paulo (1993). Política e educação. São Paulo: Cortez.
FREIRE, Paulo (1997). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à
prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra.
LA BELLE, Thomas (1986). Nonformal Education in Latin American and the
Caribbean.
Stability, Reform or Revolution? New York, Praeger.