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CIÊNCIA   NOVO LIVRO DE R. DAWKINS É LEITURA INSTIGANTE PARA ADOLESCENTES E ADULTOS




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MÚSICA    O SAMBA DE TERREIRO RESSURGE COM JOVENS QUE VALORIZAM OS ANTIGOS MESTRES
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                                                                                                            FALE CONOSCO:
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                                                                                                           CARTAS À REDAÇÃO
                                                                                                       redacao@retratodobrasil.com.br
5 Ponto de Vista
                                                                                                           rua fidalga, 146 conj. 42
UM JULGAMENTO DE EXCEÇÃO                                                                                cep 05432-000 são paulo - sp

                                                                                                      ATENDIMENTO AO ASSINANTE
                                                                                                      assinatura@retratodobrasil.com.br
                                                                                                              tel. 31 | 3281 4431
                                                                                                            de 2a a 6a, das 9h às 17h
8 O HERÓI DO MENSALÃO
A “historinha” armada pelo ministro                                                                   Entre em contato com a redação
                                                                                                            de Retrato do Brasil.
                                                                                                      Dê sua sugestão, critique, opine.
[Raimundo Rodrigues Pereira]                                                                          Reservamo-nos o direito de editar
                                                                                                        as mensagens recebidas para




                                                                                        Amarildo
12 UMA HISTÓRIA EXEMPLAR                                                                               adequá-las ao espaço disponível
                                                                                                       ou para facilitar a compreensão.


                                                 30 A MAIOR GREVE                                  Retrato do BRASIL é uma publicação
todos os casos                                                                                     mensal da Editora Manifesto S.A.
[Lia Imanishi e Raimundo Rodrigues Pereira]
                                                                                                   EDITORA MANIFESTO S.A.
                                                 assumiu o poder                                   PRESIDENTE
22 HÁ REMÉDIO CONTRA O CAIXA                                                                       Roberto Davis
DOIS?                                            [Thiago Domenici]                                 DIRETOR VICE-PRESIDENTE
Um dos principais temas da reforma política                                                        Armando Sartori
                                                 32 PROBLEMAS AMAZÔNICOS                           DIRETOR ADMINISTRATIVO
                                                 Canteiros do tipo plataforma serão a              Marcos Montenegro
clandestino de dinheiro
                                                 solução para as constantes paralisações           DIRETOR EDITORIAL
                                                                                                   Raimundo Rodrigues Pereira
                                                 na construção de hidrelétricas?
                                                                                                   DIRETOR DE RELAÇÕES INSTITUCIONAIS
26 A CAMINHO DA DITADURA                                                                           Sérgio Miranda
A Abert foi fundada para a derrubada de
                                                                                                   EXPEDIENTE
                                                 34 APOIO GERAL                                    SUPERVISÃO EDITORIAL
                                                                                                   Raimundo Rodrigues Pereira
                                                 presidente Dilma anunciou o Programa de           EDIÇÃO
                                                 Investimento em Logística                         Armando Sartori
                                                 [Téia Magalhães]                                  SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
28 ALARME FALSO?                                                                                   Thiago Domenici
                                                                                                   REDAÇÃO
declarações de suposta “escalada de violência”   38 PARA TODOS
em São Paulo no 1º semestre deste ano            O samba de terreiro ressurge: ao lado
                                                                                                   EDIÇÃO DE ARTE
                                                                                                   Pedro Ivo Sartori
                                                 mostram suas composições
                                                                                                   REVISÃO
                                                 [André Carvalho]                                  Silvio Lourenço [OK Linguística]
                                                                                                   COLABORARAM NESTA EDIÇÃO
                                                 42 MAGIA DA CIÊNCIA
                                                 Além de matar a curiosidade de pré-
                                                                                                   Artur de Lima
                                                 é boa leitura para adultos
                                                                                                   REPRESENTANTE EM BRASÍLIA

                                                                                                   ADMINISTRAÇÃO
                                                 44 POLARIZAÇÃO CRESCENTE
                                                 Livro de Marcio Pochmann destaca                  Aparecida Carvalho
                                                 crescimento dos trabalhadores da base da
                                                                                                   DISTRIBUIÇÃO EM BANCAS
                                                                                                   Global Press




   4   | retratodoBRASIL 63
Ponto de Vista



                                                                                                           Calandra, presidente
                                                                                                           da Associação dos
                                                                                                           Magistrados do Brasil:
                                                                                                           “Nunca vi presidente de
                                                                                                           tribunal votar duas vezes
                                                                                                           para condenar alguém”
ABr




Um julgamento de exceção
Na Ação Penal 470, do chamado mensalão, o STF, pressionado pela
grande mídia, negou direitos básicos à defesa e, assim, criou regras
de ocasião para interpretar o direito penal brasileiro

EM MEADOS DE setembro, caminhan-          do julgamento, o do relator Joaquim         tinha, então, recuado: reorganizou seu
do-se para o segundo mês de apre-         Barbosa. Ele começou pela análise de        voto e votou, como Barbosa, também na
ciação, pelos ministros do Supremo        crimes que teriam sido cometidos no         forma fatiada.
Tribunal Federal (STF), do mérito da      uso de recursos públicos, um dos sete           Na primeira derrota, os defensores
Ação Penal 470 (AP 470), que julga        blocos em que subdividiu seu voto, e        queriam garantir aos réus o direito,
os envolvidos no chamado mensalão,        anunciou que, depois, passaria a palavra    expresso na Constituição brasileira,
confirmam-se as previsões pessimistas     para os demais ministros votarem sobre      da dupla jurisdição: poder apelar da
feitas no início desse processo, quando   o mesmo assunto.                            sentença a um tribunal mais alto. No
uma petição da maioria dos advogados          Houve, então, certo tumulto no          julgamento pelo STF, corte acima de
dos acusados alertou para a possibili-    tribunal. O revisor do voto de Barbosa,     todas, esse direito praticamente não
dade de ser feito um “julgamento de       Ricardo Lewandowski, disse que o en-        existe. E é preciso destacar que somente
exceção”. Na ocasião, os defensores dos   caminhamento contrariava o regimento        dois dos réus têm de ser julgados pelo
réus já tinham sido derrotados em sua     do STF e ameaçou renunciar. O ministro      STF, porque são deputados e têm foro
pretensão de desmembrar a ação penal,     Marco Aurélio de Mello condenou a pro-      privilegiado; 36 dos 38 não o têm. Os
enviando para os tribunais inferiores     posta de Barbosa. O presidente do STF,      defensores dos réus foram derrotados
os acusados sem foro privilegiado. No     Ayres Britto, iniciou uma contagem de       sob o argumento de que se tratava de
julgamento de um caso muito parecido,     votos para decidir a forma de votação,      um processo único, no qual todos os acu-
o dito mensalão tucano, que envolve       mas não a concluiu e acabou decidindo       sados têm ligação com o grande crime
políticos do PSDB de Minas Gerais, o      que cada um votaria como quisesse, o        que teria sido cometido, o da compra de
STF tinha desmembrado o processo. Por     que, como alguns ministros argumen-         votos por um “núcleo político” do PT e
que não fazê-lo no caso do mensalão pe-   taram imediatamente, causaria uma           do qual faria parte José Dirceu, então
tista, diziam os advogados? O segundo     confusão tremenda. O julgamento foi         chefe da Casa Civil do governo do ex-
protesto foi contra mais uma medida       suspenso depois do voto de Barbosa,         presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No
excepcional: o fatiamento das decisões    feito da forma fatiada, como escolhera, e   caso do fatiamento, ao argumentarem
dos ministros. Isso ocorreu em função     recomeçou na sessão seguinte, após um       que o processo é um todo e seria mais
do encaminhamento do primeiro voto        acordo entre os ministros. Lewandowski      justo ouvir o voto integral de cada

                                                                                                     63 retratodoBRASIL    |   5
ministro, os advogados dos acusados          declarou que o PT estava pagando               um exemplo curioso: “Tem-se admitido,
foram derrotados sob o argumento da          uma mesada a parlamentares e assim             em matéria de prova, uma certa elastici-
conveniência: dividir o julgamento em        corrompendo o Congresso. A Comissão            dade na prova acusatória, valorizando-
partes facilitaria a compreensão das         Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI)          se o depoimento das vítimas. É como nos
decisões.                                    dos Correios, por exemplo, comandou            casos de estupro. Nos delitos de poder
     Afinal, pode-se perguntar: é um         investigações. Do seu trabalho resulta-        não pode ser diferente”. A ministra
grande e único crime que obriga enfiar       ram cassações de mandatos e renúncias          parece estar muito impressionada com
38 pessoas num mesmo saco, mesmo             de parlamentares e na sua conclusão ela        os comentaristas dos grandes jornais
desrespeitando direitos claros da gran-      encaminhou o pedido de indiciamento            conservadores, que querem a conde-
de maioria deles? Ou se trata de criar       criminal de dezenas de pessoas.                nação dos petistas a qualquer preço, e
sete fatias de crimes que devem ser              A CPMI não condenou criminalmente          confunde seus clamores com indícios
puxados de uma cartola de modo pla-          ninguém. Os depoimentos que ouviu, as          para condenar o “poderoso” Cunha, um
nejado, para criar um clima que ajude a      perícias que promoveu, as acusações            ex-metalúrgico – como Lula –, que foi
condenar os petistas a qualquer preço,       que fez são indícios que podem ser usa-        presidente da Câmara dos Deputados.
como mostramos nesta edição, em “O           dos na AP 470, é óbvio. Mas as provas              Cunha foi condenado, entre outros,
herói do mensalão”. O artigo descreve        essenciais, diz a lei brasileira, são produ-   pelo crime de peculato por 9 votos a 2.
as gestões do ministro Barbosa, que          zidas judicialmente, são as que estão nos      Rosa e Fux, por exemplo, votaram pela
atua mais como promotor do que como          autos do processo. O valor determinante        condenação, a despeito de a acusação
juiz nesse caso, empenhado praticamen-       para um julgamento é o das provas apre-        não ter conseguido provar ter ele co-
te numa campanha de opinião pública          sentadas diante de um juiz, num ato no         metido qualquer delito numa licitação
para vender a tese do mensalão.              qual o contraditório, a participação da        usada para condená-lo, pela qual uma
     A maioria do STF parece disposta                                                       das agências do publicitário Marcos
a ultrapassar limites. Segundo depoi-                Ao negar à                             Valério ganhou concorrência para gerir
mentos de vários de seus ministros, a                                                       10 milhões de reais a serem usados para
corte não sabe o que fará no caso de um              maioria dos                            promover as atividades da Câmara.
empate de votos. Com a aposentadoria                                                        Quando, em 1994, julgou o ex-presidente
de Cezar Peluso, logo após o encerra-               réus a dupla                            Fernando Collor de Mello por crime de
mento da primeira fatia da discussão,                                                       peculato – o de ter recebido de presente
permaneceram dez ministros. Eles                      jurisdição,                           de seu tesoureiro de campanha, Paulo
estariam discutindo o que acontecerá                                                        César (PC) Farias, um automóvel Fiat –,
se houver uma decisão com cinco de
                                                  “o STF pode ser                           o STF decidiu em sentido oposto. Absol-
um lado e cinco de outro: o presidente                                                      veu Collor de Mello porque a acusação
da corte, Ayres Britto, votará ou não
                                                   visto como um                            não conseguiu provar a existência de
pelo desempate? É uma duvida desca-               órgão que vestiu                          um ato de ofício, uma decisão formal
bida. In dubio pro reo, lembrou Nelson                                                      por meio da qual ele, como funcionário
Calandra, presidente da Associação dos           a toga para matar,                         público, teria favorecido PC Farias em
Magistrados do Brasil, referindo-se a um                                                    troca do Fiat recebido. Rosa e Fux con-
dos pilares do direito penal, o princípio         não para julgar”                          denaram Cunha porque não aceitaram
da presunção da inocência, segundo o                                                        sua explicação para ter recebido 50 mil
qual, em caso de dúvida, o acusado deve                                                     reais de Valério. Cunha disse nos autos
ser considerado inocente. “Nunca vi          parte contrária, é indispensável, para         – e apresentou provas – que os 50 mil
presidente de tribunal votar duas vezes      que seja garantido outro princípio do          reais foram gastos com uma pesquisa
para condenar alguém”, disse Calandra.       processo penal: o do amplo direito de          eleitoral e que pediu o dinheiro a Delúbio
     A palavra de ordem que prevalece        defesa. Sob o argumento de que estão           Soares, tesoureiro do PT, num esquema
no STF no julgamento do mensalão             julgando um crime dos poderosos, com           de caixa dois cujo intermediário foi Va-
petista parece ser: flexibilizar o direito   ampla capacidade de manipulação e              lério. Rosa e Fux sabiam que havia um
penal. “O juiz formará sua convicção         ocultação de provas de suas atividades         ato de ofício – a abertura do processo
pela livre apreciação da prova produzida     “tenebrosas”, para usar a expressão            de licitação pela Câmara para a contra-
em contraditório judicial, não podendo       de um deles, os ministros que formam           tação da agência de Valério – assinado
fundamentar sua decisão exclusivamen-        a atual maioria, empenhada em conde-           por Cunha. Mas esse ato de ofício, está
te nos elementos informativos colhidos       nar os mensaleiros, estão invertendo o         provado nos autos, foi perfeitamente
na investigação”, diz o Código Penal         princípio: relativizam a importância das       legal. Rosa e Fux passaram a dizer então
brasileiro no artigo 155. Isso significa     provas produzidas em juízo e ampliam o         que não é necessária a existência de um
dizer, no caso: os juízes não podem ba-      peso dos indícios e contextos que sacam        ato de ofício para provar um crime de
sear suas decisões principalmente nos        aqui e ali da fase do inquérito policial ou    peculato. Pode-se dizer que:
indícios colhidos pelas investigações do     das investigações da CPMI.                         1. tinham diante de si um crime de
Congresso Nacional e nas duas dezenas            Vejam-se, por exemplo, os votos dos        caixa dois confessado;
de inquéritos da Polícia Federal (PF)        ministros Luiz Fux e Rosa Weber na con-            2. mas precisavam de um crime
feitos a partir da denúncia do mensalão,     denação do deputado João Paulo Cunha           maior, o do mensalão, inventado por
quando o deputado Roberto Jefferson          por crime de peculato. A ministra deu          Jefferson;


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STF
    3. por isso, flexibilizaram a tese do
ato de ofício necessário;
    4. e, ao fazê-lo, esqueceram outro
princípio: o de que, no direito penal
brasileiro, cabe ao Ministério Público
provar a acusação que faz.
    Desprezaram os depoimentos dos
outros réus, Soares e Valério, os quais
dizem serem os 50 mil reais enviados a
Cunha dinheiro de caixa dois das cam-
panhas petistas. A tese do mensalão foi
criada pela acusação; a do caixa dois,
pela defesa. Rosa e Fux não tiveram
a dúvida que, por recomendação dos
princípios do direito penal, favorece o
réu: ficaram com as explicações que
favorecem a tese de Jefferson. Votou
em sentido contrário, pela absolvição de
Cunha, acompanhando o revisor Lewan-
dowski, o ministro Dias Toffoli. Ele disse
bem: Cunha não tinha que provar ser
inocente, podia até ter ficado calado. “A
acusação é quem tem de fazer a prova.
A defesa não tem que provar sua versão.      Olga: em 1936, o STF permitiu que ela, grávida, fosse extraditada para a Alemanha nazista
Essa é uma das maiores garantias que a
humanidade alcançou. Estou rebatendo
[a acusação contra Cunha não apenas]         casos graves de condenação política.           presidente, no entanto, estava no Rio
em relação ao fato concreto, mas como        Um, de março de 1936, quando negou             Grande do Sul, sem qualquer sombra
premissa constitucional que esta corte       pedido de habeas corpus para a mili-           de dúvida. Tinha sido lá que, anos antes,
deve seguir.”                                tante comunista alemã Olga Benário,            fora organizada a resistência, afinal
    Roberto Gurgel, o procurador-geral       de origem judaica, grávida de uma filha        vitoriosa, para garantir sua posse em
da República, que cumpre o papel de          de seu companheiro, o líder comunista          1961, quando o então presidente, Jânio
acusador no processo, considerou que         brasileiro Luiz Carlos Prestes. Os dois        Quadros, renunciou e ele, como vice,
essa flexibilização caiu como o queijo       estavam presos no Brasil e o governo           teve seu mandato contestado pelos
sobre o seu prato de macarrão. Disse,        de Adolf Hitler pediu a extradição de          militares. O STF aceitou o argumento da
após a condenação de Cunha, que o            Olga ao governo comandado por Getúlio          direita e deu posse ao sucessor consti-
julgamento estava sendo encaminhado          Vargas. A defesa de Olga solicitou ha-         tucional, Ranieri Mazzilli, presidente da
muito favoravelmente à sua acusação e        beas corpus ao STF por dois motivos: a         Câmara, que governou como preposto
que a aceitação de provas mais tênues        extradição colocaria sua vida em risco,        dos golpistas por 15 dias.
para acusados de menor poder, como           pois os campos de concentração nazis-              Renato Janine Ribeiro, professor de
Cunha, mostrava a tendência da corte         tas eram conhecidos pelo tratamento            ética e filosofia da Universidade de São
suprema de aceitar provas mais tênues        cruel dispensado aos detidos, especial-        Paulo (USP), reconhece, como Retrato
ainda no caso da sua proposta de con-        mente se fossem comunistas ou judeus,          do Brasil, em artigo publicado pelo diá-
denação de Dirceu, apontado por ele e        e ainda colocaria sob o poder de um            rio Valor Econômico, que “o Supremo,
pela grande mídia conservadora como          governo estrangeiro a filha de um bra-         pressionado por uma mídia sobretudo
o comandante do mensalão. Como se            sileiro. O STF negou o pedido. Olga foi        oposicionista, negou direitos básicos
sabe, nos autos, além dos depoimentos        deportada e morta num dos campos de            à defesa”. Ao negar à grande maioria
dos réus Jefferson e Emerson Palmieri,       extermínio de Hitler (Anita Leocádia, sua      dos réus a dupla jurisdição, diz ele, “ao
do PTB – que podem ser levados em            filha, sobreviveu e hoje, com 75 anos, é       chegar à mesquinhez de proibir a defesa
conta apenas como indícios, porque dos       professora aposentada da Universidade          de usar o power point que facilitaria a
réus não é cobrado o juramento de dizer      Federal do Rio de Janeiro; uma mulher          exposição de seus argumentos, o STF
a verdade –, Gurgel não tem mais nenhu-      com o mesmo nome está sendo julgada            pode ser visto como um órgão que vestiu
ma testemunha ou prova documental ou         na AP 470).                                    a toga para matar, não para julgar”. Ele
pericial contra Dirceu.                          A outra decisão foi a que legalizou,       conclui, com razão: “A imagem da corte
    Em debate promovido pelo Centro          digamos assim, o golpe militar que der-        está em risco. Ninguém é legalmente
de Estudos da Mídia Alternativa Barão        rubou João Goulart da Presidência da           culpado até ser condenado em processo
de Itararé, realizado em meados do mês       República em 1964. A direita golpista          justo [...] O Supremo não mostrou essa
passado em São Paulo, o jornalista e         levou ao STF um pedido para declarar           cautela”. Nós acrescentamos: e o que é
escritor Fernando Morais disse que o         vaga a Presidência sob o argumento             pior, pode estar criando precedente para
STF tem em seu passivo histórico dois        de que Goulart abandonara o País. O            uma fieira de outros abusos.


                                                                                                            63 retratodoBRASIL      |    7
Política 1


    O HERÓI DO
                                                                                                   Para lembrar:
                                                                                                   Na Justiça brasileira, pessoas com foro
                                                                                               privilegiado – deputados como João Paulo
                                                                                               Cunha, José Dirceu, Roberto Jefferson e




    MENSALÃO
                                                                                               só podem ser processadas e julgadas pelo

                                                                                               gadas na chamada primeira instância, com
                                                                                               direito a recorrer a uma alçada superior.
                                                                                                    Uma etapa inicial do processo judicial
                                                                                               é o inquérito, cujas investigações são
    Como o ministro Barbosa armou para o público sua                                           feitas pela polícia. Ele é dirigido por um
                                                                                               promotor, um advogado do Ministério
    “historinha” e, com ela, rebaixou o nível do debate que
    deveria ter sido feito sobre o grande escândalo político                                   reitos constitucionais dos acusados, como,
                                                                                               por exemplo, uma busca em sua residência,
    por Raimundo Rodrigues Pereira                    ilustração Amarildo
                                                                                               devem ser aprovadas por um juiz a quem
                                                                                               o inquérito precisa ser comunicado. No
                                                                                               caso de nossa história, em função do foro
    NÃO HÁ A menor dúvida de que o PT,                                                         privilegiado, o inquérito, de número 2.245,
    que se dizia o grande partido da ética na     geral da República, Roberto Gurgel. Do
    política, paga hoje o preço de, ao chegar     mesmo gênero foi a avaliação de Antonio
    à Presidência da República, em 2003,                                                       ministro Barbosa.
    ter mergulhado fundo no pântano dos           cargo e encaminhou, em 2006, a denúncia

    panhas eleitorais. A avaliação de que o       agora em julgamento na suprema corte de      mover uma ação penal destinada a julgar
    chamado mensalão é “o mais atrevido e         Justiça do País.                             os acusados. Em caso positivo, encaminha
    escandaloso esquema de corrupção da                                                        denúncia ao juiz e este a examina para
    história do Brasil” é outra coisa. Está nas   ção que supervaloriza os erros cometidos     dizer se a aceita ou não. No caso, Barbosa
                                                  pelo PT é da oposição ao governo do
                                                                                               A seguir, encaminhou seu voto ao plenário
                                                   e já está formulada nas conclusões da
                                                     principal das comissões parlamentares          Na ação penal, presidida por um
                                                       de inquérito que investigaram o caso    juiz, são preparados os chamados autos
                                                         a partir de julho de 2005, após a     do processo, com depoimentos, perícias,
                                                         denúncia espetacular de Roberto       documentos, apresentados a ele sob as
                                                          Jefferson. Mas, com certeza, a       regras do contraditório, ou seja, as duas
                                                          pessoa que transformou esse          partes, acusação e defesa, devem ter amplo
                                                                                               acesso às provas produzidas, com o direito
                                                          rência de justiça para ser vendida
                                                          à opinião pública foi o ministro
                                                          Joaquim Barbosa, que cuida           lização dos autos, a ação vai a julgamento;
                                                          do mensalão desde que o caso         no caso, o da AP 470 começou no início
                                                                                               de agosto passado.
                                                                                                    Barbosa surgiu como um herói para
                                                                                               a grande mídia conservadora do Brasil
                                                        um inquérito na corte, visto que
                                                         diversas pessoas acusadas tinham
                                                         o chamado foro privilegiado.
                                                                                               um voto de 430 páginas, lidas ao longo
                                                                                               de 36 horas em cinco dias, defendendo a

                                                                                               abertura da AP 470 foi amplamente aceito.
                                                                                                   Até então Barbosa era relativamente
                                                                                               estigmatizado. Fora escolhido para ser

                                                                                               logo no começo de seu primeiro mandato,
                                                                                               por ser negro, numa espécie de exercício

                                                                                               modo, foi mal recebido por expoentes da

    8   | retratodoBRASIL 63
mídia mais conservadora que são contra          “historinha”, como disse na ocasião ao diá-       milhões de reais por meio dos chamados
esse critério para preenchimento de parte       rio O Estado de S. Paulo, pelo capítulo 5, no     bônus de volume, isto é, recursos dados
das vagas públicas em várias instâncias; no     qual Souza tentava provar a corrupção de          pelos veículos de promoção e mídia em
caso, o STF.                                    Cunha e Pizzolato. Depois foi para o 3, no        função do volume de serviços cobrados
    O seu encaminhamento vitorioso da           qual Souza procurava mostrar que o dinhei-        do BB, que seriam devidos ao banco, mas
denúncia contra o mensalão petista, o cha-      ro do esquema Soares–Valério viria, de fato,      foram dados para uma empresa de Valério
memos assim, mudou radicalmente essa            de desvio de dinheiro público. Deixou por         com a anuência de Pizzolato; e um “grande
imagem e lhe valeu elogios estridentes. “O      último o capítulo no qual Dirceu é acusado        peculato”, pelo desvio de 73,8 milhões de
Brasil jamais teve um deplorável escândalo      de formar uma quadrilha, articulada com           reais, que também seriam do BB e foram
como o mensalão. Como compensação,              outras duas – uma de publicitários e outra        dados para a mesma empresa de Valério,
também jamais teve um ministro como             de banqueiros –, para corromper o Con-            a partir de um fundo de incentivos ao uso
Joaquim Barbosa”, disse Veja em sua edi-                                                          de cartões da bandeira Visa.
ção do início de setembro de 2007, num          mais compreensível, “o capítulo anterior              O que Barbosa fez ao começar pelas
artigo de capa no qual enumerava suas           jogava luz sobre o capítulo subsequente”,         “historinhas” de corrupção é o oposto do
qualidades de menino pobre que estudou          como disse, na época, Barbosa ao Estadão.         que se recomenda num debate intelectual
                                                    Barbosa reorganizou a denúncia do             sério. Como disse o pensador italiano An-
desde falar várias línguas, vestir-se em lo-    procurador-geral, mas com um voto                 tonio Gramsci, nesse tipo de discussão, na
jas chiques pelo mundo e conhecer com           unitário. No julgamento, quando, como             luta de ideias, ao contrário do que se faz
detalhes a vida em Paris, Nova York, Los        relator, foi o primeiro a votar, já quase no      na guerra, quando se come o pirão pelas
Angeles e San Francisco.                                                                          beiradas, procurando destruir o inimigo
                                                da acusação, pelo procurador-geral Gurgel,        atacando-o por seus pontos mais fracos,


M          as, essencialmente, Veja elogiava
           o fato de Barbosa ter se con-
           vencido da tese apresentada na
denúncia de Souza em 2006, e encampada
pela revista desde meados de 2005, de que
                                                e das defesas, pelos advogados dos 38 réus,
                                                ele acabou impondo – com a ajuda do pre-
                                                sidente da corte, Ayres Britto – a votação
                                                fatiada, para espanto dos ministros Ricardo
                                                Lewandowski, revisor da AP 470, e Marco
                                                                                                  deve-se começar pelo ponto forte, o
                                                                                                  essencial da argumentação adversária. O

                                                                                                  adversário, como se faz com o inimigo na
                                                                                                  guerra, mas derrotar suas ideias errôneas
“uma quadrilha liderada pelo ex-ministro        Aurélio de Mello e protestos da maioria dos       e, dessa forma, contribuir para elevar o
José Dirceu movimentara dezenas de mi-          advogados dos réus.                               nível popular de consciência e informação.
lhões de reais para corromper parlamen-              O fatiamento parece ter sido o grande
tares em troca de apoio político”. Veja
destacava, essencialmente, a sagacidade
de Barbosa em transformar a denúncia
do procurador-geral numa peça para o
convencimento do público. Diz a revis-
                                                truque de Barbosa. É uma espécie de
                                                técnica como a de comer o pirão a partir
                                                das beiradas, onde está mais frio. No caso,
                                                começar a julgar a complexíssima tese do
                                                mensalão a partir de um ponto que é quase
                                                                                                  B       arbosa não é nenhum Gramsci. Fez
                                                                                                          o contrário, procurou contar uma
                                                                                                          “historinha”. Estavam em debate
                                                                                                  duas posições. De um lado, a dos maiores
                                                                                                  criminalistas do País, que defendem os
ta: “Sua obsessão era a forma do voto,          um senso comum: o de que os políticos são         acusados com a tese do caixa dois. Essa tese
a estrutura, a ordem dos capítulos [...]        corruptos e é grande o desvio de dinheiro         foi desenvolvida por Soares e Valério, já em
Joaquim Barbosa fez um voto inteligente.                                                          2005. Eles apresentaram provas e testemu-
Subverteu a ordem da denúncia preparada         setores da classe média e da burguesia brasi-     nhos de terem repassado clandestinamente
pelo procurador-geral da República”.            leira devem fazer isso até com uma espécie        55 milhões de reais para pagar dívidas de
     Souza apresentou uma denúncia di-          de consciência culpada: deve-se notar que,        campanha do PT e partidos associados a
vidida em sete capítulos. No quinto, por        no mensalão, a acusação tenta provar um           ele nas eleições. Disseram que o dinheiro
exemplo, falava de 50 mil reais recebidos       desvio de dinheiro público de perto de 100        vinha de empréstimos tomados – pelo
pelo deputado João Paulo Cunha, na época        milhões de reais. Já a Receita Federal está       PT, mas, principalmente, pelas empresas
presidente da Câmara dos Deputados,             cobrando de centenas de milhares de pes-          de Valério – nos bancos mineiros Rural
e 326 mil reais recebidos por Henrique          soas físicas e jurídicas 86 bilhões de reais em   e Mercantil de Minas Gerais. De outro
Pizzolato, então diretor de Comunicação         “débitos vencidos”. Desse total, 42 bilhões       lado estava a tese da maioria da CPMI dos
e Marketing do Banco do Brasil (BB). Eles       são atribuídos a 317 grandes contribuintes        Correios, a tese do mensalão. Ela dizia que
tinham apresentado essas quantias como          (15 pessoas físicas e 302 jurídicas) – ou seja,   os 55 milhões de reais admitidos pelos
sendo dinheiro do caixa dois confessado         um montante que equivale a mais de 420            acusados como caixa dois não existiam.
por Delúbio Soares, tesoureiro do PT, e         vezes o dinheiro envolvido no mensalão.           Seriam dinheiro público os 76,7 (73,8 +
Marcos Valério, dono de agências de pu-              Cunha e Pizzolato foram as vítimas           2,9) milhões de reais da soma do grande
blicidade com serviços prestados ao BB e à                                                        e do pequeno peculatos de Pizzolato,
Câmara. O procurador-geral dizia que, nos                                               -         desviados do BB para Valério. As quantias
dois casos, o dinheiro era, de fato, suborno.   ção de Barbosa, Pizzolato foi condenado
     No terceiro capítulo, Souza apresentava    quase unanimemente pelos outros dez               como empréstimos pelo publicitário com
dois tipos de operações da agência DNA          ministros por quatro crimes: corrupção            ajuda dos banqueiros do Rural. Os 326 mil
com o BB como sendo a fonte de desvio de        passiva, porque teria recebido 326 mil            reais que chegaram a Pizzolato seriam o
2,9 milhões de reais e 73,8 milhões de reais    reais para favorecer Valério; lavagem de          suborno para ele fazer o desvio. Os ban-
de dinheiro público para as empresas de         dinheiro, por ter recebido dinheiro em            queiros do Rural teriam feito a simulação
Valério. Barbosa mudou a ordem da apre-         espécie e ocultado essa movimentação; um          porque estariam interessados num prêmio
sentação dos supostos crimes: começou sua       “pequeno peculato”, por ter desviado 2,9          que Dirceu, chefe da quadrilha política,

                                                                                                                  63 retratodoBRASIL      |   9
Para Barbosa, Valério tirou R$ 76,7 milhões do BB
na “mão grande”. Ele ignorou as notas em poder da
CBMP que comprovam os serviços do publicitário
poderia obter do Banco Central para eles: a      do PT a governador nas eleições de 2002.        dessa tese, buscando em seu apoio todos
“bilionária” liquidação do Banco Mercantil       A segunda maior parte – 11,2 milhões de         os indícios e suposições da fase do inqué-
de Pernambuco, como diz Gurgel em sua            reais – foi para o PL, que estava coligado      rito e praticamente ignorando as provas e
peça acusatória. E Dirceu e sua quadrilha        com o PT desde a formação da chapa              testemunhos produzidos para os autos pela
política queriam o dinheiro para comprar         presidencial, com Lula encabeçando-a e          defesa, os quais, pela lei brasileira, deveriam
o apoio de partidos no Congresso para o          com o empresário mineiro José Alencar           ser os determinantes para a condenação
governo Lula.                                    como vice. Mais 4 milhões foram para o          dos acusados. Como disse o experiente so-
     Como juiz, a nosso ver, para encarar        PTB, de Roberto Jefferson. No primeiro          ciólogo Wanderley Guilherme dos Santos,
o debate de frente, Barbosa deveria ter          turno da eleição presidencial de 2002, o        em entrevista publicada pelo jornal Valor
começado por dar seu veredicto sobre a           PTB formou a chamada aliança trabalhista,       Econômico em 21 de setembro: “Temo que
acusação, isto é, dizer se a tese do mensalão    com o PDT e o PSB, para apoiar Anthony          uma condenação dos principais líderes do
fora ou não provada. Deveria fazer isso          Garotinho, o candidato à Presidência dessa      PT, e do PT como partido, acabe tendo por
examinando a argumentação da defesa, a           última agremiação. No segundo, o partido        fundamento não evidências apropriadas,
tese do caixa dois, e fazer isso com todo o      de Jefferson apoiou a candidatura de Lula.      mas o discurso paralelo que vem sendo
empenho, para eliminar qualquer dúvida           Por que o valerioduto não repassou verbas       construído”. O jornal então lhe perguntou
razoável em favor dos acusados, em res-          para o PSB pagar suas campanhas de 2002?        se ele achava que os ministros estavam
peito ao princípio in dubio pro reo.             Por que não deu dinheiro para o PCdoB,          “dizendo, nas entrelinhas do julgamento”,
                                                 outro de seus aliados históricos? Por que       que “o tribunal condenará alguns réus sem


N        ote-se bem: ninguém pode dizer
         que os réus são inocentes se o
         propósito for corrigir os males do
processo eleitoral brasileiro, totalmente cor-
rompido pelo dinheiro. Muitos dos acusa-
                                                 PTB, PP e PL são partidos, como se diz,

                                                 É claro que pode ter havido compra de
                                                 partidos, que candidatos possam ter usado
                                                 o esquema clandestino Valério-Soares
                                                                                                 fundamentar essas condenações em provas
                                                                                                 concretas”. Ele respondeu: “É uma espécie
                                                                                                 de vale-tudo. Esse é meu temor. O que os
                                                                                                 ministros expuseram até agora é a intimi-
                                                                                                 dade do caixa dois de campanhas eleitorais
dos são participantes confessos, em maior        para melhorar suas contas pessoais e que,       e o que esse caixa dois provoca. A questão
ou menor grau, de um crime eleitoral: o uso      portanto, a tese do caixa dois não dá conta     fundamental é: por que existe o caixa dois?
                                                 de todos os detalhes e não ajuda, de forma      Isso eles se recusam a discutir, como se
de candidatos e partidos. Ao escrever sobre      alguma, diga-se mais, a limpar as estrebarias   o que eles estão julgando não fosse algo
esse tema, poucos meses depois do ocor-          formadas pelo dinheiro e pelos poderosos        comum – que pode variar em magnitude,
rido (ver no livro As duas teses do mensalão,    que o oferecem para orientar, em função         mas que está acontecendo agora, não te-
Editora Manifesto, 2012, o capítulo “O PT        de seus interesses, o processo democrático.     nho a menor dúvida. Como se o que eles
no seu labirinto”, escrito em setembro de        Quem, dentre os defensores da tese do           estão julgando fosse alguma coisa inédita e
2005), já dizíamos, por exemplo, o que está      caixa dois, pode ter certeza de que os ban-     peculiar, algum projeto maligno”.
sendo observado agora por alguns analistas:      queiros do Rural e do BMG não queriam
os 4,1 milhões de reais repassados por meio
do chamado valerioduto para o PP não
podiam ser vistos como verba para paga-
mento de despesas de campanhas passadas.
A adesão do PP à base do governo Lula foi
                                                 favores do governo? É claro que queriam.
                                                     Mas o problema em discussão não é
                                                 esse. A tese do caixa dois é a da defesa.
                                                 Ela não tem, a serem seguidos os princí-
                                                 pios do direito penal, o ônus da prova. É
                                                                                                 B       arbosa adotou o método da “his-
                                                                                                         torinha” para ganhar o público a
                                                                                                         partir dos preconceitos existentes
                                                                                                 contra a política. E também porque, obser-
                                                                                                 vada na sua estrutura, a tese do mensalão é
tardia. Em 2002 esse partido, assim como o       a acusação que está sendo julgada na AP         muito complexa e frágil. Ela precisa de uma
PMDB, se coligou com o PSDB no apoio             470. É a tese do mensalão, encaminhada          superorganização criminosa. Precisa de
à candidatura de José Serra à Presidência. É     pelo procurador-geral Gurgel na sua             três quadrilhas – associação criminosa que
outro, no entanto, o caso de PT, PTB, PL         sustentação oral feita em 2 de agosto, na       envolve, em cada uma, pelo menos quatro
e de seus políticos que receberam dinheiro       abertura do julgamento da AP 470. E é a         pessoas – unidas num mesmo propósito e
do esquema. Dos 55 milhões distribuídos          forma como o relator Barbosa está levando       com divisão de tarefas. As três quadrilhas
através do esquema Soares-Valério, a maio-       os seus colegas do STF a julgá-la.              devem ter uma hierarquia, porque, segundo
ria foi para o próprio PT: 23,6 milhões de           É nossa opinião que, ao não dar um          essa tese, Dirceu, da quadrilha política, é
reais – sendo o equivalente a 10 milhões         voto unitário inicial à altura das dimensões    o poderoso chefão e seria o articulador e
de reais depositado numa conta no exte-          que o julgamento adquiriu, Barbosa visou,       comandante do grande esquema.
rior para Duda Mendonça, que, como se            de modo doloso – para usar um termo                 As deformações decorrentes do enca-
sabe, foi o marqueteiro da campanha de           jurídico –, abrir caminho para a vitória da     minhamento dado à AP 470 por Barbosa
Lula à Presidência e de vários candidatos        tese do mensalão. Empenhou-se na defesa         podem ser vistas com mais precisão em

10   | retratodoBRASIL 63
Angeli/Folhapress
alguns absurdos cometidos no tratamento          retirada do dinheiro do BB, como se o            bosa mostrou ao País pela televisão, o BB
                                           -     banco fosse uma padaria de cujo caixa um         não tinha qualquer controle das contas da
drilha dos banqueiros teria grande interesse     dirigente pudesse retirar dinheiro com a                                                 -
em falsificar os empréstimos da dupla                                                             viço algum, apenas carregado a grana para
Valério-Soares, de olho, por exemplo, na         apresentou, mostram que essa acusação é          os esquemas fantásticos de Soares-Valério
liquidação “bilionária” do Banco Mercan-
                                                 Fundo de Incentivo Visanet, para o uso dos
como disse repetidas vezes o advogado de         cartões de bandeira Visa, a partir do qual a     processo está a avaliação de uma equipe de
um dos banqueiros, o ex-ministro Márcio                                                           20 auditores do BB, feita ao longo de quatro
Thomaz Bastos, que essa liquidação foi
                                                                                                  provam o que Valério diz até hoje, aparente-
Barbosa mostrou, como prova da falsidade         no essencial, por uma empresa multina-           mente com razão: que sua empresa realizou
dos empréstimos para o valerioduto, o fato                                                -       todos os serviços de promoção pelos quais
de um sócio de Valério ter recebido em sua       ciation, estabelecida em San Francisco, na
conta um depósito de adiantamento de
dinheiro do Fundo de Incentivo Visanet
e imediatamente ter aplicado o montante
no Banco Rural, como se isso fosse uma

uma obrigação de toda pessoa sensata, no
                                                 a utilização de cartões de sua bandeira, Visa,

                                                                                                  B                                        -
                                                                                                          são Parlamentar Mista de Inquérito

                                                                                                  tese do mensalão, mandou indiciar, pelos
                                                                                                  desvios que imaginou terem sido feitos no
sistema em que vivemos, aplicar a juros                                                           Fundo de Incentivo Visanet durante quatro
                                                                                                  anos de seu uso pelo BB, cinco pessoas,
convênios que o governo federal faz com          mais de 20 outros bancos –, estabelece cla-
estados e municípios, por exemplo, não                                                            administração petista: Luiz Gushiken e Pi-
fossem de adiantamento de boa parte de           de cada pagamento feito por meio dos
dinheiro e de prestação de contas a posteriori   cartões Visa, para promoção dos próprios
E nos quais todos os secretários de Fazenda      cartões e através de cada um de seus sócios,     isso ocorreu apenas porque seu cliente era
com bom senso mandam aplicar o dinheiro
                                                                                                                                                -
    Mas o dolo principal de Barbosa é            depois de o Fundo de Incentivo Visanet ter
                                                 sido fechado em função do escândalo do
                                                 mensalão, tentou fazer valer, sem sucesso,       do governo Lula e superior hierárquico de
Esses 76,7 milhões de reais dos supostos         uma decisão do então presidente do STF,
dois desvios de dinheiro do BB substituem        Nelson Jobim, que mandava a companhia            Embora responsável, em última instância,
os 55 milhões de reais que, na tese do men-                                                       pela publicidade alocada pelo governo Lula,
salão, não existem e teriam sido inventados                                                       se entrasse na história, Gushiken destruiria a
pelos banqueiros, por Valério e por Soares       Visa – não pelo BB e muito menos por             parte da tese que ainda hoje une a massa dos
                                                                                                  conservadores: a de que o ex-comunista, ex-
voto, ao omitir dezenas de provas e teste-                                                        guerrilheiro e ex-comandante da equipe que
munhos da defesa, Barbosa praticamente           serviços de promoção dos cartões emitidos        elegeu Lula, José Dirceu, é o chefão mais
diz que Pizzolato, sozinho, comandou a                                                   -

                                                                                                                   63 retratodoBRASIL       |   11
Política 2



   UMA HISTÓRIA
   EXEMPLAR
    Henrique Pizzolato foi condenado no STF, de forma
    quase unânime, por quatro crimes. Pode ter sido uma
    decisão errada, em todos os casos

    por Lia Imanishi e Raimundo Rodrigues Pereira




    HENRIQUE PIZZOLATO FOI diretor de Comunicação e Marketing do Banco do Brasil                            e veio a campanha de Lula, da qual
    (BB) do início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva até pouco depois          Gushiken foi, junto com José Dirceu,
    do estouro do mensalão, em agosto de 2005, quando foi afastado como um dos denunciados no               um dos dirigentes. Pizzolato começou
    escândalo. Em agosto passado, sete anos depois, foi condenado no Supremo Tribunal Federal (STF)         então a trabalhar ativamente para eleger
    por quatro crimes: corrupção passiva, dois peculatos e lavagem de dinheiro. Foram 44 votos; cada        Lula. Como a Previ tem investimentos
    um dos 11 ministros votou em cada uma das acusações. Só um voto não foi por sua condenação, o           junto a grandes empresas em diversos
    de Marco Aurélio de Mello, que o absolveu do crime de lavagem de dinheiro.                              setores – hoteleiro, ferroviário, portuá-
         Na história que publicamos a seguir tentaremos provar que todas as quatro condenações são          rio, bancário, mineração, infraestrutura,
    injustas, mesmo a por corrupção, em cuja defesa ele apresentou uma versão, de fato, pouco convincente   turismo, lazer e imobiliário –, o partido
    para 326 mil reais que recebeu do valerioduto, esquema montado pelo então tesoureiro do PT,             lhe deu a função de apresentar o plano
    Delúbio Soares, e pelo publicitário mineiro Marcos Valério. Nosso argumento nesse caso: ao réu          de governo petista em reuniões com os
    cabe o benefício da dúvida; a acusação, à qual cabe o ônus da prova, não provou que Pizzolato não       líderes patronais dos sindicatos, asso-
    repassou o dinheiro para o PT do Rio de Janeiro, como ele alega. Diremos mais: a condenação pelos
    dois peculatos, essencial para “provar” a teoria do mensalão, simplesmente não se sustenta nos fatos.   de obter apoio. Lula eleito, Gushiken
                                                                                                            foi ser ministro da Secretaria de Comu-
                                                                                                            nicação Social e Assuntos Estratégicos
    UM HOMEM CONDENADO                                                                                      da Presidência da República e superior
    Trinta e dois anos de carreira até o topo do Banco do Brasil.                                           hierárquico de Pizzolato em relação aos
    E, de repente, Pizzolato se transformou num pária                                                       assuntos relativos à publicidade do BB.
                                                                                                                Tudo parecia ir muito bem até 3
   Henrique Pizzolato tem 60 anos. For-                 tário. Depois, foi eleito presidente do             de agosto de 2005, quando a vida de
   mou-se em arquitetura, com especiali-                Sindicato dos Bancários do Rio Grande               Pizzolato virou de cabeça para baixo.
   zação em urbanismo. Estudou também                   do Sul e do Paraná, para onde se mudou              Em manchetes de jornais, foi acusado
   comunicação social durante três anos.                antes de ir para o Rio de Janeiro, em               de receber R$ 326.660,27 encaminhados
   Em 1974, ainda universitário, passou em              Copacabana, onde mora até hoje. Foi                 a ele pelo empresário Marcos Valério, da
   concurso para escriturário do Banco do               no movimento sindical que Pizzolato                 agência de publicidade DNA. Valério já
   Brasil (BB), onde, ao longo de 32 anos               conheceu, por volta de 1985, Luiz                   era tido como o operador do mensalão,
   de carreira, ocupou diversos cargos, até             Gushiken, então presidente do Sindicato             o grande escândalo do início do governo
   chegar ao topo, em fevereiro de 2003,                dos Bancários de São Paulo e depois                 Lula, e a Comissão Parlamentar Mista
   como diretor de Marketing e Comuni-                  deputado federal pelo PT. Durante                   de Inquérito (CPMI) dos Correios, a
   cação, nomeado pelo recém-empossado                  cinco meses, ele, Gushiken e Eduardo                mais importante de três formadas para
   presidente do banco, Cássio Casseb. Já               Jorge, também deputado federal pelo                 investigar o caso, pegava fogo. O di-
   conhecia Casseb do conselho da Brasil                PT, dividiram um apartamento em Bra-                nheiro fora sacado por um contínuo da
   Telecom, no qual este representava a                 sília. Pizzolato os convidou a trocar os            Previ, Luiz Eduardo Ferreira da Silva,
   Telecom Itália e ele, a Previ, o fundo de            quartos de hotel pagos pela Câmara dos              em uma agência do Banco Rural, no
                                                        Deputados pelo apartamento funcional                centro do Rio de Janeiro. Levado a de-
   em sua nomeação também, é claro, sua                 da Associação Nacional dos Funcioná-                por na Polícia Federal (PF), o contínuo
   militância no PT, no qual ingressou logo             rios do BB, da qual era dirigente. Em
   na fundação, ainda estudante universi-               2002 seu mandato na Previ terminou                  pediu que fosse buscar “documentos”

   12   | retratodoBRASIL 63
FolhaPress
 Pizzolato: a acusação de corrupção
 é a que mais dói. “Fui humilhado,
 execrado em praça pública. Tudo
 com insinuações, hipóteses.
 Não apresentaram uma prova”



no Banco Rural. Lá chegando, disse          ter feito isso a mando de Gushiken, um       da Ação Penal 470 (AP 470) – ou seja,
no depoimento, foi levado a uma sala        dos maiores dirigentes do governo Lula.      em depoimento judicial, tendo ele, como
interna do banco, onde lhe entregaram           O mensalão não mais iria sair do         advogado, ao lado, em 14 de fevereiro de
dois embrulhos em papel pardo, os           noticiário dos jornais nos próximos sete     2008 – o juiz da 7ª Vara Federal Criminal,
quais disse ter levado pessoalmente         anos. Pizzolato disse, em depoimento         Marcelo Granado, abriu a audiência para
a Pizzolato, em seu apartamento em          judicial, depois, que a sua inquirição       toda a imprensa, fato que, diz ele, “não
Copacabana. Foi a notícia mais quente       pelos deputados e senadores na CPMI          ocorreu em nenhum outro depoimento
dos jornais do dia seguinte. As matérias    foi uma tortura, que se sentiu “humilha-     dos litisconsortes passivos, para utilizar a
destacavam que, pouco tempo depois          do”, “achincalhado”. Hoje vive recluso       própria expressão do STF”. Lobato diz
do recebimento do dinheiro, Pizzolato       no apartamento em Copacabana. Não            que ainda tentou anular o depoimento,
comprara um apartamento de 400 mil          fala com a imprensa. Para Retrato do         mas o ministro Joaquim Barbosa negou
                                            Brasil, sua única concessão foi enviar       o pedido sob o fundamento de que o
sua culpabilidade. Quinze dias depois,      pela internet, a 7 de setembro, através de   processo não está sob sigilo.
Pizzolato depôs na CPMI dos Correios.       seu advogado, Marthius Sávio Lobato,             Depois de aberta a AP 470, Barbosa
Seu advogado pediu habeas corpus ao         em Brasília, uma declaração da Receita       expediu as chamadas “cartas de ordem”
                                            Federal com a qual buscava provar que,       para que os réus fossem ouvidos pela
calado, o que foi negado. Pizzolato disse   após uma devassa em suas contas, nada        Justiça em seus estados de origem. Em
no depoimento que suas ações no BB          fora apurado contra ele. Mas RB teve         2008, quando terminou seu depoimen-
tinham sido aprovadas por Gushiken, o       cerca de oito horas de conversas com         to no Rio, o juiz Granado concedeu a
que causou sensação ainda maior por-        Lobato, que estudou na Universidade          Pizzolato o direito de, “como pessoa
que, àquela altura, a questão do dinheiro   de Brasília, onde foi aluno de Gilmar        humana”, dizer mais algumas palavras
que teria recebido de Valério já estava     Mendes, um dos ministros do STF hoje         em sua defesa, se quisesse. Pizzolato
associada a outra denúncia, maior: a de     no julgamento do caso.                       disse: “Eu queria dizer da minha revolta,
ter desviado 73,8 milhões de reais do BB        Lobato diz que considera seu cliente     da minha insatisfação da forma como
ilegalmente para as empresas do publi-      um injustiçado. Conta que, na primeira       eu fui envolvido nesses fatos, porque
citário. Pizzolato então estaria dizendo    vez em que Pizzolato falou para os autos

                                                                                                         63 retratodoBRASIL      |   13
destruída, tive a minha família exposta,      pessoa do PT que o procurou. Diz que        da venda de dólares que comprara – ele
         fui humilhado, fui execrado em praça          não abriu os envelopes, não quis saber      mostrou o comprovante de aquisição.
         pública, fui julgado, fui satanizado em       o nome do emissário do partido e nunca           Em depoimento judicial, Valério
         público [...] tudo a partir de insinuações,   mais viu a cara dele.                       disse que o diretório do PT do estado
         não foi apresentado um documento;                 Lobato nega todos os crimes dos         do Rio de Janeiro, de acordo com o
         tudo a partir de hipóteses”.                  quais Pizzolato é acusado. Diz que          então tesoureiro do PT, Soares, tinha
             Lobato disse a RB que Pizzolato           Barbosa não analisou as provas apre-        débitos de campanha de 2002, estava
         tinha saído dessa fossa e se animara          sentadas por ele nos autos. No caso da      se preparando para as eleições munici-
                                                       corrupção, diz, Barbosa e os juízes prin-   pais de 2004 e foi o que mais recebeu
         sua defesa, entregues ao STF em 30 de         cipalmente especularam sobre a versão       recursos do esquema comandado por
         agosto do ano passado. Mas a sentença                                                     Soares. O tesoureiro do PT, então, so-
         dos ministros do STF o teria arrasado. O                                                  licitou a ele que remetesse um total de
         crime de corrupção passiva é, talvez, o
         que mais lhe doa. A acusação é a de que
                                                             Valério:                              pessoas indicadas para o recebimento
         ele embolsou os 326 mil reais repassados
         por Valério, justamente para facilitar os
                                                            Delúbio                                foram Manuel Severino, Carlos Ma-
                                                                                                   nuel e Pizzolato, disse Valério. Os R$
         desvios dos dois crimes de peculato,
         um de 2,9 milhões de reais e outro de
                                                            mandou                                 326.660,67 repassados via Pizzolato
                                                                                                   seriam parte desse total. Valério disse
         73,8 milhões de reais. E, para encobrir
         a corrupção cometeu outro crime, o              R$ 2.676.660,67                           também que Pizzolato trabalhou na
                                                                                                   campanha eleitoral de 2002 com Soares,
         de “lavagem de dinheiro”, ocultando
         origem, movimentação e destino dos               para o PT-RJ.                            no Rio de Janeiro.
                                                                                                       Lobato diz, com razão, que o ônus
         recursos recebidos de Valério a 15 de                                                     da prova é da acusação: “Cadê a prova
         janeiro de 2004.                                 R$ 326.660,67                            de que Pizzolato pegou esse dinheiro
             No seu depoimento, Pizzolato disse                                                    para ele?”. Ao depor na CPMI em
         que naquele dia recebeu uma ligação              via Pizzolato                            2005, Pizzolato abriu para a Justiça,
         em seu celular de uma mulher que dizia                                                    imediatamente, todos os seus sigilos
         ser a secretária de Valério, pedindo que

         para o PT” em um “escritório” no cen-         que Pizzolato deu para a encomenda          para comprar o apartamento que a
         tro da cidade. Pelo fato de estar muito       recebida de Valério. A acusação, diz        acusação sugeria ter saído de suborno
         ocupado, diz Pizzolato, acertou com a         Lobato, primeiro trabalhou muito para       recebido. Em 2005, por exemplo, rece-
         secretária mandar outra pessoa em seu         provar que Pizzolato teria comprado um      bia 4 mil reais da Previ, 19 mil reais do
         lugar, no dia seguinte, com o compro-         apartamento de 400 mil reais, no mês        BB, 18 mil reais a título de participação
         misso de entregar os documentos ao            seguinte ao recebimento de dinheiro de      no conselho da Embraer e mais 4 mil
         representante do PT que iria procurá-lo       Valério, mas fracassou. Pizzolato provou    reais devido à atuação no conselho da
         no mesmo dia. Pizzolato diz que rece-         que comprou o apartamento com suas          Associação Nacional dos Funcionários
         beu uns envelopes do contínuo Silva e         economias, com um cheque do BB e            do BB. Lobato mostra a RB o imposto
         os repassou, como combinado, a uma            mais 100 mil reais em espécie, resultado    de renda de Pizzolato que está nos
                                                                                                   autos. Em 2003, seu patrimônio era
                                                                                                   de R$ 1.304.725,45. Em 2004, de R$
      O relator da CPMI dos Correios, Osmar Serraglio, nas alturas: a oposição comemora            1.768.090,23, já incluído o apartamento
                                                                                                   comprado em fevereiro daquele ano. Seu
FolhaPress




                                                                                                   rendimento bruto anual em 2004 foi de
                                                                                                   R$ 717.611,46 – aproximadamente 60
                                                                                                   mil reais por mês. “A Receita Federal
                                                                                                   e a Polícia Federal não conseguiram
                                                                                                   encontrar nenhuma irregularidade nas
                                                                                                   contas de Pizzolato”, diz Lobato.
                                                                                                       Pizzolato tem razão? Ele pode ter
                                                                                                   omitido fatos e o nome de pessoas em
                                                                                                   sua versão da história, o que a tornou
                                                                                                   pouco crível. Mas, aceitando-se a tese do
                                                                                                   caixa dois, sua versão pode ser verdadei-

                                                                                                   da dúvida, nesse caso. Mais ainda porque
                                                                                                   os dois crimes de peculato de que é acu-
                                                                                                   sado, e pelos quais ele teria recebido o
                                                                                                   suborno, podem ter sido simplesmente
                                                                                                   inventados para sustentar a tese do men-
                                                                                                   salão, como relatamos a seguir.


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ONDE ESTAVAM OS DOCUMENTOS?                                                           participação no FIV, em 2001, o BB
Barbosa disse que o BB não tinha recibos do dinheiro gasto por
Valério. Mas sabia que estavam com a CBMP, controlada pela Visa                       recursos do FIV não passariam por seu
                                                                                      orçamento. E nunca fez um contrato
Visanet é o nome fantasia da Compa-        Ele previa a cobertura para atividades
nhia Brasileira de Meios de Pagamento      de promoção de todo tipo. No seu           agência DNA para o uso dos recursos
(CBMP), fundada no Brasil em 1995 e        item III.4, definia as “ferramentas        do FIV. Essa situação persistiu até
que passou a operar mais amplamente        mercadológicas”, a serem usadas.           meados de 2004.
a partir de 2001. O capital controlador                                                  A DNA trabalhava com publicidade
da CBMP é da Visa International Ser-       dessas ferramentas, como: “publicidade     e promoção para o BB desde 1995.
vice (Visa), que tem 10%; do Bradesco,     em mídias de massa”, “TV, rádio,           Entre 2001 e 2002 dividia os trabalhos
com 39%; e do BB, 32%. O restante          revistas, jornais, outdoors, mobiliário    de promoção com uso do dinheiro do
está dividido entre cerca de 20 outros     urbano, front e back lights, painéis,      FIV com outras agências contratadas
sócios – bancos como Itaú, Santander       etc.”; “merchandising, trabalhos
e BankBoston. Pode-se dizer, porém,        de planejamento, criação, layout,          ainda no governo FHC – destaque-se,
que o controle da CBMP sempre foi          editoração, produção, veiculação e         para melhor entendimento de nossa
da Visa, empresa americana do mundo        comissão de agência de publicidade”;       história –, o BB decidiu dividir os tra-
                                       -                                              balhos das suas agências entre as áreas
mas décadas. Ela é a possuidora dos        para portador no ponto de venda,           de negócios chamadas de “governo”,
direitos dos cartões de crédito e débito   nas agências bancárias, via internet,      “atacado” e “varejo” e escalou a DNA
da bandeira com seu nome, emitidos em      correio, telefone ou locais de grande      para o varejo, em que se encontravam
cerca de 200 países.                       fluxo de portadores para estimular         os serviços para promoção de seus
    A partir de 2001 a CBMP começou        venda do plástico; de planejamento e       cartões com bandeira Visa.
a operar no Brasil o Fundo de Incentivo                                                   O ministro Barbosa conhece bem
Visanet (FIV), “com o objetivo único”,     de divulgação e de apoio, contratação      toda essa história. Sabe, por exemplo,
como diz um de seus documentos, “de        de promotores, compra de benefícios,       que os originais dos recibos dos servi-
realizar ações de marketing destinadas a   brindes, prêmios, taxas governamentais     ços da DNA prestados ao BB eram da
incentivar o uso dos cartões Visa pelos    de aprovação e alvarás”. E por aí afora.   CBMP e que a companhia resistiu judi-
consumidores”. O FIV era formado               O FIV era administrado por um          cialmente por longo tempo a entregar
por uma porcentagem dos negócios           comitê gestor, formado por um presi-       tais recibos, mesmo com o escândalo
com os cartões e a CBMP destinava          dente, um diretor de Finanças e Admi-      do mensalão, depois de ter sido de-
os recursos assim obtidos a ações de       nistração e outro de Marketing, todos      terminado, a 11 de janeiro de 2006,
promoção e marketing dos mesmos,                                                      pelo então presidente do STF, Nelson
a serem comandadas pelos sócios. O         os recursos estavam sendo emprega-         Jobim, o acesso de peritos do Instituto
dinheiro movimentado pelos cartões         dos “de acordo com as diretrizes, a        Nacional de Criminalística “a todos os
da bandeira Visa é monumental: no          estratégia do negócio e as condições do    documentos da empresa no período de
mundo, passa de 5 trilhões de dólares      Regulamento”. Os recibos dos gastos        2001 até janeiro de 2006”. Em junho de
por ano. No Brasil, é mais de 1 bilhão     da agência de publicidade DNA, de Va-      2006, quando Barbosa já era, no STF, o
de reais anualmente, somando-se ape-                                                  ministro encarregado de supervisionar
nas os negócios feitos com os cartões      com a CBMP, que fazia pagamentos           o andamento do inquérito 2.245, rela-
Visa do BB.                                                                           tivo ao mensalão, ele recebeu uma
    A CBMP arrecadou para o FIV
                                                                                                                                 José Cruz /Agência Senado



cerca de meio bilhão de reais entre 2001
                                       -
cerrado; na verdade, mudou de nome,
devido à má repercussão das histórias
divulgadas a respeito dele no mensalão.
O BB foi o líder dos negócios com
cartões de bandeira Visa nesse período.
Sua parte no FIV foi grande e crescente:
aproximadamente 150 milhões de reais
entre os anos de 2001 e 2004: 60 mi-
lhões de reais nos anos 2001–2002 – no
governo Fernando Henrique Cardoso,          Já em 2005 Valério afirmava
portanto – e 90 milhões de reais nos        ter feito os trabalhos pagos pelo
anos 2003–2004, já no governo Lula,         Fundo de Incentivos Visanet: na
quando Pizzolato era diretor de Comu-       foto, advogados dele entregam
nicação e Marketing do BB.                  o que seriam suas provas à
    Desde a criação da CBMP, o FIV          CPMI dos Correios (o relator,
tinha um regulamento que cada sócio         Serraglio, à esquerda; ao centro,
deveria observar para usar os recursos.     o presidente, Amir Lando)


                                                                                                     63 retratodoBRASIL    |   15
petição do então procurador-geral,
                                                                                                  Antonio Fernando de Souza, relatando




                                                                                            STF
                                                                                                     Souza requisitou “busca e apreen-
                                                                                                                                     -


                                                                                                                                     -
                                                                                                  vou os pedidos do procurador-geral e


                                                                                                                                        -




             Receitas do FIV      Adiantamentos       Gastos com notas
                                                                            Gastos sem
             utilizadas pelo      às agencias de      fiscais em poder
                                                                            notas fiscais
             Banco do Brasil       publicidade            da CBMP
               R$ milhões      R$ milhões     %     R$ milhões     %             %
     2001        28,83           26,4       91,57     28,76      99,76          0,24
     2002        32,03            21,9      68,37     31,99      99,88          0,12
     2003        38,43            29,7      77,28     38,28      99,61          0,39                                                    -
     2004        52,01            34,1      65,56     51,45      98,92          1,08

     BARBOSA NÃO VIU
     Os números da auditoria mostram o que o relator
     provavelmente não quis ver
     A tabela acima foi construída a partir da auditoria feita por 20 técnicos do BB por
     quatro meses, logo após a denúncia do mensalão. Ela mostra que o Fundo de Incenti-
     vo Visanet (FIV) foi operado pelo BB, entre 2001 e 2004, da mesma forma, tanto nos
     anos do governo FHC (2001–2002) como nos anos do governo Lula (2003–2004).
     Diz o relatório da auditoria que as regras para uso do fundo pelo BB tiveram
     duas fases: uma, de sua criação, em 2001 , até meados de 2004, quando o banco,
     em função de não ter adotado “definições formais acerca dos direcionamentos                                                        -
     estratégicos”, como tipo de “eventos ou ações que poderiam ser patrocinados”,
     adotou “como referencial básico, o Regulamento de Constituição e Uso do Fun-                 nos anos 2001–2002; que os recursos
     do” da CBMP, que é sua “legítima proprietária”; e outra, do segundo semestre
     de 2004 até dezembro de 2005, quando o banco criou uma norma própria para
     o controle dos recursos do fundo.                                                            total a ser gasto, antes de as despesas
     Os auditores fizeram simulações por amostragem para verificar a porcentagem
     das ações de incentivo para as quais existiam comprovantes, no banco, de que elas
     tinham sido de fato realizadas. Procuraram os documentos existentes no próprio
     banco – notas fiscais, faturas, recibos emitidos pelas agências para pagar os ser-
     viços e despesas de fornecedores para produzir as ações. Referente ao período                gestão do FIV, para evitar possíveis
     2001–2002, não foram localizados esses documentos. Já com relação aos anos
     2003 e 2004, entre as 93 ações encaminhadas à Visanet, nas 33 ações selecionadas
     como amostra para a análise, para três delas não havia qualquer documento e para
     20 havia parte dos documentos. Ou seja: somando-se as ações com falta absoluta
     de documentos às com falta parcial, estas chegavam a 45% do total de recursos
     despendidos. Os auditores procuraram então os mesmos documentos na CBMP,
     que, por estatuto, era a dona dos recursos e a controladora de sua aplicação. A
     falta de documentação comprobatória foi, então, muito pequena em proporção aos
     valores dos gastos autorizados, como se vê ma última coluna da tabela.
     Para condenar Pizzolato, o relator Barbosa não destacou esses dados. Não os
     viu ou não os quis ver?


16   | retratodoBRASIL 63
O PEQUENO PILAR DO MENSALÃO                                                             de contrato por BVs, exatamente no
É a acusação que trata dos bônus de volume. E tem lei do                                período em que Pizzolato estava no
Congresso, contra a qual se insurge o presidente do STF                                 banco. O banco, no entanto, respondeu
                                                                                        de modo mais amplo. Disse que existiam
Os dois peculatos – desvios de 2,9          plicou depois que o BV se distingue
milhões de reais e 73,8 milhões de reais                                                tratavam do BB, envolvendo justamente
do BB – que Pizzolato teria cometido        relação entre o BB e os fornecedores        as cinco grandes agências que prestavam
a favor da agência DNA, de Valério,         de mídia. “Os fornecedores – jornais,       serviços para o banco entre 2000 e
formam os pilares de sustentação do         rádios, televisões – costumam oferecer      2005: Grottera, Lowe, DNA, D+Brasil
mensalão. Se a acusação não consegue                                                    e Ogilvy.
provar esses dois desvios, a tese do        para que o período de compra seja mais          O BB mostrou a Barbosa que
mensalão desmorona (ver “O herói do         longo. Por exemplo, eu comprei 60 dias      apresentou recursos contra decisão
mensalão”, nesta edição). O pequeno         de espaço no Valor Econômico. O Valor
peculato trata do bônus de volume (BV).     Econômico me faz uma proposta: se você      auditoria nas cinco agências, para poder
                                            comprar noventa dias ou seis meses eu       juntar, aos autos do processo naquele
que a DNA de Valério embolsava inde-
                                            o caderno especial de domingo, porque       a serviços de BVs emitidas por essas
BB, dadas a ela, pelas empresas com as      vou lançar um caderno especial, um          cinco agências. O BB mostrou que
quais contratava serviços para promo-       encarte. Pode dizer também: eu te dou       isso não foi aceito por nenhuma delas.
ção dos cartões Visa do BB, em função       mais 5% de desconto”. Nesse caso, o
do volume dessas contratações. No           banco participa da negociação. E todo       relativas a BVs, por dizerem respeito a
interrogatório judicial de Pizzolato, em                                                negociações privadas entre elas e seus
2008, o juiz Granado leu um trecho da                                                   fornecedores, nada tinham a ver com
denúncia do então procurador-geral que
                                              Pelas datas dos                           do Brasil” e não estavam contempladas
pagas pelos fornecedores de serviços                                                    entre os documentos que poderiam ser
para a DNA – jornais, TVs, empresas de         pedidos se vê,
promoção contratadas pelo publicitário                                                     As defesas de Pizzolato e Valério
para os trabalhos de estímulo ao uso
dos cartões Visa do BB – deveriam ter
                                                claramente.                             mostraram nos autos, com testemunhos
                                                                                        importantes – de vários destacados
sido repassadas ao BB pela agência de
Valério e não o foram. O próprio Gra-
                                               O relator e o                            e marketing –, que o Ministério Público
nado informou que esse procedimento
era antigo: cinco agências, entre 2000
                                                procurador                              tinha feito uma interpretação equivoca-

e 2005, embolsaram esses BVs e não
apenas a DNA.
                                               geral queriam                            não pertence à empresa contratante (no
                                                                                        caso, o BB), e sim à agência de publi-
    Pizzolato fez, então, primeiro, um
esclarecimento. Mostrou que existem
                                              pegar Pizzolato                           diretor-geral da Rede Globo, Octávio
                                                                                        Florisbal, que criou o BV no mercado
fruto da relação entre a agência de pu-                                                 de propaganda e marketing brasileiro.
blicidade e o fornecedor de mídia – TVs,                                                Ele disse que “praticamente todos os
rádios, jornais, revistas, etc. “O nome     para o BB, disse Pizzolato ao juiz. Nesse   veículos impedem que a agência repasse
                                                                                        esses volumes ou esses valores para os
volume”, disse Pizzolato. Não se restrin-   Pizzolato a Granado.
ge ao volume de publicidade veiculado          O próprio procurador-geral Souza,        empresa em que eu trabalho, toda vez
pela agência por um cliente, como o         na denúncia apresentada ao STF em           que nós temos conhecimento de que
BB. Todas as agências que prestavam                                                     uma determinada agência está repas-
serviços para o banco tinham vários         qual constava que a DNA teria recebido
clientes e o BV era dado pelas empresas     esses BVs indevidamente desde 2000,         um determinado anunciante, nós sus-
de mídia às agências pelo volume total      num valor de 4,3 milhões de reais. Mas,     pendemos esse plano, porque esse não
de anúncios veiculados. “Isso, doutor, é    como Souza já tinha como foco Pizzo-        é o objetivo”. Florisbal citou normas
praticado em todo o mercado, público        lato, ele destacou que, desse dinheiro,     do mercado de publicidade, decisões
e privado”, disse Pizzolato a Grana-        “2,9 milhões se referiam ao período de      e acordo recente “entre anunciantes,
do. O próprio Tribunal de Contas da         31/03/2003 a 14/06/2005, da gestão          agências e veículos” para comprovar que
                                            de Pizzolato na Diretoria de Marketing      o BV é “direito da agência e não deve
auditoria a que Granado tinha se refe-      do Banco do Brasil”. Como já se disse,      ser repassado aos anunciantes, sejam
                                            Barbosa também visava pegar Pizzolato,      da iniciativa privada, sejam anunciantes
diz que o BV foi praticado no Banco         quando, em 2009, com a AP 470 já em         de estatais”.
do Brasil de 2000 a 2005, por todas as      pleno curso, enviou interrogatório à            Barbosa, o relator do julgamento
cinco agências que prestaram serviços       direção do BB da época pedindo infor-       do mensalão, citou diversas vezes, para
ao banco nessa época”. Pizzolato ex-        mações sobre eventual descumprimento        condenar Pizzolato, os termos do

                                                                                                       63 retratodoBRASIL    |   17
ABr
     Ana Arraes, no centro da foto, o ministro
     Vilaça, à esquerda, e Ayres Britto, à
     direita: pelo TCU, ela reafirmou as regras
     e ele considerou que era absurdo ser
     diferente. Já o presidente do STF se
     rebelou contra a lei
     ABr




                                                                                                                                  STF
contrato entre o BB e a DNA. Leu um               volume. Não vejo cabimento nisso”.          a polêmica que havia, o que era “uso e
dos seus itens, que diz que a agência                  O fato é que a Lei 12.232/2010,        costume” foi colocado na lei. O minis-
deveria “envidar esforços para obter as           que dispõe sobre as normas gerais para      tro Ayres Britto, presidente do STF, ao
melhores condições nas negociações                licitação e contratação de serviços de      condenar Pizzolato e Valério, saiu-se
junto a terceiros e transferir, integral-         publicidade pela União, foi editada
mente, ao banco, os descontos especiais           para regulamentar o que já existia nas
(além dos normais previstos em tabelas),          relações de fato entre agências e anun-     preparada intencionalmente, maquina-
                                                  ciantes públicos e privados. O projeto      damente, para coonestar com os autos
ciais de pagamento e outras vantagens”.           que deu origem à lei é do então depu-       desta Ação Penal 470”. Para Britto, a lei
                                                  tado e hoje ministro da Justiça, José       “é um atentado descarado ao artigo 5º,
                                                  Eduardo Cardozo. É de 2008 e legaliza       inciso 36, da Constituição, que fala do
mídia” oferecidas pelos fornecedores              a retenção, pelas agências, dos BVs nos     princípio de segurança jurídica, dispo-
para estimular vendas por períodos                contratos com as empresas estatais. O       sitivo que é verdadeira cláusula pétrea”.
mais longos.                                      projeto aprovado foi o emendado pelos            O presidente da suprema corte, ago-
   No TCU, ao analisar o caso DNA–                parlamentares Milton Monti (PR–SP) e        ra, além de dar sentença, parece querer
BB, a ministra Ana Arraes considerou              Claudio Vignati (PT–SC). Vignati diz        mandar o Congresso fazer nova lei. E
                                                  que a emenda foi pedida pelo setor de       revisar dezenas e dezenas de contratos
BV. Tomou como base a Lei 12.232,                 publicidade, porque as agências sempre      feitos pelas estatais, que respeitaram os
sancionada em 2010, que autoriza isso             retiveram na prática os BVs. Para sanar     BVs nas últimas décadas.
explicitamente, em dois artigos, um
deles referindo-se a contratos encerra-
dos antes de a lei entrar em vigor. Ela           O DESVIO NA “CASA DA MÃE JOANA”
tomou por base a votação de processos             A se acreditar nas descrições do relator e do revisor da AP 470,
                                                  Pizzolato teria tirado 73,8 milhões de reais do BB na “mão grande”
empresas, relatados pelo ministro do
TCU Marcos Vinicios Vilaça. Ao funda-             Quanto ao grande peculato, o desvio de      na forma de adiantamentos, sem que se
                                                  73,8 milhões de reais do BB para Valério,   tenha comprovado a realização de qual-
                                                  que teria sido feito sob o comando de Pi-   quer propaganda ou promoção. Também
ção de BV é algo impossível de contro-            zzolato, tanto o relator Joaquim Barbosa    isoladamente ele teria prorrogado um
lar, porque o prêmio depende, primeiro,           como o revisor Ricardo Lewandowski          contrato de publicidade com a DNA,
da política de incentivos do ofertante            apresentaram em seus votos para os          no período de abril a setembro de 2003.
e, segundo, dos investimentos feitos à            nove colegas do STF um cenário abso-        E, além disso, sem qualquer processo
ordem de outros contratos que a agência           lutamente incrível. Entre 2003 e 2004, no   licitatório, Pizzolato teria dado a conta
possui. Tenho assistido, perplexo, ao             cargo de diretor do BB, Pizzolato teria     de publicidade do Banco Popular, lan-
Tribunal orientar as entidades públicas           comandado, sozinho, o desvio daqueles       çado na época pelo BB, para a mesma
a efetuarem auditorias em agências de             milhões de reais do banco para a agência    agência do operador do mensalão, como
publicidade para apuração do bônus de             de publicidade DNA, principalmente          se fosse o dono de uma espécie de “casa

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  • 3. Ponto de Vista Calandra, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil: “Nunca vi presidente de tribunal votar duas vezes para condenar alguém” ABr Um julgamento de exceção Na Ação Penal 470, do chamado mensalão, o STF, pressionado pela grande mídia, negou direitos básicos à defesa e, assim, criou regras de ocasião para interpretar o direito penal brasileiro EM MEADOS DE setembro, caminhan- do julgamento, o do relator Joaquim tinha, então, recuado: reorganizou seu do-se para o segundo mês de apre- Barbosa. Ele começou pela análise de voto e votou, como Barbosa, também na ciação, pelos ministros do Supremo crimes que teriam sido cometidos no forma fatiada. Tribunal Federal (STF), do mérito da uso de recursos públicos, um dos sete Na primeira derrota, os defensores Ação Penal 470 (AP 470), que julga blocos em que subdividiu seu voto, e queriam garantir aos réus o direito, os envolvidos no chamado mensalão, anunciou que, depois, passaria a palavra expresso na Constituição brasileira, confirmam-se as previsões pessimistas para os demais ministros votarem sobre da dupla jurisdição: poder apelar da feitas no início desse processo, quando o mesmo assunto. sentença a um tribunal mais alto. No uma petição da maioria dos advogados Houve, então, certo tumulto no julgamento pelo STF, corte acima de dos acusados alertou para a possibili- tribunal. O revisor do voto de Barbosa, todas, esse direito praticamente não dade de ser feito um “julgamento de Ricardo Lewandowski, disse que o en- existe. E é preciso destacar que somente exceção”. Na ocasião, os defensores dos caminhamento contrariava o regimento dois dos réus têm de ser julgados pelo réus já tinham sido derrotados em sua do STF e ameaçou renunciar. O ministro STF, porque são deputados e têm foro pretensão de desmembrar a ação penal, Marco Aurélio de Mello condenou a pro- privilegiado; 36 dos 38 não o têm. Os enviando para os tribunais inferiores posta de Barbosa. O presidente do STF, defensores dos réus foram derrotados os acusados sem foro privilegiado. No Ayres Britto, iniciou uma contagem de sob o argumento de que se tratava de julgamento de um caso muito parecido, votos para decidir a forma de votação, um processo único, no qual todos os acu- o dito mensalão tucano, que envolve mas não a concluiu e acabou decidindo sados têm ligação com o grande crime políticos do PSDB de Minas Gerais, o que cada um votaria como quisesse, o que teria sido cometido, o da compra de STF tinha desmembrado o processo. Por que, como alguns ministros argumen- votos por um “núcleo político” do PT e que não fazê-lo no caso do mensalão pe- taram imediatamente, causaria uma do qual faria parte José Dirceu, então tista, diziam os advogados? O segundo confusão tremenda. O julgamento foi chefe da Casa Civil do governo do ex- protesto foi contra mais uma medida suspenso depois do voto de Barbosa, presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No excepcional: o fatiamento das decisões feito da forma fatiada, como escolhera, e caso do fatiamento, ao argumentarem dos ministros. Isso ocorreu em função recomeçou na sessão seguinte, após um que o processo é um todo e seria mais do encaminhamento do primeiro voto acordo entre os ministros. Lewandowski justo ouvir o voto integral de cada 63 retratodoBRASIL | 5
  • 4. ministro, os advogados dos acusados declarou que o PT estava pagando um exemplo curioso: “Tem-se admitido, foram derrotados sob o argumento da uma mesada a parlamentares e assim em matéria de prova, uma certa elastici- conveniência: dividir o julgamento em corrompendo o Congresso. A Comissão dade na prova acusatória, valorizando- partes facilitaria a compreensão das Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) se o depoimento das vítimas. É como nos decisões. dos Correios, por exemplo, comandou casos de estupro. Nos delitos de poder Afinal, pode-se perguntar: é um investigações. Do seu trabalho resulta- não pode ser diferente”. A ministra grande e único crime que obriga enfiar ram cassações de mandatos e renúncias parece estar muito impressionada com 38 pessoas num mesmo saco, mesmo de parlamentares e na sua conclusão ela os comentaristas dos grandes jornais desrespeitando direitos claros da gran- encaminhou o pedido de indiciamento conservadores, que querem a conde- de maioria deles? Ou se trata de criar criminal de dezenas de pessoas. nação dos petistas a qualquer preço, e sete fatias de crimes que devem ser A CPMI não condenou criminalmente confunde seus clamores com indícios puxados de uma cartola de modo pla- ninguém. Os depoimentos que ouviu, as para condenar o “poderoso” Cunha, um nejado, para criar um clima que ajude a perícias que promoveu, as acusações ex-metalúrgico – como Lula –, que foi condenar os petistas a qualquer preço, que fez são indícios que podem ser usa- presidente da Câmara dos Deputados. como mostramos nesta edição, em “O dos na AP 470, é óbvio. Mas as provas Cunha foi condenado, entre outros, herói do mensalão”. O artigo descreve essenciais, diz a lei brasileira, são produ- pelo crime de peculato por 9 votos a 2. as gestões do ministro Barbosa, que zidas judicialmente, são as que estão nos Rosa e Fux, por exemplo, votaram pela atua mais como promotor do que como autos do processo. O valor determinante condenação, a despeito de a acusação juiz nesse caso, empenhado praticamen- para um julgamento é o das provas apre- não ter conseguido provar ter ele co- te numa campanha de opinião pública sentadas diante de um juiz, num ato no metido qualquer delito numa licitação para vender a tese do mensalão. qual o contraditório, a participação da usada para condená-lo, pela qual uma A maioria do STF parece disposta das agências do publicitário Marcos a ultrapassar limites. Segundo depoi- Ao negar à Valério ganhou concorrência para gerir mentos de vários de seus ministros, a 10 milhões de reais a serem usados para corte não sabe o que fará no caso de um maioria dos promover as atividades da Câmara. empate de votos. Com a aposentadoria Quando, em 1994, julgou o ex-presidente de Cezar Peluso, logo após o encerra- réus a dupla Fernando Collor de Mello por crime de mento da primeira fatia da discussão, peculato – o de ter recebido de presente permaneceram dez ministros. Eles jurisdição, de seu tesoureiro de campanha, Paulo estariam discutindo o que acontecerá César (PC) Farias, um automóvel Fiat –, se houver uma decisão com cinco de “o STF pode ser o STF decidiu em sentido oposto. Absol- um lado e cinco de outro: o presidente veu Collor de Mello porque a acusação da corte, Ayres Britto, votará ou não visto como um não conseguiu provar a existência de pelo desempate? É uma duvida desca- órgão que vestiu um ato de ofício, uma decisão formal bida. In dubio pro reo, lembrou Nelson por meio da qual ele, como funcionário Calandra, presidente da Associação dos a toga para matar, público, teria favorecido PC Farias em Magistrados do Brasil, referindo-se a um troca do Fiat recebido. Rosa e Fux con- dos pilares do direito penal, o princípio não para julgar” denaram Cunha porque não aceitaram da presunção da inocência, segundo o sua explicação para ter recebido 50 mil qual, em caso de dúvida, o acusado deve reais de Valério. Cunha disse nos autos ser considerado inocente. “Nunca vi parte contrária, é indispensável, para – e apresentou provas – que os 50 mil presidente de tribunal votar duas vezes que seja garantido outro princípio do reais foram gastos com uma pesquisa para condenar alguém”, disse Calandra. processo penal: o do amplo direito de eleitoral e que pediu o dinheiro a Delúbio A palavra de ordem que prevalece defesa. Sob o argumento de que estão Soares, tesoureiro do PT, num esquema no STF no julgamento do mensalão julgando um crime dos poderosos, com de caixa dois cujo intermediário foi Va- petista parece ser: flexibilizar o direito ampla capacidade de manipulação e lério. Rosa e Fux sabiam que havia um penal. “O juiz formará sua convicção ocultação de provas de suas atividades ato de ofício – a abertura do processo pela livre apreciação da prova produzida “tenebrosas”, para usar a expressão de licitação pela Câmara para a contra- em contraditório judicial, não podendo de um deles, os ministros que formam tação da agência de Valério – assinado fundamentar sua decisão exclusivamen- a atual maioria, empenhada em conde- por Cunha. Mas esse ato de ofício, está te nos elementos informativos colhidos nar os mensaleiros, estão invertendo o provado nos autos, foi perfeitamente na investigação”, diz o Código Penal princípio: relativizam a importância das legal. Rosa e Fux passaram a dizer então brasileiro no artigo 155. Isso significa provas produzidas em juízo e ampliam o que não é necessária a existência de um dizer, no caso: os juízes não podem ba- peso dos indícios e contextos que sacam ato de ofício para provar um crime de sear suas decisões principalmente nos aqui e ali da fase do inquérito policial ou peculato. Pode-se dizer que: indícios colhidos pelas investigações do das investigações da CPMI. 1. tinham diante de si um crime de Congresso Nacional e nas duas dezenas Vejam-se, por exemplo, os votos dos caixa dois confessado; de inquéritos da Polícia Federal (PF) ministros Luiz Fux e Rosa Weber na con- 2. mas precisavam de um crime feitos a partir da denúncia do mensalão, denação do deputado João Paulo Cunha maior, o do mensalão, inventado por quando o deputado Roberto Jefferson por crime de peculato. A ministra deu Jefferson; 6 | retratodoBRASIL 63
  • 5. STF 3. por isso, flexibilizaram a tese do ato de ofício necessário; 4. e, ao fazê-lo, esqueceram outro princípio: o de que, no direito penal brasileiro, cabe ao Ministério Público provar a acusação que faz. Desprezaram os depoimentos dos outros réus, Soares e Valério, os quais dizem serem os 50 mil reais enviados a Cunha dinheiro de caixa dois das cam- panhas petistas. A tese do mensalão foi criada pela acusação; a do caixa dois, pela defesa. Rosa e Fux não tiveram a dúvida que, por recomendação dos princípios do direito penal, favorece o réu: ficaram com as explicações que favorecem a tese de Jefferson. Votou em sentido contrário, pela absolvição de Cunha, acompanhando o revisor Lewan- dowski, o ministro Dias Toffoli. Ele disse bem: Cunha não tinha que provar ser inocente, podia até ter ficado calado. “A acusação é quem tem de fazer a prova. A defesa não tem que provar sua versão. Olga: em 1936, o STF permitiu que ela, grávida, fosse extraditada para a Alemanha nazista Essa é uma das maiores garantias que a humanidade alcançou. Estou rebatendo [a acusação contra Cunha não apenas] casos graves de condenação política. presidente, no entanto, estava no Rio em relação ao fato concreto, mas como Um, de março de 1936, quando negou Grande do Sul, sem qualquer sombra premissa constitucional que esta corte pedido de habeas corpus para a mili- de dúvida. Tinha sido lá que, anos antes, deve seguir.” tante comunista alemã Olga Benário, fora organizada a resistência, afinal Roberto Gurgel, o procurador-geral de origem judaica, grávida de uma filha vitoriosa, para garantir sua posse em da República, que cumpre o papel de de seu companheiro, o líder comunista 1961, quando o então presidente, Jânio acusador no processo, considerou que brasileiro Luiz Carlos Prestes. Os dois Quadros, renunciou e ele, como vice, essa flexibilização caiu como o queijo estavam presos no Brasil e o governo teve seu mandato contestado pelos sobre o seu prato de macarrão. Disse, de Adolf Hitler pediu a extradição de militares. O STF aceitou o argumento da após a condenação de Cunha, que o Olga ao governo comandado por Getúlio direita e deu posse ao sucessor consti- julgamento estava sendo encaminhado Vargas. A defesa de Olga solicitou ha- tucional, Ranieri Mazzilli, presidente da muito favoravelmente à sua acusação e beas corpus ao STF por dois motivos: a Câmara, que governou como preposto que a aceitação de provas mais tênues extradição colocaria sua vida em risco, dos golpistas por 15 dias. para acusados de menor poder, como pois os campos de concentração nazis- Renato Janine Ribeiro, professor de Cunha, mostrava a tendência da corte tas eram conhecidos pelo tratamento ética e filosofia da Universidade de São suprema de aceitar provas mais tênues cruel dispensado aos detidos, especial- Paulo (USP), reconhece, como Retrato ainda no caso da sua proposta de con- mente se fossem comunistas ou judeus, do Brasil, em artigo publicado pelo diá- denação de Dirceu, apontado por ele e e ainda colocaria sob o poder de um rio Valor Econômico, que “o Supremo, pela grande mídia conservadora como governo estrangeiro a filha de um bra- pressionado por uma mídia sobretudo o comandante do mensalão. Como se sileiro. O STF negou o pedido. Olga foi oposicionista, negou direitos básicos sabe, nos autos, além dos depoimentos deportada e morta num dos campos de à defesa”. Ao negar à grande maioria dos réus Jefferson e Emerson Palmieri, extermínio de Hitler (Anita Leocádia, sua dos réus a dupla jurisdição, diz ele, “ao do PTB – que podem ser levados em filha, sobreviveu e hoje, com 75 anos, é chegar à mesquinhez de proibir a defesa conta apenas como indícios, porque dos professora aposentada da Universidade de usar o power point que facilitaria a réus não é cobrado o juramento de dizer Federal do Rio de Janeiro; uma mulher exposição de seus argumentos, o STF a verdade –, Gurgel não tem mais nenhu- com o mesmo nome está sendo julgada pode ser visto como um órgão que vestiu ma testemunha ou prova documental ou na AP 470). a toga para matar, não para julgar”. Ele pericial contra Dirceu. A outra decisão foi a que legalizou, conclui, com razão: “A imagem da corte Em debate promovido pelo Centro digamos assim, o golpe militar que der- está em risco. Ninguém é legalmente de Estudos da Mídia Alternativa Barão rubou João Goulart da Presidência da culpado até ser condenado em processo de Itararé, realizado em meados do mês República em 1964. A direita golpista justo [...] O Supremo não mostrou essa passado em São Paulo, o jornalista e levou ao STF um pedido para declarar cautela”. Nós acrescentamos: e o que é escritor Fernando Morais disse que o vaga a Presidência sob o argumento pior, pode estar criando precedente para STF tem em seu passivo histórico dois de que Goulart abandonara o País. O uma fieira de outros abusos. 63 retratodoBRASIL | 7
  • 6. Política 1 O HERÓI DO Para lembrar: Na Justiça brasileira, pessoas com foro privilegiado – deputados como João Paulo Cunha, José Dirceu, Roberto Jefferson e MENSALÃO só podem ser processadas e julgadas pelo gadas na chamada primeira instância, com direito a recorrer a uma alçada superior. Uma etapa inicial do processo judicial é o inquérito, cujas investigações são Como o ministro Barbosa armou para o público sua feitas pela polícia. Ele é dirigido por um promotor, um advogado do Ministério “historinha” e, com ela, rebaixou o nível do debate que deveria ter sido feito sobre o grande escândalo político reitos constitucionais dos acusados, como, por exemplo, uma busca em sua residência, por Raimundo Rodrigues Pereira ilustração Amarildo devem ser aprovadas por um juiz a quem o inquérito precisa ser comunicado. No caso de nossa história, em função do foro NÃO HÁ A menor dúvida de que o PT, privilegiado, o inquérito, de número 2.245, que se dizia o grande partido da ética na geral da República, Roberto Gurgel. Do política, paga hoje o preço de, ao chegar mesmo gênero foi a avaliação de Antonio à Presidência da República, em 2003, ministro Barbosa. ter mergulhado fundo no pântano dos cargo e encaminhou, em 2006, a denúncia panhas eleitorais. A avaliação de que o agora em julgamento na suprema corte de mover uma ação penal destinada a julgar chamado mensalão é “o mais atrevido e Justiça do País. os acusados. Em caso positivo, encaminha escandaloso esquema de corrupção da denúncia ao juiz e este a examina para história do Brasil” é outra coisa. Está nas ção que supervaloriza os erros cometidos dizer se a aceita ou não. No caso, Barbosa pelo PT é da oposição ao governo do A seguir, encaminhou seu voto ao plenário e já está formulada nas conclusões da principal das comissões parlamentares Na ação penal, presidida por um de inquérito que investigaram o caso juiz, são preparados os chamados autos a partir de julho de 2005, após a do processo, com depoimentos, perícias, denúncia espetacular de Roberto documentos, apresentados a ele sob as Jefferson. Mas, com certeza, a regras do contraditório, ou seja, as duas pessoa que transformou esse partes, acusação e defesa, devem ter amplo acesso às provas produzidas, com o direito rência de justiça para ser vendida à opinião pública foi o ministro Joaquim Barbosa, que cuida lização dos autos, a ação vai a julgamento; do mensalão desde que o caso no caso, o da AP 470 começou no início de agosto passado. Barbosa surgiu como um herói para a grande mídia conservadora do Brasil um inquérito na corte, visto que diversas pessoas acusadas tinham o chamado foro privilegiado. um voto de 430 páginas, lidas ao longo de 36 horas em cinco dias, defendendo a abertura da AP 470 foi amplamente aceito. Até então Barbosa era relativamente estigmatizado. Fora escolhido para ser logo no começo de seu primeiro mandato, por ser negro, numa espécie de exercício modo, foi mal recebido por expoentes da 8 | retratodoBRASIL 63
  • 7. mídia mais conservadora que são contra “historinha”, como disse na ocasião ao diá- milhões de reais por meio dos chamados esse critério para preenchimento de parte rio O Estado de S. Paulo, pelo capítulo 5, no bônus de volume, isto é, recursos dados das vagas públicas em várias instâncias; no qual Souza tentava provar a corrupção de pelos veículos de promoção e mídia em caso, o STF. Cunha e Pizzolato. Depois foi para o 3, no função do volume de serviços cobrados O seu encaminhamento vitorioso da qual Souza procurava mostrar que o dinhei- do BB, que seriam devidos ao banco, mas denúncia contra o mensalão petista, o cha- ro do esquema Soares–Valério viria, de fato, foram dados para uma empresa de Valério memos assim, mudou radicalmente essa de desvio de dinheiro público. Deixou por com a anuência de Pizzolato; e um “grande imagem e lhe valeu elogios estridentes. “O último o capítulo no qual Dirceu é acusado peculato”, pelo desvio de 73,8 milhões de Brasil jamais teve um deplorável escândalo de formar uma quadrilha, articulada com reais, que também seriam do BB e foram como o mensalão. Como compensação, outras duas – uma de publicitários e outra dados para a mesma empresa de Valério, também jamais teve um ministro como de banqueiros –, para corromper o Con- a partir de um fundo de incentivos ao uso Joaquim Barbosa”, disse Veja em sua edi- de cartões da bandeira Visa. ção do início de setembro de 2007, num mais compreensível, “o capítulo anterior O que Barbosa fez ao começar pelas artigo de capa no qual enumerava suas jogava luz sobre o capítulo subsequente”, “historinhas” de corrupção é o oposto do qualidades de menino pobre que estudou como disse, na época, Barbosa ao Estadão. que se recomenda num debate intelectual Barbosa reorganizou a denúncia do sério. Como disse o pensador italiano An- desde falar várias línguas, vestir-se em lo- procurador-geral, mas com um voto tonio Gramsci, nesse tipo de discussão, na jas chiques pelo mundo e conhecer com unitário. No julgamento, quando, como luta de ideias, ao contrário do que se faz detalhes a vida em Paris, Nova York, Los relator, foi o primeiro a votar, já quase no na guerra, quando se come o pirão pelas Angeles e San Francisco. beiradas, procurando destruir o inimigo da acusação, pelo procurador-geral Gurgel, atacando-o por seus pontos mais fracos, M as, essencialmente, Veja elogiava o fato de Barbosa ter se con- vencido da tese apresentada na denúncia de Souza em 2006, e encampada pela revista desde meados de 2005, de que e das defesas, pelos advogados dos 38 réus, ele acabou impondo – com a ajuda do pre- sidente da corte, Ayres Britto – a votação fatiada, para espanto dos ministros Ricardo Lewandowski, revisor da AP 470, e Marco deve-se começar pelo ponto forte, o essencial da argumentação adversária. O adversário, como se faz com o inimigo na guerra, mas derrotar suas ideias errôneas “uma quadrilha liderada pelo ex-ministro Aurélio de Mello e protestos da maioria dos e, dessa forma, contribuir para elevar o José Dirceu movimentara dezenas de mi- advogados dos réus. nível popular de consciência e informação. lhões de reais para corromper parlamen- O fatiamento parece ter sido o grande tares em troca de apoio político”. Veja destacava, essencialmente, a sagacidade de Barbosa em transformar a denúncia do procurador-geral numa peça para o convencimento do público. Diz a revis- truque de Barbosa. É uma espécie de técnica como a de comer o pirão a partir das beiradas, onde está mais frio. No caso, começar a julgar a complexíssima tese do mensalão a partir de um ponto que é quase B arbosa não é nenhum Gramsci. Fez o contrário, procurou contar uma “historinha”. Estavam em debate duas posições. De um lado, a dos maiores criminalistas do País, que defendem os ta: “Sua obsessão era a forma do voto, um senso comum: o de que os políticos são acusados com a tese do caixa dois. Essa tese a estrutura, a ordem dos capítulos [...] corruptos e é grande o desvio de dinheiro foi desenvolvida por Soares e Valério, já em Joaquim Barbosa fez um voto inteligente. 2005. Eles apresentaram provas e testemu- Subverteu a ordem da denúncia preparada setores da classe média e da burguesia brasi- nhos de terem repassado clandestinamente pelo procurador-geral da República”. leira devem fazer isso até com uma espécie 55 milhões de reais para pagar dívidas de Souza apresentou uma denúncia di- de consciência culpada: deve-se notar que, campanha do PT e partidos associados a vidida em sete capítulos. No quinto, por no mensalão, a acusação tenta provar um ele nas eleições. Disseram que o dinheiro exemplo, falava de 50 mil reais recebidos desvio de dinheiro público de perto de 100 vinha de empréstimos tomados – pelo pelo deputado João Paulo Cunha, na época milhões de reais. Já a Receita Federal está PT, mas, principalmente, pelas empresas presidente da Câmara dos Deputados, cobrando de centenas de milhares de pes- de Valério – nos bancos mineiros Rural e 326 mil reais recebidos por Henrique soas físicas e jurídicas 86 bilhões de reais em e Mercantil de Minas Gerais. De outro Pizzolato, então diretor de Comunicação “débitos vencidos”. Desse total, 42 bilhões lado estava a tese da maioria da CPMI dos e Marketing do Banco do Brasil (BB). Eles são atribuídos a 317 grandes contribuintes Correios, a tese do mensalão. Ela dizia que tinham apresentado essas quantias como (15 pessoas físicas e 302 jurídicas) – ou seja, os 55 milhões de reais admitidos pelos sendo dinheiro do caixa dois confessado um montante que equivale a mais de 420 acusados como caixa dois não existiam. por Delúbio Soares, tesoureiro do PT, e vezes o dinheiro envolvido no mensalão. Seriam dinheiro público os 76,7 (73,8 + Marcos Valério, dono de agências de pu- Cunha e Pizzolato foram as vítimas 2,9) milhões de reais da soma do grande blicidade com serviços prestados ao BB e à e do pequeno peculatos de Pizzolato, Câmara. O procurador-geral dizia que, nos - desviados do BB para Valério. As quantias dois casos, o dinheiro era, de fato, suborno. ção de Barbosa, Pizzolato foi condenado No terceiro capítulo, Souza apresentava quase unanimemente pelos outros dez como empréstimos pelo publicitário com dois tipos de operações da agência DNA ministros por quatro crimes: corrupção ajuda dos banqueiros do Rural. Os 326 mil com o BB como sendo a fonte de desvio de passiva, porque teria recebido 326 mil reais que chegaram a Pizzolato seriam o 2,9 milhões de reais e 73,8 milhões de reais reais para favorecer Valério; lavagem de suborno para ele fazer o desvio. Os ban- de dinheiro público para as empresas de dinheiro, por ter recebido dinheiro em queiros do Rural teriam feito a simulação Valério. Barbosa mudou a ordem da apre- espécie e ocultado essa movimentação; um porque estariam interessados num prêmio sentação dos supostos crimes: começou sua “pequeno peculato”, por ter desviado 2,9 que Dirceu, chefe da quadrilha política, 63 retratodoBRASIL | 9
  • 8. Para Barbosa, Valério tirou R$ 76,7 milhões do BB na “mão grande”. Ele ignorou as notas em poder da CBMP que comprovam os serviços do publicitário poderia obter do Banco Central para eles: a do PT a governador nas eleições de 2002. dessa tese, buscando em seu apoio todos “bilionária” liquidação do Banco Mercantil A segunda maior parte – 11,2 milhões de os indícios e suposições da fase do inqué- de Pernambuco, como diz Gurgel em sua reais – foi para o PL, que estava coligado rito e praticamente ignorando as provas e peça acusatória. E Dirceu e sua quadrilha com o PT desde a formação da chapa testemunhos produzidos para os autos pela política queriam o dinheiro para comprar presidencial, com Lula encabeçando-a e defesa, os quais, pela lei brasileira, deveriam o apoio de partidos no Congresso para o com o empresário mineiro José Alencar ser os determinantes para a condenação governo Lula. como vice. Mais 4 milhões foram para o dos acusados. Como disse o experiente so- Como juiz, a nosso ver, para encarar PTB, de Roberto Jefferson. No primeiro ciólogo Wanderley Guilherme dos Santos, o debate de frente, Barbosa deveria ter turno da eleição presidencial de 2002, o em entrevista publicada pelo jornal Valor começado por dar seu veredicto sobre a PTB formou a chamada aliança trabalhista, Econômico em 21 de setembro: “Temo que acusação, isto é, dizer se a tese do mensalão com o PDT e o PSB, para apoiar Anthony uma condenação dos principais líderes do fora ou não provada. Deveria fazer isso Garotinho, o candidato à Presidência dessa PT, e do PT como partido, acabe tendo por examinando a argumentação da defesa, a última agremiação. No segundo, o partido fundamento não evidências apropriadas, tese do caixa dois, e fazer isso com todo o de Jefferson apoiou a candidatura de Lula. mas o discurso paralelo que vem sendo empenho, para eliminar qualquer dúvida Por que o valerioduto não repassou verbas construído”. O jornal então lhe perguntou razoável em favor dos acusados, em res- para o PSB pagar suas campanhas de 2002? se ele achava que os ministros estavam peito ao princípio in dubio pro reo. Por que não deu dinheiro para o PCdoB, “dizendo, nas entrelinhas do julgamento”, outro de seus aliados históricos? Por que que “o tribunal condenará alguns réus sem N ote-se bem: ninguém pode dizer que os réus são inocentes se o propósito for corrigir os males do processo eleitoral brasileiro, totalmente cor- rompido pelo dinheiro. Muitos dos acusa- PTB, PP e PL são partidos, como se diz, É claro que pode ter havido compra de partidos, que candidatos possam ter usado o esquema clandestino Valério-Soares fundamentar essas condenações em provas concretas”. Ele respondeu: “É uma espécie de vale-tudo. Esse é meu temor. O que os ministros expuseram até agora é a intimi- dade do caixa dois de campanhas eleitorais dos são participantes confessos, em maior para melhorar suas contas pessoais e que, e o que esse caixa dois provoca. A questão ou menor grau, de um crime eleitoral: o uso portanto, a tese do caixa dois não dá conta fundamental é: por que existe o caixa dois? de todos os detalhes e não ajuda, de forma Isso eles se recusam a discutir, como se de candidatos e partidos. Ao escrever sobre alguma, diga-se mais, a limpar as estrebarias o que eles estão julgando não fosse algo esse tema, poucos meses depois do ocor- formadas pelo dinheiro e pelos poderosos comum – que pode variar em magnitude, rido (ver no livro As duas teses do mensalão, que o oferecem para orientar, em função mas que está acontecendo agora, não te- Editora Manifesto, 2012, o capítulo “O PT de seus interesses, o processo democrático. nho a menor dúvida. Como se o que eles no seu labirinto”, escrito em setembro de Quem, dentre os defensores da tese do estão julgando fosse alguma coisa inédita e 2005), já dizíamos, por exemplo, o que está caixa dois, pode ter certeza de que os ban- peculiar, algum projeto maligno”. sendo observado agora por alguns analistas: queiros do Rural e do BMG não queriam os 4,1 milhões de reais repassados por meio do chamado valerioduto para o PP não podiam ser vistos como verba para paga- mento de despesas de campanhas passadas. A adesão do PP à base do governo Lula foi favores do governo? É claro que queriam. Mas o problema em discussão não é esse. A tese do caixa dois é a da defesa. Ela não tem, a serem seguidos os princí- pios do direito penal, o ônus da prova. É B arbosa adotou o método da “his- torinha” para ganhar o público a partir dos preconceitos existentes contra a política. E também porque, obser- vada na sua estrutura, a tese do mensalão é tardia. Em 2002 esse partido, assim como o a acusação que está sendo julgada na AP muito complexa e frágil. Ela precisa de uma PMDB, se coligou com o PSDB no apoio 470. É a tese do mensalão, encaminhada superorganização criminosa. Precisa de à candidatura de José Serra à Presidência. É pelo procurador-geral Gurgel na sua três quadrilhas – associação criminosa que outro, no entanto, o caso de PT, PTB, PL sustentação oral feita em 2 de agosto, na envolve, em cada uma, pelo menos quatro e de seus políticos que receberam dinheiro abertura do julgamento da AP 470. E é a pessoas – unidas num mesmo propósito e do esquema. Dos 55 milhões distribuídos forma como o relator Barbosa está levando com divisão de tarefas. As três quadrilhas através do esquema Soares-Valério, a maio- os seus colegas do STF a julgá-la. devem ter uma hierarquia, porque, segundo ria foi para o próprio PT: 23,6 milhões de É nossa opinião que, ao não dar um essa tese, Dirceu, da quadrilha política, é reais – sendo o equivalente a 10 milhões voto unitário inicial à altura das dimensões o poderoso chefão e seria o articulador e de reais depositado numa conta no exte- que o julgamento adquiriu, Barbosa visou, comandante do grande esquema. rior para Duda Mendonça, que, como se de modo doloso – para usar um termo As deformações decorrentes do enca- sabe, foi o marqueteiro da campanha de jurídico –, abrir caminho para a vitória da minhamento dado à AP 470 por Barbosa Lula à Presidência e de vários candidatos tese do mensalão. Empenhou-se na defesa podem ser vistas com mais precisão em 10 | retratodoBRASIL 63
  • 9. Angeli/Folhapress alguns absurdos cometidos no tratamento retirada do dinheiro do BB, como se o bosa mostrou ao País pela televisão, o BB - banco fosse uma padaria de cujo caixa um não tinha qualquer controle das contas da drilha dos banqueiros teria grande interesse dirigente pudesse retirar dinheiro com a - em falsificar os empréstimos da dupla viço algum, apenas carregado a grana para Valério-Soares, de olho, por exemplo, na apresentou, mostram que essa acusação é os esquemas fantásticos de Soares-Valério liquidação “bilionária” do Banco Mercan- Fundo de Incentivo Visanet, para o uso dos como disse repetidas vezes o advogado de cartões de bandeira Visa, a partir do qual a processo está a avaliação de uma equipe de um dos banqueiros, o ex-ministro Márcio 20 auditores do BB, feita ao longo de quatro Thomaz Bastos, que essa liquidação foi provam o que Valério diz até hoje, aparente- Barbosa mostrou, como prova da falsidade no essencial, por uma empresa multina- mente com razão: que sua empresa realizou dos empréstimos para o valerioduto, o fato - todos os serviços de promoção pelos quais de um sócio de Valério ter recebido em sua ciation, estabelecida em San Francisco, na conta um depósito de adiantamento de dinheiro do Fundo de Incentivo Visanet e imediatamente ter aplicado o montante no Banco Rural, como se isso fosse uma uma obrigação de toda pessoa sensata, no a utilização de cartões de sua bandeira, Visa, B - são Parlamentar Mista de Inquérito tese do mensalão, mandou indiciar, pelos desvios que imaginou terem sido feitos no sistema em que vivemos, aplicar a juros Fundo de Incentivo Visanet durante quatro anos de seu uso pelo BB, cinco pessoas, convênios que o governo federal faz com mais de 20 outros bancos –, estabelece cla- estados e municípios, por exemplo, não administração petista: Luiz Gushiken e Pi- fossem de adiantamento de boa parte de de cada pagamento feito por meio dos dinheiro e de prestação de contas a posteriori cartões Visa, para promoção dos próprios E nos quais todos os secretários de Fazenda cartões e através de cada um de seus sócios, isso ocorreu apenas porque seu cliente era com bom senso mandam aplicar o dinheiro - Mas o dolo principal de Barbosa é depois de o Fundo de Incentivo Visanet ter sido fechado em função do escândalo do mensalão, tentou fazer valer, sem sucesso, do governo Lula e superior hierárquico de Esses 76,7 milhões de reais dos supostos uma decisão do então presidente do STF, dois desvios de dinheiro do BB substituem Nelson Jobim, que mandava a companhia Embora responsável, em última instância, os 55 milhões de reais que, na tese do men- pela publicidade alocada pelo governo Lula, salão, não existem e teriam sido inventados se entrasse na história, Gushiken destruiria a pelos banqueiros, por Valério e por Soares Visa – não pelo BB e muito menos por parte da tese que ainda hoje une a massa dos conservadores: a de que o ex-comunista, ex- voto, ao omitir dezenas de provas e teste- guerrilheiro e ex-comandante da equipe que munhos da defesa, Barbosa praticamente serviços de promoção dos cartões emitidos elegeu Lula, José Dirceu, é o chefão mais diz que Pizzolato, sozinho, comandou a - 63 retratodoBRASIL | 11
  • 10. Política 2 UMA HISTÓRIA EXEMPLAR Henrique Pizzolato foi condenado no STF, de forma quase unânime, por quatro crimes. Pode ter sido uma decisão errada, em todos os casos por Lia Imanishi e Raimundo Rodrigues Pereira HENRIQUE PIZZOLATO FOI diretor de Comunicação e Marketing do Banco do Brasil e veio a campanha de Lula, da qual (BB) do início do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva até pouco depois Gushiken foi, junto com José Dirceu, do estouro do mensalão, em agosto de 2005, quando foi afastado como um dos denunciados no um dos dirigentes. Pizzolato começou escândalo. Em agosto passado, sete anos depois, foi condenado no Supremo Tribunal Federal (STF) então a trabalhar ativamente para eleger por quatro crimes: corrupção passiva, dois peculatos e lavagem de dinheiro. Foram 44 votos; cada Lula. Como a Previ tem investimentos um dos 11 ministros votou em cada uma das acusações. Só um voto não foi por sua condenação, o junto a grandes empresas em diversos de Marco Aurélio de Mello, que o absolveu do crime de lavagem de dinheiro. setores – hoteleiro, ferroviário, portuá- Na história que publicamos a seguir tentaremos provar que todas as quatro condenações são rio, bancário, mineração, infraestrutura, injustas, mesmo a por corrupção, em cuja defesa ele apresentou uma versão, de fato, pouco convincente turismo, lazer e imobiliário –, o partido para 326 mil reais que recebeu do valerioduto, esquema montado pelo então tesoureiro do PT, lhe deu a função de apresentar o plano Delúbio Soares, e pelo publicitário mineiro Marcos Valério. Nosso argumento nesse caso: ao réu de governo petista em reuniões com os cabe o benefício da dúvida; a acusação, à qual cabe o ônus da prova, não provou que Pizzolato não líderes patronais dos sindicatos, asso- repassou o dinheiro para o PT do Rio de Janeiro, como ele alega. Diremos mais: a condenação pelos dois peculatos, essencial para “provar” a teoria do mensalão, simplesmente não se sustenta nos fatos. de obter apoio. Lula eleito, Gushiken foi ser ministro da Secretaria de Comu- nicação Social e Assuntos Estratégicos UM HOMEM CONDENADO da Presidência da República e superior Trinta e dois anos de carreira até o topo do Banco do Brasil. hierárquico de Pizzolato em relação aos E, de repente, Pizzolato se transformou num pária assuntos relativos à publicidade do BB. Tudo parecia ir muito bem até 3 Henrique Pizzolato tem 60 anos. For- tário. Depois, foi eleito presidente do de agosto de 2005, quando a vida de mou-se em arquitetura, com especiali- Sindicato dos Bancários do Rio Grande Pizzolato virou de cabeça para baixo. zação em urbanismo. Estudou também do Sul e do Paraná, para onde se mudou Em manchetes de jornais, foi acusado comunicação social durante três anos. antes de ir para o Rio de Janeiro, em de receber R$ 326.660,27 encaminhados Em 1974, ainda universitário, passou em Copacabana, onde mora até hoje. Foi a ele pelo empresário Marcos Valério, da concurso para escriturário do Banco do no movimento sindical que Pizzolato agência de publicidade DNA. Valério já Brasil (BB), onde, ao longo de 32 anos conheceu, por volta de 1985, Luiz era tido como o operador do mensalão, de carreira, ocupou diversos cargos, até Gushiken, então presidente do Sindicato o grande escândalo do início do governo chegar ao topo, em fevereiro de 2003, dos Bancários de São Paulo e depois Lula, e a Comissão Parlamentar Mista como diretor de Marketing e Comuni- deputado federal pelo PT. Durante de Inquérito (CPMI) dos Correios, a cação, nomeado pelo recém-empossado cinco meses, ele, Gushiken e Eduardo mais importante de três formadas para presidente do banco, Cássio Casseb. Já Jorge, também deputado federal pelo investigar o caso, pegava fogo. O di- conhecia Casseb do conselho da Brasil PT, dividiram um apartamento em Bra- nheiro fora sacado por um contínuo da Telecom, no qual este representava a sília. Pizzolato os convidou a trocar os Previ, Luiz Eduardo Ferreira da Silva, Telecom Itália e ele, a Previ, o fundo de quartos de hotel pagos pela Câmara dos em uma agência do Banco Rural, no Deputados pelo apartamento funcional centro do Rio de Janeiro. Levado a de- em sua nomeação também, é claro, sua da Associação Nacional dos Funcioná- por na Polícia Federal (PF), o contínuo militância no PT, no qual ingressou logo rios do BB, da qual era dirigente. Em na fundação, ainda estudante universi- 2002 seu mandato na Previ terminou pediu que fosse buscar “documentos” 12 | retratodoBRASIL 63
  • 11. FolhaPress Pizzolato: a acusação de corrupção é a que mais dói. “Fui humilhado, execrado em praça pública. Tudo com insinuações, hipóteses. Não apresentaram uma prova” no Banco Rural. Lá chegando, disse ter feito isso a mando de Gushiken, um da Ação Penal 470 (AP 470) – ou seja, no depoimento, foi levado a uma sala dos maiores dirigentes do governo Lula. em depoimento judicial, tendo ele, como interna do banco, onde lhe entregaram O mensalão não mais iria sair do advogado, ao lado, em 14 de fevereiro de dois embrulhos em papel pardo, os noticiário dos jornais nos próximos sete 2008 – o juiz da 7ª Vara Federal Criminal, quais disse ter levado pessoalmente anos. Pizzolato disse, em depoimento Marcelo Granado, abriu a audiência para a Pizzolato, em seu apartamento em judicial, depois, que a sua inquirição toda a imprensa, fato que, diz ele, “não Copacabana. Foi a notícia mais quente pelos deputados e senadores na CPMI ocorreu em nenhum outro depoimento dos jornais do dia seguinte. As matérias foi uma tortura, que se sentiu “humilha- dos litisconsortes passivos, para utilizar a destacavam que, pouco tempo depois do”, “achincalhado”. Hoje vive recluso própria expressão do STF”. Lobato diz do recebimento do dinheiro, Pizzolato no apartamento em Copacabana. Não que ainda tentou anular o depoimento, comprara um apartamento de 400 mil fala com a imprensa. Para Retrato do mas o ministro Joaquim Barbosa negou Brasil, sua única concessão foi enviar o pedido sob o fundamento de que o sua culpabilidade. Quinze dias depois, pela internet, a 7 de setembro, através de processo não está sob sigilo. Pizzolato depôs na CPMI dos Correios. seu advogado, Marthius Sávio Lobato, Depois de aberta a AP 470, Barbosa Seu advogado pediu habeas corpus ao em Brasília, uma declaração da Receita expediu as chamadas “cartas de ordem” Federal com a qual buscava provar que, para que os réus fossem ouvidos pela calado, o que foi negado. Pizzolato disse após uma devassa em suas contas, nada Justiça em seus estados de origem. Em no depoimento que suas ações no BB fora apurado contra ele. Mas RB teve 2008, quando terminou seu depoimen- tinham sido aprovadas por Gushiken, o cerca de oito horas de conversas com to no Rio, o juiz Granado concedeu a que causou sensação ainda maior por- Lobato, que estudou na Universidade Pizzolato o direito de, “como pessoa que, àquela altura, a questão do dinheiro de Brasília, onde foi aluno de Gilmar humana”, dizer mais algumas palavras que teria recebido de Valério já estava Mendes, um dos ministros do STF hoje em sua defesa, se quisesse. Pizzolato associada a outra denúncia, maior: a de no julgamento do caso. disse: “Eu queria dizer da minha revolta, ter desviado 73,8 milhões de reais do BB Lobato diz que considera seu cliente da minha insatisfação da forma como ilegalmente para as empresas do publi- um injustiçado. Conta que, na primeira eu fui envolvido nesses fatos, porque citário. Pizzolato então estaria dizendo vez em que Pizzolato falou para os autos 63 retratodoBRASIL | 13
  • 12. destruída, tive a minha família exposta, pessoa do PT que o procurou. Diz que da venda de dólares que comprara – ele fui humilhado, fui execrado em praça não abriu os envelopes, não quis saber mostrou o comprovante de aquisição. pública, fui julgado, fui satanizado em o nome do emissário do partido e nunca Em depoimento judicial, Valério público [...] tudo a partir de insinuações, mais viu a cara dele. disse que o diretório do PT do estado não foi apresentado um documento; Lobato nega todos os crimes dos do Rio de Janeiro, de acordo com o tudo a partir de hipóteses”. quais Pizzolato é acusado. Diz que então tesoureiro do PT, Soares, tinha Lobato disse a RB que Pizzolato Barbosa não analisou as provas apre- débitos de campanha de 2002, estava tinha saído dessa fossa e se animara sentadas por ele nos autos. No caso da se preparando para as eleições munici- corrupção, diz, Barbosa e os juízes prin- pais de 2004 e foi o que mais recebeu sua defesa, entregues ao STF em 30 de cipalmente especularam sobre a versão recursos do esquema comandado por agosto do ano passado. Mas a sentença Soares. O tesoureiro do PT, então, so- dos ministros do STF o teria arrasado. O licitou a ele que remetesse um total de crime de corrupção passiva é, talvez, o que mais lhe doa. A acusação é a de que Valério: pessoas indicadas para o recebimento ele embolsou os 326 mil reais repassados por Valério, justamente para facilitar os Delúbio foram Manuel Severino, Carlos Ma- nuel e Pizzolato, disse Valério. Os R$ desvios dos dois crimes de peculato, um de 2,9 milhões de reais e outro de mandou 326.660,67 repassados via Pizzolato seriam parte desse total. Valério disse 73,8 milhões de reais. E, para encobrir a corrupção cometeu outro crime, o R$ 2.676.660,67 também que Pizzolato trabalhou na campanha eleitoral de 2002 com Soares, de “lavagem de dinheiro”, ocultando origem, movimentação e destino dos para o PT-RJ. no Rio de Janeiro. Lobato diz, com razão, que o ônus recursos recebidos de Valério a 15 de da prova é da acusação: “Cadê a prova janeiro de 2004. R$ 326.660,67 de que Pizzolato pegou esse dinheiro No seu depoimento, Pizzolato disse para ele?”. Ao depor na CPMI em que naquele dia recebeu uma ligação via Pizzolato 2005, Pizzolato abriu para a Justiça, em seu celular de uma mulher que dizia imediatamente, todos os seus sigilos ser a secretária de Valério, pedindo que para o PT” em um “escritório” no cen- que Pizzolato deu para a encomenda para comprar o apartamento que a tro da cidade. Pelo fato de estar muito recebida de Valério. A acusação, diz acusação sugeria ter saído de suborno ocupado, diz Pizzolato, acertou com a Lobato, primeiro trabalhou muito para recebido. Em 2005, por exemplo, rece- secretária mandar outra pessoa em seu provar que Pizzolato teria comprado um bia 4 mil reais da Previ, 19 mil reais do lugar, no dia seguinte, com o compro- apartamento de 400 mil reais, no mês BB, 18 mil reais a título de participação misso de entregar os documentos ao seguinte ao recebimento de dinheiro de no conselho da Embraer e mais 4 mil representante do PT que iria procurá-lo Valério, mas fracassou. Pizzolato provou reais devido à atuação no conselho da no mesmo dia. Pizzolato diz que rece- que comprou o apartamento com suas Associação Nacional dos Funcionários beu uns envelopes do contínuo Silva e economias, com um cheque do BB e do BB. Lobato mostra a RB o imposto os repassou, como combinado, a uma mais 100 mil reais em espécie, resultado de renda de Pizzolato que está nos autos. Em 2003, seu patrimônio era de R$ 1.304.725,45. Em 2004, de R$ O relator da CPMI dos Correios, Osmar Serraglio, nas alturas: a oposição comemora 1.768.090,23, já incluído o apartamento comprado em fevereiro daquele ano. Seu FolhaPress rendimento bruto anual em 2004 foi de R$ 717.611,46 – aproximadamente 60 mil reais por mês. “A Receita Federal e a Polícia Federal não conseguiram encontrar nenhuma irregularidade nas contas de Pizzolato”, diz Lobato. Pizzolato tem razão? Ele pode ter omitido fatos e o nome de pessoas em sua versão da história, o que a tornou pouco crível. Mas, aceitando-se a tese do caixa dois, sua versão pode ser verdadei- da dúvida, nesse caso. Mais ainda porque os dois crimes de peculato de que é acu- sado, e pelos quais ele teria recebido o suborno, podem ter sido simplesmente inventados para sustentar a tese do men- salão, como relatamos a seguir. 14 | retratodoBRASIL 63
  • 13. ONDE ESTAVAM OS DOCUMENTOS? participação no FIV, em 2001, o BB Barbosa disse que o BB não tinha recibos do dinheiro gasto por Valério. Mas sabia que estavam com a CBMP, controlada pela Visa recursos do FIV não passariam por seu orçamento. E nunca fez um contrato Visanet é o nome fantasia da Compa- Ele previa a cobertura para atividades nhia Brasileira de Meios de Pagamento de promoção de todo tipo. No seu agência DNA para o uso dos recursos (CBMP), fundada no Brasil em 1995 e item III.4, definia as “ferramentas do FIV. Essa situação persistiu até que passou a operar mais amplamente mercadológicas”, a serem usadas. meados de 2004. a partir de 2001. O capital controlador A DNA trabalhava com publicidade da CBMP é da Visa International Ser- dessas ferramentas, como: “publicidade e promoção para o BB desde 1995. vice (Visa), que tem 10%; do Bradesco, em mídias de massa”, “TV, rádio, Entre 2001 e 2002 dividia os trabalhos com 39%; e do BB, 32%. O restante revistas, jornais, outdoors, mobiliário de promoção com uso do dinheiro do está dividido entre cerca de 20 outros urbano, front e back lights, painéis, FIV com outras agências contratadas sócios – bancos como Itaú, Santander etc.”; “merchandising, trabalhos e BankBoston. Pode-se dizer, porém, de planejamento, criação, layout, ainda no governo FHC – destaque-se, que o controle da CBMP sempre foi editoração, produção, veiculação e para melhor entendimento de nossa da Visa, empresa americana do mundo comissão de agência de publicidade”; história –, o BB decidiu dividir os tra- - balhos das suas agências entre as áreas mas décadas. Ela é a possuidora dos para portador no ponto de venda, de negócios chamadas de “governo”, direitos dos cartões de crédito e débito nas agências bancárias, via internet, “atacado” e “varejo” e escalou a DNA da bandeira com seu nome, emitidos em correio, telefone ou locais de grande para o varejo, em que se encontravam cerca de 200 países. fluxo de portadores para estimular os serviços para promoção de seus A partir de 2001 a CBMP começou venda do plástico; de planejamento e cartões com bandeira Visa. a operar no Brasil o Fundo de Incentivo O ministro Barbosa conhece bem Visanet (FIV), “com o objetivo único”, de divulgação e de apoio, contratação toda essa história. Sabe, por exemplo, como diz um de seus documentos, “de de promotores, compra de benefícios, que os originais dos recibos dos servi- realizar ações de marketing destinadas a brindes, prêmios, taxas governamentais ços da DNA prestados ao BB eram da incentivar o uso dos cartões Visa pelos de aprovação e alvarás”. E por aí afora. CBMP e que a companhia resistiu judi- consumidores”. O FIV era formado O FIV era administrado por um cialmente por longo tempo a entregar por uma porcentagem dos negócios comitê gestor, formado por um presi- tais recibos, mesmo com o escândalo com os cartões e a CBMP destinava dente, um diretor de Finanças e Admi- do mensalão, depois de ter sido de- os recursos assim obtidos a ações de nistração e outro de Marketing, todos terminado, a 11 de janeiro de 2006, promoção e marketing dos mesmos, pelo então presidente do STF, Nelson a serem comandadas pelos sócios. O os recursos estavam sendo emprega- Jobim, o acesso de peritos do Instituto dinheiro movimentado pelos cartões dos “de acordo com as diretrizes, a Nacional de Criminalística “a todos os da bandeira Visa é monumental: no estratégia do negócio e as condições do documentos da empresa no período de mundo, passa de 5 trilhões de dólares Regulamento”. Os recibos dos gastos 2001 até janeiro de 2006”. Em junho de por ano. No Brasil, é mais de 1 bilhão da agência de publicidade DNA, de Va- 2006, quando Barbosa já era, no STF, o de reais anualmente, somando-se ape- ministro encarregado de supervisionar nas os negócios feitos com os cartões com a CBMP, que fazia pagamentos o andamento do inquérito 2.245, rela- Visa do BB. tivo ao mensalão, ele recebeu uma A CBMP arrecadou para o FIV José Cruz /Agência Senado cerca de meio bilhão de reais entre 2001 - cerrado; na verdade, mudou de nome, devido à má repercussão das histórias divulgadas a respeito dele no mensalão. O BB foi o líder dos negócios com cartões de bandeira Visa nesse período. Sua parte no FIV foi grande e crescente: aproximadamente 150 milhões de reais entre os anos de 2001 e 2004: 60 mi- lhões de reais nos anos 2001–2002 – no governo Fernando Henrique Cardoso, Já em 2005 Valério afirmava portanto – e 90 milhões de reais nos ter feito os trabalhos pagos pelo anos 2003–2004, já no governo Lula, Fundo de Incentivos Visanet: na quando Pizzolato era diretor de Comu- foto, advogados dele entregam nicação e Marketing do BB. o que seriam suas provas à Desde a criação da CBMP, o FIV CPMI dos Correios (o relator, tinha um regulamento que cada sócio Serraglio, à esquerda; ao centro, deveria observar para usar os recursos. o presidente, Amir Lando) 63 retratodoBRASIL | 15
  • 14. petição do então procurador-geral, Antonio Fernando de Souza, relatando STF Souza requisitou “busca e apreen- - - vou os pedidos do procurador-geral e - Receitas do FIV Adiantamentos Gastos com notas Gastos sem utilizadas pelo às agencias de fiscais em poder notas fiscais Banco do Brasil publicidade da CBMP R$ milhões R$ milhões % R$ milhões % % 2001 28,83 26,4 91,57 28,76 99,76 0,24 2002 32,03 21,9 68,37 31,99 99,88 0,12 2003 38,43 29,7 77,28 38,28 99,61 0,39 - 2004 52,01 34,1 65,56 51,45 98,92 1,08 BARBOSA NÃO VIU Os números da auditoria mostram o que o relator provavelmente não quis ver A tabela acima foi construída a partir da auditoria feita por 20 técnicos do BB por quatro meses, logo após a denúncia do mensalão. Ela mostra que o Fundo de Incenti- vo Visanet (FIV) foi operado pelo BB, entre 2001 e 2004, da mesma forma, tanto nos anos do governo FHC (2001–2002) como nos anos do governo Lula (2003–2004). Diz o relatório da auditoria que as regras para uso do fundo pelo BB tiveram duas fases: uma, de sua criação, em 2001 , até meados de 2004, quando o banco, em função de não ter adotado “definições formais acerca dos direcionamentos - estratégicos”, como tipo de “eventos ou ações que poderiam ser patrocinados”, adotou “como referencial básico, o Regulamento de Constituição e Uso do Fun- nos anos 2001–2002; que os recursos do” da CBMP, que é sua “legítima proprietária”; e outra, do segundo semestre de 2004 até dezembro de 2005, quando o banco criou uma norma própria para o controle dos recursos do fundo. total a ser gasto, antes de as despesas Os auditores fizeram simulações por amostragem para verificar a porcentagem das ações de incentivo para as quais existiam comprovantes, no banco, de que elas tinham sido de fato realizadas. Procuraram os documentos existentes no próprio banco – notas fiscais, faturas, recibos emitidos pelas agências para pagar os ser- viços e despesas de fornecedores para produzir as ações. Referente ao período gestão do FIV, para evitar possíveis 2001–2002, não foram localizados esses documentos. Já com relação aos anos 2003 e 2004, entre as 93 ações encaminhadas à Visanet, nas 33 ações selecionadas como amostra para a análise, para três delas não havia qualquer documento e para 20 havia parte dos documentos. Ou seja: somando-se as ações com falta absoluta de documentos às com falta parcial, estas chegavam a 45% do total de recursos despendidos. Os auditores procuraram então os mesmos documentos na CBMP, que, por estatuto, era a dona dos recursos e a controladora de sua aplicação. A falta de documentação comprobatória foi, então, muito pequena em proporção aos valores dos gastos autorizados, como se vê ma última coluna da tabela. Para condenar Pizzolato, o relator Barbosa não destacou esses dados. Não os viu ou não os quis ver? 16 | retratodoBRASIL 63
  • 15. O PEQUENO PILAR DO MENSALÃO de contrato por BVs, exatamente no É a acusação que trata dos bônus de volume. E tem lei do período em que Pizzolato estava no Congresso, contra a qual se insurge o presidente do STF banco. O banco, no entanto, respondeu de modo mais amplo. Disse que existiam Os dois peculatos – desvios de 2,9 plicou depois que o BV se distingue milhões de reais e 73,8 milhões de reais tratavam do BB, envolvendo justamente do BB – que Pizzolato teria cometido relação entre o BB e os fornecedores as cinco grandes agências que prestavam a favor da agência DNA, de Valério, de mídia. “Os fornecedores – jornais, serviços para o banco entre 2000 e formam os pilares de sustentação do rádios, televisões – costumam oferecer 2005: Grottera, Lowe, DNA, D+Brasil mensalão. Se a acusação não consegue e Ogilvy. provar esses dois desvios, a tese do para que o período de compra seja mais O BB mostrou a Barbosa que mensalão desmorona (ver “O herói do longo. Por exemplo, eu comprei 60 dias apresentou recursos contra decisão mensalão”, nesta edição). O pequeno de espaço no Valor Econômico. O Valor peculato trata do bônus de volume (BV). Econômico me faz uma proposta: se você auditoria nas cinco agências, para poder comprar noventa dias ou seis meses eu juntar, aos autos do processo naquele que a DNA de Valério embolsava inde- o caderno especial de domingo, porque a serviços de BVs emitidas por essas BB, dadas a ela, pelas empresas com as vou lançar um caderno especial, um cinco agências. O BB mostrou que quais contratava serviços para promo- encarte. Pode dizer também: eu te dou isso não foi aceito por nenhuma delas. ção dos cartões Visa do BB, em função mais 5% de desconto”. Nesse caso, o do volume dessas contratações. No banco participa da negociação. E todo relativas a BVs, por dizerem respeito a interrogatório judicial de Pizzolato, em negociações privadas entre elas e seus 2008, o juiz Granado leu um trecho da fornecedores, nada tinham a ver com denúncia do então procurador-geral que Pelas datas dos do Brasil” e não estavam contempladas pagas pelos fornecedores de serviços entre os documentos que poderiam ser para a DNA – jornais, TVs, empresas de pedidos se vê, promoção contratadas pelo publicitário As defesas de Pizzolato e Valério para os trabalhos de estímulo ao uso dos cartões Visa do BB – deveriam ter claramente. mostraram nos autos, com testemunhos importantes – de vários destacados sido repassadas ao BB pela agência de Valério e não o foram. O próprio Gra- O relator e o e marketing –, que o Ministério Público nado informou que esse procedimento era antigo: cinco agências, entre 2000 procurador tinha feito uma interpretação equivoca- e 2005, embolsaram esses BVs e não apenas a DNA. geral queriam não pertence à empresa contratante (no caso, o BB), e sim à agência de publi- Pizzolato fez, então, primeiro, um esclarecimento. Mostrou que existem pegar Pizzolato diretor-geral da Rede Globo, Octávio Florisbal, que criou o BV no mercado fruto da relação entre a agência de pu- de propaganda e marketing brasileiro. blicidade e o fornecedor de mídia – TVs, Ele disse que “praticamente todos os rádios, jornais, revistas, etc. “O nome para o BB, disse Pizzolato ao juiz. Nesse veículos impedem que a agência repasse esses volumes ou esses valores para os volume”, disse Pizzolato. Não se restrin- Pizzolato a Granado. ge ao volume de publicidade veiculado O próprio procurador-geral Souza, empresa em que eu trabalho, toda vez pela agência por um cliente, como o na denúncia apresentada ao STF em que nós temos conhecimento de que BB. Todas as agências que prestavam uma determinada agência está repas- serviços para o banco tinham vários qual constava que a DNA teria recebido clientes e o BV era dado pelas empresas esses BVs indevidamente desde 2000, um determinado anunciante, nós sus- de mídia às agências pelo volume total num valor de 4,3 milhões de reais. Mas, pendemos esse plano, porque esse não de anúncios veiculados. “Isso, doutor, é como Souza já tinha como foco Pizzo- é o objetivo”. Florisbal citou normas praticado em todo o mercado, público lato, ele destacou que, desse dinheiro, do mercado de publicidade, decisões e privado”, disse Pizzolato a Grana- “2,9 milhões se referiam ao período de e acordo recente “entre anunciantes, do. O próprio Tribunal de Contas da 31/03/2003 a 14/06/2005, da gestão agências e veículos” para comprovar que de Pizzolato na Diretoria de Marketing o BV é “direito da agência e não deve auditoria a que Granado tinha se refe- do Banco do Brasil”. Como já se disse, ser repassado aos anunciantes, sejam Barbosa também visava pegar Pizzolato, da iniciativa privada, sejam anunciantes diz que o BV foi praticado no Banco quando, em 2009, com a AP 470 já em de estatais”. do Brasil de 2000 a 2005, por todas as pleno curso, enviou interrogatório à Barbosa, o relator do julgamento cinco agências que prestaram serviços direção do BB da época pedindo infor- do mensalão, citou diversas vezes, para ao banco nessa época”. Pizzolato ex- mações sobre eventual descumprimento condenar Pizzolato, os termos do 63 retratodoBRASIL | 17
  • 16. ABr Ana Arraes, no centro da foto, o ministro Vilaça, à esquerda, e Ayres Britto, à direita: pelo TCU, ela reafirmou as regras e ele considerou que era absurdo ser diferente. Já o presidente do STF se rebelou contra a lei ABr STF contrato entre o BB e a DNA. Leu um volume. Não vejo cabimento nisso”. a polêmica que havia, o que era “uso e dos seus itens, que diz que a agência O fato é que a Lei 12.232/2010, costume” foi colocado na lei. O minis- deveria “envidar esforços para obter as que dispõe sobre as normas gerais para tro Ayres Britto, presidente do STF, ao melhores condições nas negociações licitação e contratação de serviços de condenar Pizzolato e Valério, saiu-se junto a terceiros e transferir, integral- publicidade pela União, foi editada mente, ao banco, os descontos especiais para regulamentar o que já existia nas (além dos normais previstos em tabelas), relações de fato entre agências e anun- preparada intencionalmente, maquina- ciantes públicos e privados. O projeto damente, para coonestar com os autos ciais de pagamento e outras vantagens”. que deu origem à lei é do então depu- desta Ação Penal 470”. Para Britto, a lei tado e hoje ministro da Justiça, José “é um atentado descarado ao artigo 5º, Eduardo Cardozo. É de 2008 e legaliza inciso 36, da Constituição, que fala do mídia” oferecidas pelos fornecedores a retenção, pelas agências, dos BVs nos princípio de segurança jurídica, dispo- para estimular vendas por períodos contratos com as empresas estatais. O sitivo que é verdadeira cláusula pétrea”. mais longos. projeto aprovado foi o emendado pelos O presidente da suprema corte, ago- No TCU, ao analisar o caso DNA– parlamentares Milton Monti (PR–SP) e ra, além de dar sentença, parece querer BB, a ministra Ana Arraes considerou Claudio Vignati (PT–SC). Vignati diz mandar o Congresso fazer nova lei. E que a emenda foi pedida pelo setor de revisar dezenas e dezenas de contratos BV. Tomou como base a Lei 12.232, publicidade, porque as agências sempre feitos pelas estatais, que respeitaram os sancionada em 2010, que autoriza isso retiveram na prática os BVs. Para sanar BVs nas últimas décadas. explicitamente, em dois artigos, um deles referindo-se a contratos encerra- dos antes de a lei entrar em vigor. Ela O DESVIO NA “CASA DA MÃE JOANA” tomou por base a votação de processos A se acreditar nas descrições do relator e do revisor da AP 470, Pizzolato teria tirado 73,8 milhões de reais do BB na “mão grande” empresas, relatados pelo ministro do TCU Marcos Vinicios Vilaça. Ao funda- Quanto ao grande peculato, o desvio de na forma de adiantamentos, sem que se 73,8 milhões de reais do BB para Valério, tenha comprovado a realização de qual- que teria sido feito sob o comando de Pi- quer propaganda ou promoção. Também ção de BV é algo impossível de contro- zzolato, tanto o relator Joaquim Barbosa isoladamente ele teria prorrogado um lar, porque o prêmio depende, primeiro, como o revisor Ricardo Lewandowski contrato de publicidade com a DNA, da política de incentivos do ofertante apresentaram em seus votos para os no período de abril a setembro de 2003. e, segundo, dos investimentos feitos à nove colegas do STF um cenário abso- E, além disso, sem qualquer processo ordem de outros contratos que a agência lutamente incrível. Entre 2003 e 2004, no licitatório, Pizzolato teria dado a conta possui. Tenho assistido, perplexo, ao cargo de diretor do BB, Pizzolato teria de publicidade do Banco Popular, lan- Tribunal orientar as entidades públicas comandado, sozinho, o desvio daqueles çado na época pelo BB, para a mesma a efetuarem auditorias em agências de milhões de reais do banco para a agência agência do operador do mensalão, como publicidade para apuração do bônus de de publicidade DNA, principalmente se fosse o dono de uma espécie de “casa 18 | retratodoBRASIL 63