O documento discute como as decisões de marketing são frequentemente tomadas com base em sentimentos em vez de análise, levando a erros, comparando isso ao modo como Cristóvão Colombo navegou sem saber para onde ia. Ele também destaca que os estudantes de marketing muitas vezes buscam receitas prontas em vez de aprender técnicas analíticas, e que as empresas preferem soluções fáceis em vez de realmente entender os consumidores.
1. MARKETING E CRISTÓVÃO COLOMBO
JOÃO BAPTISTA VILHENA
DIRETOR DO MVC
INSTITUTO M. VIANNA COSTACURTA ESTRATÉGIA E HUMANISMO
"Marketing é muito afetado pela síndrome de Cristóvão Colombo. Colombo saiu da
Europa sem saber para onde ia e voltou sem saber onde esteve. Exatamente como
as empresas, que acertam ou erram sem saber por quê."
Alberto Cerqueira, presidente da Copernicus no Brasil
Recentemente a revista Exame publicou uma interessante reportagem sobre
pesquisa feita pela Copernicus, uma consultoria americana de marketing. Neste
trabalho os pesquisadores procuravam medir o ’efeito testosterona’ nas decisões
corporativas. "O termo, criado pelos consultores Kevin Clancy e Peter Krieg,
fundadores da Copernicus, refere-se a atitudes voluntariosas, decididas, corajosas
– e geralmente erradas".
Afora a tentação maniqueísta (e machista) de comparar como os homens e as
mulheres decidem – o que faz com que, naturalmente, os estereotípicos masculinos
e femininos se reproduzam – uma questão se destaca durante a pesquisa: a
tendência que tanto homens quanto mulheres têm de tomar decisões "por
sentimento", sem a devida avaliação analítica.
Em outros artigos já tivemos a oportunidade de defender duas premissas que nos
parecem básicas para entender o processo de marketing:
1a.) toda a decisão de marketing é, ao fim e ao cabo, uma decisão de natureza
financeira;
2a.) marketing é um processo eminentemente analítico e não intuitivo, como muitos
querem fazer crer.
A pesquisa da Copernicus indica que as confusões sobre como o marketing funciona
não são privilégios de um país específicos. Foram consultados executivos de
diversas nacionalidades e a conclusão apontada é que a maioria acha que decidindo
na base do "feeling" conseguirão um número maior de acertos do que se investirem
(em suas mentes, provavelmente, palavra exata é "gastarem") tempo tentando
analisar tendências e oportunidades de mercado.
Inspirado pela pesquisa, resolvi conversar com alguns colegas professores sobre o
assunto. Ao levantar o tema com o prof. Arão Sapiro e a profa. Darci Basta, pude
verificar que temos, os três, a mesma opinião. Infelizmente os alunos de marketing
parecem esperar que o tal "jeitinho brasileiro" funcione como um antídoto contra a
falta de formação e informação. Nas diversas turmas para as quais lecionam, Darci
e Arão percebem que muitas vezes os alunos estão à procura de uma espécie de
"receita de bolo" ou pó de pirlimpimpim (para o lobatianos mais antigos) que lhes
permita, repetindo sempre a mesma estratégia, garantir resultados positivos em
suas ações mercadológicas. Acreditam esses alunos – que logo em seguida estarão
sentados em importantes cadeiras tomando decisões nas suas empresas – que se
descobrirem o "caminho das pedras" o restante pode ser resolvido com um pouco
de ousadia e alguma sorte.
O mais assustador - complementam meus dois companheiros - é que o mesmo
comportamento é expresso pelos seus clientes durante os trabalhos de consultoria
que ambos realizam. Numa espécie de espiral perversa, muitos executivos
terminam seus cursos de graduação, pós-graduação e especialização convictos que,
2. se forem criativos e ousados, o sucesso pessoal e de suas organizações estará
assegurado.
Pude também conversar com os professores Roberto Madruga e Alexandre
Varanda. Madruga – que é hoje um dos mais respeitados profissionais brasileiros na
área de Marketing Direto – disse-me que investe um tempo significativo de suas
aulas na tentativa de provar que, em marketing, tudo pode ser quantificado.
Conversamos muito sobre a dificuldade que os alunos e profissionais tem de
entender que se não for possível medir, não vale a pena fazer. Varanda é de
opinião que, desde a introdução dos programas de qualidade no Brasil, vai se
criando uma maior sensibilidade quanto aos aspectos quantitativos das decisões.
Acabamos por concordar que isso é uma verdade apenas em parte, uma vez que
setores como, por exemplo, o de comunicação continuam falando – e defendendo –
os aspectos intangíveis e imensuráveis de suas decisões (essa é uma confusão
muito comum: o fato de ser intangível não significa que não se possa medir).
Nestas duas conversas, uma constatação foi lugar comum: não faltam técnicas e
modelos. A verdadeira carência do mercado está na pequena quantidade de
profissionais que demonstrem efetiva competência para operacionalizá-los. Todos
nós, enquanto consultores, havíamos recentemente participado de alguma reunião
com clientes na qual foi apresentada uma idéia "infalível" para convencer o
consumidor a comprar alguma coisa. O que esses "gênios" não pareciam levar em
conta é que o consumidor está cada vez mais consciente de sua importância para a
sobrevivência das empresas. Por isso vem apresentando um comportamento cada
vez mais exigente e crítico, precisando ser estudado m profundidade para ser
compreendido e correspondido.
Terminei minha breve incursão como pesquisador lembrando de uma afirmação do
rabino Nilton Bonder: "o oposto de prazer não é a dor, mas conforto".
Embora não se possa afirmar que a resposta para a dificuldade em lidar com
questões exatas e não ficar dependente da "sorte" ou capacidade de improvisação
seja simples, minha conclusão é que as pessoas preferem abrir mão de investigar,
analisar e questionar não porque não sabem ou não dominam os modelos
necessários (afinal sempre é possível aprender ou contratar um consultor para
ajudar), mas sim porque é mais fácil fazer e, se der errado, colocar a culpa no
destino ou no descontrole do governo.
O que você acha?
http://www.institutomvc.com.br/costacurta/artCG03_Markting_Cristovao_Colombo.htm